O julgamento de Sócrates: uma discussão historiográfica

June 6, 2017 | Autor: Barbara Celi | Categoria: Socrates, Democracia Ateniense
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O julgamento de Sócrates: uma discussão historiográfica Introdução O presente artigo tem como objetivo discutir as visões acerca do julgamento de Sócrates, tendo como base as interpretações de diferentes autores. Para tanto, dialogaremos com Finley (1988), Goldhill (2007), Grimal (1990), Mossé (1990) e Stone (2005) a fim de buscar os pontos de contato e discordâncias sobre o Sócrates histórico para, enfim, compreendermos o que cada autor defende em relação ao seu julgamento e condenação. Moses Finley foi um historiador norte americano que se dedicou, especialmente, ao estudo da economia no mundo greco-romano. Um dos aspectos mais relevantes na sua formação foi o contato com os intelectuais exilados da Alemanha nazista que se transferiram para os Estados Unidos na década de 1930, ocasião em que o Instituto para Pesquisa Social, que trabalhava na perspectiva do marxismo cultural, mudou-se de Frankfurt para Nova York. Finley se envolveu em várias atividades no Instituto e partilhou de sua preocupação em revisar os princípios do marxismo, muitas vezes à luz dos escritos de Weber. Mas em 1954 Finley teve que deixar os Estados Unidos devido à perseguição do Macartismo. Instalou-se, então, em Cambridge, onde ocupou a cadeira de História Antiga entre 1970 e 1979 (JOLY, 2006:34) O livro cujos capítulos utilizamos como base para este trabalho, Democracia Antiga e Moderna, foi publicado pela primeira vez em 1973, justamente no período em que Finley estava na Inglaterra. Desta forma, a despeito dele ter desenvolvido sua carreira especialmente trabalhando questões econômicas, este livro aborda problemas políticos – mais especificamente a questão da democracia –, o que é muito pertinente se levarmos em consideração a situação em que ele se encontrava naquele momento: exilado na Inglaterra devido à perseguição política do Macartismo. Simon Goldhill, conhecido por seu trabalho voltado para a tragédia grega, é professor de literatura e cultura grega e diretor de Estudos Clássicos do Kings College, em Cambridge. Além disso, é também diretor do CRASSH (Centro de Investigação em Artes, Ciências Sociais e Humanidades da Universidade de Cambridge). No livro que aqui nos baseamos, Amor, sexo & tragédia: como os gregos e romanos influenciam nossas vidas até hoje, Goldhill se volta para um passado longínquo com o intuito de entender a influência daqueles homens e mulheres na atualidade.

Pierre Grimal foi um historiador francês que dedicou sua carreira ao estudo da civilização romana na antiguidade, trabalhando a questão da mitologia, tradução de clássicos como Cícero e Sêneca, além de biografias, como a de Agripina. Foi membro da Sociedade Francesa de Arqueologia Clássica e da Sociedade Francesa de Egiptologia, além de ter sido professor por cerca de trinta anos na Universidade de Sorbonne. No livro que aqui utilizaremos, Os erros da liberdade, Grimal trata sobre a ideia de liberdade no mundo grecoromano e como este conceito se transformou através do tempo. Claude Mossé, que faz parte de uma escola francesa que tem como base os modelos teóricos usados por Polanyi, Max Weber e M. I. Finley, é professora da Universidade de Paris VIII e atualmente uma das mais importantes historiadoras de história da Antiguidade grega. No livro O processo de Sócrates, Mossé busca compreender o contexto no qual Sócrates foi julgado e condenado, assim como o entendimento da figura histórica do filósofo. I. F. Stone foi um jornalista norte americano com posicionamento político radical de esquerda. Profundamente interessado por questões ligadas à liberdade de pensamento e de expressão, aproveitou sua aposentadoria para se dedicar à este assunto. Um estudo iniciado com as revoluções inglesas do século XVII conduziu-o até Sócrates, na Grécia antiga. Tal caminho o levou ao desenvolvimento da obra que aqui usamos como base, O julgamento de Sócrates. Apesar de possuírem perspectivas diferentes, chegando a conclusões distintas, tais autores tem uma característica em comum: todos, de forma mais ou menos profunda, querem compreender o processo e a morte de Sócrates. Mas para analisar Sócrates é preciso ter como horizonte a questão socrática, ou seja, é preciso buscar apreender o que é de Sócrates e o que é dos autores que escreveram sobre ele. Tal tarefa não é fácil, tendo como agravante o fato de que o filósofo nada deixou por escrito. Para buscar este entendimento é necessário um diálogo com as fontes. Desta forma, além dos autores que apresentamos brevemente, procuraremos também dialogar com as fontes, especialmente as de autoria de Xenofonte e Platão, cujas obras podem ser identificadas como pertencentes a um gênero literário que podemos chamar de “Apologia de Sócrates” ou “Diálogos Socráticos”. A principal característica deste gênero é a preocupação em apresentar uma defesa do filósofo devido à pequenos ataques que foram movidos contra ele. É preciso atentar que neste gênero literário os autores atuam como uma espécie de advogados de Sócrates e, como tal, procuram apresentar argumentos que favoreçam o

filósofo. Sendo então um texto de defesa, os autores procuram responder aos ataques, colocando o filósofo com as características contrárias àqueles que o acusam. Mas as estratégias para essa defesa são distintas. De acordo com Pinheiro (2009:46-47), o Sócrates apresentado por Xenofonte é mais ligado às questões cotidianas da vida na cidade, diferente de Platão, que apresentaria um Sócrates mais filosófico. Enquanto Platão tratava mais das ideias, apresentando um Sócrates questionador, polêmico, que tripudia dos adversários, Xenofonte se preocupa em mostrar um Sócrates sociável, amável, justo e mais próximo das pessoas e dos problemas do dia a dia na cidade. A partir desta diferença é possível entendermos como foram construídas as diferentes interpretações que aqui apresentaremos. A despeito dos autores terem trabalhado com uma gama maior de fontes primárias, destacamos aqui as Memoráveis, Apologia e Banquete, de Xenofonte, e Apologia, de Platão. No Banquete não é tratada diretamente a questão do julgamento de filósofo, estando esta obra defendendo algo mais amplo: os homens de bem de forma geral, sendo Sócrates um deles. Desta forma, ela também pode ser entendida como um “Diálogo Socrático”, isto é, como uma obra em defesa de Sócrates. Já as Memoráveis e Apologia são textos que respondem de forma direta ao processo que condenou Sócrates, defendendo-o de forma explícita e objetiva, sendo a primeira a principal obra socrática. Platão, na sua Apologia, trabalha a defesa de Sócrates perante a Assembléia ateniense. No decorrer do texto, Platão mostra um Sócrates que apresenta seus argumentos acerca das acusações e do veredicto, buscando sempre mostrar o significado de sua missão filosófica.

1. Discussão historiográfica De acordo com Goldhill (2007:185-187), existem duas tradições básicas que buscam explicar o julgamento e condenação de Sócrates. A primeira coloca o filósofo como um herói e mártir, enquanto a segunda é mais hostil às suas indagações. Seu heroísmo se manifesta em sua capacidade de fazer perguntas incômodas e nunca estar satisfeito com as respostas. Nesta perspectiva, sua morte é vista como um martírio, uma vez que ele permaneceu na prisão enquanto aguardava a execução. E enquanto aguardava, segundo Platão, discutia calmamente sobre a imortalidade da alma, acalmando e encorajando seus companheiros. Esse Sócrates, fruto de uma tradição liberal, é o preferido daqueles que se

dizem defensores da liberdade de pensamento e não aceitam se render à “tirania da maioria” (GOLDHILL, 2007:185-186). A segunda tradição percebe a dissidência de Sócrates como criadora de uma oligarquia violenta e individualista, uma vez que teria produzido indivíduos que derrubaram o Estado (GOLDHILL, 2007:186-187). A partir da apresentação dos autores que vamos trabalhar e destas duas tradições globais, acreditamos ser igualmente importante a apresentação do nosso personagem histórico principal, Sócrates. Este será nosso ponto de partida. Levando em consideração que Sócrates não deixou nada escrito, é impossível delinearmos de forma fidedigna a figura do filósofo. Para que possamos nos aproximar o máximo possível, é necessário recorrer aos textos de Platão, Xenofonte ou as peças cômicas de Aristófanes (GOLDHILL, 2007:184-185). Segundo Stone (2005:150), Sócrates, cuja mãe era parteira e o pai, canteiro (talvez também escultor), era de classe média. Tendo vivido até os setenta anos de idade, era casado e tinha três filhos. Até onde sabemos, nunca trabalhou, tendo passado seus dias no ócio, “filosofando”. Levando em consideração que ele não cobrava por seus ensinamentos, uma pergunta se impõe: como Sócrates sustentava a si e sua família? Acredita-se que ele vivia de uma herança deixada pelo pai, o que teria permitido sua vida de ócio. Mossé (1990:72-76) nos coloca que Sócrates serviu como hoplita durante a guerra do Peloponeso, além de ter combatido em Potidéia, Anfípolis e Délion, ocasiões em que ele teria dado provas de sua coragem cívica. Essa coragem não se resumia apenas ao campo de batalha, mas também no dia a dia da pólis, uma vez que ele não hesitava em enfrentar aqueles cujas ordens parecessem injustas ou contrárias às leis. Viveu em Atenas no decorrer do século V a.C.1, período no qual a democracia era a forma de governo estabelecida na cidade-Estado em questão. Para que possamos compreender melhor o funcionamento da sociedade democrática ateniense, especialmente no que tange à liberdade, iniciaremos dialogando com Grimal (1990:81), que tem como horizonte duas situações: quando se colocou fim à tirania dos pisistrátidas e quando os persas fracassaram na tentativa de subjugar a Grécia. Esses episódios remetem à forma como os gregos, segundo Grimal, concebiam a liberdade: como uma deusa protetora.

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Todas as datas que se encontram neste trabalho se referem à antes da era Cristã.

A primeira situação se refere ao surgimento do mito dos “tiranóctones”, ocasião em que dois irmãos, Harmódio e Aristogíton, resolvem atacar os pisistrátidas, Hípias e Hiparco, numa história cercada de ciúme e vingança. Hiparco foi morto, assim como Harmódio e Aristogíton, enquanto que Hípias continuou exercendo sua tirania por mais três anos. Esse episódio abriria caminhos para o estabelecimento de democracia em Atenas, cujo ideal principal seria a liberdade cívica, isto é, a isonomia, que é o fato de todos os cidadãos poderem participar igualmente de todas as funções da cidade, sendo os cargos administrativos sorteados e repartidos entre todos. E essa liberdade interna, que significa o fato da cidade não estar subjugada a nenhum outro tirano, deveria ser consagrada pelo sangue (GRIMAL, 1990:82-84). O segundo momento no qual a deusa Liberdade teria protegido Atenas foi na guerra contra os reis da Pérsia, primeiramente Dario e depois Xerxes. Aqui Grimal trata da liberdade do ponto de vista externo, isto é, o fato dela ser independente, livre. O autor nos apresenta um panorama geral, afirmando que Aristágoras, um “tirano” heleno estabelecido numa colônia grega da Ásia Menor, pediu ajuda às demais cidades gregas para libertar os gregos da região do jugo persa. O rei da Esparta recusou. Já em Atenas, onde a decisão ficava a cargo do povo reunido em Assembléia, votou-se que Aristágoras deveria ser ajudado. Com isso, os atenienses tornaram-se inimigos declarados da monarquia dos persas. A partir desse episódio, Grimal faz uma crítica à estrutura política ateniense, uma vez que ele afirma que é mais fácil enganar um número grande de homens do que um só (GRIMAL, 1990:84-86). Mas Dario, o então rei persa, prepararia sua vingança. Em 491, enviou às cidades gregas, principalmente Atenas e Esparta, representantes que reivindicavam “a terra e a água” 2, sendo tal exigência recusada. Paralelo a isso, os pisistrátidas, liderados por Hípias, o tirano, confirmaram a Dario sua vontade de fazer os atenienses de escravos e, com esse apoio, o exército dos persas se colocou em marcha. A presença de Hípias entre os persas mostrava que não só a liberdade externa estava em jogo, mas também a interna. Tudo terminou na planície de Maratona com a vitória de Atenas (GRIMAL, 1990:87-88). Mas os atritos entre gregos e persas não parariam por aí. Xerxes, filho de Dario, tinha ambições ainda maiores que seu pai. Então, mais uma vez, foi exigida “a terra e a água” aos gregos. Atenas foi tomada, mas a frota persa foi novamente aniquilada, dessa vez em Salamina, em 480. Essa vitória marcou o apogeu de Atenas que, em nome da liberdade grega, buscou o estabelecimento do seu império sobre a Grécia “libertada” (GRIMAL, 1990:90-91). 2

Aceitação por parte das cidades gregas da submissão aos persas.

A partir deste panorama acerca das guerras contra os reis persas, Grimal (1990:9192) relativiza o conceito de liberdade na democracia em Atenas, questionando se as demais cidades gregas não teriam preferido o rei persa ao imperialismo ateniense. Levando em consideração que nesse início de século V as cidades haviam feito diferentes opções políticas, umas adotando a democracia, outras a oligarquia e outras ainda se acomodando a um tirano, Grimal defende que cada uma dessas cidades era livre a sua maneira, sendo esta “liberdade traduzida por sua autonomia política interna e externa, gestão das suas próprias finanças, organização de sua própria defesa, culto de suas divindades tradicionais, enfim, livre escolha do regime que aceitava lhe convir”, autonomia essa que Atenas não mais permitiria. No decorrer do trabalho entenderemos melhor onde Grimal quis chegar com essa crítica à ideia de liberdade da democracia ateniense. Neste momento, é interessante dialogarmos com Finley, que nos apresenta alguns pontos importantes para compreendermos a sociedade democrática ateniense que se estabelecera a partir do panorama exposto por Grimal. Finley (1988:131) examina a experiência ateniense a partir da Guerra do Peloponeso (431 a 404), que recebeu ampla aprovação da população. A análise é feita através de alguns estudos de caso. Os dois primeiros serão úteis para melhor compreendermos o último, o julgamento de Sócrates. O primeiro envolve o dramaturgo Aristófanes, poeta cômico que, em 411, escreveu Lisístrata, na qual ele aborda a questão da guerra de forma extremamente debochada e, mesmo assim, era totalmente aceito pela sociedade (FINLEY, 1988:136-138). O segundo estudo de caso refere-se à aprovação na Assembléia da Lei de Diopeithes, que determinava ser delito grave ensinar astronomia ou negar a existência dos deuses. Finley acredita que tal Lei foi aprovada por conta de uma peste que eclodiu nos primeiros anos da Guerra do Peloponeso, matando muita gente em pouco tempo, levando ao povo verdadeiro terror. A piedade consistia em reforçar a coesão da cidade através dos diferentes ritos. Desta forma, qualquer manifestação de dúvida ou indiferença em relação à religião era caso de impiedade e, como tal, passível de uma ação pública. Assim, apesar da tolerância típica do politeísmo, a blasfêmia era um grave delito contra a comunidade, a quem os deuses poderiam se vingar. E, para evitar tal ira, o Estado poderia intervir na questão e se encarregava da punição (FINLEY, 1988:132-133;139; MOSSÉ, 1990:114). Um exemplo que nos é apresentado em relação à blasfêmia é o caso da mutilação das estátuas sagradas de Hermes, cuja função era repelir o mal. É importante ressaltar que tal mutilação ocorreu na noite anterior à partida da grande esquadra que iria lutar na Sicília,

deixando a população apreensiva, receosa de uma vingança dos deuses. A principal vítima por tal desrespeito aos deuses foi Alcibíades, um dos três generais no comando da expedição, que foi acusado de impiedade. Com a derrota de Atenas na Sicília, Alcibíades não retornou para responder ao processo, tendo fugido para Esparta (FINLEY, 1988:140-142). Com a perda praticamente total do exército e da marinha atenienses na Sicília, iniciou-se uma conspiração para substituir a democracia por uma oligarquia, na qual Alcibíades assumiria o comando supremo. Em 411, a Assembléia votou pela eliminação da democracia, mas esse panorama não durou muito, uma vez que pouco tempo depois a democracia foi restaurada. Alcíbiades, que não havia se juntado à conspiração, recebeu o comando militar (FINLEY, 1988:142-143). Segundo Grimal (1990:104-105), esse golpe de 411 teria sido uma primeira tentativa de introdução de alguma razão na vida política ateniense. Na sua perspectiva, a liberdade expressa pela Assembléia é, na verdade, uma coerção exercida sobre os indivíduos, no que ele chama de “tirania do demos”, uma vez que a cidade, através dos cidadãos reunidos em Assembléia, impunha suas leis aos indivíduos, estando estes subordinados ao grupo, que, por sua vez, age como um tirano que, quanto mais “livre”, mais é tirânico, pois o princípio que dava a cada cidadão o direito de tomar a palavra, a isegoria, tornava possível todos os excessos. É interessante observar o comportamento dos atenienses após o retorno de Alcibíades ao comando militar, uma vez que ele foi recebido com total tolerância. Além da questão da mutilação dos Hermes, havia, ainda, a tentativa de derrubar a democracia, que, como vimos, foi restaurada. Finley nos coloca, ainda, que, mais tarde, em 404, Esparta acabou vencendo a guerra e impôs uma junta militar conhecida como os Trinta Tiranos. Mas estes também não governaram por muito tempo, sendo expulsos pelos democratas após breve guerra civil (FINLEY, 1988:143-145). Finley (1988:144-145) entra então no último, e mais importante para nós, estudo de caso, o julgamento de Sócrates, ocorrido em 399. O autor afirma que, assim como em Alcibíades no caso do Trinta Tiranos, apenas alguns foram punidos, tendo outros recebido anistia. Anistia essa que não beneficiaria Sócrates, tendo em vista que este não teria ido a julgamento por alguma acusação de cunho político. Como veremos, todos demais autores não concordam que essa percepção. Goldhill (2007:185), por exemplo, afirma que ficou claro que o caso era político, uma vez que Sócrates estaria sendo perseguido por ser um inimigo do Estado. Mossé (1990:144) é ainda mais taxativa. A autora defende que na cidade de Atenas tudo é político, no sentido que, conforme Aristóteles define, o homem é um animal da pólis e

não há nada que aconteça nela fora dessa dimensão política, inclusive a religião e a filosofia, que só pôde se desenvolver por conta da estrutura política da cidade de Atenas, a democracia. Assim, jamais Sócrates seria o que ele foi em outra cidade. Segundo Finley (1988:145), Sócrates foi acusado “de não acreditar nos deuses em que a cidade crê e de apresentar novas divindades. Ele é, também, acusado de corromper a juventude”. É importante ressaltar, e isto é colocado por Goldhill (2007:185) e também por Mossé (1990:111-113), que a acusação de “corromper os jovens” não tem conotações sexuais, tendo, na verdade, um aspecto político mais amplo no sentido da influência que o filósofo tinha sobre seus seguidores. Voltando-nos para as fontes, observamos que tal acusação aparece logo no início das Memoráveis, de Xenofonte, assim como em Apologia, de Platão, que coloca as seguintes palavras na boca de Sócrates: Tentarei, em seguida, defender-me de Meleto, esse honrado e prestante cidadão, como se proclama, e dos acusadores recentes. Novamente, já que se trata de outros acusadores, tomemos também o texto de sua acusação. Reza ele mais ou menos assim: ‘Sócrates é réu de corromper a mocidade e de não crer nos deuses em que o povo crê e sim em outras divindades novas. (Apologia)

De acordo com Finley (1988:145), e conforme também pode ser observado no trecho de Apologia acima explicitado, a acusação foi articulada por Meleto, do qual sabemos pouco a respeito. Segundo Mossé (1990:106-107), ele era filho de um poeta trágico que se considerava igualmente poeta. No processo, estava a ele associado outros dois homens: Licon, desconhecido, e Anito, figura política cuja principal característica era sua insistência no rígido cumprimento da anistia. Para aquele autor, tal aspecto levaria ao entendimento que o julgamento de Sócrates não poderia ser caracterizado simplesmente como uma vingança política. De acordo com o que podemos observar em Platão, os três acusadores – Meleto, Anito e Licon – tinham em comum o fato de pertencerem à setores da vida ateniense que eram criticados por Sócrates: poetas, artífices e oradores: Entre esses, arremessaram-se contra mim Meleto, Anito e Licon: Meleto pelos poetas, Anito pelos artífices, Licon pelos oradores. De modo que, como eu dizia no princípio, ficaria maravilhado se conseguisse, em tão breve tempo, tirar do vosso ânimo a força dessa calúnia, tomada tão grande. (Apologia)

Mossé (1990:106) identifica Anito como um homem rico e influente que, segundo Aristóteles, se situava no círculo dos oligarcas moderados. Desta forma, quando os Trinta Tiranos ascenderam ao poder, ele optou pelo exílio. Porém, posteriormente, ele integrou a

restauração democrática. Para Anito, os sofistas e todos os que se dedicavam a filosofar representavam um perigo para a juventude. Grimal (1990:108) apresenta Anito como um estratego dos tempos da oligarquia que posteriormente foi para o lado dos democratas e passou a combater seus antigos aliados. Este autor entende a acusação na seguinte perspectiva: com a condenação de Sócrates, Anito purificaria seu passado oligarca, ligando-se totalmente à democracia. Ou seja, ao contrário de Finey, Grimal entende que a acusação tinha cunho fortemente político. O Anito apresentado por Stone (2005:143) é semelhante ao do Grimal: foi um dos oligarcas moderados de classe média que passou para o lado dos democratas e ajudou a derrubar o regime dos Trinta Tiranos, restaurando a democracia. Nesse contexto, Anito não teria esquecido que Sócrates não se uniu aos moderados e nem aos democratas contra os Trinta, o que nos leva ao entendimento de que Anito acreditava que havia alguma ligação entre o filósofo e os oligarcas radicais. Percebemos também em Stone uma justificativa para a acusação com viés político. Ao afirmar que não havia cunho político nas acusações contra Sócrates, Finley defende que o filósofo não era um revolucionário político. Grimal o vê de outra forma, uma vez que, em sua perspectiva, Sócrates, todo o tempo, colocava em cheque a democracia, o que não era bem visto na pólis. Seguindo esta lógica, Stone também o vê como um revolucionário. Para argumentar neste sentido, Stone nos apresenta três divergências básicas entre o filósofo e Atenas. A primeira diz respeito à natureza da comunidade humana. Enquanto para os atenienses essa natureza remetia à cidade livre, governada por seus cidadãos, para Sócrates essa comunidade não passava de um rebanho que deveria seguir as ordens de um rei. Percebemos então que Sócrates não defendia nem a democracia nem a oligarquia. Seu ideal era o poder exercido por “aquele que sabe”, o mais bem preparado, o que remete à ideia de monarquia. E defender a monarquia era se colocar em oposição à essência da polis (STONE, 2005:28-31). Ao apelar para monarquia, na visão do ateniense da época, seja oligarca, seja democrata, Sócrates ficaria do lado dos não civilizados. A segunda divergência diz respeito a duas questões que, para Sócrates, estavam indissoluvelmente ligadas: o conhecimento e a virtude. É preciso atentar que, se virtude é considerada um conhecimento, então se espera que, assim como as outras formas de conhecimento, ela pode ser ensinada. E, se é possível ensiná-la, qualquer um pode aprender, e

não somente uma minoria aristocrática. Se o povo é capaz de adquirir virtude, então qualquer um pode reivindicar participação no governo da cidade. Mas, para Sócrates, não se pode ensinar nada que não se pode definir absolutamente, isto é, para que eu possa ensinar o que é virtude, eu preciso conhecê-la. Ao defender que tal conhecimento absoluto, claro e objetivo era inatingível, até mesmo para ele, Sócrates estava afirmando que a virtude não poderia ser ensinada para todos, conforme a cidade defendia. A partir desta divergência, Sócrates se opunha aos sofistas, pois estes afirmavam ensinar conhecimento e, portanto, a virtude (STONE, 2005:61-63). A terceira divergência refere-se ao ideal de vida. O ideal de vida da cidade pressupõe a ideia de você participar da vida cívica, de você ter uma presença atuante dentro da cidade e, nesse aspecto, Sócrates era totalmente indiferente à cidade: Sócrates não era um bom cidadão. Ele cumpriu suas obrigações militares, revelando-se um soldado valoroso. Mas é extraordinário constatar que um ateniense tão notável conseguiu, ao longo de 70 anos de vida, não ter praticamente nenhuma participação nos negócios cívicos. Se a lei de Sólon contra a não participação em termos de conflitos cívicos estivesse ainda em vigor no século V a.C., Sócrates poderia ter perdido a cidadania. As duas maiores convulsões políticas ocorridas durante a vida de Sócrates – que foram as piores de toda a história da cidade – foram a derrubada da democracia em 411 e novamente em 404 a.C. Em ambas as ocasiões, Sócrates não teve participação alguma nem na derrubada da democracia, nem em sua restauração. (STONE, 2005:130)

Mossé (1990:90-94) também aborda a relação entre Sócrates e a democracia ateniense. A autora afirma que é difícil ter uma ideia precisa em relação ao que Sócrates pensava da democracia, uma vez que as fontes utilizadas, essencialmente Platão e Xenofonte, têm algumas discordâncias. Porém há pelo menos um ponto pacífico e de grande importância para nossa análise: para Sócrates não era possível improvisar um homem político, no sentido de que a competência numa dada técnica qualquer não implicava competência política. Ou seja, ele questionava a capacidade da massa, do demos reunido, para julgar. Mas, a despeito dela considerar o julgamento do filósofo como um acontecimento de cunho político, entendemos que a autora não o considera um revolucionário, uma vez que ele não concedia essa competência simplesmente aos mais ricos, mas sim para aqueles que o rodeavam, pois seriam estes os mais bem preparados. Desta forma, uma das grandes críticas de Sócrates à democracia ateniense gira em torno daqueles que dirigiam a cidade e que não tinham nenhuma formação específica nesta “arte” em que consistia a política. Percebemos, portanto, que na perspectiva de Mossé, Sócrates não era contra a democracia em si, mas sim a algumas

de suas instituições, o que não significa afirmar que ele automaticamente seria a favor da oligarquia ou até mesmo de uma monarquia. É interessante notar que Stone e Mossé partem das mesmas fontes, porém chegam a conclusões distintas. Ao analisar as Memoráveis, por exemplo, Stone entende que Sócrates defendia uma monarquia, uma vez que, segundo Xenofonte coloca na referida obra, o poder deveria ser exercido por um especialista: Sócrates então perguntou: - Por acaso, Eutidemo, não estarás interessado naquele dom, com a qual os homens se tornam governantes, administradores, chefes competentes e prestáveis, aos outros homens e a eles próprios? - É precisamente essa, Sócrates – exclamou Eutidemo – a virtude que preciso! - Por Zeus, então procuras a mais bela e a mais importante das artes, uma vez que é a arte de reis, e lhe chamam a “arte real”. (Memoráveis, IV, 11)

Ao se deparar com este tipo de diálogo, Mossé entende que Sócrates nunca foi contra a democracia, logo não foi a favor de uma oligarquia, sendo sua preocupação não com o sistema em si, mas sim com a educação. E, por isso, essa discussão em torno dos especialistas. Neste momento podemos perceber a questão socrática, pois as interpretações se dão na medida em que se consegue diferenciar o que é o pensamento de Sócrates e dos autores que escreveram sobre ele. Desta forma, acreditamos que o que Stone entende como sendo de Sócrates é, na verdade, de Platão, apesar de não termos como comprovar isto neste momento. A partir da consideração de que Sócrates não era um revolucionário político e que não poderia ter sido considerado ímpio ou culpado de blasfêmia, Finley (1988:146-147) questiona por que Sócrates foi condenado. O autor traz a ideia de que, apesar de se recusar a receber pagamento por suas “instruções”, Sócrates era considerado pelos acusadores como um sofista, tendo em vista que ele defendia que a educação, assim como outras “artes”, deveria ser confiada a especialistas. Essa era uma questão delicada, pois atingia em cheio os princípios tradicionais da sociedade ateniense, nos quais os jovens deveriam aprender com os pais ou com os mais velhos. Mas a partir de meados do século V surgiram os sofistas, “instrutores profissionais”, que ofereciam instrução retórica, filosófica e política para aqueles que pudessem pagar. É interessante observar que alguns desses cidadãos que tiveram acesso a esse tipo de “serviço” participaram ativamente do golpe oligárquico de 411 ou do governo dos Trinta Tiranos em 404, fazendo com que, de forma geral, os sofistas e seus discípulos fossem mal vistos pela

sociedade democrática de Atenas. Neste sentido, Mossé também chamou atenção para o perfil dos discípulos de Sócrates, afirmando que alguns deles desempenharam funções importantes naqueles acontecimentos relevantes do final do século V, especialmente durante as duas revoluções oligárquicas do ano 411 e 404. Mesmo alertando para o fato de que Sócrates também tinha como seguidores pessoas que apoiavam a democracia, como Lísias, que era um meteco que lutou a favor do regime esperando que fosse dada a ele a cidadania, o que nunca aconteceu, a autora acredita que não podemos ignorar aquelas relações no contexto do seu julgamento e condenação. Desta forma, os sofistas, aos quais Sócrates estaria de alguma forma associado, passaram a ser vistos como a causa de todo mal – peste, golpes oligárquicos, mutilação dos Hermes – e, por isso, tinham que ser expulsos da cidade (FINLEY, 1988:147149; MOSSÉ, 1990:45;95-96). Porém Mossé (1990:83) afirma que Sócrates não era um sofista. Ele se autodenominava um sábio. Neste sentido, Grimal (1990:107) nos coloca que Sócrates denunciava os sofistas, uma vez que estes dominavam a “arte da ilusão”, além de serem prisioneiros do irracional. Levando em consideração que muitos procuravam pelos “serviços” dos sofistas para se posicionar com mais propriedade politicamente, estes seriam os grandes causadores da série de erros cometidos por aqueles homens reunidos em Assembléia que tinha tomado decisões fatais à cidade, como foi o caso da Sicília. Como vimos quando tratamos da questão da virtude e conhecimento, Stone também levanta essa questão da oposição de Sócrates aos sofistas. Finley (1988:149) defende que Aristófanes, com sua peça As Nuvens, tem alguma responsabilidade pelo julgamento e execução de Sócrates, uma vez que ele apresenta uma figura falsa do filósofo, colocando-o como uma mistura de filósofos-cientistas e sofistas, sem levar em consideração que Sócrates se recusava a receber qualquer pagamento. Essa apresentação teria influenciado na ideia que o demos viria a ter de Sócrates como um impiedoso e corruptor da juventude. Esta questão do teatro grego é interessante, uma vez que os poetas cômicos possuíam plena liberdade para fazer piadas com os deuses e ridicularizar as instituições democráticas. Mas mais tarde houve uma mudança profunda e a comédia acabou desviando sua atenção da vida pública. Finley defende que isso não foi consequência de alguma forma de censura, uma vez que não houve nenhuma lei nesse sentido. De acordo com Mossé, isso foi consequência do processo de “despolitização” ocorrido com a exaustão ateniense em decorrência da Guerra do Peloponeso. Percebemos então que a liberdade de expressão era ampla no campo da

política quando analisamos a experiência ateniense (FINLEY, 1988:151;185-186; MOSSÉ, 1990:147). Mossé (1990:89) concorda com Finley ao afirmar que “Atenas é a terra da liberdade”, uma vez que ninguém seria obrigado a aceitar seu regime político ou suas leis, mas, a partir do momento que o cidadão opta por permanecer na pólis, considera-se que está firmando uma espécie de contrato com ela. O entendimento de Stone (2005:255-262) vai no mesmo sentido, pois ele defende que a democracia ateniense estava visceralmente ligada à liberdade de expressão. A fim de compreender a mentalidade dos atenienses antigos neste aspecto, Stone analisa as palavras empregadas pelos homens da época para designar tal conceito. E o autor chega a quatro termos: isonomia, isegoria, eleutherostomou e a parrhesia, sendo esta última também citada por Finley (1988:169). Todas essas palavras remetem à ideia de que todos são iguais perante a lei, que todos têm direito de falar na Assembléia, que o debate é livre e o homem livre é aquele que diz o que pensa. Em contrapartida, Grimal (1990:95-98) relativiza a ideia de liberdade ateniense através de diversas comparações entre a Atenas democrática e a Roma oligárquica. Além de defender que a cidade romana era mais aberta, tendo em vista que admitia pessoas vindas de outros lugares, acolhendo-as muitas vezes com direitos iguais das pessoas “de dentro”, o autor também mostra que em Roma seriam tomadas decisões políticas mais coerentes com as formas jurídicas já existentes e respeitando o direito de propriedade. Grimal compara o decreto de Sólon em Atenas, no qual ele anula as dívidas, o que o autor considera um ato arbitrário contra os credores, com a criação do Tribuno da Plebe em Roma, no qual todos os cidadãos passariam a ter tempo e meios materiais para participar da vida política, sendo a condição da liberdade o estabelecimento de uma igualdade mínima entre todos os membros da cidade. A percepção de Goldhill (2007:184) acerca da liberdade em Atenas pode ser equiparada à de Grimal, uma vez que o autor, ao tentar compreender a fronteira entre a liberdade do indivíduo e a regulamentação da comunidade, coloca Sócrates como um cidadão incômodo, uma ameaça a ser removida, já que fazia perguntas que poderiam destruir os valores da democracia. Desde As Nuvens se passaram 24 anos e, em 399, Sócrates é processado. Se, na perspectiva de Finley, não houve censura, quais seriam então as motivações para acusar

Sócrates? De acordo com este autor, tanto Platão quanto Xenofonte sugerem que Meleto, Licon e Anito teriam se unido por motivos pessoais. Mas e a condenação? Essa é uma questão pertinente, uma vez que foi uma decisão tomada num júri formado por 501 cidadãos da pólis (FINLEY, 1988:150). Neste momento, Finley (FINLEY, 1988:152) chama atenção para uma questão importante: os poetas atuavam nos festivais religiosos, ou seja, dentro da estrutura do Estado, enquanto que os filósofos estavam fora dessa estrutura e, portanto, eram vistos como pessoas que a atacavam. Desta forma, teria havido, no contexto da Guerra do Peloponeso que aqui explicitamos, uma perseguição em Atenas aos intelectuais e sua liberdade. Mas a grande preocupação girava em torno da preservação da ideologia política dos jovens da elite, uma vez que esses, tradicionalmente, compunham a liderança da comunidade. Ou seja, não importava o que estava sendo dito, mas sim para quem estava sendo dito (FINLEY, 1988:152-154;176177). Neste momento podemos perceber que Finley contradiz, de certa forma, sua própria tese de que não houve cunho político na acusação, pois ao se preocupar com a ideologia política do jovens, isso já nos leva automaticamente ao entendimento de que a acusação tinha um forte conotação política. Cabe salientar que foram os membros das classes mais altas que inspiraram a mutilação dos Hermes. Foram esses mesmos homens que teriam arquitetado o golpe oligárquico de 411 e, mais tarde, o regime dos Trinta Tiranos. Eram essas pessoas que podiam pagar pelo serviço dos sofistas e eram elas também que seguiam Sócrates, segundo Platão fez o filósofo admitir em sua Apologia. Assim, os atenienses ficaram com medo de perder, através da corrupção dos jovens, especialmente aqueles da elite, um modo de vida construído em meio século que tinha como base a democracia (FINLEY, 1988:154-155). Stone (2005:188-190;274-275) discorda de Finley em relação ao fato de que teria havido uma “caça às bruxas” em Atenas, afirmando que a condenação de Sócrates foi um caso isolado. Ele trabalha o contexto da Guerra do Peloponeso sob o seguinte viés: nos apresenta três momentos, que ele chama de “três terremotos”, que teriam levado à condenação de Sócrates: os dois golpes oligárquicos de 411 e 404 e, mais tarde, em 401, a tentativa de um terceiro golpe, que foi estancado antes mesmo de se configurar. Concordando com Finley no fato de que foram os membros da elite que participaram desses eventos e que, entre estes, havia discípulos de Sócrates, Stone entende que as atitudes do filósofo geraram um clima favorável aos golpistas. E isto teria levado ao seu julgamento e condenação.

A despeito de também focar nos golpes oligárquicos de 411 e 404, Mossé (1990) não trabalha essa questão dos “três terremotos”, mas aborda Atenas em três dimensões: a cidade vencida, a cidade assassinada e a cidade dilacerada. Vencida porque foi derrotada na Guerra do Peloponeso. Assassinada porque, em função da guerra, a cidade ficou financeiramente debilitada. E dilacerada, pois certos grupos começaram a colocar a culpa na democracia pela derrota de Atenas e, com isso, vão promover os golpes oligárquicos, que dilaceram a cidade. Esse panorama acaba, de certa forma, convergindo com o que Stone defende, uma vez que após os golpes Atenas teria ficado numa situação tão delicada, que qualquer coisa poderia ameaçá-la. E é nesse contexto que Mossé localiza Sócrates, uma vez que ele teria aparecido como uma dessas ameaças. Stone (2005:236) chama atenção que o processo de Sócrates vai contra todo espírito da democracia ateniense, já que Atenas era o espaço por excelência da liberdade de expressão e o julgamento em questão foi um julgamento de ideias. Desta forma, Stone (2005:253254;273) defende a tese de que Sócrates queria ser condenado, pois ser absorvido significaria uma derrota política e filosófica, uma vez que “ele não iria querer que a democracia por ele rejeitada obtivesse uma vitória moral libertando-o da prisão”. Ou seja, se ele fosse libertado, ele teria que, necessariamente, reconhecer o funcionamento das instituições democráticas. Por isso, em nenhum momento Sócrates argumentou no sentido da liberdade de expressão, o que, muito provavelmente, o teria libertado. Mas o filósofo não acreditava no princípio tal qual ele se colocava, pois defendia que essa liberdade era “privilégio de uns poucos esclarecidos e não da maioria ignorante”. Assim, Stone defende que Sócrates provocou a própria morte e Atenas cometeu um crime ao condená-lo. Apesar de entender que houve uma “caça às bruxas” em Atenas naquele período, Finley (1988, 150;174) defende que não havia intenção de condená-lo a morte. A expulsão do seio da sociedade era o que os acusadores de Sócrates pretendiam, mas este não aceitou, optando pela morte. Finley (1988:130-131) ressalta que estamos nos referindo à uma sociedade que depende da comunicação verbal e, desta forma, o método mais eficaz para a censura, com exceção da pena de morte, era a expulsão da sociedade. Neste sentido, existia em Atenas alguns mecanismos que buscavam resolver o problema do equilíbrio entre liberdade e segurança, como o ostracismo e o graphé paranomon. No primeiro, o indivíduo que pudesse influenciar negativamente a pólis com suas ideias seria excluído fisicamente da comunidade por um período de dez anos e, desta forma, suas opiniões públicas não mais circulariam. O segundo mecanismo era utilizado para rever propostas já aprovadas na

Assembléia, propostas essas consideradas ilegais. Com isto, o indivíduo que originou dada proposta poderia ser processado e condenado. Assim, Finley (1988:187) defende que o que Sócrates provocou não passou de um distúrbio, uma vez que ele poderia ter ido embora, como outros filósofos fizeram. Assim, ele defende que a morte de Sócrates não teria passado de uma ocasionalidade provocada por uma sucessão de acidentes – a peste, a mutilação dos Hermes, os golpes oligárquicos. Mossé (1990) concorda com Finley, no sentido de que não se pode acusar a democracia de ter matado Sócrates, uma vez que o próprio Platão viveu a vida toda acusando a democracia e nunca foi condenado a nada. Desta forma, a autora defende que o episódio de Sócrates está localizado num contexto histórico ateniense no qual observamos não só a morte do filósofo, mas também diminuição do interesse dos cidadãos pela vida pública e aumento progressivo do medo e desconfiança de qualquer coisa que poderia abalar as estruturas democráticas. Neste contexto, Sócrates seria a personificação dessa desconfiança. Então, nesta perspectiva, Sócrates foi levado a um julgamento político no contexto de uma cidade que já estava se “despolitizando”. Assim, a autora defende que a morte de Sócrates foi um acidente causado por uma sucessão de acontecimentos. Neste ponto, ela concorda claramente com Finley, com a diferença que ela vai trabalhar num horizonte de transformação mais ampla da pólis ateniense. Para Mossé, então, a democracia não foi culpada pela morte de Sócrates, sendo o filósofo um elogio à democracia ateniense. Já Grimal (1990:107) entende que Sócrates era antipático à democracia, questionando suas bases sempre que possível e, com isso, era a personificação da dúvida. O filósofo defendia que a política ateniense tinha levado à tomada de decisões fatais à cidade, uma vez que os cidadãos reunidos em Assembléia seriam prisioneiros do irracional, isto é, não estariam aptos a reconhecer “o Bem e a Verdade”. Assim, Sócrates se tornava uma vítima em potencial. No que tange ao questionamento constante, Goldhill (2007:184) segue a mesma linha de raciocínio de Grimal. Sua abordagem leva à seguinte indagação: que liberdade era aquela que não tolerava um pensamento discordante? Assim, tal autor defende que Sócrates foi executado pela democracia ateniense por conta do que ele acreditava que, por sua vez, ia muitas vezes contra as instituições democráticas, sendo, portanto, considerado perigoso para a sociedade.

Tanto Grimal quanto Stone colocam que após a morte de Sócrates, suas teses sustentariam uma nova noção de liberdade. Mossé segue um pensamento semelhante, mas em outra dimensão. Grimal (1990:108-112) afirma que a morte do filósofo levou ao entendimento que era possível ser livre, mesmo estando submetido a um tribunal composto pelos cidadãos, mostrando, então, que a liberdade estava no indivíduo e não na praça pública. Nesse contexto, surgiram os cínicos, que levaram ao extremo essa necessidade de liberdade, pois defendiam que os homens, ao se conformarem aos valores da opinião, se tornavam escravos. As coerções sociais eram, para eles, insuportáveis. Com a tomada da Grécia pelos Macedônicos, a ideia de liberdade vai perdendo seu sentido inicial, passando-se a defender cada vez mais o papel do melhor, daquele que é mais sábio e, portanto, tem mais capacidade para governar. E, com isso, a história caminha para essa metamorfose da liberdade, na qual o monarca começa a aparecer como uma figura que de alguma forma favorece a liberdade. Stone (2005:268-269) também trata desse momento quando examina a atitude dos filósofos gregos em relação à liberdade de expressão. O primeiro período seria o que ele chamou de pré-socrático, quando os filósofos tinham tanta liberdade para se expressar que nem precisavam se preocupar em defendê-la. O segundo é o socrático-platônico, período no qual os filósofos gozavam de liberdade de expressão, mas acreditavam que os outros não faziam jus a ela. E, enfim, o terceiro, que remete ao período tratado por Grimal, que tem início com a morte de Sócrates e é caracterizado pelo fim da liberdade política por conta do domínio macedônico e posteriormente romano, fazendo com que os filósofos se tornassem indiferentes à política, se recolhendo em seus mundos individuais. Mossé (1990:146-147) tem um entendimento semelhante, mas dá uma dimensão maior a isso. Como vimos, a autora defende que Atenas muda. E o fato dela estar vencida, assassinada e dilacerada levou as pessoas a se preocuparem mais com elas mesmas, num processo que ela chamou de “despolitização” dos cidadãos, que passaram aos poucos a estar mais preocupados com suas vidas privadas em detrimento da vida pública. E, para Mossé, a morte de Sócrates simboliza essa mudança.Ou seja, a condenação de Sócrates não causou uma transformação, mas fez parte de um contexto mais amplo de mudanças. Mas a autora chama atenção para o fato de que a morte de Sócrates não teve grande repercussão na Atenas do século IV, pois aquele tipo de julgamento era comum. Assim, ela busca compreender como se deu a construção do mito de Sócrates como vítima da democracia e afirma que o historiador precisa se abster da tentação de se entregar a esta percepção, uma

vez que o homem Sócrates precisa ser entendido dentro do contexto ateniense no qual ele viveu, foi julgado e condenado (MOSSÉ, 1990:152). A despeito de não aceitar o mito de Sócrates como vítima da democracia, Mossé (1990:153-156) reconhece que tal imagem se perpetuou por muito tempo, especialmente a partir da Renascença, que é o momento em que a antiguidade é “redescoberta” e, nesse contexto, Sócrates surge como uma espécie de antecessor dos homens da época que, como o filósofo, não hesitaram em enfrentar a morte pela liberdade, como Galileu e Giordano Bruno, por exemplo. No decorrer do século XVIII Sócrates viria a se tornar um ícone do combate contra a intolerância. Com isto, o mito de Sócrates se desenvolveu e se fortaleceu em diversas frentes: como adorador de um deus único e cuja morte anuncia a de Cristo; como vítima da multidão ignorante; como vítima do totalitarismo da cidade. E Mossé finaliza afirmando que: Cabe ao historiador resistir a tais amálgamas. [...] Não existia uma ‘ideologia oficial’ à qual Sócrates devesse se submeter, sob pena de ser perseguido ou de ser condenado à morte. A própria noção de tolerância ou intolerância ainda não tinha assumido ali nenhum sentido. No ano de 399, porém, Atenas saía de uma guerra desastrosa e de uma grave crise política. Ela tinha necessidade de reencontrar seu equilíbrio e qualquer ameaça que arriscasse comprometê-lo devia ser afastada. Convém também se lembrar do que era a justiça ateniense: uma justiça popular cujos julgamentos não permitiam nenhum recurso, mas onde a pena de morte era mais facilmente infligida quanto mais frequentemente aqueles que eram condenados tinham mil meios de escapar a ela. [...] É preciso resignarmos a jamais conhecer o verdadeiro pensamento do filósofo Sócrates. O homem Sócrates, ao contrário, despojado da lenda que seus discípulos e a posteridade criaram, permanecerá paradoxalmente como o símbolo da grandeza da civilização nascida da democracia ateniense. (MOSSÉ, 1990:156-157)

Conclusão No decorrer do trabalho nossa grande preocupação girou em torno do significado do julgamento de Sócrates para diferentes autores. Porém o processo de Sócrates não deve ser considerado um fim em si, mas sim um meio para compreendermos como funcionava a Atenas democrática, tendo como horizonte três aspectos essenciais: a lei, a justiça e a liberdade. No que tange à lei, estamos nos referindo ao sentido amplo da palavra, isto é, no sentido da Constituição do Estado ateniense, cujas instituições estavam pautadas na democracia, que diz respeito à forma como os cidadãos deliberavam. Portanto, democracia tem a ver com o sistema político interno, como a cidade está constituída politicamente.

Para que possamos compreender o funcionamento da democracia ateniense, é preciso ressaltar que estamos trabalhando no horizonte da pólis, isto é, da sociedade políade, cujo apogeu se deu na Grécia entre os séculos VI e IV. Levando em consideração o contexto no qual se passou o julgamento de Sócrates, dialogamos com Theml (1988:18-19), que nos apresenta algumas características básicas da sociedade políade ateniense. A autora afirma que Atenas democrática era uma organização na qual prevalecia a totalidade da comunidade cívica, ou seja, os interesses dos cidadãos atenienses não se confundiam com as instituições públicas; na qual os cidadãos tinham como parte central da vida a política, estando essa esfera acima das relações domésticas; era uma sociedade face a face, na qual toda atividade política acontecia na Assembléia através do debate. Por conta disso, a questão da oratória vai ganhando importância e, com isso, a retórica vai ser criada para ajudar a desenvolver esta habilidade. Percebemos a grande importância dada à coletividade, sendo essa consciência o que conduz a atividade política e, consequentemente, a coesão social. Constatamos então que, segundo Theml (1988:51-52;59), a democracia ateniense tinha como base a ideia de que todos os cidadãos eram responsáveis pela pólis, ou seja, a administração era despersonalizada. Era baseada, ainda, na aceitação absoluta das leis, incluindo nelas a Politeía, que era o conjunto de normas que regulavam a vida política de Atenas, assim como o próprio corpo cívico. Assim, percebemos que cidadãos e pólis eram entendidos como uma unidade. Desta forma, os cidadãos atenienses, ao exercerem funções públicas, deveriam diferenciar seus interesses privados dos públicos, assegurando, assim, a execução das leis. A obediência total à lei é de grande importância, pois, segundo Heródoto (História, III, 84) citado por Theml (1988:45), o ateniense não obedecia a nenhuma homem, mas somente “às leis escritas que expressavam a vontade coletiva da comunidade cívica”. Logo, o respeito às leis (nómos) significava a liberdade do cidadão ateniense. Na Politeía, que, como vimos, é o conjunto de cidadãos e a Constituição do Estado, havia alguns princípios gerais que deram condições à formação e consolidação da democracia ateniense, como a isonomia, igualdade perante a lei; a isegoría, direito a palavra; isocracia, direito à participação política; eleuthería, liberdade e independência; entre outros. A partir de tais princípios foi possível tornar o demos atuante através da Assembléia (THEML, 1988:47). Conforme foi possível observar, um dos pressupostos para a manutenção da vida políade é a despersonalização do poder. Assim, para manter distante o perigo da ascensão de um poder pessoal, eram seguidos os princípios de colegiado, no qual os magistrados não

atuavam sozinhos em dada Magistratura, tendo sempre consigo pelo menos mais um colega com o mesmo cargo, além do sorteio e a anualidade. Tais princípios só não valiam para a Assembléia, onde todos os cidadãos tinham o direito e o dever de participar (THEML, 1988:48-49). Neste sentido, existiam ainda dois mecanismos, já citados anteriormente quando dialogamos com Finley (1988:130-131)3: o ostracismo e o graphé paranomon. Theml (1988:49) nos apresenta mais um mecanismo, a atimia, que é a perda dos direitos cívicos daquele que cometesse um crime político. A Constituição democrática ateniense não previa a existência de partidos políticos. Pelo contrário: a democracia era uma forma de governo direta, na qual não se concebeu a noção de representatividade. Apesar disso, é possível perceber a formação informal de duas facções, que defendiam dois tipos de governo: um oligárquico e outro democrático, o que não mudava a ideologia da vida cívica, que estava baseada na ideia de igualdade entre os cidadãos. A diferença básica entre as duas facções foi que enquanto os oligarcas propunham a restrição da participação política dos cidadãos, os democratas defendiam a ideia da participação efetiva destes. As tensões políticas entre oligarcas e democratas se intensificaram, até que atingiram seu auge durante a Guerra do Peloponeso (THEML, 1988:59). Para que possamos melhor compreender como se dá na prática essa diferença entre oligarcas e democratas, é importante compreendermos como a pólis se organizava politicamente. Toda cidade-Estado possui Assembléia(s), Conselho(s) e Magistraturas. A Assembléia é onde todos os cidadãos deveriam se reunir, o que não significa que todos compareciam. O Conselho é um órgão mais restrito, reunindo um número reduzido de cidadãos. As Magistraturas são as funções públicas fundamentalmente de cunho executivo, apesar de não se resumir a isso. Basicamente, o que diferencia a oligarquia da democracia é que esta dá mais peso às decisões da Assembléia, enquanto que aquela dá mais ênfase ao Conselho. Para ficar ainda mais claro, nos voltamos para Roma, cuja organização política era a oligarquia. Lá, existiam várias Assembléias, diferente de Atenas, onde existia somente uma. As Assembléias romanas eram caracterizadas pelo fato de não resultarem de um número indefinido de indivíduos, mas sim de um número limitado e definido de acordo com certas unidades de agrupamento: classes, centúrias e tribos. Assim, quem era de fato consultado nas Assembléias era um representante de cada agrupamento, e não a totalidade de seus 3

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componentes, fazendo com que o voto não fosse de fato igualitário, como se pretendia na Assembléia democrática ateniense (NICOLET, 1991:33). A questão da justiça pode ser entendida a partir da organização da democracia ateniense que acabamos de explicitar. Conforme colocamos, uma das características básicas da sociedade políade é o fato dela ser face a face, isto é, todos os cidadãos, mesmo que indiretamente, se conhecem. Tal característica é de extrema importância quando nos voltamos para a questão da justiça, uma vez que num tribunal, que é formado por cidadãos escolhidos através de sorteio, aqueles que vão julgar precisam conhecer minimamente o acusado, pois, somente assim, as decisões não serão tomadas de improviso. No caso do julgamento de Sócrates, no qual 501 cidadãos da pólis formaram o júri, muito provavelmente todos ali já tinham ouvido falar do filósofo em algum momento. Percebemos, portanto, como bem nos colocou Mossé (1990:157), que a justiça democrática ateniense era popular, cujas decisões não cabiam recurso. No que se refere à questão da liberdade, acreditamos que podemos melhor trabalhá-la dialogando com Grimal, uma vez que os demais autores que aqui utilizamos como base não desenvolveram profundamente o tema, uma vez que trabalharam no horizonte da liberdade de expressão, e não num conceito mais amplo de prática dessa liberdade no mundo antigo, como fez Grimal. Neste sentido, os demais autores, de forma geral, colocam Atenas como o grande ícone da liberdade de expressão. Apesar de Grimal não deixar isso totalmente claro em sua análise, a partir deste autor podemos compreender que essa liberdade pode ser apreendida de diferentes formas, sendo este um primeiro ponto a ser observado. No capítulo que aqui trabalhamos, Grimal tem como foco o caráter sagrado da liberdade, mas para entender essa noção, o autor faz uma importante confrontação com Roma. Neste sentido, ele afirma que o que os atenienses consideravam como liberdade, era para os romanos um abuso dessa liberdade. Mas é importante ressaltar que estamos nos referindo a um grupo de romanos que, por sua vez, se alinha com um grupo de atenienses que também viam aquilo como um abuso da liberdade. A partir destas breves colocações podemos concluir que a liberdade pode ter vários significados, dependendo do lugar social de que se esteja falando. Outra ponderação interessante que podemos fazer a partir de Grimal é que essa liberdade pode conduzir à um extremo, isto é, pode levar até mesmo à morte do cidadão. Um bom exemplo disso é o exército cívico das cidades-Estado, no qual o cidadão abre mão da sua liberdade para defender a liberdade da cidade. Desta forma, o soldado-cidadão está se

permitindo ser castigado, punido, disciplinado e até morto pela cidade. A partir deste exemplo podemos observar o que Grimal chama de “erros da liberdade”. Conforme colocamos, Grimal aborda o caráter sagrado da liberdade, porém é interessante notar que na verdade os heróis da liberdade que foram entronizados, os pisistrátidas, pouco tinham a ver com ela. E, neste sentido, Grimal nos apresenta, mais uma vez, os limites e as contradições dessa liberdade. Percebemos então que apesar do grande valor que a liberdade tem para a sociedade cívica, ela passa a servir de campo de disputas, pois cada um vai entendê-la de modo diferente. Grimal, ao apresentar esses elementos contraditórios, nos coloca que Sócrates passa a ser símbolo de uma mudança nessas concepções de liberdade. Neste sentido, o autor entende que a morte do filósofo é a exaltação de uma liberdade pessoal, uma vez que ele morre para ser livre. Mossé, de certa forma, chega a uma conclusão semelhante, pois ela defende que num contexto de “despolitização” dos cidadãos atenienses, no qual estes aos poucos passaram a estar mais preocupados com suas vidas privadas, a condenação de Sócrates é vista como um símbolo dessa transformação. A partir do exposto acerca da liberdade, podemos fazer uma breve reflexão em relação à atualidade. A liberdade para nós, diferente do contexto ateniense que aqui analisamos, não tem caráter cívico, mas sim um caráter extremamente individualista. Isto significa afirmar que cada indivíduo pode fazer o que quer, quando quer, sendo a única restrição à essa liberdade o respeito ao outro. Então atualmente julgamos a liberdade do ponto de vista individualista, sem considerar a existência de um Estado. Ou seja, quando enfatizamos a ideia de liberdade, a ideia de Estado perde força, uma vez que tendemos a vê-lo como um opressor. Porém, ao exaltarmos a liberdade nesta perspectiva individualista, acabamos sendo, de certa forma, tirânicos, pois no limite tendemos a colocar a nossa própria liberdade acima dos demais, invertendo a situação que Grimal apresenta. Assim, essa liberdade individual também pode ser opressiva, assim como pode ser na perspectiva cívica, coletiva.

Referências Bibliográficas FINLEY, Moses. Democracia Antiga e Moderna (ed. rev.). Rio de Janeiro: Graal, 1988. p. 127-187. GOLDHILL, Simon. Amor, sexo e tragédia: como os gregos e romanos influenciam nossas vidas até hoje. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007. p.147-192. GRIMAL, Pierre. Os erros da liberdade. Campinas, SP: Papirus, 1990. p. 81-115. JOLY, Fábio. Libertate opus est. Escravidão, manumissão e cidadania à época de Nero (54-68 d.C.). 2006. 218 f. Tese (Doutorado em História) – Departamento de História, Universidade de São Paulo. 2006. MOSSÉ, Claude. O processo de Sócrates. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1990. NICOLET, Claude. O cidadão e o político. In: GIARDINA, Andrea (org.). O homem romano. Lisboa: Editorial Presença, 1991. PINHEIRO, Ana Elias: XENOFONTE. Banquete, Apologia de Sócrates. Tradução do grego, introdução e notas. Coimbra: CECH, 2008. __________________________________. Memoráveis. Tradução do grego, introdução e notas. Coimbra: CECH, 2009. BRUNA, Jaime: PLATÃO. Defesa de Sócrates. São Paulo: Nova Cultural, 1987. STONE, I. F. O julgamento de Sócrates. São Paulo: Cia. das Letras, 2005. THEML, N. O público e o privado na Grécia do VIII ao IV séc. a.C.: o modelo ateniense. Rio de Janeiro: Sette Letras, 1988.

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