O fim do padroado e da Igreja Católica como religião oficial do estado

May 30, 2017 | Autor: Gilvandro Silva | Categoria: História do Brasil, História Do Maranhão, história colonial da Amazônia
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O fim do padroado e da Igreja Católica como religião oficial do estado.

Sem dúvida nenhuma a Igreja foi um dos braços europeus na colonização da América, África e Ásia e a parceria Igreja-Estado vem desde a Idade Média, onde se tutelavam mutuamente e sofriam ingerências recíprocas. Porém o Renascimento, o Humanismo, a Reforma Protestante instauram um novo período, uma nova ordem, social, econômica, política e religiosa no Ocidente. Os estados modernos são instalados e junto surgem os questionamentos entre Religião e Estado. Os autores modernos pregaram a separação entre razão e fé, sobretudo os autores iluministas tratando também da separação Igreja e o Estado. O fim do padroado e da Igreja Católica como religião oficial do estado acontece com a modernidade. Devemos separar a religião do estado, da politica. O Estado é e deve continuar sendo laico.
É preciso considerar que vários séculos de Estado e Religião entrelaçados durante a Idade Média, não podem ser simplesmente rompidos porque chegou a Idade Moderna. O processo foi lento e gradual, a influência da Igreja permaneceu por mais tempo em alguns estados, como os Ibéricos. Cabia à Igreja sagrar o rei, este por sua vez protegia a Igreja, mediante o regime do padroado.
Na colonização do Brasil a Igreja Católica foi importante parceira do Estado Português não só com a ordem jesuíta, como também com as demais ordens que aqui chegaram. Com o passar do primeiro século, os primeiros 100 anos de colonização, a Igreja estava enraizada em toda a Colônia, além de missões, se estabelece como importante instituição social, educadora e politica. A Igreja em alguns momentos teve a pretensão de estar acima do Estado.
Lembremo-nos de alguns casos da província do Maranhão onde o conflito de jurisdição denota as ingerências recíprocas, ainda que se existisse diferenças de competências de ambas as instituições. O padroado dava ao rei autonomia nas questões de ordem espiritual e essa autonomia foi aplicada no Maranhão a favor do Estado, como também por padres em seu próprio favor. As autoridades régias buscavam afirmar o poder politico do Estado, colocando a Igreja apenas na função espiritual, porém os líderes religiosos demoraram a perceber que o poder politico da Igreja estava sendo gradualmente diminuído, com o fortalecimento dos estados nacionais e das monarquias e a superioridade temporal do rei. Na prática o poder dos reis fugiu das mãos da Igreja e a modernidade acabaria com o privilégio do padroado e com a pretensão politica estatal da Igreja. Os casos no Maranhão de disputa de competência, de jurisdição, dos tribunais episcopais e o tribunal secular que mediam forças, onde leigos sempre recorriam às autoridades seculares contra as autoridades eclesiásticas, onde clérigos como no caso do padre Dionísio, fugiam da autoridade do bispado maranhense recorrendo ao juízo secular e ao tribunal régio ou ao rei. Assim a disputa de poder entre Estado e Igreja no Maranhão reflete também a disputa de egos e de influências entre pessoas, como também o problema do entrelaço entre Igreja e Estado. Dessa forma na prática o padroado atrapalhou mais do que ajudou a Igreja no Maranhão e no Brasil e a modernidade resolveu isso.
A separação entre Igreja e Estado é sem dúvida uma das condições fundamentais para que exista tolerância religiosa em uma comunidade politica e para isso o Estado precisa ser laico. A unidade Igreja-Estado implica em intolerância ao exercício da liberdade de religião dos indivíduos. A separação Igreja-Estado foi objeto de discussão no século XVII. John Locke (1632-1704) produziu obras que foram essenciais para que a comunidade politica e eclesiástica não se confundem, definindo seus exatos limites, sendo a mais conhecida à carta sobre tolerância (1689). No inicio da "Epistola de Tolerantia", em latim, Locke expõe uma noção que sintetiza os seus argumentos mais importantes em defesa da tolerância religiosa. A distinção entre Estado e Igreja. Nela o filósofo escreve; (1954, p. 275).
Para estabelecer a paz dos locais onde há diferentes opiniões religiosas, duas coisas devem ser perfeitamente distinguidas: religião e governo, e suas espécies de oficiais, magistrados e ministros, e suas províncias [...]; o magistrado deve apenas visar a paz e segurança do Estado, os ministros devem estar apenas preocupados com a salvação da alma, e se estes últimos fossem proibidos de se intrometer com a composição e execução das leis em sua prédica, provavelmente nós estaríamos muito mais tranquilos.
Um Estado laico, sem religião é fator fundamental para garantir a liberdade de culto. O culto religioso não é questão de ordem pública, mas um assunto de competência individual. A competência de cuidar da alma humana é de cada individuo, as pessoas participam de uma comunidade religiosa a fim de se salvarem ou se confortarem, portanto a igreja é uma comunidade livre e voluntária, onde só faz sentido permanecer se existe uma identificação o que crê seu membro e a fé por ela professada.
Além dos pensadores modernos a separação Estado e Religião, um estado sem uma religião e não um estado ateu e sim um estado laico vemos especialmente na assertiva; "Dai a César o que é de Cesar e a Deus o que é de Deus". Jesus nessa afirmativa faz a emancipação da Religião em face do Estado.
Assim a modernidade traz uma noção a favor do conhecimento científico e tecnológico, emerge o subjetivismo, o individualismo, a distinção de fé e razão, ou a aceitação de Deus mediante a revelação ou especulação filosófica. É no Iluminismo que a separação Estado-Igreja tem seu apogeu, no Iluminismo a ideia era de libertação do homem do estado de minoridade, que ele deve imputar a si mesmo senão fizer uso de seu próprio intelecto e sem ser guiado por outro. A Revolução Francesa absorve essas influências e estabelece um estado moderno e laico.
Dessa forma o Estado e a Igreja cumprem seu papel politico e religioso respectivamente, a modernidade segue seu progresso, novas religiões surgem, a sociedade moderna se ajusta. Em alguns momentos resolve seus problemas em conflitos e guerras, a religião também segue seu progresso, tendo sua função também social e surgi novos movimentos, ações da condição humana exigem adaptação e flexibilidade. Estado e Igreja sofrem essas influências e vão sendo forjados pelo presente, se houver conflitos, e eles sempre retornam, é quando a interpretação dessa separação e distinção, na atuação prática de ambas as instâncias, dado que há sempre pontos de contato. Mas não mais de ingerências e competências.
Portanto a Igreja e a Religião são inerentes da condição humana através da fé, da razão crítica. Temos assegurado o direito de liberdade de culto e religião que somente um estado laico pode nos permitir, garantindo a tolerância religiosa. Como também o fim de disputas de poder e a efetiva divisão de atribuições, deixando exemplos de ingerências e interesses conflitantes Estado-Igreja, como no Maranhão no passado. A modernidade, a democracia e a república deram muito mais autonomia a Igreja, principalmente no Brasil, sem que o Estado tenha que ter padroado ou religião oficial, dessa forma o Estado laico é bom para os indivíduos, para a comunidade e para a Igreja. Disse Jesus quando alguns queriam nomeá-lo rei, "O meu reino não é desse mundo.".






ReferÊNCIAS
LOCKE, J. A letter concerning toleration. In: The works of John Locke. Germany: Scientae Verlag Aalen, 1963. P. 1-58.

MARSHALL, John. John Locke: resistance, religion and responability. Great Britain:
Cambridge University Press, 1996. 486 p.

MICHAUD, Yves. Locke. Tradução de Lucy Magalhães. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 1991. 172 p. Original francês.




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