O MEIO FÍSICO E A URBANIZAÇÃO DE JACAREÍ -SP: UMA PROPOSTA DE CLASSIFICAÇÃO DOS AMBIENTES

June 7, 2017 | Autor: Antonio Oviedo | Categoria: Geotechnical Engineering, Land-use planning
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O MEIO FÍSICO E A URBANIZAÇÃO DE JACAREÍ - SP: UMA PROPOSTA DE CLASSIFICAÇÃO DOS AMBIENTES ANTONIO FRANCISCO PERRONE OVIEDO Departamento de Arquitetura e Urbanismo Universidade de Taubaté RESUMO A urbanização desordenada e irregular (clandestina), onde interagem sinergicamente ambientes mais problemáticos e as formas mais impactantes de uso urbano-industrial, tem gerado uma série de situações críticas, palco privilegiado de políticas pouco eficazes e diretrizes de planejamento restritivas. Os conceitos aqui emitidos calcam-se, em primeiro plano, no conhecimento do território municipal de Jacareí e, em especial, em seus aspectos do meio físico. A abordagem sistêmica dos processos de urbanização de um lado e, de outro lado, a variada natureza dos ambientes em ocupação, com potencialidades e fragilidades, fazem com que os pontos aqui destacados também estejam presentes, com diferentes intensidades e priorizações, em outras cidades do Vale do Paraíba marcadas pelo crescimento urbano-industrial. À luz da experiência acumulada no campo da cartografia geotécnica, expõe-se uma abordagem da dinâmica da urbanização (formal e informal), voltada para novas políticas que contemplem os interesses e expectativas dos protagonistas, dentro das potencialidades e fragilidades dos diferentes tipos de ambientes envolvidos, de modo que sejam absorvidas também como vantajosas, através de estímulo e de diretrizes exeqüíveis para o uso socialmente responsável dos ambientes urbanos. PALAVRAS-CHAVE: análise ambiental, carta geotécnica, urbanização, fragilidade dos ambientes, unidades homogêneas.

ABSTRACT The irregular (illegal) and disordered urbanization, where interact sinergicaly problematics environments and the more impactants configurations of the urban-industrial use, have been generated a serie of critical situations, a privileged stage of policies few efficient and restrictive planning forms. The concepts proposed here are based, in the foreground, on the knowledge of the municipal territory of Jacarei city and, in special its physical environment aspects. The sistemic approach of the urban processes on one side and, on the other, the diverse nature of the environments in ocupation, with potentialities and fragilities, makes this points also present, in differents intensities and priorities, in others cities at the Vale do Paraiba marked with urban-industrial growth. Under the light of accumulated experience on the ground of geotechnical cartography, is exposed an approach of the dinamic of urbanization (formal and informal), turned over to new policies which account the benefits and expectations of the protagonists, inside the potentialities and fragilities of the different types of involved environments, so that, it can also be absorbed as profitable, through of stimulus and executable directions for the responsible use of urban environments.

KEY-WORDS: environmental analysis, geotechnical map, urbanization, environmental fragility, homogen units. INTRODUÇÃO O Município de Jacareí está localizado na região do Vale do Paraíba do Sul e representa uma “Fronteira Interna” da Macrometrópole Paulista, em pleno eixo RioSão Paulo, sendo, estrategicamente, um entroncamento viário de grande importância. Além de estender seu território ao longo da Via Dutra, abriga ligação com a região de Campinas, através da rodovia D. Pedro I. Este entroncamento cresce em importância com a Rodovia Carvalho Pinto, que reforça a ligação entre a região metropolitana de São Paulo, o pólo industrial de São José dos Campos e o Porto de São Sebastião. A região apresenta franco processo de metropolização e já possui um importante parque industrial em acelerada expansão. O início do processo de urbanização de Jacareí privilegiou os terrenos mais favoráveis à ocupação, ou

seja, nos terraços de declividade suave alçados alguns metros acima das várzeas do rio Paraíba do Sul, protegidos das inundações periódicas e dos fenômenos erosivos. Porém, a cidade se expandiu de forma rápida e desordenada, afastando-se das margens do Rio Paraíba do Sul, ocupando as encostas mais íngremes, bem como invadindo áreas verdes e institucionais. Embora o município possua bons mananciais de superfície e subterrâneos, o aproveitamento pouco criterioso desses recursos vem comprometendo a qualidade e disponibilidade das águas. Os trabalhos aqui sintetizados tiveram como objetivo criar uma base de dados cartográficos das condicionantes do meio físico para o planejamento ambiental no município de Jacareí, subsidiando um conjunto de atividades que permita a adoção de

estratégias de apropriação do espaço e de seus recursos, de tal modo que o equilíbrio ambiental seja mantido. Resultante da interação e das conexões existentes nesse conjunto, esta base de dados é composta pelas cartas geotécnica e hidrológica, associadas a relatórios e tabelas que apresentam unidades homogêneas, com características, comportamentos, problemas e recomendações distintos (DAEE, 1992). De posse desse instrumento, o município adquire suporte para o planejamento, através de mecanismos técnicos e legais, de forma a tratar os problemas provenientes da ocupação do solo e aproveitamento dos recursos naturais de maneira sustentável. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA A urbanização no município de Jacareí tem revelado alguns problemas de considerável gravidade, originados do mau uso e da ocupação do solo. Tal situação se agrava de modo crescente, à medida que se aceleram os processos de urbanização. Observa-se que o início do processo de urbanização de um sítio se dá no local mais adequado, tanto geograficamente quanto geotecnicamente, e que a dinâmica da expansão é que passa a desencadear uma série de problemas, à medida que o perímetro urbano começa a interagir em áreas limitantes para a urbanização. Observa-se ainda o fato de que esta expansão se dá mais sob a influência de razões do mercado do que pelas reais potencialidades das áreas a serem ocupadas. Isso acaba determinando o parcelamento de regiões e locais extremamente problemáticos, por exemplo, as áreas de relevos mais íngremes e as áreas de várzeas sujeitas a inundação (Prandini et al., 1993). As dificuldades impostas pelas características do meio físico são normalmente ignoradas ou tratadas de modo ineficaz, ou, na melhor das hipóteses, com obras de alto custo, e, nesses casos, ainda assim, de desempenho duvidoso. Essas dificuldades surgem logo na implantação do loteamento, ou mesmo de assentamentos espontâneos, e se prolongam durante todo o processo de ocupação urbana (ABGE, 1982). Tais problemas se mostram, por exemplo, nos fenômenos de erosão e escorregamentos, que ultrapassam a própria área do loteamento, através do assoreamento de corpos d’água. Continuam se revelando nas dificuldades de se implantar e manter em funcionamento as vias de acesso e circulação e serviços de abastecimento de água e coleta de esgoto, chegando mesmo a impedir a implantação de residências, pelas graves condições de fundação, inundações periódicas, ou mesmo risco de estabilidade, por escorregamentos e erosões. Outros problemas da urbanização se ligam direta ou indiretamente à natureza geológica dos terrenos. Entre eles destacam-se, como exemplos, os problemas da água subterrânea, tanto em termos quantitativos como

qualitativos, quanto de sua possível contaminação. Da mesma forma, o saneamento pode ser exemplificado através dos casos de opção por fossas sépticas ou de infiltração, ambas impedidas em seu uso nas encostas íngremes, por desencadearem escorregamentos (ABGE, 1982). São problemas que atingem loteamentos de qualquer categoria, tanto os de classe A, quanto os populares, os empreendimentos mais conceituados ou os loteamentos clandestinos e invasões. Além do desconforto e risco de vida da população diretamente afetada, impõe-se pesado ônus ao Poder Público Municipal e, em conseqüência, à sociedade, devido aos altos custos para dotação e manutenção de infra-estrutura urbana, passando, desta maneira, a subsidiar a expansão urbana (Prandini et al., 1993). Estes problemas são agravados quando estão associados ao crescimento extremamente rápido, carente de um planejamento mais interdisciplinar e compatível com os próprios recursos. A interação de informações pode determinar potencialidades e fragilidades do meio ambiente, frente aos possíveis usos. Integradas a outras áreas do conhecimento, as condicionantes do meio físico se mostram indispensáveis, tanto na previsão da suscetibilidade à degradação do meio físico quanto na concepção dos meios de prevenção e correção das degradações ambientais (Gouveia et al., 1992). MATERIAL E MÉTODO Os estudos integrados de um território pressupõem o entendimento da dinâmica de funcionamento do ambiente natural com ou sem as intervenções antrópicas. O planejamento dos usos compatíveis não pode ser formado a partir de uma leitura estática do ambiente, mas inserida no entendimento dos processos de urbanização na escala espaço-temporal. O conhecimento das potencialidades dos ambientes passa pelos levantamentos dos solos, relevo, rochas, águas, clima, fauna e flora, enfim, de todos os componentes que dão suporte à urbanização. Para a análise da fragilidade, entretanto, exige-se que esses conhecimentos setorizados sejam avaliados de forma integrada, calcada sempre no princípio de que os ambientes apresentam funcionalidade intrínseca entre seus componentes (Prandini e Nakazawa, 1993). A análise da fragilidade dos ambientes em Jacareí foi determinada com base em duas cartas sínteses, a Carta Geotécnica e a Carta Hidrológica (DAEE, 1992). A elaboração da Carta Geotécnica de Jacareí baseou-se na integração de dados do meio físico relativos ao relevo, geologia, pedologia, recursos hídricos e uso do solo, visando à criação de unidades homogêneas do ponto de vista físico, identificando seus problemas e limitações, estabelecendo recomendações e diretrizes quanto ao uso do solo. Os diferentes planos de informação referentes ao meio físico foram analisados

utilizando técnicas de geoprocessamento, através da digitalização das cartas e cruzamento dos planos no sistema Microstation, Versão 4.0 – Intergraph, resolvendo o problema das diferentes escalas de mapeamento. A compartimentação dos padrões de relevo foi efetuada por meio da interpretação visual das principais feições morfológicas do município. Procurou-se individualizar os setores de relevo mais favoráveis à ocupação (topos, platôs e encostas suavizadas) daqueles potencialmente problemáticos (encostas íngremes, cabeceiras de drenagem e planícies aluviais). Inicialmente, os padrões de relevo foram delimitados utilizando-se a carta topográfica 1:25.000 do município, elaborada pela Terrafoto, e imagem do satélite LANDSAT - TM, banda 4 na escala 1:100.000; referendados por levantamentos amostrais, em fotografias aéreas P&B escala 1:5.000 e campo, de dados de declividade e amplitude. É importante lembrar que a condicionante relevo isoladamente não indica o uso mais adequado. Deve-se considerar o material constituinte do terreno. A compartimentação dos tipos de rochas baseouse no mapa geológico elaborado pelo Instituto de Pesquisa Tecnológica – IPT, escala 1:100.000, no ano de 1977, e agrupa rochas (e seus solos de alteração) com características geotécnicas semelhantes. Quanto aos dados pedológicos, utilizou-se o mapa exploratório de solos, folha SF.23/24 - Rio de Janeiro/Vitória, do Projeto RADAM BRASIL, e mapa de declividade, escala 1:25.000, elaborado pela Prefeitura Municipal de Jacareí. Ambos os levantamentos tiveram apoio de trabalhos de campo. Elaborou-se também um mapa de uso do solo após interpretação visual de imagem do satélite LANDSAT - TM, bandas 2-3-4, escala 1:50.000. O mapeamento foi conferido por meio de fotointerpretação (fotografias aéreas em escala 1:5.000) e levantamentos de campo. Foram mapeados a mancha urbana, chácaras, loteamentos, nucleos rurais, áreas de mineração, áreas agrícolas, reflorestamento, vegetação arbórea, pastagem/campo antrópico, vegetação arbustiva e herbácea. A elaboração da Carta Hidrológica baseou-se no mapeamento e atualização dos dados referentes à rede de drenagem, dados hidrológicos (vazão, seção de canais, precipitação), bacias hidrográficas, pontos de captação e lançamento, e cadastro de poços subterrâneos. Os dados foram levantados em carta topográfica em escala 1:25.000, cadastros existentes e levantamentos de campo. Foi adotada a base cartográfica na escala 1:25.000 para a impressão das cartas pelo fato de o nível de detalhe ser adequado para o planejamento municipal e devido à disponibilidade de uma base cartográfica confiável do município, elaborada pela Terrafoto (Terrafoto, 1986).

RESULTADOS E CONSIDERAÇÕES FINAIS A partir da integração dos dados do meio físico relativos ao relevo, rochas, solos, recursos hídricos e dados do uso do solo, foram definidas as unidades ambientais homogêneas. As unidades foram descritas e analisadas quanto à sua geomorfologia, geologia, pedologia e hidrologia; aos problemas decorrentes dessas características naturais; ao uso e ocupação do solo. A abordagem sistêmica para o enfrentamento dos problemas ambientais decorrentes dos processos naturais e antrópicos permitiu a determinação binária dos ambientes, ou seja, tanto as potencialidades quanto as fragilidades ao uso e ocupação dos ambientes. Para cada unidade foram feitas recomendações para sua utilização, evitando-se, sempre que possível, as de caráter meramente proibitivo. Podem ser citadas aqui as orientações quanto a: tamanho de lote e operações de terraplenagem; traçado viário, tipo de calçamento; implantação das obras de drenagem, disposição das águas servidas; disposição de resíduos sólidos; e práticas agrícolas e conservacionistas. Para as atividades de exploração mineral (destacando-se a extração de areia), recomenda-se a análise criteriosa da atividade, principalmente sob os seguintes aspectos: sistema viário, impacto ambiental, conflito urbano, reserva potencial e processo produtivo. A avaliação do manancial subterrâneo se deu pela análise de 150 poços, estabelecendo diretrizes quanto ao monitoramento do recurso subterrâneo, zoneamento do potencial de abastecimento e planejamento do uso. A elaboração das Cartas Geotécnica e Hidrológica partiu do interesse da administração local em ordenar a ocupação de duas bacias hidrográficas sob constante pressão para o parcelamento do solo para fins urbanos, industriais e de recreio, bem como a acelerada degradação do recurso água. Esta base de dados informa onde há maior ou menor possibilidade de cada fenômeno ocorrer (erosão, escorregamento, inundações, poluição de mananciais, etc.), em decorrência do uso e ocupação dos ambientes. Apresenta, também dados sobre o comportamento do meio físico frente aos possíveis usos e aponta locais onde a ocupação é problemática. As unidades homogêneas refletem ainda as principais características para a ocupação e os problemas existentes e/ou esperados, identificados a partir da análise dos dados gerados e de observações de campo (em áreas já parceladas ou ocupadas com atividades urbanas e/ou rurais). Com base nas características do meio físico, do uso do solo e dos problemas geotécnicos, tornou-se possível traçar recomendações para a concepção de projetos de parcelamento do solo, recuperação de áreas degradadas, uso adequado dos recursos hídricos e práticas conservacionistas. Sobre a Carta Geotécnica e Hidrológica ainda foram lançados dados sobre a mancha urbana, áreas

institucionais, unidades de conservação, sistemas rodoviário e ferroviário, principais corpos d’água, linhas de alta tensão, gasodutos e a espacialização da lei municipal 2.874/90, que dispõe sobre o uso e ocupação do território do município de Jacareí, fortalecendo a carta como instrumento para o planejamento. A lei 2.874/90 estabelece o zoneamento do município com base na classificação das vias em cinco níveis. Desta forma, com a adoção das recomendações da Carta Geotécnica e Hidrológica, a concepção e soluções tecnológicas adotadas nos projetos que interagem com o meio físico devem ser orientadas de acordo com os diferentes compartimentos geotécnicos que ocorrem ao longo das vias, no caso de vias que cruzam por mais de uma unidade homogênea. É fundamental que as condicionantes do meio físico, integradas às demais condicionantes de ordem institucional, política, socioeconômica e de infraestrutura sejam incorporadas aos futuros códigos de obras, legislações e planos diretores, de modo a prever e prevenir problemas advindos da ocupação do solo, como escorregamentos, erosão, enchentes, assoreamentos, poluição de corpos d’água, etc., evitando-se, dessa maneira, a proliferação de áreas degradadas num município.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABGE - Associação Brasileira de Geologia de Engenharia. A exigência e a importância de laudos geológicos na implantação de novos loteamentos. In: XXVI Congresso dos Municípios do Estado de São Paulo, Anais.São Paulo, 1982. DAEE - Departamento de Águas e Energia Elétrica. Carta Geotécnica e Hidrológica de Jacareí. São Paulo, jun. 1992. GOUVEIA, M. I. F., OVIEDO, A. F. P., PRANDINI, F. L. A carta geotécnica no plano diretor de Jacareí SP. Encontro Internacional sobre Problemas Ambientais dos Grandes Centros Urbanos, Rio de Janeiro, 1992. PRANDINI, F. L., NAKAZAWA, V. A., FREITAS, C. G. L., et al. As cidades e o meio físico. Encontro Nacional de Geólogos da Administração Pública, Guarulhos, São Paulo, 1993. PRANDINI, F. L., NAKAZAWA, V. A. Parcelamento de solos urbanos: algumas lições em áreas com restrições de uso. I Fórum Nacional sobre Geologia de Meios Urbanos, Porto Alegre, RS. 1993. RADAMBRASIL. Mapa exploratório de solos. Folha SF.23/24 - Rio de Janeiro/Vitória. Rio de Janeiro, RJ, RADAMBRASIL. 1983. TERRAFOTO. Carta planialtimétrica do município de Jacareí – escala 1:25.000. São Paulo. 1986.

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