O (NOVO) PAPEL DOS MUNICÍPOS NA SEGURANÇA PÚBLICA 1

May 28, 2017 | Autor: Alberto Kopittke | Categoria: Segurança Pública, Cidades, Municipios, Guardas Municipais
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O (NOVO) PAPEL DOS MUNICÍPOS NA SEGURANÇA PÚBLICA1 Alberto L. Kopittke2

Introdução

O Brasil tem visto os seus indicadores de Direitos Humanos e violência se degradarem de forma crescente desde a redemocratização, sendo hoje o país com o maior número de homicídios, em termos nominais, do mundo, o que já representa mais de 10% das mortes violentas do mundo (UNODC 2011). Desde 1980, mais de 1.2 milhão de pessoas foram vítimas de homicídio no país, com uma taxa de crescimento no período de 132,1% (SANGARI, 2012). O Brasil tem hoje mais de 715 mil pessoas presas, um crescimento de mais de 600% desde 1990, com a terceira maior população carcerária do planeta (CNJ, 2014) e 15 das 50 cidades mais violentas do mundo (ENGEL; STERBENZ; LUBIN, 2013). A violência e a sensação de insegurança são hoje fatores de grande impacto na rotina de todas as grandes cidades brasileiras, desde seus aspectos arquitetônicos até as atividades econômicas, trazendo muitos prejuízos na qualidade de vida de milhões de pessoas em todo país, em especial dos mais jovens3. Apesar dessa situação em que muitas administrações municipais se sentem de mãos atadas, este artigo pretende demonstrar que as Prefeituras possuem um grande leque de ações ao seu alcance, independente da forma como a Constituição Federal hoje regule as competências sobre o controle das polícias. Essas ações, porém, tem ficado relegadas a um segundo plano de prioridades, ou são desconhecidas mesmo, em razão de uma determinada concepção, hoje ainda predominante no Brasil sobre o que seja Segurança Pública. A discussão sobre o papel dos municípios na Segurança Pública no Brasil, que tem ganhado força a partir da Constituição Federal de 1988, está inserida na construção, ainda incipiente no Brasil, de um novo paradigma4 sobre a própria violência e o papel do

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Artigo publicado em

KOPITTKE, A. L.. O papel dos municípios na segurança pública. In: Gilmar Mendes. (Org.). Gestão Pública e Direito Municipal: Tendências e Desafios. 1ed.Porto Alegre: Saraiva, 2016, v. 1, p. 25-. 2

Advogado. Foi Coordenador Nacional da 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública, Diretor do Departamento de Políticas e Projetos da Secretaria Nacional de Segurança Pública e Secretário Municipal de Segurança Pública de Canoas/RS. Atualmente é Mestrando no Programa de Ciências Criminais da PUC-RS, Vereador na Cidade de Porto Alegre/RS e membro do Conselho Nacional de Segurança Pública. 3 Segundo pesquisa mundial da UNICEF (2014), o Brasil é o sexto país do mundo mais perigoso para umjovem de 14 a 19 anos viver. O estudo aponta que muitos dos avanços conseguidos em termos de mortalidade infantil são minimizados devido a essa alta taxa de homicídio. 4 Paradigma: “modelo científico de verdade, aceito e predominante em determinado momento histórico.” (KUHN, 1975,

Estado, numa sociedade livre e democrática.

1. O PARADIGMA TRADICIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA

O racionalismo moderno projetou para os sistemas jurídicos legais a capacidade de regular de forma plena e segura as relações sociais 5. As codificações modernas seriam capazes de prever todas as situações relevantes para o bom convívio social e todos os conflitos seriam resolvidos pelo devido enquadramento jurídico, teoricamente neutro de interesses. O Direito Penal moderno, nasce então, como a grande tecnologia de controle da sociedade, a partir da crença sobre sua capacidade em “dissuadir” e “reformar” comportamentos desviantes, pela ideia do castigo estatal. As instituições públicas que nasceram desse pensamento, se orientaram pela crença de que a segregação social do indivíduo deliquente, seriam os únicos, ou pelo menos, os mais eficazes meios capazes de garantir a ordem social. Nessa concepção, as razões da violência na sociedade eram buscadas em características individuais, de origem genética ou psicológica, que determinavam o comportamento desviante e informavam a sua possibilidade de ressocialização. Era sobre esse indivíduo que as forças do Estado deveriam agir para garantir que a sociedade pudesse se desenvolver com ordem e tranquilidade. A história brasileira agregou a esse paradigma algumas outras peculiaridades. Desde nossa colonização até o ciclo dos regimes autoritários (Estado Novo e Regime Militar), o tema da Segurança Pública se desenvolveu norteado de um lado pela militarização6 e de outro por uma ideologia jurídica elitista e hierarquizada. A militarização se caracteriza por “um processo de adoção e emprego de modelos, métodos, conceitos, doutrinas, procedimentos e pessoal militares em atividades de natureza policial”, e que influenciam o pensamento toda a sociedade e das demais instituições. Por decorrência, as concepções voltadas para o combate ao inimigo se tornam uma referência no país, em relação aos temas de violência (ZAVERUCHA, 1999). Esse processo praticamente impediu o desenvolvimento da Segurança Pública enquanto p. 218) Sobre a evolução do Positivismo jurídico na modernidade ver LYRA FILHO, 2006. p. 23-48 e WOLKMER, 2006, P. 2-3 6 Importante notar duas exceções a essa regra: a Guarda Nacional, que existiu de 1831 até o final do século XIX, em razão do enfraquecimento do Exército, muito identificado com a Colônia. A Guarda Nacional chega a ter em seu auge mais de 500 mil membros, entre membros ativos e da reserva e é desmobilizada conforme as Forças Armadas retomam força, a partir da Proclamação da República, em 1889. A segunda experiência é das Guardas Civis Estaduais, que nascem no vácuo causado por essa desmobilização, que são criadas pelos Estados, a partir de 1906, no Paraná, e são organizadas tendo por referência a Polícia Metropolitana de Londres. As Guardas Civis foram extintas a partir do decreto-lei 667, de 1969), no processo que resultaria na criação das Polícias Militares Estaduais (decreto-lei n.217 de 8 de abril de 1970 ), vinculadas ao Exército. Modelo este mantido pela Constituição de 1988 (artigos.....). 5

campo institucional e de conhecimento próprio, norteado pelos direitos civis, o que ocorreu nas democracias mais sólidas, desde o final do Século XIX (MONET, 2006, p. 236). Em relação ao campo jurídico, a existência paradoxal de uma ideologia formal igualitária e uma ordem social hierarquizada relegou à polícia a tarefa de vigilância das classes pobres. Por meio de práticas arbitrárias de aplicação da lei e do uso da violência, conforme o status social de cada pessoa, foi se desenvolvendo um sentimento de desconfiança e temor entre a polícia e esses grupos, num processo de estigmatização que se autorealiza e que cada vez mais aumenta e cristaliza as diferenças sociais. (KANT DE LIMA). Esses elementos confluem para formar o que poderíamos chamar de concepção tradicional sobre a Segurança Pública, ainda largamente hegemônica no país. Em razão dessa visão, todos os problemas de violência são jogados sobre os ombros das polícias. A atuação destas, por sua vez, é resumida a um papel reativo, sempre agindo após a situação de violência tanto em suas atribuições investigativa/judicial, quanto nas de policiamento ostensivo, no que pode ser chamado de “hipertrofia da missão repressiva”, jogando a polícia num fenômeno que, segundo Rolim (2006, p 27-37) lembra a frase dita pela Rainha Vermelha à Alice: “Pois aqui como vê, você tem que correr o mais que pode para continuar no mesmo lugar”. Colocadas num estado permanente de emergência e pressão pública por resultados, as instituições policiais realizam apenas operações pontuais (de pequeno ou grande porte), sem planejamentos estratégicos de médio ou longo prazo ou sem mensurar o impacto de sua atuação. Atuando em permanente competição e desconfiança, agem sem integração entre si e sem qualquer tipo de integração com outros campos do conhecimento ou políticas públicas. Fechadas em suas tradições e em sua cultura institucional, muitas polícias não possuem processos públicos de tomada de decisão e avaliação de suas ações 7, baseados em evidências científicas. Pesquisas e avaliações sobre as metodologias implementadas são vistas como perda de tempo e refutadas a priori. Propostas de reformas são vistas como ofensas, por um segmento que cada vez mais vê o mundo com ceticismo, se sente injustiçado e (não sem razão) desvalorizado. Assim o modelo policial se fecha cada vez mais em si mesmo e é cobrado por resultados que jamais poderá produzir de forma isolada, numa perigosa espiral de distanciamento entre expectativas sociais e resultados institucionais, que produzem perda 7

Segundo Relatório do Tribunal de Contas da União, 24% das Organizações de Segurança Pública não possuem referencial estratégico e 60% não formalizaram seus planos estratégicos e apenas 20% divulgaram seu referencial estratégico interno e externamente. TCU (2014, p. 27)

de confiança pra fora e desestímulo para dentro. As instituições não avançam em accountability8, transparência, participação social, controle civil e responsabilização, princípios basilares da gestão pública num Estado Democráticos de Direito 9. A sociedade amedrontada pede respostas imediatas, cada vez menos preocupada com os meios empregados, num ciclo que se retroalimenta e faz com que a crença na democracia se enfraqueça, legitimando a aplicação arbitrária da violência e intervenções de cunho militar contra população civil. Diferente do que se imagina, a cada ano, os indicadores oficiais demonstram um aumento do trabalho policial, em atividades como prisões, recuperação de veículos e apreensão de armas10. Isso demonstra que problema do aumento da violência que o país vivência nas últimas décadas não reside na falta de “eficácia” das instituições policiais. O problema talvez se encontre nas próprias concepções que estão sendo utilizadas para se compreender e atuar em relação a violência. Para melhor ilustrar o atual paradigma das políticas de Segurança Pública no Brasil e perceber as possibilidades de mudança, é relevante traçar um paralelo com as antigas concepções que norteavam as ações na área de Saúde Pública. A saúde pública, que historicamente era organizada a partir de um modelo reativo, focado na doença, sem planejamento ou modelo de financiamento, médico-centrado e hospitalocêntrico, passou por uma grande transformação a partir da década de 80, em especial da 8 Conferência Nacional de Saúde. A partir da mobilização de diversos setores da sociedade, uma nova concepção passou a impulsionar a construção do que se chamou Sistema Único de Saúde (SUS). Voltado na prevenção em saúde, com abordagem familiar e comunitária, multidisciplinar, orientada permanentemente por estudos epidemiológicos e evidências científicas, estruturado por um sistema de financiamento e de responsabilidades entre os três entes da federação, com especial destaque para o papel dos municípios na atenção básica, e “Accountability: termo em inglês cujo conceito envolve responsabilidade (objetiva e subjetiva), obrigação de prestar contas, justificativas para as ações que foram ou deixaram de ser empreendidas. Traz implicitamente a responsabilização pessoal pelos atos praticados. (…) Relaciona-se com democracia visto que é maior o interesse por ela em sociedades que apresentam avançado estágio democrático.” (PINHO & Sacramento, 2009) 9 É importante destacar que esse extenso e complexo conjunto de elementos, que tem sido referidos como 8

características necessárias para a construção de instituições policiais num contexto contexto democrático, é recente mesmo nas nações de democracia mais consolidada no mundo. Essas idéias tem se desenvolvido na medida do fortalecimento das lutas pelos direitos civis e teve um grande salto especialmente a partir da onda de manifestações sociais por direitos civis no final dos anos 60 e início dos anos 70, nos EUA e na Europa. Sobre o tema, ver MONET, 2006 e GOLDSTEIN, 2003. 10

O I Mapa da Segurança Pública e Direitos Humanos de Porto Alegre, demonstra que entre 2011 e 2013, o número total de ocorrências policiais aumentou de 736.516 para 775.160, o numero de armas de fogo apreendidas aumentou de 7.283 para 8.256 e o número de veículos recuperados subiu de 15.430 para 18.698, porém o número de homicídios e roubo de veículos não parou de subir (KOPITTKE e BASSANI, 2014)

de acesso universal. Em 30 anos, o Sistema logrou expressiva melhoria dos indicadores de saúde no país (CONASS, 2011). Como se vê, não se tratou tão somente de transferência de responsabilidades para o município, dentro das antigas concepções que orientavam as políticas de saúde, mas de uma profunda mudança de concepção. No caso da Saúde Pública, não mais focado na doença, mas na saúde. No caso da Segurança Pública, apesar de ainda incipiente, já se inicia o movimento para que se supere o atual paradigma focado na violência, para uma nova concepção, como se verá a seguir.

2. O NOVO PARADIGMA DE SEGURANÇA PÚBLICA E OS MUNICÍPIOS

A busca por alternativas a essa concepção tradicional de intervenção do Poder Público em relação ao fenômeno da violência não é nova (AZEVEDO e PAZINATO, 2007, pp. 5-7). Enquanto os estudos de Lombroso, sobre a medida de crânios para apontar o perfil do homem delinquente, ainda ecoavam como paradigma para a busca das causas da criminalidade11, começaram a surgir distintas teorias baseadas na ideia de que o delito é um fato social (nem individual nem patológico), chamadas de “enfoques sociológicos sobre o delito” (Elbert, 2009, p. 155). Uma dessas escolas de pensamento focou sua atenção na relação entre o crime e a questão urbana. Foi no contexto do grande inchaço urbano experimentado pelos EUA, no início do Século XX que, não por acaso, a cidade de Chicago viu florescer esse pensamento baseado no que se chamou de “Sociologia dos grandes centros urbanos” ou “Ecologia Criminal”. Importante lembrar que nesse período a cidade enfrentou uma grande onda de violência provocada pela força e violência da máfia, que adquiriu muito poder a partir do Proibição do álcool naquele país12. A chamada Escola de Chicago desenvolveu uma compreensão sobre o crime na qual as condições urbanas, como densidade, urbanismo e condições básicas de infraestrutura tinham um papel central. Na ausência de condições básicas, algumas áreas ficariam suscetíveis ao desenvolvimento da deliquência. Para reverter essa situação, seus pensadores começaram a defender a necessidade de “tecnologiais sociais”, isto é, intervenções planejadas e de grande impacto nessas áreas. 11

Sobre o Positivimo criminológico, que misturou conhecimentos das ciências sociais e das ciências naturais, para identificar as origens do delito e mensurar suas tendências, com base em características biológicas advindas da Medicina e sua influência sobre o pensamento jurídico ver ELBERT, 2009, p. 65 - 75 12 A Proibição foi aprovada com a introdução da 18ª Emenda à Constituição dos EUA, que passou a vigorar em 1920, proibindo a fabricação, o comércio, o transporte, a exportação e a importação de bebidas e foi revogada apenas 12 anos depois, em razão dos efeitos totalmente contrários ao esperado que produziu.

Os formuladores dessa escola apontavam que o sucesso dessas intervenções estava vinculado a forma participativa de sua construção, com o conjunto da comunidade, para que as ações fossem condizentes com suas reais necessidades e se conseguisse forte mobilização social para a transformação do ambiente. Portanto, enquanto a concepção tradicional, acima descrita, sobre a violência partia da ideia de uma sociedade homogênea, que deveria ser protegida pelas forças do Estado, afastando os indivíduos de comportamento inadequado, a nova concepção parte da ideia de uma sociedade diversa e plural, onde o papel do Estado deva ser o de garantir a liberdade individual e fomentar o reconhecimento cultural, por meio de um ambiente que estimule a convivência no espaço público13. A partir da década de 80, essa concepção sobre o papel da cidade nas políticas de prevenção volta a ganhar força, através de uma escola chamada “Nova Prevenção” (DIAS NETO, 2006), que novamente procura retirar do âmbito do Direito Penal a leitura primordial sobre os conflitos sociais. A Nova Prevenção, ao buscar uma compreensão multidisciplinar sobre as razões dos conflitos e do sentimento de insegurança, defende a construção de alternativas inclusivas e da implementação de políticas que estimulem e fortaleçam os vínculos sociais, através de uma nova compreensão sobre o papel do Poder Público em geral e da polícia especificamente14..

3. A CHEGADA DA NOVA VISÃO NA AMÉRICA LATINA

Desde o final da 2ª Guerra Mundial, as potências mundiais (EUA e URSS) haviam despendido grande volume de recursos em assistência militar entre seus aliados, sem qualquer preocupação com suas consequências para a democracia e os direitos humanos. Com a Queda do Muro de Berlim, em 1989, tem início um processo mundial de reversão do legado da Guerra Fria, especialmente com a desmilitarização e reforma da Segurança Pública (WULF, 2004). Na América Latina, esse processo é impulsionado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o qual tem procurado difundir desde os anos 90, esse novo conceito sob o nome de Segurança Cidadã. (ACERO, p. 181-182) Segundo essa concepção, as políticas de segurança devem partir do conceito de desenvolvimento humano sustentável e estarem voltadas ao fortalecimento das 13 14

Para uma discussão mais aprofundada sobre as diferentes teorias criminológicas críticas ver: LARRAURI (2000). Sobre Reformas inovadoras nas polícias, ver BAYLEY & SKOLINCK (2006), em que os autores apresentam o resultado de ampla pesquisa feita no início dos anos 70, sobre novas formas de organização das instituições policiais e das metodologias de policiamento voltadas para a aproximação com as comunidades, que passaram a ser referências para as polícias dos EUA nas décadas seguintes.

instituições democráticas, da liberdade e da dignidade da pessoa e não mais nos antigos conceitos de Segurança de Estado. As ações das diversas instâncias do Estado devem estar voltado para criar as condições e estimular a convivência pacífica entre os cidadãos, em especial com a revitalização de áreas degradas e a reocupação do espaço público das grandes cidades (ACERO, 186-187), o engajamento da sociedade civil em políticas de inclusão social e prevenção integrada (AZEVEDO, 2006), numa nova visão “compreendida como uma estratégia interdisciplinar, comunitária, baseada em fatores socioculturais e articulada em vários níveis da atuação governamental” (Kahn e Zanetic, 2005, p. 50 e ). A concepção tradicional de segurança pública, aponta que os esforços para reduzir a violência devem estar voltados para o aumento dos efetivos do policiamento ostensivo, (utilizados no formato tradicional de rádio-patrulha motorizada, respondendo aos chamados de emergência15), baseado no que hoje é criticamente chamado de “Mito do Espantalho” (HIPÓLITO & TASCA, 2012 p. 105). Nessa concepção, os municípios deveriam se restringir a tarefa de aumentar o efetivo das Guardas Municipais16, replicando muitas vezes as concepções reativas e pontuais acima elencadas. Seja pelo fato de terem mais proximidade com as diversas comunidades locais e com as próprias autoridades policiais ou por terem a responsabilidade na gestão de praticamente todas as demais políticas sociais como saúde, educação e assistência social, além da infra-estrutura e dos serviços urbanos, os municípios surgem como protagonistas fundamentais dessa nova concepção sobre as políticas públicas de Segurança, com especial enfoque em áreas com altos índices de violência (MIRAGLIA, 2008, p. 89 e BEATO, 1999). Estudando as razões da queda dos homicídios no estado de São Paulo KAHN E ZANETIC (2005), apontam que a entrada dos municípios no tema da Segurança Pública, de uma forma muito mais ampla do que a mera criação de Guardas Municipais, teve um papel relevante para a redução ocorrida nos indicadores de violência letal daquele estado (o que não ocorreu nos demais estados brasileiros). A pesquisa demonstra que iniciativas adotadas pelos municípios da Região Metropolina de São Paulo, como: fechamento de bares a partir das 23 horas17 (adotada

Colocar referência sobre a chance de uma patrulha “pegar” um criminoso em flagrante. Kahn e Zentic (2005, p. 49), encontraram evidências que apontam que no caso de municípios pequenos, totalmente urbanizados, um aumento expressivo do efetivo ostensivo (através da criação de Guardas Municipais) podem ter um efeito significativo sobre certos crimes (em especial patrimoniais), destacando porém que é fundamental que a alocação desses efetivos seja feita com base em pesquisa técnica e com qualidade no relacionamento com a comunidade. 17 Diversas pesquisas (….) apontam a relação entre o consumo de álcool e os índices de violência. No Brasil o consumo de álcool de aumentado muito rapidamente: de 1,88 litro per capta em 1961 para 5,32 litros per capita por ano em 2001, um aumento de 182%. Conforme estudos do Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas 15 16

por 16 cidades após 2001), Leis de Divulgação do Disque Denúncia (8 após 2001), campanhas de entrega de armas, aumento das taxas de matrículas, permanência na escola e projetos de Educação de Jovens e Adultos, além da criação de Guardas Municipais

e

diversas

outras

iniciativas

preventivas

integradas

em

esforços

multiagenciais, a partir de Planos Municipais de Segurança Pública, tiveram importante impacto na redução das taxas de homicídios e crimes patrimoniais naquele estado.

4. PANORAMA ATUAL SOBRE O PAPEL DOS MUNICÍPIOS NA SEGURANÇA NO BRASIL

a) Apoio do Governo Federal (anos 2000)

Desde a redemocratização brasileira, pode-se falar de uma tendência de municipalização da segurança Pública no Brasil, com a criação de Secretarias e Guardas Municipais (MISSE & BRETAS, 2010, p. 9-11). Em 2012, 993 municípios já contavam com Guardas Municipais, o

equivalente a 17,8% do total de cidades do país (em 2009, essa proporção era de 15,5%), sendo que 153 já contavam com guardas municipais equipados com armas de fogo (IBGE, 2012). No total, as Guardas Municipais já alcançavam naquele ano o expressivo contingente de 96.147 Guardas Municipais (FBSP, 2014 pp. 8485). Foi a partir do ano 2000 que o Governo Federal passou a potencializar o papel dos municípios na Segurança Pública, tanto do ponto de vista quantitativo (financeiro), quanto qualitativo (em relação ao novo paradigma de Segurança Pública). Através de repasses do Fundo Nacional de Segurança Pública, o Governo Federal investiu cerca de R$ 60 milhões, nos municípios entre 2001 e 2003 (Kahn e Zanetic, p.3). (CEBRID), a taxa de dependentes de álcool no país é de 11,2% e entre os homens adultos com idade de 18 a 24 anos, a taxa de dependentes chega a 26,3%, colocando o Brasil entre os cinco da lista com mais jovens dependentes. Estudo de Duarte e Carlini-Cotrim, que analisou processos de homicídios em Curitiba entre 1990 e 1995, em 76,2% ou a vítima ou o autor ou ambos estavam sob influência de álcool no momento da ocorrência. Pesquisa realizada com vítimas não fatais de agressões atndidas em um importante serviço de emergência do Município de São Paulo, encontrou um percentual de alcoolemia em 46,2%. No estado de São Paulo, a proibição de venda de bebidas alcólicas após às ___ horas, acompanhada de forte trabalho de fiscalização por parte do município, teve grande impacto em pelo menos 4 cidades (Osasco, Embu, Diadema e Mauá), respondendo pela redução de pelo menos 750 assassinatos nos dois anos seguintes a implantação da Lei, o que equivaleu a uma queda de 21% dos homicídios em todo o Estado. (Kahn e Zanetic, 2005, p. 28-43) Importante ainda perceber a diferença entre as políticas de proibicionismo, como a adotada nos EUA na década de 20, em relação ao álcool e em todo o mundo a partir dos anos 60, em relação aos derivados da planta de coca e da maconha, das políticas de regulamentação, utilizadas nesses casos pelos municípios em relação ao álcool ou em todo o país em relação ao tabaco, nas últimas duas décadas. No proibicionismo toda a cadeira produtiva e o consumo se tornam ilegais, enquanto no segundo são criadas regradas de regulação, que podem ser modificadas conforme seus impactos, sobre a produção, transporte, venda e consumo de determinadas substâncias.

No entanto, foi com o surgimento do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), em 2007, na gestão do Ministro Tarso Genro, que o tema ganhou uma nova relevância. O PRONASCI além de ser efetivamente o primeiro Programa Nacional de Segurança Pública, colocou os municípios como atores centrais na nova política de segurança. Ao longo dos seus quatro anos de existência (2008-2012), o Programa destinou R$ 353.010.080,81 para um total de 111 municípios beneficiados (FGV, 2009). Além disso, o Ministério ainda destinou entre 2008 e 2010, R$ 48.282.530 para outros 91 municípios, através do Fundo Nacional de Segurança Pública, que continou existindo como fonte de financiamento além do Pronasci. Os municípios se tornam os responsáveis pela implementação de diversas políticas sociais desenhadas pelo Ministério, como: Projeto, programa voltado para jovens; Mulheres da Paz, voltado para a formação e empoderamento de mulheres, Justiça Comunitária, para implementação de centros de mediação de conflitos. Além disso, o Pronasci financiou a estruturação dos Gabinetes de Gestão Integrada Municipal, de Observatórios Municipais de Segurança e de Sistemas de Videomonitoramento, para fortalecer as Secretarias Municipais de Segurança Pública. No campo da formação, através da Rede Nacional de Altos Estudos em Segurança Pública (Renaesp), as Guardas Municipais receberam tele-centros para a realização de cursos a distância e passaram a receber uma Bolsa Formação, no valor de R$ 400, como forma de estímulo para a realização dos cursos oferecidos. Porém, a partir de 2010, a nova gestão do Governo Federal modificou suas prioridades e não deu sequência aos programas de fomento do novo papel dos municípios na Segurança, com a mesma intensidade.

b) Conferência Nacional de Segurança Pública (2009)

Com o objetivo de elaborar uma Política Nacional de Segurança Pública e sob a orientação programática do Pronasci, o Ministério da Justiça, promoveu em 2009, a primeira Conferência Nacional de Segurança Pública, na qual os municípios tiveram papel central. Entre 1º de fevereiro a 30 de maio de 2009, 265 municípios realizaram conferências municipais, reunindo 25.645 participantes nos debates e elegendo representantes para as etapas estaduais e nacional. (CONSEG, 2009, p. 56-57) Durante o processo de construção da Conferência, ainda foi criada o Conselho Nacional de Secretários e Gestores Municipais de Segurança (Conseges), com o objetivo

de partilhar experiências e fortalecer o papel dos municípios (PNUD, 2009). Como resultado, na Etapa Nacional, que reuniu 3.060 representantes eleitos entre representantes de todos os setores da segurança pública, gestores e sociedade civil, foram escolhidos 10 princípios que deveriam nortear a Política Nacional de Segurança Pública, na continuidade do Pronasci. O papel do município e a concepção de Segurança Pública aqui expressa tiveram amplo apoio entre os princípios priorizados, como por exemplo (CONSEG, 2009, p. 80): 1º Princípio (793 votos) Ser uma política de Estado que proporcione a autonomia administrativa, financeira, orçamentária e funcional das instituições envolvidas, nos três níveis de governo, com descentralização e integração sistêmica do processo de gestão democrática, transparência na publicidade dos dados e consolidação do Sistema Único de Segurança Pública - SUSP e do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania - PRONASCI, com percentual mínimo definido em lei e assegurando as reformas necessárias ao modelo vigente

5º Princípio (258 votos) Pautar-se pelo reconhecimento jurídico-legal da importância do município como co-gestor da área, fortalecendo sua atuação na prevenção social do crime e das violências.

6º Princípio (243 votos) Ser pautada na intersetorialidade, na transversalidade e na integração sistêmica com as políticas sociais, sobretudo na área da educação, como forma de prevenção do sinistro, da violência e da criminalidade, reconhecendo que esses fenômenos tem origem multicausal (causas econômicas, sociais, políticas, culturais, etc.) e que a competência de seu enfrentamento não pode ser de responsabilidade exclusiva dos órgãos de segurança pública

c) Parecer do Conasp (2010)

Sobre o papel crescente dos municípios na área, é significativo o fato de que o primeiro Parecer da história do novo Conselho Nacional de Segurança Pública (CONASP, 2010), o qual composição tripartite entre gestores, servidores da Segurança Pública e membros da sociedade civil, aprovado em 2010, versou exatamente sobre “O Papel dos Municípios na Segurança Pública”. O

Parecer

define

a

perspectiva

da

“integração,

da

intersetorialidade,

transversalidade e integração sistêmica com as políticas sociais” como elementos norteadores da atuação municipal, sendo que o “foco da atuação do município deve ser a prevenção a violência”. O documento recomendou que os municípios implantem os Gabinetes de Gestão Integrada (GGI-M), elaborem planos municipais de segurança, precedidos de pesquisas e estudos que favoreçam um diagnóstico adequado da realidade, para o que devem ser implementados observatórios de segurança pública, destacando ainda que a participação social através dos conselhos municipais de segurança, fóruns de segurança, e conferências municipais de segurança deve ser assegurada.

c) Estatuto das Guardas Municipais (2014)

Nessa perspectiva, o Governo Federal elaborou e o Congresso Nacional aprovou recentemente a Lei 13.022/14, o Estatuto das Guardas Municipais, que representa o mais importante marco legal até o momento sobre o papel dos municípios na Segurança Pública. Apesar de se restringir ao papel das Guardas Municipais (GM), a lei expressa um grande avanço na direção do novo paradigma acima referido, ao garantir o caráter civil e preventivo das Guardas Municipais, que passam a ser compreendidas como órgão central para a construção de políticas sociais e urbanísticas integradas. Destaque-se que a Lei estabelece competências para as Guardas Municipais (art. 5) como: estabelecimento de parcerias com órgãos estaduais, municípios vizinhos e da União com vistas ao desenvolvimento de ações preventivas integradas (X), para que as GMs envidem esforços para articular-se com os órgãos de políticas sociais, visando à adoção de ações interdisciplinares (XI), contribuir no estudo de impacto na segurança local, conforme plano diretor municipal, por ocasião da construção de empreendimentos de grande porte (XV), desenvolver ações de prevenção primária (XVI), atuar mediante ações preventivas na segurança escolar (XVIII), além da possibilidade de criação conjunta de Guardas entre municípios por meio de Consórcio Público (Art. 8). A Lei é um importante marco de desmilitarização das forças de polícia, ao afirmar a necessidade de observação da matriz curricular nacional para a formação (Art. 11, Parágrafo único), a vedação de que o órgão de formação seja o mesmo de qualquer força militar (art. 12, parágrafo 3º), obrigatoriedade de código de conduta próprio e vedação de utilização de códigos militares (art. 14), vedação que a coordenação da Guarda seja feita por pessoa externa aos quadros da própria Guarda (o que é um avanço em relação a ocupação dessa função por oficiais das Polícias Militares, que ocorre em várias cidades do país), carreira única (art. 15, parágrafo 3º) e a vedação de utilização das

denominações militares sobre postos, graduações, uniformes, distintivos e condecorações (art. 19). O dispositivo legal ainda avança ao estabelecer a obrigatoriedade de ouvidoria externa, independente, com mandato, (Art 13, parágrafo 2º) e a possibilidade de constituição de órgão colegiado para a avaliação e monitoramento das atividades (art. 13, parágrafo 2º) e na necessidade de se observar percentual mínimo de mulheres (art. 15, parágrafo 2º).

5. EXPERIÊNCIAS EXITOSAS

a) Bogotá (Colômbia)

As mais famosas experiências de implementação do paradigma de Segurança Cidadã na América Latina, até o momento foram as gestões municipais de Bogotá e Medelín, na Colômbia. Durante sua formação histórica, a Colômbia também privilegiou uma concepção de resolução violenta e coercitiva dos conflitos entre os cidadãos, sem nenhum tipo de abordagem preventiva e integral. A Constituição Colombiana de 1991, o marco da redemocratização do país, inovou ao criar uma cadeia de comando da Polícia Nacional que começa pelo Presidente, passa pelo Governador e delega ao Prefeito (art. 315) a autoridade de polícia do município: Art. 315. São atribuições do prefeito:

2. Conservar a ordem pública no município, em conformidade com a lei e as instruções e ordens que reba do Presidente da República e do respectivo governador. O prefeito é a primeira autoridade de polícia do município. A Polícia Nacional cumprirá com prontidão e diligência as ordens impostas pelo prefeito.

Porém, num contexto de profunda crise de violência, em que os cartéis de produção de cocaína confrontaram belicamente as instituições pública, a maioria dos Prefeitos decidiu não exercer suas novas atribuições, as quais também não haviam sido bem recebida pelos oficiais da Polícia Nacional. Apesar da mudança Constitucional, em razão da ausência de modificação da concepção sobre as políticas públicas de Segurança, praticamente nada foi feito na maioria das cidades do país, onde as taxas de violência continuaram subindo aceleradamente. No entanto, as cidades de Medellín, a partir de 1991, e a cidade de Bogotá, durante três administrações seguidas (Mockus 1995-1997, Peñalosa 1998-2000 e Mockus 2001-

2003), mesmo de Partidos diferentes, decidem mudar sua abordagem sobre o tema. Em Bogota18, o exito na nova abordagem faz as taxas de homicídio cairem de 80 por 100 mil habitantes em 1993, para 22 por 100 mil em 2003 e os roubos despencam de 23 mil em 1996, para 9 mil casos em 2002 (SAPORI, 2007, p. 89). Antanas Mockus, ao assumir a prefeitura da cidade coloca o tema da Segurança como a prioridade central de sua gestao. O Prefeito criou a Subsecretaria para a Convivência e a Segurança Cidadã (que foi formada por uma equipe técnica multidisciplinar), e o Conselho de Segurança da Cidade, formado pelos comandantes de todas as unidades especiais e distritais da Polícia, vinte conselheiros locais e Secretários Municipais (sem possibilidade de delegação), coordenado pessoalmente pelo Prefeito. O Conselho passou a se reunir semanalmente, sendo instituído como a instância central de gestão e elaborou no seu primeiro ano o Plano Integral de Segurança e Convivência. Para assessorar tecnicamente o Conselho, foi criado o Comitê de Vigilância Epidemiológica, que se reune semanalmente para a análise dos dados fornecidos pelo novo Sistema Unificado de Informação de Violência e Deliquência, e passou a impulsionar diversas pesquisas sobre o tema com as melhores Universidades do país. Dessa forma as diversas ações e projetos do Plano se estruturam a partir dos eixos: 1) Acesso a Justiça e fortalecimento da capacidade de investigação criminal: implementou projetos como Casas de Justiça, a capacitação em mediação de conflitos e juízes mediadores, e cria a Unidade Permanente de Justiça, em parceria com o Ministério Público e com o fortalecimento do Instituto Nacional de Medicina Legal, que qualifica e agiliza a formação das provas nas investigações; 2) Atenção a Jovens envolvidos em situações de violência. Mais de 25 mil jovens em situação de vulnerabilidade retornam a sala de aula e realizam capacitação profissional; 3) Melhoria da convivência e recuperação de espaços públicos: foram feitas grandes obras de infra-estrutura e construção de novos equipamentos públicos com grande qualidade, como biblioparques (grandes centros culturais para a juventude), escolas, quadras de futebol, etc, além de abertura de ruas, sinalização e iluminação em comunidade de periferia que receberam uma Intervenção Integral, orientada para a retomada do controle das áreas, antes dominadas pelos cartéis. 4) Controle do consumo de bebidas alcóolicas: estabeleceu-se o fechamento de todos os estabelecimentos que vendiam bebidas alcóolicas à 1:00 da manhã.

18

SAPORI (2007, p. 86 -93), destaca que o sucesso da experiência de Bogotá se deve a implementação simultânea entre políticas públicas abrangentes, tanto de prevenção quanto de repressão, de forma articulada e integrada.

5) Desarmamento: estímulo a entrega voluntária de armas e estímulo ao confisco de armas ilegais. Segundo pesquisas o número de cidadãos que apoiavam essas medidas saltou de 10% em 1994 (quando a polícia apreendia em média 1000 armas por ano) para 67% em 1998 (quando a polícia apreendeu 6000 armas). Apenas após o lançamento de uma forte campanha da Prefeitura, chamada “Que as armas descansem em Paz”, em 1996, os homicídios cairam 23% comparados com o ano anterior 19. 6) Capacitação da polícia e Polícia Comunitária: foram realizados cursos para mais de 14 mil policiais e agentes da segurança sobre a nova abordagem e cerca de 1.100 policiais passaram a realizar o policiamento comunitário, estimulando atividades de convivência nas comunidades e a mediação de conflitos. Foi feito uma reestruturação da Polícia com o objetivo de enxugar as atividades administrativas, o que resultou em 1500 policiais a mais nas ruas. 7) Participação Comunitária: a Prefeitura criou a Escola de Segurança Cidadão, que capacitou mais de 26.000 lideranças comunitárias em cursos de prevenção a violência e estímulo a convivência cidadã e foram criadas as Frentes Locais de Segurança (mais de 7 mil), com o objetivo de combater a apatia e a falta de solidariedade entre vizinhos. O setor privado da cidade, através da Câmara de Comércio e do maior jornail da cidade, criou o programa “Bogotá Como Vamos” que passou a fazer o monitoramento externo do Plano de Segurança e realizar pesquisas de vitimização percepção da violência, com o objetivo de apoiar e subsidiar as ações. São ainda realizadas campanhas massivas de cultura de paz e realizadas grandes mobilizações de ocupação dos espaços públicos, como caminhadas e pedaladas pela paz, que chegaram a reunir mais de 1 milhão de pessoas. 8) O Centro de Despacho da Polícia e os equipamentos de comunicação da Polícia foram foi totalmente modernizados, reduzindo o tempo médio de resposta de 20 para 5 minutos. Segundo Acero, foi fundamental para o sucesso da experiência de Bogotá e das demais cidades em que atuou (Quito, Medelín e El Salvador) a decisão do Prefeito em estruturar e institucionalizar os espaços de gestão sobre o tema, a garantia de recursos para a implementação das ações, a continuidade das políticas, a mobilização da sociedade civil e a integração e engajamento da polícia na nova concepção. O gestor ainda destaca que não houve nenhuma alteração nas leis penais durante esse período e expressa sua preocupação com a criação de forças policiais municipais, segundo ele “ignora-se que na América Latina as polícias locais não representam experiências bem-sucedidas”, que podem entrar em conflito com as polícias nacionais ou 19

Kahn e Zanetic, 2005, p. 19

estaduais, aumentar a fragmentação, além de serem vulneráveis ao envolvimento político e com o crime organizado20. b) Canoas – Rio Grande do Sul (Brasil)

No Brasil, recente experiência do município de Canoas, cidade de 340 mil habitantes na Região Metropolitana de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, teve bastante destaque pelas suas iniciativas no campo da Segurança Pública, baseadas nessa nova concepção21. Em 2010, o Prefeito recém eleito Jairo Jorge, coloca o tema como sua prioridade e estruturou uma Secretaria Municipal de Segurança com quadros não policiais com conhecimento técnico sobre o tema. A Secretaria captou em torno de R$ 12 milhões do Governo Federal e estabeleceu parceria com grandes universidades, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul,

Unisinos, La Salle e UniRitter, para a

implementação dos projetos. Seguindo as diretrizes do PRONASCI, o município criou o Gabinete de Gestão Integrada Municipal, com a participação dos mais altos quadros de gestão das polícias (Federais e Estadual), do Ministério Público, das Secretarias Municipais, da Guarda Municipal e dos serviços de Fiscalização Municipal, o qual passou a se reunir a cada 15 dias. Para subsidiar a tomada de decisões, a Prefeitura realizou a primeira Pesquisa de 20

Recentemente, como forma de enfrentar a escalada de violência, o Presidente do México anunciou a extinção das Polícias Municipais. EL PAIS (2014) 21 Foram realizadas diversas pesquisas e trabalhos acadêmicos sobre a experiência de Canoas. Destaque para a pesquisa realizada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e a Universidade Federal de Pernambuco (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2013), que realizou entrevistas em profundidade com os gestores, cinco grupos focais com gestores, beneficários dos programas e moradores do bairro, além um survey com 400 moradores de toda a cidade, com o objetivo de verificar a percepção social a respeito das políticas públicas de Segurança implementadas e os impactos destas na sensação de segurança e avaliação das polícias. No Bairro Guajuviras, que recebeu as ações do Território da Paz, a sensação de melhora é significativa e mais alta que no restante da cidade: 42% acha o policiamento era ruim e melhorou, contra 4% que considerava ruim e que piorou (30% e 8%, respectivamente no restante da cidade). Para 61% dos entrevistados no bairro, a criminalidade diminuiu, contra 35% no restante da cidade. No Bairro Guajuviras, o sistema de audiomonitoramento implementado pela Prefeitura tem o apoio de 95% da população. Entre o total de moradores da cidade, mais de 70% manifestaram satisfação com as novas ações empreendidades pela Guarda Municipal. Os moradores do Bairro Guajuviras destacaram melhoria em 8 de 10 indicadores: 79% em relação a imagem do bairro, 54% sobre o o uso de praças e parques, 55% o acesso às atividades culturais e de lazer e 54% andar pelas ruas do bairro a noite melhorou. Em relação a sensação de segurança, para os moradores do Bairro houve redução em vários indicadores apresentado: de 51% das brigas entre jovens, de 70% dos assaltos e de 65% o número de assassinatos diminuiu. Uma análise crítica sobre a experiência de Canoas pode ser encontrada em DAMICO (2011), que analisou a experiência do Território da Paz de Canoas e as ações desenvolvidas na cidade de Grigny Centre, na região metropolitana de Paris, no âmbito do projeto politques de la ville. Para ele as ações empreendidas aumentaram o controle, a estigmatização, a criminalização e a governamentalidade sobre os moradores do bairro, em especial sua juventude. Num outro sentido, OLIVEIRA (2014), que realizou pesquisa com as equipes técnicas do Território da Paz, em 2013, aponta a falta de institucionalização dos projetos e a insegurança sobre sua continuidade, como elemento fragilizador dos projetos, além da ausência de canais de participação com a sociedade para melhor adequar os conteúdos e objetivos dos projetos as expectativas dos jovens.

Vitimização, e criou o Observatório da Segurança22, que começou a coletar dados e analisar tendências sobre homicídios, roubo e furto de veículos e outras violências. A Guarda Municipal foi reestruturada e a violência escolar colocada como sua principal prioridade. Os Guardas passaram por formação em mediação de conflitos e psicologia juvenil e foram estimulados a criar programas para a criação de vinculos com as crianças e adolescentes, o que resultou na criação de um Grupo de Teatro de Bonecos e do programa Hip Guarda Hop, no qual uma viatura recebeu caixas de som e os agentes passaram a realizar intervenções nas escolas com os jovens. Ainda em relação a violência escolar, foi criado por meio de Lei Municipal23 o Sistema Municipal de Prevenção a Violência Escolar, no qual cada escola ficou obrigada a criar uma Comissão Interna de Prevenção a Violência Escolar (Cipave), com a previsão de encontros semestrais para formação e troca de experiências exitosas. A Secretaria de Segurança criou ainda um Sistema de Registro On-line de Situações de Violências nas Escolas (Rove), através do qual cada diretora passou a fazer o registro das situações de violência. Com base nos resultados, cada escola foi capacitada para elaborar seus Planos Locais de Prevenção a Violência, com o acompanhamento e apoio do GGIM. No bairro mais violento da cidade, o Guajuviras, foi realizado um Plano de Intervenção Integral, nos moldes preconizados então pelo Ministério da Justiça, chamado Território da Paz. A intervenção foi desenvolvida em cinco etapas: 1) operação policial repressiva (realizada com a integração das áreas de inteligência da Polícia Civil, Polícia Militar e Ministério Público), com foco em mandantes e executores de homicídios de todos os grupos violentos que agiam no bairro; 2) operação de saturação policial através da Polícia Militar, logo após a primeira operação; 3) projetos sociais de prevenção a violência (abaixo descritos); 4) projetos de reurbanização; 5) tecnologias de prevenção (câmeras de monitoramento e a instalação do primeiro sistema de detecção de disparos de armas de fogo fora dos EUA); 6) policiamento comunitário. Os projetos sociais de prevenção a violência implementados foram: 1) a Casa das Juventudes, que abrigou o projeto federal Protejo, que paga bolsa aos jovens participantes das atividades culturais, computacional e de cidadania desenvolvidas no prédio de três andares; 2) o Projeto Mulheres da Paz, que capacitou dezenas de mulheres em cidadania e ações de mobilização comunitária pela cultura de paz; 3) Centro de Mediação de Conflitos, no qual lideranças comunitárias foram capacitadas como mediadoras, com o apoio de uma equipe multidisciplinar; 4) Comunicação Cidadã24, no 22

Para um maior detalhamento sobre o funcionamento, os sistemas criados e pesquisas desenvolvidas pelo Observatório de Segurança Pública de Canoas, ver SPANIOL (2012) e PAZINATO, KERBER & DAL SANTO (2013). 23 Lei Municipal n. 5505, de 20 de maio de 2010. 24 Esse projeto recebeu o Prêmio Nacional de Direitos Humanos, em 2011.

qual jovens foram capacitados para estratégias de comunicação positiva sobre a comunidade. As ações de infra-estrutura urbana envolveram desde a colocação de mais de 300 postes de iluminação pública, asfaltamento, saneamento básico, regularização fundiária, implantação de uma Unidade de Pronto Atendimento que funciona 18 horas por dia, duas escolas infantis e uma escola de ensino fundamental, até a revitalização de pequenos espaços que antes abrigavam lixo até as grandes praças do bairro e a construção da Praça da Juventude. A Prefeitura fortaleceu a integração com a Polícia Militar e a Polícia Civil. As cinco Delegacias do município foram alocadas em novas instalações adequadas e receberam o apoio de estagiários. Em relação ao policiamento comunitário, a Prefeitura passou a financiar uma Bolsa para os policiais envolvidos no Programa e a sua formação, além de instituir uma premiação para as unidades de polícia que atingissem as taxas de redução dos indicadores prédefinidos. A gestão municipal ainda construiu um Centro de Comando e Controle, que passou a coordenar dezenas de Câmeras de monitoramento, o sistema de alarmes dos prédios públicos e o Sistema de Detecção de Tiros. Apesar da resistência da Polícia Militar durante o início do trabalho, o atendimento do telefone de emergências e o despacho de viaturas está se integrando ao centro. Em relação aos resultados, segundo o Observatório Municipal (2014), a taxa de roubo de veículos no município caiu de 83,9 em 2009 para 35,5 em 2013. As mortes violentas, que vinham subindo anualmente, cairam de 154 em 2009 para 117 em 2013, num período em que as taxas de homicídio no estado subiram 40%.

CONCLUSÃO

O paradigma da Segurança Pública, que tem orientado as práticas de Segurança Pública no Brasil, baseado tão somente na repressão penal, no policiamento militarizado e na investigação seletiva, tem se mostrado ineficaz para a redução da violência. Novas concepções alternativas a essa visão tem surgido em todo o mundo, desde os anos 20, do século passado. Elas são baseadas na integração entre diferentes políticas e defendem um papel estratégico das administrações locais para a reconstrução dos vínculos sociais. De fato, os municípios têm assumido novas responsabilidades na Segurança Pública, desde a redemocratização. Porém, esse novo papel dos municípios pode-se apresentar tanto da forma tradicional da Segurança Pública, quanto da forma inovadora

aqui apresentadas. No Brasil, as discussões sobre a segurança pública ainda têm se restringido sobre as competências legais das polícias, normalmente orientadas por disputas de poder entre as corporações. No entanto, a própria experiência brasileira em outras políticas públicas, demonstra que mais profícuo seria a discussão e a estruturação de um sistema único que fosse capaz de integrar as ações dos três entes da federação, impulsionando um novo modelo preventivo e multidisciplinar. Infelizmente, nos últimos 4 anos o processo de construção desse novo modelo de Segurança Pública e do fortalecimento do papel do município sofreu novos retrocessos. Apesar dos resultados do grande processo de participação social feito durante a Conferência Nacional (CONSEG) e as deliberações do novo Conselho Nacional de Segurança Pública (CONASP), os mecanismos federais de financiamento e indução, ao invés de serem qualificados conforme a experiência dos quatro anos anteriores, perderam força e foram dirigidos para outras prioridades. Em que pese a relevância e urgência do tema, a Segurança Pública ainda é o único entre todos os direitos sociais previstos no art. 7 de nossa Carta Magna, a não ter constituído o seu Sistema Nacional e não por acaso é o único em que todos os indicadores tiveram piora ao longo dos últimos 30 anos. Assim como o SUS, o SUAS, o FUNDEB, a Política Nacional de Meio Ambiente, a Política Nacional de Cidadas e tantos outros Sistemas Nacionais que integraram os municípios numa nova concepção de gestão pública, o país somente avançará se os municípios assumirem a liderança da construção desse novo modelo. Não lutando para “municipalizar” o antigo modelo, que tem se mostrado ineficiente em reduzir a violência, mas num novo modelo, em que o espaço da cidade se torne um catalizador da convivência, do exercício da cidadania e da construção da paz.

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