O impacto do contato em nível local entre os cidadãos e as instituições: pesquisa exploratória relacionada às administrações municipais locais

June 23, 2017 | Autor: Rebeca Lins | Categoria: Legitimacy, Descentralization, Institutional Trust and Confidence
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O impacto do contato em nível local entre os cidadãos e as instituições: pesquisa exploratória relacionada às administrações municipais locais Rebeca Almeida Lins Universidade de São Paulo/Núcleo de Estudos da Violência [email protected]

Resumo Essa Iniciação Científica está incluída no projeto CEPID 2013, - “Building democracy daily: human rights, violence and institutional trust” – desenvolvida pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo. O objetivo principal da pesquisa do NEV é analisar como a legitimidade das instituições fundamentais para a democracia é construída ou comprometida, explorando as relações entre os cidadãos e funcionários públicos. Em outras palavras, a preocupação da pesquisa é estudar como o desempenho das instituições afeta a percepção do cidadão de legitimidade política. Esse trabalho realizou um estudo das administrações municipais locais, representadas pelas subprefeituras de São Paulo. Os resultados apresentados nesse relatório são frutos de pesquisa bibliográfica e legislativa sobre as subprefeituras e consistem nas análises sobre: (i) o debate da descentralização administrativa; (ii) o contexto histórico da criação das subprefeituras e sua lei criadora; (iii) as mudanças políticas ocorridas nas subprefeituras durante as diferentes gestões do executivo. Diante dos resultados da pesquisa bibliográfica e legislativa foi feita uma reflexão sobre a legitimidade e a confiança da administração municipal, que irá contribuir para os objetivos do projeto CEPID 2013. Palavras Chaves: subprefeituras de São Paulo; descentralização; democracia; legitimidade; confiança institucional.

Abstract This scientific initiation research is included in the Project CEPID “Building democracy daily: human rights, violence and institutional trust” – developed by the Center for the Study of Violence at the University of São Paulo. The main purpose of NEV´s research is to analyze how the legitimacy of key institutions for democracy is constructed, or jeopardized, by exploring the contacts between citizens and civil servants. In other words, we are concerned with how the performance of institutions affects citizen’s perceptions of political legitimacy. This paper performed a study of the municipal government, represented by the Regional City Halls of São Paulo. The results presented in this report came from legislative and bibliographical research about the Regional City Halls of São Paulo and include the analysis of: (i) the discussion of administrative decentralization; (ii) the history of the Regional City Halls and its regulatory law; (iii) the political changes in the Regional City Halls during the different managements of the executive. Considering these elements an analysis was made about legitimacy and institutional trust which will guide the field work that will be conducted in the second semestre. Key words: Regional City Halls of São Paulo; decentralization; democracy; legitimacy; institutional trust.

SIICUSP 2014 – 22º Simpósio Internacional de Iniciação Científica e Tecnológica da USP

Introdução Esta iniciação científica1 integra o projeto CEPID 2013 - “Building democracy daily: human rights, violence and institutional trust” - do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP), o qual pretende estudar como a legitimidade das instituições-chave da democracia é construída e desconstruída através do contato diário entre cidadãos e funcionários públicos. Para isso, o programa irá analisar o contato dos cidadãos com as instituições locais: a administração municipal, a escola local, equipamentos de saúde, fóruns trabalhistas, polícias e Centros Integrados de Cidadania e terá o formato de um painel longitudinal, com múltiplos contatos ao longo do tempo (NEV/USP, 2011, p. 01). Nesse artigo, foram apresentados os resultados do relatório parcial, visto que o relatório final será entregue para a FAPESP no mês de dezembro de 2014. Essa iniciação científica irá contribuir para o projeto CEPID com o estudo da administração pública municipal, representada pelas subprefeituras de São Paulo. A escolha dessa instituição se justifica pelo fato dela representar o poder executivo municipal nas regiões da cidade, bem como pela natureza jurídica dos municípios brasileiros de entes federativos autônomos (conforme dispõe o art. 18 da CF/88), sendo estes incumbidos de atender aos interesses e necessidades locais (art. 30 da CF/88). Dessa forma, é através das subprefeituras que que se estabelece o contato mais próximo entre o cidadão e a administração municipal, tanto na busca por serviços públicos, quanto na procura por participação popular, representando um importante canal na busca por efetivação de direitos através do poder público. O conceito de legitimidade legal para Tyler e Fagan (2008) é definido a partir do ponto de vista do cidadão como “um sentimento de obrigação de obedecer à lei e acatar as decisões tomadas pelas autoridades legais” (tradução livre). Para Tyler (2006), uma das bases que legitimam autoridades e instituições, inclusive as políticas, é a justiça processual (“procedural justice”). Assim, o cidadão tende a obedecer a leis e confiar nas autoridades quando estas adotam procedimentos justos e coerentes, do mesmo modo, quando há corrupção em instituições políticas, por exemplo, estas tendem a perder legitimidade. Essas referências teóricas guiaram o estudo das subprefeituras, indicando que as mudanças normativas ocorridas nas diferentes gestões do executivo alteraram seu modo de funcionamento e função, fatores que podem impactar a relação da instituição com o cidadão.

Objetivos O objetivo da pesquisa é fazer um mapeamento das subprefeituras de São Paulo - através do estudo de sua história, dos serviços ofertados, e das alterações legais que a instituição sofreu em cada gestão, buscando entender qual o seu papel na vida cotidiana do cidadão paulistano. A proposta de estudo das subprefeituras se enquadra na iniciativa do projeto CEPID de incluir outras instituições públicas, além da polícia e do judiciário, no estudo da legitimidade, por entender que elas “também aplicam as leis, regras e regulamentos, e que estas podem ter um papel tão importante na socialização legal como aquelas.” (NEV-USP, 2011, p. 16). Essa pesquisa foi realizada em dois eixos: (i) estudo da questão normativa – atribuições, competências legais e estrutura administrativa das subprefeituras e (ii) análise da literatura sobre o tema - contexto de criação das subprefeituras, alterações da instituição conforme a mudança de gestão do executivo, entre outros. Tais informações coletadas visam relacionar a administração municipal (representada pelas subprefeituras) ao Estado de Direito, bem como refletir sobre a importância do acesso da população à administração pública municipal e o reflexo disso na legitimidade e confiança nas instituições da democracia.

Materiais e Métodos A metodologia empregada nesse trabalho consistiu na busca de bibliografia nos seguintes bancos de bases de dados: “Scielo”; “Google Acadêmico”; “Banco de Teses USP” e “Dedalus”, com os termos “subprefeitura”; “administração municipal” e “descentralização”. É importante registrar que há pouca literatura sobre as subprefeituras, especificamente, e que esta não inclui a discussão da legitimidade, confiança institucional e Direitos Humanos, como proposto pelo projeto CEPID 2013.

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Essa iniciação é vinculada ao Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, com apoio da FAPESP. Entretanto, o curso da graduação em Direito é feito pela Universidade Mackenzie.

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Além disso, foi feita a busca em sites de notícias sobre as subprefeituras em cada gestão do executivo, bem como o acesso a sites oficiais da Prefeitura Municipal de São Paulo e das subprefeituras. A pesquisa da legislação municipal em relação às subprefeituras foi feita através do site “Leis Municipais”: https://www.leismunicipais.com.br.

Resultados As trinta e duas subprefeituras de São Paulo foram criadas em julho de 2002 pela lei 13.399/2002, no governo petista da prefeita Marta Suplicy (2001-2004), com o objetivo de descentralizar e democratizar a administração pública municipal. A intenção era que a instituição fosse um canal de participação popular, recebendo as demandas por políticas públicas de acordo com as necessidades de cada região da cidade e levando-as para o poder executivo municipal. Entre os anos 2003 e 2004, a prefeita editou uma série de decretos que transferiram a gestão dos equipamentos públicos (saúde, educação, cultura, etc) das secretarias para as subprefeituras, a fim de concretizar a descentralização administrativa. Entretanto, para Grin (2011) esse processo foi errático, pois manteve a lógica de entrega de cargos para os vereadores (em troca de governabilidade), bem como encontrou dificuldades em transferir atribuições das secretarias para as subprefeituras, ocasionando uma descentralização irregular e desforme nas regiões. Nas gestões seguintes dos prefeitos do PSDB José Serra (2005-2006) e Gilberto Kassab (2006-2012), grande parte dos decretos editados pela prefeita Marta Suplicy foram revogados, transferindo a gestão dos equipamentos para as secretarias. Além disso, na gestão do prefeito Kassab houve a militarização das subprefeituras, com a nomeação de coronéis reformados para o cargo de subprefeitos. Na atual gestão do prefeito petista Fernando Haddad (2013-2016) há uma tentativa de retornar ao projeto original das subprefeituras, com a criação do mecanismo de controle social, os conselhos participativos municipais, a fim de incentivar o debate de políticas públicas intersetoriais. A criação dos conselhos participativos municipais pode ser analisada a luz de dois elementos que são importantes para a qualidade da democracia: “accountability” (prestação de contas) e “responsiveness” (capacidade de atender às demandas da população). A participação da sociedade civil nesse espaço pretende aumentar a transparência da administração municipal (accountability) e a capacidade de ouvir demandas dos moradores regionais e responder a elas, criando aderência do sistema ao desejo dos cidadãos em geral (Morlino, 2010). Para Carpini et al. (2004), citado por Tyler (2006), os esforços em criar mecanismos participativos e deliberativos, em processos políticos, são incentivados, em parte, pela demonstração que estes trazem maior legitimidade. Dessa forma, os conselhos participativos, constituem uma tentativa de aumentar a legitimidade das subprefeituras, através da participação do cidadão nos processos políticos, trazendo maior aceitação das leis editadas pela administração municipal, sua aplicação e as decisões dos gestores. Marta Arretche (1996) ressalta que os resultados pretendidos pela descentralização (como maior participação democrática, eficiência e controle social) não resultam automaticamente dela. A autora sustenta que a concretização dessas ideias depende mais da incorporação de valores democráticos pelas instituições do que do nível da tomada de decisões. As subprefeituras assumem papéis diferentes conforme a gestão do executivo, indicando que a descentralização, por si só, não incorpora os valores democráticos trazidos pela lei das subprefeituras. Essas alterações políticas e normativas podem refletir na construção da confiança institucional, visto que a percepção dos cidadãos entre o conteúdo ético e normativo das instituições, e o funcionamento delas é que vai lhes conferir confiança política ou não (MOISES, 2010). A lei de criação das subprefeituras estabelece como valores normativos a participação democrática regional, o controle social, a construção intersetorial de políticas públicas, dentro outros. Como estudado, essas atribuições sofrem constantes alterações de acordo com a vontade do poder executivo, através da edição de decretos que moldam a função das subprefeituras, o que altera a relação da instituição com os cidadãos. Um exemplo para elucidar essas questões seria a atribuição das subprefeituras de constituir um espaço de discussão de políticas públicas intersetoriais e regionais, que gerou uma expectativa na população no desempenho da instituição, a qual pode ter sido frustrada com a implantação errática e as posteriores alterações normativas. Pode-se levantar a hipótese de que a confiança na administração pública municipal é mitigada pelas suas constantes alterações normativas, as quais não permitem aos cidadãos conhecer ou recorrer aos seus objetivos, transformando a instituição em “zeladorias” que não possuem um papel claro em relação aos valores democráticos como participação popular, igualdade, dentre outros.

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Conclusões Essa reflexão sobre confiança institucional tem impacto no estudo da legitimidade, pois “a disposição para aceitar as decisões depende, por sua vez, do fato de que os cidadãos confiam no Estado e uns nos outros para cumprir com as demandas estatais” (NEV-USP, 2011, p. 9,). Dessa forma, a hipótese levantada acima pode trazer um indicador para a análise da legitimidade das subprefeituras. Com o estudo das especificidades das subprefeituras (contexto de implantação, atribuições, mudanças instituições provocadas pelo executivo), apresentadas nesse relatório, foi possível identificar elementos que contribuirão com a análise da legitimidade e da confiança na administração pública municipal, no âmbito do projeto CEPID 2013. As hipóteses e conclusões apresentadas aqui serão aprofundadas na pesquisa de campo, que permitirão avaliar as especificidades do contato do cidadão com a instituição.

Referências Bibliográficas ARRETCHE, M.T.S. Mitos da descentralização: mais democracia e eficiência nas políticas públicas. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 11, n. 31, p.44-66, jun, 1996. BONIFÁCIO, R.; SCHLEGEL. Serviços Públicos: O Papel do Contato Direto e do Cidadão Crítico nas Avaliações das Instituições. In: MOISÉS, J. A.; MENEGUELLO, R. (orgs). A Desconfiança Política e os Seus Impactos na Qualidade de Democracia. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2013. GRIN, E. J. Caminhos e descaminhos das subprefeituras na cidade de São Paulo no governo Marta Suplicy (2001-2004). 2011. Dissertação (Mestrado em Ciência Política) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. Disponível em: . Acesso em: 19-05-2014. MOISÉS, J. A. Confiança na Democracia e Desconfiança das Instituições Democráticas. In: MOISÉS,J. A. (org). Democracias e Confiança: Por que os Cidadãos Desconfiam das Instituições Públicas? São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2010. MORLINO, LEONARDO. Legitimacy and the quality of democracy. International Social Science Journal, V. 60, n. 196, p. 211–222, Junho 2009. NÚCLEO DE ESTUDOS DA VIOLÊNCIA (NEV/USP). Projeto Cepid: “Building Democracy Daily: Human Rights, Violence and Institutional Trust”. São Paulo: Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, 2011. REDAÇÃO. Haddad anuncia o fim da militarização das subprefeituras de SP. SPRESSO SP. São Paulo, 0301-2013. Disponível em: . Acesso em 05/08/2014. REDAÇÃO. Haddad tira coronéis das subprefeituras, mas mantém 14 funcionários de Kassab. Carta Capital. São Paulo, 03-01-2013. Disponível em: . Acesso em 05/08/2014. TYLER, T. R. Psychological Perspectives on Legitimacy and Legitimation. Annu. Rev. Psychol. 57: 375–400, 2006. TYLER, T.R., & FAGAN, J. (2008). Why do people cooperate with the police? Ohio State Journal of Criminal Law, 6, 231-275. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: . Acesso em 26/06/14. SÃO PAULO (MUNICÍPIO). Lei nº 13.399, de 1º de agosto de 2002. Dispõe sobre a criação de Subprefeituras no Município de São Paulo, e dá outras providências. Disponível em: . Acesso em 05/06/2014.

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