O neoconstitucionalismo e a evolução do direito administrativo

July 18, 2017 | Autor: Márcio Ribeiro | Categoria: Constitutional Law, Administrative Law
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O neoconstitucionalismo e a evolução do direito administrativo1 Solo lo que es imperfecto cambia: o porque se corrompe o porque se mejora. La inmutabilidad debe ser garantizada para lo que es perfecto, a fin de preservarlo como tal.2

Raimundo Márcio Ribeiro Lima Mestre em Direito Constitucional pela UFRN. Especialista em Direito Público pela UnB. Especialista em Docência do Ensino Superior pela UnP. Graduado em Direito pela UFC. Professor Substituto da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Professor de Direito Administrativo e Constitucional da UnP. Procurador Federal/AGU. Associado do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública (IBAP).

Resumo: O trabalho visa discutir o sentido e o alcance do neoconstituciona­ lismo na aplicação do direito na ambiência administrativa e também promover as possíveis relações entre o desenvolvimento dos movimentos constitucionais para a formação do perfil da Administração Pública e, claro, para a evolução do direito administrativo. Palavras-chave: Constitucionalismo. Neoconstitucionalismo. Administração Pública. Direito Administrativo. Sumário: 1 Introdução – 2 Constitucionalismo e neoconstitucionalismo – 3 A evolução do direito administrativo –­ 4 Neoconstitucionalismo e atuação da Administração Pública – 5 Conclusão – Referências

1 Introdução Inicialmente, cumpre assinalar que o trabalho não se destina a perquirir sobre os mais diversos entendimentos com relação ao discutível termo neocons­ titucionalismo, mas identificar uma possível conexão entre o ele e a evolução do direito administrativo, de forma a evidenciar as possíveis consequências na relação entre a Administração Pública e os cidadãos, outrora denominados súditos e, mais recentemente, administrados.

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Artigo apresentado, com algumas breves alterações, na disciplina Teoria da Constituição, ministrada pelo Prof. Dr. Artur Cortez Bonifácio, no segundo semestre de 2010, no Curso de Mestrado do Programa de PósGraduação em Direito da UFRN. ZAGREBELSKY, Gustavo. Historia y constitución. Traducción y prólogo de Miguel Carbonell. Madrid: Editorial Trotta, 2005. p. 40. Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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Tendo em vista o propósito acima, impende discutir o sentido do constitucionalismo clássico e seus desdobramentos no âmbito do direito público para, só assim, promover as possíveis relações com o direito administrativo, pois as imbricações são inevitáveis em função os fins do Estado que, em grande medida, cabe àquele ramo jurídico disciplinar. Ademais, seguindo a trilha ascendente dessa possível relação, observar as mudanças decorrentes do neoconstitucionalismo para o processo evolutivo do direito administrativo quer dizer, dentre outras coisas, destacar a importância da senda constitucional na consecução da atividade administrativa. Por fim, no necessário arremate das proposições levantadas, serão apresentadas algumas conclusões ou inferências decorrentes da projeção do direito constitucional sobre o direito administrativo. 2 Constitucionalismo e neoconstitucionalismo Primeiramente, cabe gizar o que seja constitucionalismo, seu nascedouro e os seus propósitos, de forma a explicitar a sua importância nos diversos campos do direito, afinal, não há como encabeçar um pretenso sentido ao neoconstitucio­ nalismo sem compreender o constitucionalismo moderno. Numa rápida análise sobre o assunto, extrai-se que as raízes do constitucionalismo moderno remontam à segunda metade do século XVIII,3 mais precisamente no ideário americano e francês de libertação ou de resistência à crueza do regime até então vigente, os quais foram determinantes para o florescimento das primeiras constituições escritas. De modo diverso, o constitucionalismo inglês prescindiu das constituições de papel,4 haja vista o particular desenvolvimento do seu direito que, em grande medida, decorre de um multissecular sistema de reconhecimento de direitos mediante imposições consuetudinárias. Do afirmado acima, dessume-se que não constitui uma assertiva apressada dizer que existe mais de um constitucionalismo. A rigor, pode-se mesmo falar na existência de diversos constitucionalismos: o americano, o inglês, o francês, o alemão etc.5 Enfim, não há como negar o surgimento de movimentos constitucionais, com matizes próprios,6 nos mais diversos Estados nacionais e que, por 3 4

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MIRANDA, Jorge. Manual de Direito Constitucional. 4. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2000. p. 07-08. t. II. ACKERMAN, Bruce. The Rise of World Constitutionalism. Virginia Law Review (VLR), v. 83, p. 771-797, 1997, no que referencia, com certo sarcasmo, o pensamento de Ferdinand Lassalle. Ademais, a qualificação não se limita apenas à contextura de determinado ordenamento jurídico, pois, por vezes, ela é adotada com relação à ordem/convergência político-ideológico de uma época, como é o caso do constitucionalismo social, que prega uma submissão do governo às leis com vista a contemplar o maior número possível de cidadãos do efetivo gozo dos direitos proclamados pela Carta Fundamental (VANOSSI, Jorge Reinado A. Estudios de Teoría Constitucional. México: UNAM, 2002. p. 132). Por exemplo, no que se refere ao absolutismo, o constitucionalismo da Europa continental, desde os seus primórdios, pregava a substituição da monarquia por outro poder, também absoluto, reverberado na Assembleia soberana. Na Inglaterra, por sua vez, incidia uma particular preocupação na consagração dos privilégios e liberdades tradicionais dos cidadãos ingleses, devidamente defendidos pelo Parlamento. Desse modo, no primeiro caso, o absolutismo régio fora derrotado como expressão de um poder régio; noutro, como expressão de um poder absoluto (ZAGREBELSKY, Gustavo. El derecho dúctil. Ley, derechos y justicia.

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vezes, até mesmo por inegável influência político-ideológica, possuem pontos de aproximação com outras ordens jurídicas, fazendo com que exista uma densa e complexa teia histórico-cultural sobre a temática constitucional.7 De qualquer sorte, neste breve condensar gráfico, emprega-se o termo no singular, de modo a não particularizá-lo em face de uma ordem jurídica, mas não se olvidando da heterogenia conteudística em razão das suas raízes políticas ou históricas tão diversas. Notadamente, não se pode compreender o constitucionalismo apenas como um movimento de cunho jurídico, já que também revela um perfil renovador das relações políticas existentes na aurora das vicissitudes sociais, culminando-se com a Constituição escrita e, claro, com os desdobramentos ou implicações político-jurídicas para determinado Estado. É dizer, o complexo mosaico das vertentes políticas e jurídicas que encetam o constitucionalismo faz ultimar uma ambiciosa e consagradora teia de prescrições vinculantes para todo o Estado. Assim sendo, Constituição e constitucionalismo são fenômenos evidentemente diversos, de maneira que a primeira não antecede ao segundo, no entanto, e isso se afigura até mesmo paradoxal, o constitucionalismo, como expressão da Constituição, exige uma necessária compreensão dos textos fundamentais ao redor do mundo, seja como discussão do problema da técnica constitucional,8 seja como parâmetro de evolução dessa mesma técnica. Sobremais, o termo Constituição classicamente se vincula a uma nação, o constitucionalismo não se limita a um continente, muito menos a um Estado, muito embora assuma nuances próprias em cada país. Volvendo-se de maneira mais particular sobre a Constituição, Riccardo Guastini, salienta a existência de quatro principais significados do termo Constituição, quais sejam,9 (a) que a Constituição expressa todo ordenamento político de tipo liberal; aqui, remete-se exatamente à contextura do liberalismo para a consolidação da Constituição no ocidente;10 (b) ademais, ela pode ser concebida como um conjunto de normas jurídicas; quer dizer, um plexo de normas que identificam e caracterizam todo o ordenamento jurídico; ou, de modo ainda mais preciso, um conjunto de textos jurídicos que prescrevem os comandos fundamentais de um Estado, já que um ordenamento jurídico não é composto de

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9. ed. Tradução de Marina Gascón. Madrid: Editorial Trotta, 2009. p. 25). Aliás, essa clara diferença teve importante repercussão no desenvolvimento da cultura constitucional nos países da Europa continental e na Grande Ilha, pois, no primeiro caso, recrudesceu a importância do Parlamento, devidamente decantada na relevância tributada às leis; no segundo, o Parlamento tinha a função de defender os direitos do povo inglês e não declará-los ou reconhecê-los, daí a razão da diminuta, ou mesmo inexpressiva, pertinência da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão para o povo inglês. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 51. MATTEUCCI, Nicola. Constitucionalismo. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 254. v. I. GUASTINI, Riccardo. Estudios de Teoría Constitucional. México: UNAM, 2001. p. 29-30. Daí, o porquê de o constitucionalismo, como movimento jurídico-político, exigir a consagração de diversas constituições no mundo ocidental. Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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normas, mas de prescrições jurídicas, pois aquelas representam um resultado da atividade hermenêutica que antecede a toda aplicação de uma disposição jurídica; (c) a terceira acepção, de fácil compreensão, representa apenas um documento de caráter normativo que ostenta o nome de Constituição; e (d) por fim, guardando já notória particularidade em face dos demais ordenamentos jurídicos, representa um particular texto normativo carreado de certas características formais, isto é, as especificidades de um dado regime jurídico, no que aparta de eventual constituição influenciadora do constitucionalismo moderno. Sobremais, dentro de uma dimensão mais ampla sobre a temática, não se pode olvidar que a Constituição deve ser vista como um limite ao poder político, haja vista as razões fundantes da instituição das constituições a partir do sé­ cu­lo XVIII, bem como, e aqui a evidência é inegável, ela declara um verdadeiro catálogo de direitos fundamentais em determinada ordem jurídica e, a rigor, tais direitos, sob o estigma da historicidade, são praticamente comuns entre as nações ocidentais, mormente naquelas em que há instituições democráticas fortes e consolidadas. Em face de tais considerações, tem-se como desnecessária uma análise mais demorada das características, tarefas11 ou funções12 da Constituição, pois, sem maior dificuldade de entendimento, o termo diverge do constitucionalismo, em que pese uma estreita relação existente entre essas duas realidades políticojurídicas. Sobremais, como que um adorno conceitual à questão, numa feliz e plástica síntese, nota-se que a “Constituição é, de fato, a própria estrutura de uma comunidade política organizada, a ordem necessária que deriva da designação de um poder soberano e dos órgãos que o exercem”.13 Quanto ao constitucionalismo, e isso desde já deve ser ressaltado, observase que ele sofre uma interferência direta das mudanças no plano das realizações constitucionais ao longo dos séculos. Assim, José Joaquim Gomes Canotilho, num largo exercício de síntese, arvora o entendimento de que o constitucio­na­ lismo é a “[...] teoria (ou ideologia) que ergue o princípio do governo limitado 11

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Hesse ventila, com inegável precisão, a existência de três tarefas fundamentais da Constituição, a saber, (a) a de integração ou de unidade política; (b) a de organização; e (c) a de direção jurídica (HESSE, Konrad. Constitución y Derecho Constitucional. In: BENDA; HEYDE; HESSE; MAIHOFER; VOGEL. Manual de Derecho Constitucional. 2. ed. Tradução de Antonio López Pina. Madrid: Marcial Pons, 2001. p. 3-5). Numa ligeira menção às funções da Constituição, impende elencar os escólios de Giuseppe de Vergottini, nos quais apresenta as seguintes funções: (a) função de garantia dos direitos fundamentais; (b) função constitutiva do documento constitucional de determinado Estado; (c) função de estabilização e racionalização de particular sistema de poder; (d) função constitutiva legitimadora de um novo Estado, de maneira que cada Constituição inaugura uma nova ordem de poder e, claro, um novo Estado; e (e) função de propaganda e educação política, no que revela a necessidade de consolidar o conteúdo ideológico contido em qualquer Constituição (VERGOTTINI, Giuseppe de. Constituição. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco Pasquino. Dicionário de Política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 258-259. v. I). Para uma discussão sobre a revisão das funções da Constituição, vide CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 1447-1452. MATTEUCCI, Nicola. Constitucionalismo. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 247. v. I.

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indispensável à garantia dos direitos em dimensão estruturante da organização político-social de uma comunidade [...]”,14 no que revela uma técnica de limitação do poder com propósitos nitidamente garantísticos. Nicola Matteucci, num vislumbre menos linear sobre a temática, salienta que se deve aceitar a dimensão valorativa implícita no termo constitucionalismo, qual seja, e de forma bem resumida, a defesa dos direitos da pessoa, do indivíduo e do cidadão.15 Ademais, o autor assevera que, no alcance do propósito valorativo acima mencionado, e isso é relevante para a compreensão da razão dos termos empregados, foram utilizadas algumas expressões diversas do constitucionalismo, tais como: separação dos poderes, garantias, Estado de direito ou Rechtsstaat e Rule of Law,16-17 de maneira que, hoje, deve-se perquirir um significado mais específico ou particular ao termo constitucionalismo. Prendendo-se ao aspecto tipológico do constitucionalismo moderno, convém destacar as palavras de Paolo Comanducci, que baseia sua classificação em três claros parâmetros, quais sejam, (a) os objetos e as pretensões do constitucionalismo; (b) os meios institucionais; e (c) os meios políticos.18 Considerando o primeiro parâmetro, tem-se o constitucionalismo em sentido amplo e o constitucionalismo em sentido estrito. Este exige a criação de um tipo específico de Constituição com o objetivo de limitar o poder, bem como prevenir o despotismo,19 no que desponta uma salvaguarda concreta de interesses através do texto constitucional. Aquele requer, tão somente, a criação de uma Constituição, no sentido de que seja ela qual for, com o fim de limitar o poder e prevenir o despotismo. O autor divide, ainda, até mesmo em função da elementar divisão apresentada, o constitucionalismo em fraco e forte. O constitucionalismo fraco se caracteriza pela existência de uma Constituição somente para limitar o poder 14

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CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 51. MATTEUCCI, Nicola. Constitucionalismo. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 248. v. I. MATTEUCCI, Nicola. Constitucionalismo. In: BOBBIO, Norberto; MATTEUCCI, Nicola; PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1998. p. 248. v. I. Naturalmente, os autores ingleses se dedicaram com primazia ao estudo do termo e, dentre eles, se destaca Dicey, o qual trouxe contribuição preciosa sobre o sentido e o alcance da expressão Rule of Law, que versa, em linhas gerais, dentre outras coisas, sobre (a) a natureza e a aplicação geral do direito na Inglaterra; (b) o direito de liberdade individual; (c) o direito de liberdade de expressão; (d) o direito de manifestação/reunião pública; (e) a responsabilidade dos Ministros; (f) o tratamento das receitas públicas e a relação de imposição tributária; (g) a organização das Forças Armadas; (h) a relação entre o Parlamento soberano e o Rule of Law. O que se observa, e o autor faz questão de destacar, é que as instituições políticas inglesas são norteadas por dois claros fundamentos, quais sejam, (a) a onipotência ou indisputada supremacia do governo central inglês (no sentido de organização e exercício do poder político) sobre todo o país; e (b) a regra ou supremacia do direito (DICEY, Albert Venn. Introduction to the study of the law of the constitution. 8. ed. London: Macmillan and Company, 1915. p. 179-180). COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 76. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 77. Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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existente sem, contudo, prever uma específica defesa dos direitos ­fundamentais. Por outro lado, o constitucionalismo forte se notabiliza pela criação de uma Constituição destinada a garantir os direitos e as liberdades fundamentais em face do poder estatal.20 Agora, tendo em vista o segundo parâmetro, tem-se o constitucionalismo dos contrapoderes e o constitucionalismo das regras. O constitucionalismo dos contrapesos, que tem como objetivo limitar o poder e/ou de garantir os direitos fundamentais, propõe um sistema institucional de checks and balances, do qual absorve critérios político-jurídicos necessários para tentar equilibrar ou harmonizar a relação entre os poderes. Por sua vez, o constitucionalismo das regras, que tem como objetivo limitar o poder e/ou garantir os direitos fundamentais, propõe o reconhecimento da prioridade cronológica e, principalmente, axiológica das esferas de liberdades individuais em face da atuação do Estado.21 Observase, portanto, que o constitucionalismo das regras centra a sua atenção em certas liberdades individuais, as quais carreiam valores que exigem uma atuação mais precisa da atividade legiferante do Estado. Quanto ao terceiro parâmetro, tem-se o constitucionalismo reformista e o constitucionalismo revolucionário. Este, como o termo já denuncia, propõe destruir o poder existente e/ou requer novo poder, tido como revolucionário, mediante a outorga de uma Constituição. Já o constitucionalismo reformista requer apenas às forças já existentes a concessão de uma Constituição ou mesmo se limitar a pactuar a promulgação de uma.22 Como se pode observar, a evolução do constitucionalismo moderno, notadamente liberal, ocorrera de forma a empreender uma maior limitação do poder estatal e, consequentemente, permitir uma maior consolidação das liberdades individuais e isso, evidentemente, deveria trazer, desde o início, importantes consequências para o direito administrativo. Assim sendo, se forem considerados os imperativos de cada época, e assi­ nalando de maneira bem elementar, pode-se gizar que, no decurso de poucos séculos, o constitucionalismo passou do clássico para o moderno e deste, numa vertente mais atual, para o indefinido neoconstitucionalismo.23 O constitucionalismo clássico remonta à Idade Média e vai até o século XVIII, constituindo-se, portanto, num longo período; sendo que o constitucionalismo moderno parte da segunda metade do século XVIII.24 Mas, aqui, cumpre uma advertência: o 20

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COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 77. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 77. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 78. Em todo caso, é relevante mencionar que a divisão acima, linear e simplista, não revela toda a complexidade que envolve os períodos de transição entre os constitucionalismos enumerados, muito menos os matizes que marcam ou caracterizam, em cada época, as discussões sobre as relevantes questões constitucionais. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra: Almedina, 2003. p. 52.

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constitucionalismo, por não se confundir com o movimento positivista do início do século passado, revela-se, também, nesse ponto, e não só por esse, bem distinto das concepções ideológicas vinculadas à supremacia da lei como critério, por vezes exauriente, de resolução antecipada dos conflitos jurídicos, no que tanto rebate a concepção ideológica do neoconstitucionalismo, que pretende ser uma proposta evolutiva em face do positivismo jurídico,25 daí, quiçá, a razão pela qual o termo pós-positivismo não raras vezes é empregado. Promovidas breves considerações sobre o constitucionalismo, impende, agora, encetar alguns entendimentos sobre o discutível termo neoconstitucionalis­ mo. Aqui, impõe-se uma compreensão sobre o que seja ou o que se entende por neoconstitucionalismo para, só depois, obter condições sobre as possíveis inferências que ele carreia para o direito administrativo ou, mais precisamente, para a Administração Pública, assunto, aliás, que é abordado em tópico específico. Pois bem. Paolo Comanducci, no artigo já mencionado, apresenta uma divisão do neoconstitucionalismo em três segmentos, a saber, teórico, ideológico e metodológico.26 A compreensão da divisão acima é determinante para encetar quaisquer considerações sobre o neoconstitucionalismo, de modo a não empreender afirmações apressadas e potencialmente equivocadas, tão comuns na seara das cogitações sobre o direito constitucional. O neoconstitucionalismo teórico se notabiliza como uma alternativa em face do juspositivismo tradicional, de forma que constitui uma contraposição ao legalismo, ao estatalismo, legicentrismo e ao formalismo interpretativo;27 enfim, representa um rompimento com os cânones elementares do positivismo. Nesse ponto, tem-se nitidamente o neoconstitucionalismo como uma superação ao positivismo clássico, haja vista os seus evidentes problemas na compreensão do direito ou dos direitos em função dos critérios ou parâmetros interpretativos empregados. Paolo Comanducci, tergiversando ainda sobre o neoconstitucionalismo teórico, faz uma observação quanto ao objeto de investigação do documento constitucional; assim sendo, divide-o em “modelo descritivo da Constituição como norma” e “modelo axiológico da Constituição como norma”.28 No primeiro modelo, no que parece evidente, tem-se que a Constituição retrata um conjunto de regras jurídicas positivas, decantadas num documento escrito ou decorrentes de imposições consuetudinárias, que são fundamentais em relação às demais regras do ordenamento jurídico, de modo que são ­fundantes 25

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Sobre o positivismo numa perspectiva ideológica extremada, vide BOBBIO, Norberto. O positivismo jurídico. Lições de Filosofia do Direito. Tradução de Márcio Pugliesi et al. São Paulo: Ícone, 1995. p. 225 et seq., obra na qual o autor salienta que o conteúdo ideológico do positivismo é o dever absoluto ou incondicionado de cumprir à lei pelo simples fato de ser lei. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 83. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 83. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 84. Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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de todo o ordenamento jurídico e, por certo, hierarquicamente superiores às demais regras.29 O outro modelo, por sua vez, possui a mesma conceituação acrescida da condição de que haja determinados conteúdos a que se atribui um especial valor. Logo, já se pode dessumir a importância dos valores para o neoconstitucionalismo, só que tal relevância vai inevitavelmente desaguar na questão do fundamento ou da justificação de tais valores, o que é sempre algo bem tormentoso. Por fim, destaca o jusfilósofo que as cortes constitucionais parecem assumir o modelo axiológico de Constituição como norma em vez do modelo descritivo,30 isto é, o modelo que melhor acolhe evidentemente a liberdade decisória dos magistrados. Quanto ao neoconstitucionalismo ideológico, observa-se que há uma preocupação em colocar no primeiro plano dos conclaves jurídicos o escopo de garantir os direitos fundamentais,31 tudo de forma a salientar os mecanismos institucionais de defesa dos direitos humanos.32 Comanducci menciona que os expoentes da doutrina neoconstitucionalista entendem que há uma conexão necessária entre direito e moral, quer dizer, que há atualmente uma obrigação moral de cumprir a Constituição e as leis que são compatíveis com os parâmetros axiológicos da senda constitucional.33 Daqui, por certo, resulta uma inegável aproximação entre o direito a moral, o que se contrapõe aos hercúleos esforços dos positivistas para tentar mantê-los separados. Voltando-se, agora, ao neoconstitucionalismo metodológico, esclarece Comanducci que ele sustenta uma conexão necessária, identificativa, ou mesmo justificativa, entre o direito e a moral.34 Tal conexão, como será demonstrado adiante, encontra algumas razões e reflexões na doutrina de Mauro Barberis.35 Passadas essas preliminares considerações, Comanducci enceta algumas críticas sobre a temática do neoconstitucionalismo teórico, ideológico e metodológico. Assim sendo, ventilam-se alguns posicionamentos arvorados pelo autor, haja vista a pertinência de suas observações quanto ao discutível rótulo neoconstitucional. Primeiramente, Paolo Comanducci divaga criticamente sobre o neocons­ titucionalismo teórico. Destarte, salienta que não há motivos para dispensar o 29

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COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p.84. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 84. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 85. Que, sem sombra de dúvida, possuem uma compreensão mais ampla que os direitos fundamentais, muito embora não revelem qualquer diferença de natureza qualitativa, a divergência, acredita-se, assenta-se sobre questões de ordem histórica e, claro, acertamento legislativo. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 86. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 87. BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 273-278.

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neoconstitucionalismo como teoria, já que empreende e compreende a estrutura e o funcionamento dos sistemas jurídicos de modo mais satisfatório que a doutrina juspositivista tradicional. Contudo, menciona que, tendo em vista as mudanças, ainda que parciais, dos modelos de Estado e de direito no século XIX e no início do XX, “[...] a teoria do Direito neoconstitucionalista resulta ser nada mais que o positivismo jurídico de nossos dias”.36 Naturalmente, a afirmação revela certa descrença do autor na perspectiva totalmente ou pretensamente inovadora do neoconstitucionalismo. A rigor, a novidade constitui apenas, e se isso for considerado pouco, no deslocamento da lei, centrada numa perspectiva meramente legalista, para o reconhecimento da norma jurídica como valores de um sistema decorrente da aproximação do direito com a moral, ou simplesmente o claro reconhecimento de que eles nunca estiveram separados, muito menos distantes. Como expoentes da doutrina neoconstitucionalista na Itália, Ferrajoli e Zagrebelsky são alvejados pela crítica de Paolo Comanducci. Quanto ao primeiro, Comanducci critica-o por considerar a ciência jurídica como normativa, em que se observa, numa clara contextura filosófica, uma precisa advertência quando assevera: “O que o Direito é não pode servir para criticar o que o Direito é, nem para indicar o que o Direito deve ser”.37 Por sua vez, Gustavo Zagrebelsky sofre uma ligeira crítica de Comanducci, qual seja, de que o direito não deve ser estudado sob o ponto de vista interno, mas, sim, sob a perspectiva externa, na qual é possível o estudo nas ciências sociais. Diz, ainda, numa clara explicitação da crítica formulada, que uma coisa é considerar o ponto de vista dos operadores do direito, outra é fazer o próprio direito sob essa perspectiva.38 A crítica incidente sobre a perspectiva do isolamento se justifica como forma de evitar um neoconstitucionalismo indene ou distante das consequências que a adoção dos seus esteios pode causar na sociedade, particularmente quando as decisões judiciais podem padecer de maior previsibilidade em função de eventual fragmentariedade decisional decorrente dos arroubos de uma pretensiosa correção material dos direitos no caso concreto, no que pode revelar, não raras vezes, uma clara ofensa à estabilidade das relações jurídicas e, claro, uma consolidação de decisões conflitantes. No que se refere ao neoconstitucionalismo ideológico, Paolo Comanducci assevera, com tom de inegável preocupação, um sério problema: “[...] a diminuição do grau de certeza do Direito derivada da técnica de ‘ponderação’ dos princípios constitucionais e da interpretação ‘moral’ da Constituição”.39 No Brasil, 36

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COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 88. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 90. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 91. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 91. Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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essa preocupação é tenazmente compartilhada por Daniel Sarmento, pois apregoa que “[...] a filtragem constitucional do Direito [...] quando realizada pelo Poder Judiciário sem critérios racionais e intersubjetivamente controláveis, pode comprometer valores muito caros ao Estado Democrático de Direito”.40 Não há maior esforço em perceber que, a despeito das pretensas con­ quistas dogmáticas do neoconstitucionalismo, a crítica se volta à velha questão do decisionismo judicial, temática, aliás, devidamente encartada pela doutrina de Hans Kelsen, porém com os matizes que caracterizam a sua teoria pretensamente pura.41 É dizer, tanto a imprecisão decorrente do argumento da injustiça, no sentido de que uma norma extremamente injusta não é direito, portanto, entendimento que expressa uma eficácia reducionista do ordenamento jurídico; quanto à incerteza do argumento dos princípios, no sentido de que há uma inegável relação conceitual entre o direito e a moral, portanto, uma compreensão expansiva do ordenamento jurídico, já que vai além das regras,42 acabam por revelar a mais nuclear e persistente questão metodológica do neoconstitucionalismo: como afirmar a pertinência da correção material dos textos ou preceitos jurídicos em função de uma orquestrada razão prática; portanto, com desejáveis ou aceitáveis parâmetros operativos, sem malferir a regularidade da atuação da autoridade pública, isto é, sem que descambe para uma álea judicial ou administrativa por conta da inviabilidade de traçar prognósticos confiáveis na prestação da tutela judicial e, claro, administrativa. Ademais, Paulo Comanducci critica a posição dworkinana sobre a existência de uma moral objetiva que vá a ser fonte das regras e dos princípios. Quer dizer, o autor não acredita que tal entendimento vá resolver a indeterminação ex ante ou ex post do direito.43 Aliás, a redução da indeterminação do direito ainda é uma das maiores chagas das teorizações jurídicas.

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SARMENTO, Daniel. Ubiquidade constitucional: Os dois lados da moeda. In: SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de (Org.). A constitucionalização do direito: fundamentos teóricos e aplicações específicas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 115. KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 8. ed. Tradução de João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 388-395. Aliás, com inegável evidência, a questão é claramente apontada na seguinte passagem: “A teoria usual da interpretação quer fazer crer que a lei, aplicada ao caso concreto, poderia fornecer, em todas as hipóteses, apenas uma única solução correta (ajustada), e que a ‘justeza’ (correção) jurídico-positiva desta decisão é fundada na própria lei. Configura o processo desta interpretação como se se tratasse tãosomente de um ato intelectual de clarificação e de compreensão, como se o órgão aplicador do Direito apenas estivesse que pôr em ação o seu entendimento (razão), mas não a sua vontade, e como se, através de uma pura atividade de intelecção, pudesse realizar-se, entre as possibilidades que se apresentam, uma escolha que correspondesse ao Direito positivo, uma escolha correta (justa) no sentido do Direito positivo” (KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 8. ed. Tradução de João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 391, grifos no original). FIGUEIROA, Alfonso García. Neoconstitucionalismo, derrotabilidad y razón prática. In: CARBONELL, Miguel; JARAMILLO, Leonardo García. El canon neoconstitucional. Madrid: Editorial Trotta e Instituto de Investigaciones Jurídicas – UNAM, 2010. p. 185-186. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 92.

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Destarte, em face de tais colocações, Paolo Comanducci promove uma s­érie de inferências críticas44 sobre a justificação do direito pautada nos princípios e, em última instância, numa moral pretensamente objetiva, salientando, ainda, que não há razões para não se criar princípios para configurá-los ou ponderá-los: “Mas o que não creio é que, na situação atual, criar ou configurar princípios, ou ponderá-los caso por caso, sejam atividades que alcancem diretamente (como parece crer Dworkin) o valor da certeza do Direito”.45 Por outro lado, mesmo que se incline à crítica formulada, até mesmo por se afigurar plenamente defensável, não há como prospectar ou pretender certeza no direito em função de teorizações pautadas por elementos extrajurídicos, ainda que sejam extremamente engendradas, nem mesmo se pode afirmar que tal desiderato revele-se necessário para solucionar os problemas que encerram a dinâmica da convivência social, sempre tão conflitiva e, hoje, potencialmente desgastante em face dos dilemas da hipermodernidade. Tratando-se de neoconstitucionalismo metodológico, Paolo Comanducci apre­senta as mais severas críticas. Considerando a tese neoconstitucionalista de que qualquer decisão jurídica se baseia, em última instância, numa norma moral, as decisões judiciais seriam subsidiadas pela moral de cada magistrado, o que, evidentemente, faz com que todo o sistema jurídico padeça de previsibilidade das consequências jurídicas das condutas ou das soluções dos conflitos.46 A crítica, não se pode negar, é pertinente. Como afastar os vislumbres subjetivistas dos fundamentos judiciais, especialmente quando os reclames da senda principiológica não encontram limites concretos em face de uma precária argumentação jurídica; logo, os engendros neoconstitucionais demandam um consistente substrato metodológico que, e isso não pode ser olvidado, ainda não se encontra devidamente formulado. Paolo Comanducci chega até mesmo a elencar quatro possibilidades de aplicação da tese neoconstitucionalista e que nelas se verificam problemas de ordem epistemológica, quer dizer, relacionados à validade, ao método ou à estrutura do conhecimento.47 Ademais, para encerrar a questão, o autor salienta que, mesmo que sejam fulminados ou sanados os entraves relacionados à epistemologia, ainda persistem dois claros empeços, quais sejam: (a) a inexistência de uma homogeneidade moral na sociedade; e (b) que as normas morais compartilhadas já estejam incorporadas nas regras ou nos princípios jurídicos.48 44

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COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 92-93. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 93. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 96. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 94-97. COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: um análisis metateórico. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 97. Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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Diante de tais conclusões, não há como olvidar que a identidade justificativa entre direito e moral não promove qualquer certeza jurídica ao direito e, o que é pior, transcreve uma carga de indeterminação ex ante e ex post e ele, conforme o sabor dos valores morais de cada magistrado. Então, seria isso um parâmetro aceitável para a autoridade administrativa tendenciosamente autocrática? A negativa se impõe, e por diversas razões, conforme exposição em tópico próprio. O neoconstitucionalismo, sem dúvida, representa uma notória evolução em face do juspositivismo clássico, já que suplanta o rigor das teorizações meramente normativistas, mas, à evidência, não resolve uma das maiores chagas do positivismo kelseniano, a saber, o decisionismo judicial. Em contraponto ao acima salientado, mas sem antes também promover as suas críticas ao neoconstitucionalismo,49 Mauro Barberis salienta 7 (sete) razões para aceitar o imperialismo da moral, nestes termos: (a) de ordem disciplinar – se refere ao processo de distinção de diferentes disciplinas práticas, tais como direito natural e filosofia do direito, de modo que o imperialismo da moral se assentaria na reflexão normativa do direito ou, em termos mais precisos, a argumentação jurídica imprescinde da moral50 e, desse modo, imprescinde de uma necessária contextualização disciplinar; (b) de ordem metodológica – consiste na reflexão antiformalista de que o direito é um fenômeno social, o qual não poderia ser separado ou ilhado sobre o fenômeno do mesmo tipo, como a moral,51 o que denuncia uma evidente defesa da aproximação entre direito e moral; (c) de ordem lógica – consiste na impossibilidade do sistema jurídico de se autofundar; quer dizer, há a necessidade de um fundamento anterior ao próprio direito, o que não quer dizer que seja necessariamente de caráter moral52 e, dentre outros fundamentos, é preferível que não seja, por exemplo, o de cunho religioso,53 pois a racionalidade e a razoabilidade54 perdem espaço em relação à paixão e à conformação dos parâmetros pretensamente indiscutíveis; 49

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BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 259-264. BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 273. BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 273. BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 274. Menciona-se, pois, em que pese à laicidade que adorna o nosso sistema constitucional (art. 19, inc. I, da CF/88), não raras vezes as decisões dos nossos tribunais são pautadas por contextualizações meramente religiosas, muito embora veladas através de uma pretendida relação inextrincável entre a senda religiosa (da maioria) e concreta expressão da cultura nacional. Cumpre transcrever sobre a temática uma ligeira, e melhor que seja assim, síntese, nestes termos: “La racionalidad consiste en la coherencia del sistema normativo; la razonabilidad, en la correspondencia entre la solución normativa y las características de sentido y valor del caso disciplinado, correspondencia valorada no libremente sino conforme a los principios constitucionales” (ZAGREBELSKY, Gustavo. Principios y votos. El Tribunal Constitucional y la política. Traducción de Manuel Martínez Neira. Madrid: Editorial Trotta, 2008. p. 75).

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(d) de ordem teórica – revela-se na forma de conceber o neoconstitucionalismo uma relação identificativa de conexão entre direito e moral, contudo, não se pode dizer que, no plano teórico, tal concepção possa comportar uma posição plenamente sustentável;55 (e) de ordem prática – de origem aristotélica, da qual se compreende que a razão prática ou o discurso jurídico seja uma ação e seja uma ação; quer dizer, no primeiro caso, pautada na conduta de um servidor ou cidadão; no segundo, que se dedique a especificar uma ação em face de todas as demais. Claro que, a depender do caso, não se pode dizer que a razão última de uma conduta seja sempre idealizada na moral;56 (f) de ordem política – consiste na razoável ideia de que a garantia última contra eventuais aberrações do direito positivo pode consistir unicamente numa justificação última de caráter moral. Mas, mesmo assim, deve-se ter um cuidado enorme na justificação aventada, pois o julgamento com base em parâmetros morais pode não ser sempre favorável aos destinatários do julgado;57 (g) de ordem filosófica – consiste na elementar ideia de coerência de todos os valores da esfera prática: mesmo admitindo que esta se articulasse em diversos âmbitos (jurídico, moral, político, religioso etc.), caberia sustentar, inclusive, que todos estes valores convirjam e, naturalmente, devam ser coerentes (ao menos no sentido de não contraditórios).58 Em que pesem os argumentos apresentados, nos quais encetam possíveis abordagens numa contextura holística, tem-se que a inexistência de valores (a) objetivos, ou objetivamente aferíveis em face das miríades fáticas, e (b) cognoscíveis cientificamente no interior de cada uma das diversas esferas normativas, pode fazer com que o neoconstitucionalismo seja, francamente, uma via de instabilidade ou insegurança no direito, o que não se afasta tanto do direito alternativo ou, de modo mais remoto, da jurisprudência dos interesses, já que a teleologia se perde na heterogenia da fragmentariedade decisória, acarretando, assim, imprevisibilidade na senda decisional promovida pelas autoridades públicas. É dizer, a proposta teórica do neoconstitucionalismo não apresenta balizas concretas ou precisas para conter o decisionismo judicial, inclusive, tal problemática pode até mesmo aumentar em função de uma pretendida correção material59 55

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BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 275. BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 275. BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 276. BARBERIS, Mauro. Neoconstitucionalismo, democracia e imperialismo de la moral. In: CARBONELL, Miguel (Org.). Neoconstitucionalismo(s). Madrid: Trotta, 2005. p. 276. Aliás, não se pode desconsiderar o [...] “o fato de que o mero não cumprimento da pretensão à correção, embora não prive sistemas jurídicos ou normas jurídicas individuais do caráter jurídico ou da validade jurídica, torna-os juridicamente defeituosos. Isso é a expressão do fato de que o direito possui uma dimensão ideal necessária” (ALEXY, Robert. Conceito e validade do direito. Tradução de Gercélia Batista de Oliveira Mendes. São Paulo: Martins Fontes, 2009. p. 153). Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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pautada preponderantemente na moral que, evidentemente, não representa o necessário decantar de valores universais e objetivamente aferíveis no caso ­concreto. 3 A evolução do direito administrativo60 Não se pretende aqui, nem seria possível, destacar uma correspondente implicação evolutiva do direito administrativo com o constitucionalismo clássico, moderno ou contemporâneo, mas, tão somente, salientar que a evolução desse ramo jurídico, sob o influxo das teorizações do direito, e não se arvora nada de novo até aqui, mantém-se, de certa forma, numa linha de independência evolutiva e, infelizmente, tardia, por não se ater, infelizmente, em maior ou menor grau, aos luminares dos caminhos da contextura constitucional ao longo dos séculos. É dizer, o direito administrativo caminhou, e de certo modo ainda caminha, como um bêbado trôpego nas paragens da cultura jurídica constitucional, fato que, a toda evidência, traz uma indisfarçável inferência negativa à atuação administrativa, já que, não raras vezes, ela se contrapõe aos comandos constitucionais para assentar medidas ou condutas marcadas pela autocracia ou pelo capricho dos gestores públicos. Em que pese tais assertivas, hodiernamente, não se pode negar que o direito administrativo ventila uma ascendente imposição de valores constitucionais, muitos dos quais determinantes na qualidade de vida dos cidadãos, já que, tendo a Administração Pública o inarredável dever de promover as mais diversas prestacionais fáticas do Estado, todo o arcabouço das realizações públicas acaba por expressar os importantes aspectos materiais da tessitura axiológica das prescrições constitucionais. Para demonstrar a evolução do direito administrativo, impõe-se um brevíssimo apanhado histórico. Assim sendo, tributa-se à Lei do 28 pluvioso do ano VIII (1800), na França, o discutível nascedouro desse ramo jurídico,61 já que uma mera lei sobre a organização administrativa francesa não teria o condão de perfazer todos os contornos necessários à constituição de um novel ramo jurídico; porém, ainda que questionável, trata-se de um marco sempre lembrado pelos doutrinadores pátrios.62 Em todo caso, ainda que existissem Estados organizados, bem como uma estrutura orgânica voltada à sistematização e à realização de suas atividades

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Aqui, considerando o contexto que encerra o artigo, não há uma demorada exposição sobre a evolução do direito administrativo, aliás, tal temática é objeto de outro artigo deste autor, no qual há uma larga exposição sobre o tema. MAFRA FILHO, Francisco de Saltes Almeida. Nascimento e evolução do direito administrativo. Revista de Direito Administrativo (RDA), v. 238, p. 167-174, out./dez. 2004. Para fins de exemplificação, referenciam-se dois importantes manuais pátrios: ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de Direito Administrativo. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 9; e DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 4.

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t­ípicas, mas, antes dessa lei, não havia marcos normativos indicativos de uma independência dos domínios administrativos em face do direito privado, fato que veio a se tornar possível com a Revolução Francesa,63 uma vez que, por conta da necessária divisão dos poderes,64 o Estado passaria a cumprir fielmente as determinações legais do legislativo, mormente as que estabeleciam a organização administrativa e a atuação do Poder Público.65 O direito administrativo pátrio, naturalmente, originou-se de forma diversa da França ou da Itália, já que, aqui, nunca vingou o sistema da jurisdição dúplice,66 porém não há como olvidar a importância desses países para a consolidação dos institutos administrativos no Brasil. Logo, considerando o modelo de Estado predominante no século XIX, inegavelmente liberal, resulta claro que as suas características impuseram nuances determinantes para o direito administrativo, de maneira que, numa necessária síntese, tinha-se:67 (a) unidade e centralização de poder, de modo que a atuação estatal era excessivamente centralizada; (b) uma perspectiva individualista do cidadão em face do Estado absoluto, de maneira a consagrar a plêiade de direitos e garantias individuais, mais precisamente as liberdades públicas; (c) a ausência do Estado na atividade econômica; e (d) no âmbito social, uma verdadeira ausência do Estado, excetuando-se apenas a área de ensino. Infelizmente, tais características acarretavam um direito administrativo preso às concepções centralizadoras e despóticas da atuação administrativa. Mais ainda, já na segunda metade do século XX, observa-se o seguinte:68 (a) a fragmentação do poder e a diversidade de centros de poder na sociedade, o que acarreta uma necessária discussão sobre a atuação do Estado e a sua importância para a condução dos próprios fins da sociedade; (b) o Estado passa a intervir na economia em busca de uma melhor qualidade de vida para todos, ainda que tal intervenção, em muitos casos, se prestou apenas a ensaiar uma inexitosa tentativa de corrigir graves desvios na ciranda econômica em função da inércia do setor privado; (c) o Estado passa a empreender uma série de políticas sociais, o que faz crescer sua estrutura orgânica e, claro, os encargos para mantê-la; e (d) ocorre o fenômeno da publicização do privado, bem como a privatização do 63

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Na relação existente entre a Revolução Francesa e a consolidação do princípio da legalidade, vide GARCÍA DE ENTERRÍA, Eduardo. Revolución Francesa y Administración Contemporanea. 4. ed. Madrid: Civitas, 2005. p. 21-34. Obviamente, não há como consentir a existência de uma efetiva divisão de poderes, já que, inicialmente, a relação de promiscuidade ou de dependência do Conselho do Estado com o Executivo fazia com que o Poder Público, muitas vezes, fosse senhor das decisões do seu mais profundo interesse. MAFRA FILHO, Francisco de Saltes Almeida. Nascimento e evolução do direito administrativo. Revista de Direito Administrativo (RDA), v. 238, p. 169, out./dez. 2004. Já que o Conselho de Estado, devidamente albergado no art. 137 da Constituição de 1824, não saiu do papel. MEDAUAR, Odete. Evolução do Direito Administrativo. Boletim de Direito Administrativo (BDA), ano VII, p. 285, maio 1992. MEDAUAR, Odete. Evolução do Direito Administrativo. Boletim de Direito Administrativo (BDA), ano VII, p. 286, maio 1992. Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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­público que, em termos bem simples, representa um inevitável encontro funcional dos regimes por conta das demandas decorrentes dos novos fluxos de atividades do Estado numa sociedade hipermoderna. Considerando o contexto acima, não há como negar que a Administração Pública passa a desenvolver atividades mais complexas e diversificadas, logo, o direito administrativo teve que acompanhar tais transformações e uma delas é a própria concepção ou extensão dada à lei; isto é, a Administração Pública, como mera executora da lei, passou efetivamente a legislar, por conta de algumas necessidades técnicas ou operacionais, e foi observado, primeiro, com as autarquias educacionais e, depois, com as agências reguladoras. Tendo em vista as transformações assinaladas, podem-se cogitar, ­ainda na segunda metade do século passado, as seguintes mudanças no direito administrativo,69 (a) a preocupação com resultados da atuação administrativa, no que segue toda uma torrente de proposições gerenciais no interior da Administração Pública pautada no desejo de promover uma gestão pública eficiente; (b) maior preocupação com os administrados e a promoção de um regime de aproximação com os grupos sociais ou cidadãos isolados; (c) o dever de transparência na atividade administrativa, isto é, inteligibilidade e acessibilidade sobre as realizações públicas; (d) o respeito às garantias constitucionais, mormente à ampla defesa e ao contraditório; (e) aumento significativo da atividade consensual da Administração Pública, o que decorre de uma gestão pública mais democrática e, consequentemente, mais paritária; (f) redução dos atos ou atuações com poder de império por parte do Poder Público, ou seja, um sensível declínio da verticalidade nas relações com os particulares; (g) a redução da burocracia com a desformalização e a desregulamentação no âmbito da Administração Pública em beneplácito à eficiência funcional e à racionalização dos procedimentos administrativos. Prendendo-se, agora, à atual quadra evolutiva do direito administrativo, em que se discute a perspectiva pós-positivista do direito, elencam-se alguns notáveis pontos:70 (a) o desprestígio da vontade da autoridade ou de qualquer forma absoluta de exercício da atividade administrativa, o que bem revela uma preocupação hodierna com a legitimidade da atuação administrativa; (b) a adoção de valores e princípios consagrados no ordenamento jurídico, mormente os constitucionais, decorrente de um árduo processo de maturação dos avanços dogmáticos do constitucionalismo moderno; (c) a abertura para as realidades socioeconômico-políticas quando do exercício da atividade administrativa, o mesmo se diga quando da escolha das formas da atuação administrativa;71 69

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MEDAUAR, Odete. Evolução do Direito Administrativo. Boletim de Direito Administrativo (BDA), ano VII, p. 286, maio 1992. MEDAUAR, Odete. Evolução do Direito Administrativo. Boletim de Direito Administrativo (BDA), ano VII, p. 288, maio 1992. “Nessa nova ordem os cidadãos não mais aceitam a condição de sujeitos passivos; o indivíduo também evoluiu: o grau mais elevado de informação propiciado por maior instrução formal e pelos meios de

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(d) o reconhecimento de uma nova realidade entre o Estado e a sociedade, ­destacando-se as relações de parceria e um claro envolvimento com o objetivo de alcançar propósitos comuns, aliás, isso muito animou a configuração de certos institutos, como é o caso das parcerias público-privadas; (e) a disposição para mudanças de paradigmas na atuação administrativa e, claro, tal predisposição representa um ponto-chave, antecedente e consequente, para a uma verdadeira democratização da gestão administrativa. Diante das colocações acima, não se pode negar que as vicissitudes promovidas no direito administrativo foram significativas, muito embora, e não se pode deixar de reconhecer, elas não atendam, a contento, ao importante itinerário constitucional de relevantes transformações sociais e políticas. Explica-se: a contextura hodierna da disciplina jurídica da atuação administrativa ainda guarda muito dos ranços de antanho,72 preserva os favores régios dos privilégios estatais, encampa o anacronismo na limitação operativa dos novos institutos73 e, por fim, mantém uma resistência à atividade do particular no seio da Administração Pública, rompendo, assim, com as premissas cívicas que remonta ao republicanismo clássico.74 4 Neoconstitucionalismo e atuação da Administração Pública O direito administrativo, sem sombra de dúvida, constitui o ramo do direito com laços mais estreitos com o direito constitucional, de sorte que o ventilar das discussões ou dos problemas sobre a técnica constitucional, por certo, acarreta inevitáveis implicações no ramo do direito público, mormente no direito administrativo. Mas seriam tais implicações devidamente absorvidas pelo Poder Público na ordinária consecução da atividade administrativa? É dizer, o giro ou as transformações ocorridas na ambiência constitucional faz ressoar, sem maior demora, uma nova diretriz na seara administrativa? Esses questionamentos são inevitáveis e, claro, se afiguram como premissas básicas para aferir uma efetiva constitucionalização do direito, uma vez que na práxis administrativa, longe das perspectivas meramente abstratas dos comandos constitucionais, é que se reconhece o desvelo das mudanças de valores da gestão pública, isto é, de pouco bastam os cotejos singulares de uma ou outra prescrição normativa constitucional, mas, sim, a consagração de toda uma torrente transformadora de condutas na consecução da atividade administrativa na prossecução o interesse público.

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comunicação de massa acarreta a vontade geral de ‘tomar a palavra’ ante a burocratização maciça das grandes organizações estatais” (MEDAUAR, Odete. O Direito Administrativo em evolução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1992b. p. 215). Veja-se, por exemplo, a tratativa quase nobiliárquica dispensada às autoridades públicas, cujo festivo e pomposo letreiro, quando olvidado, é motivo de lamuriosa e oficiosa advertência. Isso é facilmente observado na Lei de Acesso à Informação (nº 12.527/2011), haja vista a dificuldade encontrada pelos cidadãos/administrados em obter os documentos desejados, por mais simplórios que sejam os seus conteúdos. AGRA, Walber de Moura. Republicanismo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 44. Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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Pois bem, a relação de aproximação entre o direito e a moral, bem como a adoção dos princípios jurídicos, inclusive sob uma perspectiva contra legem,75 faz com que devam ser repaginados os textos sobre a disciplina jurídica do direito administrativo, especialmente para enfocar a primazia da defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, de sorte a contemplar, com uma necessária responsabilidade sobre os esteios dos institutos administrativos, as importantes transformações na aplicação dos textos jurídicos decorrentes do atual relevo dos estudos constitucionais, sem, contudo, perder as diretrizes fundantes do direito público, isto é, sem olvidar as premissas instrumentais dos poderes públicos, mas, sim, harmonizá-los com a ordem jurídica vigente. Portanto, a teia pretensamente inovadora do neoconstitucionalismo deve servir de mote para uma releitura dos institutos do direito administrativo, mas, à evidência, não poderá representar uma ponte para uma intervenção desenfreada do pernicioso panprincipiologismo apregoado por operadores do direito mais desavisados ou, simplesmente, mal-intencionados. Enfim, não se deseja aqui enumerar os possíveis contornos harmonizantes dos novos ares constitucionais no extenso catálogo da disciplina jurídica administrativa,76 já que é uma tarefa eminentemente casuística, ainda que possam ser encetados alguns exemplos evidentes, e por conta da evidencia não se afigura necessário mencioná-los, porém destacar duas importantes constatações: (a) o avanço das perspectivas constitucionais tem alcançado, de certo modo, e em muitas searas jurídicas, um modismo mal ensaiado de uma dogmática canhestra no atendimento dos seus fosforescentes fins, o que tem permitido um zigue-zague nada evolutivo de contextualizações jurídicas destinadas a consolidar os direitos fundamentais dos cidadãos, uma vez que prescrevem tímidas proposições para desvanecer a verticalidade nas relações jurídicas administrativas; e (b) por outro lado, tal perspectiva errante, mesmo assim, tem contribuído para divisar novas posturas ou medidas do Poder Público, pois ele, no vazio diversificante de uma pretendida tessitura moral da Constituição, ainda é capaz de fazer crescer, por conta de uma pressão social ainda com parâmetros meramente idealistas da senda constitucional, uma nova torrente de manifestações democráticas da Administração Pública, muito embora ainda inebriada pelo legalismo de antanho, isto é, pela segurança do erro certo e legalizado até o devir das garantias institucionais e administrativas que assegure as desejáveis garantias dos administrados.

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Nesse sentido, vide ALBUQUERQUE JÚNIOR, Raimundo Parente de. Juridicidade contra legem no processo administrativo. Limites e possibilidades à luz dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. p. 261-315. E que tem crescido à medida que recrudescem os fins do Estado.

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Sendo que a contextura constitucional revela luzes sobre a atuação administrativa, e o reluzente descortinar da disciplina jurídica dos institutos administrativos passa, necessariamente, pela superação do ofuscamento dos primeiros brilhos da senda constitucional, não se afigura impertinente afirmar que a releitura do direito administrativo, sob a égide dos avanços constitucionais, não representa apenas um mero apelo ideológico à consolidação de uma Administração Pública mais democrática, eficiente e garantidora de direitos fundamentais dos direitos dos cidadãos, mas que ela exige uma operativa evolução dos mecanismos ou instrumentos jurídicos indispensáveis à perfectibilização das manifestações do Poder Público, que só ocorrerá em função de concretos efeitos dos textos jurídicos decorrentes de uma precisa adequação dos direitos dos servidores para o regular exercício de suas competências na prossecução do interesse público. É dizer, contra um Estado que ainda possui os ranços de uma atuação administrativa imperativa e autocrática, e isso não é difícil de ser compreendido, exige-se muito mais que a imposição legal lastreada no dever de o servidor promover uma conduta irrepreensível e eficiente, vai-se bem mais além: impõe-se a constituição de meios para promovê-las, ou mesmo exigi-las, em face de contextos geralmente bem adversos, pois, tal como o administrado, o agente público também pode ser vítima da truculência estatal, de maneira que a promoção da prestigiada eficiência funcional carece, muitas vezes, da concessão de importantes prerrogativas funcionais, que não se confundem logicamente com odiosos privilégios ostentados por alguns agentes públicos. 5 Conclusão Considerando as ligeiras ponderações apresentadas acima, especialmente por questionar o tratamento linear dispensado aos parâmetros constitucionais na ambiência administrativa, concluímos que: (a) o constitucionalismo antecedeu às constituições escritas do século XVIII e, mais que isso, demandou uma necessária discussão do problema da técnica constitucional ao longo dos séculos, tudo de forma a contemplar uma relação mais precisa e harmoniosa entre o poder do Estado e os direitos e garantias fundamentais dos cidadãos sob o influxo das políticas epocais; (b) o neoconstitucionalismo que propõe, e não se pode negar isto, uma apro­ ximação identificativa ou justificativa de valores entre o direito e a moral, em que pesem alguns benefícios em prospecção com o positivismo clássico, apresenta sérias resistências por considerável parcela da doutrina constitucional, haja vista a sua discutível utilidade para impulsionar certeza ao direito, pois, muitas vezes, assenta-se numa frágil argumentação jurídica em função de uma canhestra metodologia adotada, no que possibilita uma fragmentariedade decisória para casos semelhantes, haja vista a ausência de tratamento uniforme por parte dos magistrados, Int. Públ. – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015

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fazendo com que seja reservado à decisão judicial um indevido espaço para uma verdadeira álea jurídica; (c) por possuir uma intensa e estreita relação com o direito constitucional, defende-se que o direito administrativo, mais que qualquer outro ramo jurídico, deveria absorver imediatamente as interferências ou implicações do itinerário constitucional, de modo que a sua evolução seguiria o rumo harmonioso dos comandos constitucionais; todavia, inexiste essa absorção imediata e convergente da senda constitucional, porém, ele se inclina, cedo ou tarde, ao necessário reconhecimento dos prognósticos evolutivos dos movimentos constitucionais, ainda que em função de justificáveis ingerências do Poder Judiciário; e (d) o neoconstitucionalismo, malgrado revele uma perigosa aproximação entre o direito a moral, se observados os devidos cuidados quanto à contextura dos imperativos do direito público, no que absorve os conclaves de uma gestão pública democrática, pode fazer com que ocorra uma efetiva releitura de vários institutos do direito administrativo, de sorte a possibilitar uma evolução (i) na forma de promover os deveres prestacionais positivos fáticos do Estado, (ii) bem como na relação entre a Administração Pública e os administrados, porém, isto deve ficar claro, as releituras não devem assinalar posições ou expressões meramente retóricas sobre os objetos estudados, exige-se, acima de tudo, operatividade em função das mudanças realizadas.

Abstract: This paper aims to discuss the meaning and scope of neoconstitutionalism in law enforcement in administrative ambience and also promote the possible relationship between the development of the constitutional movement for the formation of the profile of Public Administration and of course for the evolution of Administrative Law. Keywords: Constitutionalism. Neoconstitutionalism. Public Administration. Administrative Law.

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Informação bibliográfica deste texto, conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT): LIMA, Raimundo Márcio Ribeiro. O neoconstitucionalismo e a evolução do direito administrativo. Interesse Público – IP, Belo Horizonte, ano 17, n. 90, p. 69-90, mar./abr. 2015.

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