O eu e o outro no masculino, feminino e queer : uma exploração do gaze no cinema contemporâneo japonês

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Discente: Teresa Vieira Docente: Maria Irene Aparício Cinema Contemporâneo 2015/2016

/ O eu e o outro no masculino, feminino e queer











Uma exploração do gaze no cinema contemporâneo japonês







/ Introdução - O olhar, o corpo, o género, o cinema

No mundo do cinema, três olhares entram em jogo: o do realizador sobre as personagens, o das personagens em relação a outras personagens, e o do espectador em relação às personagens. A realização de um filme implica, como tal, a especulação de um trio de olhares que não se limitará somente ao do realizador - ainda que este permita o despoletar (ou condicionamento) dos mesmos. Um determinado enquadramento, um determinado plano, uma determinada escolha de duração, entre outros aspectos - talvez quase todas as decisões tomadas num filme - definem, como tal, aquele que será o outcome - e o income - de uma visão da sociedade. O olhar do cinema permite-nos observar não só uma formação de determinada codificação simbólica social, como também um espelho das codificações simbólicas sociais em vigor. O espectador é afectado e insere-se, "enquanto sujeito, no texto fílmico." (Aumont, Marie, 2013). "O dispositivo técnico atribui ao sujeito espectador (...) um certo "lugar", o que se traduz por um conjunto de disponsições psicológicas a priori (o dispositivo psíquico) do espectador em relação ao filme". (Aumont, Marie, 2013) O espectador poderá identificar-se com a câmara, com o olhar, e pode estabelecer certas identificações secundárias através de "traços constitutivos das personagens e (...) situações" (Aumont, Marie, 2013). Corpos dispõem-se, corpos entram em relação, corpos apresentam-se, corpos são representados e percepcionados no espaço fílmico, e, através deles, é possível " (...) atingir o impensado, ou seja, a vida" (Deleuze, 2015), sendo que as " (...) categorias da vida são, precisamente, as atitudes do corpo, as suas posturas." (Deleuze, 2015). A câmara é montada sobre o corpo quotidiano, com a atitude quotidiana, "(...) que põe o antes e o depois no corpo, o tempo no corpo, (...) o pensamento em relação com o tempo (...). (Deleuze, 2015). Diversos tipos de corpos, com diferentes tipos de gestus associados de forma intrínseca que, para Brecht, "deve ser social" (Deleuze, 2015) -, são teatralizados, num sistema de significação que, muitas vezes, se assemelha a um quadro referencial fechado. O corpo da mulher é um desses diversos corpos. No entanto, recorrendo a uma noção de género, será necessário entender que o binómio homem-mulher não é suficiente para uma caracterização actual do género. Judith Butler problematiza a questão de género associada à causalidade sexo-género, que poderia sugerir que do par sexual masculino-feminino - que é um par questionável - surgiria uma noção de género igualmente de paridade: homem-mulher. No entanto, mesmo que o sexo se representasse enquanto uma dualidade de masculino-feminino, "(...) it does not follow that the construction of "men" will accure exclusively to the bodies of males or that "women" will interpret only female bodies" (Butler, 1990), e "there is no reason to assume that genders ought also to remain as two" (Butler, 1990). A associação de causalidade entre género e sexo - e, como tal, dos pares de género e de sexo - não é precisa. Gender ought not to be conceived merely as the cultural inscription of meaning on a pregiven sex (...); gender must also designate the very apparatus of production whereby the sexes themselves are established. As a result, gender is not to culture as sex is to nature; gender is also the discursive/cultural means by which "sexed nature" or "a natural sex" is produced and established as "prediscursive", prior to culture, a politically neutral surface on which culture acts. (Butler, 1990)

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Estabelece-se uma diferença entre o "eu" e o "outro", através da linguagem, e, "once that separation is effected, creates an artificial set of question about the knowability and recoverability of that Other." (Butler, 1990). A construção da identidade como uma prática social, como uma construção realizada através da significação da linguagem, mas, acima de tudo, como uma repetição de signos utilizados para a construção do "eu". "(...) when the subject is said to be constituted, that means simply that the subject is a consequence of certain rule-governed discourses that govern the intelligible invocation of identity." (Butler, 1990). Tal aplica-se a questões de construção e identificação de género e de sexualidade, que, através da repetição de normas linguísticas sociais convencionadas, se mantêm dentro do paradigma definido como o normal. No entanto, esta mesma regra de repetição pode ser utilizada como uma forma de abrir o discurso a novas possibilidades de identidade, de novas possibilidades de caracterização e identificação do género e da sexualidade. Quebrar o estereótipo daquilo que deve ser uma mulher e um homem - mantendo esta discussão somente neste binómio de género -, por exemplo, poderá recair nesta estratégia de apresentação e representação repetida de determinados gestus ainda não convencionados para a sua identificação. O cinema poderá ser uma das formas de quebra das normas linguísticas e sociais que moldam a construção da identidade. Um dos objectivos do cinema contemporâneo é o de "uncoding, de-coding, deconstructing the given images" (Doane, 1981), procurando responder à questão: "how to fight the unconscious structured like a language (formed critically at the moment of arrival of language) while still caught within the language of the patriarchy" (Mulvey, 1975)? No entanto, aquilo que é possível observar é que o círculo de filmes mainstream tende a cair na repetição de paradigmas pré-estabelecidos relativamente àquilo que implica ser mulher, e para quem são feitos os filmes. Retorne-se, então, ao olhar sobre o corpo. De acordo com Laura Mulvey, em "Visual Pleasure in Narrative Cinema", é necessário observar desde o início que, tal como dito anteriormente, "film reflects, reveals and even plays on the straight, socially established interpretation of sexual difference which controls images, erotic ways of looking and spectacle." (Mulvey, 1975). A teoria psicoanalítica é utilizada de forma a ser possível entender de que forma é que a mulher é, em si, percepcionada: "the image of the castrated woman", que se situa, no interior da sociedade patriarcal, enquanto "signifier for the male other, bound by a symbolic order in which man can live out his phantasies and obsessions through linguistic command by imposing them on the silent image of woman still tied to her place as bearer of meaning, not maker of meaning." (Mulvey, 1975). O cinema oferece, como tal, uma visão relativamente ao corpo e ao gestus de uma mulher, recaindo no paradigma de prazeres que pode providenciar ao espectador - masculino, neste caso. "One is scopophilia. There are circumstances in which looking itself is a source of pleasure, just as, in the reverse formation, there is pleasure in being looked at." (Mulvey, 1975), em que o corpo da mulher é objectificado pelo o espectador. Outra forma de prazer provém do reconhecimento analisado por Lacan enquanto a forma de formação da identidade dos indivíduos, baseado numa identificação com o outro: o efeito de espelho. "The conventions of mainstream film focus attention on the human form. Here, curiosity and the wish to look intermingIe with a fascination with likeness and recognition: the human face, the human body, the relationship between the human form and its surroundings, the visible presence of the person in the world." (Mulvey, 1975). Duas formas divergentes de fonte de prazer para o espectador, sendo que, na primeira, o espectador se distancia do objecto observado - o corpo da mulher - e, na segunda, se identifica - narcisisticamente - com o mesmo. A mulher, no

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cinema mainstream , é representada de duas formas: "as erotic object for the characters within the screen story, and as erotic object for the spectator" (Mulvey, 1975). (...). Um corpo apresentado e representado através da "diferença de posição entre os figurantes homens e mulheres em relação ao papel do olhar." (Aumont, Marie, 2013). Sendo o cinema construído para a satisfação do espectador, e sendo que a mulher pode ser alvo de ansiedade, enquanto um significante de castração e de diferença, o cinema é construído para o - homem - voyeur e fetichista, garantido a satisfação através da "corroboration of the spectator's identity." (Doane, 1981), sendo que não é direccionado para o espectador de sexo feminino que, "in buying her ticket, must deny her sex. There are no images either for her or of her." (Doane, 1981). A sociedade patriarcal prevalece, e, desta forma, coloca-se a seguinte questão: "Can the male gaze be reversed,(...) is there a female gaze?" (Jacobsson, 1999). O male gaze predomina, e o female gaze é ambicionado. No entanto, será que o female gaze assentará simplesmente numa reversão dos papéis daquele que é observado enquanto um objecto sujeito ao desejo de um indíviduo de outro género - ou como é que um "filme pode (poderia, deveria) dirigir-se a "um" sujeito espectador feminino. (Aumont, Marie, 2013)? Mulvey diz-nos que "the male figure cannot bear the burden of sexual objectification. Man is reluctant to gaze at his exhibitionist like." (Jacobsson, 1999). Levando a questão para indivíduos não-binários ou queer -, será possível ter um queer gaze? O caminho passa pela utilização da linguagem utilizada até aos nossos dias para quebrar precisamente a linguagem que se refere ao corpo feminino, e do corpo em geral (Doane, 1981). O cinema japonês é uma das formas através das quais se pode observar, enquanto cidadãos ocidentais, as dinâmicas sociais do país. Numa sociedade de evidentes mudanças sociais, com claras influências ocidentais desde o início da globalização e modernização do país, é necessário entender de que forma é que a sociedade é representada. Neste artigo, explorar-seão diferentes visões cinematográficas que ilustram o tema da representação da mulher, e do indivíduo não-binário - queer - no contexto específico do cinema contemporâneo japonês: Kurosawa; Mizoguchi e Naruse; e Matsumoto. Kurosawa, enquanto um dos pioneiros do cinema japonês no mercado de cinema ocidental, é uma referência no contexto do cinema contemporâneo. No entanto, a sua visão será confrontada com a de outros realizadores que apresentam estratégias alternativas à sua visão. Realizadores contemporâneos de Kurosawa, mas que, no entanto, não tiveram a possibilidade de chegar ao final do século XX, como Kurosawa. Como tal, o ponto de partida será definido com o último filme de Kurosawa, "Madadayo", de 1993, de forma a ser possível entender o passado, e a respectiva evolução social e cinematográfica que esse mesmo filme representa, quando colocado em comparação com filmes dos outros realizadores.

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/ Kurosawa, Mizoguchi e Naruse - male gaze vs female gaze

"The basis of the Kurosawa style, as we have seen again and again (...) is a search for reality and an inability to tolerate illusion." (Richie, 1970). A necessidade de alcançar a realidade, através dos - e com os - seus filmes, induz um estilo realista na forma como Kurosawa realiza, edita, e compõe o filme. As suas personagens encarnam, igualmente, uma necessidade de entender o mundo como ele é, de alcançar uma realização pessoal, através do desenrolar habitual da vida - com o sofrimento inerente, "since suffering is one of the ways through which one recognizes existence." (Richie, 1970). O seu estilo realista define determinadas escolhas, em termos de adereços, e em termos de edição. Era exigido, aos actores, um entendimento daquilo que se procurava transmitir, com uma profunda encarnação da sua personagem e um profundo entendimento dos sentimentos que a dominam, num determinado momento: " (...) in his films it must be truth itself and not merely resemble truth." (Richie, 1970) A procura da realidade, através das narrativas, passa, por outro lado, pela abordagem humanista do realizador. A aparência superficial do mundo que rodeia os indivíduos da sociedade não é suficiente: é necessário um olhar aprofundado e focado no mundo do indivíduo: "the Kurosawa film is about character, the actor and his interpretation, his abilities, become more important than in the ordinary picture." (Richie, 1970). A individualidade tem uma essência única, que o realizador procura revelar, dentro do seu mundo de pequenas estórias que se desenrolam dentro da grande História. As estórias contadas - através de poemas visuais realistas -, contêm um significado intemporal, e incorporam uma representação dos valores humanos que devem ser preservados e enaltecidos. "He is a true humanist. To him, 'what is necessary for salvation is a new, more demanding, higher form of individualism'. (...) he is concerned with matters on the world only." (Oi-wah, 2002). O filme humanista revela ao espectador, como tal, os valores mais elevados através dos quais deve guiar a sua vida, sem, no entanto, ser moralista. A personagem principal do filme torna-se, desta forma, a personagem principal da história, e o ponto ao redor do qual tudo decorre - o centro da acção -, sendo a narrativa construída em volta do mesmo uma narrativa centrada. "Everything in the film surrounds the protagonist and narrative is in a chronological order. The narrative is always beading towards 'something' pre-destined; (...) The reaching of that (...) becomes the driving force of the story" (Oi-wah, 2002). Kurosawa é frequentemente apresentado enquanto "(...) the most 'Western' Japanese director" (Oi-Wah, 2002), ainda que, na realidade, aquilo que o realizador realizava era um "diálogo entre Japón y occidente" (Zerpa, 2011). Do Ocidente, Kurosawa herdara tanto aspectos como o humanismo, como também a incidência sobre o male gaze, característica dos filmes ocidentais mainstream. No entanto, a questão relativa à exaltação de valores associados, de forma standard, a indivíduos do sexo masculino, e o ofuscar das personagens femininas poderá resultar, também, das influências do passado e daquilo que constituía a imagem da família japonesa per se - com os papéis sociais inerentes. Em 30 filmes, somente 2 se focam em

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personagens femininas, sendo que Kurosawa did not aim at preaching political ideas (...))or speaking in a woman's voice (although his hero was a woman); his interests lied solely on the portrayal of a hero in general." (Oi-wah, 2002). Para Kurosawa, as boas qualidades de um sujeito correspondem a qualidades masculinas. O olhar de Kurosawa - humanista, realista e centralizado na personagem principal - é um olhar masculino, o que, dentro da lógica de Stephen Heath implica que "the look being a male one, it is a movie triade from a male perspective for a male spectator." (Oi-wah, 2002) Em "Madadayo", de 1993, é possível observar este male gaze através da fraca construção da personagem Kyôko Kagawa - mulher da personagem principal -, tal como do tipo de representação que é feita da mesma: ao lado do professor, constantemente a realizar tarefas, numa absoluta subordinação/devoção. Na realidade, o seu papel não é de forma alguma passivo: simplesmente, a sua actividade restringe-se ao cuidar do seu marido. No entanto, esta personagem não deixa de ser considerada emocionalmente mais forte do que o seu marido. O professor é, admiravelmente, caracterizado por certos pormenores de carácter que não são considerados masculinos: a emoção e a falta de receio de demonstrar o mesmo, como por exemplo, chorar em público, a sua reacção aos trovões, a sua reacção à perda do gato, etc. A mulher torna-se no grande pilar de apoio ao professor - devido à sua própria força -, mas é, no entanto, renegada a um plano secundário e instrumental. Madadayo, sendo um character movie, torna-se centrado nesta personagem masculina, tal como nas narrativas mainstream. Um ponto central a partir do qual todo o mundo é organizado e é dado significado. O espectador que é construído, desta forma, é masculino. É necessário ressaltar, no entanto, que existem algumas teses sobre o lado feminista de Kurosawa, pelo facto de colocar as personagens femininas com características do Teatro Noh onde estas, inicialmente, não poderiam ser integradas (Asaumi, 1997). Em "Ran", uma das personagens femininas principais - Lady Kaede - é caracterizada com uma espécie de máscara do Teatro Noh. A maquilhagem impõe, desde logo, uma imagem que se manterá tanto nesta personagem, como noutras semelhantes, noutros filmes de Kurosawa: uma personagem sem expressão facial, sem grandes movimentos gestuais - que servem, igualmente, para criar contraste quando é criado movimento - forte - pela personagem. Os contrastes de movimento desta personagem são extremos: de uma quase-estátua, para uma mulher dominada pelo histerismo. Será este um female gaze? "(...) despite the opinions of his detractos, Kurosawa was both interested in and capable of creating well-developed female characters." (Asaumi, 1997). Tal verifica-se nos dois exemplos apresentados. "(...) these characters reflect the times in which they were conceived." (Asaumi, 1997) Um retrato de uma mulher poderosa que recai no estereótipo daquilo que seria a mulher, na época dos samurais, e que, como tal, recai no inevitável male gaze de Kurosawa. Ainda que a posição da mulher na sociedade japonesa tenha sido alterada, ao longo dos anos, a verdade é que o olhar de Kurosawa recaiu, desde o início, sobre os valores do homem, com uma secundarização do papel da mulher. Sendo o contemporâneo aquele que consegue pensar para além do seu tempo, e sendo Kurosawa um contemporâneo que, através de filmes humanistas, se focava em personagens contemporâneas, seria de prever, como tal, que o papel e a imagem da mulher não tivessem de seguir as normas da sociedade - ou, pelo menos, não tinham de se manter, enquanto algo estagnado, mesmo com a evolução social. "Madadayo", realizado em 1993, retrata as alterações sociais em segundo plano, através das cenas nos Maadha-Kai 's do professor. De um público recheado de homens, passa-se para um público misto, onde as mulheres se sentam ao lado dos seus maridos - e não ficam retidas no seu lar. No entanto, a falta de voz da mulher do professor - uma personagem extremamente bem concebida,

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e de uma força interna brutal - ao longo de todo o filme - mesmo com o retrato da evolução social demonstra, em parte, a falta de evolução da representação da mulher nos filmes de Kurosawa. Outros realizadores japoneses, contemporâneos de Kurosawa apresentaram uma cinematografia alternativa em relação ao estatuto da mulher na sociedade, e ao estatuto da mulher no cinema: Naruse e Mizoguchi foram os dois grandes embaixadores do cinema da mulher, no contexto do cinema japonês, entre os anos 30 e os anos 60. Os filmes de Kenji Mizoguchi (1898-1956) e de Mikio Naruse (1905-1969) são descritos enquanto "a special brand of Japanese feminism, distinguished by a kind of obsession or preoccuption with womanhood." (Bernardi, 1988) O foco e a principal preocupação destes realizadores passava por representar a situação da mulher no seio da sociedade patriarcal japonesa, com o objectivo de realçar certas características - como força e persistência - da mulher, induzindo "our admiration with their stoic resignation to their fate" (Bernardi, 1988), que, regra geral, não correspondia ao típico happy ending. Os filmes de Naruse e Mizoguchi inseremse, desta forma, num género de drama que se poderá denominar "o filme da mulher japonesa". During the 1950s, the postwar democratic reform brought the issue of women’s rights and social roles to public debate. Whereas women demanded recognition in the public sphere due to their widened access to the workforce, the discourse of motherhood and the family was quick to surface in opposition to women’s labor movements. (Huang, 2014) Neste género que surgiu, dentro deste contexto social japonês, a mulher não só era colocada na posição de personagem principal do filme, como os próprios filmes eram claramente direccionados para um público feminino, "who demonstrated increasing capacity as cultural consumer." (Huang, 2014) As mulheres representadas nos filmes destes realizadores "suffer at the hand of a cruel and oppressive society" (Bernardi, 1988). São, como tal, símbolos do protesto social realizado pelos realizadores, em termos da desigualdade de género, e tal ocorre através da ligação estabelecida entre as personagens e o público: personagens com uma personalidade forte, com valores, que lutam contra um sistema que não lhes permite, desde logo, a remota possibilidade de vencer, o que permite uma ligação de simpatia, de raiva e de apreço por parte do espectador - em particular, um espectador feminino. Partem de histórias particulares - podendo-se dizer, até, de subclasses específicas - de forma a poder exemplificar e espelhar os diversos problemas sociais da sociedade - que não se limitam às mulheres. "Mizoguchi (...) seldom relinquished his preference for either an entertainer, a geisha, or a prostitute as his central character (...). Naruse also filmed tragedies about the plight of geisha (...) ,and although his Iater heroines are more often employed in respectable though modest occupations, they are frequently widows struggling outside the traditional security of marriage." (Bernardi, 1988) A questão das injustiças sociais está particularmente presente na cinematografia de Mizoguchi, onde as suas heroínas "are all individuals struggling against male and social subjugation" (Bernardi, 1988), sendo que, no entanto, os direitos que estas ambicionam - e pelos quais lutam - são os direitos que todos os seres humanos deveriam/deverão ter. No entanto, os seus filmes recaem num pessimismo relativamente à situação presente da altura, havendo, regra geral, um toque de fatalidade e de tragédia. " (...) only a man with a tragic life could have made

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such tragic films." (Bernardi, 1988). A vida de Mizoguchi poderá ser facilmente relacionada com a forma como aborda - e constrói - as suas personagens: o seu pai vendeu a sua irmã para uma "geisha house in order to support the family." (Bernardi, 1988), tendo estado ligado de forma mais pessoal com a sua mãe, que, tal como a sua irmã, lidou com extrema infelicidade com o pai de Mizoguchi - e o seu mau tratamento para com ela. Desde muito cedo, como tal, Mizoguchi observou de perto a forma injusta pela qual as mulheres eram tratadas, e a forma como os homens, mesmo que com falhas de carácter, conseguiam dominar na sociedade. Uma frustração que explorou nos seus filmes. O seu último filme, de 1956, é "Street of Shame". Um filme de retrato do presente da redlight district de Tokyo, onde seis prostitutas - e não geishas - são as personagens principais de um filme crítico das discussões relativamente ao eventual fim da prostituição legal no Japão. As personagens principais apresentam backgrounds e fins diferentes, entre si: a mulher que é prostituta de forma a conseguir dar dinheiro ao seu filho, a mulher que é prostituta para sustentar a família - após o despedimento do seu marido -, a mulher que é prostituta porque quer - sabendo, no final, que se trata de uma escapatória à sua realidade familiar passada -, a mulher que é prostituta para conseguir enganar homens para conseguir criar o seu próprio negócio, entre outras. Independentemente das suas motivações, a ligação forte entre todas demonstra uma união de amizade e de cooperação fora do normal. Neste filme, podemos ver que todas as personagens femininas são construídas de formas diferentes, mas que, inevitavelmente, todas apresentam um carácter de força e de luta. Sujeitas à vergonha alheia, à discriminação dos olhares alheios, têm ainda que lutar para conseguir manter a prostituição um negócio legal. A prostituição é a ferramenta através da qual elas têm a possibilidade de resolver os seus problemas financeiros. Neste local de beleza improvável, onde a imoralidade poderia reinar, observamos estas mulheres de uma forma bastante próxima, um olhar que nos permite conhecêlas a tal ponto que nos identificamos com a sua situação, e com as injustiças da vida com as quais têm de lidar. As personagens têm idades diferentes, e formas de vestir, e formas de beleza diferentes. O estereótipo do belo, no retrato apoximado, não é a explorada. Os homens representados, no entanto, sucumbem à beleza e ao poder destas mulheres, sendo personagens de fraco carácter, e de extrema emocionalidade, e de extrema necessidade de apego, ao contrário das mulheres. Ainda que uma das personagens tenha tido a possibilidade de sair do mundo da prostituição, e criar o seu próprio negócio, a verdade é que o filme termina num tom pessimista ainda que não tenha demonstrado ser um filme contra ou a favor da prostituição, mas sim contra o tratamento a que estas mulheres se têm de sujeitar: a prostituta mais recente, que é uma adolescente virgem - cuja primeira vez valerá mais, e as personagens incitam-na a explorar isso -, que se prepara para entrar neste mundo onde os homens exploram as mulheres a seu belo favor, ainda que elas o façam por si próprias, pelas suas famílias, pela sua vida, pelo seu futuro. Um filme de denúncia da injustiça inerente ao acto de as mulheres terem de se prostituir por causa de outros, ainda que de vontade própria. Naruse, no entanto, é mais nihilista, quando comparado com Mizoguchi, por retratar mulheres a quem é negada "(...) the spiritual reconciliation to sorrow that is visible in Mizoguchi" (Bernardi, 1988). "From the earliest age I have thought that the world we live in betrays us; this thought remains with me. Among the people in my films there is always something of this if they move even a little, they quickly hit a wall." (Bernardi, 1988)

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Não deixa, no entanto, de construir personagens principais de grande força, mesmo quando se deparam com as maiores adversidades - e com o inevitável destino final de tragédia, de infelicidade ou de impossibilidade. Acima de tudo, são personagens de grandes valores, sendo que todos - homens ou mulheres - deveriam ambicionar ter tais características de carácter. Perante o seu destino de infelicidade, mantêm a sua força e lidam com essas circunstâncias da melhor forma que sabem. Os filmes de Naruse e de Mizoguchi partilham uma intensidade emocional forte, e apresentam características de influência ocidental na forma de abordagem dessa mesma emocionalidade, sendo que, no entanto, reject their “gestural, visual and musical excess” (...) and displace it with formal “passivity and restraint” ". (Huang, 2014). Como tal, para além de uma clara escolha de personagens que influenciam o olhar do espectador, a forma como os realizadores olham para estas personagens é marcado pela sua singularidade de não recorrerem às mesmas estratégias de retrato ou close-up de pose que os restantes realizadores - ocidentais ou orientais. Em "When a Woman Ascends the Stairs", de 1960, Naruse apresenta-nos uma protagonista - Keiko - que é a mama-san de um bar em Tokyo e que, vendo o seu negócio a piorar, devido à concorrência de uma antiga funcionária - que se tornou dona do seu próprio estabelecimento -, procura arranjar soluções para conseguir manter a sua posição, de forma a conseguir sustentar a sua família e de forma a se conseguir sustentar a si própria. Tem claramente duas opções a seguir, na sua vida: ou mantém a sua posição enquanto mama-san, ou casa-se duas opções que se apresentam a todas as mulheres da sociedade japonesa. Lendo esta personagem aos olhos de Mulvey, é possível ver que Naruse cumpre o seu objectivo de se direccionar para um público feminino: "Keiko, with her dignity and grace through hardships, fits in the role of the star identified by Mulvey. The star produces for the audience an ego ideal through the operation of likeness and difference, as seen in the glamorous impersonating the ordinary (...)." (Huang, 2014). Keiko, viúva, procura manter a sua dignidade a todo o custo, abstendo-se de se envolver emocionalmente - ou sexualmente - com qualquer outro homem. Na verdade, quando não consegue fugir mais aos seus verdadeiros instintos de, por momentos, sentir que tudo não depende somente dela, e que ela pode depender de outros, é encarada com a triste realidade da desilusão: o homem com quem se propõe casar é casado, e o homem que ama verdadeiramente é casado e vai mudar de cidade com a sua família. No entanto, perante tais desilusões, podemos observar que Keiko mantém a sua firmeza de carácter, e retorna ao seu papel de mama-san com um sorriso no rosto - ainda que sofrendo de forma extrema no interior - e despede-se do seu amor na estação de comboios, oferencendo um presente aos seus filhos e com uma postura digna perante a sua mulher. Sujeita à exploração dos desejos de homens, sujeita à manipulação de homens, Keiko assume o papel de aquela que sai por cima, pelo seu comportamento digno e por lidar de frente com a adversidade, após um momento de recaída emocional e de ligeira dependência em homens - que são fracos de carácter e que procuram, simplesmente, sentir-se desejados. Tanto "Street of Shame" como "When a Woman Ascends The Stairs" problematizam o male gaze e oferecem uma alternativa, um female gaze que não advém de realizadoras mulheres, mas sim de homens que não concordam com o estatuto social das mulheres, na sua época. "(...) both films refuse to present their women as merely sexual objects. (...) Ascends the Stairs resists and diverts the male gaze, (...). In Naruse’s film, the acts of sex are never explicitly presented." (Huang, 2014) e "(...) Naruse seldom captures his characters in point-of-view shots. Even when a character is talking in the direction of the camera, his/her eyes slightly miss the audience’s gaze. (...) the

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camera (...) refuses to identify with a looking subject, especially in a voyeuristic manner. (Huang, 2014) Desta forma, torna-se evidente que Kurosawa, pela sua escolha de personagens, pela sua construção das personagens e, igualmente, pela sua apresentação das personagens, recaía num male gaze não inevitável, devido às claras fortes apostas de Naruse e Mizoguchi no reino do female gaze, numa época em que o papel da mulher era secundarizado e a sua imagem dependia da sua escolha entre o casamento e o trabalho - como prostituta, por exemplo, mas não só. Kurosawa, ainda que reconhecido pelo seu papel fundamental no panorama do cinema japonês e do cinema contemporâneo no geral, falhou naquele que será um aspecto fulcral do cinema contemporâneo: a representação da mulher no cinema, e o papel da mulher na sociedade. Naruse e Mizoguchi ofereceram, no entanto, uma nova perspectiva no cinema, onde a mulher não só se torna a personagem principal do filme - e da sua vida -, como deixa de ser alvo da mera satisfação do público masculino, sendo representada na sua diversidade - de idade, de beleza, de background -, e com um olhar que procura não erotizar, mas sim fortalecer aquela que, na altura, era uma das classes mais negligenciadas pela sociedade.

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/ Kurosawa e Matsumoto - um breve olhar sobre o queer gaze

Kurosawa realizou diversos filmes que decorrem durante a época dos samurais. Tal como na Grécia Antiga, existiam relações homossexuais entre os elementos mais novos e os mais velhos - mais sábios -, mais experientes, sendo que "queer love was not really queer during this time as it was normative." (Ferguson, 2009) A própria representação de género actual, enquanto uma oposição entre masculino e feminino "may not have been functioning in pre-Meiji Japan" (Ferguson, 2009). Os padrões de beleza não só não recaíam simplesmente na representação de género actual, como "Androgynous men became synonymous with beauty, which was expected to stimulate erotic desire in men whether it was embodied in a woman or a male youth" (Ferguson, 2009). Kurosawa "has an interest in historical accuracy" (Ferguson, 2009), mas, no entanto, os seus filmes são vistos enquanto construções de "heteronormative space for the samurai, one that forgets Japan‘s own cultural history in relation to sexuality." (Ferguson, 2009). No entanto, no caso de "Ran" (1985), inspirado no "King Lear", de Shakespeare, Kurosawa escolheu desenvolver a personagem do "bobo" enquanto o Kyoami - aquele que tinha como função entreter os samurais, de diversas formas -, que, de acordo com Kurosawa, "was something like a page who waited on them and with whom they had sexual relations." (Powers, 2008). A escolha do actor para esta personagem foi a primeira que o realizador fez: "Peter was cast for that role, because he is an entertainer - a transvestite entertainer." (Powers, 2008) Weekly: Did people think that was a daring casting choice? Kurosawa: [Laughs] Yes, at first everyone was surprised. (Powers, 1986) Nessa mesma entrevista, Kurosawa postula uma eventual relação homossexual entre Kyoami e Lord Hidetora, que se teria desenrolado antes do tempo representado no filme. Será possível, como tal, classificar Kurosawa como um realizador que, para além de um male gaze, impossibilita a criação de um queer/gender fluid/não-heteronormativo, que, neste caso, se basearia em aspectos históricos reais? Na verdade, a escolha natural do realizador assentou sobre um performer travesti, com características andrógenas, e, ainda que não se estabeleça um ambiente não-heteronormativo, também não se invalida uma perspectiva não-heteronormativa como, aliás, se torna evidente pelas palavras do realizador. Peter, o travesti escolhido para representar Kyoami no filme de Kurosawa, foi a personagem principal de "Funeral Parade of Roses", de Toshio Matsumoto, de 1969. "Funeral

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Parade of Roses" centra-se na vida de Eddie, uma madame de um clube nocturno, onde estabelece uma relação amorosa com o companheiro de Leda - outra madame do clube -, o seu patrão. No final, descobre-se que o alvo do amor de Eddie é, na realidade, o seu pai, que abandonou a sua família. Eddie, tal como Leda, e outras personagens travesti do filme, são divas, e Matsumoto tinha consciência do papel da diva no espectador: ""(...) diva as a site of conflict, a film image that represents a rupture in the status quo and that questions the boundaries of socially constructed identities. " (Gee, 2014). No entanto, Deleuze alerta, em "Imagem-Tempo - Cinema 2" que "uma exaltação das personagens marginais que fazem da sua vida quotidiana uma insípida cerimónia; (...)."(Deleuze, 2015) "não é isento de perigos (...)" (Deleuze, 2015). Matsumoto insere-se no contexto do cinema underground, que "Ao fazer dos marginais as personagens do seu cinema (...) dava-se nos meios de uma quotidianidade que constantemente decorria nos preparativos de uma cerimónia estereotipada, droga, prostituição, travestismos. As atitudes e posturas passam para essa lenta teatralização quotidiana do corpo (...)." (Deleuze, 2015). Um cinema alternativo, onde novas possibilidades de olhar surgem: "a space for a cinema to be born which is radical in both a political and an aesthetic sense and challenges the basic assumptions of the mainstream film.(...) its formal preoccupations reflect the psychical obsessions of the society which produced it, and, (...) the alternative cinema must start specifically by reacting against these obsessions and assumptions." (Mulvey, 1975) O filme de Matsumoto, que não segue uma estrutura narrativa linear, e que recorre a ligações não-lógicas entre elementos do filme, is a fusion of experimental avant-garde selfreflexivity and psychological drama that deliberately aims to produce a defamiliarizing portrait of 1960s youth culture in Japan." (Gee, 2014). Através da escolha das personagens, é possível trazer a este medium as histórias do underground, tal como vividas pelo underground. Num misto entre ficção e documental, é difícil entender, por vezes, onde começa a ficção e onde termina o documental, o que faz com que o poder de autenticidade das personagens se eleve a um nível máximo - por não conseguirmos discernir onde começa a realidade e onde acaba a ficção. A cena inicial do filme é um mote relativo ao tipo de abordagem de Matsumoto em relação ao corpo: uma exploração do corpo que não se liga à identificação binária, uma exploração do corpo confusa, desfocada, desenfreada, que impede o espectador de entender, inicialmente, que estamos perante uma relação sexual entre dois homens - de acordo com o binómio homemmulher que Matsumoto claramente procura quebrar. Um retrato da comunidade queer japonesa que poderá - e deverá - definir qualquer comunidade, independentemente de questões de identificação de género e de sexualidade. Eddie é uma personagem extremamente feminina, que se define enquanto homem, mas que se veste e se maquilha enquanto mulher. Numa cena de entrevista, observamos uma das queens a dizer que não seria capaz de ser transgénero, mas que aquilo que queria mesmo era somente vestir-se como uma mulher - quebrando a ideia de que um travesti é, automaticamente, alguém que quer ser transgénero. A história desenrola-se - ainda que através de uma abordagem claramente avant-garde -, e observamos uma exploração visual de Eddie enquanto a típica personagem feminina do cinema mainstream - com o tipo de close-ups, com o tipo de enquadramento e com as suas poses. No entanto, tal abordagem entra em contraste com o facto de o espectador saber que, no fundo, a personagem é um homem. O male gaze é utilizado de forma a ser descontruído, e se tornar um queer gaze. Uma observação de indivíduos que não só não se definem dentro do paradigma heteronormativo da sociedade, como não se definem dentro do paradigma homem-mulher.

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Tendo em mente que este filme foi realizado em 1969, numa época em que questões de identidade, nacionalidade, entre outras estavam em grande foco, e tendo em mente que é um filme avant-garde, não deixa de ser necessário estabelecer um paralelo com a abordagem de Kurosawa, em "Ran". Matsumoto apresenta-nos um filme de uma comunidade underground de drags, de artistas, e explora essas personagens como indivíduos independentemente do género. A escolha dos mesmos não foi, no entanto, por acaso: o objectivo de provocação do espectador, de quebra do male gaze mainstream é evidente. Em "Ran", tal não ocorre. Numa representação de uma comunidade igualmente não-heteronormativa e não-binária, Kurosawa evita lançar pistas relativamente a esse facto. A inclusão de um travesti nesse filme não é o suficiente para entender Kurosawa enquanto um realizador de queer gaze. Aliás, a descrição de Kurosawa enquanto um realizador com um male gaze impede, desde logo, esse facto.

/ Conclusão Kurosawa é um dos cineastas contemporâneos de maior relevância, no contexto do cinema japonês. No entanto, a sua falta de interesse por uma representação justa do papel e da imagem da mulher induziu uma exploração teórica de alternativas. Procurou-se o female gaze em Naruse e Mizoguchi, e o queer gaze em Matsumoto. Esta exploração, no entanto, não descreve todos os pormenores cinematográficos dos filmes escolhidos com a maior exaustividade que estes, na realidade, merecem - de forma a se tornar evidente as diversas estratégias particulares de cada um dos realizadores escolhidos. No entanto, tornou-se evidente que a mulher pode não só ser a personagem principal, tal como um indivíduo não-binário pode ser a personagem principal, como podem ser alvo de olhares de identificação de indivíduos com as mesmas características e de características diferentes. A mulher que não tem de seguir o padrão normativo daquilo que o cinema mainstream definiu, e o indivíduo que é observado independentemente do género e da sexualidade. O confronto do público com diferentes visões, com diferentes realidades, com a utilização dos códigos de significação vigentes: uma inversão natural da (não-)naturalidade do mainstream.

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/ Bibliografia

Asaumi, A. "Reclaiming Kurosawa Akira's Shakespearean women". Master Thesis, San Jose State University, 1997. Aumont, Jacques, and Michel Marie. A Análise do Filme. Lisboa: Edições texto & grafia (2013). Bernardi, Joanne. "The Suffering Heroine-Women in the Films of Mizoguchi- Kenji.Naruse Mikio.and Ozu Yasujiro." BULLETIN 20 (1988). Butler, Judith. Gender Trouble - Feminism and the subversion of identity. Edited by. Linda J. Nicholson. New York: Routledge, 1990 Deleuze, Gilles. A Imagem-Tempo - Cinema 2. Lisboa: DOCUMENTA (2015). Doane, Mary Ann. "Woman's Stake: Filming the Female Body." The New Talkies 17 (1981): 22-36. Ferguson, Joshua M. "Queer Japanese Cinema: A Rich and Diverse Cultural History’s Challenge to Hegemonic Ideologies of Gender and Sexuality". Master Thesis, University of British Columbia, 2010. Gee, Felicity. "The angura diva: Toshio Matsumoto's dialectics of perception. Photodynamism and affect in Funeral Parade of Roses." Journal of Japanese and Korean Cinema 6 (2014). Huang, Kun. "Woman in Japanese Cinema: A Comparative Study on the Woman's Film of Naruse and Imamura." MERCURY 1 (2014). Jacobsson, Eva-Maria. "A Female Gaze?" CID 51 (1999). Mulvey, Laura. "Visual Pleasure and Narrative Cinema." Screen 16 (1975): 6-18 Oi-wah, Lam. "A male 'look' versus a female 'look': a comparison of Kurosawa's and Ozu's films". Master Thesis, University of Hong Kong, 2002. Powers, John. "Interview." in Akira Kurosawa: interviews, edited by Bert Cadullo, 130-140. Mississippi: University Press of Mississipi, 2008. Richie, D. "Method, Technique and Style" In The Films of Kurosawa, edited by Donald Richie, 184.198. Berkeley: University of California Pressa, 1970. Zerpa, Claritza "Artes Tradicionales en las Películas de Akira Kurosawa: Diálogo entre Resistencia y Tradición." Razón y Palabra 74 (2011).

/ ANEXO 1

Stills "The Street of Shame"

/ ANEXO 2 Stills de "When a Woman Ascends the Stairs"

/ANEXO 3 Stills de "Funeral Parade of Roses"

/ Anexo 4 Kyoami, em "Ran", de Kurosawa

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