\"O “fim” dos Direitos Humanos\" (tradução - Costas Douzinas - Núcleo de Direitos Humanos/UNISINOS)

July 15, 2017 | Autor: D. Carneiro Leão ... | Categoria: Critical Legal Theory, International Human Rights Law, Costas Douzinas
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The 'end' of human rights In the hands of western governments human rights have lost their true aim and become the latest version of the civilising mission Costas Douzinas theguardian.com, Wednesday 10 December 2008 09.30 GMT Tradução do texto de autoria do Professor Costas Douzinas publicado na página do “The Guardian” no dia 10 de dezembro de 2008. Link de acesso: http://www.theguardian.com/commentisfree/2008/dec/10/humanrights-unitednations O “fim” dos direitos humanos Autor: Costas Douzinas Tradução: Daniel Carneiro Leão Romaguera Revisão: Profª. Fernanda Bragato

Nas mãos dos governos ocidentais os direitos humanos perderam seu verdadeiro objetivo e tornaram-se a versão mais recente da missão civilizatória.

Ao longo dos últimos 30 anos viu-se o triunfo dos direitos humanos. Tais direito unem a esquerda e a direita, norte e sul, igreja e estado. A ordem mundial cosmopolita promete a realização dos princípios do Iluminismo e um fim a sua contenda.

No entanto, os direitos humanos têm apenas paradoxos a oferecer. Apesar das declarações sobre o direito universal à vida, todo dia chegam notícias atrozes de Darfur, do Congo, da Palestina e de Mumbai. Apesar das declarações piedosas sobre a igualdade e a dignidade, em nenhum outro período houve uma maior distância econômica entre o norte e o sul, ou entre os ricos e os pobres. Segundo um relatório da Oxfam, em outubro mais de um bilhão de pessoas não têm comida suficiente para sobreviver.

Os direitos humanos são uma expressão da vontade humana em resistir à dominação pública e privada e sua opressão. Sua força une dissidentes chineses, defensores de refugiados, imigrantes e presos da guerra contra o terror, bem como crianças em idade escolar na Grécia. No entanto, nas mãos de governos ocidentais se tornaram a versão mais recente da missão civilizadora. No oeste, a ascensão do capitalismo neoliberal coincidiu com a virada cosmopolita e humanitária.

A disseminação dos direitos humanos não é resultado da disposição liberal ou de caridade do Ocidente exportada para o sul, conjuntamente com roupas de segunda mão oferecidas a Oxfam.

A moral global e regras cívicas são companheiros necessários ao capitalismo neoliberal. Ao longo dos últimos 30 anos, as regras legais regularam o investimento, o comércio, o auxílio e a propriedade intelectual. O Banco Mundial, o FMI e a OMC impuseram condições de “reestruturação econômica” para o desenvolvimento dos estados pelos contratos de empréstimo e ajuda financeira. Estes estados tem restrita sua capacidade de tomar decisões sobre níveis salariais, educação, saúde e políticas de segurança social, pois ditam a privatização dos serviços públicos e utilidades no comércio aberto, mantendo as políticas de proteção cruciais para os setores agrícola e manufatureiro ocidentais.

Robert Cooper chamou esse cenário de imperialismo voluntário da economia global. É um imperialismo “aceitável para um mundo de direitos humanos e valores cosmopolitas”. Regras econômicas têm sido complementadas por diversos tratados e declarações retóricas de direitos que preparam o futuro cidadão do mundo - altamente moralizado e regulamentado, mas também altamente diferenciado materialmente apesar da retórica dos direitos comuns que todos deveriam desfrutar de Helsinque a Hanói.

Ou seja, a (implícita) promessa para o mundo em desenvolvimento de que a adoção do modelo neoliberal da boa governança e direitos limitados inexoravelmente leva a padrões econômicos ocidentais é fraudulenta.

Historicamente, a capacidade ocidental para transformar a proteção dos direitos formais em uma garantia limitada de direitos materiais, econômicos e sociais foi baseada em enormes transferências de valor das colônias para a metrópole.

Os necessários fluxos reversos não são politicamente viáveis. As sucessivas crises e rearranjos do capitalismo neoliberal conduziram a expropriação e deslocamento da agricultura familiar para o agronegócio, a migração forçada e a urbanização. Estes processos expandiram o número de pessoas sem habilidades, status ou condições

básicas para a existência. Formam-se os restos humanos, as vidas perdidas, o fundo do poço dos bilhões.

A nova língua franca do cosmopolitismo e humanitarismo apresenta o mundo como um espaço simbólico comum que promete prosperidade, igualdade de direitos e paz perpétua. Mas, como Immanuel Wallerstein coloca: “se todos os seres humanos têm direitos iguais, e todos os povos têm direitos iguais, então não podemos manter o tipo de sistema desigual que a economia-mundo capitalista sempre foi e sempre será”. O capitalismo neoliberal e o “lixo humano” são apresentados como um desastre natural ou contingência de vida inevitável. Esta, abandonada à magnanimidade de filantropos e a boa vontade das estrelas pop.

Quando o abismo entre as declarações missionárias sobre igualdade e dignidade e a realidade sombria da desigualdade obscena torna-se aparente, as falsas promessas de humanitarismo vão levar a incontroláveis tensões e conflitos. Soldados espanhóis encontraram os exércitos de Napoleão gritando “Abaixo a liberdade!” Não é difícil imaginar as pessoas que satisfaçam as “forças de paz” dos Novos Tempos com gritos de “Abaixo aos direitos humanos!”.

Os sistemas sociais e políticos se tornaram hegemônicos transformando suas prioridades ideológicas em princípios e valores universais. Na nova ordem mundial, a categoria de direitos humanos é o candidato perfeito para este papel. Seus princípios fundamentais interpretados negativamente e economicamente promovem a dominação capitalista neoliberal. Isto não é inevitável. Se formulados de maneira diferente, as disposições abstratas poderiam sujeitar as desigualdades e indignidades do capitalismo tardio a ataque fulminante. Mas isso não poderá acontecer enquanto a crítica da injustiça é formulada em termos daquilo que gera e apoia a injustiça. A utilidade de direitos chega ao fim quando perdem o objetivo de resistir à injustiça.

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