O instituto do indigenato: caminhos do reconhecimento na América luso-brasileira

August 2, 2017 | Autor: Wilson Rocha | Categoria: Povos Indígenas, História do Direito do Brasil, Direito Constitucional, indigenato
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O INSTITUTO DO INDIGENATO: OS CAMINHOS DO RECONHECIMENTO NA AMÉRICA LUSO-BRASILEIRA Wilson Rocha Assis As contradições do processo colonial repercutiram na legislação portuguesa editada entre os séculos XVI e XIX. No período colonial brasileiro, o reconhecimento de direitos indígenas sobre seus territórios, corpos e instituições conviveu com sua negação prática e sua destruição velada, tal qual ocorreu em toda a América. Cumpre-nos neste capítulo perscrutar os caminhos pelos quais o reconhecimento dos direitos indígenas tornou-se uma realidade exigível em seu sentido plenamente jurídico na América portuguesa, não obstante as correlações de forças históricas desfavoráveis inviabilizassem a concretização destes direitos. Tal como o sistema de tratados da América anglófona, sobre o qual longamente discorrem as obras de James Tully, Robert Williams, entre outros autores, sustentamos que o indigenato luso-brasileiro compõe parte do constitucionalismo escondido que conforma o núcleo duro dos modernos conceitos do constitucionalismo. Revisitar a história dos direitos e das liberdades indígenas no Brasil servirá, ao menos, para confrontar certas leituras simplistas de debates complexos e profundamente conflitivos, cuja solução, apresentada pelos setores política e economicamente hegemônicos, aponta sempre para o apagamento da diferença e destruição da alteridade indígena. O direito de propriedade no Brasil - especialmente quando confrontado a direitos originários de povos indígenas, ou a direitos decorrentes de conformações sócioculturais características de comunidades tradicionais - deve ser lido, analisado e criticado em sua perspectiva histórica, de modo a resgatar, no palimpsesto dos sucessivos diplomas legais, os direitos e garantias que as violências históricas cuidaram de apagar. O que se pretende afirmar é que, além de um direito originariamente indígena, formulado e aplicado pelas comunidades pré-colombianas e que sobrevive até os dias de hoje na vida comunitárias de seus descententes, que afirma as pretensões originárias dos índios às suas terras, instituições e culturas, esse direito indígena foi reconhecido e abarcado pelo constitucionalismo ocidental, tornando factível a afirmação, em termos estritamente

jurídicos, de direitos fundamentais fundados em uma identidade histórico-cultural distinta da sociedade nacional. Nesse sentido, devemos começar esclarecendo que o Brasil, entre os séculos XVI e XIX, constituia-se de uma miríade de povos, cuja vida social e econômica foi profundamente alterada pela chegada dos europeus na América. As impossibilidades materiais de controle do território e das populações nele presentes não permitem conceber um estado em sua acepção moderna, ou seja, como uma estrutura burocrática apta ao exercício de um poder incontrastável sobre pessoas e territórios. Com essa afirmação, pretende-se atentar para a inexistência do Brasil enquanto realidade nacional, ou seja, enquanto realidade culturalmente homogênea e fundada em um poder soberano. Nos primórdios da colonização, simultaneamente à implantação de estruturas de dominação portuguesa no Brasil - como as capitanias hederitárias, o Governo Geral e as Câmaras Municipais -, em Portugal, a colonização da América promoveu também profundas alterações, entre as quais se deve destacar o fortalecimento da burguesia mercante, o fortalecimento da administração monárquica, a ampliação da base arrecadatória do estado nacional português1 e a consolidação do poder régio, que, assim, venceu definitivamente os particularismos feudais. A par de todas as discussões que a presença européia na América despertou entre os espanhóis, Portugual encontrou seu próprio caminho de efetivação e justificação do domínio exercido em terras americanas. Hartmut-Emanuel Kayser destaca que “a questão do título jurídico para a expansão do domínio no Novo Mundo e a aquisição local de propriedade não haviam obtido qualquer significado em Portugal por longos períodos do século XVI. As soluções teóricas da Escola de Salamanca a respeito dos títulos jurídicos permaneceram sem influência sobre Portugal. O Direito dos portugueses sobre a aquisição de propriedade em terras indígenas no Brasil não foi objeto de dúvidas nem submetido a quaisquer restrições”2.

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“Não devemos imaginar porém que, no século XVI, o Brasil proporcionasse riquezas consideráveis aos cofres reais. Pelo contrário, segundo cálculos do historiador Vitorino Magalhães Godinho, em 1558 a arrecadação proveniente do Brasil representava apenas algo em torno de 2,5% das rendas da Coroa, enquanto ao comércio com a Índia correspondiam 26%”. FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade São Paulo, 1999, p. 47. 2

KAYSER, 2010, p. 142.

No campo econômico, seguindo as diretrizes gerais do mercantilismo, a lavoura canavieira - fundada sob o tripé monocultura, latifúndio e escravidão - forneceu o impulso inicial para o aproveitamento econômico das terras americanas e a justificativa para criação de uma estrutura burocrática de administração. A expansão da pecuária, a comercialização das drogas do sertão e a mineração, esta última a partir do século XVIII, asseguraram a interiorização da colonização e a consolidação do domínio português sobre terras originariamente indígenas. Logo após o envio da primeira expedição colonizadora à América, comandada pelo experiente navegador Martim Afonso de Souza, em 1530, a Dinastia Portuguesa de Avis inaugurou no Brasil o sistema de Capitanias Hereditárias, instalado em 1534, pelo qual se dividiu o território brasileiro em 15 quinhões, definidos por linhas paralelas ao Equador, que iam do litoral atlântico ao meridiano definido pelo Tratado de Tordesilhas. Segundo Bóris Fausto, as capitanias representaram, em essência, “uma tentativa trasitória e ainda tateante de colonização, com o objetivo de integrar a Colônia à economia mercantil européia”3. Os donatários foram investidos na posse dos territórios concedidos, o que significava a atribuição de poderes de ordem jurídica, administrativa (tal como a concessão de autorização para fundação de vilas e engenhos), tributária (recebimento de direitos relativos à agricultura, depósitos de sal, além de parcela dos tributos arrecadados pela Coroa) e militar (especialmente a guarda e vigilância do território contra potências estrangeiras). Conforme ensina Demetrio Ramos Pérez, “el año de 1534 se abrió con las primeras donaciones. Éstas no significaban que el rey enajenara la tierra en favor del donatario: a éste sólo se le daba el beneficio de ella, que tampoco era total. El donatario era, pues, un pequeño virrey que administraba directamente la real hacienda y los poderes de gobierno y las funciones militares. Tenía derecho a la propiedad directa de un 20 por 100 de la propiedad de la capitania y de los molinos e ingenios cuya instalación sólo él autorizaba. Recibía también una vintena del palo de Brasil”4 As capitanias hereditárias não contrariavam a estrutura patrimonialista do Reino Português, pela qual, ao longo da história portuguesa, a monarquia transformou 3 4

FAUSTO, 1999, p. 45.

PÉREZ, Demetrio Ramos. In SALMORAL, Manuel Lucena (coord.) Historia de Iberoamérica. II - Historia Moderna. Madrid: Cátedra, 2008, p. 191.

seus largos domínios na península Ibérica em direitos de soberania, do dominare ao regnare5, como ensina Raymundo Faoro. O mesmo autor destaca que “os dois caracteres conjugados - o rei senhor da guerra e o rei senhor de terras imensas - imprimiram a feição indelével à história do reino nascente”6. Os domínios do rei estendiam-se às terras americanas por força das sucessivas bulas papais editadas ao longo do século XV. A propriedade régia sobre as terras do Novo Mundo trazia como acessório o dever de propagar a fé cristã, segundo o espírito cruzadista presente na expansão marítima portuguesa. Todavia, a colonização do vasto território brasileiro, determinada em 1530 pelo rei João III, deflagrava uma mudança no sistema mercantilista português, limitado, até aquele momento, ao estabelecimento de trocas comerciais mais ou menos regulares com povos autóctones da África e Ásia, asseguradas por forte poder bélico. Segundo Bóris Fausto, “sem penetrar profundamente no território africano, os portugueses foram estabelecendo na costa uma série de feitorias, que eram postos fortificados de comércio; isso indica a existência de uma situação em que as trocas comerciais eram precárias, exigindo a garantia das armas”7. O sistema de feitorias não indicava, propriamente, a necessidade de garantia de territórios e a afirmação da soberania portuguesa sobre outros povos. Portanto, o sistema de capitanias hereditárias sinalizava maiores desafios, que mobilizariam toda a estrutura administrativa, mercantilista e militar portuguesa, para a garantia de seus territórios na América. A colonização das ilhas atlânticas de Madeira, Cabo Verde e Açores, ao longo do século XV, representou um ensaio tímido do que viria a tornar-se o empreendimento colonial português na América. Paralelamente, o sucesso espanhol no descobrimento de metais preciosos no Peru estimulou a Coroa Portuguesa a lançar-se à colonização das terras que lhe foram asseguradas pelo Tratado de Tordesilhas, de 1494. No contexto dessa nova experiência colonizadora, referindo-se à expedição comandada por Martim Afonso de Souza, João Mendes Júnior destaca que “os indios tratavam com Martim Affonso em 1531 como de potencia a potencia, a história nos confirma; e o assalto de Piratininga, em 10 de julho de 1562, se teve por causa occasional

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FAORO, 2001, p. 19.

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Ibidem.

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FAUSTO, 1999, p. 28-29.

as intrigas entre João Ramalho e os jesuitas, teve por causa principal o rompimento do tratado pelo qual Martim Affonso se obrigara a não permitir, sem licença prévia, a subida dos europeus. Martim Affonso havia promettido que os portuguezes não se estabeleceriam em serra acima, nem mesmo poderiam lá ir a resgatar ou negociar com indigenas sem sua licença ou dos capitães-móres seus loco-tenentes, a qual não se daria senão com muita circumspecção e unicamente a sujeitos bem morigerados”8. À vinda de novos colonos, entre os quais se destaca o Capitão-donatário Duarte Coelho, responsável pela instalação da lavoura canavieira na próspera capitania de Pernambuco, seguiu-se, em 1548, a instalação do Governo Geral cuja implantação foi motivada pelas dificuldades do sistema anterior, que revelavam a necessidade do empenhamento estatal para a consolidação dos domínios portugueses nas regiões em que os esforços iniciais de colonização não prosperaram. Via de regra, houve pouco interesse de capitais privados no lançamento da empresa colonial9. O primeiro Governador-Geral, nomeado pelo rei Dom João III, foi Tomé de Sousa, que aportou na colônia em 1549, com extensos poderes descritos em seu Regimento. O Regimento de Tomé de Sousa, de 17 de dezembro de 1548, “constituiu o fundamento da administração civil do Brasil até 1677”10, ano em que foi substituído pelo Regimento de Roque da Costa Barreto11. Coube a Tomé de Sousa e a seus sucessores (Duarte da Costa e Mem de Sá) empreenderem um esforço de estruturação e centralização administrativa, iniciada com a fundação da primeira capital da colônia, a cidade de São Salvador, em 1549. Com Tomé de Sousa, vieram ao Brasil os primeiros jesuítas, capitaneados por Manuel da Nóbrega. Em 1552, seguindo as prescrições contidas no Regimento de Tomé de Sousa, a Companhia de Jesus iniciou o aldeamento das populações indígenas. A catequese indígena nas aldeias era um dos vetores centrais da colonização. A reunião dos índios em grandes aldeamentos - nos quais implementada uma rigorosa rotina de

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MENDES JÚNIOR, João. Os indigenas do Brazil, seus direitos individuaes e políticos. São Paulo, Typ. Hennies Irmãos, 1912, p. 26-27. 9

Consta que apenas as Capitanias de São Vicente, doada a Martim Afonso de Souza, e Pernambuco, doada a Duarte Coelho, prosperaram. As demais capitanias fracassaram, ora por falta de recursos, ora em razão de ataques indígenas ou, simplesmente, por desinteresse dos donatários. Cf. FAUSTO, p. 44-45. 10 11

KAYSER, 2010, p. 136.

Cf. LARA, Silvia Hunold. Legislação sobre escravos africanos na América portuguesa, 2000, p. 21. Disponível em < http://pt.scribd.com/doc/41888925/Legislacao-sobre-escravos-africanos-na-AmericaPortuguesa>. Acessado em 11 de novembro 2011.

trabalho e controle dos índios -, ao desestruturar as formas tradicionais de vida e organização social, serviu de instrumento para impor os valores da civilização cristã europeia, entre os quais se incluia o rigoroso respeito à autoridade real. A catequese serviu, ao mesmo tempo, como mecanismo de exploração ecônomica das populações indígenas; estratégia militar de proteção dos territórios portugueses12; e instrumento político de dominação, tendo em vista a confusão entre Igreja e Estado materializada, em Portugal, na Ordem de Cristo e no regime do Padroado13. Com a vinda dos primeiros jesuítas, iniciou-se também o conflito secular entre missionários e colonos, pelo controle da mão de obra indígena. Não obstante concebessem o mesmo destino à população autóctone - a servidão silenciosa ou o extermínio - jesuítas e colonos pelearam ao longo de quase todo o período colonial em torno da questão indígena, o que somente se resolveu, em favor dos colonos, em 1759, com a expulsão da Companhia de Jesus dos domínios portugueses. A atração de colonos à América, dando solução aos problemas demográficos14 crescentes da Europa, foi estimulada pela visão edênica do Novo Mundo, apresentado, nas descrições feitas por viajantes e cronistas, como uma terra de fertilidade, liberdade e riquezas. Raymundo Faoro acrescenta que “um apelo a mais, além das delícias edênicas prometidas por Caminha, se apresenta ao imigrante potencial: a libertação do trabalho. Libertação que completa todas as liberdades - ensejando vida aristocrática, de acordo com os suspirados modelos europeus”15. 12

Todas as invasões estrangeiras no Brasil decidiram-se com o apoio das populações autóctones, a exemplo do que ocorreu com a expulsão dos franceses do Rio de Janeiro, em 1565, ou a retirada dos holandeses de Pernambuco, em 1654. A continuidade ou descontinuidade de diversos núcleos de povoamento tambés dependeu de alianças militares indígenas, tal como ocorreu em São Paulo, que, em 12 de julho de 1562, quando atacada por diversos tribos indígenas, contou com o apoio do chefe indígena Tibiriça (MENDES JÚNIOR, 1912, p. 26-27). Em todos esses conflitos, as potências estrangeiras em conflito contaram, lado a lado, com o apoio de diferentes grupos étnicos. 13

“O padroado consistiu em uma ampla concessão da Igreja de Roma ao Estado português, em troca da garantia de que a Coroa promoveria e asseguraria os direitos e a organização da Igreja em todas as terras descobertas. O rei de Portugal ficava com o direito de recolher o tributo devido pelos súditos da Igreja conhecido como dízimo, correspondente a um décimo dos ganhos obtidos em qualquer atividade. Cabia também à Coroa criar dioceses e nomear os bispos. [...] Para supervisionar todas essas tarefas, o governo português criou uma espécie de departamento religioso do Estado: a Mesa da Consciência e Ordens” (FAUSTO, 1999, p. 60-61) 14

“Uma rápida expansão demográfica, iniciada nos meados do século XV, irrompe em todos os países, na França e na Espanha, na Itália e nos Balcãs. Entre 1500 e 1600 a população dobra de volume, com uma taxa provável de 7 por cento ao ano. A revolução biológica cria, de súbito, um problema social, que atordoa os reis, inquieta os proprietários rurais e ameaça os habitantes das cidades”. FAORO, 2001, p. 122. 15

Idem, p. 120.

Assim, ao atrativo da posse de abundantes terras no novo mundo, somavase a possibilidade de obtenção de vasta escravaria, libertando o colono dos trabalhos braçais. Vê-se que os desígnios dos colonos portugueses no Brasil atingiam duplamente os direitos indígenas, antevendo-se a expropriação do território e a escravidão como consequentes lógicos da empresa colonizadora. O embate em torno da escravidão indígena foi deflagrado já nos primórdios da colonização, enquanto a vastidão das terras interiores, livremente apropriadas pelos índios, empurrava para os séculos seguintes o enfrentamento definitivo pelo território. Faoro revela que “num quadro válido para o açúcar e o café, no curso de trezentos anos, a terra representaria o valor de um décimo do valor da escravaria”16. O elevado valor do escravo africano, cujo comércio era monopolizado por comerciantes portugueses, determinou a necessidade prática de exploração da mão-de-obra indígena. A admissão da hipótese escravista, todavia, contrariava a fórmula ideológica em que concebida a expansão marítima. A legitimação do empreendimento comercial e a distribuição de vastas terras no globo demandou o referendo papal, pelo qual a tarefa evangélica impôs-se como ônus acessório do empreendimento comercial e militar. Nesse sentido, não obstante prenhe de contradições, a presença religiosa no empreendimento marítimo levou para dentro das naus o humanismo da longa tradição filosófica ocidental, contribuindo para civilizar, até certo ponto, a ganância de monarcas, comerciantes, colonos e navegadores17. Definiu-se, portanto, uma fórmula anti-escravista para o trato com as populações autóctones, consubstanciada na Bula Sublimis Deus, editada em 1537, pelo papa Paulo III. Apesar disso, na prática colonial, a catequese tornou-se um instrumento de subordinação política e econômica dos índios aos interesses metropolitanos, razão pela qual o afastamento do escravismo não assegurou a integridade física e cultural das populações americanas. 16 17

Idem, p. 149.

Em certo sentido, causa estranhamento que a fórmula anti-escravista, definida em termos jurídicos e teológicos em favor dos índios, não tivesse aplicação em relação às nações africanas. Por certo, esta é uma das razões, ainda pouco explicadas, pelas quais é verdadeira a assertiva de Raymundo Faoro, segundo a qual “a descoberta do Brasil entrelaça-se na ultramarina expansão comercial portuguesa. Episódio, bem verdade, perturbador e original, incapaz de se articular totalmente nas navegações africanas e asiáticas. Diante do português emergiu não apenas um mundo novo, mas também um mundo diferente, que deveria, além da descoberta, suscitar a invenção de modelos de pensamento e de ação” (FAORO, 2001, p. 117)

Do ponto de vista legal, as disposições atinentes à questão indígena encontravam-se especialmente na legislação extravagante, conjunto de documentos legais que extravasavam o texto das Ordenações. A legislação extravagante forma um extenso e complexo corpo normativo, de variada designação, cujo acesso, conhecimento e interpretação constituía tarefa difícil18. Sobre as diversas modalidades de textos normativos, que compunham a legislação extravagante, ensina Siliva Hunold Lara que as leis expressavam ordens de caráter geral, válidas em todo o Reino e seus domínios com validade indeterminada, costumando trazer mencionadas a legislação por elas revogadas; os alvarás, por sua vez, referiam-se a modificações e declarações sobre assuntos já estabelecidos e normalmente deveriam conter disposições com até um ano de validade, sendo frequente que se perpetuassem indefinidamente através de uma cláusula expressa em contrário; já os regimentos eram diplomas que estabeleciam um conjunto de obrigações, normas e princípios que deveriam reger o funcionamento de um órgão, tribunal, magistrado ou cargo; as cartas régias, por sua vez, eram dirigidas a uma autoridade ou pessoa determinada e constituem também uma ordem real; por fim, as provisões e avisos eram determinações expressas em nome do rei, emanadas dos Conselhos e ministros reais, em seguimento a suas ordens ou no exercício de suas atribuições legais19. A primeira lei a tratar das liberdades aplicáveis aos “gentios das terras do Brasil, e mais Conquistas” foi editada em 20 de março de 1570, dispondo em que “casos se podem, ou não podem captivar: determinando que todos sejão tratados, e reputados por livres, sem se poderem por modo, ou maneira alguma captivar; salvo aquelles que forem tomados em guerra justa, que os Portugueses fizerem aos ditos Gentios com authoridade, e licença do Rei, ou do seu Governador nas ditas terras; ou aquelles, que

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Ao longo dos séculos, foram publicadas diversas compilações dos diplomas legais editados pela Coroa Portuguesa. Essas coleções, de grande valor histórico, estão disponíveis em . Para a presente obra, utilizamos especialmente a Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, para o período de 1750 a 1830, publicada em Lisboa no ano de 1830; a Collecção Chronologica da Legislação Portugueza Compilada e Annotada, de José Justino de Andrade e Silva, para o período de 1603 a 1700, publicada em Lisboa em 1854; a Synopsis Chronologica de subsidios ainda os mais raros para a historia e estudo critico da Legislação Portugueza, de Jozé Anastasio de Figueiredo, para o período de 1143 a 1603, publicada em Lisboa, em 1790; Indice Chronologico Remissivo da Legislação Portugueza Posterior à Publicação do Codigo Filippino, de João Pedro Ribeiro, para o período de 1604 a 1750, publicada em Lisboa, em 1805; e Codigo Philippino ou Ordenações e Leis do Reino de Portugal recopiladas por mandado d’El-Rey D. Philippe I, de Cândido Mendes de Almeida, publicada no Rio de Janeiro, no ano de 1870. 19

LARA, 2000, p. 25-26.

costumão faltear os Portugueses, e a outros Gentios para os comerem, assim como são os que chamão Aymores, e outros semelhantes”20. Em 22 de agosto de 1587, é assinada outra lei, confirmando-se a lei de 20 de março de 1570, acrescentando ainda “providencias a respeito dos que trabalham nas fazendas, para nunca poderem ser nellas retidos como escravos, mas só como inteiramente livres em quanto fosse sua vontade”21. Em seguida, por lei de 11 de Novembro de 1595, 25 anos depois do diploma legal que admitia a escravização indígena quando decorrente de guerra justa, a Coroa Portuguesa esclarece “as circunstancias, que devem concorrer para a guerra ser justa nos termos da Lei de 20 de Março de 1570”22. A brecha legal aberta pela hipótese da guerra justa justificava a escravização quase generalizada da população americana, especialmente nas regiões mais pobres, em que a carência de capitais financeiros obstava o acesso à mão-de-obra africana. Na capitania de São Vicente, a despeito dos protestos gerados entre os missionários jesuítas, organizaram-se grandes expedições, as bandeiras de apresamento, destinadas ao ataque e captura de índios já aldeados, na região dos Sete Povos das Missões, área sob domínio espanhol até meados do século XVIII. Os abusos dos colonos, levaram à Provisão, de 05 de junho de 1605, na qual foi estabelecido que “em nenhum caso se podessem captivar os gentios do Brazil; porque, com quanto houvesse algumas razões de direito para se poder em alguns casos introduzir o dito captiveiro, eram de tanto maior consideração as que haviam em contrario, especialmente pelo que toca á conversão dos gentios á nossa Santa Fé Catholica, os quaes se deviam antepôr a todas as mais”23.

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Lei de 20 de março de 1570, conforme Synopsis Chronologica de subsidios ainda os mais raros para a historia e estudo critico da Legislação Portugueza, de Jozé Anastasio de Figueiredo, publicada em Lisboa, em 1790. 21

Lei de 22 de Agosto de 1587, conforme Synopsis Chronologica de subsidios ainda os mais raros para a historia e estudo critico da Legislação Portugueza, de Jozé Anastasio de Figueiredo, publicada em Lisboa, em 1790. 22

Lei de 11 de Novembro de 1595, conforme Synopsis Chronologica de subsidios ainda os mais raros para a historia e estudo critico da Legislação Portugueza, de Jozé Anastasio de Figueiredo, publicada em Lisboa, em 1790. 23

Provisão de 05 de Junho de 1605, conforme Collecção Chronologica da Legislação Portugueza Compilada e Annotada, de José Justino de Andrade e Silva, publicada em Lisboa em 1854.

A vedação total para o apresamento de índios foi reiterada pela importante lei de 30 de julho de 1609, na qual o Rei Habsburgo Felipe III considerando que, “Para se atalharem os grandes excessos que poderá haver, se o dito captiveiro em algum caso se permitir, para de todo se cerrar a porta a isto, com o parecer dos do meu Conselho, mandei fazer esta Lei, pela qual declaro todos os gentios d’aquellas partes do Brazil por livres, conforme o Direito, e seu nascimento natural, assim os que já forem baptizados, e reduzidos á nossa Santa Fé Catholica, como os que ainda viverem como gentios, conforme a seus ritos, e cerimonias; os quaes todos serão tratados, e havidos por pessoas livres, como são; e não serão constrangidos a serviço, nem a cousa alguma, contra sua livre vontade; e as pessoas que delles se servirem nas suas fazendas, lhes pagarão seu trabalho, assim e da maneira, que são obrigados a pagar a todas as mais pessoas livres, de que se servem”24. O conhecimento dos cativeiros realizados em contrariedade às leis emanadas da Coroa, fez com que o Rei dispusesse, na mesma lei de julho de 1609 que, “porque sou informado, que em tempo de alguns Governadores passados se captivaram muitos gentios, contra a a fórma das Leis de El-Rei, [...] hei por bem, e mando, que todos sejam postos em liberdade; e que se tirem logo do poder de quasquer pessoas, em cujo poder estiverem, e os mandem para suas terras, sem embargo de os que delles estiverem de posse dizerem, que os compraram, e que por captivos lhes foram julgados por sentenças - as quaes, vendas e sentenças declaro por nullas, por serem contra o Direito, ficando resguardado aos compradores o que pertenderem, contra os que lh’es venderam. [...] e os que contra fórma desta Lei trouxerem gentios da serra, ou se servirem delles, como captivos, ou os venderem, incorrerão nas penas, que por Direito commum, e Ordenações, incorrem os que captivam e vendem pessoas livres”25. A mesma lei estabelece ainda disposições sobre o domínio das terras e dos bens possuídos pelas comunidades indígenas, determinando que “Hei por bem, que os ditos gentios sejam senhores das suas fazendas, nas povoações em que morarem, como o são na serra, sem lhes poderem ser tomadas, nem sobre ellas se lhes fazer molestia, nem injustiça alguma”. Sobre os índios descidos pelos jesuítas, o Rei estabelece que o 24

Lei de 30 de Julho de 1609, conforme Collecção Chronologica da Legislação Portugueza Compilada e Annotada, de José Justino de Andrade e Silva, publicada em Lisboa em 1854. 25

Idem.

“Governador, com o parecer dos ditos Religiosos, aos que vierem da serra, assignará logares, para nelles lavrarem, e cultivarem, não sendo já aproveitados pelos Capitães, dentro no tempo, como por suas doações são obrigados; e das Capitanias, e logares, que lhes forem ordenados, não poderão ser mudados para outros contra sua vontade (salvo quando elles livremente o quizerem fazer)”26. Não se trata da instituição de um direito novo, mas do reconhecimento e declaração de direitos pré-existentes, fundados na posse congênita e ancestral das comunidades autóctones. Referido reconhecimento, expresso na Lei de 30 julho de 1609, marcou o início da positivação do regime jurídico das terras indígenas. Por fim, a mesma lei dispõe ainda sobre o estabelecimento de uma jurisdição especial para os conflitos decorrentes das relações dos povos indígenas com a sociedade colonial. Assim, para os povos indígenas, “nas povoações, em que estiverem, aonde não houver Ouvidor dos Capitães, o Governador, lhes ordene um Juiz particular, que seja portuguez, chistão velho, de satisfação, o qual conhecerá das causas, que o gentio tiver com os mercadores, ou os mercadores com elle”27. Portanto, a lei de 30 de julho de 1609 abordou três questões da mais elevada importância para a garantia das liberdades indígenas: i. “declaro todos os gentios d’aquellas partes do Brazil por livres, conforme o Direito, e seu nascimento natural”; ii. “que os ditos gentios sejam senhores das suas fazendas, nas povoações em que morarem, como o são na serra, sem lhes poderem ser tomadas, nem sobre ellas se lhes fazer molestia”; iii. “lhes ordene um Juiz particular, [...], o qual conhecerá das causas, que o gentio tiver com os mercadores, ou os mercadores com elle”. Disposição semelhante às anteriores foi disposta na lei de 10 de setembro de 1611, pondo em liberdade todos os gentios que “até a a publicação desta Lei forem cativos”28, declarando nulas as vendas e sentenças das quais decorreram os cativeiros, resguardado o direito dos compradores de haverem seus prejuízos em face dos vendedores.

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Idem.

27

Idem.

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Lei de 10 de setembro de 1611, citada na Lei de 06 de junho de 1755, conforme Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830.

Sobre os índios sob administração de autoridades civis, dadas por repartição ou por administração para a realização de trabalhos diversos, em 10 de novembro de 1647, o Rei considerou que “tendo consideração ao grande prejuizo, que se segue ao serviço de Deos, e Meu, e ao augmento do Estado do Maranhão, de se darem por administração aos Gentios, e Indios daquele Estado, por quanto os Portuguezes a quem se dão estas administrações, usão tão mal dellas, que os Indios, que estão debaixo das mesmas administrações, em breves dias de serviço ou morrem á pura fome, e excessivo trabalho, ou fogem pela terra dentro, onde a poucas jornadas perecem, tendo por esta causa perecido, e acabado innumeravel gentio no Maranhão, Pará, e em outras partes do Estado do Brazil: Pelo que hei por bem mandar declarar por Lei (como por esta faço, e como o declararão já os Senhores Reis deste Reino, e os Summos Pontifices) que os Gentios são livres, e que não haja administradores, nem administração, havendo por nullas, e de nenhum effeito todas as que estiverem dadas, de modo que não haja memoria dellas; e que os Indios possão livremente servir, e trabalhar com quem bem lhes estiver, e melhor lhes pagar seu trabalho”29. Todavia, as contradições do sistema colonial voltam a se manifestar em 1655, quando nova lei restabelece a possibilidade da escravidão indígena, explicitando quatro casos em que o direito reconhece como justo e lícito o apresamento, “a saber quando fossem tomados em justa guerra, que os Portuguezes lhes movessem, intrevindo as circunstancias na dita Lei declaradas; ou quando impedissem a prégação Evangelica, ou quando estivessem prezos á corda para serem comidos; ou quando fossem rendidos por outros Indios, que os houvessem tomado em guerra justa, examinando-se a justiça della na fórma ordenada na dita Lei”30. A edição da lei expressa o recrudescimento do poder dos colonos, aos quais a lei novamente franqueava a mão-de-obra indígena como alternativa para o desenvolvimento da lavoura. Por ora, observamos que, afora a Lei datada de 20 de março de 1570, o início da positivação dos direitos indígenas no Brasil colonial deu-se durante a União

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Lei de 10 de novembro de 1647, citada na Lei de 06 de junho de 1755, conforme Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830. 30

Lei de 09 de abril de 1655, conforme Lei de 1º de abril de 1680, citada na Lei de 06 de junho de 1755. Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830.

Ibérica (1580-1640), período no qual a Coroa Portuguesa esteve em mãos dos reis espanhóis da dinastia Habsburgo, a começar por Felipe II. O primeiro influxo que se segue à Restauração portuguesa, em relação aos direitos indígenas, foi de retrocesso, por ocasião da edição da citada Lei de 09 de abril de 1655. Todavia, em 1680, em razão dos reiterados abusos cometidos pelos colonos, novamente a Coroa reafirma a proibição geral do cativeiro indígena: “[...] Ordeno, e Mando que da qui em diante se não possa cativar Indio algum do dito Estado em nenhum caso, nem ainda nos exceptuados nas ditas Leis, que Hei por derogadas, como se dellas, e das suas palavras fizera expressa, e declarada menção, ficando no mais em seu vigor: e succedendo que alguma pessoa, de qualquer condição, e qualidade que seja, cative, e mande cativar algum Indio pública ou secretamente, por qualquer titulo, ou pretexto que seja, o Ouvidor geral do dito Estado o prenda [...]31. Para as hipóteses de guerra justa, a Lei de 1º de abril de 1680 determina que se apliquem as mesmas regras do direito internacional, acrescentando: “E succedendo mover-se a guerra defensiva, ou ofensiva a alguma Nação dos Indios do dito Estado nos casos, e termos, em que por minhas Leis, e ordens he permitido; os Indios, que na tal guerra forem tomados, ficarão sómente prisioneiros como ficão as pessoas que se tomão nas guerras de Europa, e somente o Governador as repartirá como lhe parecer mais conveniente ao bem, segurança do Estado, pondo-os nas Aldêas dos Indios livres Catholicos, onde se possão reduzir á Fé, e servir o mesmo Estado, e conservarem-se na sua liberdade [...]”32. Referido tratamento - de aplicar-se aos povos indígenas regras atinentes às guerras entre nações europeias - reforça a autonomia indígena e a percepção de sua diferença. Reforça também a percepção de João Mendes Júnior sobre o tratamento dispensado pelos portugueses aos índios no início da colonização, quando “os indios tratavam com Martim Affonso em 1531 como de potencia a potencia”, celebrando o tratado, descumprido pelos colonos, de que os portugueses não subiriam a Serra do Mar, o que resultou no assalto da recém-fundada vila de São Paulo, em 10 de julho de 156233.

31

Lei de 1º de abril de 1680, citada na Lei de 06 de junho de 1755, conforme Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830. 32

Idem.

33

Ver nota 75.

No que se refere à questão fundiária, implantou-se, no Brasil, desde os primórdios da colonização, o sistema de sesmarias, de origem medieval, então em vigor no Livro Quarto, Título LXVII, das Ordenações Manuelinas, vigentes em Portugal de 1514 a 1603. Segundo as Ordenações, “sesmarias sam propriamente aquellas que se dam de terras, casas, ou pardieiros, que foram ou sam dalguns senhorios, e que já em outro tempo foram lavradas e aproveitadas, a agora o nom sam, as quaes terras, e os bens assi danificados e destroidos, podem e dever seer dados de sesmarias polos sesmeiros [...]”. Acrescenta ainda as Ordenações que “esto averá luguar assi nos bens de quesquer Grandes, e Fidalgos, como dos outros de qualquer condiçam que sejam”. As terras eram, pois, doadas, sob a condição de serem exploradas no prazo máximo de 05 anos. Os sesmeiros - que eram, segundo as ordenações, os funcionários encarregados de realizar a doação das terras - deverão ser avisados “que nam dem maiores terras a hua pessoa de Sesmaria, que aquellas que razoadamente parecer que no dito tempo poderam aproveitar”. O donatário, ao não aproveitar as terras concedidas em sesmaria, enseja que “façam loguo os Sesmeiros executar as penas que lhe forem postas, e dem as terras que aproveitadas nom esteverem a outros que as aproveitem, assinando-lhes sempre tempo e poendo-lhes a dita pena”. No Brasil, em face da grandeza do território e dos interesses mercantilistas que orientaram a colonização, o regime sesmarial permitiu-se corromper. Raymundo Faoro assinala que “a mudança de rumo, mudança que o contexto comercial da economia acelerou, refletiu sobre o sentido da propriedade territorial, que se afasta da concessão administrativa para ganhar conteúdo dominial. O pretendente à sesmaria deveria provar ser homem de posses, capaz de ajustar o destino da terra aos produtos exportáveis. [...] A terra, de base de sustento, expandiu-se para título de afidalgamento, com o latifúndio monocultor em plena articulação”34. As Ordenações, no Título referente às sesmarias, parágrafo 12, destacam que “se as terras onde estiverem forem isentas, se dem as sesmarias isentas; e se forem tributarias, com o tributo dellas as dem, e nom lhe ponham outro tributo por mais favor da lavoira, e pondo-lhe tributo ou forma algum, avemos a tal imposiçam de foro, ou tributo, por ninhuma e de ninhum viguor, e as Sesmarias ficaram em sua força sem a tal 34

FAORO, 2001, p.150.

obriguaçam do dito foro, ou tributo”. Tal imposição deixou de ser observada no Brasil a partir de Ordem Régia de 27 de dezembro de 1695, segundo Ruy Cirne Lima, na seminal obra Pequena história territorial do Brasil, que destaca que a “a imposição de foros, nas sesmarias do Brasil, equivalendo a uma apropriação legal do respectivo domínio direto, feria de frente esse preceito e inaugurava, entre nós, o regime dominialista da instituição das semarias, que perde, desde então, o seu caráter de restrição administrativa do domínio privado e dos das entidades públicas, para assumir definitivamente a feição de concessão, segundo os preceitos ordinários, de latifúndios, talhados no domínio régio”. A vastidão de terras fez que tampouco fossem observadas as restrições aos limites territoriais das áreas concedidas, havendo sesmarias amplíssimas. Faoro lembra que, “a sesmaria doada a Brás Cubas, lembra Eduardo Zenha, abrangia parte dos atuais municípios de Santos, Cubatão e São Bernardo do Campo, enquanto, no Nordeste, foram frequentes as concessões de terras, mais largas do que os Estados de nossos dias, como as da Casa da Torre, dos Guedes de Brito, de Certão, etc.”35. A mudança dava-se em prejuízo dos direitos congênitos dos índios às terras americanas, na medida em que consolidava a expansão do latifúndio como modelo de ocupação fundiária. A legislação extravagante previa regras específicas para as territórios indígenas. Além da já citada lei de 1º de abril de 1680, na mesma data, foi editado um Alvará, em cujo Parágrafo 40, estabeleceu-se que, nas aldeias em que se encontram, os índios são “senhores de suas fazendas, como o são no sertão, sem lhes poderem ser tomadas nem sobre ellas se lhes fazer molestia. E o Governador com parecer dos ditos Religiosos assignará aos que descerem do Sertão lugares convenientes para nelles lavrarem, e cultivarem e não poderão ser mudados dos ditos lugares contra sua vontade, nem serão obrigados a pagar foro, ou tributo algum das ditas terras”36. Neste ponto, a lei de 1680 reeditava os termos da Lei de 30 de julho de 1609. Os territórios indígenas eram, pois, considerados glebas reservadas, insuscetíveis de concessão na forma de sesmarias. Dispunha o Alvará de 1º de abril de 1680 que, na concessão das sesmarias, “se reserva sempre o prejuizo de terceiro, e

35 36

Idem, p. 148.

Alvará de 1º de abril de 1680, Parágrafo 40, citado na Lei de 06 de junho de 1755, conforme Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830.

muito mais se entende, e quero se entenda ser reservado o prejuizo, e direitos dos Indios, primarios, e naturaes senhores dellas”37. João Mendes Junior, conforme se verá a seguir, define no Alvará de 1680 a origem do sistema do indigenato, que estabelece a posição das terras indígenas no sistema jurídico brasileiro. O Regimento de 21 de dezembro de 1686, que estabelece regras para os aldeamentos indígenas no Estado do Maranhão, por sua vez, dispõe expressamente que “a justiça não permite que estes homens sejam obrigados a deixarem todo e por todo as terras que habitam, quando não repugnam a ser Christãos; e a conveniencia pede que as Aldêas se dilatem pelos Sertões, para que deste modo se possam penetrar mais facilmente, e se tire a utilidade que delles se promete”38. Kayser cita também a Carta Régia de 9 de março de 1718, na qual foi estabelecido que “os índios eram ‘livres’, ‘não se submetiam à jurisdição do rei português’, e ‘por isso não poderiam ser obrigados a abandonar suas terras’”39. Em 06 de junho de 1755, o rei Dom José editou extensa lei, revigorando a validade de todos os diplomas pretéritos que dispunham sobre as liberdades indígenas. Considera o monarca português que “[...] havendo descido muitos milhões de Indios, se forão sempre extinguindo de modo, que he muito pequeno o número das povoações, e dos moradores dellas; vivendo ainda esses poucos em tão grande miseria, que em vez de convidarem e animarem os outros Indios barbaros a que os imitem, lhes servem de escandalo para se internarem nas suas habitações silvestres com lamentavel prejuizo da salvação das suas Almas, e grave damno do mesmo Estado. [...] Foi assentado por todos os votos, que a causa, que tem produzido tão preniciosos effeitos, consitio, e consiste ainda em se não haverem sustentado efficazmente os ditos Indios na liberdade, que a seu favor foi declarada pelos Summos Pontifices, e pelos Senhores Reis meus

37

Idem.

38

Regimento de 21 de dezembro de 1686, citado em Collecção Chronologica da Legislação Portugueza Compilada e Annotada, de José Justino de Andrade e Silva, publicada em Lisboa em 1854 39

KAYSER, 2010, p. 143. A Carta Régia de 9 de março de 1718 não foi localizada nas coleções constantes de . Há menção à referida Carta Régia, sem transcrição de seu conteúdo, no Indice Chronologico Remissivo da Legislação Portugueza Posterior à Publicação do Codigo Filippino, de João Pedro Ribeiro, publicada em Lisboa, em 1805.

predecessores, observando-se no seu genuino sentido as Leis por elles promulgadas sobre esta materia [...]”40. A partir dessa inicial constatação fática, o rei entendeu por “derogar, e annullar; como por esta derogo, e annullo todas as Leis, Regimentos, Resoluções, e ordens que desde o descobrimento das sobreditas Capitanías do Grão Pará, e Maranhão até ao presente dia permittirão, ainda em certos casos particulares, a escravidão dos referidos Indios [...]”. Assim, os índios foram declarados “livres, e izentos de toda a escravidão, podem dispor das suas pessoas, e bens como melhor lhes parecer, sem outra sujeição temporal, que não seja a que devem ter ás Minhas Leis, para á sombra dellas viverem na paz, e união Christã, e na sociedade Civil, em que, mediante a Divina graça, procuro manter os Povos, que Deos me confiou, nos quaes ficarão incorporados os referidos Indios sem distinção, ou excepção alguma, para gozarem de todas as honras, privilegios, e liberdades, de que os Meus Vassallos gozão actualmente conforme suas respectivas graduações, e cabedaes”41. Sobre as terras e bens das comunidades indígenas, a Lei considera que “não bastaria para restabelecer, e adiantar o referido Estado, que os Indios fossem restituidos á liberdade das suas pessoas na sobredita forma, se com ellas se lhes não restituisse também o livre uso dos seus bens, que até agora se lhes impedio com manifesta violencia”42. A este respeito, manda o Rei que se execute o disposto no Alvará de 1º de abril de 1680, que declara o senhorio dos índios sobre suas fazendas e a invalidade das sesmarias concedidas em prejuízo dos direitos primários e naturais das comunidades indígenas.

40

Lei de 06 de junho de 1755, conforme Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830. 41

Acrescenta a Lei de 06 de junho de 1755: “Desta geral disposição exceptuo sómente os oriundos de pretas escravas, os quaes serão conservados no dominio dos seus actuaes senhores, enquanto Eu não der outra providencia sobre esta materia. Porém para que com o pretexto dos sobreditos descendentes de pretas escravas, se não retenhão ainda no cativeiro os Indios que são livres: estabeleço que o beneficio dos Editaes assima ordenados se extenda a todos os que se acharem reputados por Indios, ou que taes perecerem, para que todos estes sejão havidos por livres sem a dependencia de mais prova, do que a plenissima que a seu favor resulta da presunção de Direito Divino, Natural, e Positivo, que está pela liberdade [...]”. Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830. 42

Idem.

Já o Diretório dos índios do Pará e Maranhão, de 03 de maio de 1757, estabelece que se “os Indios não possuem terras sufficientes para a plantação dos precisos fructos, que produz este fertilissimo Paiz; ou porque na distribuição dellas se não observarão as Leis da equidade, e da justiça; ou porque as terras adjacentes ás suas Povoações forão dadas em sesmarias ás outras Pessoas particulares; serão obrigados os Directores a remetter logo ao Governador do Estado huma lista de todas as terras situadas no continente das mesmas Povoações, declarando os Indios, que se achão prejudicados na distribuição, para se mandarem logo repartir na fórma que Sua Magestade manda”43. De todo o até aqui exposto, observa-se que, situada a meio caminho dos vários setores envolvidos na colonização do Brasil, a Coroa Portuguesa manteve posições dúplices e ambivalentes sobre a questão indígena. Não havia equívoco da Coroa ao referendar ora as pretensões da Companhia de Jesus (aldeamento indígena e adestramento da mão-de-obra através da catequese), ora os desejos do número crescente de colonos recém imigrados, franqueando as possibilidades jurídicas para a escravidão indígena ou omitindo-se na fiscalização e punição dos agentes responsáveis por ela. Segundo Raymundo Faoro, “absurda a admissão da preia ao índio, contrariando a poderosa Companhia de Jesus, sem o afago, a tolerância e o velado estímulo dos agentes reais na colônia”44. Quanto à legislação portuguesa, o mesmo autor atesta que “varrida de interesses contraditórios, tergiversou entre um pólo e outro, ao sabor das influências, ora poderosas dos jesuítas, ora incontrastáveis dos colonos”45. Em comum, colonos e jesuítas operavam na América o plano colonizador português, pelo mesmo caminho da opressão e apagamento das populações autóctones. Quando o preço elevado dos escravos de origem africana inviabilizavam a sua aplicação no empreendimento colonial, jesuítas e colonos lançavam mão da escravidão indígena sem peias e amarras. O empreendimento jesuíta, não obstante a sinceridade missionária de seus principais expoentes, não esteve isento de interesses econômicos, destinados, em última instância, à sobrevivência institucional, à contínua expansão e crescente

43

Parágrafo 19, do Diretório dos índios do Pará e Maranhão, de 03 de maio de 1757, conforme Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830. 44

FAORO, 2001, p. 184.

45

Idem, p. 233.

fortalecimento da Companhia de Jesus. O rompimento definitivo com a Companhia ocorre em 1759, com a vitória do anticlericalismo do Marquês de Pombal, primeiro ministro do rei Dom José I, interessado nas vultosas rendas da Companhia para restaurar Lisboa, arrasada pelo terremoto de 1755. Em 1759 os jesuítas foram expulsos de Portugal e os bens da Companhia foram incorporados ao patrimônio da Coroa. Em 1808, soma-se à complexa rede de interesses que permeiam a questão indígena a transferência da Corte Portuguesa para o Brasil. A chegada de mais de 10 mil nobres ao Rio de Janeiro aumentou a pressão por terras, ensejando a publicação do Decreto de 25 de novembro de 1808, pelo qual Dom João, então Príncipe Regente, dispôs que “sendo conveniente ao meu Real serviço, e ao bem publico augmentar a Lavoura, e população, que se acha muito diminuta neste Estado; e por outros motivos, que me forão presentes: Hei por bem, que aos estrangeiros residentes no Brazil, se possão conceder datas de terras por Sesmarias, pela mesma forma com que segundo as minhas Reaes ordens se concedem aos meus Vassallos, sem embargo de quaesquer leis ou disposições em contrario”46. Para assegurar as terras a serem doadas aos nobres portugueses e aos estrangeiros recém-emigrados da Europa fugindo das guerras napoleônicas, foi editada ainda a Carta Régia de 2 de dezembro de 1808 na qual ficou estabelecido “que seriam consideradas sem dono as terras dos índios aos quais tivesse sido declarada a guerra e que tivessem sido nela vencidos”47. Anteriormente, em 2 e 5 de novembro de 1808, duas Cartas Régias declaravam guerra aos índios nas províncias de Minas Gerais e São Paulo, determinando, em São Paulo, “que os prisioneiros fossem obrigados a servir por 15 annos aos milicianos ou moradores, que os apprehendessem”48. Contrariando a vasta legislação anterior, o chamado Período Joanino (1808-1821) foi pródigo na expropriação de terras indígenas. O fim do período colonial, acompanhando os novos ventos que sopravam na Europa, viu nascer no Brasil o projeto civilizatório pautado no progresso técnico-científico,

46

Decreto de 25 de novembro de 1808, conforme Codigo Philippino ou Ordenações e Leis do Reino de Portugal recopiladas por mandado d’El-Rey D. Philippe I, de Cândido Mendes de Almeida, publicada no Rio de Janeiro, no ano de 1870. 47

KAYSER, 2010, p. 143.

48

As Cartas Régias de 1808 foram citadas nos artigo 1º e 2º, da Lei de 27 de outubro de 1831.

que substituirá a catequese como ferramenta ideológica da dominação sobre o índio. Os movimentos emancipacionistas de fins do século XVIII, no Brasil, não articularam a questão indígena em sua formulação e prática, de modo que o índio permaneceu estranho à sociedade colonial, bem como à sociedade nacional em formação, reflexo da negação do direito a uma identidade cultural distinta daquela proposta pela dominação europeia. O Diretório dos índios do Pará e Maranhão, de 03 de maio de 1757, deixa claro o desprezo da sociedade colonial pela cultura indígena, ressaltando a imposição da cultura europeia, especialmente da língua portuguesa, como instrumento para infundir o “affecto, a veneração, e a obediencia”49 ao soberano. O Diretório determinava: Sempre foi maxima inalteravelmente praticada em todas as Nações, que conquistarão novos Dominios, introduzir logo nos Póvos conquistados o seu proprio idioma, por ser indisputavel, que este he hum dos meios mais efficazes para desterrar dos Póvos rusticos a barbaridade dos seus antigos costumes; e ter mostrado a experiencia, que ao mesmo passo, que se introduz nelles o uso da Lingua do Principe, que os conquistou, se lhes radica tambem o affecto, a veneração, e a obediencia ao mesmo Principe. Observando pois todas as Nações polidas este prudente, e sólido systema, nesta Conquista se praticou tanto pelo contrario, que só cuidarão os primeiros Conquistadores estabelecer nella o uso da Lingua, que chamarão geral; invenção verdadeiramente abominavel, e diabolica, para que privados os Indios de todos aquelles meios, que os podião civilizar, permanecessem na rustica, e barbara sujeição, em que até agora se conservarão. Para desterrar este perniciosissimo abuso, será hum dos principaes cuidados dos Directores, estabelecer nas suas respectivas Povoaçõs o uso da Lingua Portugueza, não consentindo por modo algum, que os Meninos, e Meninas, que pertencerem ás Escolas, e todos aquelles Indios, que forem capazes de instrucção nesta materia, usem da Lingua propria das suas Nações, ou da chamada geral; mas unicamente da Portugueza, na fórma, que sua Magestade tem recomendado em repetidas Ordens, que até agora se não abservarão com total ruina Espiritual, e Temporal do Estado.

A independência do Brasil em 1822 não alterou as relações de força no interior do novo estado americano, tampouco a percepção central sobre o elemento indígena. Na tentativa de fundar uma identidade nacional, o romantismo literário lançou as bases do indigenismo brasileiro, exaltando as virtudes da população autóctone e a maldade intrínseca do dominador português. Houve um resgate das visões edênicas da América, num esforço de justificar a nova soberania, fundada a partir do “grito do Ipiranga”. Analisando as tratativas diplomáticas que se seguiram à proclamação da Independência, João Mendes Júnior destaca que “o tratado de 29 de Agosto de 1825, 49

Parágrafo 6, do Diretório dos índios do Pará e Maranhão, de 03 de maio de 1757, conforme Collecção da Legislação Portugueza desde a ultima compilação das Ordenações, de Antonio Delgado da Silva, publicada em Lisboa no ano de 1830

pelo qual Portugal reconheceu a nossa independência, não alterou, em ponto algum, as antigas relações dos indios; assim como os reis de Portugal não se julgavam com ampla jurisdicção sobre os índios, também não se podia, desde logo, julgar com essa jurisdicção o novo governo do Brasil”50. Em 27 de outubro de 1831, contudo, uma lei do Império declarava, em seu artigo 4º, que os índios “serão considerados como orphams, e entregues aos respectivos Juízes, para lhes applicarem as providencas da Ordenação Livro primeiro Titulo oitenta e oito”. O artigo 6º, por sua vez, determinava que “os Juizes de Paz nos seus districtos vigiarão, e ocorrerão aos abusos contra a liberdade dos Indios”. Concluia-se, pois, a transformação das populações indígenas: de potentados livres, capazes para negociar em igualdade com a soberania portuguesa, a incapazes. A situação perduraria no Brasil até a edição da Constituição republicana de 1988. O regime das terras, por sua vez, foi profundamente alterado com a edição da Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850, conhecida como Lei de Terras. O governo imperial editou o diploma com o fim de extremar os domínios públicos e particulares sobre as terras brasileiras, definindo a forma e prazos dentro dos quais deveriam ser medidas e demarcadas as terras adquiridas por posses ou por sesmarias. O artigo 3º da Lei de Terras definia como terras devolutas as que não se achassem aplicadas a algum uso publico nacional, provincial, ou municipal; as que não se achassem no domínio particular por qualquer título legitimo, nem fossem havidas por sesmarias e outras concessões; e as que não se achassem ocupadas por posses, que, apesar de não fundadas em titulo legal, fossem legitimadas pela Lei de Terras. O artigo 14, por sua vez, autorizava o Governo a vender as terras devolutas em hasta publica, ou fora dela, como e quando julgasse mais conveniente, fazendo previamente medir, dividir, demarcar e descrever a porção das terras que houvesse de ser exposta à venda. Doravante, a partir de 1850, a compra e a herança passaram a ser a única forma de aquisição de terras nos Brasil. O artigo 4º, por sua vez, revalidava as sesmarias concedidas sobre o regime anterior, que vigorou até o ano de 1822, desde que se encontrassem cultivadas, ou com princípios de cultura e morada habitual do respectivo sesmeiro. Com o fim de estimular a agricultura e regularizar as ocupações até então

50

MENDES JÚNIOR, 1912, p. 43.

realizadas51, a lei previa ainda, no artigo 5º, a legitimação das posses mansas e pacificas, adquiridas por ocupação primaria, ou havidas do primeiro ocupante, que se achassem cultivadas, ou com principio de cultura e morada habitual do respectivo posseiro. Pelo artigo 15, os posseiros ficavam obrigados a tirar os títulos dos terrenos que lhes ficassem pertencendo por efeito da lei. Na forma do artigo 12, o Governo reservava para si as terras devolutas que julgasse necessárias para a colonização dos indígenas; para a fundação de povoações, abertura de estradas e assento de estabelecimentos públicos; bem como para a construção naval. Citando Stanley J. Stein, Raymundo Faoro sustenta que “em que pese as boas intenções, essa legislação veio tarde demais. Não obstante a resistência encarniçada e, às vezes, altiva dos pequenos posseiros, estes não podiam sustentar por muito tempo a luta com podererosos adversários possuindo relações no Rio de Janeiro, recursos abundantes para pagar advogados [...].”52 Destaca Faoro que, em 1822, já não havia mais terras a distribuir, tamanha a largueza e prodigalidade do regime anterior, que chegou a conceder sesmarias de até cem léguas de testada a um só beneficiário53. Portanto, desde os estertores do sistema colonial, a concessão e ocupação de terras no Brasil dava-se necessariamente em conflito com os direitos e interesses dos povos indígenas às terras que ancestralmente possuíam. Nesse contexto é que João Mendes Junior publicou a obra intitulada Os Indígenas do Brazil, seus Direitos Individuaes e Políticos. Publicada em 1912, já no contexto republicano, a obra foi a primeira a definir “o lugar dos direitos indígenas à terra dentro da lógica do sistema jurídico ocidental implantado no Brasil. Assim é que, a partir de seu trabalho, se tem falado no instituto do indigenato, definidor da especificidade dos direitos territoriais indígenas no Brasil”54.

51

Vale notar que o regime das sesmarias deixou de ser aplicado no Brasil em 1822. Entre este ano e a edição da Lei de Terras, em 1850, havia um verdadeiro vazio jurídico em matéria fundiária, período no qual grassaram as ocupações como única forma de apossamento da terra. 52

FAORO, 2001, p. 467.

53

Cf. idem, p. 466.

54

BARBOSA, Marco Antônio. Direito Antropológico e Terras Indígenas no Brasil. São Paulo: Plêiade, 2001, p. 55.

Sobre a situação das terras indígenas no sistema inaugurado pela Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850, Mendes Júnior destacava que “nas demandas entre posseiros e indígenas aldeados, se tem pretendido exigir que estes exhibam os registros de suas posses. Parece-nos, entretanto, que outra é a solução jurídica: - Desde que os indios já estavam aldeados com cultura e morada habitual, essas terras por elles ocupadas, si já não fossem delles, tambem não poderiam ser de posteriores posseiros, visto que estariam devolutas; em qualquer hyphotese, suas terras lhes pertenciam em virtude do direito á reserva, fundado no Alvará de 1º de Abril de 1680, que não foi revogado, direito que jamais poderá ser confundido com uma posse sujeita á legitimação”55. A original tese do autor consiste na afirmação de que as terras em posse das comunidades indígenas não se submetiamm ao sistema criado pela Lei de Terras de 1850. Às terras indígenas, por sua especificidade, aplica-se diretamente o disposto no Alvará de 1º de abril de 1680, confirmado pela Lei de 6 de junho de 1755, que seriam normas especiais em relação ao regime geral das terras. Ao tratarem especialmente do título pelo qual os índios possuem seus territórios, referidos diplomas não foram regogados pelas leis fundiárias de caráter geral que as sucederam. Assim, no tocante ao regime inaugurado pela Lei de Terras de 1850, temos que: i. as terras indígenas não são alcançadas por seu artigo 3º, que dispõe sobre as terras devolutas que poderiam ser alienadas pelo Estado na forma do artigo 14; ii. também não se refere às terras indígenas o artigo 5º, relativo às terras possuídas sujeitas a legitimação, titulação (prevista no artigo 11) e medição (sem a qual há pena de comisso, prevista no artigo 8º); iii. tampouco refere-se às terras indígenas o artigo 12, que trata das terras devolutas reservadas ao Governo para a colonização dos indígenas. Analisemos detalhadamente cada hipótese, segundo a argumentação construída por João Mendes Junior. Sobre a primeira situação, Mendes Junior expõe que, as terras indígenas não são terras devolutas, “uma vez que essas terras são tão particulares como as possuidas por occupaçõa legitivamel, isto é, são originariamente reservadas da

55

MENDES JUNIOR, 1912, p. 57.

devolução, nos expressos termos do Alvará de 1º de Abril de 1680, que as reserva até na concessão de sesmarias”56. A situação da terras indígenas não se transforma com o advento da federação, instaurada em 1889 com a proclamação da Republica57, momento no qual as terras devolutas, por força do artigo 64 da Constituição de 1891, passaram ao domínio dos estados58. No novo quadro histórico-político, “aos estados ficaram reservadas as terras devolutas; ora, as terras do indigenato, sendo terras congenitamente possuídas, não são devolutas, isto é, são originariamente reservadas, na fórma do Alvará de 1º de Abril de 1680 e por deducção da propria Lei de 1850 e do art. 24 par. 1º do Decr. de 1854”59. Em relação à segunda hipótese - terras possuídas sujeitas a legitimação, titulação e medição -, Mendes Junior sustenta que “já os philosophos gregos affirmavam que o indigenato é um titulo congenito, ao passo que a occupação é um título adquirido. Comquanto o indigenato não seja a unica verdadeira fonte juridica da posse territorial, todos reconhecem que é, na phrase do Alv. de 1º de Abril de 1680, ‘a primaria, naturalmente e virtualmente reservada’, ou, na phrase de Aristóteles (Polit. I, n. 8), - ‘um estado em que se acha cada ser a partir do momento do seu nascimento’. Por conseguinte, o indigenato não é um facto dependentes de legitimação, ao passo que a occupação, como facto posterior, depende de requisitos que a legitimem”60. A originalidade da construção de João Mendes Junior, na parte em que diferencia os direitos indígenas dos direitos decorrentes das posses legitimadas pela Lei de Terras de 1850 obriga-nos a transcrever a íntegra de seu raciocínio:

56

Idem, p. 60.

57

“Quer em relação a direitos individuaes e politicos, quer mesmo nas relações estrictamente administrativas, os indios na Republica, não passaram alteração alguma”. Idem, p. 67. 58

Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Art. 64. Pertencem aos Estados as minas e terras devolutas situadas nos seus respectivos territórios, cabendo à União somente a porção do território que for indispensável para a defesa das fronteiras, fortificações, construções militares e estradas de ferro federais 59

Idem, p. 62.

60

Idem, p. 58.

O indigena, primariamente estabelecido, tem a sedum positio, que constitue o fundamento da posse, segundo o conhecido texto do jurisconsulto Paulo (Dig. titul. de acq. ve. amitt. possess. L. 1), a que se referem Savigny, Molitor, Mainz e outros romanistas; mas o indigena, além desse jus possessionis, tem o jus possidendi, que já lhe é reconhecido e preliminarmente legitimado, desde o Alvará de 1º de Abril de 1680, como direito congenito. Ao indigenato, é que melhor se applica o texto do jurisconsulto Paulo: - quia naturaliter tenetur ab eo qui insistit. Só estão sujeitas á legitimação as posses que se acham em poder de occupante (art. 3º da Lei de 18 de setembro de 1850), ora, a occupação como título de acquisição, só póde ter por objecto as cousas que nunca tiveram dono, ou que foram abandonadas por seu antigo dono. A occupação é uma apprehensio rei nullis ou rei derelictae [...]; ora, as terras de indios, congenitamente apropriadas, não podem ser consideradas nem como res nullius, nem como res derelictae; por outra, não se concebe que os indios tivessem adquirido, por simples occupação, aquillo que lhes é congenito e primario, de sorte que, relativamente aos indios estabelecidos não ha uma simples posse, ha um titulo immediato de dominio; não ha, portanto, posse a legitimar, ha dominio a reconhecer e direito originario e preliminarmente reservado. O art. 24 do Decr. n. 1318 de 30 de Janeiro de 1854, explicando o pensamento da Lei, claramente define, no Par. 1º, que, em relação ‘ás posses que se acharem em poder de primeiro occupante’, estão sujeitas á legitimação aquellas ‘que não tem outro titulo senão a sua occupação’. Esse Par. 1º do art. 24 do cit. Decr. de 1854 reconhece, portanto, a existencia de primeiro occupante que tem titulo distinto de sua occupação. E qual póde ser esse primeiro occupante, com titulo distincto da sua occupação, senão o indigena, aquelle que tem por titulo o indigenato, isto é, a posse aborígene? O Decr. de 1854 repetiu desse modo o pensamento do Alv. de 1º de Abril de 1680: ‘quero se entanda ser reservado o prejuizo e direito dos Indios, primarios e naturaes senhores das terras’”61.

Por fim - tratando da terceira hipótese alcançada na Lei de Terras de 1850 -, João Mendes Junior entende que não se pode tratar as terras indígenas como terras reservadas para fins de colonização, porque “dos indios aborígenes, organisados em hordas, póde-se formar um aldeamento mas não uma colonia; os indios só podem ser constituidos em colonia, quando não são aborígenes do lugar, isto é, quando são emigrados de uma zona para serem immigrados em outra”62. Reforçando esse raciocínio, o autor acrescenta que “A colonisação de indigenas, como já ficou explicado, suppõe, como qualquer outra colonisação, uma emigração para immigração.” Arremata o autor, “seja, porém, como fôr, não podem ser applicadas ás terras de posse indigenata as

61

Idem, p. 58-60.

62

Idem, p. 58. Noutro ponto, o autor acrescenta Idem, p. 60.

mesmas regras applicaveis ás terras reservadas para colonisação: aquellas não estão sujeitas senão ás cautelas da Ord. L. I tit. 88 Par. 26; estas, na forma do art. 72 do Regul. de 1854, têm um encargo analogo ao usofructo e não podem ser alienadas emquanto o Governo, por acto especial, não conceder aos indios o pleno gozo dellas”63. Portanto, por não apreender as especificidades do regime jurídico das terras indígenas instaurado sob a legislação colonial, a Lei de Terras de 1850 não revoga o direito positivo anterior pelo qual se reconhecem e declaram os índios “primarios, e naturaes senhores” das terras que ocupam. A única ressalva que faríamos à construção teórica de João Mendes Junior é que o reconhecimento do indigenato deu-se desde a Lei de 30 de julho de 1609, e não pelo Alvará de 1º de Abril de 1680. Ora, a Lei de 1609 já declarava que os “ditos gentios sejam senhores das suas fazendas, nas povoações em que morarem, como o são na serra, sem lhes poderem ser tomadas, nem sobre ellas se lhes fazer molestia, nem injustiça alguma”. A mesma lei reforçou a disposição, ao esclarecer que as comunidades não poderiam ser mudadas para outros lugares contra sua vontade. O alvará de 1680, por sua vez, a par de repetir a disposição da lei anterior, apenas explicitava a necessidade de observância dos direitos indígenas nas doação de sesmarias, conclusão lógica que já poderia, de toda forma, ser extraída da Lei de 30 de julho de 1609. Na doação de sesmarias, reza o Alvará de 1680, “se reserva sempre o prejuizo de terceiro, e muito mais se entende, e quero se entenda ser reservado o prejuizo, e direitos dos Indios, primarios, e naturaes senhores dellas”. A redação do Alvará comprova que a disposição, no tocante à sua aplicação às doações de sesmarias, é meramente explicitatória. Concluindo, consideramos que a positivação do indigenato ocorre na Lei de 30 de julho de 1609, sendo confirmada pelo Alvará de 1º de abril de 1680 e pela Lei de 06 de junho de 1755. A legislação posterior, especialmente a Lei de Terras de 1850, ao não tratar especificamente do regime jurídico das terras indígenas, mantém intacta a legislação editada no período colonial. O indigenato viria a ser expressamente acolhido 63

Idem, p. 60-61. Em seguida, acrescenta o autor: “Esta distincção, que parece subtil, não o é; - tem consequencias praticas, que os norte-americanos resolveram por tratados entre o governo e as tribus, pagando-lhes as terras a preço debatido; e as difficuldades nascidas desta distinção só desappareceram depois que foi applicada aos indios a lei de homestead. A jurisprudencia americana, como explica Carlier, sempre apprehendeu esta distincção, a ponto de sustentar como legitimas as vendas particulares feitas pelos indios do Indian country, desde que nellas não interviesse dólo ou frande, e sempre applicando ás terras do Indian reservation, regras distintas.” Idem, p. 61.

em todas as Constituições republicanas posteriormente editadas no Brasil, ou seja, em 193464, 193765, 194666, 1967/6967 e 198868.

64

Constituição dos Estados Unidos do Brasil (1934). Art. 129. Será respeitada a posse de terras de silvícolas que nelas se achem. permanentemente localizados, sendo-lhes, no entanto, vedado aliená-las 65

Constituição dos Estados Unidos do Brasil (1937). Art. 154. Será respeitada aos silvícolas a posse das terras em que se achem localizados em caráter permanente, sendo-lhes, porém, vedada a alienação das mesmas. 66

Constituição dos Estados Unidos do Brasil (1946). Art. 216. Será respeitada aos silvícolas a posse das terras onde se achem permanentemente localizados, com a condição de não a transferirem 67

Constituição da República Federativa do Brasil (1967). Art. 186. É assegurada aos silvícolas a posse permanente das terras que habitam e reconhecido o seu direito ao usufruto exclusivo dos recursos naturais e de todas as utilidades nelas existentes. 68

Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

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