O material didático atual para viola da gamba

July 21, 2017 | Autor: Liana Pereira | Categoria: Viola Da Gamba, Educação Musical, Música Antiga, Ensino Coletivo de Instrumentos Musicais
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Workshop-Konzert, Frasdorf - Deutschland Sonntag, 23.07.2015

O material didático atual para viola da gamba Uma pesquisa na área da pedagogia musical aplicada ao instrumento histórico na Alemanha Liana Pereira (Nürnberg/Leipzig)

- www.liana-pereira.de

Em comparação com instrumentos como violino, teclados, piano, violão, flauta doce, bateria entre outros, cuja literatura pedagógica mantém-se constantemente atualizada, a viola da gamba1

encontra-se

em

uma

situação

drasticamente

diferenciada.

Tendo em vista que a família das violas permaneceram por séculos como o alicerce da prática instrumental de cordas na Europa, poderíamos concluir que, atualmente, uma rica oferta na área de literatura, tanto de repertório, quanto pedagógica encontram-se disponíveis. Estudos realizados na Alemanha2 apontam, porém, que nos últimos dez anos apenas dois novos métodos voltados para o ensino da viola da gamba encontram-se editados, nenhum deles concebido para o público infanto-juvenil. Porém, a viola da gamba está intrinsecamente contextualizada no Sistema de ensino escolar alemão, pertencendo ao grupo de matérias (optativas ou obrigatórias) em colégios no setor de música instrumental. Nas escolas particulares e estaduais de música, o ensino da viola da gamba também é oferecido ao lado dos instrumentos de orquestra. O trato do material didático orienta-se, portanto, de forma heterogênea e muitas vezes ineficiente, já que cabe unicamente ao professor a organização completa desse material para que as aulas sejam ministradas.

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Do italiano: viola „viola“ e gamba „perna“ Pereira, Liana. Pesquisa realizada em: Versuch eines Lehrganges für Viola da Gamba – Ein neuer Weg des Lernens. Akademiker Verlag 2013 2

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A proposta do método “Mein erstes Viola da Gamba-Buch Band I”3 , concebido para alunos entre oito e dez anos de idade, sugere a possibilidade de um programa sistemático para o ensino do instrumento, orientado no processo de trabalho, proporcionando também um caminho para o aprendizado autônomo-cognitivo. A integração de elemtos da psicologia e metodologia do esporte, além dos elementos do Sistema Montessoriano de ensino visam à interação e emancipação do aluno de forma construtivista, resultando uma vivência musical completa e formando os domínios epistemológicos e metódicos do aluno de forma coligada. A elaboração de um novo método para viola da gamba para adolescentes e jovens adultos, sob a mesma autoria, está prevista para o segundo semestre de 2015.4

A renascença da viola da gamba na Alemanha no século 20. Christian Döbereiner5 e August Wenziger6 foram pioneiros no importante passo na reelaboração da música antiga e a prática musical historicamente informada na Alemanha. Döbereiner escreve seu método para viola da gamba ("Schule für die Viola da Gamba") em 1936, complementando seu mérito de pedagogo em diversos cursos, academias de formação musical e por fim, a docência no setor de música antiga na Hochschule für Musik und Theater em Munique, fundado por ele mesmo.

Fig.1."Deutsche Vereinigung für alte Musik", Munique, aprox. 1906.©frei

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Pereira, Liana. Mein erstes Viola da Gamba-Buch Band I. Akademiker Verlag 2013 Projeto relacionado a pesquisa de Doutorado na Hochschule für Musik und Theater Leipzig 5 Christian Döbereiner: violoncelista, violista da gamba alemão, 1874-1961 6 August Wenzinger: violoncelista, violista da gamba suíço, 1905-1996 4

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Contemporâneo de Döbereiner, Wenziger publica em 1935 e 1938 seus métodos para viola da gamba “Gambeübung” em dois livros e deixa a Alemanha em 1933, para seguir sua carreira de docente no recém-fundado centro de música antiga Schola Cantorum na Basiléia, Suíça.7 Contudo, sabemos atualmente que vários parâmetros abordados nessa época por pesquisadores como Döbereiner e Wenziger, no que diz respeito a pesquisas e o entendimento da técnica da viola da gamba, foram absorvidos de forma tendenciosa e equivocada. Exemplo disso são as afirmações que Döbereiner faz em seu discurso sobre o uso dos trastes e a fricção do arco no instrumento:

„(...)Die Fragestellung, ob mit Bünden oder ohne Bünde, ob mit Ober- oder Untergriffbogenhaltung zu spielen sei, ist keine künstlerische, als vielmehr eine solche der Zweckmäßigkeit. Äußerliche Hilfsmittel bestimmen niemals das Wesentliche des Gambenspiels. (...)“8 „A questão sobre (tocar) com ou sem trastes, com a fricção (do arco) superior ou inferior não é uma questão artística, mas uma utilidade. As ajudas externas não determinan jamais a maneira de tocar viola da gamba. (…)”

Paradoxalmente, a prática de concertos com endumentárias próprias do período barroco (Fig.1), numa tentativa de trazer o público para a forma “original” e diferenciada da música relativa contemporânea foi protagonizada por Döbereiner e seus conjuntos de câmera. O resultado musical não está diretamente coligado com tais agentes “teatrais” externos, mas muito mais com o ideal músico-estético do intérprete. A execução de instrumentos de época ficaram portanto por muitos anos pairando numa aura de amadorismo e, de certa maneira, criou-se uma sociedade paralela crescente de interessados passivos e ativos por esse “novo estilo” de interpretação musical.9

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Entre vários músicos que passaram por sua formação encontra-se o violista da gamba e maestro Jordi Savall Bayerisches Musik Lexikon Online (BMLO) de 03.05.2015, http://www.bmlo.lmu.de/d0265 9 Boer, Johannes. “From Output to Impact: the integration os artistic research results into musical training”, 2014 8

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Contudo, o movimento da música antiga na Alemanha emancipou-se de forma considerável a partir de 195010, atingindo um patamar profissional elevado e atualmente possui um espaço sólido nos programas de concertos na Alemanha em geral.

A literatura para viola da Gamba nos tempos atuais na Alemanha Tendo em vista a situação esboçada acima, conclui-se que o espectro técnico da viola da gamba ganhou uma nova dimensão desde o início do século 20 até o presente momento. Métodos para o instrumento como: “Viola da Gamba, Schule für Anfänger“ (Brigitte Gasser, 2008) e “Gambenschule“ (Lorenz Duftschmid, 2010) foram publicados na Alemanha. Esses métodos possuem claras semelhanças com métodos para instrumentos de cordas concebidos no século 19 até a metade do século 20.11 O caráter indutivo presente nessas obras limitam a dinâmica do aprendizado de forma que o elemento indutor está presente na transmissão da mensagem de tal maneira que, a partir de uma regra genérica, uma ou mais afirmações poder ser concluídas pela lógica de raciocínio. Problemático nessa forma metodológica é a exumação de casos isolados, limitando portanto o aprendizado músicoinstrumental. Exemplo de raciocínio indutivo: a semicolcheia

Essa figura de tempo é uma semicolcheia

Uma semicolcheia é uma figura de tempo rápida

Todas as semicolcheias são figuras de tempo rápidas

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Isso se aplica por exemplo à fundacão em 1956 do conjunto “Concertus Musicus Wien“ de Nikolaus Harnoncourt 11 Por exemplo: Otakar Sevcik (1852-1934), Bernhard Cossmann (1822-1910).

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Sabemos portanto, que existem inúmeras exceções para regras musicais. Abaixo, um exemplo onde a semicolcheia aparece num contexto dessemelhante ao raciocícino induzido no exemplo anterior das semicolcheias:

Fig.2.Johann Sebastian Bach, Gambesonate mit Cembalo BWV 1029.Takt 1-2, Adagio München: Urtext Henle Verlag.

Outro paradigma a ser considerado na elaboração atual da literatura pedagógica para a viola da gamba é a dificuldade de integrar as diversas mensuras 12dos instrumentos. Esse e outros critérios pedagógicos apresentam um claro deficit no que diz respeito ao trato da diversidade de registros de afinação das cordas peculiar à família das violas.13 A renovação da literatura educacional para a viola da gamba é portanto de extrema importância, de forma que esse instrumento seja apresentado para os alunos com uma linguagem sócio-cultural de fato moderna, apropriada para a idade do público alvo, com elementos atuais e também para desmistificar o conceito purista de que o repertório para viola da gamba está restrito apenas ao período da música renascentista e barroca.

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Do Latim: “medida”. Família das violas: viola soprano, viola alto, viola tenor, viola baixo, violone.

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