O Infante e a Madeira

June 20, 2017 | Autor: Alberto Vieira | Categoria: Island Studies, Madeira
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I

INDICE

ISABEL L. MORGADO S. E SILVA

9-

OInfante D. Hemique 11 Mestre" da Ordem Militar de Jesus Cristo HUMBERTO BAQUERO MORENO

23 -

OInfante D. Henrique em torno da regência do Infante D. Pedro ALBERTO VIEIRA

31 -

OInfante eaMadeira

65 ,...,

Os Judeus na época do Infante D. Henrique

MARIA JOSÉ FERRO TAVARES

LUÍS SOAREZ FERNANDEZ

75 -

Castilla yPortugal en la epoca dei Infante Don Henrique AIRES A. NASCIMENTO

85 ,...,

Odiálogo de André do Prado com oInfante D. Henrique: oHorologium Fidei SAUL ANTÓNIO GOMES

105 -

Perspectivas sobre os mesteirais das obras da Batalha no século XV

127 -

OInfante D. Henrique na História eHistoriografia: representações oitocentistas ealguns dos seus fundamentos

FILIPE NUNES DE CARVALHO

JOSÉ MANUEL MALHÃO PEREIRA

165 -

Experiências com instrumentos de navegação da época dos Descobrimentos AHMED BOUCHARB

19 3 -

Aimportância de Safi no Império Comercial Português

ALBERTO VIEIRA

OINFANTE EAMADEIRA

permitem várias leituras. A intenção é tão-só colocar o leitor perante um conjunto variado de informações que lhe possibilitem a sua leitura. Mesmo assim é possível retirar deste conjunto de dúvidas e certezas uma opinião unânime sobre o que terão sido os primeiros anos de ocupação e valorização económica das ilhas. Aqui a presença do Infante D. Henrique foi fundamental. A dúvida principal levanta-se quanto ao período de duração da mesma. Acresce, ainda, que o conhecimento aprofundado de tudo o que se passou no arquipélago da Madeira é fundamental para a compreensão do fenómeno daí decorrente. A Madeira, para além de ter sido a primeira terra portuguesa do Novo Mundo Atlântico, foi, por isso mesmo, modelo para todas as iniciativas levadas a cabo em novas áreas de ocupação.

INTRODUÇÃO Os documentos, para este período de cerca de 40 anos, são poucos e os que existem em quase nada satisfazem a curiosidade do investigador e público interessado. Sem dúvida, aquele que se nos apresenta mais importante pela informação que contém, suplanta o seu âmbito cronológico. É a resposta do infante D. Fernando às reclamações dos moradores feitas por dois procuradores idos da ilha 1 • As soluções e respostas aos pedidos permitem rastrear a situação vivida no tempo de governo do infante D. Henrique. À parte a documentação diplomática, existe um conjunto variado de fontes narrativas que abordam estes primeiros anos de ocupação do arquipélago. Aqui, a principal dificuldade é encontrar uma versão consensual para as diversas dúvidas que nos assaltam. E, lamentavelmente, a historiografia tem-se dedicado mais a descobrir as diferenças do que as suas semelhanças.

« •••

E NOVAMENTE ACHEI))

Foi desta forma que o infante D. Henrique reclamou em 8 de Setembro de 1460 3 o descobrimento das ilhas do arquipélago da Madeira. Novamente é aqui interpretado por todos como pela primeira vez, o que quererá significar que antes não haviam sido encontradas ou se o foram delas não ficara rastro na memória colectiva. Esta afirmação contraria a tradição histórica que testemunha o seu conhecimento desde meados do século XIV. Também, contradiz os textos coevos que apontam uma diversidade de versões para o seu encontro em época muito anterior ao infante. Sendo assim como interpretar semelhante intencionalidade? Para muitos ela prende-se com a disputa em torno das Canárias e da necessidade de preservar a sua posse quando aquelas estavam irre-

Por tudo isto, a história dos primeiros quarenta anos de ocupação do arquipélago, faz-se mais pelas dúvidas do que pelas certezas. A cada historiador ou erudito, que se debruça sobre a época, corresponde uma nova e, por vezes, original versão. A mais recente, é a de José Hermano Saraiva 2 . Por isso, porque não é nossa intenção entrar nesta lista, decidimo-nos por outro caminho, assim a nossa atenção será centrada na exposição nas dúvidas e certezas, reservando-se espaço separado para o debate dos temas polémicos e que

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quatrocentistas e quem as realizou? A tradição, que filia a ideia do encontro quatrocentista, releva o real protagonismo dos homens da casa do infante D. Henrique (João Gonçalves Zarco aliado de Tristão Vaz), que é como quem diz do próprio infante. De fora ficam Roberto Machim, os anónimos castelhanos e o incógnito navegador, Afonso Fernandes, referido apenas por Diogo Gomes 7 .

mediavelmente perdidas. Aqui, fez-se valer o "praescritio longissimo temporis" do direito romano e, por isso mesmo, havia que argumentar a prioridade lusíada. Daí resulta uma relação directa entre os dois arquipélagos, nos começos da expansão atlântica. D . João II, 1493 4 , é peremptório na reclamação dos direitos de posse pelos portugueses da ilha de Madeira, "porquanto essa ylha não foy de nossos antepassados nem della teveram dereyto algum dominio ante de ser descoberta y ocupada pello sennor rey nos o bisa vou ... , . Idêntica ideia surge em alguns cronistas, como Jerónimo Dias Leite.

Todavia, para o tema que nos motiva, o mais importante é saber quem ordenou e financiou tais expedições que levaram ao reconhecimento e ocupação da Madeira: o infante D. Henrique ou o rei D. João I ?

Esta mesma argumentação foi aduzida no debate em torno do descobrimento da ilha por Roberto Machim, no século XIV. Para alguns, foram os ingleses que criaram a "lenda, no século XVII para mais facilmente conseguirem a sua posse, como se vinha reclamando no dote da infanta D. Catarina 5 .

Esta dúvida liga-se como outra global sobre o real protagonismo da coroa e da casa do infante nos descobrimentos portugueses. O debate não é novo e tão-pouco deverá considerar-se encerrado neste momento de comemoração do nascimento do infante D. Henrique 8 . Tudo isto foi sustentado por Gomes Eanes de Zurara, com o texto que ficou conhecido por Crónica de Guiné. Deste modo, questionou-se a forma de intervenção do monarca e do infante no (re)descobrimento e ocupação do arquipélago.

Para além desta polémica que envolveu o descobrimento da Madeira por Machim, há a considerar todo o debate sobre o descobrimento das ilhas, encetado a partir da segunda metade do século XIX. Desde então até hoje a controvérsia manteve-se, alimentada num número inaudito de publicações. Não há consenso possível, mas, hoje, parece ganhar corpo a ideia de que o descobrimento das ilhas teve lugar em época anterior sendo a acção dos navegadores portugueses do século XV entendida como reconhecimento, ou como o referem alguns, descobrimento oficial 6 .

O infante refere que, desde 1425, participou activamente neste processo mas a documentação oficial só o menciona como tal a partir de 1433, data em que recebeu do rei o direito de posse das mesmas ilhas. Também, compilando as informações disponíveis, nomeadamente nos cronistas, constata-se que não é fácil diferenciar até onde chegou o real protagonismo de ambos.

As dúvidas começam a surgir quando procuramos respostas para os aspectos de pormenor. A eterna questão de quem, como e quando foi descoberto o arquipélago não p'arece de fácil solução. Os inúmeros estudos sobre o tema lançaram-nos para um mar de dúvidas e incertezas. As datas exactas do encontro e início do povoamento, situação que serve as efemérides e o empenho da sociedade política, não encontram fácil solução, porque algumas das mais credíveis fontes coevas divergem neste particular. A isto associa-se a dificuldade em identificar os verdadeiros protagonistas: quem ordenou as expedições

Certo, certo, é que a partir de 1433 o infante D. Henrique actuou de pleno direito nestas ilhas, comandando todo o processo efectivo de povoamento e valorização económica. É, na verdade, a partir da década de trinta que as ilhas passam a assumir importância no contexto dos descobrimentos portugueses. Elas afirmam-se como áreas de cultivo de produtos com alto valor mercantil, caso dos cereais, vinho e açúcar, e porta charneira para a expansão além-Atlântico, uma vez perdidas as esperanças na posse das Canárias. Note-se que as expedições de D. Fernando de

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Castro (1424) e António Gonçalves da Câmara (1427) foram inconclusivas para as reais aspirações henriqu inas. Ademais, neste processo as gentes fixadas na Madeira tiveram uma participação activa 9, daqui resultando uma ligação que só as represálias inerentes à guerra de Restauração conseguiram alterar.

aconteceu com os textos de Cadamosto 15 , Duarte Pacheco Pereira 16, Damião de Góis 17, Valentim Fernandes 18 e António Galvão 19 , ou então vilipendiadas, como sucedeu com o relato de Francisco Alcoforado 20 , D. Francisco Manuel de Melo 2 1, Giulio Landi 22 e Manuel Constantino 23 • Na actualidade, com a revelação de algumas fontes, como o texto de Francisco Alcoforado (1878-1961), de Jerónimo Dias Leite (1947) e o aparecimento de novos dados, é tarefa urgente reformular o ideário subjacente ao descobrimento da ilha. Eis uma síntese das nossas conclusões.

Em 1460, quando o Infante D. Henrique, à beira da morte, declarava os seus últimos desejos não se esqueceu de enun ciar os feitos insulares e o seu empenho no progresso das ilhas, nomeadamente religioso. Por isso mesmo, consignou aos madeirenses a obrigação perpétua de lhe rezarem uma missa todos os sábados do ano nas igrejas do arquipélago. Sabemos do seu cumprimento na Madeira até ao século xvrn 10, caindo depois no esquecimento. Somente em 1960 a celebração do centenário da sua morte veio colocar a questão da dívida não cumprida.

Todos os autores referenciados são unânimes em considerar o povoamento do arquipélago como obra portuguesa, tendo como obreiro o infante D. Henrique e por executor João Gonçalves Zarco, com ou sem o apoio de Tristão Vaz. Apenas Giulio Landi tem opinião diferente, pois para ele tudo foi feito por Machim. A polémica tem lugar quanto à data do descobrimento e à sua autoria. Para uns, as ilhas foram descobertas por portugueses: João GonÇalves Zarco com Tristão Vaz, ou Afonso Fernandes. Para outros esta é da iniciativa de estrangeiros : castelhanos (o Porto Santo), ou ingleses (Madeira).

DÚVIDAS E CERTEZAS

AS VERSÕES DO DESCOBRIMENTO DA MADEIRA E PORTO SANTO

De acordo com o texto de Gaspar Frutuoso o descobrimento da Ilha da Madeira teve lugar a 1 de Julho de 1419, desembarcando os portugueses na baía de Machico no dia seguinte, da visitação de Santa Isabel 11 . Esta versão poderá ser considerada como a oficial e foi a que conquistou a aprovação do madeirense que a estabeleceu como o marco para o dia da Região Autónoma.

Numa breve síntese podemos afirmar que existem quatro versões coevas, que serviram de base a todas as restantes: 1. Relação de Francisco Alcoforado, atribui odes-

cobrimento da ilha ao inglês Robert Machim e o reconhecimento aos portugueses; 2. Relação de Diogo Gomes 24 apresenta o descobrimento como sendo de iniciativa do piloto português Afonso Fernandes e o povoamento a João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz;

O descobrimento da Madeira, tal como Gaspar Frutuoso o apresenta, embora considerado como uma verdade adquirida e intransponível, carece de fundamentação e merece, à luz da crítica h istórica, inúmeros reparos . Estamos perante uma opção oitocentista que teve como base os testemunhos dos cronistas dos séculos XV e XVI, mais divulgados e que possibilitam a fundamentação desta tese oficial, isto é, de Gomes Eanes de Zurara 12 , João de Barros 13 , Gaspar Frutuoso 14 . É de salientar que todas as demais fontes que contrariam esta visão foram ignoradas, como

3. Zurara atribui a João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz o achamento das ilhas bem como o seu reconhecimento e povoamento; 4. Cadamosto aponta o descobrimento pelos homens do infante D. Henrique e o seu povoamento por João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz. É a estas quatro versões-base que a Historiografia

vai buscar os argumentos para a defesa das múl-

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Em todos os autores que defendem esta tese é manifesta a intenção nacionalista e patriótica, quer na hipervalorização da iniciativa dos portugueses, quer na marginalização de outras versões, assumindo em Álvaro Rodrigues de Azevedo e Eduardo Pereira uma crítica cerrada à versão de Machim.

tiplas teorias que se colocam. Neste contexto merecem a nossa atenção os textos de João de Barros e Gaspar Frutuoso. Ambos foram e continuam a ser o principal sustentáculo da tese oficial do descobrimento henriquino. Os seus arautos, aproveitando-se das lacunas do texto de Zurara, afinam pela visão posterior de Barros, repetida com grande evidência em Frutuoso. No entanto, quanto a este último, apenas o fazem de modo parcelar, uma vez que ignoram todas as outras versões aí compiladas. A divulgação de fontes inéditas, que apresentam argumentos contraditórios desta versão, não os convencem, pois tudo o que o contrariasse era considerado como falso ou apócrifo.

2. TESE TRECENTISTA contrapõe ao conhecimento quatrocentista a prova documental e cartográfica do seu achamento no século XIV. Estes, no entanto, divergem entre si, quanto à autoria das expedições que conduziram ao seu conhecimenta. Assim, para uns, a descoberta deveu-se a genoveses, catalães ou venezianos; outros apontam as mesmas expedições, mas ao serviço da coroa portuguesa, o que valoriza a iniciativa nacional deste empreendimento. No último caso é de destacar a polémica mantida entre M. d' Azevac 28 e J. Costa Macedo 29 e o Visconde de Santarém30 .

O debate que teve lugar a partir do século XIX, tendo como ponto de partida o estudo de Álvaro Rodrigues de Azevedo 25, deu origem ao aparecimento de várias teses sobre o descobrimento da Madeira. A polémica recrudesceu nas décadas de cinquenta e sessenta, por altura da comemoração da morte do infante D. Henrique 26 . Entretanto, para trás ficara a evocação do quarto centenário do descobrimento da Madeira, que foi uma importante manifestação na Madeira do primeiro quartel do nosso século 27 .

Em abono da autoria portuguesa do descobrimento temos, em 1894, a opinião de Brito Rebelo 31 que, baseado num documento de 1379, tenta esboçar uma explicação para o topónimo Machico. Segundo ele teria sido um certo Machico, mestre de barca, quem descobriu a ilha da Madeira, tendo desembarcado no local que mereceu o seu nome.

Não obstante, o vasto número de estudos existentes que, de um ou de outro modo, abordam a questão, podemos dizer que todo este movimento editorial se orienta de acordo com quatro ideias-base, que resumem toda a informação e fundamentação do problema:

3. TESE DE MACHIM, os que argumentam, em complemento da segunda tese, que o conhecimento do arquipélago resultou da aventura de Machim. É vasta a bibliografia sobre esta tese, sendo, no

1. TESE QUATROCENTISTA, os que argumentam, a partir de Zurara, João de Barros e Gaspar Frutuoso, considerando o arquipélago descoberto pelos portugueses no século XV, destacando a acção de Zarco e Tristão Vaz e o infante D. Henrique. A sua formulação e fundamentação foi definida, a partir de 1873, por Álvaro Rodrigues de Azevedo. Mais tarde, como o quinto centenário do descobrimento da ilha, é retomada por Fernando Augusto da Silva, saindo reforçada em 1960, no momento do quinto centenário da morte do infante D . Henrique, por Eduardo Pereira.

entanto, poucas as perspectivas aí enunciadas, uma vez que se denota um apego às visões clássicas, quer na afirmativa, quer na sua negação. Neste último caso a ideia expressa-se de acordo com a enunciação de Álvaro Rodrigues de Azevedo 32 e Eduardo Pereira 33 . Assim, em 1873, Álvaro Rodrigues de Azevedo referia já sete perspectivas diferentes da referida tese, que no essencial se resumem a três opiniões, amplamente divulgadas: -os que afirmam ser o relato pura lenda, carecendo de fundamento histórico, baseando a sua argumentação nas crónicas coevas.

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-os que defendem afincadamente a veracidade do relato, apresentando o necessário fundamento histórico,

cabado, a merecer redobrada atenção de historiadores e linguistas.

- os que perfilham urna opinião eclética, fazendo coincidir as versões anteriores no conhecimento da ilha.

4. TESE ECLÉTICA, os que procuram uma opinião de consenso entre as várias fontes e versões, perfilhando soluções intermédias, ou reforçando a sua dúvida em face de todas.

Esta tese foi definida pela primeira vez, em 1812, por N. C. Pitta 34 , a que se seguiu, em 1869, H. Major 35 . No entanto, só a partir deste último mereceu a sanha de Álvaro Rodrigues de Azevedo e Camilo Castelo Branco 36, que lançaram uma onda de descrédito sobre a aventura de Machim. Na actualidade, A. G. Rodrigues 37, Pita Ferreira 38 e Armando Cortesão 39 retomaram-na procurando apagar o descrédito vigente. Assim António Gonçalves Rodrigues preocupa-se em comprovar documentalmente a existência das personalidades envolvidas no relato, através de uma busca nos arquivos ingleses. Pita Ferreira, por seu turno, procura fundamentar a veracidade do relato dado por Francisco Alcoforado e os factos que se relacionam com o achado da cruz, que o testemunha, Robert Page 40 . Entretanto Armando Cortesão contraria a crítica dos seus detractores ao referir que as versões da aventura são todas portuguesas, não sendo razoável a opinião divulgada da sua origem inglesa. Não obstante, a intenção destes dois últimos não é a defesa da descoberta de Machim, mas sim enquadrar o facto no conhecimento trecentista, ou na tradição remota, conforme atestam as fontes greco-romanas.

Assim, Jordão de Freitas 44 e João Franco Machado 45 procuram conciliar as fontes que atestam um conhecimento trecentista com aquelas que apontam apenas para o século seguinte, concluindo por um processo contínuo de conhecimento ou reconhecimento e divulgação na Europa. Armando Cortesão e J. A. Betencourt 46 defendem a ideia do seu conhecimento desde tempos imemoráveis. No entanto, concordam, ainda que parcialmente, com as restantes versões, buscando nelas a informação necessária e esclarecida para a sua fundamentação. Após esta enunciação das principais opiniões ou versões parece-nos ilógico continuar a defender a opinião, embora comummente aceite, do seu primeiro conhecimento em 2 de Julho de 1419, por João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz Teixeira. Esta, à luz do que atrás foi dito, carece de fundamento histórico. Além disso, a opinião de Gaspar Frutuoso parece-nos pouco válida, uma vez que o autor relata um facto que não presenciou e que se passara há mais de 160 anos, recorrendo, por isso, à tradição escrita e oral. Por outro lado, o mesmo autor, que serve de fundamento à versão oficial, nos cinco volumes que dedicou à história das ilhas do Atlântico não apresenta uma certeza do descobrimento quatrocentista e henriquino, antes fica-se pela compilação do maior número de versões existentes até à data da sua escrita. E, deste modo, o texto que serviu de base à fundamentação à tese oficial poderá ser utilizado na defesa da descoberta de Machim.

A defesa do descobrimento da ilha por Machim está subjacente à existência e veracidade da relação de Francisco Alcoforado . Para muitos é uma criação do século XVII e, por isso mesmo, carece de fundamento a versão que veicula. Muito se escreveu sobre isto, mas apenas Ernesto Gonçalves 41 teve a coragem de avançar com uma análise de crítica interna, onde veio a revelar-nos alguns problemas. Mais recentemente, Luís de Sousa Melo 42 retoma este tipo de análise com novos dados. A isto acresce a mais recente apartação de David Pinto Correia que procura enquadrar o relato dentro do panorama literário da época 43 . Todavia este é um percurso ainda ina-

Perante informação tão contraditória que credibilidade merece uma tese fundamentada apenas numa perspectiva? Que razões encontrou a historiografia do século XIX e princípios do século XX para valorizar a denominada versão oficial ? Que motivos levaram a historiografia a alhear-se das

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fontes coevas, como Zurara, Cadamosto, Francisco Alcoforado, Diogo Gomes e Jerónimo Dias Leite?

manuscritos que serviram de fonte a esta versão: primeiro o da Biblioteca Nacional de Madrid revelado em 1878 por Cesareo Fernandes Duro, depois o da Biblioteca do Paço Ducal de Vila Viçosa, apresentado ao público em 1960 por Juan Fontvieille.

A «LENDA )) DE MACHIM

Foi o Padre Pita Ferreira 50 o único, entre os eruditos madeirenses, que se atreveu a defender a veracidade deste relato não colhendo qualquer apoio. O tema apaixonou a geração dos historiadores do cenáculo e dela passou ao público. Mas, disto pouco ou nada resultou, uma vez que todos se preocuparam em defender aprioristicamente a sua versão, esquecendo o estudo crítico do documento e a necessidade de inserção ou não na contextualidade da época. Aqui a existência de documentos que corroborassem a existência dos protagonistas e a ausência de anacronismos no relato eram e continuam a ser o único meio capaz de assegurar a sua veracidade. Todos ignoraram a crítica interna do texto e preocuparam-se mais com o acolhimento que o tema merecia junto dos literatos ingleses . O espectro do medo que isto fosse usado para reivindicação da posse por parte dos ingleses foi o mote para a sua negação como facto histórico.

No debate do descobrimento da Madeira surge uma importante questão: a relação da viagem de Machim pode ser considerada como verdadeira ou, ao invés, é apenas uma lenda? Esta é, sem dúvida, a versão que mais tem entusiasmado o público preocupando os historiadores e eruditos que se debruçam sobre a história dos primórdios da ilha. Tal como vimos atrás, desde finais do século XVI, com a célebre compilação de Gaspar Frutuoso, que a História da Madeira se debate com o problema da data e propriedade da sua descoberta sem que seja possível uma opinião de consenso e de acordo com as fontes históricas. Aqui, os interesses políticos sobrepuseram-se aos testemunhos históricos conduzindo-a para uma profissão de fé, alheando-se dos dados concludentes da cartografia ou da veracidade da polémica Relação de Francisco Alcoforado. Este relato atribui o primeiro descobrimento da ilha a Robert Machim, antes de 1344, aquando da sua fuga de Bristol com Ana Arfet . E, de acordo com o testemunho de Valentim Fernandes, o nome dado à baía onde apartaram foi Machim, sendo o Matchico a sua corruptela. Estava assim encontrada a relação entre Machim e Machico.

Em 1861 o Rv. Samuel Lysons 51 preocupou-se com a questão e escreveu um opúsculo apresentando provas doumentais que atestavam a veracidade do relato. Foi ele quem primeiro encontrou documentos probatórios da existência do par amoroso que protagonizou a aventura. Aliás, em 1943, H. A. Machen 52, um dos descendentes deste Machim trecentista, traçou-nos de forma precisa a genealogia dos seus ascendentes . Em 1940 António Gonçalves Rodrigues apresentou parte destas provas genealógicas dos Machins de Bristol, corroborando a veracidade do relato.

Todavia, o facto deste relato ter chegado ao conhecimento dos eruditos sob a forma de opúsculo anónimo, editado em 1671 4 7 em Paris, e através do texto novelesco de D. Francisco Manuel de Melo, a Epanáfora Amorosa, não colheu muitas opiniões a seu favor. E, deste modo, a partir da sua defesa por Henry Major em 1868 48 logo se levantaram inúmeros protestos da Historiografia nacional. O primeiro a ditar a sentença foi Álvaro Rodrigues de Azevedo em 1873 nas anotações às Saudades da Terra. A extensa nota V 49 , lida e relida pelos eruditos locais foi o veredicto final contra a veracidade do relato. Com isso ignorou-se, por exemplo, o aparecimento dos

A tudo isto acresce a existência de dois outros Machins . Nas Canárias é referenciado um Juan Machim 53 , enquanto em Lisboa no ano de 1544 temos um Machym Fernandes. Entretanto, em 1894 Brito Rebelo 54 revela-nos um Machico, mestre de barca em Lisboa, que foi motivo de regozijo para todos os que se preocupavam em negar

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a relação deste local com Machim. Este era sem dúvida um argumento mais plausível que a associação ao topónimo Monchique.

causa a prioridade lusíada na sua revelação, pois um dos protagonistas é marinheiro português . Por outro lado o nome dado à baía radicar-se-ia, como vimos, a origem neste Macheco, filho de marinheiros lusos, e não deverá ser entendido como uma corruptela de Monchique ou Machim. Esta foi uma atitude comum entre os marinheiros portugueses.

A descoberta recente de dois documentos dos arquivos britânicos parecem trazer nova luz. Em 1373 55 surge o apelido Macheco atribuído a um patrão de navio de Portugal que se dirigia para St. Mallo. Mais tarde, uma ordem de expulsão de Henrique IV datada de 1406 56 apresenta uma lista de estrangeiros a expulsar da Inglaterra, temos um Macheco e um Machim. Este último documento adquire importância uma vez que faz associar o Machim ao Macheco e diz-nos que os mesmos teriam saído de Inglaterra em 1406. Se a este facto juntarmos o relato de Francisco Alcoforado teremos uma maior consistência entre a aventura de Machim e o descobrimento de João Gonçalves Zarco por intermédio da informação do piloto João de Amores. Note-se, que a disparidade de datas entre ambos os factos é um dos argumentos mais seguros na contestação da relação. Entre este facto e o reconhecimento por João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz mediaram apenas treze anos, enquanto em relação à anterior data (1344) passavam setenta e cinco anos, o que seria impossível a transmissão do relato por meio de sobreviventes.

A QUEM ATRIBUIR O COMANDO DO DESCOBRIMENTO E POVOAMENTO DA MADEIRA: O REI OU O INFANTE Uma das questões mais debatidas nos primórdios da História da Madeira prende-se com o real protagonismo do rei e do infante D. Henrique, no processo de (re)descobrimento e ocupação das ilhas do arquipélago 57 . A leitura das crónicas coevas e quasi-coevas leva-nos a concluir que tudo começou sob a orientação da coroa. De todos o mais esclarecedor é a "relação de Francisco Alcoforadou 58 . De acordo com esta o infante ordenou a João Gonçalves Zarco .. fosse logo a El Rey a Lisboa" e foi o rei quem mandou preparar as embarcações para a viagem de reconhecimento da ilha 59 como, depois, de povoamento 60 .

Deste modo é muito plausível que estes tenham sido os protagonistas da façanha relatada por Francisco Alcoforado, sendo Macheco, o mestre da embarcação que em Machico encalhou e que por isso mesmo teria dado o nome ao porto de salvamento. Tendo em conta a proximidade de datas entre este e o referido em 1416 em Lisboa é muito natural que seja o mesmo ou um familiar seu, que com certeza não esteve alheio a esta realidade. A forma como o relato foi escrito por Francisco Alcoforado pode ser justificada pela necessidade de enfabular o feito, de acordo com os cânones da época, apresentando-o como resultado de uma aventura amorosa. Esta não é uma situação inédita na tradição literária que testemunhou a revelação do oceano Atlântico.

O próprio infante D. Henrique testemunha este real protagonismo de seu pai ao afirmar em 1460 que «Por serviço de El Rey meu senhor e padre de virtuosa memória, (... ) comecei a povoar a minha ilha de Madeira haverá ora :xxxb anos, E assim mesmo a de Porto Santo E dessy prosseguindo a deserta( ... )" . Todavia, esta ideia contrasta com outra veiculada pelo próprio infante nas cartas de doação das capitanias de Madeira " e Porto Santo. Em 1440, ao conceder a posse da capitania de Machico a Tristão Vaz, ele declara que este havia sido uum dos primeiros que por seu mandado fora povoar as ditas ilhas". O mesmo surge quanto ao Porto Santo em 1446 e ao Funchal em 1450. Neste último caso o infante considera João Gonçalves Zarco como «O primeiro que por seu mandado povoara a ilha" .

A partir daqui poder-se-á afirmar, com segurança, a veracidade do relato sem que isso ponha em

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Nada disto é novidade pois radica-se na opinião veiculada pelo imaginário nacional, tomada indelével pelos cronistas peninsulares. Assim, em Portugal, os cronistas Gomes Eanes de Zurara, João de Barros, Rui de Pina, Garcia de Resende e Gaspar Frutuoso haviam justificado perante os homens do seu tempo e testemunhavam aos vindouros as razões da reivindicação henriquina 66 . Do último temos o retrato expressivo deste afrontamento : " ... os castelhanos contam com isso doutra maneira que n em El-Rei de Portugal, nem o infante D . Henrique, as quiseram largar até chegarem a direito diante do papa Eugénio quarto, veneziano, o qual, vendo isto deu a conquista daquelas ilhas por sentença a El-Rei D. João de Castela no ano mil quatrocentos e trinta e um, por onde cessou esta contenda das Canárias entre os reis de Portugal e Castela, 67 .

En tretanto em 1443 D. D uarte reclamava a sua intervenção referindo as ilhas «que agora novamente o dito infante per nossa autoridade pobra". Mas, já o rei D. Afonso V, em 1454, tem outra opinião ao afirmar que «por serviço de Deus e nosso conquistou e povoou" as ilhas de Madeira e Porto Santo. Esta ideia é expressa, mais tarde, pelo capitão do Funchal, Simão Gonçalves da Câmara: "esta ilha era uma horta do senhor infante e ele pôs e trouxe a semente e plantou estas canas e a deu a toda a ilha à sua própria custa (... )» 61.

O INFANTE DOM HENRIQUE À CONQUISTA DO SENHORIO DE LANZAROTE O infante D. Henrique não se ficou apenas pela Madeira pois manifestou empenho na conquista de algumas das ilhas das Canárias. Daqui resultou o conflito bélico e diplomático que perdurou at é 1479. A questão não era nova, pois arrastava -se já desde o século XIV, novos são os prot agonistas e os interesses em jogo. Note-se que esta divergência de opiniões e interesses contagiou os cronistas da época e repercutiu-se nas visões veiculadas pela Historiografia peninsular 62. A importância do conflito não se esgota na expressão das ambições dos seus protagonistas, uma vez que se reflecte no devir histórico consequente ao firmar as conexões humanas e comerciais com a Madeira 63 .

A disputa pela posse das ilhas Canárias foi o prelúdio de outras e do confronto de objectivos exclusivistas, bem patentes nos reinos peninsulares . A defesa do Mare Clausum e os problemas sucessórias das coroas provocaram o afrontamento entre Portugal e Castela, ao mesmo tempo que catalisaram as atenções da Europa para uma intervenção directa ou indirecta no conflito . Tudo começou no mundo insular, pois o seu domínio assegurava a hegemonia e exclusivo das navegações e comércio no Atlântico. A intervenção do infante D . Henrique, a partir de finais do primeiro quartel do século XV, deu um novo rumo à querela. Com ele retomou-se a pretensão portuguesa ao domínio e cristianização das Canárias . O alheamento parcial da coroa castelhana favoreceu e reforçou a posição henriquina em face da burguesia andaluza. A esta interessava a posse das Canárias pelo facto de serem um importante mercado de escravos e materiais corantes e, mesmo, base de apoio para as posteriores incursões no litoral africano 68 . O monarca de Castela, grato pela intervenção da família de Las Casas, decidiu premiar o seu esforço solicitando, em 2 de Maio de 1421, ao papa a confirmação da posse das ilhas de Gran Canaria, Tenerife, La Gomera e La Palma a Afonso de Las Casas 69 •

A historiografia peninsular dedicou muitas páginas ao tratamento da questão. A conjuntura histórica em que foram escritos estes textos fez com que se estabelecessem duas perspectivas de análise diferentes, de acordo com a nacionalidade do seu proponente. Por Portugal tivemos, num primeiro momento, José da Costa Macedo e o Visconde de Santarém a defender a prioridade da descoberta e a legitimidade da soberania lusíada 64 . Entretanto, a escola historiográfica espanhola, nomeadamente canária, reclama a prioridade e soberania castelhana, como se poderá verificar em Elias Serra Ráfols e Buenaventura Bonnet 65 .

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Perante isto, ao infante D. Henrique restavam apenas duas alternativas: por um lado a solução diplomática, fazendo valer os direitos portugueses junto do papado e, por outro, o recurso a uma intervenção bélica, legitimada pelo espírito de cruzada, no sentido de ocupar as ilhas ainda não conquistadas. Assim, tivemos as expedições de D. Fernando de Castro (1424-1440) e de António Gonçalves da Câmara (1427) . No âmbito diplomático as vitórias foram efémeras. A concessão papal em 1436 do direito de conquista das ilhas não ocupadas por cristãos durou enquanto não surgiu a reacção castelhana, isto é, menos de um mês 70 • Todavia D. Duarte, ignorando as alegações apresentadas pelo bispo de Cartagena ao Concílio de Basileia (1435) e a deliberação papal, prossegue a política de intervenção directa no arquipélago, concedendo ao infante D. Henrique em 1446 o exclusivo do comércio e navegação 71 .

rense para esta promissora terra. Assim, decorridos apenas 26 anos de povoamento, os colonos madeirenses actuam na disputa pela posse das Canárias ao serviço do Infante. Em 1446 João Gonçalves, sobrinho de Zarco, é enviado pelo infante a Lanzarote como plenipotenciário para firmar o contrato de compra da ilha. Acompanham-no caravelas de Tristão Vaz, capitão donatário em Machico e de Garcia Homem de Sousa, genro de Zarco 77 . Passados alguns anos em 1451, o infante enviou nova armada, organizada pelos moradores de Lagos, Lisboa e Madeira, participando nela Rui Gonçalves, filho do donatário do Funchal 78 . Esta intervenção madeirense na empresa canária conduziu a uma maior aproximação dos dois arquipélagos ao mesmo tempo que influenciou o traçado de vias de contacto e comércio . Do nosso lado foi o saque fácil de mão-de-obra escrava para a safra do açúcar e o recurso ao cereal e à carne, necessários à nossa dieta alimentar 79 • Pelas Canárias foi o recurso à Madeira como porto de abrigo das gentes molestadas com a conturbada situação que aí se viveu no século XV. Esta corrente emigratória começou com Maciot de Bettencourt. O sobrinho do conquistador de Lanzarote preferiu o sossego da vila do Funchal ao governo da sua ilha 80 . Este foi o primeiro passo de ramificação atlântica desta família normanda 8 1. No desterro de Maciot de Bettencourt acompanharam-no a sua filha Maria e os seus sobrinhos e netos Henrique e Gaspar. Todos eles conseguiram uma posição de prestígio e avultadas fazendas mercê do relacionamento matrimonial com as primeiras famílias da Madeira . D. Maria de Bettencourt, por exemplo, casou com Rui Gonçalves da Câmara, filho segundo do capitão do donatário do Funchal.

E, para assegurar esta determinação organizaram-se no mesmo ano três expedições. Em 1448 a questão toma novo rumo com os desentendimentos entre os Bettencourts e os Perazas, o que veio favorecer os desejos do Infante D. Henrique. Maciot de Bettencourt aceitou a proposta de venda do direito de posse do senhorio da ilha de Lanzarote por 20.000 reais brancos ao ano e alguns interesses na Madeira, para onde se retirou com a família 72 . Com o objectivo de assegurar a posse do senhorio o infante enviou em 1440 e 1441 duas armadas, que provocaram imediata reacção de Castela em 1452 73 • A isto seguiu-se o recurso aos missionários franciscanos com o intuito de evangelizar os aborígenes 74 . Entretanto em 1455 o monarca Henrique IV de Castela doa aos Condes de Atouguia e Vila Real o senhorio das ilhas de Canária, Tenerife e Palma 75 • De imediato a coroa portuguesa solicitou a confirmação papal da referida doação 76 . Mas, o monarca castelhano, mediante a reclamação de Fernão de Peraza, teve de voltar atrás na sua palavra.

«{ .•. ) QUE AGORA NOVAMENTE O DITO YFANTE PER NOSSA AUTORIDADE POBORA))

A proximidade da Madeira ao arquipélago canário em conjugação com o rápido surto do povoamento e valorização socioeconómica do solo madeirense orientaram as atenções do madei-

Assim se expressava em 1433 o rei D. Duarte, ao conceder a posse das ilhas da Madeira, Porto Santo e Deserta ao infante D. Henrique. A par-

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tir de então o infante vê legitimado o seu direito de orientação do povoamento e administração do novo espaço insular.

então desconhecida" e que "nunca dantes fora habitada". Idêntica é a opinião de Jerónimo Dias Leite 82 , peremptório em afirmar, que perante os navegadores se deparava uma «terra brava e nova, nunca lavrada, nem conhecida desde princípio do mundo até aquela hora". Desta forma o empenho das gentes e autoridades peninsulares, aliado ao investimento e experiência italiana, contribuíram para que em pouco tempo na Madeira a densa floresta fosse substituída por extensas clareiras de arroteamento.

O povoamento e o consequente processo de valorização económica da Madeira surgem, no contexto da expansão europeia dos séculos XV e XVI, como o primeiro ensaio de processos, técnicas e produtos que serviram de base à afirmação dos Portugueses no espaço atlântico, continental e insular. Aqui foram lançadas, na década de 20, as bases sociais e económicas daquilo que será definido como a civilização atlântica. Tal situação resulta do facto de a Madeira ter sido a primeira área atlântica a merecer o impacto da humanização peninsular. Enquanto nas Canárias tardava a pacificação guanche e se esvaneciam as esperanças da posse henriquina, na Madeira os cabouqueiros europeus lançam-se num plano de exploração intensiva do solo virgem. Ao empenhamento dos tradicionais descobridores juntam-se os interesses da coroa, do infante D. Henrique e da comunidade italiana sediada em Portugal.

À luz do acima enunciado, torna-se forçoso considerar que a acção lusíada na década de 20 se define por um processo de povoamento, e nunca colonização, pois estamos perante uma porção de terra inabitada cuja paisagem foi humanizada apenas com a entrada portuguesa 83 . Além disso, a peculiaridade do processo de ocupação resulta em muito da situação de abandono em que se encontravam as ilhas, o que permitiu o ensaio de técnicas, produtos e formas de organização do espaço sem qualquer entrave humano. Os resultados deste ensaio foram de tal modo profícuos que o exemplo madeirense terá não só um lugar de evidência no contexto da expansão peninsular, mas surgirá também como ponto de referência ou modelo para as outras experiências de povoamento que se seguiram.

A década de setenta é dada como o momento de arranque efectivo do povoamento dos Açores e das Canárias. Ora isto sucede numa altura em que a Madeira surgia já como um importante entreposto de comércio e de apoio à navegação. Para isto haviam contribuído as condições oferecidas pela ilha, a conjuntura atlântica de então, e o forte empenhamento dos promotores e principais protagonistas do povoamento. Nos dois arquipélagos vizinhos os entraves foram enormes. Dum lado os sismos e os vulcões atemorizam os colonos açorianos, do outro foi a forte resistência dos aborígenes canários à pacificação castelhana.

De acordo com as crónicas quatrocentistas e quinhentistas, o processo, que decorreu a partir de 1418, foi faseado . Zurara refere quatro expedições à ilha antes que o infante ordenasse o envio dos primeiros colonos e clérigos para o arranque do seu aproveitamento . A mesma ideia surge na «Relação de Francisco Alcoforado". P.• Manuel Juvenal Pita Ferreira 84 especifica melhor as quatro viagens: Dezembro 1418 85 e princípio de 1419 ao Porto Santoi Junho de 1419 e Maio de 1420 à Madeira. Se tivermos em consideração as condições técnicas e náuticas das referidas expedições, teremos de atribuir quatro anos para o reconhecimento cabal da ilha e início da ocupação efectiva.

Os testemunhos dos cronistas são evidentes quanto ao facto da inexistência de uma população no solo madeirense. Assim, para além das referências à abordagem do Porto Santo por castelhanos, vindos das Canárias, e da presença de Machim na baía de Machico, nada mais indiciava uma preocupação anterior de humanização destas ilhas. Cadamosto afirma "que fora até

A forma de ocupação e valorização económica da Madeira foi ao encontro das solicitações da conjuntura interna do Reino e do espaço orien-

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-se um novo regimento ou foral, que confirma as ordenações régias, estipulando que as terras deverião ser distribuídas apenas por um prazo de cinco anos, findo o qual caducava o direito de posse e a possibilidade de nova concessão.

tal atlântico. No primeiro caso, surge como resposta à disputa das Canárias e à ingente necessidade de encontrar um ponto de apoio para as operações do litoral africano. Zurara faz disso eco ao referir que as embarcações portuguesas tinham escala obrigatória na Madeira, onde se proviam de «Vitualha as ilhas da Madeira, porque havia aí já abastança de mantimentos, s6.

A primeira missão dos capitães foi proceder à distribuição de terras. Assim o testemunha Francisco Alcoforado, ao referir que João Gonçalves Zarco, após a segunda viagem, empenhou-se em tal tarefa. Uma das prerrogativas desta função era a possibilidade de reservar para si e familiares algumas das terras de sesmarias . E isso foi o que o mesmo fez . Ainda, segundo Francisco Alcoforado, João Gonçalves Zarco apropriou -se do alto de Santa Catarina, no Funchal, e das terras altas de Câmara de Lobos . Mais além, na Calheta, tomou duas Lombadas para os seus filhos João Gonçalves e Beatriz Gonçalves .

Para os cronistas tudo começou no Verão de 1420. Nesta data o monarca ordenou o envio de uma expedição comandada por João Gonçalves Zarco para dar início à ocupação da ilha. Acompanhavam-no Tristão Vaz Teixeira, Bartolomeu Perestrelo, alguns homiziados que "querião buscar vida e ventura forão muitos, os mais delles do Algarve , 87 . De acordo com o capítulo de uma carta régia 88, João Gonçalves foi incumbido de proceder à distribuição de terras, conforme o regulamento entregue. Estes capítulos de um pretenso regimento para a distribuição de terras são diferentes dos demais que se seguiram, pois para além da demarcação social dos agraciados estabelecem um prazo alargado de 1O anos. Assim, os vizinhos de mais elevada condição social e possuidores de proventos recebem-nas sem qualquer encargo enquanto os pobres e humildes que vivem do seu trabalho apenas as conseguiram mediante condições especiais, só adquirindo as terras que possam arrotear com a obrigatoriedade de as tornar aráveis num prazo de dez anos. Estas cláusulas, a serem verdadeiras, favoreceram a posição fundiária dos primeiros povoadores e contribuíram para o aparecimento de grandes extensões que mais tarde serão vinculadas.

Nas décadas seguintes, a concessão de terras de sesmaria e a legitimação da sua posse geraram vários conflitos, que implicaram a intervenção legislativa do senhorio ou o arbítrio do seu ouvidor. Em 1461, os madeirenses reclamavam contra a redução do prazo para aproveitamento das terras de sesmaria, dizendo que estas eram «bravas e fragosas e de muytos arvoredos ". Contudo, o infante D. Fernando não abdicou do foral henriquino e apenas concedeu a possibilidade de alargamento do prazo mediante análise circunstanciada de cada caso pelo almoxarife 90 . Desde 1433 e até 1495, a concessão de terras de sesmaria era feita pelo capitão, em nome do donatário. A carta deveria ser lavrada pelo escrivão do almoxarifado, na presença do capitão e do almoxarife. No seu enunciado constavam obrigatoriamente as condições gerais que regulavam este tipo de concessão do terreno, capacidade de produção e a cultura adequada à sua exploração, bem como o prazo de aproveitamento. O colono ou sesmeiro deveria cumprir o clausulado. Findo o prazo estabelecido, este podia vender, doar, "escambar o fazer dela e em ela como sua própria coisa , .

A partir de 1443, com a doação do senhorio das ilhas ao infante D. Henrique, o poder de distribuir terras é uma atribuição do senhorio, mas " sem prejuyzo de forma do foro per nos dado aas ditas ylhas em parte nem em todo nem em alheamento do dito foro, 89 , o que comprova mais uma vez que a primeira iniciativa e regulamento de distribuição de terras coube ao monarca. O infante, fazendo uso destas prerrogativas, delegou nos capitães os seus poderes. A isso junta-

São poucas as doações de terras que resistiram ao correr dos tempos e que ficaram a testemu-

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nhar e legitimar esta forma de distribuição de terras. Conhecem-se apenas 4 cartas de sesmaria:

maioria escudeiros e criados, que adquiriram uma posição proeminente ao nível administrativo e fundiário 96 . Mesmo assim João Gonçalves Zarco sentiu dificuldade em encontrar varões de qualidade para desposarem as suas filhas, tendo solicitado ao monarca o seu envio 97 . Isto poderá ser o indicativo de que a aristocracia do reino apostava mais nas façanhas bélicas em Marrocos do que num projecto de povoamento. A enxada não lhes era familiar. Por outro lado confirma o fracasso de Zarco no recrutamento de gente nobilitada, que foi suprida com aqueles que pretendiam .. buscar vida e ventura, 98 . Este processo foi faseado podendo-se definir três momentos. Logo na década de vinte foram os aventureiros e companheiros de Zarco e Tristão. Depois em meados da centúria surge novo grupo, atraído pela fama das riquezas da ilha, alguns deles filhos segundos de famílias nobilitadas do norte. E, finalmente, a partir da década de sessenta, após a morte do infante, é o entusiasmo contagiante de estrangeiros, nomeadamente, oriundos das cidades italianas, a quem as portas se encontravam abertas.

1477 /Maio/3. Concessão feita por João Gonçalves Zarco a Gil Gonçalves, com condição de aproveitar em 3 anos 91 : 1452/Dezembro/2. Concessão pelo mesmo João Gonçalves Zarco a Álvaro Gonçalves e Briolange Afonso, com condição de aproveitar em 5 anos 92; 1454/Fevereiro/11. Carta de firmidação das terras que João Gonçalvez Zarco tomou para si, conforme carta de doação 93 ; 145 7/ Abril/29. Concessão de terras a Henrique, a Henrique Alemão, por prazo de 5 anos 94 com confirmação régia de 18 de Maio. De todos os documentos o mais completo é o de 1457. Aí surgem exaradas as condições em que foi estabelecida a posse das terras. Esta poderá ser considerada uma carta modelo, pois aí juntavam-se todas as recomendações: limites da terra, as benfeitorias a implantar e o tipo de culturas (vinhas, canaviais, horta) 95 . O povoamento da ilha, iniciado na década de 20 a partir dos núcleos do Funchal e Machico, rapidamente alastrou por toda a costa meridional, surgindo novos núcleos em Santa Cruz, Câmara de Lobos, Ribeira Brava, Ponta do Sol e Calheta. As condições orográficas condicionaram os rumos da ocupação do solo madeirense, enquanto a elevada fertilidade do solo e a pressão do movimento demográfico implicaram o rápido processo de humanização e valorização socioeconómica da ilha.

ORIGEM DOS PRIMEIROS COLONOS: DO ALGARVE? É comum afirmar-se que os primeiros povoadores da Madeira são oriundos do Algarve. Esta ideia filia-se na tradição algarvia da gesta expansionista e na expressão de Jerónimo Dias Leite "muitos do Algarve, 99 . Todavia, a dedução parece-nos apressada, uma vez que faltam provas que a corroborem. Senão, vejamos. Numa listagem dos primeiros povoadores referidos nos documentos e crónicas, a presença nortenha (64%) é superior à algarvia (25% ). Por outro lado, os registos paroquiais da freguesia da Sé (desde 1539), no período de 1539 a 1600, confirmam essa ideia uma vez que os nubentes oriundos de Braga, Viana e Porto representam 50% do total, enquanto os provenientes de Faro não ultrapassam os 3% 100 . Tudo isto contraria o estudo de Alberto Iria que, ao contrário do que se possa pensar não foi capaz de responder às dúvidas que o tema suscita 101 •

A costa norte tardou em contar com a presença de colonos, contribuindo para isso as dificuldades de contacto por via marítima e terrestre. Não obstante, refere-se já na década de 40 a presença de gentes em S. Vicente, uma das primeiras localidades desta vertente a merecer uma ocupação efectiva. Aos primeiros obreiros e cabouqueiros seguiram-se diversas levas de gente, entusiasmadas com o progresso da ilha. Neste grupo surgem trinta e seis apaniguados da casa do infante, na sua

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Note-se que esta ideia mantém-se na actualidade e continua a merecer a aprovação de muitos estudiosos 102 . Todavia, os mais eminentes investigadores madeirenses hesitam entre a procedência minhota ou algarvia dos primeiros colonos 103 . Ernesto Gonçalves, no entanto, é ' peremptório em apontar a ascendência minhota dos primeiros obreiros do povoamento do arquipélago 104 •

agora novamente o dito infante per nossa autoridade pobra " . Quererá isto dizer que o infante só nesta data assume o comando do processo? Não. Pelo menos esta não é a opinião do infante, que nas cartas de doação das capitanias apresenta João Gonçalves Zarco, Tristão Vaz e Bartolomeu Perestrelo, como os primeiros povoadores por seu mandado. Será que só podemos falar de povoamento a partir de 1425 ou 1433, contrariando a opinião dos cronistas? A resposta parece ser também negativa, à luz daquilo que nos dizem dois documentos . Primeiro, uma sentença do Duque D. Diogo de 6 de Fevereiro de 1483 105 refere que «podia haver cincoenta e sete anos, pouco mais ou menos, que a essa ilha fora João Gonçalves Zarco, capitã que fora nessa ilha, levando consigo sua mulher e filhos e outra gente .· ·" · Depois, noutra sentença Diogo Pinheiro, vigário de Tomar em 1499, afirma: «podera bem aver oytenta annos que a dieta ilha era achada pouco mais ou menos e se começara a povoar" 106 . Esta versão é corroborada em 27 de Julho de 1519 por acórdão da Câmara do Funchal em que se dá conta do início do povoamento há cem anos atrás. Ambos os documentos abonam versões diversas: enquanto o primeiro coincide com a data apontada pelo infante, o segundo corrobora os cronistas.

Tendo em consideração que o povoamento da Madeira é um processo faseado, em que intervêm colonos oriundos das mais recônditas origens, e que de todo o Reino surgem gentes empenhadas nesta experiência tentadora, é de prever a confluência de várias localidades, em especial as áreas ribeirinhas- Lisboa, Lagos, Aveiro, Porto e Viana - , adestradas no arroteamento de terras incultas. Se é certo que do Algarve partem muitos dos apaniguados da casa do infante, com uma função importante no lançamento das bases institucionais do senhorio, não é menos certo que do norte de Portugal, nomeadamente da região de Entre Douro e Minho, provêm os cabouqueiros necessários ao desbravamento da densa flo resta e preparar o solo para as culturas mediterrânicas - cereal, vinha, cana-de-açúcar e pastel. O Norte de Portugal, quer pelo facto de ser a região do País mais densamente povoada, quer pela sua permanente vinculação à economia madeirense, exerceu aqui uma decisiva influência.

Por tudo isto a única conclusão plausível é de que o povoamento efectivo terá começado a partir do fim do último quartel do século XV. Os seis anos que medeiam entre esta data e o seu reconhecimento não deverão ser encarados como de total alheamento, pois o processo não parou.

A DATA DE INÍCIO DO POVOAMENTO: 1420-1425-1433

Um dos muitos pontos polémicos no início de História da Madeira é a data em que o solo virgem começou a ser desbravado pelos primeiros colonos europeus. Os cronistas são unânimes em definir o ano de 1420 como o de começo . Todavia, surgem opiniões diferentes, como a do infante D. Henrique, que em 1460 declarava: «Comecei a povoar a minha ilha da Madeira averá ora XXXb anos ... ", isto é, a partir de 1425 ele iniciara o povoamento da ilha. Mas, na doação régia de 1433, o monarca afirmara "que

A « ... HORTA DO SENHOR INFANTE» Foi desta forma que o capitão do Funchal em 1511 107 , em carta dirigida ao rei, definiu o período de governo do infante D . Henrique. Na verdade, assim aconteceu. O infante, desde 1433, assumiu de pleno direito a posse das ilhas: procedeu à distribuição das terras pelos apanigua-

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dos que estiveram empenhados no reconhecimento delas; estabeleceu os regimentos para o governo das capitanias; definiu os seus direitos e usufrutos; ordenou o lançamento de sementes -cereais- e o transplante de videiras e socas de cana. Em pouco tempo a ilha da Madeira transformou-se numa horta que, de direito, pertencia o senhor infante. Para aí foi estabelecida uma estrutura institucional adequada, tendo como ponto de partida o Infante e as prerrogativas estabelecidas pela coroa em 1433.

Nesta carta de doação estão claramente expressas algumas limitações, isto é, aspectos que a coroa não abdica da sua própria intervenção: 1. A doação é vitalícia: "e aia de nos em todollos dias de sua vjda as nossas ilhas» . 2. Justiça: " com sua jurdiçom civil e crime salvo em sentença de morte ou talhamento de membro mandamos que a alçada fique a nos E venha aa casa do civil de Lixboa " . 3. Respeito pelas normas já estabelecidas: "sem perjujzo da forma do foro per nos dado nas dietas jlhas em parte nem em todo ... , .

AS C APITANIAS

4. Direito cunhar moeda : " E Reservamos pera nos que o dicto jffante nom possa mandar fazer em ellas moeda mas praz nos que a nossa se corra nela " .

Foi a 26 de Setembro de 1433 108 que o Infante D. Henrique recebeu das mãos de D . Duarte a posse vitalícia das ilhas de Madeira, Porto Santo e Deserta. De acordo com esta doação o infante detinha a seguinte capacidade de intervenção:

Na mesma data a coroa, concedeu todo o espiritual das ilhas à Ordem de Cristo. Esta doação é feita a pedido do infante: " E por o jffante dom anrrique meu jrmãão regedor e governador de dieta ordem que no llo Requereo". No entanto, a coroa reserva para si "o foro e o dizimo de todo o pescado que se nas dietas jlhas matar" .

1. Jurisdição cível e crime, limitada: «com sua jurdiçom civel e crime salvo em sentença de morte ou talhamento de membro ... " . 2. Usufruto de rendas e direitos: «com todollos djreitos e rendas dellas assy como as nos de djreito avemos e devemos aver".

A validade desde diploma correspondia ao tempo de governo do monarca. Após a sua morte, tudo requeria a confirmação do novo rei. E, foi na realidade isso que sucedeu em 1 de Junho de 1439 110, e 11 de Março de 1449 111 , tendo D. Afonso confirmado a anterior doação.

3. Capacidade de livre intervenção na valorização do espaço: «Outrossy lhe damos poder que elle possa mandar fazer das dietas jlhas todollos proveitos e bemfectorias aquellas que entender por bem e proveito das dietas jlhas " . 4. Distribuição de terras pelos seus criados e demais povoadores: "E dar ja perpetuo ou a tempo ou aforar todas as dietas terras a quem lhe aprouver".

Tal como estava preceituado na primeira doação de 1433 o infante D. Henrique tinha poder de proceder à divisão das terras das ilhas e distribuí-las como entendesse, estando apenas limitado quanto aos direitos adquiridos resultantes da intervenção da coroa. É o caso de João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz, os primeiros obreiros do reconhecimento das ilhas. Eles recebem o encargo de, em nome do infante, coordenarem as tarefas de povoamento dos novos espaços. São os capitães em representação do donatário, por isso, ficaram conhecidos como capitães do donatário.

No último ponto a coroa estabelece que a referida concessão de terras se realize «sem perjuizo da forma do foro per nos dado aas dietas jlhas em parte nem em todo nem amalheamento do dicto foro ", com a capacidade de o poder " quitar parte ou todo". Esta situação remete-nos para a existência de um diploma anterior da iniciativa do mesmo monarca, que não é possível encontrar e que alguns fazem coincidir com os capítulos de uma carta de D . João I, inserida noutra de 7 de Maio de 1493 109 .

O documento que o estabelece juridicamente não surge em simultâneo para as três áreas, pois entre

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eles existem alguns anos de diferença. Primeiro recebeu Tristão Vaz em 8 de Maio de 1440 112 o .. carrego, das terras entre o Caniço e a Ponta de Tristão que ficou conhecida como a capitania de Machico. Este diploma é uma peça fundamental, uma vez que nele se estabelecem os mecanismos de intervenção dos interessados e preludia uma nova estrutura de mando. Assim Tristão Vaz exercia o governo em nome do infante- .. que elle a mantenha por mym em justiça e em direito"- de acordo com as seguintes condições:

4. Redizima de todas as rendas havidas pelo infante: uoutrossy me praz qo de todo o que eu ouver de renda da dita parte da jlha elle aja de dez huu". 5. Poder de distribuir e retirar terras, sem embargo do o infante o fazer: uitem me praz que elle possa dar per suas cartas a terra desta parte fora pollo forall da jlha a quem lhe prouver com tall condiçam que aquelle a que der dita terra a aproveite ataa cinquo aunos. E nom a aproveitamdo que a possa dar a outrem( ... ). E esta nom embarge a mym que me ouver terra por aproveitar que nom seia dada que eu a possa dar a quem minha mercee for".

1. Doação hereditária de acordo com Lei Mental: "E morremdo elle a mym praz que o seu filho primeiro ou ho segundo se tall for que tenha este emcarrego pella guisa suso disa. E assy de descemdemte em desçemte per linha direita ... ".

As duas cartas posteriores, que legitimam a posse das capitanias do Porto Santo e Funchal, seguem de perto esta, acrescentando alguns pormenores, que aqui não mereceram qualquer referência. Assim, na de 1 de Novembro de 1446 113 , em que o rei concedia a posse da ilha do Porto Santo a Bartolomeu Perestrello, acrescenta algumas regalias mais:

2. Administração da justiça, de acordo com os poderes a ele consignados e os foros do infante: uitem me praz que elles tenham em esta sobredita terra e jurdiçam por mym e em meu nome do çívell e crime rresalvando morte ou talhamento de membro que a apellaçam venha pera mym (... ]a mym praz que os meus mandados e correiçam seiam hi compridos como em cousa minha propria".

1. Direitos sobre serras de água e outros engenhos: uitem me praz que aje de todallas serras de água que hi fizerem de cada hua hum marco de prate em cada hum anno (... )e esta aje tarobem (... ) de quallquer enjenho que se hi fezer (... )»

3. Privilégios de fruição própria: 1. Monopólio dos moinhos, excepto nos braçais: «O dito Tristam aja pere si todolos moynhos que ou verem em a parte desta ilha ... E em esta sse nom emtemdo mo o de braço que o faço quem quiser nom moendo a outrem ... na dita Ribeyra do Caniço elle faça os moynhos que lhes prouver".

2. Possibilidade de venda das terras de sesmarias: uffie praz que os dietas vezinhos posam vender suas herdades aproveitadas a quem lhe prouver···" 3. Usufruto comum do gado bravio, excepto o pastorado: uos gaados bravos posam matar os da hilha sem aver hi outra defesa. Resalvando o gaado que amde nos hilheos ou outro algum lugar çarrado ... "

2. Monopólio de fornos de poia, excepto fornalha para uso próprio: «Item ma praz que todollos fornos de pam em que ouver poya seiam seus. E porem nom embargue quem quiser fazer fornalha pera sseu pam que a faça e nom pera outro nehuu".

A última carta a ser concedida foi a João Gonçalves Zarco, a 1 de Novembro de 1450. Ela segue de perto as duas anteriores, surgindo já com os acrescentos supra-referidos. Todavia, foi a primeira a merecer a confirmação régia, que teve lugar a 25 de Novembro do mesmo ano 114 • Aqui o Rei confirma a doação que passa a per-

3. Exclusivo condicionado da venda de sal: ultem me praz que teemdo elle sall pera vemder que o nam possa vemder outrem( ... ). E quando o nom tever que o vendam os das ilhas aa sua vomtade atta que o elle venha".

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D. Henrique, que se perderam. Assim ao referir a reclamação dos moradores para a isenção de algumas dízimas, é peremptório: "A isto que respondo que ei hei por bom o foral e regimento que o senhor infante meu padre que Deus aja acerca da dizima das ditas coizas tinha feito e mandava que se fizesse ... ". O mesmo aparece em Jerónimo Dias Leite no que dá conta de "humas lembranças" do infante " em que lhe encomendava muito ha justiça principalmente, e ha lavrança da terra( .. . ).. . Delas o autor enuncia algumas rematando: "e outras cousas mais meudas com o tudo se contem no regimento e lembranças (que ficão em meu poder)".

petua, a pedido do infante, mas estabelece uma emenda: "E que honde diz na carta do dieta tyo qe a apellaçom de morte ou talhamento de membro venha perante elle, queremos que venham perante nos segundo he contheudo na carta del Rey meu senhor e padre e padre susso estprita ··· "· As demais doações para Machico e Porto Santo também mereceram a confirmação da coroa, mas só se conhece a de Machico de 18 de Janeiro de 1452 115, que tem o mesmo teor da do Funchal, apenas não refere a usurpação de alçada cuja legalidade havia sido já reposta. No decurso do governo henriquino apenas se colocou o problema da sucessão na capitania de Porto Santo. Bartolomeu Perestrelo terá morrido em 1457, deixando em aberto a sucessão, uma vez que o filho varão, Bartolomeu Perestrelo, era menor de 7 anos sem capacidade para assumir ainda o governo da capitania. Entretanto a sua mãe Isabel Moniz, optou pela venda ao genro, Pedro Correia da Cunha, capitão da ilha Graciosa. Esta operação foi confirmada pelo infante D. Henrique em 17 de Maio de 1458 116 • Todavia, na maioridade do referido Bartolomeu Perestrelo, a seu pedido, a coroa considerou nula a referida venda, já confirmada pelo Infante D. Henrique 11 7•

Quanto às estruturas de governo nas capitanias sabe-se que, para além da presença do capitão e do almoxarife, existia o município. Mas este tinha uma intervenção muito limitada. Assim, não existem paços do concelho, nem bandeira e selo . A par disso, os juízes e procurador do concelho eram impostos pelo capitão, contrariando os regimentos do reino que impunham a eleição dos pelouros. A tudo isto junta-se uma recomendação ao capitão: «que em esta parte nos não torve", o que nunca aconteceu. O relativo menosprezo do infante pela regulamentação dos diversos domínios jurisdicionais do senhorio madeirense deverá resultar do facto de a ilha no período inicial não necessitar de uma excessiva regulamentação, que poderia ser refreadora do impulso povoador. Por outro lado poderá enunciar-se que o infante encontrava-se empenhado num processo mais vasto de conquista das Canárias, de expansão e descobrimento no litoral africano, sobrando-lhe pouco tempo para se empenhar nas coisas da sua ilha. Todavia, as referências indirectas a alguns destes documentos, que não chegaram até nós, atestam o seu real interesse no rápido avanço do povoamento da ilha. As isenções e privilégios conseguidos junto da coroa para os seus súbditos e exarados no seu foral, são exemplo disso 121 •

O S R EGIMENTO S

A administração das ilhas no começo do povoamento fazia-se com poucos regimentos. O fundamental era o foral do infante e as cartas de doação. Do primeiro sabe-se apenas ter existido, pois é o infante quem o anuncia em 1440, na carta de doação da capitania de Machico: "E o que eu ey daver na dita ilha he comtheudo no forall que pera ella mandey fazer" . O mesmo é confirmado pelo novo foral manuelino de 6 de Agosto de 1515 11 8 • Aí diz-se: «assi por forall do jffante dom Anrrique seu tio ... esteve sempre e esta em posse de levar e aver, em a dieta sua ylha da Madeira, as rendas e direitos seguintes, asi do espirituall (.. . )do senhorio( ... )... Também em 3 de Agosto de 1461 119 o infante D. Fernando, na resposta às reclamações dos moradores do Funchal, insiste nos regimentos do senhor infante

O extenso rol de reclamações apresentado em 1461, após a sua morte, ao sucessor no senhorio, o infante D . Fernando, poderão ser o teste-

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OINFANTE EAMADEIRA

munho deste relativo menosprezo ou antes da tendência centralizadora da política henriquina. O infante D. Fernando, ao assumir, em 1460, o governo da casa senhorial do seu tio, herda um pesado fardo político-administrativo. Procurando adequar o governo de ilha à nova conjuntura política e à satisfação das reclamações dos procuradores enviados ao Reino, define em Agosto de 1461 uma nova dinâmica institucional, económica e religiosa através dos seus .. apontamentos" t22.

regulamentos adequados a todas as solicitações do quotidiano . Foi esta a principal tarefa do infante D. Fernando, que teve continuidade nos seus sucessores. O infante D. Henrique havia lançado a semente, cabendo ao seu herdeiro fazê-la medrar e colher o fruto.

IGREJA

A dois de Julho de 1420 desembarcou João Gonçalves Zarco no vale de Machico e, de imediato, procedeu à posse da terra em nome do rei e à sua sagração com a primeira missa, rezada pelos franciscanos que acompanharam a viagem. O texto de Francisco Alcoforado é muito claro: .. (... ) detremynou sajr em terra e levar consygo dous padres que trazia, sajmdo em terra deu graça a Deos mandou bemzer aguoa e espargella pello ar (... ) mandou dizer mysa (... ) Foy a prymeyra mysa que se dise (... ),1 23 .

Os poderes discricionários e os privilégios dos capitães sofreram uma grande machadada mercê da aplicação plena da jurisdição estabelecida nas doações de que se faz uma pública-forma de modo que não possa «entender aalem delle sem poer outros foros e a costumes". Ao mesmo tempo estabeleceu-se a necessária vinculação da jurisdição do capitão às directivas régias e da estrutura municipal, conjugadas com o reforço da intervenção do almoxarifado. O avanço mais significativo é dado como o município, que se liberta do controlo e intervenção discricionária do capitão, passando os seus oficiais a serem eleitos entre os homens-bons que fazem parte do rol aprovado pelo senhorio. Esta autonomia é expressa ainda na concessão do selo e da bandeira.

Em Maio do ano imediato, João Gonçalves Zarco regressou à ilha com três navios e a disposição de proceder ao seu povoamento. De novo o desembarque em Machico, e ua primeira cousa que fez foy traçar huma igreja de Invocação de Xpo ... , 124 . Depois foi o novo reconhecimento da costa, com o assentamento de colonos. Todos os actos eram precedidos pela construção de uma igreja ou ermida. No Funchal foram as capelas de Santa Catarina e a de Nossa Senhora do Calhau, sendo a última considerada pelo autor .. a prymeyra casa de igreja que se fez na ilha, 125 • Mais além em Câmara de Lobos a do Espírito Santo, na Quinta Grande a de Vera Cruz, nos Carthas a de Santiago, na Estrela (Calheta) a de Nossa Senhora da Estrela. E conclui o cronista: " ... começou a por em obra a edificação das jgrejas e llavrança da terra".

No aspecto económico, os referidos apontamentos anotam a necessidade de adequar a orgânica administrativa ao nível do desenvolvimento económico da ilha. Primeiro procura-se estabelecer uma adequada repartição das águas, tão necessárias à faina açucareira, depois, o apoio indispensável aos assalariados e pequenos proprietários. No domínio comercial, a intervenção fernandina pautar-se-á por uma abertura da ilha aos agentes de comércio nacionais e estrangeiros, que motiva a sua discordância em favor da pretensão dos madeirenses para a expulsão dos judeus e genoveses.

Como se poderá verificar o templo religioso é o ponto de divergência do processo de povoamento e foi em torno dele que surgiram as primeiras habitações de madeira para dar abrigo a estes colonos. Daqui resulta a importância fundamental da igreja em todo o processo.

Era chegado o momento de mudança, pois havia-se ultrapassado o estado zero de desenvolvimento e a ilha só poderia avançar com estas inovações. A sociedade complexifica-se e requer

De acordo com a doação régia de 26 de Outubro 1433 126 o infante, como mestre da Ordem de

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.M.ARE LLBERUM

Cristo, recebeu também a capacidade de intervenção na espiritualidade do novo espaço. O Vigário de Tomar, local sede da Ordem, era quem, em nome do infante, estabelecia a estrutura religiosa, provendo ministros. Apenas a arrecadação dos dízimos eclesiásticos permanecia a cargo do almoxarife do infante 127 .

que a tradição veiculada por Álvaro Rodrigues de Azevedo 132 e P.e Fernando Augusto da Silva 133 apresenta algumas paróquias criadas em 1430, 1440 e 1450. Não sabemos em que se fundamenta tal ideia, uma vez que nas reclamações dos moradores do Funchal em 1461, documento já citado, refere-se a existência de um só capelão que dizia missa no Funchal 134 •

Para cada capitania foi nomeado um vigário, que dependia directamente do de Tomar, tendo como função administrar a espiritualidade no recinto da sua jurisdição. Destes apenas se conhece o nome dos de Machico e Funchal, respectivamente Frei João Garcia e João Gonçalves.

ERMIDAS, CAPELAS E IGREJAS (1420-1460)

Parece que esta situação perdurou por todo o governo do infante D. Henrique, uma vez que em 1461 128 uma das exigências dos moradores do Funchal era o aumento do clero, de modo que fosse assegurado o serviço religioso aos moradores de Câmara de Lobos, Ribeira Brava, Ponta de Sol e Arco da Calheta.

LOCAL

DATA

TIPO

ORAGO

Arco da Calheta

1426-61

Capela

S. Brás

Calheta

1426 1430 1420

Capela

N.ª Sr.ª Estrela

Câmara de Lobos

1421-26 1421-26

Não agradou ao infante a pretensão dos franciscanos, oriundos das Canárias, quererem introduzir-se na ilha, ficando subordinados ao vigário dessas, tal como o estabelecia a letra "dum ad prellara, do papa Nicolau V em 10 de Dezembro de 1450 129 . Estes havião-se fixado no arquipélago vizinho desde 1436, mediante autorização do Papa Eugénio IV. Tal situação era entendida como uma ingerência nos direitos adquiridos pela Ordem de Cristo e uma afronta, tendo em conta o empenho do infante na conquista de algumas dessas ilhas.

Canhas Deserta Machico

Madalena Ponta de Sol Porto Santo Quinta Grande

O próprio infante preocupou-se com a administração religiosa do arquipélago, ordenando a construção de igrejas e capelas, conforme se deduz do seu testamento de 1460: «Item estabeleci e ordenei a principal igreja de Sta Maria da ilha da Madeira e deshi em diante as outras que si ordenaram, e item estabeleci hi da ilha do Porto Santo e Igreja de Ilha Deserta (.. . ), 13o.

Ermida

Espírito Santo

Igreja

São Sebastião 1

1425 Convento 1426 Capela 1426-60 Capela

São Bernardino São Tiago N.ª Senhora 1

Cristo 1420-21 Capela 1426 Ermitério São Francisco Igreja N .ª Sr.ª Conceição 1 1450 1450 Capela Sta Maria Madalena 1426 Capela N.ª Sr.ª da Luz 1420-26 Ermida N .ª S.r.ª Piedade 1

1426

Capela

N. ª Sr.ª Vera Cruz São Bento

1426-67 1427

Capela

N.ª Sr.ª Conceição

Igreja

Santa Cruz

1440 1424 1425 1425

Ermida

São Vicente

Capela

São Sebastião

Capela

Sta Catarina

Capela

N.ª Sr.ª Conceição de Cima

1425-60

Igreja

Sta Maria a Maior/ /N.ª Sr.ª Calhau 1

Funchal

1426 1426 1454 1468

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N.ª Sr.ª Conceição

Ermida

S. Vicente

1

Espírito Santo

Capela

Ribeira Brava 1426-40 Santa Cruz

Quanto aos diversos templos religiosos, que foram erguendo os povoadores em toda a ilha, neste período, não existe consenso entre os diversos historiadores nem dados que abonem com segurança a data exacta de construção 131 . É de salientar

Capela

Ermitério S. João da Ribeira Capela

S. Pedro e S. Paulo

Capela

S. Paulo

Capela

Santo Amaro

Fundadas pelo Infante D. Henrique.

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OINFANTE EAMADEIRA

O SENHORIO DAS ILHAS

De acordo com a primeira carta de doação, o infante D . Henrique recebeu o direito de posse do senhorio das ilhas que compõem o arquipélago da Madeira. O afastamento do donatário das áreas de ocupação, as dificuldades nas comunicações com o reino, em consonância com a necessidade de distribuir benesses pelos principais obreiros do reconhecimento e ocupação do arquipélago, implicaram urna nova estrutura nas instituições insulares : os capitães do donatário. Eles foram os lídirnos representantes do donatário que detinham capacidade para administrar a área (capitania) concedida por carta de doação.

lJrn dos aspectos de aproximação do processo histórico da Madeira ao das Canárias poderá ser a estrutura institucional. O senhorio foi comum a ambos os arquipélagos e a partir dele desenvolveram-se as estruturas de governo que acompanharam o porvir histórico e serviram de modelo às posteriores iniciativas. Daqui resulta a singularidade e importância do conhecimento deste processo institucional. A ideia de conquista e posse das Canárias inicia-se com a transmissão da titularidade para particulares, adquirida desde 1344, junto do papado. A coroa castelhana só intervirá a partir de 1477 quando Diego García de Herrera lhe cede o direito de conquista das ilhas de Gran Canaria, La Palma, Tenerife. Esta intervenção da coroa resultou da relativa estabilidade da península e da necessidade de firmar uma posição nas ilhas mercê da disputa de particulares e coroa portuguesa 135 .

Nas Canárias a situação foi diferente . Em primeiro lugar somos confrontados com duas formas de intervenção na conquista e povoamento do arquipélago . Num primeiro momento tudo correu por iniciativa particular. E só depois, a partir de 1477, surgiu a coroa. Daqui resultou urna diferente opção institucional. Assim para as ilhas conquistadas por particulares, que ficaram conhecidas corno senhoriais, vigorou o senhorio . Ao invés, naquelas em que a coroa actuou no processo de conquista, enviando os seus emissários, conhecidas como realengas, a presença régia é materializada na pessoa dos governadores D. Pedro de Vera e Alonso de Lugo . As prerrogativas enunciadas nas diversas recomendações régias associadas à prática destes aproxima-os dos capitães do donatário da Madeira. Eles, não obstante a sua situação de funcionários régios, detêm privilégios de tipo senhorial, como sejam, o direito de sucessão no cargo e o usufruto do título de adeJantado.

O reconhecimento e ocupação da Madeira, ainda que com forte colaboração particular, foram de iniciativa da coroa. O empenhamento do infante D. Henrique e dos homens da sua Casa surge corno serviço prestado aos intentos da coroa: era urna cruzada de reconhecimento e ocupação e a coroa chamava a si o direito de posse bem corno de administração. A legitimação institucional para a intervenção da casa do infante só ficou estabelecida em 1433 136 . A partir desta data a gesta de reconhecimento ou descobrimento do Atlântico ficara subordinado ao empenho do grão-mestre da Ordem de Cristo - o infante D. Henrique. O monarca Dom Duarte ao atribuir, em 1433-1439, à Ordem de Cristo responsabilidades na expansão atlântica ia ao encontro dos interesses e pertinácia do infante. Ao mesmo tempo lançavam-se as bases para urna nova estrutura institucional lusíada - senhorio atlântico insular -, composta pelas ilhas dos arquipélagos da Madeira e Açores. Durante mais de sessenta anos (1433-1497) a administração das ilhas esteve a cargo da Ordem de Cristo por meio do grão-mestre.

Será possível urna aproximação de ambos os modelos institucionais definidos pelos reinos ibéricos para a expansão atlântica? Note-se que, corno referimos de ambos os lados, na ilha ou no continente, deparamo-nos com urna conjuntura diversa que pesou de forma significativa no lançamento das bases institucionais da nova sociedade. Nas Canárias os condicionalismos internos e externos conduziram a urna gesta

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de tipo feudal, enquanto na Madeira surge algo diferente que se enquadra nos parâmetros do senhorialismo em Portugal 137 • Além disso, o senhorio das Canárias é marcado por laços feudais, como a enfeudação, enquanto na Madeira estes não existem, pois com a doação régia de 1433 apenas são concedidas algumas prerrogativas jurisdicionais conducentes à sua adequada administração. Assim o senhorio usava desta jurisdição em nome do rei, que não abdicava de certos domínios jurisdicionais como a pena de morte, talhamento de membro, direito de fazer guerra e cunhar moeda. Nas Canárias Jean de Bettencourt usufruía do direito de cunhar moeda.

Ao capitão estava reservado o redízimo dos direitos, alguns privilégios exclusivos e a fruição dos réditos resultantes da exploração das suas terras. O senhorio português das ilhas da Madeira (1433) e Açores (1439) e mais espaço atlântico (1443) legitimado pelas bulas papais (1452, 1454) assentava não só no domínio económico-social e institucional, mas também espiritual. Assim os administradores da Ordem de Cristo, através do Vicariato de Tomar, usufruíam da administração espiritual e religiosa do novo espaço ocupado no Atlântico Insular. Esta situação manteve-se até 1514 altura em que foi criada a diocese do Funchal com jurisdição sobre as terras descobertas 140 • Nas Canárias a coroa nunca delegou o direito de patronato, atribuído em 1486 pelo papa Inocêncio VIII, mantendo-o como seu exclusivo privilégio 141 •

A posse da Madeira foi feita a ordem do rei e só depois a coroa concedeu o senhorio. Nas Canárias foi algo inverso. A conquista começou com uma campanha normanda e o necessário acto formal de vassalagem e prestação de pleito e homenagem (1403-1412) ao monarca de Castela a quem as ilhas pertenciam por bula papal de 1344. Na Madeira o senhorio subdelegou competências em homens da sua casa, atribuindo-lhes a administração de áreas, que ficaram conhecidas como capitanias. Nas Canárias algo semelhante sucede. Jean de Bettencourt nomeou para as ilhas um tenente ou governador geral que assegurava a administração da justiça 138 • Note-se ainda que na ilha de La Comera o senhorio delegara no alcaide mayor o poder cível e de nomear os regedores, alferez, alguacil mayor e escribanos.

(( ... É TODA ELA UM JARDIM E TUDO O QUE NELA SE APROVEITA É OURO»

Igual a esta observação de Cadamosto, em meados do século XV, contar-se-ia às centenas se todos os visitantes nacionais e estrangeiros tivessem tido possibilidade de o expressar. O progresso e a riqueza económica da ilha causaram a estupefacção de todos os aventureiros e foram um forte incentivo à presença de novos colonos e de avanço do processo de reconhecimento das ilhas e litoral Atlântico. Tudo isto, segundo Gaspar Frutuoso 142, resultou do espírito empreendedor dos primeiros colonos madeirenses, que sob as ordens dos capitães empenharam-se em «cultivar e beneficiar a terra para dar fruto".

Num e noutro arquipélago o senhorio usufruía de determinados proventos económicos resultantes do usufruto do monopólio da recolha, fabrico e venda de certos produtos ou do lançamento de alguns direitos sobre a produção e comércio. Assim nas Canárias ele reservava para si o monopólio do comércio da urzela, conchas marinhas, além de uma renda senhorial (o quinto) que onerava o dinheiro, o gado e o comércio 139 • Na Madeira o senhorio, de acordo com a carta de doação régia, detinha o usufruto de todas as rendas e direitos existentes ou a lançar nesses domínios. O principal tributo era o dízimo que onerava o aproveitamento dos recursos, a agricultura, pecuária, pesca, transacções e comércio.

João Gonçalves Zarco, após o reconhecimento da costa meridional da ilha, fixa-se no Funchal enquanto Tristão Vaz recolhe-se ao vale de Machico. É a partir destes dois pólos, mais tarde sedes das capitanias, que irradia a força dos cabouqueiros . O processo foi rápido tal como o testemunham os cronistas. Zurara refere-nos que "em breve tempo foi grande parte daquela terra aproveitadan 143 , sendo corroborado por Gaspar Frutuoso 144 : «Foi assim tudo tanto em crescimento em ambas as juridições, com boa dili-

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gência de seus capitães, que em breve tempo se povoou e enobreceu a ilha toda (... ). Crescendo as povoações e moradores com a fama da sua fatalidade ... ".

desbravar a densa floresta para abrir as arroteias. As queimadas comuns na Europa, tiveram aqui lugar e foram responsáveis por um duradoiro incêndio. É o que refere João de Barros: " ... assy tomou o fogo posse da roça e do mais arvoredo, que sete aunos andou vivo no bravio daquellas grandes matas que a natureza tinha criado avia tantas centenas de aunos. A qual destruição de madeira posto que foy proveitosa pera os primeiros povoadores logo em breve começarem lograr as novidades da terra: os presentes sentem bem este dano, por a falta que tem de madeira e lenha: porque mais queimou aquelle primeiro fogo do que dentamente ora podera delepar força de braço e machado. Cousa que o infante muyto sentio e parece que como profecia vio esta necessidade presente que a ilha tem de lenha: porque dizem que mandava que todos plantassem matas, ... " 149 • A questão da duração das queimadas, de sete ou nove anos, tem provocado alguma polémica, havendo quem as considere mais como uma figura de estilo do que uma situação real 150 .

Desde o início, é evidente o contraste entre as ilhas do Porto Santo e Madeira. Assim, segundo Zurara na primeira unão se pode em ela fazer lavra" 145 • A principal dificuldade estava, segundo Valentim Femandes 148, no unão aver agoas a terra em sy sterih•, o que implicou que «não se fez tanta obra nella como em a ylha de Madeira ... ". Aliás, esta última era "mais nobre e mais rica e mais avendosa". A falta de águas só permitiu as culturas de sequeiro e a valorização do pastoreio. Para Zurara a sua importância está na criação de gado. É ele quem refere a praga dos coelhos e que «criam-se ali muitos gados". Note-se que foi com a carta de doação da capitania do Porto Santo que o infante se deu conta da importância do gado bravo e apastorado. A estas duas junta-se a Deserta, que segundo Zurara era «intenção de a mandar povoar com as outras", lançando-se para isso gado.

A par disso é de notar o aproveitamento de outros recursos que na época tinham grande valor comercial. Referimo-nos ao sangue de drago 15 1 • Em ambas as ilhas eram abundantes os dragoeiros, mas especialmente no Porto Santo ele mereceu maior atenção dos povoadores, por ser o primeiro e principal recurso disponível.

Distribuídas as primeiras terras, um longo trabalho os esperava: as queimadas, a construção de paredes encosta fora, para retenção da terra, o delineamento das levadas para o regadio e aproveitamento da força motriz nos moinhos, serras de água e, depois, engenhos açucareiros.

A importância das madeiras está bem patente no facto de o infante ter determinado, nas cartas de doação e lembranças e regimentos, de tributar a sua exploração. O infante tinha direito do dízimo das madeiras usadas na construção de habitações e latadas, das lenhas para uso caseiro e industrial. Todas estas, mesmo situadas nas terras doadas de sesmarias, eram sua propriedade, como se pode inferir da doação das terras na Madalena a Henrique Alemão: "com condição que das ditas terras e lugar não pague senão o dizímo de tudo o que seus der em ele, salvando paus de teixo, vino, canas e quaisquer tintas que houver e gomas, que tudo seja para mim» 152 • Contra isto reclamaram em 1461 os moradores do Funchal ao infante D. Fernando no que não tiveram qualquer apoio. Também nas cartas de doação das

À mão de todos estavam as madeiras resultantes do abundante arvoredo que cobria a ilha da Madeira 147 . O arroteamento das terras implicava o seu desbaste. E foi aí que o colono encontrou uma das primeiras riquezas, verdadeira dádiva da natureza. Com estas madeiras foi possível avançar na construção naval e civil, beneficiando a marinha e a cidade de Lisboa. Assim o refere Jerónimo Dias Leite 148 . "E neste tempo pela muita madeira que daqui levavão pera ho rejno começarão com ella a fazer navios de gavea, e castello da vante, porque dantes não havia no rejno ... "

Todavia, esta riqueza e preciosidade das madeiras durou pouco tempo. Em pouco tempo aquilo que existia em abundância passou a ser uma raridade. Para isso terá contribuído a necessidade de

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os elementos típicos da dieta cristã-mediterrânica [os cereais, as videiras) são os primeiros a embarcar. Só, depois, num segundo momento, surgiram os produtos de grande procura nascidades europeias: o pastel e a cana-de-açúcar.

capitanias refere-se a esta importante indústria. Assim aqueles que construíssem serras de água 153 deveriam entregar ao capitão «Um marco de prata em cada um ano ou seu certo valor ou duas tábuas cada semana das que costumarem serrar " , enquanto ao infante era devido «O dizímo de todas as ditas serras segundo pagam das outras coisas o que serrar as ditas serras". Acresce que nos capítulos do regimento atribuído a D. João I valoriza-se esta actividade ligada ao aproveitamento das madeiras. Aí são referidos os «de menos, que vivam do seu trabalho e de cortar de talhar madeiras ... ".

As condições em que se estabeleceram as primeiras arroteias fizeram com que as sementes de cereal, lançadas sobre as cinzas das queimadas, frutificassem em abundância. Diz Jerónimo Dias Leite que de um alqueire semeado se colhiam sessenta, enquanto Diogo Gomes refere «que uma medida dava cincoenta e mais» . Cadamosto corrobora o primeiro mas anota que esta relação foi baixando devido à deterioração do solo. Ainda, segundo ele, a ilha produzia 3000 moias de trigo de que só tinha necessidade de um quarto . O demais era exportado para o reino, tal como o diz Diogo Gomes: "E tinham ali tanto trigo que os navios de Portugal, que por todos os anos ali iam, quase por nada o compravam».

Outra importante fonte de riqueza terá sido o aproveitamento das ilhas para a criação de gado. Não obstante, alguns cronistas referirem a existência de gado selvagem no Porto Santo, onde os castelhanos faziam carnagem 154 , o certo é que nas ilhas não se encontrava qualquer espécie animal indígena com utilidade para o homem. É por isso que aqui, a exemplo do que virá a suceder nos Açores, o processo de povoamento inicia-se com o lançamento de gado trazido do reino lSS. Isto era uma forma, não só de testar a capacidade de sobrevivência dos seres vivos, mas também de assegurar um primeiro suplemento alimentar aos primeiros colonos 156 . Daqui resultou que a criação de gado se transformou numa das primeiras e principais riquezas. Assim o testemunha, em meados do século XV, Cadamosto. Quanto ao Porto Santo ele refere que "é abundante de carne de vaca, porcos selvagens e infinitos coelhos " , enquanto a Madeira é «abundante em carnes".

Em data, que desconhecemos, estabeleceu o infante D . Henrique ou o rei a obrigatoriedade de envio de mil maios para a Guiné, o que era considerado, na década de sessenta um vexame para os funchalenses, que prontamente reclamaram ao novo senhor da ilha, no que não tiveram grande acolhimento por ser «trato de el-Rei» . O vinho é outra necessidade alimentar, mas também uma exigência do culto eucarístico cristão, por isso era imprescindível a presença de videiras na bagagem dos primeiros colonos . Todavia, alguns cronistas, à excepção de Zurara e João de Barros que o não referem, afirmam ter sido o infante quem, num segundo momento, ordenou a vinda de bacelas de malvasia de Cândia. Sucede que a cultura da vinha não era novidade em Portugal e tinha já uma grande tradição, nomeadamente no norte. Por isso, é natural, que antes das cepas de malvazia de Cândia, tenham apartado à ilha outras do reino 157 .

Esta reserva de pastos servia não só para alimentação dos primeiros habitantes da ilha, mas também para o abastecimento das embarcações que demandavam a costa africana que, desde 1455, segundo nos informa Zurara, tinham aqui escala obrigatória na ilha.

AS CULTURAS DE SUBSISTÊNCIA E DE EXPORTAÇÃO

A notícia mais detalhada sobre a importância deste produto surge em Cadamosto: «Os vinhos da Madeira podem reputar-se muito bons, se se considerar, que foram transplantados de fresco, e são em tanta quantidade, que bastam para os

A organização do sector produtivo fez-se de acordo com as exigências da dieta alimentar dos colonos e as solicitações do mercado europeu. Assim,

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OINFANTE EAMADEIRA

habitantes e ainda sobram para exportar para fora . Entre as outras videiras fez o dito Senhor plantar bacelas de Malvasia que mandou vir de Cândia, os quais produziram muito bem: e por ser o terreno tão gordo e bom, criam as videiras quase mais cachos, do que folhas; e são eles muito grandes do comprimento de dois a três palmos e estou em dizer que até de quatro; é coisa a mais bela do mundo para ver.»

lhante e não se podendo todo fazer que eu dê lugar a quem me prouver que faça outro". Do primeiro açúcar começou a fazer-se exportação . Assim Cadamosto dá conta da promissora produção: " ... e fabricaram-se açúcares pela quantidade de quatrocentos cântaros, tanto na primeira cozedura, como da mistura e pelo que posso perceber, far-se-á com o tempo maior quantidade (... ). Fazem-se ali também muitos doces cobertos com suma perfeição". Para Diogo Gomes os da ilha «fabricam açúcar em tal quantidade que é exportado para as regiões orientais e ocidentais» .

Os canaviais aparecem, num segundo momento, por iniciativa do infante que os mandou vir da Sicília. Neste caso os testemunhos são claros1 58, sendo de referir Cadamosto: «E por ser banhada por muitas águas, o dito senhor mandou pôr nesta ilha muitas canas de açúcar, que deram muito boa provan 159. Isto é documentado, mais tarde em 1511, por Simão Gonçalves da Câmara: «que vendo a calidade da terra desta ilha e a teperãça della pareceo-lhe q sse podia ddar açuqres e sabendo ha aspeza da trra e hos grandes trabalhos q os primeiros pouoradores tinhã em ha romperem detriminou como mtº vrtuoso ajudar a seus lauradores e tãbee pllo proueito q lhe disso seguya de mãdar trazer a planta das canas a esta trra e ordenou e qis q pondo elle a dita pranta em cada hum ano e os lauradores poese ho esmoutar e tirar e laurar e prantar, 160.

O (( CICLO DO TRIGO » E A TEORIA DOS CICLOS Este período que abrange o governo do infante D . Henrique foi definido como o do ciclo do trigo. Isto é, durante mais de quarenta anos a economia madeirense ter-se-ia orientado apenas para a aposta na cultura e comércio do trigo, que, por sua vez, é entendido como um dos principais móbeis para a conquista de Ceuta e ocupação dos arquipélagos 163 . O que atrás ficou dito prova precisamente o contrário 164 . Tudo isto começou em 1949, quando Fernando Braudel argumentou que o processo económico das ilhas articulou-se de acordo com o regime produtivo de monocultura 165 . Ainda, neste ano, Orlando Ribeiro esclarecia, que no caso da Madeira não é possível encontrar rastros de monocultura no regime de exploração agrícola madeirense 166 . A mesma opinião surge também nas Canárias, onde, volvidos vinte anos, Elias Serra Ráfols respondia a Francisco Morales Lezcano, enunciando que nunca existiu um regime de monocultura, uma vez que a economia canária foi dominada por uma variedade de culturas, cuja actuação não é uniforme no tempo e no espaço 167 . Mais tarde, Frédéric Mauro, secundado por Vitorino Magalhães Godinho, retomaram a questão, enunciando que a economia insular se definiu apenas por um regime de produtos dominantes e não de monocultura 168 .

A primeira plantação teve lugar no Funchal, num terreno do infante, conhecido como o campo do duque. Daqui os canaviais foram levados para Machico, onde se fabricou o primeiro açúcar - 13 arrobas -, que foi vendido a cinco cruzados a arroba 161. Sabe-se que o infante permitiu aos povoadores a construção de engenhos para a laboração do açúcar sujeitando-se ao pagamento de 1/3 da produção. Destes apenas temos notícia do construído por Diogo Teive, conforme autorização escrita do próprio infante de 1452 162. Daqui se infere da existência de um lagar propriedade do senhor infante. Por isso o fabrico do açúcar fazia-se em exclusivo neste lagar já existente e no novo engenho de água, pois «que eu não dê lugar a ninguém que possa fazer outro seme-

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Deste modo e, de acordo com uma análise aturada da economia insular, parece-nos que a mesma não se regeu por princípios exclusivistas, de acordo com a premência das solicitações externas. Antes pelo contrário, o seu desenvolvimento socioeconómico processou-se de forma variada, sendo a exploração económica dominada por estes vectores dominadores, confrontados com as condições e recursos do meio com as solicitações da economia de subsistência. É difícil, senão impossível, conseguir definir um ciclo em que impere a monocultura de exportação, n u m espaço amplo e multifacetado como é o do mundo insular. Os modelos, embora perfeitamente delineados, não se ajustam à realidade socioeconómica, qu e é extremamente variada e enriqu ecida de múltiplas matizes. Embora alguns produtos, como o trigo, o açúcar, o vinho e o pastel, surjam em épocas e ilhas deferenciadas, como os mais importantes e definidores das trocas externas, não são os únicos na economia insu lar.

Quem conhece as ilhas sabe que em todas domina a diversidade geo-económica, fruto da configuração geográfica. Esta situação provoca na Madeira um escalonamento de culturas, impedindo a sua sobreposição.

« ••• QUE DEUS PÔS NO MAR OCEANO OCIDENTAL PARA ESCALA, REFÚGIO, COLHEITA E REMÉDIO DOS NAVEGANTES .. . ))

Foi o arquipélago o início da presença portuguesa no Atlântico, e o primeiro e mais proveitoso resultado desta aventura. O testemunho de Gaspar Frutuoso 169 que encima esta parte é disso exemplo. Vários são os factores que se conjugaram para este protagonismo . A inexistência de população, em consonância com a extrema necessidade de valorização para o avanço das navegações ao longo da costa africana, favoreceram a rápida ocupação e crescimento económico da Madeira. Por isso,

a afirmação do arquipélago madeirense, nos primeiros anos dos descobrimentos, foi evidente : porto de escala ou apoio para as precárias embarcações quatrocentistas, que sulcavam o oceano; importante área económica, fornecedora de cereais, vinho e açúcar, modelo económico, social e político para as demais intervenções portuguesas no Atlântico 170 • A juntar a tudo isso temos que o rápido progresso social, resultado do porvir económico, condicionou o aparecimento de uma aristocracia-terratenente que, imbuída do ideal cavalheiresco e do espírito de aventura, se embrenhou na defesa das praças marroquinas, na disputa pela posse das Canárias e viagens de exploração e comércio ao longo da costa africana e, até mesmo, para Ocidente. A proximidade da Madeira ao vizinho arquipélago das Canárias, em conjugação com o rápido surto do povoamento e valorização económica do solo, orientaram as atenções do madeirense para as ilhas. Assim, decorridos apenas vinte e seis anos sob a ocupação, os moradores da Madeira empenharam-se na disputa pela posse das Canárias, ao serviço do infante D . Henrique. Em 1446 João Gonçalves Zarco foi enviado a Lanzarote, como plenipotenciário para afirmar o contrato de compra da ilha. Acompanham-no as caravelas de Tristão Vaz, capitão do donatário em Machico e de Garcia Homem de Sousa, genro de Zarco m _Mais tarde em 1451, o infante enviou nova armada, em que participaram gentes de Lagos, Lisboa e Madeira, sendo de salientar, no último caso, Rui Gonçalves filho do capitão do donatário do Funchal 172 . Para a aristocracia madeirense o empenhamento nas acções marítimas e bélicas é, ao mesmo tempo, uma forma de homenagem ao senhor (monarca, donatário) e de aquisição de benesses e comendas. Zurara na "Crónica da Guiné, 173 confirma isso, referindo que a participação madeirense ia ao encontro dos princípios e tradições da cavalaria do reino . O que não invalida a sua presença com outros objectivos, como sucede a partir de meados do século XV.

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actualidade começa a ter plena aceitação entre nós. Para isso contribuíram a criação de C.E.H.A. (1985) e os três colóquios internacionais de História da Madeira, já realizados (1986, 1989, 1992).

Os principais obreiros do reconhecimento e ocupação da Madeira, como criados da casa do infante D. Henrique, foram impelidos para a aventura africana, com participação activa nas viagens henriquinas de 1445 e 1460 e nas aventuras bélicas nas praças africanas do norte, nos séculos XV e XVI 174 . O capitão de Machico, Tristão Vaz Teixeira, participou pessoalmente numa das expedições de 1445, enquanto João Gonçalves Zarco mandou duas vezes uma caravela, sob comando do sobrinho Álvaro Fernandes. Zurara fala-nos das intenções que moveram estes capitães. Enquanto João Gonçalves Zarco surge apenas para bem servir o infante, Tristão Vaz ia por "bom desejo para serviço do Infante e muito ao seu proveito». Mas Álvaro de Ornelas, escudeiro da casa do mesmo senhor, armou caravela «por fazer alguma cousa de sua honran 175 .

A Madeira, arquipélago e ilha, afirma-se no processo da expansão europeia pela singularidade do seu protagonismo. Vários são os factores que o propiciaram, no momento de abertura do mundo atlântico, e que fizeram com que ela fosse, no século XV, uma das peças-chave para a afirmação da hegemonia portuguesa no Novo Mundo. O Funchal foi uma encruzilhada de opções e meios que iam ao encontro da Europa em expansão. Além disso ela é considerada a primeira pedra do projecto, que lançou Portugal para os anais da :t:::.:._~:'>ria do oceano que abraça o seu litoral abrupto. A fundamentação de tudo isto está patente no real protagonismo da ilha e das suas gentes.

A presença de gentes da Madeira continuará por todo o século XV em três frentes: Marrocos 176, litoral africano além do Bojador e terras ocidentais. Na primeira e última a presença dos madeirenses foi fundamental. A tradição refere que o primeiro homem a lançar-se à aventura do descobrimento das terras ocidentais foi Diogo de Teive, que em 1451 terá saído do Faial à procura da ilha das Sete Cidades, mas que no regresso apenas descobriu as ilhas de Flores e Corvo 177 . Seguiram o seu exemplo outros madeirenses que gastaram muito de sua fazenda para abrir o caminho, mais tarde, trilhado por Colombo.

À função de porta-estandarte do Atlântico, a Madeira associou outras, como «farol, Atlântico, o guia orientador e apoio para as delongas incursões oceânicas. Por isso nos séculos que nos antecederam, ela foi um espaço privilegiado de comunicações, tendo a seu favor as vias traçadas no oceano que a circunda e as condições económicas internas, propiciadas pelas culturas da cana sacarina e vinha. Uma e outra condições contribuíram para que o isolamento definido pelo oceano fosse quebrado e se mantivesse um permanente contacto com o velho continente europeu e o Novo Mundo.

A MADEIRA TERRA DESCOBERTA E TAMBÉM DE DESCOBRIDORES

Como corolário desta ambiência a Madeira firmou uma posição de relevo nas navegações e descobrimentos no Atlântico. O rápido desenvolvimento da economia de mercado, em uníssono com o empenhamento dos principais povoado- " res em dar continuidade à gesta de reconhecimento do Atlântico, reforçaram a posição da Ilha e fizeram avolumar os serviços prestados pelos madeirenses. Aqui surgiu uma nova aristocracia dos descobrimentos, cumulada de títulos e benesses pelos serviços prestados no reconhecimento da costa africana, defesa das praças marroquinas, ou nas campanhas brasileiras e índicas 178 •

A valorização da Madeira no contexto da expansão europeia tem sido diversa. A historiografia nacional considera-a um simples episódio de todo o processo e, em face da posição geográfica, hesita no seu enquadramento, sendo, por vezes, levada ao esquecimento. A historiografia europeia, ao invés, não duvida em realçar a singularidade do seu processo neste contexto. Desde F. Braudel (1949), passando por Pierre Chaunu (1955), Frédéric Mauro (1960) e Charles Verlinden (1960), que se afirmou esta nova realidade, que só na

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MODELO DA EXPANSÃO

meu avô a de São Miguel, e meu tio a de São Tomé, e com muito trabalho, e todas do feito que vê ... " . Isso dava-lhe .o alento necessário e abria-lhe perspectivas para uma sua iniciativa no Brasil. Ele reclamava o protagonismo do seu ancestral Rui Gonçalves da Câmara que em 1474 comprara a ilha de S. Miguel, dando início ao seu verdadeiro povoamento.

A par disso a Madeira surge, nos alvores do século XV, como a primeira experiência de ocupação em que se ensaiaram produtos, técnicas e estruturas institucionais. Tudo isto foi, depois, utilizado, em larga escala, noutras ilhas e no litoral africano e americano. O arquipélago foi, assim, o centro de divergência dos sustentáculos da nova sociedade e economia do mundo atlântico: primeiro os Açores, depois os demais arquipélagos e regiões costeiras onde os portugueses apartaram.

A mesma percepção surge em Gilberto Freire que em 1952 não hesita em afirmar o seguinte: - A irmã mais velha do Brasil é o que foi verdadeiramente a Madeira. E irmã que se estremou em termos de mãe para com a terra bárbara que as artes dos seus homens, ... concorreram para transformar rápida e solidamente em nova lusitania »181.

O sistema institucional madeirense apresentava uma estrutura peculiar, definida pelas capitanias. Foi a 8 de Maio de 1440 que o infante D. Henrique lançou a base da nova estrutura ao conceder a Tristão Vaz a carta de capitão de Machico. A partir daqui ficou definido o sistema institucional que deu corpo ao governo português no Atlântico insular e brasileiro.

Outra componente importante da afirmação da ilha como modelo de referência tem a ver com a organização da sociedade no espaço atlântico e da importância aí assumida pelo escravo. Mais uma vez a Madeira é o ponto de partida para esta transformação social. De acordo com S. Greenfield1 82 ela serviu de trampolim entre a " Mediterranean Sugar Production, e a «Plantation Slavery, americana. O autor não faz mais do que retomar os argumentos aduzidos por Charles Verlinden 183

Sem dúvida o facto mais significativo desta estrutura institucional deriva de a Madeira ter servido de modelo referencial para o seu delineamento no espaço atlântico. O monarca insiste, nas cartas de doação de capitanias posteriores, na fidelidade ao sistema traçado para a Madeira. Assim o comprovam idênticas cartas concedidas aos novos capitães das ilhas dos Açores e Cabo Verde. O mesmo sucede com a demais estrutura institucional que chegou também a S. Tomé e Brasil 179 .

desde a década de sessenta. Note-se que esta argumentação mereceu alguns reparos na sua formulação, mercê de novos estudos 184 .

Também os castelhanos vieram à ilha receber alguns ensinamentos para a sua acção institucional no Atlântico, como se depreende do desejo manifestado em 1518 pelas autoridades antilhanas em resolver a difícil situação das ilhas de Curaçau, Aruba e la Margarita com o recurso ao modelo madeirense de povoamento. Isto prova, mais uma vez, a presença modelar da ilha no contexto da expansão europeia e demonstra o interesse que ela assumiu para a Europa.

Na verdade tudo o concretizado em termos do mundo atlântico português teve por matriz o sucedido na Madeira. A Madeira foi ao nível social, político e económico, o ponto de partida para o umundo que o português criou ... nos trópicos. Neste contexto é sumamente importante o conhecimento do sucedido na Madeira quando pretendemos estudar e compreender as outras situações.

João de Melo da Câmara, irmão do capitão da ilha de S. Miguel, resumia em 1532 180 de uma forma perspicaz o protagonismo madeirense no espaço atlântico. Segundo ele, a sua família era portadora de uma longa e vasta experiência uporque a ilha da Madeira meu bisavô a povoou, e

BIBLIOGRAFIA

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NOTAS

RGCMF, t. I, fl. 203 -211 , publi. AHM, XV (1972), 11-20. Temas de história de Portugal, espaço Português, vol. II, Lisboa, 1989, 109-123 . 3 É de notar a forma como tudo surge na "Relação de Francisco Alcoforado ". O autor, depois de referir o descobrimento de Machim, refere que el-Rei ordenou a João Gonçalves Zarco que .. fose descobrir aquella terra " . 4 Saudades da Terra, ed. 1873, p. 675-677. 5 Confronte-se Eduardo PEREIRA, Ilhas de Zargo, vol. II, Funchal, 1989, pp. 856-865; .. A Lenda de Machim " in Congresso do Mundo Português, vol. m, t. I, Lisboa, 1940, pp . 189-207. 6 Durante muito tempo discutiu-se o alcance dos seguintes conceitos: reconhecimento, descobrimento e achamento. Veja-se J. VIDAGO, O conceito da palavra descobrimento no século XVI, separata n. 2 155-156 revista Vértice; Gago COUTINHO, Nautica dos descobrimentos, vol. II, Lisboa, 1952; Jaime CORTESÃO, .. o que é o descobrimento? ", in Os descobrim entos portugu eses, vol. IV, Lisboa, 1981 , pp. 909-923; Armando CORTESÃO, "Descobrimento e descobrimentos", in Garcia da Orta, n. 2 especial, 1972, pp. 191-200; Joaquim Barradas de CARVALHO, .. A pré-história e a história das palavras Descobrir e descobrim ento (1055-1567)- (em busca da especificidade da expansão portuguesa) " in História, n .2 6, Lisboa, Abril de 1980, 30-38; Luís de ALBUQUERQUE, .. Algumas reflexões a propósito da palavra descobrimento ", in Islenha, n .2 1 (1987), 7-11. 7 As Relações do descobrimento de Guiné e das Ilha s dos A çores, Madeira e Cabo Verde, sep. do Boletim da Sociedade de Geografia, 1898-1899. 8 Tenha-se em conta as comemorações do IV centenário de sua morte (1960) que teve reflexos evidentes nesta realidade, sendo de realçar a colecção henriquina da responsabilidade de Costa Brochado. Veja-se Duarte LEITE, Coisas de Vária Hi stória, Lisboa, 1941 ; António Domingues de Sousa COSTA, Infante D. Henrique na Expansão Portuguesa , Braga, 1963 A Madeira não ficou alheia a isto como se pode verificar pelo volume do Arquivo Histórico de Madeira (XII-1960-1961). A este propósito é de realçar os textos publicados por Eduardo PEREIRA, .. Infante Don Henrique e a Geografia Histórica das capitanias de Madeira " in AHM; XII, 21-54; «V Centenário henriquino, Sua projecção na História da Madeira", AHM, XIII (1962-1963), 42-70; Ernesto GONÇALVES, .. o infante e a Madeira", in Portugal e a Ilha , Funchal, 1992, 19-22. 9 Alberto VIEIRA, uO infante Don Henrique e o senhorio de Lanzarote: implicações políticas, sociais e económicas ", in II fornadas de história de Lanzarote e Fu erteventura, tomo I, 1990, 261-274. 10 Temos notícia do seu cumprimento nos séculos XVI e XVII, recebendo os vigários 3000 rs da Provedoria da 1

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Memórias para a História das navegações e descobrimento dos portugueses ", in Memória s da Academia Real de Ciências de Lisboa, vol. IV, Lisboa, 1819, pp. 1-19; ..Aditamento à primeira parte da memória sobre as verdadeiras épocas em que principiarão as nossas navegações e descobrimento do oceano Atlântico ", in Memórias da Academia Real de Ciências, vol. IX, Lisboa, 1831 , pp. 177-230. 30 Memória sobre a prioridade dos descobrimentos portugueses na costa ocidental africana, Lisboa, 1958. 31 Livro de Marinharia , Lisboa, 1903. 3 2 Ob. cit., nota V. 33 uA lenda de Machim", in Congresso do Mundo Português, vol. III, tomo 1, Lisboa, 1940, pp. 188-208 . 34 Account of the island of Madeira, Londres, 1812. 35 Vida do Infante D. Henrique, Lisboa, 1876. 36 Sentimentalismo e História, Porto, 1897. 37 D. Francisco Manuel de Melo e o descobrimento da Madeira, Lisboa, 1935, sep. Biblos; .. Machim, Machico, Melo e Madeira ", in Biblos, vol. XVI, tomo II, pp. 567-571. 38 Notas para a História da ilha da Madeira. Descoberta e início do povoam ento, Funchal, 1957; A relação de Francisco Alcoforado, Funchal, 1961 (sp. DAHM, n.!.l3 1); .. Q Caso Machim à face dos documentos", in Das Artes e da História da Madeira, n. 2 25 -26-27, 1957. 39 .. o descobrimento do Porto Santo e da Madeira e o Infante D. Henrique ", Revista da Universidade de Coimbra, vol. XXIII, 1973, pp. 305-317; .. A História do descobrimento da ilha da Madeira por Roberto Machim em fins do século xrv .. , in Revista da Universidade de Coimbra, vol. XXIII, pp. 292-409. 40 Isto valeu-lhe um ataque cerrado do Visconde do Porto da Cruz (Revista Portuguesa, n.2 84) e Eduardo Pereira (.. Adenda ", in Ilhas de Zargo, vol. II, pp. 857-865) . Aresposta do autor surgiu em «As notas para a História da ilha da Madeira>>no Pelourinho, Funchal, 1959. 41 .. Estudo da "Relação de Francisco Alcoforado"", .. AJgo mais acerca da "Relação de Francisco Alcoforado "", in Portugal e a Ilha, Funchal, 1992, pp. 235-255, 257-268. 42 .. o Texto de Francisco Alcoforado", in Atlântico, n. 2 5, 1986, pp. 19-26. 43 .. Da história à literatura - ainda o descobrimento da Madeira", in Actas III Colóquio Internacional de História da Madeira , Funchal, 1993, pp. 201-206. 44 Quando foi descoberta a Madeira i, Lisboa, 1911. 45 .. o conhecimento dos arquipélagos no século xv .. , in História da Expansão Portuguesa no Mundo, vol. I, pp. 269-273; uA relação de Francisco Alcoforado" , in Arquivo Histórico da Marinha, vol. I, 1936, pp. 317-329. 46 Descobrimentos, guerras e conquistas dos Portugu eses em terras do ultramar nos séculos XV e XVI, Lisboa, 1881 -1882. 47 Desta edição fez-se uma reprodução no século dezanove que figura com a mesma data .

Fazenda. Veja-se ANTT, Provedoria da Fazenda do Funchal, n .!.l 964, fl. 191 v.!.!, 193v.!.!, 195, 22 de Outubro de 1599, 17 de Março e 12 de Junho de 1600; n. 2 980, fl. 363-364v. 2 , 15 de Maio de 1650. 11 Note-se que até esta data é questionada à luz de um estudo do calendário, uma vez que em 1419 o dia 2 de Julho não foi num domingo, como o pretende afirmar Gaspar Frutuoso. Por curiosidade anote-se que em 1590, uma das datas apontadas para a redacção do livro sobre a Madeira, o dia 2 de Julho coincide com um domingo o que poderá ter levado o autor a semelhante equívoco. 12 Crónica de Guiné, Porto, 1937, cap. CXXXII, pp. 189-196. 13 Asia, década I, livro I, caps. II e III. 14 Saudades da Terra. Livro segundo, Ponta Delgada, 1979, cap. I a VIII. 15 .. Primeira Navegação", publ. in A Madeira vista por estrangeiros, Funchal, 1981, pp. 35-36. 16 Emeraldo de situ orbis, ed. 1975, pp. 14, 97-98. 17 Crónica do principe D. João, Coimbra, 1790, cap. VIII, pp. 13-14. 18 O manuscrito de Valentim Fernandes, Lisboa, 1940, pp. 155-159, 219. 19 Tratado dos descobrimentos antigos e modernos, Porto, 1944, pp. 82-83, 114-119. 20 Edição de Jean Fontvieille, uA lenda de Machim. Une découverte bibliographique à la bibliotheque Musée du Palais Ducal de Bragance à Vila Viçosa (Portugal)", in Actas do Congresso Internacional de História dos Descobrimentos, vol. III, Lisboa, 1961, pp. 197-238. 21 Epanáfora Amorosa, Braga, 1975 (edição de José Manuel de Castro). 22 .. Descrição da ilha da Madeira", in A Madeira vista por estrangeiros, Funchal, 1981, pp. 79-82. 23 História da ilha da Madeira , Funchal, 1930 (edição anotada por Fernando Augusto da Silva). 24 .. Relações do descobrimento da Guiné e das ilhas dos Açores, Madeira e Cabo Verde", in Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa, 1898-1899, pp. 25-28. 25 uNota III. Descobrimento do archipelago da Madeira Por Zargo e Tristão Vaz,, uNota IV. Descobrimento do archipelago da Madeira: diversas tradições, lendas e noticias", «Nota V. Descobrimento da ilha da Madeira por ingleses: caso de Machim e Anna de Arfet ", publicado in Saudades da Terra(. .. ), Funchal, 1873, pp. 329-339, 340-348, 348-429. 26 Confronte-se Arquivo Histórico da Madeira , vol. XII, 1960-1961. 27 Pe. Fernando Augusto da SILVA, uQuincentenario do descobrimento da Madeira.,, in Elucidário Madeirense, vol. III, pp. 163-168. A propósito disto foi feita uma publicação comemorativa: V centenário do descobrimento da Madeira, Funchal, 1922. 28 lles de l'Afrique, Paris, 1847; Notice des découvertes faites au Moyen-Age dans l'océan Atlantique, Paris, 1845.

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Chama-se a atenção para o facto de que a primeira edição em inglês do texto de Francisco Alcoforado é de 1675 (The first discovery of the island of Madeira), seguindo-se outra em 1750 (An historical account of the discovery of the island of Madeira, abridged from the portugueze original to which is added, an account of the present state of the island, in a letter to a friend). Em 1845 Terence Mahon Hughes publicou um poema (The ocean flower. A poem preceded by an historical and descriptive account of the island of Madeira) . 49 .. Descobrimento da ilha da Madeira por inglezes: Caso de Machim e Anna de Arfet", pp. 348-429. 50 .. o caso Machim à face dos documentos", in DAHM, n .ll 25-27, 1957. 5 1 uMachin and Madeira", in Gloucestershire Illustrations, Londres, 1861, pp. 5-23. 5 2 uMachen Family, Gloucestershire" in Bristol and Gloucestershire Archaeological Transactions for the year 1943, pp. 96-112. 53 Juan AL VAREZ DELGADO, uEl episodio de Juan Machin en la Madera" , in Das Artes e Da História da Madeira, vol. VI, n. 2 31, 1961. 54 Livro de Marinharia, Lisboa, 1903, pp. XXIII-XXIV; Frei Ayres de SÁ, Frei Gonçalo Velho, Lisboa, 1899, pp. CXVII-

-478; F. PÉREZ EMBID, Los Desco brimientos en el Atlántico y la rivalidad castelhano-portuguesa hasta el tratado de Tordesilhas, Sevilha, 1948; V. MAGALHÃES GODINHO, Documentos sobre a expansão portuguesa, vol. I, Lisboa, págs. 193-206; Ch. VERLINDEN, uLes découvertes portugaises et la collaboration italienne d'Alphonse IV", in Congresso Internacional de História dos Descobrimentos, Actas, vol. III, 1961, págs. 593-610; Id., uLanzarotto Malocello et la découverte portugaise des Canaries", in Revue Belge de Philologie et d 'Histoire, tomo XXXVI, 1958, n. 2 4; Id., uHenri le navigateur et les iles Canaries", in VIII Colóq@o de História Canario Americana, tomo I, Las Palmas, 1991, pp. 39-51; A PÉREZ VOITEREZ, Problemas jurídicos internacionales de la conquista de Canarias, La Laguna, 1958; P. E. RUSSEL, uEl descubrirniento de las Canarias y el debate medieval acerca de los derechos de los príncipes y pueblos paganos", in Revista de História Canária, tomo XXXVI, 1978, págs. p. 9-32; Id., uFontes documentais para a História da expansão portuguesa na Guiné nos últimos anos de D . Afonso v ,, in Do Tempo e da História, IV, 1971, págs. 5-33; Id., O Infante D. Henrique e as ilhas Canárias. Uma dimensão mal compreendida da biografia henriquina, Lisboa, 1979. 63 " Esbozo de un estudio de la influencia portuguesa en la cultura internacional canaria", in Homenaje a Elias Serra Ráfols, I, 1970, pág. 372; idem, Los portugueses en Canarias. Portuguesismos, Las Palmas de Gran Canaria, 1991. 64 Veja-se Costa BROCHADO, Historiógrafos dos Descobrimentos, Lisboa, 1960. 65 Veja-se os trabalhos publicados na Revista de História, da universidade de La Laguna e El Museo Canario. 66 Gomes Eanes de Zurara, Crónica de Guiné, Porto, 1973, caps. LXVIII, LXIX, LXXV, LXXIX, XCV; J. de BARROS, Da Asia , década primeira, parte primeira, Lisboa, 1973, caps . XI-XIII; Ruy de PINA, Cronique dei rey Dom foham II, Coimbra, 1950, pág. 26; Garcia de RESENDE, Crónica de Dom foham II, Lisboa, 1973, pág. 45; G. FRUTUOSO, Saudades da Terra, 1. 2 L. 2 , Ponta Delgada, 1966, cap. IX, págs. 65-76. 67 Ibid., pág. 69, O cronista das ilhas deverá referir-se à letra sincere devotions de 2 de Maio de 1421 (Monumenta Henricina, vol. III, Lisboa, 1961, núm. 8, págs. 14-17) ou então à bula Romani Pontificis de 30 de Abril de 1437 que revoga a bula Rex Regum de 8 de Setembro de 1436, veja-se Monumenta Hemicina , vol. VI, 1964, núm. 21, págs. 41-53; Ibid., vol. V, v. 2 90, págs. 214-216; Ibid, n. 2 97, págs. 230-234. A Monumenta Henricina, 14 vols., Coimbra, 1960-1973, publicada sob os auspícios da Comissão Executiva das Comemorações do V Centenário da morte do Infante dom Henrique é o mais importante repositório de documentação para o estudo das pretensões henriquinas às Canárias. 68 M. A. LADERO QUESADA, uLos seftores de Canarias en su contexto sevillano (1403-1477)", in Anuario de

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Public Record Office, Calendar of Glose Rolls, ref. 23/59 X/II 7137, pp. 488 a 489. 56 Public Record Office, Parliament. VII &. VIII Hen. IV, ref. RRll /84 83227, pp. 571-572. 57 Confronte-se Vitorino Magalhães GODINHO, Os Descobrimentos Portugueses e a Economia mundial, vol. II, Lisboa, 1982, p. 232. Aí releva-se a acção de João Afonso, vedar da Fazenda. 58 Utilizamos a versão publicada em 1961 por Jean FONTVIEILLE. Publicada: "A Lenda de Machim (... )" in Actas do Congresso Internacional de História dos Descobrimentos, III, Lisboa, 1961, 197-238. 59 umandoulhe ell Rey fazer prestes hum navjo e hum barynel ... " o regresso ao reino: ulevou ell Rey muyto prazer do que tynha João Gez feito ... ". 60 uno verão syguinte na etrada de Mayo mandou el Rey fazer prestes três navjos (... ) e as que ouveses devedor mandou ell Rey dar os omeziados e comdenados que ouvese palas cadeas e reynos (... ) Ell Rey cada verão mandava navjos e ferro e aço e sementes e gados ... ". 61 ANTT, C.C. , parte I, maço 27, doe. 22, carta ao rei. 62 Eis os estudos mais importantes: P. MEREA, .. como se sustentaram os direitos de Portugal sobre as Canárias" , in Estudos de História de Direito, Coimbra, 1923, fols. 137 y segs.; E SERRA RÁFOLS, «Portugal en las islas Canarias", in Congresso do Mundo Português, vol. III, Lisboa, 1940, págs. 211-241; Los portugueses en Canárias, La Laguna, 1941; Id, uLancelloto Malocello en las islas Canárias", in Congresso Internacional de História dos Descobrimentos, Actas, vol. III, Lisboa, 1961, págs. 467-

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.MA RE" LI BQUJM

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Estudios Atlánticos, núm. 23, 1977, págs. 127-128; V. MAGALHÃES GODINHO, .. A Economia das Canárias nos séculos XIV e XV, in Revista de História, S. Paulo, 1952. Em 1434 o papa Eugénio IV proíbe pela bula uRegimini gregis .. a escravização dos canários (M.H., V, núm. 28, págs. 89-93); núm. 52, págs. 118-123, letras uucator omnium .. de 17 de Dezembro; ibid, núm. 93, págs. 184-185, letras uoudum nostrasn de 13 de Janeiro de 1436. 69 M.H., núm. 18, págs. 14-16, concedido na mesma data por 5 anos pela, vol. III letra uSincere Devotions .. , publ. ibid., núm. 9, págs. 16-17. A 26 de Maio o monarca solicitou a concessão perpétua, veja-se ibid., núm. 10, págs. 17-18. 70 M.H., vol, V, núm. 137, 143. 71 Ibid., IX, núm. 95, págs. 121-123. 72 Ibid., IX, núm . 174, págs. 273-275, 9 de Março de 1448. 73 Ibid., XI, núm. 138, págs. 172-179, 25 de Maio de 1452; ibid., núm. 236, págs. 239-245, 10 de Abril de 1454. 74 Ibid., XII, núm . 144, págs. 30-32, 27 de Maio de 1456; Ibid., XIII, núm. 151, págs. 315-316. 75 Ibid., XIV, págs. 239-332, nota 2. 76 Ibid., XIV, núm. 140, págs. 322-324; Ibid., núm. 145, págs. 318-333. 77 A. Artur SARMENTO, .. Madeira & Canárias .. , in Fasquias e Ripas da Madeira , Funchal, 1931, 13-14. 78 M.H., vol. XI, 172-179. 79 Veja-se L. SIEMENS e L. BARRETO, .. Los esclavos aborigenes canarios en la isla de la Madera (1455-1505) .. , in Anuario de Estudios Atlánticos, núm. 20, 1974, págs. 111·143 e o nosso estudo .. o Comércio de cereais das Canárias para a Madeira nos séculos XVI e xvrr .. , in Colóquio de História Canário Americana (1984), Las Palmas, 1988. 80 G. FRUTUOSO, Saudadades da Terra, L.º I, Ponta Delgada, 1966, 69; ibid., L. 2 IV, vol. II, Ponta Delgada, 1981, pág. 263; J. Dias LEITE, Descobrimento da ilha da Madeira .. . , Coimbra, 1947, pág. 32; M.H., vol. IX, núm. 174, págs . 273-275. 81 G. FRUTUOSO, Ob. cit., L.QIV, vol. I, Ponta Delgada, 1977, págs. 103-113; F. Augusto da SILVA, uBettencourt .. , in Elucidário Madeirense, vol. I, Funchal, 1984, 138-139; H. Henriques DE NORONHA, Nobiliário Genealógico das famílias que passaram a viver esta ilha da Madeira .. ., vol. I, S. Paulo, 1947, 51-74; Nobiliário de Canarias, tomo I, La Laguna, 1952, págs . 595-600; L. DE LA ROSA OLIVEIRA, uLos Bettencourt en Las Canarias y en América .. , in A. E. A. núm. 2, págs. 130-135. 82 Descobrimento da Ilha da Madeira (. . .}, Coimbra, 1957, p. 9. 83 Confronte-se o que diz a este propósito Carreiro da COSTA em Esboço Histórico dos Açores, Ponta Delgada, 1978, p. 53. 84 Notas para a História de Madeira. I. Descoberta e início do povoamento, Funchal, 1957. 85 Note-se que Jordão de FREITAS (.. Madeira, Porto Santo e Deserta. Ilhas que o infante .. novamente achou e

povoou .... , in C. M. P., vol. III, tomo 1, Lisboa, 1940, 169-172), considera que a primeira viagem só teve lugar em 1419. 86 Crónica da Guiné, cap. XXXII. 87 J. Dias LEITE, ob. cit., 15-16; Gaspar FRUTUOSO, ob. cit., 53. 88 Esta carta foi pela primeira vez referenciada por Álvaro Rodrigues de AZEVEDO sendo, todavia considerada apócrifa por alguns historiadores, como José Hermano SARAIVA (Temas de História de Portugal, vol. II, pp. 109·112). 89 A.R.M., C.M.F., registo geral, tomo I, fl. 128-132, publ. in Arquivo Histórico da Madeira, vol. XV, pp. 20-25. 90 A.R.M., C.M.F., registo geral, tomo I, fl. 204-209, publ. in A.H.M. vol. XV, pp. 11-20. 91 ANTT, Convento de Santa Clara, maço 1, n. 2 1, publ. J. M. Silva MARQUES, ob. cit., vol. I, pp. 453-454. 92 Publ. J. M. Silva MARQUES, ob. cit., vol. I, pp. 453-454. 93 ANTT, Convento de Santa Clara, maço 1, n.º 1, publ. idem, ibidem, I, pp. 514-515. 94 ANTT, Livro das Ilhas, fl. 31 v.ll, publicado idem, ibidem, pp. 541-543. 95 Este enigmático Henrique Alemão é considerado o Imperador Ladislau III da Polónia. Confronte-se J. Reis GOMES, O Cavaleiro de St.a Catarina de Varna à Ilha de Madeira, Funchal, 1941. 96 Sobre a presença e importância das gentes da casa do infante veja-se João Silva de SOUSA, uA casa do infante D. Henrique e o arquipélago de Madeira (algumas notas para o seu estudo ln, in Colóquio Internacional de História da Madeira, vol. I, Funchal, 1989, 108-127. 97 Saudades da Terra, 217-218. 98 Confronte-se Jerónimo Dias LEITE, ob. cit., p. 16. 99 Ob. cit., 16; Gaspar FRUTUOSO, ob. cit., 54. 10 0 Luís Francisco de Sousa MELO, uA imigração da Madeira .. in História e Sociedade, n. 2 6, 1979, 39-57; Idem, .. o Problema de origem geográfica do povoamento .. in Islenha, n.º 3, 1988, 19-34. 101 O Algarve e a Madeira no Século XV, Lisboa, 1974, sep. de Ultramar; confronte-se com a crítica de Fernando J. PEREIRA em O Algarve e a Madeira, Braga, 1975. 102 A. T. MATOS, uDo contributo algarvio no povoamento de Madeira e dos Açores .. in Actas das I fornadas de História do Algarve e Andaluzia, Loulé, 1987, 173-183; .. Origem e reminiscências dos povoadores das ilhas atlânticas .. , in Congresso Internacional. Bartolomeu Dias e a sua época, vol. III, Porto, 1989, 241-252. 103 Fernando Augusto da SILVA, uDo começo do povoamento madeirense .. , in Das Artes e História da Madeira, vol. VIII, n.º 37, 5; Joel SERRÃO, uNa alvorada do mundo atlântico .. , in Ibidem, vol. VI, n. 2 31, 1961, 6. 104 uNo Minho ao sol de Verão .. , in Ibidem, vol, IV, n. 2 21, 1955, 45-46; Fernando Vaz PEREIRA Famílias da Madeira e Porto Santo, vol. I, Funchal, s. d., pp. 224 (n. 2 1) e 248 (n. 2 1).

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EA MADEIRA

105 ANTT, Convento de Santa Clara, maço 1, ref. Padre Manuel Juvenal Pita FERREIRA, O arquipélago da Madeira terra do senhor infante, p. 132. 1 06 ANTT, Cabido da Sé do Funchal, maço 1, n.º 1, 20 de Fevereiro 1499. 107 ANTT, C. C., I, maço 27, n .º 52, 25 de Junho. 108 ANTT, Chancelaria de D. Duarte, L.º I, fl. 18, publ. J. M. Silva MARQUES, Descobrimentos Portugueses, vol. I, Lisboa, 1988, 271-272. I09 ANTT, Provedoria da Fazenda do Funchal, n.º 1150, fl. 101, publ. J. M . Silva MARQUES, ob. cit., supl. vol. I, pp. 109-110. uo ANTT, Chancelaria de D. Afonso V, liv. 19, fl. 19v. 2 , publ. por Monumenta Hemicina, Vl (1964), pp. 316-317. 111 ANTT, Chancelaria de D. Afonso V, liv. 37, fi. 52v.2 , publ. ob. cit., vol. X (1969), p. 34. 112 ANTT, Chancelaria D. João III, 1055, fi. 184, publ. J. M. Silva MARQUES, ob. cit., vol. I, pp. 403-404. 113 ANTT, Chancelaria de D. Afonso V, 1.2 33, fl. 85, publ. J. M . Silva MARQUES, ob. cit., vol. I, pp. 449-450. 114 ANTT, Chancelaria de D. Afonso V, 1. 2 37, fl. 52v. 2 , publ. J. M . Silva MARQUES, ob. cit., vol. I, pp. 488-489. 115 ANTT, Livro das Ilhas , fi. 21 , J. M. Silva MARQUES, ob. cit., vol. I, pp. 490-491. 116 Ibidem, fls. 28-29, publ. por J. M. Silva MARQUES, ob. cit., vol. I, pp. 547 -549; com confirmação régia de 17 de Agosto de 1459, publicada in Archivo dos Açores, II, pp. 11-14. 117 Conforme confirmação régia de 15 de Março de 1473, ANTT, Livro da s Ilhas, fi. 93v.º. Confronte-se Gaspar FRUTUOSO, Livro Segundo da s Saudades da Terra, Ponta Delgada, 1979, p. 66. 118 ANTT, Livro das Ilhas, fi. 146v.º, publ. Saudades da Terra, 1873, p. 494. 119 RGCMF, tomo I, fls. 204-209, publ. in AHM, vol. XV, pp. 11-20. 120 Ob. cit., p. 26. 121 Privilégio de isenção da dízima e portagens nas mercadorias enviadas ao reino: ANTT, Chancelaria de D. Afonso V, 1. 2 19, fl. 17v.º, carta de 1 de Junho de 1439, publ., J. M. S. MARQUES, ob. cit., vol. I, Lisboa, 1988, p. 400; ANTT, Chancelaria de D . Afonso V, 1. 2 , 25 , fl. 13v.2, carta de 18 de Julho de 1449, publ. in idem, ibidem, pp. 439-440 . 122 Veja-se Joel SERRÃO, .. o infante D. Fernando e a Madeira, 1461-1470 .. , in Das Artes e da História da Madeira, 4, 1950, 10-17; Manuel J. Pita FERREIRA, .. o infante D. Fernando, terceiro senhor do arquipélago da Madeira, 1460-1470", in ibidem, 33, 1963, 1-22. 123 A Relação de Francisco Alcoforado, publ. por José Manuel de CASTRO, Descobrimento de Ilha da Madeira ano de 1420 ... , Lisboa, s. d., p. 90. 124 Ibidem, p. 93 . 125 Ibidem , p. 93. 126 J. M. Silva MARQUES, ob. cit., I, p. 273, 400.

127 Fernando Jasmins PEREIRA, .. Bens Eclesiásticos Diocese do Funchal .. in Estudos sobre Hi stória da Madeira, Funchal, 1991, pp. 325-327. 128 RGCMF, tomo I, fls . 204-209, publ. AHM, XV, pp. 11 -20. Vejamos o que é dito : uEm esa parte da ylha ho sennor ynfante meu padre que Deos aja nunca pos mays de hum capellam porque emtam a gente era pouca E agora he em mays multiplicaçam asy que hum soo capellam nom pode abrajer a todollos lagares ··· " · 129 Confronte-se Monumenta Henricina , m, (1961), pp . 53-54. I30 J. M. Silva MARQUES, ob. cit., I, p. 590. 131 Confronte-se Padre Fernando Augusto da SILVA, Subsídios para a História da Diocese do Funchal, Funchal, 1946, pp. 22-35, 299-376; Padre Manuel Juvenal Pita FERREIRA, O Arquipélago da Madeira Terra do Senhor Infante de 1420 a 1460, Funchal, 1859, pp. 308-352. 132 uNotas .. , Saudades da Terra, Funchal, 1873, pp. 534-566. 133 Subsídios para a Hi stória da Diocese do Funchal, pp. 22-35. 134 Em 1466 continua a referir-se só um vigário (RGCMF, I, fls. 216-219v. 2, publ. AHM, XV, pp. 36-40). 135 Propositadamente ignoramos a controvérsia em torno da posse do senhorio das Canárias, remetendo o seu conhecimento para: Jose PERAZA DE AYALA, uLa sucesión del senorio de Canarias (... h in Historia Gen eral de las islas Canarias, II, Las Palmas, 1977, 133-166; Miguel A. LADERO QUESADA, .. Los senores de Canarias en su contexto Sevillano (1403-1477)n, in Anuario de Estudios Atlánticos, n.º 23, 1977, 125-164; Acuerdos del cabildo de Fu erteventura 1605 -1659, Santa Cruz de Tenerife, 1970, pp. 11 -15. 136 Esta doação enquadra-se no tipo de senhorio existente em Portugal que fora regulamentado pelas Ordenações Afonsinas e Lei Mental, veja-se: António Manuel HESPANHA, História da s In stituições .. ., Coimbra, 1983, 282-301 , 325; Fernando Jasmins PEREIRA, A Ilha da Madeira n o período h enriquino (1433 -1460), Lisboa, 1961. 137 Luís Filipe R. THOMAS, .. Estruturas quasi-feudais na expansão portuguesa .. , in Colóquio Internacional de História da Madeira , vol. I, Funchal, 1986, pp. 80-87; António MURO OREGON, .. Edad Media enCanarias y America .. , in I Colóquio de História Canario-Americana (1976), Las Palmas, 1977, 43-64; Alfonso GARCÍA-GALLO, uLos sistemas de colonización de Canarias y América en los siglas XV y XVJ, in ibidem, 423 -442. 138 Le canarien, La Laguna, 1960, 320-323; J. VIERA Y CLAVIJO, Historia de Canarias, I, 342. 139 Ibidem, 310. 14 ° Charles MARTIAL DE WITTE, Les Bulles pontificales et l'expansion portugaise au xv•m• Siecle, Louvain, 1958, uLes bulles d'erection de la province eclésiastique du Funchal .. , in Arquivo Histórico da Madeira , xm, 1962-

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-1963; António BRASIO, .. o Padroado da Ordem de Cristo na Madeira .. , in Arquivo Histórico da Madeira, xn, 1960-1961. 141 Joseph de VIERA Y CLAVIJO, Historia de Canarias, II, 1952, 476 e segs. 142 Livro Segundo das Saudades da Terra, P. D., 1979, p. 93. 143 Crónica de Guiné, Porto, 1973, p. 347. 144 Ob. cit., p. 94 e 97. 145 Ob. cit., p. 347. 146 Ob. cit., p. 113. 147 Confronte-se O manuscrito de Valentim Fernandes, Lisboa, 1940, 111-112. 148 Ob. cit., p. 20. 149 Ásia, década primeira, Coimbra, 1932, p. 19. 15 Confronte-se António ARAGÃO, A Madeira vista por estrangeiros, Funchal, 1981, nota 4, pp. 42-45. 151 Diz Cadamosto: .. é uma goma, que eles estilam em certo tempo do ano, e se colhe por esta maneira: fazem alguns golpes de cutelo no pé da árvore, e no auno seguinte em certo teíipo, as ditas cortaduras estilam a goma que cozem, e purificam e assim se faz o sangue .. . 152 ANTI, Livros das Ilhas, fl. 31 v. 2 . 153 Veja-se Jordão de FREITAS, Serras de Água da Madeira e Porto Santo, Lisboa, 1937. 154 Valentim Fernandes refere: Os castelhanos em conquistando as Canárias vieram ter a esta ilha do Porto Santo em tempo, e acharam n'ella as cabras de que fize ram carnagem( ... ). E de ahi avante quando iam sobre os canários sempre vinham a dita ilha fazer carnagem ... 155 ucada veram mandava navios com animaes domesticas, ferro, e asso, e gado que tudo frutificava grandemente" (Jerónimo Dias LEITE, ob. cit., p. 19). 156 Note-se o que sucederá mais tarde nos Açores e aqui com a ilha Deserta. O testemunho de Zurara é paradigmático: .. E fez lançar gado em outra ilha, que está a sete léguas da ilha da Madeira, com intenção de a mandar povoar como as outras, a qual se chama a ilha Deserta ..... (ob. cit., cap. LXXXITI, p. 349). 157 Esta ideia é corroborada em carta de Simão Gonçalves da Câmara de 25 de Junho de 1511: «naquele tempo que se deram essas terras não se sabia que outros frutos havia de dar nela senão pão e vino ..... (ANTI, C. C., parte I, maço 27, doe. 22). 158 Confronte-se J. Dias LEITE, ob. cit.; Gaspar FRUTUOSO, ob. cit., p. 146. 159 Ob. cit., p. 37. 160 ANTI, C. C., 1.ª parte, maço 27, doe. 22. 161 J. Dias LEITE, ob. cit., p. 102; Gaspar FRUTUOSO, ob. cit., p. 146 162 RGCMF, tomo I, fls. 132-132v.2, publ. AHM, vol. XV, pp. 7 e 8. 163 Confronte-se Vitorino Magalhães GODINHO, Do cumentos sobre a expansão portuguesa, vol. III, Lisboa, 1943; idem, História Económica e social da Expansão

Portuguesa, Lisboa, 1947; idem, A expansão quatrocentista portuguesa. Problemas das origens e da linha de evolução, Lisboa, 1944; idem, uLe probleme du pain das l'économie portugaise. xv•-xvr• siecle .. , in Revista de Economia, vol. x:n, 1959, n. 2 47, pp. 87-113; idem, Os descobrimentos e a economia mundial, vol. III, p. 223-231 ; Oliveira MARQUES, Introdução à História da Agricultura em Portugal, Lisboa, 1978, pp. 251-254. Mais recentemente Fernando Jasmins PEREIRA (Estudos Sobre História da Madeira, p. 64) afirmou que .. a cultura cerealífera constitui a verdadeira base da colonização madeirense". 1 4 6 Confronte-se Joel SERRÃO, Temas Históricos Madeirenses, pp. 17-20 e 53-75. 165 Le Méditerranée et le Monde Méditerranéen (.. .), ed. de 1949, 123. 166 L'ile de Madere (... ), Lisboa, 1949, p. 67. 167 .. El gofio nuestro de cada dia .. , in Estudios Canarios, XIV-XV 1969-1970; 97-99; corroborado por M. A. LADERO QUESADA (Espana en 1492, Madrid, 1978, 205-218), Eduardo AZNAR VALLEJO (La integración de las islas Canarias en la carona de Castilla, La Laguna, 1983, 455) e Fernando CLA VIJO HERNANDEZ .. Los documentos de fletamentos (... )n, in IV C.H.C.A., vol. I, 36. A tese de Victor MORALES LEZACANO baseada em F. Braudel surgiu pela primeira vez em Síntesis de la historia economica, Tenerife, 1966, sendo depois reforçada em Las relaciones Mercantiles entre Inglaterra y los archipélagos atlántico ibéricos(.. .), La Laguna, 1970 e em .. cultivos dominantes y ciclos agrícolas en la historia Moderna de las islas Canarias .. , in Historia General de las islas Canarias, IV, 11-22. 168 Frédéric MAURO, Le Portugal et l'Atlantique au XVII•, siecle (... ), Paris, 1960, SOl; Idem, .. conjoncture économique et structure sociale en Amérique !atine depuis l'époque coloniale .. , in Con;oncture Économique, Structures Sociales, Hommage à Ernest Labrouse, Paris, 1974, 237-251; Vitorino Magalhães GODINHO, .. A Divisão da história de Portugal em períodos., in Ensaios II, 2.ª ed., Lisboa, 1978, 12-14. 169 Livro primeiro das Saudades da Terra, Ponta Delgada, 1979, p. 98. 170 Esta ultima ideia ficou expressa no nosso estudo sobre .. A Madeira na rota dos descobrimentos e expansão atlântica", in Revista da Universidade de Coimbra, vol. XXXIV, 1988, pp. 571-580. 171 José PEREZ VIDAL, uAportación portuguesa a la población de Canarias. Datas .. , in Anuario de Estudios Atlánticos, n. 2 14, 1968; A. SARMENTO, .. Madeira & Canárias" in Fasquias e Ripas da Madeira, Funchal, 1931, 13-14. 172 Monumenta Hemicina, vol. XI, 172-179 . 173 Caps. LXVIII, LXX, LXXV, LXXXVII. O mesmo poderá ser comprovado na biografia que Gaspar Frutuoso faz dos capitães do Funchal e Machico. 174 Gaspar FRUTUOSO, Livro Segundo das Saudades da Terra, Ponta Delgada, 1968; A. SARMENTO, A Madeira

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e as praças de África, Funchal, 1932; João José Abreu de SOUSA, "Emigração nos séculos XV a xvn,, in Atlântico, n.º 1, Funchal, 1985, 46-52. 175 Cap. LXX. 176 Veja-se a resenha de feitos em Alberto Artur SARMENTO, A Madeira e as praças de África, Funchal, 1932; João José de Abreu e SOUSA, «Emigração madeirense nos séculos XV a xvn,, in Atlântico, n.º 1, Funchal, 1985, pp. 46-52. 177 Sobre esta figura veja-se o que diz Ernesto GONÇALVES, Portugal e a ilha, Funchal, 1992, pp. 85-118. 178 Confronte-se João José Abreu de SOUSA, .. Emigração madeirense nos séculos XV a XVII", in Atlântico, n.º 1, Funchal, 1985, pp. 46-52. 179 David F. GOUVEIA, uA manufactura açucareira madeirense [1420-1550] ", in Atlântico, n.º 10, Funchal, 1987, p. 131. 180 História da Colonização Portuguesa do Brasil, vol. III, p. 90; cf. Vera Jane GILBERT, uOs primeiros

engenhos de açúcar" in Sacharum, n.º 3, São Paulo, 1978, pp. 5-12. 181 Aventura e Rotina, 2.2 ed., pp. 440-446, 448-449. 182 «Madeira and the beginings of New World sugar cane cultivation and plantation slavery: a study in constitution building", in Vera RUBIN e Artur TUNDEN (eds.), Comparative perspectives on slavery in New World Plantation Societies, N. York, 1977. 183 «Précédents et paralelles européens de l'esclavage colonialu, in Instituto, vol. 113, Coimbra, 1949; uLes origines coloniales de la civilization atlantique. Antécédents et types de structwe", in fournal of World History, 1953, pp. 378-398; Précédents médiévaux de la colonie en Amérique, México, 1954; Les origines de la civilization atlantique, Neuchâtel, 1966. 184 Confronte-se Alfonso FRANCO SILVA, «La eclavitud en Andalucia ... ", in Studia, n. 2 47, Lisboa, 1989, pp. 165-166: Alberto VIEIRA, Os escravos no arquipélago da Madeira. Séculos XV a XVII, Funchal, 1991.

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