O ostracismo de Fichte

September 13, 2017 | Autor: Eustáquio Silva | Categoria: Johann Gottlieb Fichte, Fichte, Idealismo Alemán, Idealismo Alemão, Idealismo, Liberdade
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O ostracismo de Fichte De discípulo e promissor substituto de Kant a um autor renegado pela tradição filosófica, em especial pós Hegel, eis o destino de Johann Gottlieb Fichte. Não foi porque a sua filosofia perdeu fôlego e se tornou plágio do mestre, pelo contrário, ela tomou rumos próprios e isso pode ter sido motivo de vários atritos entre os dois. Não foi porque o seu pensamento ficou totalmente ultrapassado e démodé. Mas foi porque Fichte teve o grande infortúnio de se postar, assim como Schelling, entre dois grandes gênios que foram Kant e Hegel. O primeiro o que abriu o caminho para todos os outros. O segundo o que fechou e colocou a sua filosofia como resumo e síntese acabada de seu tempo. De toda maneira, Gottlieb Fichte é um ator a ser lido. A ser estudado em dois dos principais aspectos de sua obra: o eu e a liberdade. Porém também foi um grande intérprete da política de outros pensadores como Maquiavel. A sua pequena mudança no célebre capítulo XV de O Príncipe é simplesmente um grande marco, pouco explorado de sua filosofia. Ao retirar a famosa frase “verdade real das coisas”, Fichte destronou a interpretação marxista e materialista de Maquiavel como um materialista avant la lettre e o transformou num pensador independente. A frase escolhida para a substituição foi “Princípios de várias formas”. É óbvio que a paráfrase fichtiana não encontra respaldo exegético no texto de Maquiavel, todavia empresta novas cores a sua hermenêutica dando um passo ideal para que saiamos do padrão materialista e viajemos para o sentido mais idealista do pensamento do ilustre florentino. Como um grande pensador não se presta a ser isolado e dominado por uma só visão, nada impede que Maquiavel também seja um inveterado idealista, ou mesmo um pensador político original que vê as coisas como são, mas também projeta as coisas por princípios de como deveriam ser. Essa ambiguidade é fértil e é um ponto positivo para Fichte em seu texto O pensamento político de Maquiavel. Nada impede que a interpretação seja um grande equívoco como um achado precioso, mas o Sapere Aude de Fichte em relação ao tema lembra e muito o esforço de seu mestre Kant de não se furtar de qualquer intenção filosófica que seja inovadora e objetivamente crítica. A ciência, o eu, a liberdade, a consciência de si tudo isso está em Fichte e reaparece, com maior riqueza de detalhes, em Hegel. Mas o germe é fichtiano e isto não pode deixar de ser reconhecido. O ostracismo não se deveu ao estado do pensamento

refinadíssimo do pensador alemão, mas a contingências de sua época que o impediram de se destacar mais. Neste ensaio só exorto para o grande prejuízo que temos em ignorar ainda hoje o que ele tem a dizer. Tal como Pierre Gassendi, Henrique de Gand, Epicuro, Boécio, Alberto Magno, Malebranche, entre outros, Fichte é calado pelos incertos de seu tempo. Mas se ele for conhecido junto a Kant ou em contraposição a este, nós veremos um debate rico e promissor. Pena que todos que dizem estudar o idealismo alemão procuram só os vértices sem deixar espaço para tantos outros nomes que estão no meio. Infelizmente um autor desconhecido, mas a menção honrosa dessas linhas pelo menos diminuem esse ostracismo e essa famigerada fama de esquecimento. Como diria Walter Benjamim, é preciso contar a história de outras formas. É preciso considerar a história de outros pontos de vista que não os dos vencedores sejam quais sejam os vencedores. O importante é que se conheça. Materialmente falando a obra de Fichte é curta e cheia de espaços no meio. Porém é interessante em especial nos pontos da consciência, da política e da liberdade que interessam a qualquer pessoa que preze pela filosofia do Direito.

Eustáquio Silva.

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