O Estudo da Música

July 25, 2017 | Autor: Aloysio Neves | Categoria: Music Education, Popular Music, Jazz Studies, Música, Guitar Pedagogy
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O Estudo de Música Aloysio Neves (2004 rev.2015)

Temos sempre em nossos sonhos e em nossa vontade uma coisa com a música e com os instrumentos.Ouvimos desde sempre as canções e quando nos damos conta em um determinado momento vemos que queremos sair da postura passiva e participar mais ativamente desse sonho. Queremos tocar os instrumentos que elegemos afetivamente, após um longo tempo em que os estamos ouvindo. A princípio essa audição é externa, mas logo começamos a ouvir internamente esse instrumento e a nos imaginar a toca-lo. Quantas vezes já não paramos na frente de um som fingindo que estávamos tocando?Isso nada mais é que a vontade de estar ali, você mesmo tocando uma música em que você se amarra. Outras vezes quando isso não acontece, elegemos simplesmente um instrumento que queremos. Cismamos que queremos tocá-lo e pronto. E isso pelas mais diversas razões, seja para fazer um som com os amigos, para impressionar as meninas,ou imaginando formar uma banda e fazer sucesso. Outros pensam em ter um companheiro para seus momentos de intimidade, e uns até nem sabem porque, mas querem, e como sabemos, o querer é o verdadeiro motivador de toda a humanidade. Juntando então os que simplesmente querem, com aqueles que tem já a música dentro de si, a ouvem e querem externa-la de alguma forma , temos aí um quadro extremamente diverso onde a motivação é a mesma, todos

querendo primeiro dominar um instrumento, e mais a frente entender a música. A partir daí é que vem a pedreira. Já vimos o que e porque queremos. A seguir vem aquela coisa mágica de ir as lojas e ficar namorando os instrumentos e finalmente, meio que em êxtase, compramos nosso querido objeto de desejo. Após esse período de namoro, vem o casamento propriamente dito. E aí começam os problemas… Primeiro que quase sempre não sai rigorosamente nada do instrumento, nem um sonzinho parecido com aqueles que ouvimos nos discos ou que imaginamos tocar. Saem uns zumbidos ininteligíveis, às vezes uns grunhidos... E ficamos ali meio zonzo ,sem saber o que está acontecendo. As mãos doem, as costas doem, a cabeça, tudo começa a doer! E aqueles sons toscos meio que destruindo tudo aquilo que havíamos sonhado. Nesse momento cruel, muitos guardam os instrumentos nas caixas e passam meses, às vezes anos sem querer tentar de novo e viver essa situação de desespero que é não conseguir tirar nem um som daquilo que até então era o seu objeto de desejo. Ouros entendem que enfim, a vida é assim mesmo e que a teoria é diferente da prática. Animam-se de novo e resolvem, muito sensatamente, arrumar um professor. Bom, aí começa a outra parte do problema. Porque o que queremos é tocar logo, sair arrasando de uma vez. E vem o cara com exercício para os dedos, escalas, dedilhados sem fim. Quando não vem uma música infantil que nos fazem voltar ao jardim de infância. Alguns professores, já sentindo o problema, começam a passar por cima de todos os preparativos e mostrar músicas direto para os alunos. Alguns contentam-se com isso, mas outros mesmo assim não conseguem nada, e também acabam parando. Outros acham que o professor e que é o culpado

e trocam uma duas ou mais vezes até achar que ou está sendo ludibriado, ou que não levam jeito pra coisa. E também desistem. O que até esse momento não passou pela cabeça do aluno, ou se passou não foi de forma concreta, é que ele precisa estudar... Mas como estudar!? Afinal estudar não é aquela coisa chata que os nossos pais dizem que temos que fazer se queremos ser alguém na vida? Isso não tem nada a ver com o ambiente dos shows que assistimos ou dos discos que ouvimos. Nos shows todo mudo parece se divertir sem parar ,mas e então!? Esse é o segredo da música. Com saber fazer, como trazer a música para perto e romper a barreira entre você e ela... Como vivenciar o aprendizado do instrumento, das músicas, criar uma performance , um estilo enfim ,viver realmente o mundo da música. Aquilo que sonhamos ficou lá atrás, quando ouvimos os discos ou compramos nosso primeiro instrumento. E agora?! Para entendermos esse problema que é o estudo de música, temos que vencer algumas barreiras externas, mas também e principalmente nossas barreiras internas e o nosso preconceito. Primeiramente vejo que temos que deixar de ver esse relacionamento diário com o instrumento como um problema em si. Porque afinal de contas o que nós queríamos não era estar na música, poder tocar ,curtir o som que vamos aos poucos fazendo e ver como ele vai se formando e se modificando até atingir uma coisa mais madura? Não?! Bem , na verdade já queríamos mesmo é começar do topo, arrasando e tirando o fôlego de todo mundo. Isso é compreensível pois na vida tudo já é difícil e normalmente só conquistado a duras penas.Então justamente quando vamos para o nosso mundo de

sonho,para a nossa cidade encantada da música, onde vamos criar uma nova maneira de ver o mundo, muito mais prazeirosa e livre, vemos de repente que da mesma forma que na vida comum do dia a dia, tudo só é conquistado lentamente e em passos dados como se tivéssemos bolas de ferro amarradas aos pés. Bem, antes de entrarmos em desespero ou depressão, vale a pena pensar em algumas coisas. Acho que o principal pensamento motivador para o aluno é o de que ele tem que aprender a curtir todos os sons que ele começa a tirar do instrumento. Muitas vezes vejo alunos que no meio das aulas começam a tirar sons estranhos, efeitos malucos que eles ficam buscando, como uma válvula de escape para o do-re-mi meio ainda acanhado que ele tira. Isso é muito legal, pois é um momento de expressão bem natural, um lance que estamos curtindo. De certa forma sempre fazemos isso em todos os níveis e até quando você vai a um concerto de uma orquestra sinfônica isso acontece quando todos os músicos tocam suas partes ao mesmo tempo e afinam seus instrumentos. Outras vezes quando você vai a um ensaio de uma banda e vê todo mundo tocando pedaços, testando efeitos de distorção, o batera testando uma virada, tudo caótico. Esse momento é um momento onde se está deixando de tocar com a razão e simplesmente deixando fluir a energia. Sempre devemos em algum momento em que estamos estudando deixar fluir essa energia e simplesmente tocar. Mas afinal de contas vamos ter mesmo que estudar? A resposta é sim, mas não da forma como imaginamos. Pois o que temos que descobrir de fato o prazer em tocar ali, naquele momento .Não interessa se são duas notas ou uma peça de Villa-Lobos. Se você é um músico de blues, dá para entender isso que estou falando. Às vezes é uma nota só, mas executada

com tanta paixão e tanto “feeling” que já basta. Muita gente inclusive prefere isso a um turbilhão de notas tocadas por um em poucos segundos.Outros já preferem a explosão criativa de alguém que tanto estudou aquela forma de se expressar que o faz de uma maneira superlativa. Tudo o que ele toca, por mais que seja complexo ou intrincado, passa uma simplicidade, um fazer normal. nessa hora é que pensamos no talento natural, no dom e naquela coisa do tipo “esse já nasceu sabendo" . E nós, aquele que ainda não sabemos tocar nem aquele som incrível do blues e muito menos a pirueta de escalas de um jazzmen !?Como ficamos?! Então, ao invés de desanimar, temos que usar a mesma idéia. Curtir o que estamos fazendo, cada nota cada trecho que tocamos, devemos ouvi-lo e buscar dali extrair o nosso prazer. Às vezes estamos estudando uma nota ou duas e lembramos um pedaço de uma música. Às vezes é um acorde que inventamos ou um outro que surge quando distraidamente colocamos as mãos no instrumento e tocamos meio que sem querer. Temos que aprender a curtir o que estamos tocando e não ficar imaginando uma música hipotética que gostaríamos de tocar. Às vezes também ficamos viajando mais na situação de tocar do que na música em si.Nos vemos num grande palco, com uma multidão gritando o nosso nome, ou então em uma turnê milionária, saindo de aviões com gente correndo atrás pedindo autógrafo. Isso tudo pode ser muito legal, mas não é a música em si. Outras vezes imaginamos (ah! Como isso é comum!) que estamos tocando igual a um cara que elegemos como nosso ídolo. E aí quando vamos ver o que nós estamos tocando de verdade, bate aquela frustração. Muitos inclusive perseguem isso até o fim e muitas vezes conseguem tocar igualzinho ao seu ídolo.Normalmente

nesse momento aparece alguém e diz: Acho que você devia parar de imitar fulano e tentar ser mais você. Pronto, já estamos arrasados e frustrados de novo. Mas esse tipo de toque é verdadeiro. Porque a música, a nossa música, vem mesmo é de dentro de nós e então é essa música que irá ser a melhor coisa que faremos.Se tivermos realmente J.S.Bach dentro de nós então será essa música a que melhor será o espelho de nosso ser. Se for o rock, o choro, o jazz, não importa se é composição de outro ou improviso. O que realmente soa dentro de você é o que você irá melhor fazer em termos de música. Uma outra dúvida que atormenta muitas pessoas que começam a estudar é a questão do tempo de estudo. Todos se perguntam, quanto tempo devo estudar por dia? Quanto tempo demora até eu dominar o instrumento? E para virar fera? E profissional?! Esse questionamento é natural, mas a resposta para ele está mais em nós do que no exterior. Nós é que temos que sentir qual é o nosso ritmo e esperar as respostas que podem vir dele. Dessa forma se você tem quinze anos e as tardes e noites livres e quer devorar a guitarra, mãos a obra! Por outro lado se você trabalha o dia inteiro, tem família pedindo atenção e uma série de compromissos, três vezes por semana, tocando uma hora cada, também dá para curtir, relaxar com o instrumento e evoluir também. É claro que sua evolução será provavelmente mais lenta que a do garoto de quinze anos, mas e daí?! O que importa é você estar inserido em algo que você gosta e utilizando o seu tempo de uma forma possível em relação ao seu dia a dia. Impor-nos missões impossíveis não resolve nada, só nos leva à desilusão e ao desânimo. É importante notar que de uma forma geral existem mil situações intermediárias entre esses dois extremos que citei. Então o que vale é o seguinte:

E mais importante um contato várias vezes por semana com o instrumento ou matéria que se esteja estudando do que uma vez só e muitas horas, pois dessa forma iremos adquirindo contato mais contínuo com o instrumento. Também dessa forma temos que constantemente pensar na linguagem da música e não apenas em um momento. Também é fato que o contato muito intenso feito em um determinado momento gera uma expectativa que uma vez não cumprida de imediato, gera uma frustração e conseqüente distanciamento. Aliás a questão da expectativa é um dos fatores que mais atrapalha o estudo da música.Normalmente ficamos pensando naquilo que já gostaríamos de estar tocando e esquecemos de comemorar os pequenos progressos que fazemos na condição real de nosso nível de estudo e aprendizado. Dessa forma, podemos então concluir que o estudo de música deve ser feito continuamente, em pequenas sessões de estudo e que esse estudo deve o mais possível ficar livre das pressões e cobranças por resultados básicos. Muitas pessoas acham que é muito demorado quando um professor diz que leva seis meses para conseguir tocar alguma coisa razoável e dois anos para fechar um ciclo básico de aprendizado no instrumento.Só que elas se esquecem que passam ás vezes anos querendo aprender e em não o fazendo, estão estáticas, sem usufruir do intenso prazer que é poder estar em contato com o fascinante mundo da música. A partir de todas essas considerações, o que realmente vale é a manutenção daquele espirito sonhador que você teve no início, quando ainda estava só imaginando toda aquela coisa de tocar e ser admirado por isso, com a descoberta do fazer a música na realidade. Integrar o estudo ao seu dia-a-dia e relacionar-se com o instrumento não como um eterno vir a ser, mas sim como

um gerador acima de tudo, de um sentimento de alegria e felicidade. Não tenha medo de parecer ingênuo diante disso. Da mesma forma que a perfeição dos virtuoses encanta, a música, que é puro detalhe, pode te oferecer, para acima de seu espírito auto-crítico, puros momentos cristalinos de auto realização. Transcendendo o espaço que o circunda, seja no show de arena ou no seu quarto. Seja tocando uma obra complexa ou curtindo três acordes, a magia está toda lá. Cabe a você relaxar,vivenciar, curtir e harmonizar o seu espaço interior e exterior calmamente estudando até alcança-la..

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