O Imaginário Popular nos símbolos do carnaval de Recife

June 24, 2017 | Autor: Carla Teixeira | Categoria: Design, Movimento Armorial, Folkcomunicação
Share Embed


Descrição do Produto

XV CONFERÊNCIA BRASILEIRA DE FOLKCOMUNICAÇÃO Festas juninas na era digital: da roça à rede Campina Grande-PB, 06 a 08 de junho de 2012 GT 3 - Conteúdos da Folkcomunicação

O IMAGINÁRIO POPULAR NOS SÍMBOLOS DO CARNAVAL DO RECIFE 1

Breno Carvalho e Carla Teixeira

2

Resumo Este trabalho analisa o Carnaval Multicultural do Recife, especificamente a sinalização e decoração de 2006 que homenageou o escritor Ariano Suassuna. A identidade se utilizou da estética Armorial, de elementos das iluminuras e de personagens da obra do escritor. Nessa perspectiva, observou-se como o design pode aproximar a cultura regional junto ao público em um evento de massa. Na construção do artigo temos como base a folkcomunicação no uso dos elementos da cultura popular e de um tipo de informação coletiva apropriada pelo design gráfico. Além disso, temos a descrição das peças de sinalização e entrevista com a artista plástica Joana Lira. O design é, sim, um instrumento capaz de ser estudado na perspectiva da folkcomunicação, quando se percebe a força disseminadora da cultura popular presente em eventos desse porte, fortalecendo o apelo turístico de uma festa que atrai milhares de pessoas a Pernambuco. Palavras-chave: Folkcomunicação. Movimento Armorial. Design.

Introdução Imprimir um caráter universal a uma festa popular que é a “cara” de Pernambuco: o Carnaval do Recife. A partir da identidade criada pela designer e artista plástica Joana Lira para o Carnaval Multicultural do Recife 2006, uma homenagem ao escritor Ariano Suassuna. Este trabalho analisa o Carnaval Multicultural do Recife, especificamente a sinalização e decoração de 2006 que homenageou o escritor Ariano Suassuna. A identidade se utilizou da estética Armorial, de elementos das iluminuras e de personagens da obra do escritor. Nessa perspectiva, observou-se como o design pode aproximar a cultura regional junto ao público em um evento de massa, com a

participação de mais de um milhão de pessoas de várias partes do país e do mundo.

1

Coordenador do Curso Superior Tecnológico em Jogos Digitais, professor da Universidade Católica de Pernambuco nos cursos de Relações Públicas, Jogos Digitais e Jornalismo, especialista em Design da Informação pela Universidade Federal de Pernambuco. Email: [email protected] 2

Mestra em Extensão Rural e Desenvolvimento Local pela Universidade Federal Rural de Pernambuco; jornalista, especialista em Desenho - Expressão Gráfica pela UFPE; Professora dos cursos de Jornalismo, Publicidade e Relações Públicas da Universidade Católica de Pernambuco. E-mail: [email protected].

2

Problematização: O Carnaval Multicultural do Recife e o Movimento Armorial Pernambuco, capital do Frevo, possui duas cidades que se destacam pelo carnaval de rua, no qual blocos, troças, maracatus e foliões do Brasil e do exterior brincam durante quatro dias: Recife e Olinda. Em 2002, a gestão do prefeito João Paulo (PT-PE), tinha como proposta, mostrar o Recife como “uma cidade que respira cultura. (...). Recife é diversidade, é descentralização, é multiculturalidade”. (I CONFERÊNCIA DE CULTURA DO RECIFE, 2003). Dessa forma, a festa de Momo foi descentralizada, com vários pólos de animação em diversos pontos da cidade. Em 2006, a Prefeitura homenageou o escritor Ariano Suassuna e o cantor Claudionor Germano. Percebemos que a identidade visual criada pela artista plástica Joana Lira teve como pressuposto abarcar a proposta de multiculturalidade, fazendo uma ponte com a obra de Ariano. Ele é autor de peças e romances, alguns deles adaptados para o cinema e a televisão como O Auto da Compadecida e, mais recentemente, A Pedra do Reino, minissérie de cinco capítulos dirigida por Luiz Fernando Carvalho, que teve o último exibido no dia do aniversário de 80 anos de Ariano: 16 de junho. (CONTINENTE MULTICULTURAL, 2007). O Movimento Armorial foi lançado por Suassuna em 18 de outubro de 1970, com o apoio de artistas e intelectuais. O conceito, segundo o próprio Ariano, era “realizar uma Arte erudita a partir das raízes populares da nossa Cultura” (SUASSUNA, 1974, p. 40). A arte Armorial foi descrita como aquela que tem como traço principal a ligação com a literatura de cordel, que apontariam três caminhos: um para a literatura, cinema e teatro, através da poesia narrativa de seus versos; outro para as artes plásticas, como a gravura, a pintura, a escultura, cerâmica, talha e tapeçaria, inspirado nas xilogravuras 3 ; e um terceiro para a música, pelas características do canto de seus verso e estrofes (SUASSUNA, 1974, p. 39). Além de escritor, Ariano Suassuna colabora como artista plástico transformando o imaginário popular em arte, a partir de suas telas, esculturas, peças em cerâmica, desenhos, gravuras e iluminogravuras 4 (veja a Figura 1), que na opinião da jornalista Olívia Mindêlo, contribuíram não só para a sedimentação de um ideal de cultura brasileira, mas para a

3

A xilogravura é uma gravura talhada em madeira, de onde se obtém ilustrações populares, muito utilizada a partir do século XIX nas capas de folhetos da literatura de cordel. (FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO, 2007). 4 Iluminogravura: termo criado por Ariano Suassuna para designar uma releitura contemporânea da iluminura do francês enluminur - a arte, imagem ou o ato de ornar um texto, uma página. (CONTINENTE MULTICULTURAL, 2002). Segundo o especialista na obra de Suassuna, Carlos Newton, a iluminogravura é também um texto ilustrado. A ilustração de cada uma delas associa episódios descritos no respectivo poema a motivos da cultura brasileira, recolhidos tanto em nossa arte popular quanto em nossa arte pré-histórica. JORNAL DO COMMERCIO, 2007.

3

construção de uma marca muito particular. (JORNAL DO COMMERCIO, 2007).

As

iluminogravuras estão presentes em várias das obras de Suassuna. Delas surgem figuras mitológicas, animais do universo sertanejo popular e personagens inspirados no imaginário nordestino, ibérico, medieval. O amarelo ouro, o marrom, o ocre, o preto e o vermelho são as cores que marcam a identidade do trabalho. (JORNAL DO COMMERCIO, 2007)

É este universo mítico, com dragões, leões e outras figuras imaginárias, além dos personagens de suas obras, além das cores, que

são

especialmente

destacados

na

identidade do Carnaval Multicultural 2006. Ele pode ser considerado uma marca forte e personalizada, que se estende além da iniciativa de Ariano Suassuna mais de 35 anos após o início do movimento, com faces que incluem as artes plásticas, a dança, o teatro, a música e também o design. Para Câmara Cascudo, o folclore, sendo uma cultura do povo, é uma cultura viva, útil, diária, natural. As raízes imóveis do passado

podem

ser

evocadas

como

indagações da antiguidade. “O folclore é o Figura 1: Iluminogravura de Ariano Suassuna

uso, o emprego imediato, o comum, embora

antiqüíssimo.” (CASCUDO, 1972, p. 123). Estigmatizada pelo “espírito de antiquário”, a meta dos “folcloristas” era a de buscar no “povo” aquelas “raízes autênticas e genuínas” capazes de definir a matriz “nacional” da cultura brasileira, que os “românticos” do século XIX, guiados pelo “espírito nacionalista”, haviam identificado no “indigenismo”. (VILHENA, 1997, p. 15) Fazendo uma analogia com o Movimento Armorial, temos Ariano Suassuna buscando nas raízes da cultura popular elementos para a criação e desenvolvimento de uma identidade genuinamente brasileira, embebida pela essência da relação entre a arte erudita e o popular.

4

Sobre folkcomunicação e design Segundo Hohlfeldt, a folkomunicação pode ser entendida como o estudo dos procedimentos comunicacionais pelos quais as manifestações da cultura popular ou do folclore se expandem, se socializam, convivem com outras cadeias comunicacionais, sofrem modificações por influência da comunicação massificada e industrializada, ou se modificam quando apropriadas por tais complexos. (apud CARVALHO, 2005, p. 11) Temos assim, como indica Carvalho, que essa nova concepção incluiu, entre os objetos a serem trabalhados pela pesquisa folkcomunicacional, as manifestações da mídia (cultura de massa) que adotam, na sua difusão, os elementos simbólicos e o universo linguístico da cultura popular. (p. 111). Nesse sentido, a compreensão das festas populares como processos comunicacionais insere-se nas discussões sobre a folkcomunicação, de Beltrão (1980). Nessa mesma linha, Marques de Melo (2008) também se volta para as festas populares. Dedicado às pesquisas da folkcomunicação, ele identifica, no mínimo, três níveis de processos comunicacionais nas festas: a comunicação interpessoal, voltada para as relações humanas ativadas por estes eventos; a intermediação comunicativa, referente às interações institucionais produzidas. E, por fim, a comunicação massiva, desencadeada entre o popular e os meios de comunicação de massa. Embora o design não esteja ligado diretamente à maioria das pesquisas relacionadas à folkcomunicação, podemos considerar a pertinência desta associação quando observamos que o campo de trabalho do designer “é o terreno dos significados, dos valores simbólicos, das associações construídas a partir de dados culturais”. (ESCOREL, 2000, p.59). Sigrist (2007) aponta que a tais influências nas manifestações da cultura popular, que se hibridizam e se transformam em produtos de consumo para atender ao turista como mecanismo de mudança da realidade do local e do artesanato, mais especificamente, chamamos folkcomunicação turística. Ou seja, as manifestações populares já não pertencem à comunidade, mas a uma teia de relações e interesses, da qual participam o Estado, instituições sociais e o aparato político e empresas comerciais, a isso chamamos folkmarketing. A folkcomunicação turística é uma forma de comunicação no âmbito do turismo, veiculadas como: festas, folguedos, eventos, espaços, culinária típica, religiosidade, ritos, objetos, publicidade, criações artísticas e musicais e outras. (SIGRIST, 2007, p.85). Nessa perspectiva, o design atua como um elemento multiplicador da cultura, seja ela hegemônica ou popular, aliando-se à folkcomunicação turística, quando do uso de elementos da cultura popular na identidade de um evento significativo para o calendário folclórico brasileiro como é o Carnaval.

5

Uma identidade multicultural: o processo de criação Como qualquer produto, “um evento cultural, seja qual for sua natureza, precisa de uma identidade visual forte e original, adequada a seus fins e ao repertório do público visado, para poder se distinguir e marcar a trajetória com nitidez”, afirma a designer Ana Luisa Escorel (2000, p. 60). Para a autora, num evento cultural, a função do design é um elemento multiplicador. Mesmo que uma exposição de arte, por exemplo, tenha como público direto um determinado segmento da população habituado à arte erudita, as possibilidades de comunicação são ampliadas pelo design. Outras pessoas também são atingidas pela mensagem. Nisso consiste o efeito multiplicador. Segundo Bürdek (1997, p.230), a disciplina do design não só cria realidades materiais, mas especificamente preenche funções comunicativas. O que dizer então, de uma festa de caráter eminentemente popular, que reúne pessoas de várias partes do mundo? Como traduzir a diversidade cultural de Pernambuco numa linguagem acessível a um universo que abrange os pernambucanos e também turistas, crianças, jovens e adultos? “Desenvolver desenhos para uma intervenção urbana do porte do carnaval do Recife é um privilégio que poucos têm”, afirma a artista plástica Joana Lira 5 . (LIRA, 2007). Sobre isso, Escorel avalia: No projeto de identidade visual de empresas, produtos e serviços, de maneira geral, de eventos culturais, em particular, cabe ao designer a tarefa de trazer para a superfície, com seu trabalho, dados que normalmente estão escondidos. (...) Sem seu auxílio o profissional não atingirá o sentido oculto da informação que deve desentranhar, dando-lhe forma e corpo através do projeto, para que possa se plasmar graficamente ao evento. (2000, p. 60)

O imaginário popular transformado em Folkmarketing De acordo com Lucena Filho, o folkmarketing manifesta-se do quarto P8 (Promoção) quando esta utiliza “manifestações folclóricas e elementos das culturas populares como tema central e estratégia comunicacional”, que tem dimensões econômica, cultural e turística (LUCENA FILHO, 2007, p.26). O autor chama a atenção para a apropriação dos elementos da cultura folk como instrumento do processo de comunicação, percebido na identidade visual do evento através do: “uso dos elementos da cultura popular na construção da identidade”; “publicização das marcas e produtos das empresas parceiras” mediante “agregação de valores

5

Joana Lira é designer, ilustradora e artista plástica. Apesar de formada em Design Gráfico pela Universidade Federal de Pernambuco, ela destaca que assume muito mais o papel de artista plástica do que de designer. Na área cultural, fez exposições, cenários para peças teatrais e ilustrou livros, além dos trabalhos desenvolvidos para o Carnaval Multicultural do Recife (LIRA, 2007).

6

e comportamentos culturais” regionais; “apropriação dos elementos das culturas populares na programação iconográfica” e dos “instrumentos de comunicação dirigidos e massivos”; e “uso dos elementos da cultura do povo como qualificador da comunicação empresarial por sua associação com as manifestações populares” (LUCENA FILHO, 2007, p.63). Temos, no trabalho do designer, uma questão a ser resolvida, que é gerir a identidade de um evento cultural unindo a imagem e personalidade do evento ao das empresas parceiras, associado ao que Lucena aborda como a publicização das marcas. Escorel explica que hoje, os produtos que se destacam num mercado de muitas ofertas são aqueles que além de suas qualidades intrínsecas, possuem uma imagem forte, sintonizada com o desejo e as expectativas do público para o qual foram concebidos. ”Tanto a imagem quanto a marca, portanto, definem uma personalidade, uma estratégia comercial, um conjunto de ações de comunicação que o público associa ao desempenho de uma determinada empresa, produto ou serviço. (ESCOREL, 2000, p. 59). Quando da análise da identidade visual do Carnaval Multicultural 2006, observamos entre os patrocinadores as Lojas Renner, a operadora de telefonia Oi, cerveja e guaraná Antartica, a Telemar, Pepsi, Caixa Econômica Federal, sorvetes Nestlé e o Hiperbompreço. Estar associado a um evento desse porte e que, especificamente neste período, baseou sua identidade em elementos da cultura popular e do Movimento Armorial, mostra a qualificação da comunicação empresarial. Temos uma maior visibilidade das marcas envolvidas e os benefícios relacionados à demonstração pública, por meio do patrocínio, da valorização da cultura regional, o que certamente contribuiu para obter resultados junto ao público envolvido na festa de Momo. Revela-se nesta ação a importância do folkmarketing destacada por Lucena “como estratégia comunicacional que se apropria de elementos da cultura folk pela cultura de massas e de elite, no segmento da indústria massiva, onde as festas populares convertem-se em conteúdo midiático de natureza” (LUCENA FILHO, 2007, p.90)

Metodologia Como aportes teóricos, utilizamos a Teoria da Folkcomunicação, de Luiz Beltrão, expandida a partir dos estudos do professor Roberto Benjamin, que registram apropriação e mediação dos canais folk pela comunicação de massa. Para o enriquecimento e o aprofundamento teórico e reflexivo da teoria folkcomunicacional e sua interdisciplinaridade, trabalhamos com autores que tratam da teoria do design como uma ferramenta

7

comunicacional e do movimento Armorial, base inspiradora da identidade visual do Carnaval Multicultural do Recife em 2006. Esta proposta de pesquisa foi trabalhada dentro de uma abordagem qualitativa. Além da análise documental, por meio da observação das peças produzidas para o evento, situadas nos Pólos de Animação em Recife, Pernambuco, foi realizada entrevista semi-estruturada com a artista plástica e designer Joana Lira, responsável pelo desenvolvimento da identidade visual do Carnaval. Também foi feita coleta de imagens da sinalização produzida para o evento, tais como banners, totens, palcos e elementos decorativos de forma a subsidiar a construção da análise.

Discussão Procuramos conhecer a estratégia criativa da artista plástica no desenvolvimento do projeto. Como base referencial para o desenvolvimento das ilustrações para a cenografia 2006 (veja a Figura 2), ela pesquisou e estudou a obra de Ariano, selecionando os elementos com os quais iria trabalhar e fazendo uma releitura. “Procurei destacar as obras e os personagens mais conhecidos pelo público quando se fala em Ariano Suassuna: Auto da Compadecida, A Pedra do Reino e Fernando e Isaura”. (LIRA, 2007). Para a artista, as principais dificuldades para um designer ou ilustrador no desenvolvimento de projetos na área cultural é desenvolver uma linguagem que agrade a todos, já que o cliente de fato não é a prefeitura, mas todos os cidadãos que participam do carnaval recifense. “Sem falar na dificuldade em dimensionar as peças das alegorias para a escala urbana e de especificar materiais para estruturá-las”. A nossa análise sobre a identidade visual do Figura 2: Personagem Jesus do filme Auto da Compadecida

Carnaval Multicultural do Recife 2006 não irá

considerar a marca do evento, também criada pela artista plástica Joana Lira em 2002. Abordaremos apenas a decoração, que contou com painéis, totens, estandartes e figurações inspiradas nas iluminuras e em personagens da rica obra do criador do Movimento Armorial.

8

Foram desenvolvidas ilustrações que retratam personagens clássicos do imaginário como a serpente, a dama, o cavaleiro, a rainha e o rei. Personagens religiosos, como Jesus e o Diabo. Do imaginário popular estão retratados as personagens Fernando e Isaura, João Grilo e Severino de Aracaju. Também foram produzidas imagens de lobos de duas cabeças, o boi voador e dragões, além da criação de brasões representando a Heráldica 6 . Também há aves, pássaros, peixes, baleias, onças pintadas e corações para retratar todo o universo encontrado nas obras de Ariano. A sinalização dos Pólos de Animação ficou assim caracterizada: - Pólo Recife Multicultural (Praça do Marco Zero) – Personagens inspirados no Auto da Compadecida: Jesus, o Diabo, Severino de Aracaju, Vicentão, o Padeiro e sua Mulher, Cabo 70, Rosinha, Nossa Senhora Aparecida ou a Compadecida, o Gato que Descome Dinheiro, Chicó e João Grilo. A sinalização foi elaborada com totens em formato lembrando caixas de fósforo na posição vertical, com uma base retangular de diversas cores. (veja a Figura 3) - Pólo de Todos os Ritmos (Pátio de São Pedro) – Bichos lúdicos e o Sol. Estes estavam em formato de totens, situados no topo, e a base tinha uma serpente tridimensional enrolada. Já o painel do palco possuía ilustrações da Dama (rainha) e do Cavaleiro (rei), fazendo um mix de alguns temas. (veja a Figura 4) - Pólo Mangue (Cais da Alfândega) – Personagens inspirados na obra A história de Amor de Fernando e Isaura: Fernando e Isaura. Aqui a sinalização foi representada através de banners de três dimensões, na qual se via também ornamentos compostos por flores, pássaros e corações. Também são utilizados corações suspensos por cabos em todo o Pólo. - Pólo Afro (Pátio do Terço) – Personagens inspiradas nas iluminuras de Ariano que retratam a raiz africana do povo nordestino e brasileiro: Negras de seios nus com ornamentos (brincos, colares e lenços na cabeça). - Pólo de Todos os Frevos (Av. Guararapes) – Aqui veremos o uso de bandeiras, com os Brasões Heráldicos, dividido em três elementos: o escudo, no qual estavam inseridas figuras de animais lúdicos ou marcas de patrocinadores e apoiadores; o timbre 7 (com a representação visual ou da flor-de-lis); e/ou coroa. O suporte destes era composto por barras de ferro na cor preta. Também há presença de animais lúdicos suspensos em um suporte na cor amarela. Em algumas bases, serpentes tridimensionais. (veja a Figura 5)

6

Refere-se à ciência e à arte de descrever brasões de armas ou escudos. (HOUAISS, 2001) O timbre é a figura sobre o elmo, como forma de facilitar o reconhecimento da identidade do cavaleiro e aumentar a sua visibilidade pelos espectadores. Elmo faz parte do equipamento de guerra medieval, e se apresenta das mais variadas formas, mas sua função básica é a proteção craniana. (HERÁLDICA, 2007)

7

9

- Pólo Fantasias (Rua do Bom Jesus) – Personagens inspirados em A Pedra do Reino: cavaleiros montados a cavalo, como painéis de chão. Também houve uso de animais reais e do imaginário suspensos por cabos nas árvores por toda a rua. (veja a Figura 6) - Vias de Chegada 8 - Cenário composto por bichos, bandeiras e brasões inspirados nas iluminuras de Ariano Suassuna. Fotos: Tiago Lubambo

Figura 3: Totens do Pólo Recife Multicultural

Figura 4: Pólo de Todos os Rítimos

Figura 6: Decoração do Pólo Fantasias Figura 5: Bandeiras do Pólo de Todos os Frevos

As cores não têm efeitos de gradiente, são chapadas. Predominam as primárias (azul, vermelho e amarelo) e secundárias (verde, laranja) com a inserção de tons de marrom em alguns personagens humanos. As cores seguem a estética do Movimento Armorial, assim como o estilo de representação, que usa a mesma linguagem das iluminuras de Ariano

8

Todas as pontes e as avenidas de acesso ao Bairro do Recife que tiveram decoração.

10

Suassuna: figurações de frente ou de perfil, sem o uso de perspectiva, profundidade ou tridimensionalidade. Os personagens são engraçados e atraentes, como forma de demonstrar tanto a alegria do Carnaval Multicultural do Recife como das obras de Ariano. O traçado das ilustrações é leve e delicado. Neste ponto Joana Lira imprime sua própria interpretação à obra de Ariano. Isto não apenas retrata a identidade de Joana Lira, que em seus trabalhos, carregados de elementos da cultura indígena e africana, reforça a feminilidade, como mostra o designer/artista plástico como um agente capaz de imprimir sua própria personalidade, a partir de um mesmo universo, no caso a cultura popular. É este universo, ligado à folkcomunicação, que pode ser apropriado pelo designer na construção de mensagens para o público-alvo. O grupo hegemônico, no caso a instituição que solicitou o projeto, a Prefeitura do Recife, busca resgatar a identidade do povo e usá-la como uma ferramenta para atrair mais turistas ao Carnaval Multicultural. Temos a folkcomunicação turística, forma de comunicação no âmbito do turismo, relacionada com festas, folguedos, eventos, espaços, culinária típica, religiosidade, ritos, objetos, publicidade, criações artísticas e musicais e outras. (SIGRIST, 2007).

Conclusão Segundo Joana Lira, não houve tanta dificuldade em criar os elementos para o projeto, mesmo o tema tendo sido tão específico. Pernambucana e admiradora do Movimento Armorial, ela destaca que também bebeu desta fonte. “Claro que minha linguagem gráfica tem uma influência regional forte. Sem falar que utilizo muito o traço preto com preenchimento, que é bem característico do desenho de Ariano”. (LIRA, 2007). Na criação, Joana Lira destaca que procurou dosar sua própria bagagem cultural com o que havia sido solicitado pela Prefeitura do Recife. A designer destaca que ao desenvolver os projetos para os clientes, estes sabem que ela vai associar à empresa deles sua própria linguagem gráfica, agregando personalidade ao projeto. Podemos perceber, a partir da análise da identidade do Carnaval Multicultural do Recife, que tanto o designer quanto o artista plástico podem imprimir um caráter único a um evento, utilizando a linguagem do design gráfico de uma maneira universal. Ou seja, mesmo a partir do universo mítico e único da cultura e do imaginário populares, integrantes do Movimento Armorial, é possível transportar e difundir a cultura pernambucana para um público de mais de um milhão de pessoas.

11

Os traços leves, as cores vibrantes e as demais características visuais das iluminuras presentes na sinalização e decoração do evento, valorizam aspectos da cultura e da identidade de uma região repleta de história, contos e causos fantásticos como o Nordeste brasileiro. Daí a importância do designer, ao unir elementos aparentemente díspares e fazendo da cultura regional um instrumento de criação, aproximando o design das raízes do Brasil. O design é, sim, um instrumento capaz de ser estudado na perspectiva da folkcomunicação, quando se percebe a força disseminadora da cultura popular presente em eventos desse porte, fortalecendo o apelo turístico de uma festa dessa magnitude.

Referências ALMA armorial. Continente Multicultural, Recife, ano II, nº 14, fevereiro, 2002. BELTRÃO, Luiz. Folkcomunicação: a comunicação dos marginalizados. São Paulo: Cortez, 1980. BENJAMIN, Roberto. Folkcomunicação na sociedade contemporânea. Porto Alegre: Comissão Gaúcha de Folclore, 2004. BÜRDEK, Bernhard E. História, teoria e prática do design de produtos. Tradução: Freddy Van Camp. São Paulo: Edgard Blücher, 2006.

CARVALHO, Samantha Viana Castelo Branco Rocha. Metodologia folkcomunicação: teoria e prática. IN DUARTE, Jorge, BARROS, Antônio (org). Métodos e Técnicas de Pesquisa em Comunicação. São Paulo: Atlas, 2005. CASCUDO, Luis da Câmara. Seleta. Rio de Janeiro: MEC – José Olympio, 1972. CONTINENTE MULTICULTURAL. Cabras e Mamulengos versus Super-homem. Recife, ano II, nº 20, agosto de 2002. CONTINENTE MULTICULTURAL. O Universo Mítico de Ariano Suassuna. Ano VII, n. 78. Recife, ano VII, n. 78, junho de 2007. ESCOREL, Ana Luisa. O Efeito Multiplicador do Design. São Paulo, Senac-SP, 2000 HOUAISS, Antônio. Mini Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001. I CONFERÊNCIA DE CULTURA DO RECIFE. Folder. Recife, dezembro de 2003. JORNAL DO COMMERCIO. Caderno Especial. Recife, 16 de junho de 2007. LIRA, Joana. Aspectos da identidade visual do Carnaval Multicultural do Recife 2006: depoimento. Jul. 2007. Entrevistadores: Breno Carvalho e Carla Teixeira. Recife, 2007. Entrevista realizada por email. LUCENA FILHO, Severino Alves de. Folkmarketing. In: GADINI, Sérgio. Luiz; WOITOWICZ.Karina Janz (orgs).Noções básicas de folkcomunicação: uma introdução aos principais termos, conceitos e expressões. Ponta Grossa: editora UEPG, 2007.

12

MARQUES DE MELO, José. Mídia e cultura popular. História, taxionomia e metodologia da folkcomunicação. São Paulo: Paulus, 2008. MELO, Jamildo. O Artesanato em Pernambuco. Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco: Recife, 2006. SIGRIST, Marlei. Folkcomunicação turística. In: GADINI, Sérgio Luiz; WOITOWICZ, Karina Janz. (Org.) Noções básicas de Folkcomunicação: uma introdução aos principais, termos, conceitos e expressões. Ponta Grossa: Editora UEPG, 2007, p.85-88. SUASSUNA, Ariano. O Movimento Armorial. Recife: Universitária da Universidade Federal de Pernambuco, 1974. VILHENA, Luis Rodolfo. Projeto e Missão: um movimento folclórico brasileiro: 1947-1964. Rio de Janeiro: Funarte, 1997.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.