O Mito de Procusto e uma analise junguiana sobre a intolerância

May 28, 2017 | Autor: L. Matta Ramos | Categoria: Carl G. Jung, Mitologia griega, Arquetipos
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O mito de Procusto e as nossas intolerâncias.

Na Grécia Antiga, havia uma cidade muito famosa próxima a Atenas, conhecida como Elêusis. Nesta região serrana eram celebrados os ritos sagrados de iniciação (https://youtu.be/epJ6OnwtSto ) em homenagem a duas divindades agrícolas: Deméter e Perséfone. Mas a fama de Elêusis não era devido às deusas protetoras da cidade e sim ao terror que seus habitantes possuíam em relação a um de seus habitantes: Procusto, embora alguns o conhecessem pela variação de Procrusto.
O significado de seu nome é terrível. Procusto pode ser traduzido como "o esticador". Na verdade, ele era um ladrão e um sacrificador. A sua maldade era traduzida em atitudes. Não apenas espoliava suas vítimas, mas as submetia a um tipo de morte que espalhava pânico ao povo da região.
Procusto tinha uma cama de ferro compatível com o seu tamanho. Com dois metros de altura, a sua cama era enorme. Após sequestrar as suas vítimas e recolher os seus pertences, este assassino amarrava pulsos e tornozelos da vítima junto à cama. Se a pessoa fosse menor que o tamanho da mesma, ele as esticava até a morte para que coubessem naquela medida. Se porventura a pessoa fosse maior que a cama, ele serrava a cabeça e as pernas e observava as suas vítimas durante o sofrimento mortal. Procusto era um ladrão dos bens materiais e da vida.
O terror espalhado por ele teve seu fim por meio da intervenção do herói grego Teseu que fingiu ceder ao assassino e durante uma distração, o inebriou com uma substância mágica que fez com que ele ficasse inconsciente e assim foi amarrado na própria cama onde muito morreram. Ao acordar, Teseu lhe infligiu a mesma punição: Procusto foi punido pelo sofrimento pelo qual ele fez tantas pessoas agonizarem.
A mitologia tem o poder de atualizar verdades universais e resgatar arquétipos (= modelos de pensamentos e sentimentos comuns a todos) que fazem parte do nosso cotidiano. Procusto que tanto assustava seus vizinhos, simboliza a postura e as atitudes de toda pessoa (sim, eu, você, todos nós!) que tem o propósito de querer enquadrar o outro sob os nossos padrões morais, afetivos, intelectivos, religiosos, ideológicos ou doutrinais.
A cama de Procusto deve ser interpretada como as nossas convicções, os nossos paradigmas que são a maneira que temos de ver e entender o mundo. Por que a cama é de ferro? Porque o ferro não se enverga, é um metal não se dobra às mudanças ou circunstâncias. Ou seja: nós muitas vezes podemos "ficar enferrujados" às ideologias e convicções que alimentamos. Perceba que a cama tem um único tamanho: quem não se encaixasse, deveria ser sacrificado.
Sob uma perspectiva junguiana, o mito é uma referência à intolerância do ser humano. Não toleramos que o outro pense diferente. Não suportamos que ela tenha outro projeto de vida. Não aprovamos o modo pelo qual ele prefere fazer as coisas. Queremos que o outro se comporte dentro um padrão específico. Queremos, reprovamos, brigamos, discutimos porque não aceitamos o que é diferente aos nossos padrões e convicções.
O mito de Procusto é bastante atual. Identificamos esse malfeitor em todas as falas que ouvimos como: "Você tem que tomar essa decisão...", "Ela deveria agir assim e parar ser burra...", "Mas ele é um idiota mesmo...", "Pau que nasce torto morre torto", "Eu no lugar deles não seria tonto não!" Essas frases são familiares para você? São suas ?
O herói Teseu vem nos explicar que cada pessoa tem o direito de ser e viver da maneira que lhe parecer adequada, certa e justa. Isso não significa que devemos deixar de aconselhar, orientar as pessoas com quem nos relacionamos, em especiais aquelas pessoas que amamos. No entanto, muita atenção e muito cuidado: aconselhar não significa exigir, recomendar não significa ameaçar.

Conclusão

O mito é um convite para que possamos pensar a respeito da intolerância. Tolerar é um verbo transitivo direto com o significado de suportar, permitir, admitir, consentir. Ele é de origem latina (tollere) que traduz a ideia de "tirar", "destruir" qualquer maneira ou atitude de exigência, obstáculo ou ameaça que podemos impor ao outro, por mais diferente que o ser humano seja.
A intolerância está presente nas guerras do Oriente Médio e faz parte da História da Humanidade, mas também está presente nas discussões do casal, nos comentários maldosos das conversas de família. A intolerância é parceira constante nos comentários maldosos entre o círculo de amigos em referência "àquele cara meio esquisito que não se sabe de onde veio". Ela também é conselheira fiel das pessoas que não aceitam ou não aprovam o jeito de alguém viver, trabalhar, vestir-se ou se comunicar. No fundo, queremos que todos sejam como nós e que se pautem pelos nossos valores, crenças e convicções. Pensar diferente é ameaçador. Viver de maneira diferente ao nosso jeito é incômodo.
É confortável identificarmos a intolerância nos países em guerra, ou nos partidos políticos. É fácil perceber a intolerância religiosa em lugares distantes à nossa casa. Mas o que pensar da intolerância em nossa vida, em nosso trabalho, em nossos relacionamentos, em nós mesmos?
Pensemos um pouco em Procusto: talvez ele esteja mais próximo de nós do que imaginamos e o seu rosto talvez seja a nossa fotografia.


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Fontes:
Dicionário On line de Português. www.dicio.com.br
Dicionário inFormal. www.dicionarioinformal.com.br
Origem da Palavra – site de etimologia. www.origemdapalavra.com.br
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Dica:
Hoje a cidade é um subúrbio de Atenas e se chama Eleusina. Veja o link muito interessante:
https://www.google.com.br/maps/place/El%C3%AAusis,+Gr%C3%A9cia/@38.0805856,23.4563135,12z/data=!4m5!3m4!1s0x14a1ae4c9ab8d99f:0x400bd2ce2b97e50!8m2!3d38.0412749!4d23.5418125

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