O livro digital e as perspectivas para o Mercado Editorial

May 22, 2017 | Autor: Lorran Feital | Categoria: Amazon, Cauda Longa, Livro, Livro Digital, Mercado Editorial
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FACULDADES INTEGRADAS HÉLIO ALONSO COMUNICAÇÃO SOCIAL - JORNALISMO

Lorran Neves Feital

O LIVRO DIGITAL E AS PERSPECTIVAS PARA O MERCADO EDITORIAL

Rio de Janeiro 2012

Lorran Neves Feital

O LIVRO DIGITAL E AS PERSPECTIVAS PARA O MERCADO EDITORIAL

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Comunicação Social Jornalismo das Faculdades Integradas Hélio Alonso, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social, sob a orientação da Profa. Angela Maria Arêas Oliveira.

Rio de Janeiro 2012

O LIVRO DIGITAL E AS PERSPECTIVAS PARA O MERCADO EDITORIAL

Lorran Neves Feital

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Comunicação Social Jornalismo das Faculdades Integradas Hélio Alonso, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social, submetida à aprovação da seguinte Banca Examinadora. Notas

_______________________ Prof. Orientador

_______________________ Membro da Banca

_______________________ Membro da Banca

Data da Defesa

_____/_____/_____

Rio de Janeiro 2012

Aos meus pais, pela dedicação; À minha irmã por me tornar responsável; E à minha namorada, por não me deixar desistir.

Nós habitamos o papel, estamos acostumados e, uma vez que é tão comum, tão simples, nós o tornamos divino, para podermos percebê-lo ainda sob a cobertura de sua habitualidade. Vilém Flusser

RESUMO

O mercado editorial enfrenta mudanças radicais na sua estrutura. Não só editores, livreiros e distribuidores, mas também autores e leitores fazem parte dessa revolução. Todos os agentes envolvidos terão que repensar seus papéis e sua importância, levando em conta as novas possibilidades surgidas pelas recentes evoluções tecnológicas. Os papéis não são mais tão claros e bem desenhados como antes. Analisando as mudanças que o livro digital promete causar à indústria editorial, este trabalho traça um histórico das transformações que deram origem ao livro e ao mercado editorial, apresenta as novas bases dos comércios eletrônicos, e mostra como estas transformações podem abalar o equilíbrio de forças predominantes desde os tempos pós Gutenberg. Tendo como exemplo base de comércio eletrônico a Amazon, buscamos uma abordagem direcionada ao funcionamento desses novos mercados, suas características, e possíveis alterações na forma de se vender livros, bem como perspectivas para a cadeia produtiva do livro. Palavras-chave: Mercado editorial. Livro. Livro digital. Cauda longa. Amazon

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - A Cauda Longa ......................................................................................... 26

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 8 2 HISTÓRICO ........................................................................................................... 11 2.1 Escrita .............................................................................................................. 11 2.2 Livro ................................................................................................................. 12 2.3 Livro digital ....................................................................................................... 14 3 MERCADO EDITORIAL BRASILEIRO ................................................................... 17 3.1 Edição .............................................................................................................. 17 3.2 Distribuição ...................................................................................................... 18 3.3 Venda............................................................................................................... 20 4 AMAZON ................................................................................................................ 22 4.1 Histórico ........................................................................................................... 22 4.2 Inovações ......................................................................................................... 24 4.3 Kindle ............................................................................................................... 24 5 A CAUDA LONGA .................................................................................................. 26 5.1 Conceito ........................................................................................................... 26 5.2 A regra dos 98% .............................................................................................. 27 5.3 Características ................................................................................................. 28 6 NOVOS MERCADOS ............................................................................................. 30 6.1 Livros ............................................................................................................... 30 6.2 Livro digital ....................................................................................................... 31 7 PERSPECTIVAS .................................................................................................... 33 7.1 Cadeia produtiva .............................................................................................. 33 7.2 Vendas ............................................................................................................. 34 7.3 E-readers ......................................................................................................... 34 8 CONCLUSÃO......................................................................................................... 36 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 38

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1 INTRODUÇÃO

"As variações em torno do objeto livro não modificaram sua função, nem sua sintaxe, em mais de quinhentos anos. O livro é como a colher, o martelo, a roda ou a tesoura. Uma vez inventados, não podem ser aprimorados" (CARRIÈRE; ECO, 2010, p.16). Com a afirmativa acima, Umberto Eco faz uma ampla e apaixonada defesa do livro de papel em seu livro, escrito em parceria com Jean-Claude Carrière, Não contem com o fim do livro. Mas será o livro (tratemos o livro de papel apenas como “livro”) uma ferramenta tão perfeita assim, que desbanca inovações e pode se dar ao luxo de “não ser aprimorado”? Será também que o livro digital representa ameaça ao “futuro do livro”? Este trabalho não busca e, certamente, não alcançará tais respostas, mas pretende apontar novos caminhos possíveis, bem como as perspectivas para um mercado editorial chacoalhado pelas novas formas de comunicação e, principalmente, pelo advento, há alguns anos, do livro digital. Mas, antes de tudo, é preciso ressaltar que mudanças sempre ocorreram e são a base evolutiva da nossa sociedade. Apedrejar o livro digital e dar o livro como morto são temas constantes nesse diálogo. É preciso, entretanto, lembrar que, principalmente na comunicação, tecnologias anteriores também surgiram e foram cunhadas como “aniquiladoras” de suas predecessoras. E essa questão não é recente. Vem de longe essa discussão, e reverberou em debates como televisão versus rádio, fotografia versus pintura, cinema versus teatro, escrita versus memória (CARRIÈRE, 2010). Em diálogo de Fedro (PLATÃO, 2000, p. 120-121), Sócrates apresenta o mito de Thoth, o deus egípcio inventor do número, do cálculo, da geometria, astronomia, do jogo de damas, dos dados, e também da escrita:

Dizem que Tamuz fez a Thoth diversas exposições sobre cada arte, condenações ou louvores cuja menção seria por demais extensa. Quando chagaram à escrita, disse Thoth: “Esta arte, caro rei, tornará os egípcios mais sábios e lhes fortalecerá a memória; portanto, com a sabedoria”. Responde Tamuz: “Grande artista Thoth! Não é a mesma coisa inventar uma arte e julgar da utilidade ou prejuízo que advirá aos que a exercerem. Tu, como pai da escrita, esperas dela com teu entusiasmo precisamente o contrário do que ela pode fazer. Tal coisa tornará os homens esquecidos, pois deixarão de cultivar a

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memória; confiando apenas nos livros escritos, só se lembrarão de um assunto exteriormente e por meio de sinais, e não em si mesmos. Logo, tu não inventaste um auxiliar para a memória, mas apenas para a recordação. Transmites aos teus alunos uma aparência de sabedoria, e não a verdade, pois eles recebem muitas informações sem instrução e se consideram homens de grande saber, embora sejam ignorantes na maior parte dos assuntos. Em conseqüência serão desagradáveis companheiros, tornar-se-ão sábios imaginários ao invés de verdadeiros sábios” (PLATÃO, 2000, p.120-121).

As novas tecnologias sempre tiveram papel ameaçador frente às tecnologias videntes. A repulsa de Tamuz em relação à escrita reflete seu medo em relação à substituição da tecnologia da época (a oralidade). Perder-se-ia, com o advento da escrita, a capacidade do homem de cultivar a memória, já que este teria como deixar tudo registrado. O que vemos hoje é o inverso, já que a escrita fez com que uma gama maior de informações sobre o mundo pudesse ser organizada, aumentando assim nosso conhecimento. Mas é curiosa tal reação, já que podemos perceber o mesmo discurso nos dias de hoje em relação à internet. “Ambientes tecnológicos não são recipientes puramente passivos de pessoas, mas ativos processos que remodelam pessoas e igualmente outras tecnologias” (MCLUHAN, 1972, p.15). As tecnologias não se extinguem, complementam-se. A internet e as novas tecnologias não deram fim às tecnologias tradicionais, mas certamente fazem com que estas tenham que reconfigurar suas práticas, sem a substituição de seus respectivos antecedentes (CUNHA, 2003, p. 21). A proposta aqui, então, não é fazer previsões sobre o futuro de ambas as tecnologias (livro versus livro digital), mas sim realizar um estudo do mercado editorial e apresentar teorias que são importantes no diálogo desse novo mercado que emerge. Traçando um histórico do livro desde o surgimento da escrita até o advento do livro digital, iniciamos este trabalho apresentando as séries de evoluções que culminaram no livro e, em seguida, no livro digital. A seguir, destrinchamos o funcionamento do mercado editorial, com foco no mercado brasileiro, a fim de entender como este funciona para poder, aí sim, apresentar tendências frente às novas técnicas que surgem. Baseando-nos principalmente nos trabalhos de EPSTEIN (2002), LINDOSO (2004), ANDERSON (2006), FLUSSER (2012) e CHARTIER (1998, 2002), buscamos apresentar as diversas dificuldades e problemas do mercado editorial, e

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também como as novas tecnologias podem ajudar a diminuir esse entrave. Quanto ao livro digital, o objetivo é explicá-lo melhor a fim de apresentar possíveis formas de utilização do mesmo, sua influência no mercado, suas funções, qualidades e problemas, sempre pensando no desenvolvimento do comércio livreiro em função das novas tecnologias que a ele se apresentam.

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2 HISTÓRICO

2.1 Escrita

Arrancou uma página do livro e a rasgou ao meio. Depois, um capítulo. Em pouco tempo, não restava nada senão tiras de palavras, derramadas feito lixo entre suas pernas e em toda a sua volta. As palavras. Por que tinham que existir? Sem elas, não haveria nada disso (ZUSAK, 2007, p.452-453).

O homem sempre buscou comunicar-se. Fato que pode ser notado desde a PréHistória, quando tiveram início as primeiras tentativas de se estabelecer algum tipo de registro dos acontecimentos por meio de pinturas feitas nas cavernas por nossos antepassados. Através da pintura rupestre, nome dado a esse tipo de representação, os homens primitivos trocavam mensagens e apontavam suas ideias. Mas, por mais que se caracterizasse como uma forma de comunicação, a pintura rupestre ainda não era considerada um tipo de escrita, pois faltava a ela representações gráficas organizadas e padronizadas, características básicas da escrita:

... o escrever consiste em uma transcodificação do pensamento, de uma tradução do código de superfície bidimensional das imagens para o claro e distinto código da escrita, das representações por imagens para os conceitos, das cenas para os processos, de contextos para os textos (FLUSSER, 2010, p.37).

Sendo assim, a escrita se caracterizará como escrita apenas no momento em que a comunicação deixar de se fazer através apenas de imagens e for transposta a um código organizado, linear e distinto, capaz de tornar transparentes essas representações imagéticas. Essa transformação se dá à medida que homem e sociedade evoluem. Novas formas de organização social, política e econômica obrigam o homem a avançar

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num aprimoramento da linguagem. A oralidade e as representações gráficas deixam de suprir as necessidades desse homem que evolui e é nessa época que a escrita dá seus primeiros passos. E esses primeiros passos ocorreram de três formas em diferentes localidades: com a escrita cuneiforme dos sumérios, com os hieróglifos maias e com os pictogramas chineses. Esse último é um dos mais antigos tipos de escrita, e é a única das línguas arcaicas ainda viva. A partir daí, entraram em cena os ideogramas, importantes até hoje para a matemática, física, informática; os silabários fenícios, e sua adaptação grega, a escrita alfabética. E foi da adaptação grega que surgiu a escrita que deu origem ao nosso alfabeto: o alfabeto greco-romano. Além de trazer um número menor de símbolos, permitindo uma variação maior de combinações, a variação romana instituiu a forma de escrita e leitura que utilizamos, hoje, em linhas e da esquerda para a direita. A escrita foi um marco importantíssimo no processo evolutivo humano. A partir dela tornou-se possível registrar a memória cultural, religiosa, artística, política e social de um povo. É ferramenta que permite e cria instrumentos para a reflexão e torna possível uma mais eficaz transmissão de informações, em contraste à oralidade. Segundo Flusser (2012, p.38), “esse avanço do escrever ao longo das linhas em direção aos fundamentos da memória e em direção ao mundo objetivo desprovido de representações por imagens é o que chamamos de história”.

2.2 Livro

A escrita foi, então, o ponto inicial do surgimento dos livros. Foi através da invenção da escrita que as tecnologias puderam avançar, conforme a disponibilidade diversa de materiais entre cada povo, até o desenvolvimento do livro. Os livros podiam ser feitos em lâminas ou placas separadas, quando escritos em materiais mais rígidos como osso, barro, madeira, metal, e bambu, ou feitos em dobras e rolos, quando eram utilizados materiais flexíveis como o couro, o papiro, entrecasca de árvores, e tecidos. As preocupações com o que hoje se trata como diagramação já podiam ser notadas nos papiros egípcios, uma vez que estes, já naquela época, por volta de

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2.500 a.C., escreviam em colunas e nelas inseriam ilustrações, trazendo informações visuais e maior riqueza aos seus textos. Os papiros não eram nada práticos no quesito leitura. Eram colados uns aos outros e guardados enrolados, com alguns chegando a medir 20 metros - não era tarefa fácil para quem procurasse alguma informação. A evolução seguinte se deu com o surgimento do pergaminho, mais resistente, fino e durável que o papiro. Não bastassem essas características, o pergaminho permitia, também, a escrita nas suas duas faces. Lavado ou lixado, permitia escrever diversas vezes. O pergaminho, além de uma evolução em relação ao papiro, possibilitou mais uma evolução: o desenvolvimento do codex. No codex, as folhas eram dobradas, no que poderia ser descrito como uma versão ancestral do livro contemporâneo. De forma mais sucinta e direta, Martins (1996, p. 68) traça essas mudanças de suporte informacional do registro da escrita, afirmando que:

o pergaminho foi escrito, como o papiro, de um lado só, até que se descobriu ser perfeitamente possível fazê-lo nas duas faces. Enquanto a escrita era realizada apenas no reto, o pergaminho era enrolado, como o papiro, para constituir o volumen. A escrita no reto e no verso vai dar nascimento ao codex, isto é, ao antepassado imediato do livro. Com ele revoluciona-se o aspecto da matéria escrita e o das bibliotecas (MARTINS, 1996, p.68).

Mas faltava ainda a tecnologia mais importante para o surgimento do livro contemporâneo: a prensa de tipos móveis de Johannes Gutenberg. Com a invenção dos caracteres móveis e da tipografia, foi possível reproduzir ampla e ilimitadamente os textos antes restritos à capacidade limitada de reprodução dos copistas. Com isso, passamos ao momento em que diferentes pessoas, em diversos pontos do mundo, passam a ter acesso às mesmas informações, transformando um livro num difusor de conhecimento de massa. Essa mudança trouxe uma transformação de larga escala, já que se começou a alterar a relação ignorância versus domínio, assim como a precariedade no acesso às informações, existente em escala mundial. Os nobres e religiosos deixaram, então, de obter o monopólio do saber, ficando a informação livre para atingir uma parcela infinitamente maior da população. Assim, na mesma proporção em que

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crescia o número de autores, aumentava também a quantidade de leitores, uma vez que esse novo suporte oferecia maior acessibilidade. (MILANESI, 2002). Segundo Lindoso (2004, p. 189):

O livro foi o primeiro objeto cultural globalizado. A invenção de Gutenberg foi fundamental para romper a estreiteza do mundo medieval, possibilitando que o conhecimento viajasse mais amplamente, com velocidade infinitamente superior à possível com as cópias manuais ou com a presença física do autor (LINDOSO, 2004, p.189).

A invenção de Gutenberg deu origem à imprensa, deu bases à economia do conhecimento e início à disseminação da aprendizagem em massa. E foi também o marco principal na criação do livro como o conhecemos hoje. A difusão e reprodução em grande escala começaram a partir deste ponto, em que o livro ganha seu status cultural e começa sua trajetória como objeto de conhecimento e desejo.

2.3 Livro digital

O livro digital, ou ebook, surgiu em 1971, com Michael Hart e o projeto Gutenberg, que tinha como objetivo digitalizar livros e oferecê-los gratuitamente, e nada mais é do que um livro disponível para leitura em aparelhos e mídias digitais. O livro digital surge, então, a partir do momento em que se forjou a possibilidade de transpor o conteúdo dos livros para serem lidos em aparelhos eletrônicos. Os primeiros livros eram lidos diretamente na tela do computador, armazenados em disquetes, CD’s, pendrives ou no próprio HD. Desde o passo inicial de Hart, muitos acontecimentos foram importantes para a popularização do ebook como o conhecemos hoje, como o surgimento da Amazon, em 1995. Mas foi em 2006 que a Sony lançou um aparelho que mudou nossos conceitos sobre livro eletrônico: o Sony Reader, que trouxe a inovadora tecnologia da tinta eletrônica, que permite a leitura de forma bastante similar à do livro. No ano seguinte, a Amazon lança o Kindle e, em 2010, a Apple lança o revolucionário iPad. A partir daí, as previsões a cerca do fim do livro começam a ganhar cada vez mais forma, já que a modernização dos equipamentos eletrônicos

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começa a alcançar níveis surpreendentes de inovação e usabilidade. Mas, por enquanto, apesar do crescimento das vendas de ebooks, principalmente nos Estados Unidos, a coexistência é pacífica, mostrando que ambos os suportes têm seus valores e funções e podem adaptar-se ao novo cenário:

O novo suporte do escrito não significa o fim do livro ou a morte do leitor. O contrário, talvez. Porém, ele impõe uma redistribuição dos papéis na “economia da escrita”, a concorrência (ou a complementaridade) entre diversos suportes dos discursos e uma nova relação, tanto física quanto intelectual e estética, com o mundo dos textos (CHARTIER, 2002, p.117).

Para muitos, o livro é o suporte perfeito, impossível de ser aprimorado, com características tão distintas que o colocam em um patamar inalcançável (ECO, 2012). Talvez seja, mas para o que ele propõe. O livro digital não deve ser entendido como um substituto para o livro, mas sim como uma nova plataforma de leitura, independente do livro. “A revolução do texto eletrônico é, de fato, ao mesmo tempo, uma revolução do suporte do escrito e uma revolução das práticas de leitura” (CHARTIER, 2002, p.113). A interatividade proposta pelos livros digitais já foi há muito tentada com os livros. Os livros pop-up 1 são uma tentativa de interatividade com o leitor. No que diz respeito aos livros infantis, o livro digital vem ao encontro do que se tem tentado produzir, com conteúdo multimídia e interativo, o que torna a leitura ainda mais interessante às crianças: Ao mesmo tempo, o livro eletrônico é, muitas vezes, citado como solução para estudantes, pois são estes que mais sofrem com problemas de peso excessivo, devido à grande quantidade de livros que precisam transportar (PONTUAL, 2009). Em contrapartida, haverá sempre a defesa da subjetividade e apelo à imaginação do livro:

A multimídia interativa deixa muito pouco espaço para a imaginação. Tal e qual um filme de Hollywood, a narrativa multimídia inclui representações tão específicas que deixa cada vez menos espaço para a fantasia. A palavra escrita, ao contrário, estimula a formação 1 Termo utilizado para livros que tenham ilustrações com efeitos móveis ou em 3D. É mais fácil de ser encontrado em livros infantis.

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de imagens e evoca metáforas cujo significado depende sobretudo da imaginação e das experiências do leitor. Quando lemos um romance, muito da cor, do som e do movimento provém de nós mesmos (NEGROPONTE, 1999, p.13).

O fato é que as duas tecnologias estão disponíveis e têm suas funções. Cada uma a seu modo, encontrarão suas funções, usuários, propósitos. Mas, em vista de tais mudanças, um questionamento fica cada vez mais evidente: como o mercado editorial assimilará essas mudanças?

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3 MERCADO EDITORIAL BRASILEIRO

O estudo do mercado editorial brasileiro deve ser feito através de um apontamento sobre a cadeia produtiva do livro. Através dos diversos processos necessários para levar o livro às mãos do consumidor, poderemos ter uma ideia, mais a frente, das possibilidades de alteração desse processo com a disseminação do livro eletrônico e suas possibilidades. O autor é também parte integrante da cadeia produtiva do livro, uma vez que é dele a criação inicial que terá valor acrescentado a fim de comercializar o texto produzido. Mas abordaremos, a seguir, apenas dos caminhos posteriores ao autor. Apesar de, com o surgimento do ebook, uma das principais mudanças poder se dar na relação autor versus editora, essa questão será tratada nos capítulos seguintes.

3.1 Edição

Segundo os resultados de uma pesquisa anual do Sindicato Nacional dos Editores de Livros – SNEL , e da Câmara Brasileira do Livro – CBL (SOUSA, 2012) sobre a produção e vendas do setor editorial brasileiro, foram comercializados no Brasil aproximadamente 469,5 milhões de livros em 2011, número que estabeleceu um novo recorde para o setor. Este número representa, também, um aumento de 7,2% em relação a 2010, quando foram comercializados cerca de 438 milhões de exemplares. Houve aumento também na quantidade de livros publicados. Entre lançamentos, reedições e reimpressões, foram 58.192 novos títulos. Destes, 20.405 títulos foram de lançamentos, número que supera em 9% a quantidade de lançamentos do ano anterior. Em relação ao número de exemplares produzidos, houve um crescimento bem menor. A produção foi de 492.579.094 em 2010, para 499.796.286 em 2011, um aumento de 1,47%. Diante de tais números, podemos ver que a diversidade da oferta ainda é a principal aposta dos editores. Ao mesmo tempo em que cai a tiragem média, aumenta o número de livros produzidos, aumentando a pluralidade da oferta.

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Ambos os fatores (a diminuição da tiragem média e o aumento da diversidade) vão ao encontro da tentativa de resolver alguns problemas graves do mercado editorial nacional: como as técnicas de produção sob demanda sempre foram mais custosas do que a impressão offset 2, era muito mais viável às editoras imprimirem em grande volume a fim de diminuir o valor da impressão, que cai drasticamente à medida que se imprime em números maiores. Mas essa impressão em grandes volumes gera alguns problemas, dentre eles, dois principais: primeiro, o Brasil ainda não é um país de leitores3 e, se não o é, não faz sentido imprimir em quantidades tão grandes; segundo, as altas tiragens só desfavorecem a diversidade, uma vez que é preciso dar vazão ao que já foi produzido para que novos produtos possam ocupar as prateleiras. Segundo Curtis Benjamin (Citado por LINDOSO, 2004, p. 64), “o problema da publicação de livros não se resolve com sua impressão, seja em que quantidade for, mas com a criação de um mercado”. Ou seja, não adianta imprimir milhares de exemplares se o mercado consumidor não é suficiente. De acordo com Cozer (2011), somente o Grupo Editorial Record conta com um estoque de mais de 2 milhões de livros encalhados, armazenados há mais de cinco anos num armazém próximo à sede da editora. Ainda segundo Cozer, “num momento em que o digital domina o debate sobre o futuro do livro, o presente é feito de encalhe de livros em papel”. O problema da superprodução e encalhe de livros é grave, principalmente num país onde se lê tão pouco. Nesse ponto, o livro digital poderá vir a ter papel importante, mas ainda não é tempo de apontar perspectivas. Produzir demais é problemático. Apesar de diminuir custos com a produção em grande volume, a superprodução atinge diretamente um dos problemas mais difíceis e importantes na cadeia do livro: a distribuição.

3.2 Distribuição

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A impressão offset é uma das formas mais utilizadas de impressão. Utilizada para imprimir em grandes e médias quantidades, é um processo rápido e de qualidade. É o processo mais utilizado ainda hoje. 3 Segundo a 3ª edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, publicada em 2011, o número de leitores é constituído de apenas 50% da população brasileira. Para a pesquisa, considera-se leitor aquele que leu, inteiro ou em partes, pelo menos 1 livro nos últimos 3 meses.

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A distribuição é, sem dúvida, o maior pesadelo na cadeia do livro para as editoras. Além das proporções continentais do Brasil, temos poucas livrarias e sua distribuição é centralizada. Das 3.481 livrarias brasileiras, 52% estão na região Sudeste. Se contarmos também com a região Sul, são 73% das livrarias do país. 4 A distribuição nada mais é do que a tarefa de distribuir os livros das editoras conforme as necessidades desta. Pode ser feita através de venda direta às livrarias e pontos de venda, de porta a porta, através de mala direta, em feiras, etc. Mas a maior parte do trabalho é feito através das distribuidoras. Segundo Cruz, (Citado por EARP; KORNIS, 2005, p. 46), “o distribuidor controla os estoques e as entregas, atuando como um agente comercial e de logística terceirizado, beneficiando-se de economias de escala que escapam ao alcance dos editores”. Até agora tratamos de superprodução e encalhe, características que se notam nas grandes editoras. Mas não são as editoras que enfrentam maior problema na distribuição. Uma análise de Earp; Kornis (2005, p. 46-47) é bastante válida para entender o porquê:

A dificuldade da distribuição pode ser avaliada por um dado da Livraria Saraiva: seu departamento de compras recebe mais de 1.500 propostas de aquisição de livros todos os meses – aproximadamente 70 por dia. Para não transformar as compras numa tarefa interminável e antieconômica, as redes preferem negociar com poucos parceiros – grandes editoras (com mais de 120 títulos em oferta), atacadistas e distribuidoras. O papel destas últimas é repor os estoques dos produtos vendidos, receber devoluções de livros em consignação que ficaram encalhados e oferecer livros novos que se enquadrem no perfil da livraria, tarefa que está acima da capacidade dos funcionários dos departamentos de compras das livrarias (EARP; KORNIS, 2005, p.46-47)

Aí está o dilema: enquanto o funcionamento é bom para as grandes editoras, ele é péssimo para as pequenas. As distribuidoras trabalham com editoras de retorno certo ou quase certo. Grandes editoras são chamarizes. Como já têm seus bestsellers e seus autores consagrados, têm credibilidade com o consumidor, que é tentado pela promessa de novos livros que a editora lança. Em contrapartida, as editoras pequenas têm que trabalhar com seus livros que, independente da qualidade, não levam credibilidade ao consumidor, uma vez que são pouco

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Segundo o “Levantamento do Setor Livreiro 2012” da Associação Nacional de Livrarias – ANL.

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conhecidas. Talvez fosse fácil vender um livro de certa editora pequena, apenas expondo-o em grande quantidade nas vitrines de alguma grande rede. Mas como os espaços são pequenos e escassos, as livrarias não podem se dar ao luxo de apostarem em livros sem uma chancela de reconhecimento. “Como consequência, as pequenas editoras enfrentam dificuldades cada vez maiores para a distribuição de seus títulos” (LINDOSO; 2004, p.129). Conforme dito no caso da Livraria Saraiva, são muitos livros para pouco espaço. Sendo assim, apostar em quem já tem mercado é a solução mais inteligente.

3.3 Venda

Se tirarmos da conta as compras governamentais de livros, que responde a cerca de 1/3 das vendas de livro no Brasil, temos cinco principais “pontos de venda” de livros no país: livrarias (44,9% das vendas), vendas porta a porta (9,07%), igrejas e templos (4,03%), supermercados (2,4%) e bancas de jornal (2,21%). 5 Apesar da retração nas vendas porta a porta no último ano, esse modelo se tornou um dos mais importantes canais de venda de livros no país. Graças à incorporação de um catálogo especial de best-sellers às famosas revistas da Avon, o modelo tem ganhado destaque no mercado editorial. Porém, assim como nas livrarias, o espaço é para poucos. É muito fácil julgar as livrarias como o grande monstro do mercado editorial. Afinal, além de serem as responsáveis pelo gargalo criado na distribuição dos livros, é ela também que fica com a maior fatia do bolo. Enquanto, na maior parte dos casos, autores ficam com 10% do valor de capa de um livro, a editora com 30%, tendo que arcar com os custos de edição e impressão e distribuidores com outros 10%, as livrarias embolsam 50% do preço de capa de um livro. Claro que essa distribuição pode variar, principalmente em se tratando de grandes editoras e grandes tiragens, mas funciona assim para a grande maioria das editoras. Apesar da grande fatia abocanhada, não é tão fácil quanto parece manter uma

5 Segundo a pesquisa “Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro” do SNEL e CBL, referentes ao ano de 2011.

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livraria. Os custos são altos e, por isso, é preciso que se tomem algumas decisões cruciais que irão influenciar diretamente no sucesso ou não de uma livraria. O primeiro problema é a localização, que precisa ser em um ponto de fácil acesso para o consumidor. Dentre os custos fixos, essa escolha pode se tornar uma das mais importantes. O nicho a se trabalhar é a segunda escolha, já que tão absurdo quanto trabalhar com apenas um título, é tentar fazê-lo com todos. Dessa escolha decorrerá o processo mais complicado e que tanta dor de cabeça dá às editoras: a seleção dos títulos que serão expostos nas prateleiras da livraria, que deverão corresponder à demanda esperada daquele grupo de consumidores. Escolhidos os títulos, resta definir a quantidade de exemplares desejada de cada título (EARP; KORNIS, 2005). Escolhas não muito fáceis são sempre auxiliadas pelas distribuidoras (que informam sobre lançamentos promissores), cadernos literários, jornais, exposição do livro na mídia. Nesse sentido, é muito mais provável que haja mais livros de grandes editoras do que de pequenas. Como trabalham em vendas em consignação, são poucos os livros que ficam muito tempo nas prateleiras das livrarias. Enquanto nas vitrines e balcões centrais ficam expostos os principais lançamentos, nas prateleiras separadas por gênero, ficam apenas os livros já antigos de maior saída. É impossível, para uma loja com espaço físico limitado, manter altos números de estocagem. Foi pensando nessa problemática do estoque, da falta de espaço, da quantidade cada vez maior de editoras produzindo livros que, por sua vez, encontram cada vez menos espaço nos canais de venda, e atento às novas tecnologias e possibilidades geradas por elas, que, em 1994, um norte-americano chamado Jeffrey Bezos, mais conhecido como Jeff Bezos, largou seu emprego em uma famosa empresa em Wall Street para fundar a empresa que representaria a maior revolução no mercado editorial nos últimos anos.

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4 AMAZON

4.1 Histórico

Hoje não se questiona mais a capacidade da internet de fazer dinheiro. Cada vez mais, e mais rápido, ela é capaz de criar novos milionários quase que da noite para o dia. Mas nem sempre foi assim. Em 1994, quando Jeff Bezos fundou a Amazon, a internet ainda era um caminho pouco estudado e compreendido. Bezos traz para o comércio online um modelo de negócios bastante antigo, iniciado em 1886, quando um homem chamado Richard Sears comprou um caixote de relógios enviado por engano a um comerciante local que não quis ficar com a mercadoria. Sears usou a ferrovia para vender seus relógios aos agentes ferroviários ao longo dela. Dez anos depois, a Sears, Roebuck & Co. 6 lançaria o “Wish Book”, catálogo semanal enviado por entrega postal com o tamanho parecido com o de um catálogo telefônico e com, aproximadamente, 200 mil itens e variações em oferta (ANDERSON, 2006). Foi como evolução desse modelo de vendas por catálogo que começou, no início da década de 1990, a ascensão do comércio eletrônico. O que se fez foi aproveitar um método já utilizado, testado e aprovado, ampliando suas funcionalidades e necessidades com o uso da tecnologia. Pela internet era agora possível processar pedidos com muito mais agilidade e organização, aumentar consideravelmente a base de produtos, e reduzir drasticamente os custos – já que não mais seria necessário imprimir e postar catálogos, os extensos e pesados catálogos. Incumbido de buscar novas oportunidades na internet pelo seu chefe, quando ainda trabalhava na empresa de fundos Hedge D. E. Shaw, em 1994, Bezos proferiu as seguintes palavras, mais de dez anos depois:

Fui à Direct Marketers Association e obtive a lista de tudo que era 6

A Sears, Roebuck and Co. ou Sears, é uma cadeia de americana de lojas de departamento, fundada no final do século 19 por Richard Warren Sears e Roebuck Alvah Curtis.

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vendido à distância. Roupas destacava-se como a principal categoria. Alimentos finos era a número dois. Bem abaixo, no final da lista, apareciam livros, e essa categoria estava lá apenas por causa de coisas como o Book of the Month Club, pois realmente não havia catálogos de papel, assim dizendo, que vendessem livros (Citado por ANDERSON, 2006, p. 45).

Com o crescimento do mercado editorial nos Estados unidos a partir da década de 1990, promoveu o desenvolvimento de cadeias de megastores, que ofereciam super- descontos e promoviam uma oferta imensamente superior às livrarias locais. Com isso, aumentou-se a disponibilidade de livros nas prateleiras, gerando uma abundância de escolhas para os compradores de livros. Com livros mais baratos e mais fartos, com a internet entrando no filão dos super-catálogos, e com a falta de catálogos voltados aos livros, Bezos não perdeu a oportunidade:

Ocorre que a seleção é fator muito importante da experiência de compra dos clientes na categoria livros. Também ocorre que não se pode ter um catálogo muito grande de livros no papel; é totalmente impraticável. A cada ano se publicam mais de cem mil livros, e mesmo uma superloja não pode manter todos esses livros em estoque. As maiores superlojas têm 175 mil títulos e só três são desse tamanho. E assim surgiu a ideia: que a Amazon.com seja o primeiro lugar onde se pode encontrar e comprar com facilidade um milhão de livros diferentes (Citado por ANDERSON; 2006, p. 46).

Não se vendia, ou pouco se vendia livros em catálogos. O espaço nestes não era suficiente, limitavam-se aos tempos de chegada do catálogo e envio do pedido, tudo indo e voltando por envios postais. E mesmo nas lojas físicas não se podia ter livros em demasia, e os estoques chegavam a, no máximo, 300 mil exemplares. A Amazon é uma loja 24 horas, com resposta de compra instantânea, e iniciou suas atividades com, nada mais, nada menos, do que 1 milhão de exemplares. Com um logotipo simples com o nome da empresa, possui uma seta que leva de A a Z, fazendo entender que, em suas prateleiras virtuais, encontram-se produtos de A a Z. A empresa e seu fundador previam alcançar, em 2000, o respeitável número de um bilhão de dólares em vendas, mas isso aconteceu bem antes. A empresa atingiu o faturamento de 1,6 bilhões de dólares já no ano de 1999, crescimento que superou em três vezes o do ano anterior. Hoje, a Amazon.com diversificou seus negócios, vende não só livros como CDs, DVDs, utensílios domésticos, produtos de beleza,

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eletrônicos, brinquedos e muito mais. Já são mais de 20 milhões de produtos, 50 milhões de clientes e um faturamento de US$ 14,83 bilhões.

4.2 Inovações

A Amazon não foi só uma das pioneiras no comércio eletrônico e uma revolução na venda de livros. Bezos é um gênio da matemática e foi capaz de compreender não só o comportamento dos consumidores, como conseguiu fazer os algoritmos jogarem a favor dele. No que diz respeito aos livros, criou um espaço para os usuários darem suas próprias opiniões e avaliações sobre os livros lidos e comprados, o que foi importantíssimo, trazendo os consumidores novamente ao site e tornando-os construtores do mesmo. Além do uso deste tipo de ferramenta social que, comprovadamente, favorece a venda, já que é sabido que a melhor maneira de se promover um livro é através do boca a boca, a quantidade de informações de um banco de dados digitalizado que se forma em uma loja virtual como a Amazon, permite a criação de algoritmos capazes de identificar preferências e indicar e sugerir produtos que possivelmente irão agradar seus clientes. Seja levando-se em conta o varejo tradicional ou os puramente virtuais, ter espaço ilimitado em suas prateleiras, fornecer informações em abundância sobre seus produtos (inclusive dos usuários) e fornecer ferramentas inteligentes de busca a fim de se encontrar o que se deseja com maior facilidade “– que em conjunto constituem a visão original de Bezos – se mostraram sob todos os aspectos tão atraentes quanto ele supôs” (ANDERSON; 2006, p. 47). Mas a Amazon não foi responsável apenas pelas inovações já tratadas acima no que diz respeito ao comércio eletrônico. Em 2007, a empresa lançou um aparelho eletrônico que, mais uma vez, revolucionaria o mercado editorial. Dessa vez trazendo mudanças não só no modo de se vender livros, mas sim na própria forma do livro.

4.3 Kindle

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Conforme já falado no item 1.3, o Kindle foi lançado em resposta ao lançamento do Sony Reader, o primeiro leitor eletrônico voltado exclusivamente à leitura de livros, e que trouxe a inovadora tecnologia da tinta eletrônica. Mas, além de ser um novo suporte à leitura e um “concorrente” para o livro, o Kindle potencializa as características que marcaram a Amazon como grande inovadora e brilhante varejista virtual. Quando a Amazon surgiu, sua principal característica, em comparação aos catálogos e livrarias físicas, era sua capacidade de trazer maior diversidade às prateleiras, com ofertas muito mais variadas do que seus concorrentes off-line. Mas, de qualquer forma, apesar de muitos acordos com fornecedores para envio de produtos diretamente dos estoques destes, a Amazon ainda tinha que lidar com o problema do estoque. Por mais que não fosse necessário estocar todos os seus produtos, é necessário estocar grande parte deles. É nesse sentido que o Kindle traz a grande revolução ao mercado editorial, o que já havia acontecido com a música e com o cinema: a digitalização. Com os ebooks, os estoques tornam-se zero, pois todos os arquivos são armazenados em bits e bytes em servidores online. A oferta pode, então, ser ampliada ao limite do infinito, uma vez que o armazenamento físico deixa de existir, criando a possibilidade de ofertas de livros em quantidades jamais pensadas pelos comerciantes tradicionais. Esse tipo de aposta da Amazon, pensando no macro, ao invés do micro, apostando numa gama maior de produtos e contando com a capacidade do cliente em escolher o que deseja, é uma característica nascida puramente das possibilidades advindas da internet e dos recentes avanços tecnológicos. E vira de cabeça para baixo a forma de se vender todos os tipos de mídia. Revirou a indústria da música, do cinema e, agora, pega pelo calcanhar a indústria editorial. Foi observando esse cenário que, a partir de 2004, Chris Anderson, editor chefe da revista Wired, começou a traduzir essas mudanças de forma a entender como a fragmentação dos mercados e as possibilidades de oferta infinita estavam revolucionando o mercado online.

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5 A CAUDA LONGA

5.1 Conceito

A teoria da Cauda Longa trata da escassez e da abundância. As economias do século XX sempre foram calcadas na produção de hits, uma vez que os espaços de venda têm suas limitações, apenas alguns poucos campeões de venda têm a oportunidade de estar em suas prateleiras. Nenhum comerciante podia dar-se ao luxo de manter em estoque produtos que não tivessem boa saída. Essa é a economia da escassez. Já o comércio eletrônico, que dispensa a necessidade de manter estoque e, com isso, multiplica ao infinito as possibilidades de venda, encontra nos nichos seu principal diferencial. Esse é o mundo da abundância, onde a quantidade reduzida, mas constante, de vendas de muitos produtos (nicho) gera uma receita no mesmo nível de poucos produtos que vendem muito (hits).

Figura Erro! Indicador não definido. - A Cauda Longa Fonte: (ANDERSON, 2006).

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5.2 A regra dos 98%

Anderson (2006) começou a desenvolver a Teoria da Cauda Longa a partir de uma conversa com o CEO 7 da Ecast 8 em janeiro de 2004, onde foi incitado a adivinhar a porcentagem de trilhas (como músicas individuais) que vendiam pelo menos uma unidade por trimestre dentre os 10 mil álbuns disponíveis no site. Seguindo seu conhecimento até ali sobre o comércio eletrônico, Anderson chutou um pouco acima do que seria o padrão apostar – seguindo a regra dos 80/20, em que 20% dos produtos são responsáveis por 80% das vendas (e 100% dos lucros) – e, mesmo parecendo apostar bastante alto, arriscou 50%:

À primeira vista, essa proporção é absurdamente alta. Metade dos 10 mil livros mais importantes de uma livraria típica não vendem um exemplar por trimestre. O mesmo se aplica aos 10 mil CDs mais vendidos do Wal-Mart. Na verdade, o Wal-Mart nem tem essa variedade de CDs. É difícil imaginar algum mercado em que uma porcentagem tão elevada de um grande estoque atinge esse volume de vendas. No entanto, minha ideia era a de que no mundo digital a coisa era diferente. Portanto, chutei um número muito alto.Não precisava dizer que eu estava muito longe da realidade. A resposta certa era 98 por cento (ANDERSON, 2006, p.7-8).

Impressionantes 98%. Ou seja, quase todas as trilhas dos 10 mil álbuns disponíveis na Ecast vendem pelo menos uma vez por trimestre. E quanto mais a Ecast adicionava músicas, aprofundando suas possibilidades em nichos e subculturas que jamais estariam disponíveis em lojas tradicionais, mais as vendas aumentavam. Segundo Vann-Adibé (citado por ANDERSON, 2006, p. 8), o mercado para músicas de nicho é tão grande que é praticamente sem fronteiras, e deu o nome à situação de “Regra dos 98%”:

Num mundo em que o custo da embalagem é praticamente zero, com acesso imediato a praticamente qualquer conteúdo nesse formato, os consumidores apresentam um comportamento 7

Chief Executive Officer, equivalente ao nacional "Diretor Executivo". A Ecast é uma extinta empresa virtual que fornecia música em banda larga numa espécie de jukebox digital. A empresa fechou as portas em março de 2012. 8

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consistente: olham para praticamente tudo (VANN-ADIBÉ, citado por ANDERSON; 2006, p. 8).

Anderson conseguiu visualizar a regra em ação em praticamente todas as suas outras análises posteriores sobre o comércio eletrônico, desde a Apple, Netflix, Rhapsody 9, eBay e, claro, a Amazon, cujo grande trunfo foi ter esta percepção bem antes de muita gente. A partir dessas análises, Anderson pode constatar que os gráficos de vendas dessas empresas eram bastante peculiares. Ele começou a classificar a curva de demanda a partir dos hits, descendo de acordo com o volume de vendas. Em certo ponto, esse gráfico sofria uma queda considerável, mas se estendia quase ao infinito, nunca chegando a zero. Segundo Anderson (2006, p. 10), “em estatística, curvas como essa são denominadas ‘distribuições de cauda longa’, pois seu prolongamento inferior é muito comprido em relação à cabeça”. Ciente da existência de gráfico estatístico e, concentrando-se nas possibilidades que essa cauda traz aos novos mercados, batizou o conceito como “A Cauda Longa”.

5.3 Características

Conforme visto no item 5.1, algumas características são essenciais para a formação da Cauda Longa, mas não se pode dizer que apenas essas características sejam responsáveis pelo sucesso de um comércio eletrônico. Oferecer novos produtos infinitamente não funciona se a demanda não acompanhar o crescimento. A Cauda Longa se forma à medida que os consumidores tenham acesso a escolhas infinitas, mas que também almejem por elas. E, para isso, os produtos precisam se tornar visíveis aos compradores, fazendo com que estes consigam navegar entre os nichos de forma a ampliar suas escolhas. Assim, ferramentas como as criadas pela Amazon como a de avaliações dos clientes, sugestões e compreensão do comportamento dos mesmos é peça chave também para o melhor aproveitamento da Cauda Longa. Da mesma forma, é também preciso que se formem os nichos. Os PCs, 9

A Rhapsody é o serviço de música digital em nuvem que permite que você ouça milhões de músicas

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softwares e a internet tornaram muito mais barato – e em muitas vezes de graça – a produção de mídias que até pouco tempo era terreno para poucos. Editar, diagramar e enviar um livro para impressão, hoje em dia, é tarefa que pode ser realizada completamente em um único PC, no quarto do autor. A democratização das ferramentas de produção tornou viável a qualquer pessoa com um PC e acesso à internet produzir, editar e distribuir conteúdo, o que potencializa a criação de nichos. Além disso, os preços dos produtos tendem a cair diante de tanta oferta disponível em mercados onde não há custos fixos pesados como os de distribuição e estocagem. A internet torna mais fácil encontrar pessoas, encontrar produtos, e aumenta, assim, a demanda de produtos na Cauda, ampliando a área sob a curva. Outra característica importante na economia da Cauda Longa é a criação de filtros eficazes, facilitando a busca, e empurrando os consumidores cauda abaixo. Google, propaganda boca a boca, blogs e resenhas de clientes são fatores importantíssimos na busca por conteúdo nos nichos, e estão cada vez mais em desenvolvimento e utilização. Quanto melhor trabalhadas e utilizadas tais ferramentas, mais a demanda corre em favor da cauda. A Amazon é mestre – e continua aperfeiçoando – em todas as características da Cauda Longa. Não à toa que é pioneira e dita tendências no que se refere ao comércio eletrônico. Foi responsável pelas maiores transformações recentes na indústria editorial, pois soube lidar com as mudanças e jogar a favor delas. É um dos maiores exemplos dos efeitos da Cauda Longa e de como aproveitar suas características, embora o mercado editorial ainda seja um comércio, essencialmente, baseado em letras impressas no papel. Claro que as mudanças provocadas pela venda online de títulos já foi um grande problema para as livrarias, mas não tanto quanto a perspectiva da transposição das letras impressas para as letras em e-ink10 dos leitores digitais.

diversas a partir diversos tipos de aparelhos eletrônicos. 10 E-ink é o nome que se deu à inovadora tecnologia da tinta eletrônica.

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6 NOVOS MERCADOS

6.1 Livros

Os novos mercados para o livro 11 já estão se desenhando, mas muita coisa pode ser feita utilizando-se as novas ferramentas. A Amazon já é uma agregadora de livros que se faz valer das características da Cauda Longa, o que é ainda pouco aproveitado no Brasil. O Submarino o tenta, mas com pouco talento. É uma tentativa de criar um espaço parecido com o que a Amazon construiu, mas que não corresponde e não põe em prática as características básicas para o sucesso nas vendas na cauda. Possui uma ferramenta de indicações básica, não abre suas “prateleiras digitais” – pelo menos no que diz respeito aos livros – a todas as editoras e tem péssimo sistema de recomendações, ferindo os três princípios básicos. Mas existe, no Brasil e no que se refere aos livros, um exemplo interessante: a Estante Virtual12, site que reúne os principais, senão quase todos os sebos do Brasil. A Estante seguiu à risca a cartilha da Cauda Longa. Trouxe para a internet um mercado de nicho desunido. Com a plataforma, não só tornou-se mais fácil para os usuários encontrarem livros usados e esgotados, como os sebos puderam catalogar seu estoque e pesquisar e equiparar preços de livros mais facilmente. O grande problema do comércio eletrônico de livros no Brasil é que ele utiliza as mesmas bases do mercado editorial tradicional. O que tende a baratear os preços os torna padrão, mesmo numa plataforma onde se tem custos reduzidos. As livrarias ainda são o melhor lugar para se comprar livros. Muitos compradores, aliás, pesquisam os livros na internet e vão à livraria comprá-los. As livrarias online ainda não são capazes de gerar fidelização e credibilidade a produtos da cauda. É como usar uma Ferrari para vender frutas. Um exemplo simples: a maioria das editoras pequenas quer ter seus livros na Livraria Saraiva 13. Se não na livraria física, ao

11

Lembrando que o livro de papel será tratado aqui apenas como “livro”. www.estantevirtual.com.br 13 A maior rede de livrarias do Brasil. Possui menos lojas que a Livraria Nobel, mas como esta é uma rede de franquias, não tem o mesmo perfil empresarial e força junto aos editores e leitores como a 12

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menos expostos na Saraiva online, mas uma coisa depende da outra: seus livros só vão para a Saraiva online se tiverem sidos comprados (consignação) por uma loja física. Vai pelo ralo a vantagem da cauda. Apenas uma livraria brasileira faz o dever de casa: a Livraria Cultura. Os canais de venda são bem divididos e qualquer editora pode ter seus livros expostos na livraria online. Dependendo das vendas no site, os livros vão parar nas prateleiras das lojas físicas. Vantagem para a livraria, que amplia seu catálogo e se torna maior do que as concorrentes, além de obter a mesma porcentagem das livrarias físicas sobre o preço de capa em vendas de livros que nem estão em seus estoques; e vantagem para a editora, que tem seus livros expostos no site de uma grande livraria.

6.2 Livro digital

Quanto ao livro digital, as vendas no Brasil ainda são muito tímidas, os leitores são caros e o formato ainda não caiu no gosto do brasileiro. Mas a Amazon vem provando que isso pode mudar. No Reino Unido, a empresa já vende um número superior de ebooks que livros impressos. Segundo release 14 divulgado em agosto de 2012, a Amazon britânica vende, para cada 100 livros impressos, 114 ebooks para Kindle - número que mostra a força que o formato vem tomando. Independente de gostos e predileções, o livro digital é tendência de ida da indústria de editoria rumo cauda abaixo. Assim como aconteceu com a música, o que se espera é uma facilitação da produção e edição, multiplicação de produtores de conteúdo e facilidade na distribuição desse conteúdo, ou seja, formação de Cauda Longa. A formação e o fortalecimento do mercado de ebooks é o grande pesadelo das editoras, mas que precisa ser encarado, sob o risco de se enfrentar a mesma bancarrota à qual chegaram muitas grandes empresas da indústria fonográfica ao ignorar a música em formato digital. É preciso ter conhecimento dos mercados e das novas ferramentas a fim de adaptar-se às novas condições. Saraiva. 14 “UK readers now buying more Kindle books than print books on Amazon.co.uk” em http://phx.corporate-ir.net/phoenix.zhtml?c=251199&p=irol-newsArticle&ID=1722449&highlight=

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7 PERSPECTIVAS

As mudanças e as possibilidades que o livro eletrônico trazem ao mercado editorial são promissoras. Alguns sites brasileiros já apostam numa plataforma de divulgação de livros (eletrônicos e impressos sob demanda) de autores independentes, mas os processos ainda caminham muito separadamente. Enquanto as livrarias brasileiras rejeitam colocar em suas “estantes virtuais” livros de editoras sem expressão, a Amazon coloca lado a lado John Grisham, autor best-seller mundial de romances jurídicos e o desconhecido – na época em que o autor publicou seu livro no site – Willian P. Young. O livro em questão, lançado de forma independente e hoje com direitos cedidos a diferentes editoras ao redor do mundo, já vendeu mais de 12 milhões de exemplares, e chama-se “A Cabana”.

7.1 Cadeia produtiva

Conforme já dito anteriormente, os PCs tornaram democráticas as ferramentas de produção, facilitaram a distribuição de mídia, em conjunto com a internet, e aproximaram a tríade autor, editora, leitor. Willian P. Young não é o único exemplo de autor independente de sucesso. Existe um exemplo ainda mais recente: o estrondoso sucesso “50 tons de cinza”, lançado da mesma forma também através da Amazon, que fornece a plataforma, os PCs, as ferramentas de produção, fazendo da internet o grande palco de atuação dessas forças. Através do boca a boca, da atuação de blogs literários, de ferramentas de indexação e busca através de palavras chave, sugestões e preferências, livros desconhecidos e pouco divulgados podem chegar ao patamar de best-sellers. Mas como a Cauda Longa não trata apenas de hits, boa notícia: há espaço para todos. E a tendência é o encurtamento do caminho. É claro que, quando se fala em livros impressos, sempre fará falta o apoio de uma editora quanto à distribuição e impressão do livro. Mas, em se tratando de livros eletrônicos, o processo fica muito mais simples. O autor tem hoje acesso a todas as ferramentas das quais um editor precisa para dar vida a um livro, e ainda conta com a internet como excelente canal de divulgação. Nada mais é um processo para poucos. É muito fácil, com as

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ferramentas atuais, diagramar e produzir um livro. Claro que uma boa revisão e edição fazem diferença, mas estas talvez não precisem mais ser feitas por uma editora convencional em um futuro breve. “Ademais, as inovações tecnológicas logo irão tornar redundantes muitas das funções editoriais tradicionais dos próprios conglomerados” (EPSTEIN, 2002, p. 27).

7.2 Vendas

Mais uma vez é preciso usar a Amazon como exemplo e lembrar que a venda de ebooks no Reino Unido já supera a venda de livros impressos. O livro eletrônico tem tudo para ser sucesso sim. Mesmo que haja rejeição pelos defensores do livro de papel. É uma mídia que explora a Cauda Longa, que abre caminho para novos nichos e possibilidades pouco exploradas. Quem poderia prever que um romance erótico com tons sadomasoquistas ultrapassaria em vendas o até então intocável e casto bruxinho Harry Potter. Provavelmente “50 tons de cinza” seria rejeitado (e certamente o foi) na maioria das editoras à qual fosse submetido. Hoje, influencia o lançamento de dezenas de livros na mesma linha editorial. Os autores se tornarão seus próprios produtores e as editoras precisarão entender como participar desse jogo. Estas ainda têm a vantagem de serem publicadoras de livros impressos e, em casos de sucesso como os vistos acima, poderem facilmente cooptar esses autores para debaixo de suas asas. Mas em um cenário em que os livros eletrônicos podem ser comprados diretamente de um aparelho eletrônico e, caso haja interesse, serem comprados também impressos sob demanda 15, utilizando-se as ferramentas que levam o leitor cauda abaixo de acordo com recomendações e preferências, as editoras perdem seu diferencial. Com a popularização dos livros eletrônicos, a tendência é que as tiragens diminuam cada vez mais, chegando ao ideal de serem feitas sob demanda. O que favorece ainda mais o dueto ebook/demanda, aumentando a oferta e a diversidade.

7.3 E-readers

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A Amazon já oferece esse serviço para alguns livros.

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É certo que os leitores eletrônicos atuais ainda estão longe de ser o hardware definitivo para leitura. Apesar de trazerem inovações importantes como a tinta eletrônica, são lentos, tem tela pequena, não reproduzem a experiência do livro tradicional e precisam de bateria. Mas muitos protótipos inovadores já se fazem presentes, com materiais mais leves e maleáveis: com duas páginas, reproduzindo a experiência do livro, e com uma usabilidade bastante superior aos atuais. Em se tratando de tecnologia, é estúpido pensar em um dispositivo ideal, já que a cada ano surgem novos elementos e possibilidades que mudam drasticamente o destino das coisas. Certamente também não deverá ser apenas um leitor eletrônico em predominância a outros. A concorrência entre as empresas de tecnologia é sempre muito acirrada, sem contar os problemas com a pirataria. Por isso é difícil imaginar um cenário onde apenas um dispositivo reine soberano sobre outros. Mesmo com a Amazon projetando ganhar todos os mercados a fim de “controlar” a venda de livros eletrônicos, a tendência é pouco provável.

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8 CONCLUSÃO

O livro digital já é uma realidade e tende a trazer modificações significativas para a indústria editorial. É época de valorização de autores – a fim de afastá-los da tentação da publicação independente –, de aposta nos mercados de nicho, de entendimento das novas tecnologias e, acima de tudo, de adaptação às novas possibilidades. É certo que novas regras surgirão, mas estas não anulam as antigas. A própria Cauda Longa é uma teoria que funciona magnificamente bem com artigos puramente digitais, como o livro eletrônico, mas também pode ser utilizada na venda de livros de papel. A questão é como as editoras reagirão frente às mudanças. É válido lembrar que a forma nem sempre é o mais importante. Como disse Epstein (2002, p. 11), “muito antes de os livros existirem como objetos físicos, os contadores de histórias transmitiam dados essenciais às sucessivas gerações em forma de narrativa (...)”. O livro é sim uma ferramenta que revolucionou a forma de se compartilhar conteúdo, mas não é a única. O livro eletrônico certamente também não o será. Apesar das qualidades e facilidades que este traz, a tendência é que haja um reajuste nas funções do livro e um encaixe no propósito do livro eletrônico. Certamente haverá redução das tiragens médias dos livros, indo de encontro às novas formas de impressão sob demanda, mas somente o futuro dirá quanto caberá às partes:

As tecnologias sucessivas da linguagem, da escrita e dos tipos móveis colocaram ferramentas cada vez mais poderosas nas mãos dos contadores de histórias, ferramentas cujos usos eram inimagináveis quando essas tecnologias foram criadas. Ficará a cargo dos nossos filhos e de seus filhos o aprendizado do significado das tecnologias que hoje despontam no horizonte. A produção de livros como eu conheci já está obsoleta, mas a definidora arte humana de contar histórias sobreviverá à evolução das culturas e de suas instituições como sempre o fez. As novas tecnologias modificam o mundo mas não apagam o passado nem alteram o genoma (EPSTEIN, 2002, p.13)

A nova configuração do mercado editorial não aniquila o livro de papel, apenas reorganiza seu espaço. Como disse Zilberman (2001, p. 117), as “mudanças

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determinam não apenas rupturas, mas também continuidades, desde que adaptações ocorram”. Sendo assim, a tendência é que, como ocorrido em todos os grandes avanços tecnológicos, que ambas as tecnologias sobrevivam. O livro eletrônico não impõe fim ao livro e, por consequência, este não deixa de representar seu papel. As novas tecnologias abrem sim um novo e amplo mercado para a indústria editorial, mas esta não precisará abrir mão dos produtos e meios usados hoje. Apenas precisará aprender a conciliar as duas práticas, aproveitando o que de melhor cada uma oferece. Assim como Epstein (2002, p. 24), “favoreço o Deus Jano, que olha para trás e para frente ao mesmo tempo. Sem um elo vivo com o passado, o presente é um caos, e o futuro, ilegível”.

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