[O FUROR.com] Qual é a Web que queremos? #PLespião?

June 15, 2017 | Autor: Louise Marie Hurel | Categoria: Internet Governance, The Internet, Políticas Públicas, Public Policy
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QUAL É A WEB QUE QUEREMOS? #PLespião? O FUROR.com LOUISE MARIE HUREL SILVA DIAS1

Precisamos estar atentos ao futuro da Internet. Refletindo sobre o título do artigo de Hossein Derakhshan, “a web que temos que salvar” [1], me pergunto: “QUAL é a web que queremos?”

Muitos ainda veem a Internet como um simples instrumento de pesquisa, conexão com amigos, e compartilhamento de likes e dislikes. Em Relações Internacionais, vejo que o tema “Internet” e “Cyber” (por mais abrangente que isso possa soar), ainda é encarado como algo extremamente particular, isolado, quando, de fato, isso faz parte do dia a dia de muitos. Após esse breve comentário (que ainda há de ser desenvolvido) sobre a relação entre temas como “Governança da Internet”, “Cyber-” e “Internet” e RI, chego ao meu ponto central: A Internet é um espaço político que agrega múltiplos atores, interesses, opiniões. É um espaço de disputas, que se contrói constantemente (como muitos outros) como uma mistura subjetiva e concreta, abstrata e palpável. De um lado, fluxos de informações trafegam, através de cabos, bits e bytes (infraestrutura), por outro, espaços para a expressão, e antagonisticamente, a supressão da expressão (controle) de vozes e opiniões. A Internet é ambivalente. De fato, torna-se muito cômodo falar sobre isso uma vez que supomos que a Internet é uma realidade universal. Infelizmente, essa não é (ainda) nem uma realidade internacional nem nacional, devido aos diversos desafios que se erguem frente à inclusão digital. Por mais que tenhamos avançado em termos de conectividade nacional (Figura 1) [2] , de acordo com o recém lançado TIC Domicílios 2014 [3], somente 50% da população brasileira possui acesso a Internet – Essa é a nossa realidade.

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Louise Marie Hurel é internacionalista e pesquisadora nas áreas de governança da Internet e segurança cibernética. Trabalha no Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getúlio Vargas (CTS/FGV) no projeto "Arquiteturas da Governança", também atua como pesquisadora no projeto Geopolítica Corrente do Núcleo de Avaliação da Conjuntura de Escola de Guerra Naval (NAC/EGN) e no projeto Brasil Global pela PUC-Rio. Contato: [email protected]

Tendo isso em mente, me dirijo aos que estão conectados, querem se conectar e, em um futuro não tão distante, estarão se conectando. Precisamos parar e pensar sobre a questão: “QUAL é a web que queremos?”. Revisitá-la e remoê-la a cada acesso, a cada click, a cada passo que damos na Internet. Digo isso, pois creio que estamos enfrentando grandes desafios (nacionais e internacionais) que põem em xeque o futuro de uma web livre e aberta. Focando no nacional, gostaria de ressaltar a recente proposta de lei PL215/15, também apelidada de “PL Espião”. Esse projeto, prevê o cerceamento de algumas de nossas liberdades e direitos no âmbito digital (Internet). Ao falar de liberdade, também me respaldo no Decálogo do Comitê Gestor da Internet (CGI), que prevê os seguintes princípios para a “Governança e uso da Internet no Brasil”: 1

Liberdade, privacidade e Diretos Humanos

2

Governança democrática e colaborativa

3

Universalidade

4

Diversidade

5

Inovação

6

Neutralidade de Rede

7

Inimputabilidade da rede

8

Funcionalidade, segurança e estabilidade

9

Padronização e interoperabilidade

10

Ambiente legal e regulatório

(para maiores detalhes clique aqui)

O projeto de lei 215/15,  se baseia em alguns pilares: cadastramento online, acesso à informação, “direito ao esquecimento” e penalidades. O cadastramento seria necessário para

download de apps, email, contas em redes sociais e outros serviços, e demandaria o fornecimento do CPF, filiação, email, endereço completo, “qualificação pessoal” e entre outros. Sendo que, “autoridades competentes” podem ter acesso a esses dados SEM ORDEM JUDICIAL. Tal ponto, bate de frente com questões relacionadas à proteção de dados pessoais, privacidade e vigilância. Este projeto de lei representa, a institucionalização de mecanismos que permitam o acesso intrusivo de “autoridades competentes”. O terceiro pilar permite que um determinado conteúdo que “associe o nome ou imagem de pessoas a um crime do qual tenham sido absolvidas em processos judiciais” seja apagado através da invocação ao “direito do esquecimento”[4]. Vale ressaltar, no entanto, que esse ponto não prevê a distinção entre pessoa pública e pessoa privada. Permitindo, por exemplo, que um político solicite a remoção de determinados conteúdos “difamatórios” [5] através desse direito. O que nos leva ao último pilar, penalidades. O projeto de lei também aumenta as penalidades de crimes contra a honra [6].

Aqui no Brasil… A forma como [o direito ao esquecimento] se materializou dá aos políticos o direito de apagar conteúdo na Internet. Não são excluídos da proteção. Então, eles são os beneficiários e os mais interessados[7]

“A alteração do artigo 19, §3°-A para inserir uma espécie de direito ao esquecimento no ordenamento jurídico brasileiro pode conduzir à indisponibilização completa de conteúdos e não apenas à mera desindexação de mecanismos de busca. Trata-se de proposta que promove uma tutela quase ilimitada do direito à honra, podendo conduzir à retirada de informações fundamentais para o debate democrático, inclusive em relação a fatos e pessoas que ocupam ou ocuparam posições que precisam estar sujeitas a amplo escrutínio público” [8] Além dos pontos alarmantes que o PL215/15 apresenta, vale comentar que o projeto foi aprovado no dia 06 de outubro pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara [6]. Como muitos já destacaram, isso põe em xeque o Marco Civil da Internet, o grande passo tomado pelo Brasil em prol regulação da Internet (o que inclui a tentativa de garantir direitos online). É necessária uma reflexão sobre as consequências que a aprovação de um projeto de lei como esse, terá em nossa sociedade.  Enfrentamos um dilema que tenderá a ser mais recorrente com o  aumento de pessoas conectadas: Como lidar com os avanços tecnológicos vis à vis a tentativa de regular (promover mecanismos que possam garantir “direitos online”)? Precisamos de respostas… Rápido, se possível… Respostas   que também levem em consideração princípios, tais como a liberdade de expressão, privacidade, direitos humanos e acessibilidade. A tarefa é árdua, o caminho é longo, os desafios são constantes e a corrida… bem, a corrida é contra o tempo.

A Internet é (tem que ser) de todos e para todos. Por isso, precisamos rechaçar qualquer tentativa, tal como a do PLespião, que tente inviabilizar a Internet como um recurso aberto e inclusivo. Devemos, portanto, não só lançar mão de mecanismos que possam garantir o direito à privacidade (tal como a criptografia), mas também nos engajar nos debates sobre os nossos direitos em um mundo cada vez mais conectado.

Como “regular”? Eis a questão. Quais vozes estão sendo privilegiadas/silenciadas nesse(s) processo(s)? Precisamos pensar sobre o que é a liberdade na web.

Sinto falta de quando as pessoas tinham tempo e se expunham a diferentes opiniões e se importavam em ler mais do que um parágrafo ou 140 caracteres. Sinto falta do tempo em que eu podia escrever algo no meu próprio blog, publicar no meu próprio domínio, sem ter que dedicar tempo igual para promovê-lo em várias redes sociais; um tempo em que ninguém ligava para curtidas e compartilhamentos. Essa é a web da qual me lembro antes prisão. Essa é a web que eu quero[*].

Qual é a web que queremos?

(foto retirada do site: http://www.seesp.org.br/site/imprensa/noticias/item/14121-pl-espi%C3%A3ocontinua-na-pauta-da-ccj-da-c%C3%A2mara-na-ter%C3%A7a-6.html) — Foto em destaque – Créditos para as ilustrações de Tim McDonagh no texto do Hossein Derakhshan [1] https://youpix.com.br/a-web-que-temos-que-salvar-987bc70ecd9d [2] http://www.cetic.br/media/analises/tic-domicilios-2013.pdf [3] http://cetic.br/tics/usuarios/2014/total-brasil/A4/

[4] http://artigo19.org/blog/cgi-br-pl-2152015-subverte-principios-fundamentais-da-internet/ [5]http://www1.folha.uol.com.br/fsp/tec/235383-politicos-com-medo-da-internet.shtml [6]http://convergenciadigital.uol.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm? infoid=40825&sid=4&utm_source=twitterfeed&utm_medium=twitter [7]http://g1.globo.com/globo-news/estudio-i/videos/t/todos-os-videos/v/comissao-da-camaraaprova-a-chamada-lei-do-esquecimento/4521741/ [8]http://www.internetlab.org.br/pt/noticias/pesquisadores-questionam-medidas-de-pl-sobre-crimescontra-a-honra-na-internet/ [*] Versão original: “I miss when people took time to be exposed to different opinions, and bothered to read more than a paragraph of 140 characters. I miss the days when I could write something on my own blog, publish on my own domain, without taking an equal time to promote it on numerous social networks; when nobody cared about shares and likes That’s the web I remember before jail. That’s the web I want.” – https://medium.com/matter/theweb-we-have-to-save-2eb1fe15a426

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