O Estado democrático e a Educação

July 19, 2017 | Autor: Ralph Bannell | Categoria: Political and Social Philosophy, Ethics
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CAPÍTULO I


O Estado Democrático e a Educação


Ralph Ings Bannell
PUC-Rio


I- Introdução


Não há dúvida que, para usar as palavras de Mészáros, "o impacto da
incorrigível lógica do capital sobre a educação tem sido grande ao longo do
desenvolvimento do sistema [do capital]" (Mészáros, 2007: 201). Obviamente,
as "modalidades de imposição dos imperativos estruturais do capital no
âmbito educacional" têm mudado ao longo da história, resultando em
consequências diferentes dependendo do período histórico em questão.


Para compreender isso, é essencial ter em mente que a educação é muito
mais ampla do que a educação formal nos sistemas escolares, por mais
importante que seja. Obviamente, como Mészáros indica,


a educação institucionalizada, especialmente nos últimos
150 anos, serviu – no seu todo – ao proposito de não só
fornecer conhecimentos e o pessoal necessário a maquina
produtiva em expansão do sistema do capital, como também
gerar e transmitir um quadro de valores que legitima os
interesses dominantes, como se não pudesse haver nenhuma
alternativa a gestão da sociedade, seja na forma
"internalizada" (isto é, pelos indivíduos devidamente
"educados" e aceitos) ou através de uma dominação
estrutural e uma subordinação hierárquica e
implacavelmente impostos. (ibidem: 202)


Na educação formal, o currículo é um campo de batalha importante para
a transmissão de valores e, até, para a distorção de fatos para legitimar
os interesses dominantes, especialmente, mas não somente, na disciplina de
história. Além disso, sabemos que políticas públicas para a educação, por
serem produzidas por um Estado comprometido com os interesses do capital,
como todos os Estados hoje em dia chamados de "democráticos", vão sempre
favorecer esses mesmos interesses, por mais que sejam combatidas por
aqueles atuantes na escola e comprometidos com uma mudança socioeconômica
radical.


A educação é muito mais que sua institucionalização em sistemas
escolares porque abrange toda a sociedade e toda a vida de cada indivíduo.
Como Mészáros nos diz, as instituições formais da educação "não podem
funcionar adequadamente exceto se estiverem em sintonia com as
determinações educacionais gerais da sociedade como um todo" (ibidem: 206,
grifos no original). O sentido da educação tem que ser ampliado para
abranger todos os mecanismos de ""internalização" pelos indivíduos (…) da
legitimidade da posição que lhes foi atribuída na hierarquia social,
juntamente com suas expectativas "adequadas" e as formas de conduta
"certas", mais ou menos explicitamente estipuladas nesse terreno" (ibidem).
Além disso, concordo, mais uma vez, com Mészáros quando diz que "a educação
formal não é a força ideologicamente primária que consolida o sistema do
capital; tampouco ela é capaz de, por si só, fornecer uma alternativa
emancipadora radical" (ibidem).


Nesse texto, gostaria de refletir sobre as relações entre o Estado
democrático de direito e a educação, com o objetivo de tentar mostrar que a
educação promovida pelo Estado não é capaz de fornecer uma alternativa
ideológica emancipadora radical ao sistema do capital, exatamente porque
esta sob o impacto da incorrigível lógica do capital.


II- O Estado de direito e a democracia


Para elaborar meu argumento, vou expor brevemente o modelo de
cidadania democrática de Habermas, um dos mais importantes defensores do
Estado de direito e suas instituições, e suas implicações para a educação.
Depois, vou tentar esboçar algumas críticas ao modelo habermasiano. Por
final, vou esboçar algumas ideias sobre a relação entre educação e
democracia que aponta para além do Estado.


2.1. O modelo da cidadania democrática de Habermas


Habermas constrói seu modelo de democracia deliberativa baseado na
crítica de dois outros modelos: o liberalismo classico e o republicano.
Como modelos normativos, eles não descrevem sistemas políticos existentes,
todavia, eles estão, com certeza, empiricamente presentes, ainda que não em
sua forma pura, na maioria das chamadas 'democracias' ocidentais.


Como é sabido, o modelo liberal clássico enfatiza o papel do cidadão
privado como membro de uma sociedade estruturada pela economia capitalista.
Esta é a esfera privada do trabalho e da circulação de pessoas, na qual os
indivíduos perseguem seus interesses privados fazendo uso de sua autonomia
privada legalmente protegida. O Estado, por outro lado, é compreendido como
a infra-estrutura mínima necessária para proteger os direitos individuais,
regular os mercados e fornecer os serviços públicos essenciais, inclusive o
de educação. Isso cria uma estrutura estatal com poder administrativo,
sobre o qual o controle é supostamente mediado pelo processo político
eleitoral.


O processo político, nessa perspectiva, pode ser analisado pelo modelo
elitista de democracia (Downs, 1957; Schumpeter, 1970). Aqui o processo
político é projetado para agregar os interesses dos cidadãos privados
através da eleição de elites políticas para um parlamento e (quando
relevante) um executivo eleito separadamente. O processo democrático
consiste da competição dessas elites pelo voto dos cidadãos e, quando
eleitos, da participação destes na formulação de leis e de políticas
públicas baseadas em sua competência política, separados de qualquer
mandato substancialmente popular. A ideia central é que a luta por
influência e acesso à administração estatal é o principal mecanismo para
agregar interesses individuais dos cidadãos, supostamente levando o poder
administrativo a ser controlado pelos indivíduos a quem serve.


O problema, claro, é que este modelo, ao pressupor que todos os
cidadãos são formalmente livres e iguais, não considera as desigualdades
entre classes e grupos sociais, baseadas no poder econômico e político
diferenciado presentes na sociedade. Ao tratar a todos como iguais, se
reproduz as desigualdades, permitindo que os grupos e os indivíduos mais
poderosos econômica e politicamente dominem o processo político, por
conseguinte agregando seus interesses às custas dos interesses da maioria
(numérica). Eleições periódicas, baseadas no princípio de um voto (secreto)
por pessoa, apenas consolidam as desigualdades porque não oferecem nenhum
mecanismo para a discussão de ideias e diretrizes antes das eleições, assim
como sistematicamente excluem os grupos minoritários de qualquer
representação expressiva no parlamento (Kymlicka, 2002). Também, como
Habermas (1996: 504) diz, "historicamente falando, direitos liberais se
cristalizaram em torno das posições sociais dos proprietários da
propriedade-privada" e podem ser usados para justificar a forma reduzida de
cidadania, como uma relação entre um cliente e administrações que oferecem
serviços e benefícios. Como na economia de mercado, a política de mercado
dá preferência àqueles com maior poder de compra, medido tanto em termos
economicos como em prestígio, reputação, influência e etc.[1]


Como Charles Taylor (2000: 216) nos diz, esse modelo "concentra-se nos
direitos individuais e no tratamento igualitário, bem como numa ação
governamental que leva em conta as preferências dos cidadãos. É isso que
deve ser garantido. A capacidade do cidadão consiste principalmente no
poder de reinvindicar esses direitos e assegurar tratamento igual, bem como
no de influenciar os reais tomadores de decisões". Essas reivindicações
podem ocorrer por meio de tribunais ou por instituições representativas,
além de engajamento extra-parlementar, como em manifestações, greves e etc.
Diria que esse é o modelo da relação entre o Estado e o cidadão dominante
hoje em dia, nas chamadas sociedades democráticas, inclusive no Brasil. Um
dos problemas com esse modelo é que ignora o fato que não é possível
garantir tratamento igual numa sociedade essencialmente desigual. E essa
desigualdade não é resultado de uma falha somente no sistema politico que,
se for resolvida, poderia equilibrar a força de cada indivíduo na sua
influência sobre quem toma as decisões. Em vez disso, é resultado da
alienação do modo de produção capitalista, que produz uma estrutura
jurídica e política igualmente alienada.


Para Habermas, um dos mais problemáticos pressupostos por trás deste
modelo é o princípio de igual respeito, que é "desenvolvido apenas na forma
de autonomia privada legalmente protegida, que qualquer um pode usar para
realizar seu projeto de vida pessoal" (Habermas, 1994:12). Nesse modelo, o
sistema escolar, bem como as formas informais de educação, tem como
objetivo formar alguém capaz de desenvolver um projeto de vida pessoal e
zelar para seus direitos individuais e subjetivos, que permitem que seu
projeto tenha êxito. Por isso, deveria desenvolver as capacidades para o
que Kant chamou da "sociabilidade insociável". Em algumas versões, a de
Kant por exemplo, os excessos dessa sociabilidade deveriam ser contidos por
um imperitivo moral, que exigia uma formação moral, aliás o foco principal
da sua pedagogia (Kant, 1996). No entanto, o que deveria ser ensinado ao
jovem, além dos conhecimentos básicos, são os valores e comportamentos
necessários para ser bem sucedido num mundo regido pelo capital, o que Kant
chamou de 'prudência'.


Em outras versões, a ênfase e na cultivação de virtudes necessárias
para o bom funcionamento do sistema do capital. Por exemplo, um autor
(Galston, apud Kymlicka, 2002: 288)[2] destaca as seguintes virtudes: 1)
virtudes gerais (coragem, obediência a lei, lealdade; 2) virtudes sociais
(independência, mente aberta); 3) virtudes econômicas (ética de trabalho,
capacidade de adiar auto-gratificação, adaptabilidade as mudanças
econômicas e tecnológicas); 4) virtudes politicas (reconhecer e respeitar
os direitos de outros, exigir somente o que pode ser pago, avaliar aqueles
no Governo, vontade de participar de discursos públicos). Não é necessária
muita reflexão para ver que tais valores, internalizados pelas crianças e
jovens (para não falar nos adultos) somente vai fortelecer o sistema do
capital. Nem as virtudes políticas de avaliar aqueles no Governo e a
vontade de participar de discursos públicos apresentam uma ameaça ao
sistema, porque os critérios de avaliação incluem somente o que é permitido
dentro de um sistema de partidos politicos, sindicatos e etc e porque
discursos públicos nunca prosseguem entre iguais, sempre sendo distorcidos
pelo poder dos grupos detentores do capital.


Tais virtudes são formadas não somente na escola, mas também na
família, no mercado econômico e na chamada sociedade civil, especificamente
pelos meios de comunicação de massa que, por trás da "liberdade de
imprensa" propagam quase exclusivamente os valores e crenças compatíveis
com os interesses do capital[3]. Assim, podemos ver claramente por que a
educação deve ser compreendida além do sistema escolar. Volto a essa
questão abaixo.


Mas, talvez o mais importante aspecto dessa forma de democracia e a
separação do econômico do politico. Como Wood (2003: 201) afirma, "de um
lado, passou a existir uma esfera politica separada na qual a condição
"extra-econômica" – política, jurídica ou militar – não tinha implicações
diretas para o poder econômico, o poder de apropriação, de exploração e
distribuição. Do outro lado, passou a existir uma esfera econômica com suas
próprias relações de poder que não dependem de privilégio político nem
jurídico". No entanto, por mais que essas esferas fossem separadas, as
implicações indiretas para o poder juridico e politico do poder economico
sempre foram centrais ao funcionamento do capitalismo, desde sua origem.
Volto a essa questao abaixo.


O que é ausente no modelo clássico de liberalismo, segundo Habermas, e
proporcionado pelo segundo modelo - o republicano - é a ideia de igual
respeito como reconhecimento público do outro como alguém que participa de
uma prática comum ou forma de vida. Esse modelo tem suas raízes no
humanismo cívico da Grécia Antiga, na qual a ênfase era na sociedade
política, as relações econômicas entendidas como externas a ela e, se
levadas ao extremo, até patológicas. Como Cohen & Arato (1992: 84) nos
lembram, a politike koinonia da Grécia Antiga era "Uma comunidade ético-
política pública de cidadãos livres e iguais sob um sistema de leis
legalmente definido (...) visto como a expressão de um ethos, um conjunto
comum de normas e valores definindo não somente procedimentos políticos,
como também uma substantiva forma de vida baseada em uma classificação de
virtudes preferenciais e formas de interação".


Esse modelo tem sido renovado recentemente na forma de
comunitarianismo, no qual a construção de uma identidade coletiva – um
"nós" – é vista como o mais importante objetivo do processo político.
Entretanto, Habermas critica esse modelo, argumentando que ele é inadequado
às realidades sociais das sociedades contemporâneas.


O modelo republicano (…) tem a vantagem de preservar o
significado radical democrático de uma sociedade que se
auto organiza através de cidadãos unidos comunicativamente
e não vê metas coletivas como "deals" entre interesses
privados em competição. Sua desvantagem (…) é que é
idealístico demais na medida em que faz com que o processo
político democrático depende das virtudes dos cidadãos
empenhados ao bem comum. (…) O erro da visão republicana
consiste em enfatizar demais a ética no discurso político
(Habermas, 1998: 244).


Todas as sociedades contemporâneas são multiculturais e multilinguais,
se não plurinacionais, desse modo removendo uma das condições necessárias à
implementação do modelo republicano: uma comunidade de descendência
compartilhada. Sem isso, a construção de uma identidade nacional, que é
coletiva e substantiva, se torna impossível; qualquer tentativa para tal
seria necessariamente a imposição da identidade do grupo ou grupos
dominantes aos outros que vivem na sociedade em questão.


Em termos educacionais, esse modelo enfatiza a construção das
identidades de grupos marginalizados, bem como um processo político que
permita o autogoverno dos grupos diferenciados por etnia, raça, cultura,
língua e etc. Assim, como assinalado mais uma vez por Charles Taylor, a
capacidade mais importante do cidadão é sua capacidade de autogovernar, que
exige uma identidade cultural, étnica e etc forte, bem como uma
participação plena em "um concenso de governo, com o qual podemos nos
identificar junto com os outros" (ibid: 217). Obviamente, essa forma de
participação não é puramente instrumental, com o objetivo de assegurar as
condições para um projeto de vida pessoal, mas é encarada como vital para
contribuir tanto para a construção de uma determinada comunidade política,
como para o indivíduo identificar-se com essa comunidade, seus valores,
crenças, padrões de comportamento e etc.


Em outras palavras, a participação política, nesse modelo, tem uma
dimensão formadora do cidadão enquanto indivíduo cultural; ele é concebido
como um ser constituído pelo seu meio sociocultural e político. E, para
esse processo constitutivo acontecer, os processos educativos na sociedade
em questão tem como objetivo principal internalizar os valores, crenças e
comportamentos considerados válidos pela comunidade maior. Em outras
palavras, o objetivo principal é o de construir uma identidade nacional
forte, partilhada por todos os membros da comunidade em questão.


No entanto, sabemos que o Estado-Nação moderno não se reduz a uma
nação culturalmente homogênea dentro de um território. Pelo contrário, são
compostos de grupos diferenciados. Por isso, um dos objetivos dos sistemas
escolares em muitos países inspirados no republicanismo foi o de construir
uma identidade nacional artificial que, na realidade, era a identidade de
uma classe social dominante, baseada nos seus valores, crenças, padrões de
comportamento e etc. Os sitemas escolares foram cruciais nessa
empreitada[4], mas não foram decisivos, sendo necessário também processos
educacionais fora da escola para construir essa homogeneidade falsa.


No entanto, o que esse modelo também ignora – e que Habermas também
não toca na sua análise – é que sociedades contemporâneas não são somente
compostos de grupos diferenciados por identidade cultural, étnica, racial
etc, mas também por classes sociais em conflito. Um dos problemas com
comunitarianismo – bem como o humanismo civico da Grecia antiga - é que
ignora como a socidade é estruturada por classes sociais com interesses
antagônicos. É sabido que a "democracia" da Atenas antiga somente foi
possível porque escravos, mulheres e estrangeiros foram excluídos da
sociedade política de cidadãos. E foram esses grupos essencialmente
responsáveis pela reprodução material da sociadade.[5] Sob o dominio do
capital, a classe que produz é a classe trabalhadora, cuja participação na
esfera política também é restrito, não formalmente, mas essencialmente. A
omissão de Habermas de falar nesse aspecto é notável, porque, como veremos,
ele coloca tanto os problemas das sociedades contemporâneas, como suas
soluções, no plano político, legal e ético, ignorando a causa deles no modo
de produção capitalista.


O modelo de Habermas faz "a concepção processual de política
deliberativa a pedra fundamental da teoria da democracia [resultando] em
diferença tanto da concepção republicana do estado como comunidade ética,
quanto da concepção liberal do estado como guardião da sociedade de
mercado." (Habermas, 1998: 246). A estrutura básica do modelo consiste na
separação de mercado, Estado e sociedade civil. Obviamente, as três esferas
se mesclam entre si na realidade, mas, ao ponto de poderem ser separadas
analiticamente, ele acha possível identificar uma esfera da vida social que
possa gerar processos racionais de formação da vontade política e de
opinião pública, de forma a não destruir as identidades culturais dos
diversos grupos sociais, e que possa também gerar uma forma de poder
comunicativo capaz de exercer controle social sobre o poder econômico da
sociedade de mercado e sobre o poder administrativo do Estado.


Obviamente, esses processos têm que exercitar alguma influência nas
instâncias de tomada da formulação de leis e políticas públicas, bem como
sua interpretação, adjudicação (quando for necessário) e execução.
Começando da premissa que "poder político é sempre exercitado em forma de
lei", junto com o pressuposto de que há uma relação interna entre lei e
democracia, Habermas acha necessário analisar como as instituições do
Estado constitucional, especificamente a legislatura e o judiciário, mas
também o executivo, participam na geração do poder comunicativo. Isso
Habermas faz na sua análise dos princípios do Estado constitucional
(Habermas, 1996: 132ss; 238ss).


Não há espaço para entrar nessas análises em detalhes, mas uma ideia
central é a de colocar autonomia pública e privada em pé de igualdade,
evitando assim a hierarquia que coloca autonomia privada acima da autonomia
pública, como no liberalismo clássico, ou vice-versa, como no
republicanismo clássico. Isso resulta na pretensão de que direitos básicos
e soberania popular se pressupõe mutuamente e não competem entre si.
Direitos básicos, especialmente os direitos de comunicação e participação
política, garantidos pelo Estado de direito, são condições necessárias para
o exercício da autonomia pública e vice-versa. Por esta razão, Habermas
(1994: 113) afirma que "pessoas privadas e legais não podem nem gozar suas
liberdades individuais se não, eles mesmos, pelo exercício de sua liberdade
enquanto cidadãos, alcançar um entendimento claro sobre quais interesses e
critérios são justificáveis e em que maneira coisas iguais serão tratadas
equitativamente e coisas não iguais tratadas em maneiras diferentes, em
cada caso particular". Tal autonomia pública ou política não pode ser
realizada pelo indivíduo que age para satisfazer seus interesses privados,
mas apenas pelo princípio republicano de uma "prática coletiva de
determinação pessoal" (Habermas, 1996: 498).[6]


Autonomia pública, neste sentido, é exercida não somente nos limites
de uma esfera publica política, mas também, mediada pela lei, nas
instituições do Estado constitucional, especificamente a legislatura e o
executivo. Habermas define "a esfera pública como uma estrutura
comunicacional enraizada no mundo da vida através da rede de associações da
sociedade civil (…) um espaço social gerado na ação comunicativa [e]
caracterizado por horizontes abertos, permeáveis e flexíveis" (Habermas,
1996: 359-60). Esse espaço é onde os problemas que afetam a sociedade como
um todo podem ser detectados, identificados e interpretados por todos os
afetados por eles. É também o espaço no qual o controle social pode ser
exercido através de um "poder gerado comunicativamente que rivaliza (...)
com o poder social de atores com capacidade verdadeira de ameaça e (...)
com o poder administrativo dos funcionários públicos" (ibid.: 1996: 341).


A análise desse poder comunicativo é complexa, envolvendo não somente
a influência exercida da opinião pública, gerada na esfera pública
política, sobre as instituições do Estado, mas também o envolvimento de
processos dentro dessas próprias instituições na geração desse poder. No
entanto, Habermas deixa claro que a opinião pública somente tem a
capacidade de influenciar o poder administrativo do Estado e não pode, ela
mesma, governar.


As estruturas comunicativas da esfera pública se compõem de uma rede
de sensores que respondem à pressão dos problemas encontrados na sociedade
e estimulam opiniões influenciais. A opinião pública que está convertida,
pelos procedimentos democráticos, num poder comunicativo não pode, ela
mesma, "governar", mas somente canalizar o uso de poder administrativo em
direções específicas (Habermas, 1996: 250).


A respeito dessa questão, Habermas tem recebido críticas, por exemplo,
de Leonardo Avritzer (2002), que argumenta que influência não é suficiente
para gerar poder comunicativo, sendo também necessário fóruns públicos
específicos de deliberação e partidos políticos para uma política
verdadeiramente participativa. No entanto, Habermas não depende somente de
uma noção vaga de influência que vem da esfera pública, mas faz uma análise
detalhada das instituições do Estado constitucional de direito, bem como a
relação entre direito e política, exatamente para tentar mostrar a mediação
– jurídica e política - necessária para tornar opinião pública em poder
comunicativo. Vale a pena mencionar aqui a necessidade de democratizar os
meios de comunicação para permitir uma pluralidade de interpretações e
argumentos na esfera pública. Com relação aos meios de comunicação de
massa, Habermas invoca uma série de expectativas normativas para que os
meios funcionem para permitir uma pluralidade de vozes na esfera
publica[7].
Mais dois elementos são centrais a este modelo. O primeiro é que se os
processos coletivos de deliberação política pretendem envolver todos os
grupos que compõe a sociedade, precisam ser embasados em alguma cultura
política compartilhada, bem como uma identidade politica em comum. Uma vez
que essa não pode ser uma cultura ou vida ética específica, como no modelo
republicano clássico, nem uma identidade fundamentada numa tradição
cultural em comum, Habermas defende a necessidade de uma cultura política
liberal e uma identidade cívica, que ele denomina patriotismo
constitucional, diferente das culturas e identidades específicas de cada
grupo. Ao afirmar que "no caso de uma comunidade democrática, essa base de
valores comuns se encontra nos princípios constitucionais", Habermas (2004:
53) enfatiza a centralidade do Estado constitucional de direito, na qual a
constituição supostamente expressa um consenso, ainda que formal, em uma
sociedade pluralista. Isso possibilita que o sentimento de pertencer a uma
comunidade política seja transferido, do solo de uma história, cultura e
língua em comum para a interpretação - da perspectiva da cultura de grupos
diferenciados e suas histórias específicas - de princípios constitucionais.



Em suma, a ênfase é na capacidade integradora do processo deliberativo
democrático em sociedades desiguais e a crença de que, se for corretamente
instalado, tal processo asseguraria uma organização social que permite
membros de cada grupo diferenciado de participar na sua vida e na criação
das condições nas quais é vivida. Eis o problema.


Avritzer (2002), por exemplo, um comentarista com simpatia pela teoria
habermasiana, nota que, após a independência, mesmo com a adoção de uma
constituição liberal e com a penetração na economia mundial, o Brasil
falhou na construção de uma esfera pública democrática durante o processo
de construção da nação. É verdade que, desde o fim da ditadura, o processo
de liberalização trouxe mudanças importantes para a esfera pública,
especialmente através da ação dos movimentos sociais e alguns segmentos da
sociedade civil, mas isso produziu um conflito entre as novas práticas
introduzidas por estes movimentos e a lógica da sociedade política,
fundamentada nos interesses da elite tradicional brasileira e da elite
econômica internacional, especialmente quando essa lógica foi reforçada na
década de 1990.


No entanto, é importante notar a incapacidade integradora do processo
democrático numa sociedade marcada por desigualdades enormes nos recursos e
chances de vida da maioria da população. Habermas insiste que "a idéia
central do republicanismo é que o processo democrático pode servir, ao
mesmo tempo, para garantir a integração social de uma sociedade cada vez
mais diferenciada. Numa sociedade caracterizada por pluralismo cultural e
religioso, essa tarefa não pode ser deslocada do nível da formação da
vontade política e comunicação pública para o substrato aparentemente
natural de uma nação supostamente homogênea." (Habermas, 1998: 117). Um
problema aqui é que isso desloca o debate do plano do modo de produção de
uma sociedade para a questão de pluralismo cultural, étnico, racial etc.


O pluralismo de identidades associado com a diversidade de grupos da
sociedade brasileira começou a ser reconhecido apenas recentemente e,
obviamente, existiu desde o inicio da colonização. No entanto, uma
sociedade estruturada por classes sociais também existia desde a
colonização e continua existindo hoje em dia. Isso abre um debate muito
quente hoje em dia entre aqueles que insistem que a questão do pluralismo
cultural etc. somente pode ser tratada junto com a questão da alienação do
trabalho e aqueles que argumentam que a política de reconhecimento tem
dificuldade de se desenvolver no Brasil exatamente por causa do mito de
democracia racial e integração étnica, não necessariamente sendo um
problema que precisa afetar o modelo socioeconômico na base da sociedade
brasileira.


Além disso, se, como Habermas argumenta, "cidadania democrática só
pode realizar sua potencial integrativa – isto é, só pode encontrar
solidariedade entre estranhos – se provar a si mesma como mecanismo que
efetivamente realiza as condições materiais das formas preferenciais de
vida" (ibid: 119, grifos meus), a carência de condições materiais pode ser
vista como uma severa limitação imposta não somente à construção de
democracia no Brasil, mas na Europa e America do Norte também. Por exemplo,
o próprio Habermas tem assinalado como o fenômeno da "globalização",
especificamente a maior "desnacionalização da produção econômica" e uma
comunicação global "não leva por si só a uma expansão de um mundo
compartilhado intersubjetivamente e a tessitura discursiva de concepções de
relevância, temas e contribuições das quais uma esfera pública política
emerge", interrompeu uma suposta "dialetica de igualdade legal e factual"
da modernidade[8]. Diante dos fenômenos socioeconômicos das últimas
décadas, Habermas declara que "as fontes de solidariedade estão secando,
com o resultado de que condições sociais do Terceiro Mundo estão se
tornando comum nos centros urbanos do Primeiro Mundo" (Habermas, 1998: 120-
124). No entanto, apesar de suas próprias observações, Habermas ainda
aposta na construção de instituições políticas que, a partir "[da] herança
normativa de um Estado Constitucional de Direito" e "conectadas a processos
democráticos de formação de vontade politica" podem "funcionar como um
freio a dinâmica não controlada da produção capitalista globalizada"
(ibidem).


As implicações educacionais desse modelo mostram que o papel da escola
na sociedade contemporânea teria pelo menos os seguintes elementos.
1- A escola tem que formar os alunos com as capacidades necessárias
para participar em processos deliberativos no espaço público,
incluindo a competência interativa e comunicativa e a capacidade de
argumentar e de coordenar suas ações junto com os outros. Em suma,
desenvolver a capacidade de participar em processos de aprendizagem
no sentido de avaliação das crenças, normas, valores etc. que
fundamentam nossas interpretações do mundo e de nossas ações. A
ênfase seria na racionalidade discursiva como mecanismo de
resolução de conflitos e de construção de compreensão entre grupos
diferenciados.
2- A escola tem que se preocupar com o plural e o universal, ou seja,
com o fortalecimento das identidades culturais, raciais e étnicas
de seus alunos, enquanto fortalecendo uma identidade cívica e
cultura politica em comum. Isso envolve uma educação política
pautada na necessidade de ampliar a esfera pública política e o
fortalecimento dos direitos de comunicação e participação política,
bem como a ênfase na constituição como elemento central na
construção de um patriotismo constitucional. A escola, enquanto
instituição social e pública, tem que preparar alunos para
participar na geração do poder comunicativo necessário para
influenciar as decisões legislativas e governamentais.
3- A formação ética tem que ter um lugar central no currículo escolar.
O reconhecimento da pluralidade de perspectivas éticas tem que ser
constrangida com o reconhecimento de um moral universal e o
desenvolvimento de uma consciência moral na direção de uma
autonomia de Eu.


2. Quais os problemas com esse modelo


A primeira vista, esse modelo pode parecer atraente e, de fato, é
atraente para muitas pessoas, porque faz uma crítica ao liberalismo
clássico, hoje em dia resuscitado na forma de neoliberalismo, e defende o
papel do Estado, além da sociedade civil, no desenvolvimento da cidadania
democrática. Além disso, contempla o pluralismo cultural prevalecente hoje
em dia. Por final, tenta mostrar como pessoas diferenciadas por etnia,
religião e etc podem resolver seus conflitos e compreender seus "interesses
generalizáveis", através da participação na esfera pública, portanto sendo
capazes de chegar a uma vontade política compartilhada e, portanto,
inflenciar aqueles que tomam as decisões dentro das instituições de Estado,
seja o executivo, o legislativo ou o judiciário.


Assim, esse modelo não exige uma transformação radical das
instituições existentes. O mercado econômico capitalista não é rejeitado,
nem as principais instituições e mecanismos políticos de uma sociedade
liberal. O que é sugerido é uma maneira de melhorar seu desempenho nos
interesses de grupos atualmente excluídos de participação efetiva no
processo político. Mas, eis o problema.


No inicio de sua carreira, Habermas fez uma "reconstrução" do
materialismo histórico, na qual ele rejeitou as categorias principais da
análise marxiana da sociedade. Como Mészáros (1989: 130ss) mostra, Habermas
argumentou que os problemas estruturais do capitalismo, analisados por
Marx, tem sido resolvidos nas sociedades do "capitalismo avançado e
organizado". Portanto, segundo Habermas, a análise de Marx era válida
somente na fase do "capitalismo liberal", mas não se aplica mais ao
capitalismo avançado. Na época da prosperidade econômica e do consenso
político pós-guerra na Europa, Habermas chegou a argumentar que
"capitalismo regulado pelo Estado, que emergiu da reação contra os perigos
ao sistema produzidos pelo antagonismo aberto de classes, suspende o
conflito de classes" (Habermas, apud, Mesaros: 138). O mecanismo político
de distribuição, através do Estado do bem estar, foi considerado suficiente
para evitar o conflito entre capital e trabalho que, na medida em que não
pode ser eliminado, permaneceria latente.


Além disso, Habermas argumentou, e elaborou mais esse elemento da sua
teoria na apropriação da teoria de sistemas mais tarde na sua teoria do
agir comunicativo, que há determinados imperativos funcionais das
sociedades complexas contemporâneas que somente podem ser adequadamente
respondidos pela economia capitalista e pelo Estado constitucional de
direito. Não há espaço aqui para entrar nos detalhes dessa análise, nem da
crítica que poderia ser levantada contra ela[9]. O importante é enfatizar
que, para Habermas, não há alternativas funcionais a economia capitalista e
o Estado constitucional de direito. Portanto, qualquer possibilidade de
superar os problemas e os conflitos sociais tem que ser buscado no terreno
atual da organização socioeconômica. Isso o levou a sugerir dois mecanismos
de integração social, um pelos chamados subsistemas economico e
administrativo-estatal e outro pelo chamado mundo da vida. Assim ações dos
indivíduos na sociedade são supostamente coordenadas por esses dois
mecanismos, um no contexto de ação estratégica – do mercado e do poder
administrativo do Estado – e outro no contexto de ação comunicativa, no
mundo da vida. No entanto, Habermas não percebe que a ação coordenada pela
economia de mercado não é um mecanismo de integração social. Pelo
contrario, é cada vez mais um mecanismo de exclusão social. Além disso, a
coordenação de ações via ação comunicativa, no mundo da vida, não é
suficiente para controlar o mercado e o Estado nos interesses
generalizáveis de todo mundo.[10]


No entanto, mais recentemente, Habermas foi forçado, diante do colapso
do "consenso político" pós-guerra, a reconhecer que um maior conflito – em
vez de menor conflito – foi e é possível, até na Europa. Por exemplo, ele
reconhece que as políticas monetaristas dos governos ocidentais desde a
década de 80, que resultaram no desmonte do Welfare State, têm aumentado os
conflitos sociais nos países Europeus, por exemplo. Assim, como vimos
acima, tem ate avisado que é possível que tais sociedades não mais possam
garantir a realização "(d)as condições materiais das formas preferenciais
de vida", portanto ameaçando uma das condições necessárias para a
solidariedade entre estranhos. No entanto, sua reposta a esse
desenvolvimento é a de continuar acreditando na possibilidade da realização
da razão na história através de processos argumentativos na esfera pública
e a capacidade de governos de responder ao risco com politicas orientadas a
reduzir os conflitos "latentes" na sociedade.


Para Habermas, as estruturas e práticas burguesas contem "elementos da
razão" que precisam ser desenvolvidos para resolver os problemas das
sociedades contemporâneas. Essas estruturas e práticas incluem o Estado de
direito e suas instituições do executivo, legislativo e judiciario, bem
como os processos políticos baseados numa democracia representativa e numa
esfera pública democrática. Como Mészáros afirma, "Habermas acredita
genuinamente nas virtudes tradicionais do liberalismo burgues" (ibid: 26).
Por exemplo, ele defende uma "cultura política liberal", que aceitaria não
somente diferentes religiões, culturas, orientações sexuais etc, mas também
a existência de ideologias antagônicas. Além de outras coisas, isso
pressupõe que os problemas sociais nas sociedades contemporâneas são da
ordem política e cultural e podem, portanto, ser resolvidos no mesmo plano.
Por isso, Habermas quer separar a esfera politica da esfera economica,
argumentando que a primeira deveria ser a esfera da ação comunicativa, via
a forma reflexiva da ação comunicativa na esfera publica, enquanto a
segunda deveria ser a esfera da ação estratégica, necessária para produzir
os bens e serviços necessários para uma sociedade complexa. Com relação a
isso, Mészáros (ibid: 27) argumenta bem: (está faltando a citação?)


Nesse sentido, Habermas tem que ignorar o fato desconcertante que as
relações de poder políticas e socioeconômicas que estão bem consolidadas
dentre as quais seu 'diálogo' idealizado acontece em sociedades de classe
faz rir das pretensões segundo as quais é possível considerar uma
modalidade de comunicação tão fortemente constrangida um dialogo genuino.
(Conferir o sentido)


Assim, qualquer 'diálogo' que acontece nas sociedades estruturadas por
classes sociais antagônicas tem que ser estruturalmente determinado de uma
maneira que não permite um desafio objetivo as estruturas essenciais a
ordem estabelecida (ibid). Hoje em dia vemos isso claramente nos veículos
de comunicação de massa. Claro, Habermas não ignora o poder de fato da
comunicação de massa, por exemplo, lamentando o fato que não corresponde as
normas idealizadas de uma comunicação de massa democrática (Habermas,
1996)[11]. No entanto, sua teoria não tem os recursos necessários para
elaborar uma resposta a essa situação que seja viável.


No fundo, como Mészáros aponta, a teoria habermasiana foi construída
em cima de uma constatação muito problemática, ou seja, que "nas sociedades
capitalistas desenvolvidas não há uma classe identificável, nenhum grupo
social claramente circunscrito, que poderia ser identificado como o
representante de um interesse geral que foi violado" (Habermas, apud
Mészáros: 30, grifo no original). Assim, não há alternativa senão a
possibilidade dos grupos diferenciados na sociedade de construir um
interesse generalizável pelo 'diálogo', para evitar os conflitos
decorrentes de diferenças culturais e etc. Além disso, tanto os conflitos
como o diálogo permanece no plano político, consequentemente pressupondo
que o substrato econômico não precisa ser alterado, porque é necessário
para responder aos imperativos funcionais de uma socidade complexa, como as
sociedades contemporâneas.


Essa estratégia permite Habermas a defender a normatividade articulada
legalmente, bem como a forma representativa – embora deliberativa - de
democracia, na sua teoria discursiva de direito e de democracia (Habermas,
1996), por mais que ele tente criticar algumas de suas formas mais
superficiais. No entanto, ele não percebe que essas estruturas normativas
estão fundamentadas numa sociedade de classes e, portanto, constituem uma
"normatividade alienada" (Mesaros, ibid: 32). Portanto, tentar achar uma
resposta aos problemas sociais por dentro dos elementos racionais de uma
normatividade alienada somente pode resultar numa análise que não atinge as
causas reais dos problemas enfrentados pela humanidade. Como se diz no
Brasil: o buraco é muito mais embaixo!


III- O Estado 'democrático' e a educação


Por que tudo isso é importante para a educação. Principalmente, porque
processos educativos numa sociedade regida pelo sistema do capital, sejam
formais ou informais, podem ser vistos como espaços que fortalecem ou
enfraquecem as estruturas normativas. É na medida em que eles fortalecem
uma normatividade alienada, somente contribuem para a reprodução do
sociometabolismo do capital. Além disso, políticas educacionais, sendo
políticas de Estado, somente podem, em última instância, determinar esses
processos numa direção, ou seja, na direção de fortalecer as ideologias, os
valores e as práticas sociais necessários para a perpetuação do sistema do
capital e sua forma de sociabilidade.


Por que o Estado tem que estar implicado na reprodução do sistema do
capital e não, como algumas análises sugerem, na sua superação? A resposta
a essa pergunta é porque o Estado está implicado no que Mészáros chama as
mediações de sugunda ordem do sistema do capital. Essas mediações incluem:
a família nuclear; os meios de produção; o dinheiro; os objetivos de
produção orientados a expansão e acumulação do capital e não a satisfação
das necessidades humanas; a separação do trabalho do controle social; o
proprio Estado enquanto agente na economia global; e o mercado global
(Mészáros, 1995: 108-109).[12]


Isso é visto claramente nas últimas décadas em vários países,
inclusive no Brasil. Por exemplo, a família nuclear é objeto de políticas
sociais que tem como objetivo fortalecê-la como o fundamento da vida em
sociedade. No Brasil, por exemplo, o crescimento dos evangélicos dentro do
Congresso Nacional, como reflexo da sua presença na sociedade como um todo,
tem fortelecido os valores e comportamento da familia nuclear, mesmo num
país com uma constituição que protege um Estado laico.


Com relação aos meios de produção, o Estado atua diretamente no
fortelecimento dos meios de produção alienados do capital. Isto foi visto
com clareza cristalina nos últimos anos com a intervenção dos Estados
europeus, e outros, para prevenir o colapso do sistema financeiro mundial.
O mesmo Estado relaxou os regulamentos que controlaram o capital
financeiro, nos Governos de Regan e Thatcher, além de outros, que
permitiram uma onda de especulação que culminou numa crise sem precedentes
e, depois que estourou, utilizaram o fundo público para sanar as contas dos
bancos privados para salvar o sistema. Assim as personificações do capital
incluem não somente os capitais da indústria e do sistema financeiro, mas
também os ministros de Estado e suas equipes que controlam a política
econômica desses paises.


Com relação ao dinheiro, é evidente hoje em dia que o capital
financeiro é o elemento dominante no sistema do capital, e que assumiu
formas tão complexas e mistificadoras de operar que nem aqueles que
supostamente controlam o sistema monetário internacional são capazes de
entender como funciona. Isso é evidente quando o FMI, junto com o banco
central europeu e os bancos centrais dos países envolvidos, não são capazes
de elaborar um plano que tire a Europa da sua crise atual. O Estado é
implicado nisso na medida em que, apesar da 'independencia' dos bancos
centrais, esses bancos – junto com o FMI, que é financiado pelos mesmos
Estados – elaboram políticas que jogam milhares de pessoas no desemprego,
diminuem os gastos sociais e pensões e reduzem a qualidade de vida das
camadas mais pobres das suas sociedades. E tudo isso com a conivência dos
Governos dos países que estão enfrentando o colapso dos seus sistemas
bancários.


Com relação aos objetivos da produção, políticas do Estado vão tentar
estimular o crescimento do PIB a quelquer custo, por exemplo, quando o
Governo brasileiro reduziu o imposto de carros, portanto estimulando seu
consumo num país cada vez mais urbanizado e com problemas de tráfego
sérios. Essas políticas são claramente determinadas pelo imperativo de
expansão e acumulação do capital, sob o discurso ideológico de que somente
assim seria possível criar empregos e melhorar a vida da população, quando,
na verdade, as necessidades humanas não estão contempladas.


Além disso, há o investimento direto do Estado na economia,
principalmente na construção da infraestrutura necessária para o
funcionamento do capital privado ou na concessão de contratos para o setor
privado explorar determinados serviços. Vemos isso, no Brasil, na queixa
dos empresários com relação a suposta falta de investimento do Governo em
infraestrutura, a concessão de rodoviárias e aeroportos ao setor privado e
na construção da infraestrutura necessária para a copa do mundo de futebol
e as olimpíadas, que acontecerão em 2014 e 2016 respectivamente. O papel do
Estado não se restringe a contratos de concessão para a construção e
exploração, mas também abrange a concessão de licenças ambientais, o retiro
pela força das moradias que estão no caminho e a repressão brutal pela
polícia de manifestações contra esses eventos e suas consequências.


Isso claramente mostra que a diferenciação da economia da política é
somente a separação do momento da coerção do momento da apropriação. Como
Wood (ibidem: 35) diz:


A diferenciação da esfera econômica (...) não é sugerir
que a dimensão política seja, de certa forma, estranha as
relações capitalistas de produção. A esfera politica no
capitalismo tem um caráter especial porque o poder de
coação que apóia a exploração capitalista não é acionado
diretamente pelo apropriador nem se baseia na subordinação
política ou jurídica do produtor a um senhor apropriador.
Mas são essenciais um poder e uma estrutura de dominação,
mesmo que a liberdade ostensiva e a igualdade de
intercâmbio entre capital e trabalho signifiquem a
separação entre o "momento" da coerção e o "momento" da
apropriação. A propriedade privada absoluta, a relação
contratual que prende o produtor ao apropriador, o
processo de troca de mercadorias exigem formas legais,
aparato de coerção e as funções policiais do Estado.
Historicamente, o Estado tem sido essencial para o
processo de expropriação que está na base do capitalismo.
Em todos esses sentidos, apesar de sua diferenciação, a
esfera econômica se apóia firmemente na política.


Quanto ao papel do Estado-Nação na reprodução do sistema do capital,
vemos nas guerras de comércio e brigas sobre 'protecionismo' na Organização
Mundial de Comércio, entre outras instâncias, como os Estados se enfrentam
agressivamente para tirar a maior vantagem com relação aos outros.
"Mercados livres" são propostas com claras intenções de favorecer um Estado-
Nação com relação aos outros e até blocos regionais, como a Uniao Europeia
ou o Mercosul não são suficientes para conter brigas entre seus membros por
uma posição vantajosa com relação aos demais para a produção e venda de
seus produtos e serviços. Além disso, há intervenções no território de
Estados alheios – como por exemplo a invasão do Iraque pelos Estados Unidos
da America – para assegurar o fornecimento de produtos e para criar
oportunidades para negócios para suas companhias transnacionais.


E com relação a última mediação – o do mercado mundial – vemos como
companhias transnacionais, que podem contar com a proteção de seus Estados-
Nacionais, podem dominar esse mercado, enquanto outros são forçados a
negociar as migalhas do bolo de uma posição de fraqueza. Outro exemplo
seria os fundos soberanos de investimento, que investem ou tiram dinheiro
de países somente a partir de um critério – lucro – sem se importar com as
vidas das pessoas afetadas com suas decisões. Isso resulta na migração de
milhares de pessoas em busca de sobrevivência, além da miséria do
desemprego e pobreza nos países não favorecidos por esses fundos.[13]


A falta de controle social pelo trabalho é vista a cada dia na medida
em que o trabalho assalariado é forçado pelos imperativos do capital a
jornadas de trabalho cada vez mais longas e com a erosão da legislação
trabalhista que existe em alguns países. Cada dia na televisão empresários
exigem a "flexibilização" das leis trabalhistas, algo apoiado pelo Estado,
tanto legislativo, como executivo e judiciario, sob o pretexto do chamado
'custo Brasil' e a consequente falta de competitividade. A cena diária de
ônibus superlotados com trabalhadores dormindo por falta de sono e viajando
horas para chegar ao trabalho e voltar para casa é testemunha da falta de
controle social do trabalho e o total controle do capital sobre as vidas
das pessoas.


Esses são somente alguns exemplos de como o Estado está implicado na
reprodução das mediações de segunda ordem do sistema do capital. É por isso
que o Estado moderno é, essencialmente, um Estado capitalista. O que é
importante frisar é que sistemas escolares, tanto públicos quanto privados,
estão implicados em tudo isso. Vemos como Governos estão tão preocupados
hoje em dia nos rankings internacionais, elaborados a partir de sistemas
internacionais de avaliacao, como a PISA. A preocupação é a de aumentar a
competitividade do país perante os competidores. O mesmo se aplica as
formas de avaliação nacionais, como o SAEB e o IDEB no Brasil, bem como
aquelas adotadas nos estados e municipos, como, por exemplo, no Municipio
do Rio de Janeiro[14].


Além dos sistemas de avaliação – e de 'accountability' dos sistemas
escolares em muitos países – há muitas iniciativas, no mundo todo, de
introduzir um currículo nacional, mesmo quando não recebe esse nome. Os
parâmetros curriculares nacionais no Brasil são um exemplo disso, por mais
que digam que sua adoção não é obrigatória. Mesmo que isso seja verdade, o
sistema nacional de avaliação, baseado nesses parâmetros curriculares, vai
determinar sua adoção na maioria das escolas brasileiras. Outro exemplo é a
recente introdução do 'bacheloriat inglês', na Inglaterra, que tem como
objetivo voltar ao ensino das materias tradicionais e academicas, em vez de
qualificações mais vocacionais. O objetivo declarado do Governo é o de
melhorar a competitividade do país pela formação de mão de obra mais
qualificada num mundo que exige não um trabalhador "tao estupido e
fleumatico que mais se assemelhe, no seu quadro mental, a um boi (...) tao
estupido que a palavra "percentagem" não tem qualquer significado para
ele", nas palavras de F. W. Taylor (apud Mészáros, 2007: 220, grifos no
original), mas um trabalhador capaz de desenvolver os produtos necessários
para a chamada "economia do conhecimento".[15]


IV- Qual o papel da escola?


A escola é uma instituição do Estado – ou, no caso da escola privada,
regulada pelo Estado – que regula, junto com outras instituições estatais e
não-estatais, obviamente, o tipo de relação que se estabelece entre
trabalho e capital. Exatamente por isso, numa sociedade capitalista somente
poderia ser uma instituição que regula essa relação pela lógica do capital.
Faz isso não somente pelo ensino de conhecimento necessário para o modo de
produção capitalista, mas também pelo ensino, tambem no chamado currículo
oculto, de valores, práticas culturais e princípios condizentes ao bom
funcionamento do capital e a sujeição do trabalhador aos seus imperativos.


Uma hipótese que valeria a pena ser investigada é a de que na medida
em que as contradições do sistema do capital se intensificam, como estamos
vendo hoje em dia no mundo como um todo, a função mediadora da política
assume uma forma mais direta. Ou seja, a relação indireta entre a política
e o econômico, apontada por Wood - em outras palavras, entre o "momento" da
coerção e o "momento" da apropriação - está cada vez mais se transformando
numa relação direta, comandada pelo Estado capitalista. A relação entre
capital e trabalho não pode ser mais mediada somente pelo dinheiro. Assim,
exatamente como na transição do feudalismo ao capitalismo, o momento
politica assumiu centralidade no movimento revolucionário burguês (Antunes,
2012: 48s), agora, num outro momento de transição entre capitalismo e outra
forma de organização socioeconômica, a política assume um lugar central,
tanto pela tentativa de preservar o sistema e a lógica do capital como pela
tentativa de superar essa lógica.


Nessa luta, não vejo um papel para as instituições formais de educação
na tentativa de transformação da direção a uma forma nao-alienada de
trabalho. Pelo contrario, vejo essas instituições como totalmente
empenhadas na preservação do sistema do capital e sua lógica. Ora, isso
obviamente não quer dizer que todos os agentes dessas instituições ajam
intencionalmente para esse fim. No entanto, a imposição da lógica do
mercado – com sua cultura e metas de produtividade, avaliação e remuneração
por desempenho, accountability dos professores, diretores e funcionarios ao
Estado, a redução de estruturas de apoio as necessidades de alunos, nos
paises que tem, sob o argumento de reduzir custos e etc. – tudo comandado
pelo Estado, mostra a relação intrínseca entre o capital e as instituições
formais de ensino, em todos os seus niveis.


Mesmo as funções da escola elaboradas acima a partir do pensamento de
Habermas não são suficientes para freiar a lógica do capital, porque estão
voltadas a reduzir os conflitos inerentes ao sistema do capital e não
eliminá-los. Como já apontado acima, a capacidade argumentativa – por mais
importante que seja - não é suficiente para chegar ao entendimento mútuo
num contexto onde a modalidade principal de comunicação é tão fortemente
constrangida pelos interesses do capital. Até a preocupação com a
diversidade e a integração de grupos diferenciados dentro de uma comunidade
política maior oferece somente uma solução política ao problema do conflito
e não uma solução que foca nas causas desse conflito. Mais uma vez, por
mais louvável que seja essa preocupação, ensinar alunos a respeitar o outro
numa sociedade dividida por classes sociais antagônicas não vai resolver os
problemas graves que enfrentam a humanidade hoje em dia. Além disso, o
objetivo de fortalecer uma cultura política liberal e uma identidade
política fundamentada na constituição, somente teria o efeito de fortalecer
as determinações educacionais gerais da sociedade de classes. Por final, a
ênfase na consciência moral pode ser vista como uma ideologia que evita
compreender os valores concretos de grupos diferenciados em nome de um
suposto princípio moral universal, que e, na verdade, um princípio baseado
numa concepção idealizada do ser humano.


Conclusão: Para alem da educação formal


Como dito no início desse artigo, e nas palavras de Mészáros, "a
educação formal não é a força ideologicamente primária que consolida o
sistema do capital; tampouco ela é capaz de, por si só, fornecer uma
alternativa emancipadora radical". A primeira constatação pode ser
ilustrada pelo poder da mídia hoje em dia de formar a opinião da maioria da
população. As expectativas normativas elaboradas por Habermas (ver nota 7
acima) estão longe de serem colocadas em prática. Pelo contrario, a mídia
de massa está cada vez mais aberta no seu apoio a ideologia burguesa.
Assim, é uma força ideológica muito mais poderosa que qualquer instituição
formal de ensino e uma das "determinações educacionais gerais da sociedade
como um todo". No Brasil a igreja, especialmente as igrejas evangélicas, é
outra determinação muito poderosa. A familia é outra. Obviamente, o mercado
é outra, com sua insistente propaganda que incentiva um consumo desenfreado
de mercadorias. Além disso, o Estado incentiva esse consumo em nome do
crescimento econômico e não impõe controles sobre a midia, nem sobre as
igrejas evangélicas.[16]


A segunda constatação na citação acima pode ser confirmada pela
interferência do Estado e suas instâncias de regulação, nas instituições de
ensino, desde a educação infantil até a universidade. As tentativas de
regular o ensino, tanto no seu conteúdo como na prática, nunca foram tão
fortes como agora e não somente no Brasil. A maioria dos países hoje em dia
está promovendo reformas educacionais orientadas a melhorar a
competitividade de seus países frente aos competidores no mercado global.
No Brasil, as iniciativas vêm dos governos federal, estadual o municipal.
Diante a imposicao dessas politicas, de cima para baixo, é impossível
pensar numa força contrária suficiente para reverter essa situação, vindo
de dentro dos sitemas escolares.


Por isso, é necessário ir além das instituições formais de ensino para
gerar uma alternativa capaz de enfrentar as determinações educacionais
gerais da sociedade. Educação, no sentido mais amplo, é essencial para uma
transição para outra organização socioeconômica e para uma democracia de
verdade, na qual aqueles que produzem mantém o controle social e,
finalmente, podem organizar a sociedade nos interesses deles.


Referências


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Mészáros, I. Beyond Capital. London: Merlin Press, 1995.


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Taylor, C. Argumentos Filosoficos. Sao Paulo: Edicoes Loyola, 2000.


Wood, E. M. Democracia contra Capitalismo: a renovacao do materialismo
historico. Sao Paulo: Boitempo, 2003.
-----------------------
[1] Wood (2003: 200ss) mostra claramente como a democracia liberal
substituiu a liberdade do senhorio para fazer o quiser pela liberdade dos
senhores do capital. "O liberalismo é uma ideia moderna baseada em formas
pré-modernas e pré-capitalistas de poder. Ao mesmo tempo, se os princípios
básicos do liberalismo são anteriores ao capitalismo, o que torna possível
a identificação de democracia com liberalismo e o próprio capitalismo. A
ideia de "democracia liberal" só se tornou pensável – e quero dizer
literalmente pensável – com o surgimento das relações sociais capitalistas
de propriedade. O capitalismo tornou possível a redefinição de democracia e
sua redução ao liberalismo."
[2] (Quem foi? Galston?) Que foi secretario de educação no governo de
Ronald Regan nos EUA.
[3] Como Ralph Milliband disse ha algum tempo, hoje em dia "liberdade
de imprensa" quer dizer quase exclusivamente liberdade de controle pelo
Governo e nao a liberdade de todos as classes e grupos da sociedade de
serem ouvidos.
[4] Somente precisamos pensar no caso da França.
[5] Embora Wood (2003: 203) note também essas exclusões, ela nos
lembra que "a necessidade de trabalhar para viver e mesmo a falta de
propriedade não constituíam motivo de exclusão do pleno gozo dos direitos
políticos. Sobre esse aspecto, Atenas excedia os critérios de todos mesmo
os mais visionários democratas ao longo dos muitos séculos que se
seguiram".
[6] Vale a pena notar que Habermas não acha necessário elaborar
direitos das minorias, porque os direitos individuais são suficientes para
garantir a autonomia pública. No entanto, poderia ser argumentado que em
sociedades como Brasil, onde direitos individuais estão longe de serem
garantidos, direitos de minorias são essenciais na sua luta por
reconhecimento, para proteger suas formas de vida e, portanto, a capacidade
de participar no espaço público enquanto grupos diferenciados.
[7] Seguindo Gurevitch e Blumer, Habermas (1996: 378) cita as
seguintes expectativas: surveillance do ambiente sócio-político, divulgando
desenvolvimentos capazes de impactar, positiva ou negativamente, no bem
estar dos cidadãos; organizar a agenda numa maneira significativa,
identificando os assuntos chaves do dia, inclusive as forças que os
formaram e poderiam os resolver; plataforma para uma advocacia inteligível
e esclarecedora por políticos e porta vozes de outras causas e grupos de
interesse; diálogo entre um leque diverso de pontos de vista, bem como
entre detentores de poder (atuais e prospectivos) e públicos de massa;
mecanismos para avaliar e cobrar como oficiais exercitam seu poder;
incentivos para os cidadãos aprenderem, escolherem e ficarem envolvidos em
vez de meramente seguir passivamente o processo político; uma resistência,
baseada em princípios, aos esforços de forças além da mídia de subverter
sua independência, integridade e habilidade para servir sua audiência; um
senso de respeito para com o membro de sua audiência, como alguém
potencialmente preocupado e capaz de compreender seu ambiente político.
[8] Se houve tal "dialética" e outra questão. Com relação a análise
habermasiana da modernidade, ver Mészáros, 1989.
[9] Para as análises, ver Habermas, 1996. Para uma crítica
contundente, ver Mészáros, 1989.
[10] Além disso, Habermas argumenta que a mídia pode ter um papel de
aliviar a compreensão mútua mediada pela ação comunicativa, ou seja,
reduzir a necessidade de comunicação e o risco de desacordo. No entanto,
como vimos acima, as expectativas normativas da função da mídia estão longe
de serem realizadas de fato. Pelo contrario, a mídia está mostrando cada
vez mais seu apoio ao capital e suas personificações.
[11] Ver nota acima.
[12] E importante notar que, para Mészáros, as sociedades do tipo
soviético, por mais que não fossem capitalistas, porque tinham expropriado
legalmente as personificações privadas do capitalismo, não conseguiram
superar essas mediações de segunda ordem do capital, portanto perpetuando o
sistema do capital numa outra forma. Ver Para Alem do Capital, passim.
[13] Não é por acaso que as notícias econômicas nos jornais são
dominadas por investimentos, bolsas de valores e o que agradaria ou não os
investidores ou, como é dito, "o mercado"! Ninguem mais fala das
necessidades humanas das pessoas envolvidas no processo produtivo,
diretamente ou indiretamente.
[14] Para uma análise parcial das políticas públicas da educação do
Município do Rio de Janeiro, ver Russo e Bannell, 2011.
[15] No entanto, em algumas economias, ate "bois" ainda sao
necessaries, como os bois frios no Brasil.
[16] Um exemplo clássico é a recente eleição de um pastor evangélico
abertamente homofóbico e racista para presidir a Comissão de Direitos
Humanos do Congresso Nacional.
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