O EXEMPLO DA GRÉCIA REBELADA CONTRA O CAPITAL FINANCEIRO

September 3, 2017 | Autor: Fernando Alcoforado | Categoria: Sociology, Economics, Political Science
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O EXEMPLO DA GRÉCIA REBELADA CONTRA O CAPITAL FINANCEIRO Fernando Alcoforado* Alexis Tspiras, líder do partido de esquerda radical Syriza, tornou-se o primeiroministro da Grécia com a vitória de seu partido nas últimas eleições. Ele será o primeiro líder europeu eleito com a promessa explícita de contestar as políticas de austeridade que prevalecem desde 2010 na União Europeia. O programa eleitoral do Syriza está centrado na recuperação econômica do país e no fim do programa de austeridade econômica imposto ao país pela troica- FMI (Fundo Monetário Internacional), Banco Central Europeu e Comissão Europeia- que provocou uma gigantesca devastação econômica e social na Grécia. Segundo Paul Krugman, esta política “impôs cortes selvagens nos serviços públicos, nos salários de funcionários e nos benefícios sociais. Graças a novas e repetidas ondas de austeridade, os gastos públicos foram reduzidos mais do que previa o programa original, e atualmente estão cerca de 20% abaixo do nível de 2010” (Ver o artigo O fim do pesadelo da Grécia? Disponível no website ). Com a política de austeridade, a Grécia ficou devastada não só economicamente, mas socialmente com a existência de pessoas sem abrigo e sem segurança social, elevado nível de desempregados (a Grécia ainda tem a taxa de desemprego mais alta da Europa, em torno de 25% e entre os jovens é de 60%), casas sem aquecimento, etc. Toda esta situação contribuiu para que, da luta do povo grego contra a espoliação financeira exercida pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), Banco Central Europeu e Comissão Europeia, surgisse um novo partido, Syriza, focado na defesa do Estado de Bem Estar Social e do bem-estar dos trabalhadores. No dia seguinte à vitória do Syriza na Grécia, seu líder, Alexis Tsipras ao assumir o cargo de primeiro-ministro afirmou que deverá enviar a Bruxelas nos próximos dias uma equipe econômica para discutir a renegociação da dívida do país na Europa, gesto que deve colocar a Grécia em rota de colisão com as grandes potências do bloco. Tsipras defende o perdão de 50% do total da dívida e moratória temporária do restante. Segundo cálculos do governo, a Grécia precisa realizar um pagamento de sua dívida de pelo menos € 20 bilhões este ano. Na eleição, o Syriza, em uma votação considerada histórica na Grécia, conquistou 149 das 300 cadeiras, duas a menos do que o mínimo necessário para governar sozinho. Diante deste fato, Alexis Tsipras selou uma aliança com o partido Gregos Independentes de direita nacionalista para obter maioria e formar um governo de coalizão no Parlamento. O acordo com os Gregos Independentes deu mais 13 votos formando um governo de coalizão cuja principal plataforma será rever as medidas de austeridade fiscal e renegociar a dívida pública do país, hoje em torno de € 320 bilhões (175% do PIB). Embora atuem em campos ideológicos opostos, Syriza e Gregos Independentes são contra o ajuste fiscal adotado desde a crise econômica de 2010 em troca do socorro de €245 bilhões do FMI (Fundo Monetário Internacional) e BCE (Banco Central Europeu). Mesmo com a maioria garantida, o partido discute novas alianças para aumentar sua força no Parlamento e evitar turbulência política no caso de romper com os Gregos Independentes. Os novos detentores do poder político da Grécia podem seguir dois caminhos: 1) renegociar com seus credores internacionais o pagamento de sua dívida em condições favoráveis que possibilite aliviar as tensões sociais e promover a retomada do 1

crescimento econômico do país; e, 2) dar o calote da dívida assumindo todas as consequências como, por exemplo, a saída da Grécia da eurozona, a volta do dracma (antiga moeda grega), o governo ter de viver do que arrecada e apenas no limite daquilo do que conseguiria exportar, além de amargar uma inflação elevada se não hiperinflação. Se os credores da dívida grega não aceitarem as imposições do novo governo da Grécia, será inevitável o calote com graves consequências não apenas para a Grécia, mas também para a União Europeia abrindo caminho para sua fragmentação. Esta fragmentação, tem a ver com os desequilíbrios estruturais internos da zona do euro com poucos países com excedentes e a grande maioria com déficites crônicos. Para evitar a fragmentação da União Europeia, teria que haver uma profunda mudança em sua política econômica haja vista sua ineficácia na promoção do crescimento econômico de todos os países da eurozona. A crise profunda que atinge a União Europeia poderá fazer com que os fluxos transnacionais de bens, serviços e capitais sejam interrompidos. A consequência disso tudo seria o inevitável aumento do desemprego e das tensões sociais, sobretudo nos seus países mais vulneráveis economicamente. Os membros mais vulneráveis da zona do euro (Grécia, Itália e Espanha) já veem sofrendo há algum tempo. A crise que abala a União Europeia poderá levar ao fim da União Europeia como preconiza muitos partidos de direita nacionalista ou ao ao surgimento de uma Nova União Europeia que é defendida, por exemplo, pelo partido Podemos na Espanha porque a atual zona do euro poderá dentro em breve não ser mais sustentável. A vitória do partido Syriza na Grécia representa uma primeira tentativa política de rejeição das políticas neoliberais vitoriosas na grande maioria dos países do mundo. Um fato que é preciso considerar é o de que não haverá o fim para a crise que afeta a União Europeia e o mundo em geral enquanto os bancos e os investidores financeiros estiverem no comando, com os governos sendo obrigados a adotar políticas totalmente dirigidas pelos interesses dos rentistas e para dar sobrevida ao sistema capitalista guiado pela dívida como vem acontecendo atualmente, inclusive no Brasil. Para retomar o crescimento econômico, é preciso que haja o restabelecimento do poder de compra das classes baixas e médias, a recriação e expansão da capacidade dos governos de fazerem os investimentos econômicos, sociais e ambientais necessários e o estabelecimento de um sistema monetário internacional estável, não subordinado ao capital financeiro. Os primeiros passos para fazerem frente à ditadura do capital financeiro consistem no cancelamento de boa parte da dívida soberana dos países, considerada ilegítima, assim como de boa parte da dívida doméstica, no estabelecimento de uma taxação correta para a renda das finanças e do capital, na adoção de um verdadeiro controle público do sistema de crédito e de um sistema de controle restrito dos fluxos de capital, além de uma luta efetiva contra os paraísos fiscais. Isto significa dizer que os governos deveriam deixar de se subordinar aos ditames do capital financeiro e suspender o pagamento de suas dívidas mesmo que levem alguns bancos à bancarrota cujos recursos que lhes seriam destinados sejam aplicados em investimentos públicos para a retomada do crescimento econômico. Os exemplos da Grécia com o Syriza que alcançou o poder e da Espanha com o Podemos que poderá vencer as próximas eleições sinalizam que algo similar deveria ser realizado no Brasil diante da falência dos partidos políticos ditos progressistas no Brasil que, no poder, se tornaram partidos da ordem dominante sucumbindo ao neoliberalismo, 2

demonstram serem incapazes de promover o desenvolvimento econômico e social do país em benefício da grande maioria de sua população e muitos deles são coniventes com a corrupção sistêmica que toma conta das instâncias de poder nacional. É preciso não esquecer que a nova política econômica proposta pelo governo Dilma Rousseff no seu segundo mandato é de austeridade seguindo o receituário neoliberal que levou a Grécia ao desastre econômico e social. Para evitar o desastre que ameaça o futuro do Brasil, urge a mobilização da nação contra a política econômica que prevê um arrocho tributário sem precedentes no País e a redução dos parcos benefícios sociais existentes, ao tempo em que deve fazer como os gregos e espanhóis criando um novo partido político para derrotar os vendilhões da pátria. * Fernando Alcoforado, 75, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.

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