O método da investigação científica na Geologia: uma abordagem através do exemplo heurístico da caixa-preta

May 27, 2017 | Autor: Rualdo Menegat | Categoria: Research Methodology, History of Science, History of Geology, epistemology of geology
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Revista Brasileira de Geociências

24(3):177-188, setembro de 1994

O MÉTODO DA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA NA GEOLOGIA: UMA ABORDAGEM ATRAVÉS DO EXEMPLO HEURÍSTICO DA CAIXA-PRETA RUALDO MENEGAT* & LUÍS ALBERTO D'AVILA FERNANDES**

ABSTRACT THE METHODOLOGY OF SCIENTIFIC INVESTIGATION IN GEOLOGY: AN APPROACH THROUGH THE BLACK-BOX HEURISTIC EXAMPLE. The epistemological fragmentation of geology verified during this century as well as the more recent unity given by the epistemological mutation triggered by Plate Tectonics is discussed in this paper. This mutation could also be detected in terms of the methodology of science adopted: from a period characterized by the use of inductivist methods to another with predominance of deductivist methods. Changes between these methodological theories are illustrated with an heuristic example named Black-Box, which makes evident usual procedures of scientific research, shows the main characteristics of the New Epistemology and also demonstrate how the baconian science concepts in Geology can be refuted. Following concepts of the New Epistemology, it was possible to outline the main characteristics of a scientific problem in Geology in terms of the concept of Scientific Research Programmes, giving intersubjective criteria to develop critical thinking in Science. Keywords: Epistemology of Geology; Scientific Methodology; Theory of Geology RESUMO A fragmentação epistemológica da Geologia verificada no presente século, bem como a recente unidade resultante da mutação epistemológica proporcionada pelo paradigma da Tectônica de Placas são discutidas na presente contribuição. Tal mutação foi igualmente acompanhada em termos da metodologia científica adotada na pesquisa, onde se verificou uma transição entre um período caracterizado pelo uso de métodos indutivistas para outro, no qual predominam os dedutivistas. Essas diferentes tipologias metodológicas foram ilustradas através de um exemplo heurístico denominado de Caixa-Preta, o qual revela os procedimentos usuais da pesquisa científica, mostra as principais características da Nova Epistemologia e, também, refuta os conceitos clássicos da ciência baconiana na Geologia. Utilizando-se os pressupostos da Nova Epistemologia, foi possível delinear as características de um problema científico na Geologia em termos do conceito de Programas de Pesquisa Científica, proporcionando, assim, que critérios intersubjetivos para uma praxiologia científica crítica sejam reconhecidos. Palavras-chaves: Epistemologia da Geologia; Metodologia científica; Teoria da Geologia

The eye sleeps until the mind wakes it with a question Provérbio Árabe (apud Dott & Batten 1988, p. 97) INTRODUÇÃO O progresso científico verificado no início deste século implicou uma revolução não só dos consagrados paradigmas1 de Descartes e Newton (Rorty 1988), mas também das próprias concepções metodológicas e conceituais do que foi convencionado denominar de Ciência por todo um longo período. O Prêmio Nobel de Química, Ylia Prigogine, junto com sua colaboradora, Isabelle Stengers, assim discorreram sobre o encanto proporcionado pela Ciência Newtoniana desde o seu surgimento e do completo esgotamento a que já chegou: Dissemos que a nossa tese é a de que a ciência clássica atingiu hoje os seus próprios limites. [...] um dos aspectos dessa transformação teórica é o da descoberta dos limites dos conceitos clássicos que implicavam, para os que acreditavam na sua validade universal, a possibilidade de um conhecimento completo do mundo. Pois se os seres oniscientes, demônio de Laplace, de Maxwell, deus de Einstein, abundam ainda hoje nos textos científicos, não há nisso arcaísmo, mas simples ingenuidade ou 'filosofia espontânea do sábio'. (Prigogine & Stengers 1991, p. 40) 1

As ciências tradicionalmente marcadas pela observação naturalista, como a Geologia (Allègre 1988; Gould 1991), ficaram, durante as primeiras seis décadas do século XX, num evidente descompasso em relação a esse progresso (Lê Grand 1988), a ponto de serem vistas como que à margem ou, pior, infensas ao que se verificava no âmbito mais geral das mudanças epistemológicas da Ciência. Foi somente a partir da década de 70 que ocorreram progressos substantivos na formulação das teorias explicativas da dinâmica da Terra, vindo a alterar completamente os paradigmas clássicos da Geologia e de suas diversas áreas. Esse progresso deu-se no sentido de uma visão sistêmica e integrada das diferentes escalas e processos espaço-temporais. O descritivismo naturalista clássico foi substituído pela abordagem dinâmica dos processos geológicos. A história natural da Terra ao invés de ser uma mera narrativa de cenários desconcatenados, passou a ser explicada em termos de uma evolução crono-geodinâmica. Na Estratigrafia, por exemplo, encontra-se principalmente em Van Wagoner et al. (1991), Wilgus (1988) e Vail (1987) uma abordagem de novo tipo, chamada de Estratigrafia de Seqüências, suplantando o descritivismo da lito-

O termo paradigma é polissêmico, pois "[...] é utilizado em pelo menos vinte e duas maneiras diferentes" (Kuhn 1989, p. 226). Khun (1989) reconheceu que se tornou no "ponto mais obscuro e mais importante" de seu texto original. Dessa forma, esse vocábulo é utilizado neste artigo no seu sentido sociológico e fraco, definido como "a constelação dos compromissos de grupo" (Kuhn 1989, p. 225) ou, ainda, "um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma" (Kuhn 1989, p. 219). O sentido forte que Kuhn (1989) pretende dar ao termo paradigma como sendo "exemplos compartilhados" (Kuhn 1989, p. 232) é mais claro e precisado pelo conceito de programas de pesquisa de Lakatos (1979), o qual preferimos (cf. Menegat 1992), pois "[...] ao passo que de acordo com Popper, a ciência é 'revolução permanente' e a crítica é o cerne do empreendimento científico, de acordo com Kuhn a revolução é excepcional e, na verdade, extra-científica, e a crítica, em épocas 'normais', é maldição." (Lakatos 1979, p. 111)

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estratigrafia (Layer Cake Stratigraphy). Na Geologia Metamórfica, os trabalhos pioneiros de England e colaboradores (England & Richardson 1977, England & Thompson 1984), desenvolvidos posteriormente por diversos autores como Rumble (1987) e Spear & Peacock (1989), possibilitaram um "renascimento" no estudo das rochas metamórfícas na década de 80. Esses autores substituíram a clássica descrição das condições de P-T, obtida através do reconhecimento de isógradas, por outro entendimento: o do significado tectônico das variações de temperatura durante a evolução das rochas metamórfícas, possível de ser estabelecido através do exame das trajetórias de P-T-t-d (pressão, temperatura, tempo e deformação), feito de acordo com uma visão dinâmica (s.l.) dos processos geológicos.2 Essas mudanças não foram apenas substantivas, isto é, relativas aos novos conceitos dos registros e processos geológicos proporcionados pela Tectônica de Placas ou pela Estratigrafia de Seqüências. Tais transformações, algumas delas anunciadas como "revoluções", têm implicado, também, uma importante substituição dos antigos padrões teóricos e metodológicos da pesquisa científica na Geologia, os quais deixaram de ser, para utilizar uma feliz e precisa expressão de Lakatos (1979), uma "remendada tecitura de ensaio-e-erro" - equivalente ao "método das múltiplas hipóteses" de Chamberlin (1897) -, típica de uma "ciência imatura", para constituírem-se num programa de pesquisa científica, mais afeito a uma "ciência madura". Pode-se entender essas mudanças, então, não apenas como o progresso particular resultante do "esforço de cada área" da Geologia, mas também como mudanças metodológicas de fundo, situadas dentro de um contexto epistemológico mais geral das Ciências. A partir disso, uma nova chave de elucidação do significado e abrangência dessas transformações é colocada, ou seja: as mutações na Geologia também enquadram-se no cenário de mudança de uma visão de ciência baconiana (observacional-indutivista) para uma visão dedutivista crítica (teoria-teste-refutação) já sofrida por outras Ciências ainda no início do presente século (cf. Menegat 1992). O objetivo do presente trabalho é compreender essa virada metodológica na Geologia. Num primeiro momento, parte-se do esgotamento da visão clássica da Geologia do século XIX e da fragmentação epistemológica a que chegou nas décadas de 30 a 60, de modo a reconhecer que as diferentes soluções metodológicas apresentadas deram-se no sentido de enfatizar uma suposta "particularidade" da Geologia em relação às demais Ciências. Reconhece-se, então, que a possibilidade de uma metodologia distinta, não dissociada daquela da Ciência em geral, passou a emergir de modo mais evidente na década de 70, a partir dos Paradigmas da Tectônica de Placas e da Estratigrafia de Seqüências, vindo a resgatar a unidade epistemológica. Num segundo momento, uma analogia com um problema heurístico, denominado de Caixa-Preta, é apresentada com o intuito de contrastar os métodos indutivistas, mais afeitos ao período da fragmentação, com os dedutivistas críticos, cuja possibilidade de desenvolvimento ocorreu associada à emergência da unidade epistêmica. A partir disso, revelam-se, não só as principais questões epistemológicas da atualidade, abordadas pela Nova Epistemologia, mas também as características básicas de um problema científico, definido em termos de um Programa de Pesquisa Científica.

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DA FRAGMENTAÇÃO À UNIDADE EPISTEMOLÓGICA A visão clássica de Ciência e a fragmentação epistemológica da Geologia A concepção baconiana de Ciência (F. Bacon, 1558-1626), também chamada de clássica, empirista ou naturalista, preconiza que através do Método Científico chega-se à Verdade. A Lógica Indutiva colocar-se-ia como a garantidora dessa possibilidade, pois pressupõe que, partindo-se de observações tidas como "neutras" e verdadeiras, pode-se obter generalizações igualmente certas e verdadeiras. Caso não sejam possíveis as generalizações, não há com o que exasperar-se, pois o importante mesmo é acumular observações que, algum dia, haverão de resultar em teorias mais gerais. Durante mais de trezentos anos, essa concepção metodológica hegemonizou a praxiologia da Geologia, como de resto em todas as áreas da Ciência. Apenas a partir deste século, essa enorme influência passou a ser questionada, principalmente devido aos monumentais avanços científicos alcançados pelas teorias do incomensuravelmente grande (Teoria da Relatividade Geral de Einstein) e do incomensuravelmente pequeno (Teoria Atômica e Teoria Quântica). Esses avanços foram apontados, em termos metodológicos e epistemológicos, ainda em 1934, pelas obras O novo espírito científico, de Bachelard, e A lógica da pesquisa científica, de Popper, que revelaram a falência da Lógica Indutiva, pois nenhuma das grandes teorias acerca do mundo fora3 constituída com base no método baconiano-indutivista. Oliva (1990a, p. 11), numa excelente análise sobre a visão empirista de Ciência, definiu desta maneira o anacronismo da hegemonia baconiana que tomou lugar de forma crescente a partir da década de 30: Começa-se a notar que o discurso metodológico empirista tradicional encerra uma normativização constantemente defasada, com suas prescrições revelando-se freqüentemente incapazes de apreender e justificar a riqueza das mutações históricas verificadas no âmbito dos sistemas de produção do conhecimento natural. Em algumas áreas científicas, como a Biologia, a visão clássica de Ciência foi substancialmente mudada ainda no início do século e, deste então, muitos estudos e análises metodológicas foram produzidos. Felice Mondella (1985), por exemplo, fez um completo balanço dessa "[...] importantíssima transformación, casi revolucionária [...]" sofrida pela Biologia e que possibilitou a mudança do conceito de mecanicismo biológico para organicismo biológico. Além disso, o matemático René Thom (1975) apresentou um dos mais completos estudos sobre modelos topológicos (a Teoria das Catástrofes) aplicados para a Biologia, "matematizando" essa Ciência, o que era tido como impossível pela visão clássica, que a considerava meramente de natureza observacional. Evidentemente, a questão posta não é a do dilema positivista que pressupõe que somente a matematização de uma ciência pode torná-la avançada, mas da possibilidade de se estabelecer teorias gerais, qualitativas, sobre os fenômenos da natureza, analisados sob o ponto de vista de Sistemas Dinâmicos ou Teoria de Sistemas (cf. Bertalanffy 1993; Delattre 1981; Arnold 1989; Carneiro 1993). Porém, se em outras Ciências, como a Biologia, a situação mudou ainda na alvorada deste século, ao passar de uma Ciência eminentemente de observação para uma Ciência dedutivista e testável, o mesmo não ocorreu com a Geologia.

2 Para uma análise das recentes mudanças na Tectônica de Placas, para continuarmos exemplificando, confira o trabalho de Sengõr (1990) e Allègre (1988). Ver, também, o recente encontro internacional de estudos tectônicos, realizado em Londres em 1992, no qual há uma crescente utilização, nos trabalhos apresentados, do conceito de sistemas dinâmicos para caracterizar e descrever os processos geológicos, associado com outro conceito, que tem ganhado uma ampla repercussão no meio científico como um todo, da geometria fractal de Mandelbrot (1977).

3 A obra de Popper passou a ser amplamente conhecida somente na década de 50, a partir da edição inglesa do Logik der Fõrshung, feita em 1958.

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No final dos anos 50 e início dos 60, as teorias sobre o planeta Terra, resultantes de uma visão naturalista do método científico, encontravam-se dispersas e em forte descompasso em relação aos aportes substantivos que a Geologia proporcionou à explicação desse mundo durante o século XIX. O historiador de ciência e paleontólogo Stephen Jay Gould (1991), por exemplo, valorizou a importância do conhecimento geológico para a constituição de uma cosmovisão de mundo, rebatendo uma citação de Freud na qual fora esquecida, entre as revoluções científicas que produziram um impacto literário na humanidade, uma das mais grandiosas etapas, justamente aquela revelada pela Geologia, ao anunciar apenas as que foram engendradas por Galileu e Darwin. Segundo Freud (apud Gould 1991, p. 13), A humanidade, no curso do tempo, teve de suportar das mãos da ciência dois grandes ultrajes contra seu ingênuo amor-próprio. O primeiro, ao dar-se conta de que nossa Terra não era o centro do universo, mas um grãozinho num sistema cósmico de magnitude praticamente inconcebível. [...] O segundo, quando a pesquisa biológica tirou do homem a primazia pessoal de haver sido especialmente criado, relegando-o a uma descendência do reino animal. Gould (1991, p. 13) corrigiu essa lista acrescentando a etapa descurada por Freud, aliás [...] uma das mais grandiosas etapas: a ponte estabelecida entre a limitação espacial do domínio humano (a revolução galileana) e a nossa união física com todas as criaturas 'inferiores' (a revolução danviniana). Ele negligenciou a tremenda limitação temporal que a geologia impõe à importância do ser humano - a descoberta do 'tempo profundo' [...]. Essa monumental descoberta, feita por James Hutton [1726-1797] e depois desenvolvida por Charles Lyell [17971875], conferiu uma unidade epistêmica, denominada usualmente de Uniformitarismo, de tal sorte que consolidou, ainda no século XIX, o nascimento da nova Ciência Geológica, suplantando a visão da Geognosia neptunista, erigida no século XVIII por Abraham Gottlob Werner [1749-1817]. Esse programa descritivista-observacional uniformitariano, que havia alçado a Geologia para o primeiro time das Ciências no século XIX, foi hegemônico por mais de um século. Contudo, a partir da década de 30 (c/. Allègre 1988), apresentou sinais de forte esgotamento, cuja agonia, expressa em termos de uma fragmentação epistemológica inequívoca, perdurou até a década de 60. Questões do tipo: "Qual o estatuto científico da Geologia e qual seu método?"; "Qual o objeto de investigação da Geologia: o meio físico ou a história da Terra?"; "Qual a lógica da investigação em Geologia?"; "Em que consiste uma explicação geológica?" encontravam uma diversidade de respostas, nas quais nenhum consenso sobre as possíveis antinomias existentes ou terrenos nos quais a reflexão pudesse progredir podia ser estabelecido. O termo "ciências geológicas", empregado correntemente na literatura sempre no plural, com o sentido de denotar tipologias distintas de conhecimento sobre a Terra, que de forma alguma poderiam ser integradas num mesmo contexto de análise teórica, expressa com grande precisão esse estado fragmentário (e.g., Allègre 1988; Souza 1990). No terreno prático, o descritivismo observacional e o mapeamento pontilhista pareciam constituir-se em possibilidades únicas de desenvolvimento da Geologia, como se todos os registros geológicos já tivessem uma "ordem natural" determinada, restando apenas a tarefa da sua descrição. Daí deriva outro forte indício da fragmentação epistemo-

179 lógica, pois a Geologia passa a ser vista como uma mera combinação de técnicas da Física, da Química e da Biologia (Bradley 1963). Nesse caso, a "tarefa científica" estaria completa se, no terreno teórico, as teses geológicas fossem reduzidas àquelas disciplinas e, no terreno prático, as técnicas se assemelhassem a um certo tipo de engenharia. A busca de soluções nos anos 60: período de crise dos paradigmas Diversas soluções foram apontadas para resolver esse descompasso epistemológico, que rondou a Geologia durante tantas décadas. A partir dos anos 60, auge da crise dos paradigmas clássicos da Geologia, encontra-se na literatura um interesse crescente pelos problemas epistemológicos, cujas principais contribuições podem ser encontradas em diversos artigos coligidos por Albritton (1963) num livro intitulado The Fabric of Geology. Tais tentativas, contudo, mostravam-se ainda desinseridas do contexto mais geral do debate da Filosofia da Ciência. Assim demonstra, por exemplo, o próprio título The Fabric of Geology, que, se por um lado, denota grande criatividade do autor ao combinar na palavra fabric ('trama') tanto um conceito da petrologia estrutural, quanto a idéia de "framework, structure or method of construction" (Webster's 1989); por outro, procura particularizar a discussão do método científico em Geologia, pois não se utiliza dos conceitos próprios da Filosofia da Ciência ou da Epistemologia. Ao mesmo tempo, apresentava o método científico como sendo um mero mosaico de possibilidades dispersas e logicamente desconectadas. A edição em espanhol de 1970 traduziu o título dessa obra como Filosofia de la Geologia, mais congruente, portanto, com a discussão mais geral do método nas Ciências do que a edição americana. De qualquer forma, havia motivos de sobra para a busca de soluções, como apontou a primeira frase do prefácio desse livro "During the years immediately following World War II, many geologists became dissatisfied with the training that was being given to students of the earth sciences" (p. v). Após um estudo prévio para avaliar o estado da educação geológica realizado pelo Comitê designado pela Geological Society of America, a conclusão sancionada foi muito além de um simples "problema de ensino": "[...] the committeemen asserted, the logical structure of geological science would have to be reexammined 'from the ground up'." (p. v) Todavia, os estudos iniciados não tiveram continuidade e nenhuma das contribuições desenvolveu em profundidade os problemas da lógica da pesquisa em Geologia, como sugeriu o prefácioxda obra mais importante sobre o tema naquele período. É o que se verifica ao analisar as três abordagens que esboçaram as principais posições propostas e que têm sido enunciadas, às vezes, como se fossem um verdadeiro consenso na Geologia. A primeira delas, procurou situar a ciência geológica no âmbito de uma suposta singularidade metodológica em relação às demais Ciências, ao invés de uma simples singularidade epistêmica. Tal restrição dava-se em função da Geologia ser considerada uma Ciência de tipo especial, porque histórica e empírica ao mesmo tempo (cf. Simpson 1963). Essa abordagem remete para uma visão naturalista da história da Terra. Dessa forma, também não se aplicariam aqui as teorizações feitas para as Ciências empíricas 'genuínas' e 'normais', porque essas eram vistas, essencialmente, como não históricas. Embora a Geologia apresente, de fato, uma singularidade, tanto quanto outras áreas científicas, que são seus problemas e objetos de estudo, isso não implica critérios de demarcação científica diferenciados daqueles definidos em nível mais geral das Ciências, de modo a colocá-la numa contingência científica particular. O Uniformitarismo foi colocado, durante muito tempo, como o método por exce-

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lência da Geologia. Alguns o consideraram, ainda, como a maior contribuição da Geologia ao pensamento humano. Todavia, não há suporte para esses mitos. Gould (1965) apresentou uma consistente análise sobre a derrota do Uniformitarismo enquanto proposição metodológica exclusiva da Geologia, ao diferenciar o Uniformitarismo em substantivo, completamente suplantado, e metodológico, utilizado por qualquer outra Ciência. Ou seja, os critérios pelos quais podemos utilizar para caracterizar a Ciência em geral devem servir, igualmente, para a Geologia. As restrições a essa posição encetaram, de alguma maneira, um encontro com a opinião comum dos geocientistas: a de que o debate epistemológico da Ciência não encontraria, de fato, pertinência na Geologia. Essa conclusão apressada foi consentida, também, pelos outros dois tipos de abordagens, igualmente pouco elaborados, que afirmaram ser a Geologia uma protociência ou uma ciência ainda muito imatura, afinal ela emergiu como disciplina científica apenas no final do século XVIII. Tais juízos ficaram distantes da tradição de pesquisadores clássicos da Geologia, os quais tinham o saudável hábito de reexaminar sistematicamente os pressupostos dessa Ciência, como o demonstram tanto o primeiro volume da obra de maior projeção no século XIX, Principles of the Earth, de Charles Lyell (1815, apud Gould 1991), quanto o trabalho de Derby (1895), nos quais encontramos um extenso histórico da pesquisa e dos métodos geológicos no mundo e no Brasil, respectivamente. Um problema ainda a ser superado: a visão naturalista de Geologia Em todas estas tipologias de análises apontadas, pode-se encontrar uma concepção naturalista da ciência geológica. Portanto, patrocinadora de sua fragmentação, pois seus métodos acabaram sendo circunscritos ou a meras observações normativistas, ou ao apoio a aplicações tecnológicas, principalmente aquelas associadas à engenharia. Desta forma, se a questão central da Geologia são as várias técnicas de descrever-se o objeto, resulta como inevitável a cisão entre a teoria e a descrição, onde essa passa a confundir-se com o próprio objetivo da Ciência e, aquela, com o da especulação. Assim, cada técnica de descrição deve ter sua própria "teoria particular", via de regra esquemas classifícatórios. Esses, de forma alguma, podem ser integrados em termos de uma teoria geral ou de uma totalidade, pois supõem que a condição para o bom descritivismo se dá na exata medida em que somente podem ser observadas as partes. A noção de especialização na Geologia, por exemplo, não é vista enquanto um estudo particular integrado a um estudo geral da Terra, mas sim como um "novo ramo da Ciência", via de regra, determinado muito mais pelo instrumento de pesquisa do que pelos problemas e objetos de pesquisa. Logo, se um geólogo utiliza o microscópio para suas análises, deixa de ser um geólogo para tornar-se um mineralogista, ou um petrógrafo, etc. O inverso também é verdadeiro: um petrógrafo já não é mais um geólogo. Essa inversão pode ser encontrada em diversos momentos desse período de fragmentação epistemológica da Geologia, como num artigo de Scorza (1940, p. 126), publicado na revista Mineração e Metalurgia, no qual afirma: A finalidade de um estudo petrográfico estando, na maioria dos casos, na dependência de problemas que o geólogo apresenta, tanto mais interessante e sugestivo será esse fim, para o petrógrafo, quanto maior for o número de dados que do campo provenham, no sentido de esclarecer as incógnitas que se procuram [grifos nossos]. Com efeito, a contraposição descritivismo vs. processo (explicação geológica; estudo da Terra) ocorreu desde o

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nascimento da própria Geologia, através das controvérsias entre Geognosia (Werner; descritivismo) e Geologia (Hutton-Lyell; explicação, uniformitarismo) no século XIX. Desse modo, a prática de apenas descrever-se o registro geológico, utilizando-se dos mais variados instrumentos, pareceria estar ancorada nas próprias raízes dessa Ciência. Além disso, pressupõe ainda que essas regras são um método particular da Geologia e, por isso, não há como trazer as questões levantadas pelas "ciências maduras", ou "ciências verdadeiras", para o concurso da esfera geológica. Todos sabemos, no entanto, que uma Ciência não é definida pelos instrumentos de descrição do objeto, mas sim pela investigação dos problemas que pretende resolver segundo um programa de investigação. Embora a maturidade de uma Ciência implique possibilidades metodológicas de maior consistência lógica e testabilidade, a questão central para o desenvolvimento de uma metodologia científica numa determinada área da Ciência não é a da escolha de um método em si, mas, fundamentalmente, qual a tipologia metodológica da teoria científica que é aspirada: se euclidiana, empirista ou popperiana (cf. Lakatos 1987, p. 49; cf. o item Programas de Pesquisa e Modelos, neste artigo). A Tectônica de Placas, de modo mais amplo, ou a Estratigrafia de Seqüências, de modo mais restrito, apresentaram-se, nas últimas décadas, como Programas de Pesquisa tão profícuos que passaram a provocar uma maneira inteiramente nova de explicar o mundo e a sua história, ou melhor, sua evolução. Essas teorias, longe de se constituírem em coleções de novos dados e classificações intermináveis, passaram a explicar e descrever o mundo em termos de sistemas cronogeodinâmicos evolutivos, unificando todos os antigos campos fragmentados do saber geológico até então naturalista e histórico. Além disso, colocaram a possibilidade objetiva de aspirar-se uma tipologia metodológica diferente da empirista. Todavia, embora as diferenças em termos teóricos e experimentais proporcionadas pela Tectônica de Placas sejam evidentes, o mesmo não pode ser dito sob o ponto de vista metodológico. Ou seja, as diferenças metodológicas são mais fracamente assimiladas pela comunidade científica, mesmo porque, poucos trabalhos, embora importantes e com diferentes enfoques, debruçaram-se sobre esses temas na Geologia (cf. Amaral, 1981; Silva et al 1982; Gonçalves, 1989; Paschoale 1990; Compiani 1990; Gonçalves 1990; Souza 1990, entre outros). De outro modo, todas aquelas considerações que tentam demonstrar a singularidade da Geologia através do seu método e técnicas e não por seus problemas de investigação, prestam-se, na verdade, para dar continuidade a determinados dogmas que inibem ou, no mínimo, confundem a idéia de unidade entre a teoria e a prática no fazer científico. Esses mitos servem para ocultar a idéia da reflexão epistêmica e, com isso, retiram por completo a possibilidade da prática da crítica na esfera científica. Daí que a Geologia é vista sempre como plural e não singular, porque antes de constituir-se em um corpo teórico próprio, tendo por base problemas a serem resolvidos, trata-se de um mosaico de técnicas a serem aplicadas, como se os geólogos fossem 'clínicos gerais' de 'pacientes' de tipos muito diversos. Pretende-se, pois, elucidar na seqüência da presente contribuição, as questões maiores da metodologia científica que implicam as principais teses daquilo que podemos chamar de filosofia espontânea dos geocientistas (cf. Althusser 1979) ou concepção naturalista de Ciência. São elas: 1. Fazer Ciência é seguir o Método Científico. A reflexão e a crítica dos métodos utilizados na Ciência (metaciência) não são necessárias para a prática científica na Geologia. 2. Existe apenas um único Método Científico, que consiste em observar e fazer generalizações, de forma cuidadosa e, ainda, apenas quando possíveis. O Método Científico pare-

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ce confundir-se com uma Bula infalível de passos que, uma vez seguidos, levam à Verdade científica ou ao conhecimento objetivo dos fatos. 3. A Geologia, enquanto Ciência, possui métodos particulares em relação à Ciência em geral, situados entre a História Natural4 e a Engenharia. As considerações da Nova Epistemologia somente podem ser aplicadas às ciências maduras, pois a Geologia ainda se encontra numa fase embrionária e pré-científica, devendo-se, portanto, coletar pacientemente os dados para futuras e cautelosas generalizações. 4. A observação geológica é neutra, desinteressada em relação à teoria e o descritivismo deve ser a principal esfera de preocupação do geólogo. A História da Terra é impossível de ser refutada empiricamente, não passando, portanto, de mera especulação, e, de qualquer forma, não tem importância prática. 5. A teoria e os modelos devem ser desprezados no processo da descoberta geológica, pois são nefastos ao bom procedimento científico. Via de regra, todas as teorias e modelos acabam malogrando e são, na verdade, especulações desprovidas de significado, sendo pura arte discursiva. 6. A prática geológica independe da teoria, de modo que os procedimentos de campo têm muito pouco a ver com os procedimentos teóricos. A esfera teórica deve ser vista, quando muito, como sinônimo de procedimentos laboratoriais. O teórico é entendido não como uma rede de pressupostos e hipóteses que servem para desenvolver determinadas relações lógicas entre si e com a base empírica (observações), mas como aquilo que é fabricado em laboratório, no sentido de artificial. Ou ainda, o teórico é erroneamente entendido como algo perfeito, porque irreal, em relação a algo imperfeito, então real. Ambas concepções deformam por completo a idéia de unidade do par Teoria/Prática, de modo que a primeira passa a ser desnecessária e, com isso, a segunda passa a ser uma "lâmina cega" . 7. A Geologia é apenas uma mera Ciência de observação, destinada a descrever a Terra e enquanto tal deve se manter. 8. A Geologia não possui teorias próprias, tomando-as emprestadas da Física, Química e Biologia. A Geologia é uma congérie de várias ciências para fins de apoio a tecnologias. As proposições da Nova Epistemologia e a unidade epistemológica Dado que essas questõ es ainda não estão sistematizadas em profundidade na literatura geológica, serão aqui esboçadas a partir do cenário mais geral das considerações feitas pela Epistemologia, inclusive como forma de demonstrar que certos problemas metodológicos da Geologia o são, também, da Ciência enquanto um todo. Não será abordada, contudo, a análise crítica das questões de fundo da Teoria do Conhecimento (cf. Rorty 1988; Menegat 1992). Por isso, não serão confrontados os mais relevantes programas epistemológicos desde o início do conhecimento dito moderno, o que significaria delinear o cenário evolutivo no qual se deu a emergência da Nova Epistemologia (cf. Menegat 1992), ou seja, partir (i) dos programas do racionalismo clássico (Descartes [1596-1650], Spinoza [1632-1677] e Leibniz [1646-1716]) e (ii) do ceticismo empirista (Bacon [1558-1626], Locke [1632-1704], Berkeley [1685-1753], Hume [1711-1776]) dos séculos XVII-XVIII; passando pelo (iii) programa crítico de Kant [1724-1804] da segunda metade do século XVIII; e pelo (iv)

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programa do positivismo lógico ou verificacionismo do Círculo de Viena [1926-1938] do início do século XX; até chegar no (v) programa do racionalismo crítico ou falibilismo crítico de Popper [1902-1994], da metade do século XX em diante. Tampouco serão discutidas as diversas correntes epistemológicas contemporâneas, porque assunto deveras amplo para os objetivos da presente contribuição (cf. Menegat 1992). Portanto, o leitor não encontrará aqui uma discussão crítica em relação à Epistemologia sociológica de Kuhn (1989) ou à Epistemologia anarquista de Feyerabend (1989) (cf. Oliva 1990c). Ou, das antinomias entre a irracionalidade do conceito de paradigma de Kuhn (1989) e a racionalidade crítica do programa de pesquisas de Lakatos (1979) (cf Stegmüller 1983). Ou, ainda, da simetria e assimetria entre falsifícabilidade de Popper (1989) e verificabilidade de Carnap (1988) (cf. Rodriguez 1986). Nosso propósito é de natureza meramente situacional, que, embora modesto, temos a pretensão de que seja capaz de fornecer alguns dos elementos necessários para uma análise crítica da Ciência, particularmente no que diz respeito aos problemas capitais da Geologia apontados acima (1. a 8.): (i) a congérie epistemológica; (ii) o mito da observação neutra; (iii) a relação lógica entre teoria e observação; (iv) a unidade entre teoria e prática geológica; (v) o método indutivista; (vi) a absolutização e atemporalidade do método e da teoria; e (vii) a existência de uma verdade absoluta. Além disso, analisam-se as possibilidades da Geologia erigir-se enquanto uma Ciência de tipo dedutivista, e não apenas observacional, como pretenderiam os indutivistas. Se tal propósito ainda parece não estar claro pela incipiente pesquisa na área da Epistemologia da pesquisa geológica, ao menos queremos estabelecer tal tese como uma aspiração possível. Para tanto, parte-se do reconhecimento de que o programa baconiano (cf Bacon 1988 [1620]) exerceu, e ainda exerce, uma forte influência na Geologia, fazendo-se necessário investigar as possibilidades de um programa de tipo popperiano (racionalista-crítico) para a pesquisa geocientífica. Esse objetivo, discorrido na forma de uma simulação de um problema geológico» resulta na proposição de uma metodologia crítica para a Geologia. Uma caixa-preta contida num envelope pardo simula o objeto da pesquisa geológica, donde, a partir de um problema - "O que há dentro da caixa-preta?" - estabelecem-se as condições para sua solução,. Inicialmente, tais condições são reveladas em termos das metodologias clássicas para, em seguida, contrastá-las com uma metodologia apresentada em termos da estrutura de um problema científico na Geologia, segundo um programa de investigação científica. Para elucidar a análise almejada, nos utilizaremos, fundamentalmente, das concepções de Popper (1975, 1982, 1987, 1988, 1989), posteriormente desenvolvidas também por Lakatos (1979, 1987) e Watkins (1990). A CAIXA-PRETA: VÁRIAS MODALIDADES METOD O LÓ G I C A S O c o n t e x t o d o e x e m p l o P a r a ilustrar a proposição sobre as características de um problema científico, de modo a revelar mais claramente os conceitos da Nova Epistemologia, far-se-á uma simulação heurística de um problema geológico. A simulação consiste num objeto de pesquisa representado por uma caixa-preta, contendo diversos objetos no seu interior, da qual podem-se ouvir diferentes sons, desde que movimentada, e cuja procedência assume-se ser desconhecida, bem como considera-se

4 O termo Nova Epistemologia é amplamente usado (cf. Bunge 1980; Brown 1988; Chalmers 1987) para designar uma visão de conjunto sobre as mudanças epistêmicas desencadeadas por Bachelard (1934), Popper (1989 [1934]), Lakatos (1979), Kuhn (1989), Feyerabend (1989) e outros, que acabaram por contrastar profundamente com a visão do racionalismo e do empirismo clássico enunciados quer seja pelas postulações de Bacon (1988 [1620]), quer seja do positivismo e do empirismo lógico do Círculo de Viena (Schlick 1988; Carnap 1988; Oliva 1990 b).

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impossível abri-la ou destruí-la para averiguar seu conteúdo. Essa caixa-preta encontra-se dentro de um envelope pardo, do qual é "retirada" para a presente análise. Pode-se objetar, inicialmente, que uma simulação de tal tipo não se coloca de um modo global para a Geologia, e, portanto, dever-se-ia circunscrever qual fenômeno geológico exatamente seria simulado. Tal objeção, no entanto, já revela uma concepção metodológica do tipo naturalistaindutivista, pois, se de fato o objeto da simulação - a caixapreta - não coincide com o objeto real - a Terra e os processos geológicos - isso não significa que não se pode extrair nenhum tipo de ilação epistemológica que seja semelhante e válida para revelar as características de um problema geocientífico. Destarte, para o naturalista-indutivista, que acredita ser possível obter a verdade pela acumulação de observações, nenhuma generalização que resulte da observação da caixapreta poderia ser minimamente semelhante àquelas obtidas pela observação dos registros geológicos. Faz-se, inicialmente, essa concessão ao indutivista e, com ele concorda-se no que tange ao conteúdo das "generalizações". Entretanto, antecipamos que, mesmo sob o ponto de vista do objeto geológico, a simulação proposta faz sentido e, oportunamente, a justificaremos de modo apropriado. Por ora, nosso interesse não será o de simular o processo geológico em si, mas ilustrar a lógica de descoberta científica na Geologia. E, nesse aspecto, obtém-se já uma primeira ruptura profunda com os chamados métodos indutivos, posto que significa trazer para a análise crítica o processo de descoberta, o qual, durante muito tempo, foi trancafiado por pretensos "guardiões das verdades", os quais, como apontou Kant (1987 [1787], p. 20), "comunicam ao público apenas seu uso, conservando porém a chave delas apenas para si (quod mecwn nescit, solus vult scire videri). [N.T.: o que não sabe comigo, pretende parecer saber sozinho]". O método indutivista tradicional Várias modalidades metodológicas se colocam para o inquirimento científico da caixa-preta. Segundo o método científico tradicional, tal investigação resumir-se-ia a coletar cuidadosamente observações, isentando-as de quaisquer teorizações, posto que essas contaminariam o processo observacional. Popper (1987, p. 77, grifos nossos) relacionou a seguinte estrutura de um texto escrito em estilo indutivo: 1. Primeiro explica os preparativos para a nossa observação. Pertencem aqui, por exemplo, os dispositivos experimentais, tais como os instrumentos usados, a sua preparação para o experimento e a preparação dos objectos [sic] de observação. 2. A parte principal do texto consiste numa descrição pura, teoricamente não influenciada, dos resultados experimentais: as observações feitas, incluindo medições (quando as há). 3. Segue-se um relatório de repetições do experimento, com uma avaliação do grau de confiança dos resultados, ou de erros prováveis. (De há pouco tempo para cá, isto pode incluir trabalho de estatística). 4. Opcional: uma comparação dos resultados com outros anteriores, ou com os de outras pessoas que trabalhem na mesma área. 5. Também opcional: sugestões para futuras observações, para melhoramentos desejáveis dos instrumentos, e para mais medições. 6. O texto termina (também opcionalmente) por um breve epílogo, geralmente de apenas algumas linhas, e, por vezes, em tipo mais pequeno [sic], que contém uma formulação de uma hipótese seguida de resultados experimentais referidos no texto.

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O resultado da investigação indutivista da caixa-preta poderá ser algo próximo ao que segue: 1. Descrição do objeto: a uma caixa revestida de papelão de cor preta, de dimensões 15 cm x 10 cm x 3 cm, com todas as superfícies lisas. b. Através de movimentos simples e repetidos, segurando-a na mão, diferentes sons são passíveis de distinção, tais como: som análogo ao de objetos metálicos chocando-se entre si e com a parede da caixa; som semelhante ao de objetos que se arrastam numa superfície lisa; som que sugere objetos pequenos chocando-se entre si e nas paredes da caixa; som parecido ao produzido por objetos esféricos rolando numa superfície lisa. 2. Análise química: A caixa foi submetida a análise química através de processo de fluorescência de raios-X, tendo-se procedido da seguinte forma: a. moagem da amostra até 100 Mesh; b. Mistura e homogeneização com tetraborato de lítio; c. fusão da amostra a 900°C; d. leitura na fluorescência de raio-X; e. os resultados obtidos não apontaram anomalias do método de acordo com as regras usuais. 3. Conclusão: a composição química obtida da caixapreta, em porcentagem por peso de oxido, foi a seguinte: FeO= 25%; MgO= 25%; CaO= 15%; Na2O= 15%; K2O= 20%. Total = 100%. 4. Trabalhos futuros: Dever-se-ia aprofundar os estudos, pois não foi possível incluir tal amostra em nenhuma classificação de rochas existente. Muitos outros tipos de soluções semelhantes a essa poderiam ser propostos, como ensaios de deformação triaxial, e, em todos, ficaríamos procurando entender qual o problema a ser resolvido por tais dados. O método indutivista sofisticado Uma outra solução é possível se a investigação for efetuada a partir de um problema previamente bem estabelecido. Dentre muitos que podem ser sugeridos para a simulação da caixa-preta, enunciamos um cuja escolha dá-se em função da semelhança com o problema geológico: "O que há dentro da caixapreta?" (na Geologia, perguntar-se-ia: "Como é o interior da Terra?"). A partir desse inquirimento, pode-se facilmente enumerar uma série infindável de respostas, como: a. um ser ubíquo; b. granules; c. sementes vindas de Marte; de tal sorte que, para cada uma, teremos múltiplas possibilidades de justificação. Desse modo, não saberemos, a não ser tentativamente, que tipo de resposta está a nos interessar e como podemos obtê-la da forma mais condizente possível com a realidade. Mais uma vez, a solução do problema pode dar-se de modo indutivo ao declarar-se que somente as respostas "verificadas", ou seja, feitas estritamente a partir de evidências observacionais, têm significado, sendo, portanto, as que nos interessam. Mas, o que vem a ser exatamente uma "resposta verificável"? Considerando-se que o indutivista tenha se sofisticado, poderá responder: "uma resposta verificável é aquela cujas evidências constem de um protocolo observacional". Fazendo-se uma concessão ao nosso indutivista sofisticado (ou verificacionista), poderíamos responder: a. moedas, pois, ao movimentar-se suavemente a caixa, ouve-se um som análogo ao de um objeto achatado que se atrita junto a uma superfície lisa; como me é dado conhecer situações nas quais uma moeda desliza sobre uma superfície lisa, posso inferir com segurança tal resposta; b. sementes, pois ao movimentar-se ritmicamente a caixa, ouve-se um som análogo ao de vários objetos pequenos chocando-se entre si e nas paredes da caixa; como me é dado conhecer sementes dentro de uma caixa que é ritmicamente movimentada, posso estar bem próximo a uma resposta certa.

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Nossa lista poderia continuar, mas desde já percebe-se que dificilmente uma resposta "com base estrita nas evidências observacionais" fugirá do padrão: - Trata-se de tal objeto ou material ou geometria, pois tal e qual atributos, observáveis pelos sentidos (audição e tato, nesse caso), são análogos a situações semelhantes já empiricamente conhecidas e 'bem estabelecidas'. A tipologia dessas respostas, entretanto, pode ser seriamente questionada. Inferêneias com base na audição dos observadores pode apresentar problemas na medida em que é impossível averiguar o que exatamente cada um ouve, ou seja, não há como fazer um controle intersubjetivo. As soluções a essa objeção desviar-se-iam por um tortuoso caminho da neurologia da audição, mesmo se considerarmos que o aparelho auditivo dos pesquisadores estivesse perfeito. Uma série de testes com medidores sonoros e instrumentos precisos poderiam, nesse caso, ser propostos. Chamaríamos de evidência verificável aquilo que fosse registrado por um protocolo de registros oriundos dos testes feitos com esses instrumentos. De igual sorte, tais testes podem ser refutados. Na medida em que o material interno da caixa é desconhecido, suposições sobre possíveis distorções das ondas sonoras produzidas ao atravessarem as paredes da caixapreta, ou subtraindo ou somando um determinado comprimento de onda sonora, são permitidas. Desse modo, o som ouvido pode estar distorcido, porque cheio de ruídos em relação ao realmente emitido, e, portanto, nossas conclusões são feitas a partir de um som que sofre interferências de incidência e regularidade desconhecidas. A resposta "verdadeira" estaria bem distante, portanto, de uma mera acumulação de protocolos observacionais. De modo diverso, uma outra importante refutação às respostas do tipo "com base estrita na evidência verificável" dá-se a partir da constatação que tais respostas estão sempre referidas considerando-se objetos previamente conhecidos pelo observador. Nesse sentido, nada de novo poderia ser descoberto, posto que, se assumirmos que a caixa-preta possua procedência totalmente ignorada, todas respostas deram-se no sentido da identificação de objetos já conhecidos pelo pesquisador. Logo, nossos extensos protocolos observacionais e verificáveis nos remeteriam a análises intermináveis em relação ao comportamento das ondas sonoras de acordo com os movimentos meticulosamente medidos da caixa-preta, sem que, no entanto, pudéssemos tirar conclusões a respeito para além da natureza específica de tais ondas. Parece-nos, assim, que não evoluímos muito e que estamos gravemente embretados. Por um lado, por mais que os testes sejam sofisticados, nunca poderemos ter certeza da resposta, pois desconhecem-se os materiais que constituem a caixa-preta. Por outro, nossas respostas estão circunscritas apenas ao que conhecemos e, conseqüentemente, temos que admitir que: a) a nossa observação não é nada desinteressada; e, b) dificilmente poderemos fazer descobertas "com base estrita na evidência observacional verificável". Tal situação é muito bem ilustrada pela metáfora, conhecida no meio geológico, dos três cegos e do elefante: cada qual toca uma parte do elefante e emite um juízo, resultando em respostas absolutamente díspares sobre um mesmo objeto. Fundamentalmente, essa metáfora aponta para a noção de que o todo é um mero somatório de partes e que, a partir de uma parte, nada se pode inferir sobre o todo. Deste modo, nada resta ao pesquisador senão observar pacientemente apenas a parte e, quiçá, algum dia, dado o acúmulo de observações, venha-se a conhecer o todo. O método racionalista-crítico Um cenário inteiramente distinto configurar-se-ia caso fossem estabelecidos determinados pressupostos em função dos quais pudés-

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semos testar (refutar ou corroborar) as respostas dadas ao nosso problema. Por exemplo, vamos admitir os seguintes pressupostos, cuja escolha deu-se pelo interesse em simular um problema geológico: 1. É impossível abrir ou destruir a caixa-preta. Pressuposto análogo se coloca ao inquirimento de processos geológicos antigos, que são, in totum, inacessíveis ao observador e, modernos, cuja escala não permite uma observação de conjunto. Além disso, com esse pressuposto, contingenciam-se os instrumentos de análise do objeto, que não poderão, em hipótese alguma, levar à destruição da própria caixa-preta. A semelhança com a Geologia mais uma vez se coloca, pois determinados registros dos processos geológicos (e.g., estruturas sedimentares ou deformacionais, fósseis, etc.) somente são passíveis de leitura se não houver destruição da rocha. De sorte que, o conceito de registro geológico é muito mais amplo do que p de rocha. Por esta razão, afloramentos de seqüências clássicas em diversas partes do mundo, como na zona de cavalgamento principal do Moine (UK.), ofiolito de Chipre e algumas exposições de Greenstone Belts dos Crátons Arqueanos da África do Sul, foram tombados já há algumas décadas pelas Sociedades Geológicas desses países. O exemplo está sendo seguido pela Sociedade Brasileira de Geologia em alguns Greenstone Belts de Goiás (H. Jost, inf. verbal, 1992). 2. O que está dentro da caixa-preta é conhecido. Na Geologia, tal pressuposto tem o nome de Atualismo, ou seja, os processos do passado são inferidos considerando-se determinados elementos arquitetados nos processos atuais. Diz-se, nesse caso, que temos uma teoria do objeto, cujos instrumentos de pesquisa serão possíveis de serem previstos a partir da mesma. 3. O que está dentro da caixa-preta não é conhecido. Diversas situações colocam o pesquisador da Terra diante desse pressuposto. Faz-se necessário, nesta situação, uma nova teoria do objeto, bem como estipular os instrumentos mais adequados para investigá-lo de modo a testar tal teoria. A Teoria da Deriva dos Continentes, por exemplo, colocou-se no início do presente século como uma nova teoria geodinâmica cuja questão central já não era mais a clássica reconstrução paleogeográfica, mas sim a reconstrução dos continentes (cf. Menegat & Fernandes 1993). 4. Há algo de fato dentro da caixa-preta. Coloca-se esse pressuposto para evidenciar o problema aparência versus essência, ou idealismo versus realismo. Poder-se-ia atribuir os sons ouvidos, ao movimentar-se a caixa-preta, a um sofisticado aparato instalado na sala na qual estamos a fazer nossa experiência, de modo a haver sincronia absoluta entre os sons emitidos e os movimentos executados. Ou seja, com este enunciado admitimos a existência de uma verdade a ser buscada, embora não possa ser, de fato, alcançada plenamente. 5. O que está dentro da caixa-preta é menor do que a caixa. Esse pressuposto, a princípio óbvio, é decisivo para demarcar-se a tipologia das respostas que buscamos, ou seja: respostas falseáveis empiricamente. Descarta-se, com isso, as respostas com características eminentemente metafísicas, embora em determinados casos sejam as únicas respostas possíveis. Contudo, justificativas metafísicas, como, por exemplo, as catástrofes diluvianas enunciadas no século XIX, poderão ser tratadas diferentemente de proposições empíricas e testáveis. Na Geologia, a analogia se coloca, ainda, quando relacionam-se o registro, o intervalo de tempo ao qual pertence na Escala Geológica de Tempo e o processo que o formou. De sorte que, muitos erros podem ocorrer quando diz-se que um registro pertence a um determinado intervalo de tempo que acaba por verificar-se incompatível com o aquele calculado a partir das taxas dos processos que julgamos tê-lo originado.

184 6. Quem fez a caixa-preta? O problema ontológico é enunciado com essa questão. Na pesquisa geológica o problema da origem e da história do objeto tem se colocado de forma crescente. Até o século XVIII, a história da Terra era circunscrita a uma narrativa mosaica, que pressupunha uma criação e uma destruição do planeta em função de perspectivas bíblicas (cf. Gillipse 1951). Além do mais, tal pressuposto tem influência decisiva quando da proposição de uma teoria do objeto. A partir desse conjunto de premissas podemos, então, derivar diversas hipóteses cuja consistência também pode ser testada. Tais hipóteses implicam, concomitantemente, o estabelecimento: (i) de uma teoria do objeto; (ii) de evidências observacionais (base empírica de uma teoria, cf, Popper 1989) que possam falseá-la; e (iii) de instrumentos de pesquisa para execução dos testes. Desse modo, pode-se estabelecer um modelo do objeto, o qual deve ter a propriedade de ser submetido sistemática e continuamente ao teste empírico. Segundo Popper (1989), deve-se fazer uma decisão metodológica suprema quando submetemos um modelo ou teoria a um teste: nenhuma premissa, seja de que hierarquia for (teoria, pressuposto ou observação) pode ser protegida do falseamento. Diz-se, nesse caso, que um modelo-hipótese foi corroborado caso tenha resistido ao falseamento, ou, do contrário, diz-se que foi refutado (Figura L). Contudo, deve-se considerar que nem todos os testes implicam um mesmo grau de refutação, pois este depende do tipo de teste que se está utilizando. Alguns testes podem comprometer apenas determinados enunciados de um modelo-hipótese; outros, o modelo como um todo. Da mesma forma, poderá comprometer apenas um, ou alguns dos pressupostos anteriormente assumidos, ou, ainda, o conjunto inteiro de pressupostos. Por fim, a refutação pode dar-se para o problema como um todo, isto é, concluímos que o problema "O que há dentro da caixa-preta?" é mal formulado e irresolubile. Nesse caso, deve se processar uma mudança no núcleo programa de pesquisa, denominada de mutação total. O que significa: tecer um novo problema, novos pressupostos e, por conseguinte, novos modelos, novos instrumentos e novas bases empíricas (evidências observacionais) para serem testados. Programas de pesquisa científica e modelos: uma visão integrada da teoria e da observação O conjunto desses elementos caracterizam um Programa de Pesquisa Científica (cf. Lakatos 1979), o qual foi simbolizado no exemplo da Caixa-Preta pelo envelope pardo no qual estava inicialmente contida. Ou seja, modelos-hipóteses, evidências observacionais, instrumentos e testes possuem uma intricada relação entre si, todos dependentes dos pressupostos e dos problemas estabelecidos, de modo que o acesso à caixa-preta se dá na medida desse programa de pesquisa, pois a própria noção de um objeto desse tipo também é uma proposição do programa. Como esclarece Prigogine & Stengers (1991, p. 3), Em suma, poderíamos dizer que o diálogo conduzido pela Ciência moderna relança um empreendimento sem precedentes ao mesmo tempo que enceta uma nova aventura. [...] [nela] A experimentação não supõe a única observação fiel dos fatos tais como se apresentam, nem a única busca de conexões empíricas entre fenômenos, mas exige uma interação da teoria e da manipulação prática, que implica uma verdadeira estratégia. Um processo natural se estabelece como chave possível duma hipótese teórica; e é nessa qualidade que é então preparado, purificado, antes de ser interrogado na linguagem dessa teoria. E assim um empreendimento sistemático que

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volta a provocar a natureza, a obrigá-la a dizer sem ambigüidades se obedece ou não uma teoria. Na simulação de um problema geocientífico através da caixa-preta, pode-se, ainda, identificar o problema e os pressupostos (1. a 6., acima) com o conceito que Lakatos (1979) denominou de heurística negativa, ou núcleo do programa de pesquisa; e, os modelos-hipóteses derivados, com o conceito de heurística positiva ou cinturão protetor do programa de pesquisa (Figura L).

Figura 1 — Características básicas de um problema científico: O objeto é investigado pelo sujeito em termos daquilo que é observado (cinza claro), observável (cinza médio) e não observável (cinza escuro), segundo um Programa de Pesquisa constituído por um núcleo (problema e pressupostos) e um cinturão protetor (teoria do objeto, hipóteses/ modelo e técnicas e instrumentos) o qual é continuamente submetido a teste. As evidências podem refutar ou corroborar, em diferentes graus, um Programa de Pesquisa, o qual sofre, então, mutações parciais (mudanças no cinturão protetor) ou mutações globais (mudanças no núcleo). Figure l - Basic characteristics of a scientific problem: The object is investigated by the researcher in terms of what is observed (light gray), observable (medium gray) and not observable (dark gray) according to a Research Programme composed by a core (problem and assumptions) and a protective belt (theory of object, models and instruments) which is continuously tested by falsification. The evidence can refute or corroborate in different degrees the research programme and this can suffer partial mutations (changes in the protective belt) or global mutations (changes in the core).

Apenas para exemplificar: embora sejam bastante diferentes, os modelos de MacKenzie & Jackson (1983) e Wernicke (1985), que explicam a extensão litosférica, possuem um mesmo núcleo de pesquisa, qual seja, os pressupostos da Tectônica de Placas. Aqueles modelos se colocam, então, como cinturão protetor do núcleo, que engloba a maior parte das pesquisas, as quais procuram propor e testar modelos derivados de um núcleo. Por conseguinte, os conceitos cruciais da Nova Epistemologia não se referem às observações, hipóteses e pressupostos em particular - vistos pela visão clássica como se fossem

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uma colcha de retalhos -, mas sim, àqueles que se referem às teorias enquanto um todo, isto é, devem propor em que condições deve-se abandonar um modelo ou uma teoria e qual o padrão do fluxo do valor de verdade no sistema (cƒ. Lakatos 1987, p. 48 e ss.). A partir desse raciocínio, pode-se caracterizar as teorias como sendo do tipo empirista, euclidiana ou popperiana segundo o sentido do valor de verdade de sua estrutura (cf. Lakatos 1987) onde: a. uma teoria de tipo euclidiana só admite inclusão de verdades a partir da sua cúspide e todo o resto é dedução, logo, não pode sequer ser refutada (Figura 2.a.); b. uma teoria empirista só admite a inclusão de enunciados verdadeiros na base, de modo que assume que os enunciados empíricos são sempre verdadeiros, evidenciando um dogmatismo (Figura 2.b.); e c. uma teoria racionalista crítica (popperiana) admite que podemos incluir enunciados tanto na cúspide, como na base, e não há valor de verdade a priori, de modo que a teoria é sempre conjectural. A teoria e a experiência (observação) adquirem, portanto, uma possibilidade de crítica mútua, com o que podemos concordar com a bela metáfora de Popper (1989, p. 61-2), que diz: As teorias são redes, lançadas para capturar aquilo que denominamos 'o mundo': para racionalizá-lo, explicálo, dominá-lo. Nossos esforços são no sentido de tornar as malhas da rede cada vez mais estreitas.

Resposta a alguns mitos importantes sobre o método científico Como um exemplo de que convém tirar algumas lições, a simulação da caixa-preta possibilita aduzir em relação à lógica da pesquisa em Geologia que: a. A observação não é neutra, ela depende da teoria. Esse enunciado constitui-se num dos grandes consensos na prática científica contemporânea (Allègre 1988; Blanche 1988; Brown 1988; Bunge 1980; Chalmers 1987; Feyerabend 1989; Foucault 1990; Geymonat 1985; Gould 1991; Kuhn 1989; Lakatos 1979; Oliva 1990a; Popper 1989; Prigogine & Stengers 1991; Rossi 1992; Santos 1989; Stegmuller 1983; Thorn 1975; para citar apenas alguns). A observação científica não é uma mera observação a ser colecionada para configurar-se em conhecimento. A observação faz parte do conhecimento científico quando está logicamente relacionada a uma teoria. Para além disso, quando ela pode contraditar uma teoria. Esse estatuto implica num redimensionamento do papel que a observação exerce na lógica de uma explicação científica (Popper 1989). Em Besana (1990, p. 73-74) encontramos uma breve explicitação do significado da observação científica entendida como diferente do simples ato de enxergar: Todo o processo cognitivo de ordem teórica ou natural requer uma base de fatos que a observação tem como tarefa recolher. Nesse sentido lato, a observação não possui uma caracterização de método ou instrumental: mais noção que conceito, não parece susceptível de grandes desenvolvimentos doutrinais nem de assumir um papel de reestruturação da experiência ou de conferir maior operatividade aos paradigmas da ciência, nem de ter um papel ou um contributo autônomo noutras áreas disciplinares como a história ou literatura. A observação exerce-se em levantamentos astronômicos, nas ciências físicas, nas disciplinas naturais, pressupondo um objeto ou um conjunto de objetos distintos do observador sobre os quais se realiza a operação de clarificação, periodização ou redução; além destes. A sua função contraposta a priori aos objetos da pesquisa parece finalmente esgotar-se quando a argumentação, a formalização ou um qualquer tratamento teórico consegue descrevê-los como totalidade. Ou, como sintetizou Popper (1982, p. 76) A observação é sempre seletiva: exige um objeto, uma tarefa definida, um ponto de vista, um interesse especial, um problema. Para descrevê-la é preciso empregar uma linguagem apropriada, implicando similaridade e classificação - que, por sua vez, implicam em interesses, pontos de vista e problemas.

Figura 2 - Tipos de Teoria segundo o sentido do valor de verdade de sua estrutura: (a) Euclidiana, admite o valor de verdade apenas na cúspide (Teoria); (b) Empirista, o valor de verdade é admitido somente na base (Observação); e (c) Racionalista-crítica (Popperiana), que admite o valor de verdade tanto na cúspide quanto na base, isto é, nenhum enunciado deve estar protegido. Enquanto que os tipos (a) e (b) cindem a teoria da observação, e vice-versa, o tipo (c) integra-as em termos de uma relação com significado lógico, onde as evidências servem para falsear as teorias, não protegendo-as, portanto, da crítica permanente. Figure 2- Types of theories according to the truth-value of its structure: (a) Euclidean, admits the truth-value only in the top; (b) Empiricist, admits the truth value only in the base (Observation); and (c) Critical-rationalist (Popperian) that admits the truth-value on both, its base and top. While (a) and (b) separate observation from theory, (c) integrate them in terms of logical significance, where observations are used to falsify the theories, therefore, not protecting them from continuous criticism.

No seu livro Lógica da Pesquisa Científica, Popper (1989, p. 61) foi ainda mais incisivo: "Entendo que nossa linguagem comum está cheia de teorias; que a observação é sempre uma observação à luz de teorias. " b. A escolha dos instrumentos de pesquisa não é feita como se o instrumento tivesse um fim em si mesmo, mas de acordo com os pressupostos, o problema e o programa de pesquisa que decidimos assumir. Kuhn (1989, p. 86), declarou, nesse sentido, que [...] conscientemente ou não, a decisão de empregar um determinado aparelho e empregá-lo de um modo específico baseia-se no pressuposto de que somente certos tipos de circunstâncias ocorrerão. Em outra passagem, Kuhn (1989, pp. 81-82) indica como se dá a intricada relação entre observação, instrumentos, teorias e descoberta científica:

186 Mas se tanto a observação como a conceitualização, o fato e a assimilação à teoria, estão inesperadamente ligados à descoberta, então esta é um processo que exige tempo. Somente quando todas essas categorias conceituais relevantes estão preparadas de antemão [grifos nossos] (e nesse caso não se trata de um novo tipo de fenômeno), pode-se descobrir ao mesmo tempo, rápida e facilmente, a existência e a natureza do que ocorre. c. Não há um único método de pesquisa, pois o método depende do problema que se quer solucionar. Os indutivistas ingênuos postulam uma única possibilidade de pesquisa científica, a qual parte da coleção de observações, pretensamente neutras, para a posterior generalização através da Lógica Indutiva. d. A lógica indutiva não leva à verdade científica. Essa conclusão foi resultante de uma solução dada a um problema amplamente tratado por Popper (1982, 1989), chamado de Problema da Indução, cuja formulação foi feita ainda no século XVIII por David Hume [1711-1776]. Especialmente no primeiro volume do Pós-Escrito à Lógica da Pesquisa Científica, cujo título é O realismo e o Objective da Ciência (Popper 1987), encontramos um completo desenvolvimento para refutar o Indutivismo. A título de breve síntese, transcrevemos seis itens que, para Popper (1982, p. 83), representam suas principais conclusões sobre esse assunto: 1) A indução - isto é, a inferência baseada em grande número de observações - é um mito: não é um fato psicológico, um fato da vida corrente ou um procedimento científico. \2) O método real da ciência emprega conjecturas e salta para conclusões genéricas, às vezes depois de uma única observação (conforme o demonstram Hume e Born). V3) A observação e a experimentação repetidas funcionam na ciência como testes de nossas conjecturas ou hipóteses - isto é, como tentativas de refutação. \4) A crença errônea na indução é fortalecida pela necessidade de termos um critério de demarcação que - conforme aceito tradicionalmente, e equivocadamente - só o método indutivo poderia fornecer. \5) A concepção de tal método indutivo, como critério de verificabilidade, implica uma demarcação defeituosa. \6) Se afirmarmos que a indução nos leva a teorias prováveis (e não certas) nada do que precede se altera fundamentalmente. e. O conhecimento não é cumulativo, no sentido de mera coleção de observações. A visão naturalista postula que o progresso científico resulta de uma infindável acumulação de observações, isto é, as novas teorias são obteníveis a partir da quantidade de dados e não das novas relações que se pode estabelecer entre Teoria e evidências. f. Há uma relação entre sujeito e objeto de pesquisa. Conseqüência do questionamento ao indutivismo, que pressupunha que todas as pessoas observam de igual maneira os objetos e as coisas e de que há um único método a ser aplicado, a Nova Epistemologia declara que tanto sujeito como objeto "mudam" com a pesquisa. Ou seja, a pesquisa científica ao revelar uma racionalidade e uma explicação do mundo, muda a relação desse mundo com o observador e desse com o mundo, pois como afirmara Galileu, as descobertas científicas violentam os sentidos (cf. Koyré 1980). Poderíamos assentar tal enunciado numa série de exemplos históricos. Mas citaremos apenas a revolução copernicana que inverteu a convergência geocêntrica do universo (tudo leva até a Terra) a favor do heliocentrismo (a Terra gira ao redor do Sol). As evidências observacionais, contudo, fariam crer que o sol gira ao redor da Terra, pois diariamente cumpre uma trajetória de deslocamento na abóbada celeste.

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A analogia da caixa-preta com a pesquisa geológica Além disso, a simulação da caixa-preta é particularmente importante pois traz as seguintes identidades com o problema geológico: 1. A inacessibilidade espaço-temporal dos registros e ambientes geológicos formadores de rochas implica a proposição de modelos. Estes, podem ser testados de acordo com a observação do registro previsto, de modo que o modelo pode ser constantemente melhorado ou totalmente refutado. De outro modo, diz-se que uma descrição está completa na medida da previsão de um modelo. 2. Necessidade de uma teoria do objeto (atualista ou não) para contextualizar o registro geológico dentro de uma dinâmica de sistemas complexos e, assim, definir a totalidade na qual pode ser explicado e observado. 3. Não neutralidade da observação. Esta deriva dos pressupostos e modelos adotados para cada tipologia de registro geológico. 4. Importância dos pressupostos no raciocínio geológico, indicando que as observações fragmentadas muito pouco significam num processo de descoberta geológica. 5. Os instrumentos de laboratório utilizados na investigação não possuem um estatuto independente. Pelo contrário, dependem da teoria e de um problema apontado por um programa de pesquisa geológica. 6. O conceito de programa de pesquisa globaliza o entendimento da atividade geocientífica, definida em termos de uma estratégia de pesquisa que, para as dimensões de espaço-tempo do objeto geológico, não pode ser desprezada. 7. Aplicabilidade do conceito de falsificabilidade em Geologia e a natureza dedutiva dessa ciência, onde um modelo define tanto os pressupostos metodológico/teóricos, quanto as práticas de teste/observação de campo e/ou laboratório. CONCLUSÕES: PROGRAMAS DE PESQUISA E GEOLOGIA A Geologia, que já pertenceu no século XIX à constelação das principais Ciências, viu seu status epistêmico ser rebaixado durante grande parte do século XX. Esse rebaixamento deveu-se, principalmente, à (a) insistência em desconsiderar o papel da teoria na construção e formulação de problemas científicos e (b) em entender a Geologia como uma ciência essencialmente vinculada ao método indutivista e à observação. Contudo, a emergência dos atuais conceitos da Nova Epistemologia que identificam os progressos havidos na Geologia na última década possibilitam situá-la no primeiro time das Ciências contemporâneas. Por outro lado, a introdução dos conceitos da Nova Epistemologia, para fins de análise de uma Ciência em particular, possui uma série de elementos inibitórios identificados pela dificuldade em fazer-se emergir a reflexão metadiscursiva em meio a ainda forte tradição indutivista da comunidade científica. Pela sua fé nas regras metodológicas, o indutivista considera a observação e a indução constituidoras não só da racionalidade científica, mas também "pretensamente definidoras da racionalidade metacientífica" (Oliva 1990a, p. 17), concepção esta denominada por Popper (1989) de naturalismo metodológico. A complexidade dos elementos colocados pela Nova Epistemologia, que cinde a suposta especularidade naturalista entre o "método científico" e a racionalidade metacientífica de segunda ordem, tão enfatizada pelo empirismo, é também, um outro fator bloqueador de sua emergência. A maioria dos termos utilizados estão muito longe daqueles empregados na pesquisa específica de cada área da Geologia e, dominá-los, significa, via de regra, visitar áreas do conhecimento anteriormente tidas como alheias à Ciência. Neste sentido, o exemplo da caixa-preta ilustra heuristicamente esses conceitos, de modo a caracterizar o empreendimento científico em termos de um Programa de Pesqui-

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sa, no qual deve-se distinguir: (i) o problema bem enunciado; (ii) os pressupostos; (iii) a teoria do objeto; (iv) os instrumentos e técnicas de pesquisa; (v) as hipóteses; e (vi) o teste (Figura 1). Este exemplo, ilustra, ainda, a natureza dedutiyista da Geologia, de modo que a sua unidade epistemológica pode ser explicitada tanto em termos de seus componentes substantivos - enunciados pela Tectônica de Placas e Estratigrafia de Seqüências -, quanto pelos meto-

dológicos - onde essas Teorias se colocam como Programas de Pesquisas e não como verdades absolutas como pensavam os indutivistas. Agradecimentos Os autores agradecem à FAPERGS e ao CNPq pelo apoio à pesquisa desenvolvida; ao Prof. Mario Costa Barberena pelo incentivo, diretivas heurísticas e profícua discussão dos temas abordados.

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MANUSCRITO A818 Recebido em 6 de setembro de 1994 Revisão do autor em 6 de julho de 1995 Revisão aceita em 3 de agosto de 1995

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