O fim do Acordo de Parceria Transpacífico

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O fim do Acordo de Parceria Transpacífico?
Como se previa o Presidente Donald Trump assinou uma ordem executiva para retirar os Estados Unidos do Acordo Transpacífico que constitua uma das traves mestras da política económica multilateral do anterior inquilino da Casa Branca, Barack Obama. Uma ordem executiva é uma directiva emitida pelo Presente para o ramo executivo do governo.
Tratou-se da concretização de uma das principais promessas de campanha do candidato republicano e filia-se no que tenho qualificado como o primeiro vector da orientação estratégica da Administração Trump: nacionalismo económico e isolacionismo estratégico. Na visão de Trump, a política de promoção do comércio livre, de eliminação de restrições aduaneiras, e de reforço multilateral de laços de cooperação económica desenvolvida pelas últimas quatro administrações norte-americanas conduziu à perda da competitividade externa dos produtos americanos.
Com ela assistiu-se, na visão de Trump, à deslocalização maciça de empresas de 'bandeira' dos Estados Unidos e à 'invasão' de produtos concorrentes vindos de países em vias de desenvolvimento, com custos de produção muito baixos, preços competitivos e omissos padrões de controlo de qualidade. O que conduziu ao encerramento de milhares de unidades industriais e ao despedimento de milhões de trabalhadores. O argumento largamente emocional 'colou' ao imaginário do eleitorado operário, da classe média e dos sectores mais desfavorecidos das pequenas cidades rurais e suburbanas sendo um dos factores que explica a expressiva vitória do candidato anti-sistema.
O Acordo fora assinado em Outubro de 2015 por doze países – Estados Unidos, Japão, Malásia, Vietname, Singapura, Austrália, Nova Zelândia, México, Chile e Peru – e constituía o maior acordo comercial da história abrangendo 800 milhões e representando 40% do PIB mundial. Só para se ter um termo comparativo, a União Europeia agrega 508 milhões de habitantes e representa 28.8% do PIB mundial. O que revelava o enorme potencial de alavancagem do APT para o conjunto da região do Pacífico e enquanto mecanismo de entrosamento das economias da América do Norte e do Sul, da Ásia Oriental e Meridional e da Oceânia.
Refira-se que o Acordo tem como objectivo, em termos muito idênticos ao que fora o Acordo EFTA, a redução progressiva de barreiras tarifárias e a adopção de regras uniformes em matéria de padrões de qualidade, propriedade intelectual e transparência de processos industriais. O Acordo teria de ser aprovado pelo Congresso até ao fim do mandato da Administração Obama para poder entrar em vigor. O Acordo colheu enorme contestação republicana na Câmara dos Representantes e mesmo entre democratas que o consideraram desfavorável aos interesses dos Estados Unidos. Um dos aspectos mais criticados era a possibilidade de empresas não nacionais poderem recorrer a instâncias de arbitragem supranacionais de decisões do governo nacional, rodeando o princípio da competência territorial dos tribunais americanos.
No texto da ordem executiva, o Presidente refere que a retirada das negociações e da subscrição permitirá à Administração negociar com os países individualmente numa base bilateral em futuros acordos de comércio, já que "o comércio com outras nações é e será de importância fundamental para a minha administração e para mim como Presidente dos Estados Unidos".
Com a assinatura da ordem executiva, a eventual aprovação de cortes nos impostos sobre as empresas (entre 15 a 20%) e a eliminação significativa de regulamentação que impende sobre a actividade das empresas, o presidente espera dar uma impulsão significativa à economia estado-unidense. A economia americana representava, em 2014, 16.14% do PIB mundial em termos de paridade do poder de compra [PPP], situando-se ligeiramente abaixo da China que representava 16.32% do PIB mundial. Embora os Estados Unidos continuem a maior economia mundial em termos do PIB nominal, a economia americana atingiu valores de crescimento negativos em 2007, tendo vindo a recuperar desde 2011 parecendo estabilizar a uma taxa de crescimento de 1.58%, em Dezembro de 2016.
A questão que se coloca é que efeitos terá a retirada americana do Acordo de Parceria Transpacifico? A leitura mais imediata, veiculada por órgãos de informação 'maistream' como o South China Morning Post e o The Economist, é que ela beneficiará a economia chinesa. A conclusão é sedutora mas carece de uma ponderação mais fina. Na verdade, do ponto de vista geoestratégico o Acordo APT era uma ameaça à hegemonia regional da RPC. A China é a maior economia regional, o maior país asiático, com maior população e maior 'output' industrial, o maior exportador para o conjunto da Região Ásia-Pacífico. Sendo a economia mundial um sistema de vasos comunicantes, a falta de um dos elementos conduz ao seu preenchimento por um dos outros, uma vez que o sistema tem horror ao vácuo.
Mas o estatuto das economias é também um factor político com relevância geoestratégica. A aceitação, tout court, da preponderância da economia chinesa importava o reconhecimento da sua zona de influência regional e o cercear dos interesses dos outros países. É bom lembrar que a China tem sempre preferido acordos de comércio bilaterais a acordos multilaterais. Não está por exemplo na ASEAN por vontade própria, não porque não lhe tenha sido endereçado convite para a integrar. Tem sido notório desde a eleição de Xi Jinping como secretário-geral do PCC, que a China prossegue uma estratégia própria, a iniciativa 'Uma Faixa, Uma Rota', sobre que guarda um controlo impressivo.
A oportunidade será agora para os outros países signatários do APT repensarem a continuidade do Acordo e a sua valia quanto às respectivas economias nacionais. Japão e Austrália parecem posicionar-se como potenciais líderes deste espaço de cooperação económica. São economias liberais, fortemente desregulamentadas, com uma componente de inovação e tecnológica muito significativa. Em tempos de proteccionismo como os que se avizinham podem ser uma factor sério de diferença.


Presidential Memorandum Regarding Withdrawal of the United States from the Trans-Pacific Partnership Negotiations and Agreement, 23 de Janeiro de 2017, in https://www.whitehouse.gov/the-press-office/2017/01/23/presidential-memorandum-regarding-withdrawal-united-states-trans-pacific



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