O PACTO ENTRE CIBERACONTECIMENTOS E PUBLICIDADE E PROPAGANDA: UM XOU DE AÇÕES PUBLICITÁRIAS DA NETFLIX NO CONTEXTO DIGITAL

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O PACTO ENTRE CIBERACONTECIMENTOS E PUBLICIDADE E PROPAGANDA: UM XOU DE AÇÕES PUBLICITÁRIAS DA NETFLIX NO CONTEXTO DIGITAL Christian Gonzatti, Unisinos1 Vanessa Ramos Furtado da Silva, Unisinos2 Orientador: Ronaldo Henn3 Palavras-chave: Ciberacontecimento. Publicidade e Propaganda. Xuxa. Netflix. Stranger Things. INTRODUÇÃO O trabalho emerge de pesquisas do grupo LIC, Laboratório de Investigação do Ciberacontecimento, do PPGCCOM da Unisinos e de trabalhos envolvendo narrativas seriadas

televisivas

contemporâneas.

A

temática

proposta

é

a

relação

entre

ciberacontecimentos, que, resumidamente, podem ser entendidos como acontecimentos que emergem das redes digitais, (HENN, 2014) e publicidade e propaganda a partir de ações publicitárias específicas da série Stranger Things (criada pelos irmãos Matt e Ross Duffer e distribuída pela Netflix) que tem como protagonista a atriz, cantora e apresentadora Xuxa Meneghel4. Pesquisas anteriores (GONZATTI, 2015; GONZATTI, ESMITIZ, SCOPEL; 2015) já se desdobraram em entender as dinâmicas que envolvem a relação de ciberacontecimentos que motorizam ações publicitárias e também o contrário. Aqui, diferente dos casos anteriores, buscamos, também, olhar para os sentidos presentes nas narrativas dos anúncios, em articulação com a série Stranger Things, que desencadeiam, devido as dinâmicas das redes digitais, o espalhamento (JENKINS, FORD, GREEN, 2014). Esses pressupostos emergem do seguinte questionamento: como a Netflix, a partir da série Stranger Things, desencadeia semioses capazes de motorizar ciberacontecimentos nas ações publicitárias envolvendo Xuxa Meneghel? 1

Mestrando em Ciências da Comunicação na Unisinos, bolsista CAPES, graduado em Comunicação SocialPublicidade e Propaganda pela Unisinos. Membro do Laboratório de Investigação do Ciberacontecimento. 2

Mestranda em Ciências da Comunicação da Unisinos, bolsista CAPES, formada em Comunicação Social Jornalismo, pela Universidade Luterana do Brasil. 3

Professor do PPG em Ciências da Comunicação da Unisinos, Doutor em Comunicação e Semiótica pela PUCSP. Coordenador do LIC, Laboratório de Investigação do Ciberacontecimento. 4

Maria da Graça "Xuxa" Meneghel é uma apresentadora, atriz, cantora pop infantil, empresária, filantropa e modelo brasileira. Duas vezes vencedora do Grammy Latino de melhor álbum infantil, é conhecida também pelo epíteto de Rainha dos Baixinhos. Fonte: https://goo.gl/DPo8we Acesso: 08 ago. 2016.

Aquino Bittencourt, Gonzatti e Esmitiz (2015) analisaram como o humor, a partir de Xuxa Meneghel, vetorizou ciberacontecimentos a partir da mudança da apresentadora da Rede Globo para a Rede Record. Neste trabalho, os memes da internet apareceram em destaque, pois, a partir deles o caso era potencializado em redes digitais. Para isso, as autoras e o autor partiram de uma contextualização em torno dos memes que já surgiram em torno da apresentadora, como o famoso aham, senta lá Cláudia, no qual Xuxa manda uma criança que, aparentemente a incomodava, sentar e os boatos de que Maria da Graça teria feito um pacto com o demônio para obter sucesso. Essa forte produção de sentidos, que emerge das redes digitais, é articulada pela Netflix com a narrativa seriada de Stranger Things, que vem obtendo notável visibilidade desde o seu lançamento5, para a construção de vídeos publicitários divulgados na página do Facebook da série, um movimento que levou a eclosão de matérias jornalísticas em torno do caso. Entender essas processualidades traz considerações sobre a transformação das dinâmicas jornalísticas e aponta possibilidades mercadológicas para marcas em redes digitais. Partimos para um breve tensionamento dos pressupostos teóricos que adotamos a fim de tensionar o nosso empírico de referência. CIBERACONTECIMENTOS Existem três dimensões que tornam propícias a emergência de um ciberacontecimento: as transnarrativas e a hipermídia, construídas por diversos atores sociais; a reverberação, ou o espalhamento, que passa a construir as narrativas em torno de determinado acontecimento; e a eclosão de outras formas de acontecimentos que se formam em cenários de conexões altamente sistêmicas (HENN, 2014). No nível transnarrativo, entra em cena a convergência (JENKINS, 2008), que propicia desdobramentos diversos, fazendo com que vários meios interajam entre si. Com a hipermídia (SANTAELLA, 2013), entram em cena os meios que trazem mais do que uma funcionalidade: misturam-se textos, vídeos, imagens, etc. O espalhamento6

(JENKINS,

FORD, GREEN,

2014) que seria,

em

totalidade, o

compartilhamento e a circulação que determinado conteúdo desenvolve na web através de atores sociais, ganha destaque na construção dos ciberacontecimentos, pois é, através dele, 5

Para mais informações: http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/proa/noticia/2016/08/por-que-stranger-things-viroufenomeno-pop-7165125.html. Acesso: 08 ago. 2016. 6

O conceito aparece no livro traduzido para o português como propagação, no entanto, optamos por usar o termo que conversa melhor com a versão original e com as ideias trazidas pelos autores.

que a visibilidade (RECUERO, 2009) dá destaque para os mais variados assuntos, que se legitimam através de sistemas complexos e passam a motorizar pautas jornalísticas. Antes de nos determos sobre o espalhamento, é importante contextualizarmos a perspectiva semiótica dos ciberacontecimentos. Os ciberacontecimentos seriam, então, resumidamente, acontecimentos tramados em sites de redes sociais (RECUERO, 2009). Desta constatação, e dos entendimentos das três dimensões que propiciam a construção (e espalhamento) de determinado ciberacontecimento, é possível partir para um entendimento semiótico a respeito destes acontecimentos específicos. É na semiosfera (LOTMAN, 1996), que seria um mundo em nível sígnico, que o objeto (acontecimento) é transformando em signo e ganha interpretações por atores sociais e pelo jornalismo, criando, assim, mais signos, constituindo, assim, uma parte desse universo semiosférico. Ao movimento dos signos na semiosfera, dá-se o nome de semiose (PEIRCE, 2002), que é vista, então, como os sentidos em torno de determinado ciberacontecimento, construídos através da ação dos signos (HENN, 2014). O meme (DAWKINS, 1979), unidade de reprodução cultural, também ganha destaque nesse cenário, pois é através dele que os sentidos desenvolvem-se em determinado contexto cultural e social. O meme de Dawkins (1979) conversa, portanto, com a ideia popular de meme, que está relacionada a conteúdos que são espalhados pela internet, ou seja, que possuem espalhabilidade (JENKINS, FORD, GREEN, 2014). Para um conteúdo ser espalhado, é necessário que a sua citação e compartilhamento sejam fáceis (JENKINS, FORD, GREEN, 2014). Isso permite que o material vá desenvolvendo, principalmente através de laços fracos (RECUERO, 2009), mais visibilidade, o que é decorrente de seu espalhamento. O também conteúdo deve ser portátil e disponível quando e onde o público quiser, deve ser reutilizável através de uma série de maneiras, remixado, ser relevante para vários públicos, não somente o alvo, mas o excedente e fazer parte de um fluxo constante de material. Além de características mais técnicas, os conteúdos, para serem dotados de espalhabilidade, podem tratar de temáticas mais espalháveis, como fantasiais e valores (práticas de fandoms, comunidade de fãs, em determinado contexto de sociabilidade), humor, paródias e referências, conteúdos inacabados, mistérios, controvérsias oportunas (gerar uma disputa de sentidos, posicionamentos, a partir de determinado contéudo) e boatos. Assim, algumas marcas desenvolvem ações que devido as suas características, desencadeiam ciberacontecimentos, um movimento que, para a publicidade e propaganda, tem valor.

ARTICULAÇÕES ENTRE OS CIBERACONTECIMENTOS E A PUBLICIDADE E PROPAGANDA Das pequenas às grandes empresas, conquistar espaços que garantam visibilidade em torno de determinado produto tem se tornado uma tarefa cada vez mais séria e complexa, do planejamento a mensagem que será veiculada. Os textos de mídia devem ir além do que era comum até o início do século 21; não só pessoas desenvolvem sociabilidades em redes digitais, “As empresas também devem interagir com os públicos nestas plataformas, como forma de aproximar-se de seus públicos, sejam eles internos ou externos”. (ESPÍNDOLA, 2013, p. 18). A publicidade, dentro do marketing, auxilia no desenvolvimento de desejos em torno de bens tangíveis e intangíveis (KOTLER, KARTAJAYA, SETIAWAN, 2010) e, tendo em vista que “A produção do desejo, produção de realidade, é ao mesmo tempo (e indissociavelmente) material, semiótica e social” (ROLNIK, 2014, p.46), não se pode negar a hipermídia e as linguagens que emergem na web como forma de desenvolvimento de cibersociabilidade entre as marcas e seus públicos. Em poucas palavras, as empresas desenvolvem conteúdos com mais espalhabilidade e, em alguns casos, desencadeiam ciberacontecimentos, evidenciando a alta visibilidade e a ruptura que emergem de determinada ação. Assim, olhamos para dois vídeos específicos da página no Facebook de Stranger Things7 e para as reverberações que deles emergem buscando atender a nossa problemática. METODOLOGIA, RESULTADOS E DISCUSSÕES Para a metodologia, buscamos entender as semioses que emergem nas narrativas de Stranger Things e que são articuladas à Xuxa Meneghel, acionadas nos seguintes vídeos publicitários: O maior mistério dos anos 808 e Xuxa e o baixinho que sumiu9. Depois,

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Página: https://www.facebook.com/strangerthingsbr/?fref=ts Acesso: 08 ago. 2016.

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Link para o vídeo: https://www.facebook.com/strangerthingsbr/videos/1393407097341682/ Acesso: 08 ago. 2016. 9

Link para o vídeo: https://www.facebook.com/strangerthingsbr/videos/1394199200595805/ Acesso: 08 ago. 2016.

desenvolvemos a construção de uma amostra qualitativa intencional a partir de uma busca10 por sites jornalísticos que produziram matérias em torno da ação. Como exemplos, destacamos os seguintes meios: Zero Hora, Hypeness, Encontro, Folha de São Paulo, O Fuxico, Jovem Nerd, R7, Administradores, IG, UOL, Exame, Yahoo, Cinepop, M de Mulher, Cidade Verde, Estadão, Infomoney, Papel Pop, Correio, O Sul e Meio e Mensagem. Por fim, recorremos a metodologia experimental denominada como construção de sentidos em redes digitais11 (HENN, 2014), a fim de entender alguns dos sentidos atribuídos ao vídeo por atores sociais na página de Stranger Things no Facebook. Entendemos que os vídeos de Stranger Things acionam signos específicos, recorrendo ao caráter mimético de semiosferas que emergem em torno de Xuxa Meneghel: o pacto com o demônio, a boneca possuída, o aham senta lá, Cláudia, a briga da apresentadora com atores sociais no Twitter12 são alguns dos memes citados no vídeo. Outra articulação narrativa emerge do acionamento da memória, uma característica do conceito de semiosfera e do meme proposto por Dawkins (1979): os vídeos, assim como a série Stranger Things, fazem referência aos anos de 1980, em que Xuxa era apresentadora do programa Xou da Xuxa. A ação insere-se em um contexto digital no qual os critérios de espalhabilidade delineados por Jenkins, Ford e Green (2014) também são percebidos: o humor, a paródia, de Xuxa por Xuxa, os boatos e as referências já citadas. O caráter técnico é atendido a partir da plataforma Facebook, que permite o compartilhamento de conteúdos a partir da marcação de pessoas nos comentários e da ação compartilhar. A partir das matérias, as três dimensões que propiciam a emergência de ciberacontecimentos também são evidenciadas: a reverberação do conteúdo a partir do espalhamento, a hipermídia e a convergência, que articulam linguagens diversas ao vídeo, e a emergência de um acontecimento que emerge das semioses em redes digitais. A construção de sentidos em redes digitais possibilitou localizar quatro núcleos de semioses: as

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Através da busca do Google. Reconhecemos que, apesar dos filtros e algoritmos que constroem sistemas de buscas variáveis, aqui desejávamos localizar matérias que evidenciem a dimensão acontecimental do caso. 11

A construção de sentidos em redes digitais tem como pressupostos as etapas de identificação e reflexão em torno dos sentidos que emergem a partir de um objeto específico em redes digitais. Possuí, também, inspiração cartográfica, um olhar ao qual recorremos aqui, por exemplo, para entender as linguagens que emergem em torno de Xuxa Meneghel. 12

Sasha, filha de Xuxa, escreveu uma palavra errada no Twitter e Xuxa argumentou que ela havia sido alfabetizada em inglês. Para mais detalhes: http://oglobo.globo.com/cultura/revista-da-tv/xuxa-briga-cominternautas-pelo-twitter-3141603. Acesso: 08 ago. 2016.

dimensões da imagem célebre de Xuxa, a nostalgia, as referências a Stranger Things13 e elogios à Netflix. Esses aspectos, a partir dos nossos tensionamentos teórico-metodológicos, sinalizam como a Netflix, a partir da série Stranger Things, desencadeia semioses capazes de motorizar ciberacontecimentos nas ações publicitárias envolvendo Xuxa Meneghel. CONSIDERAÇÕES FINAIS O desejo, como coloca Rolnik (2014), é construído a partir de dimensões materiais, semióticas e sociais, indissociáveis. Nesse sentido, as ações publicitárias desenvolvidas pela Netflix apropriam-se de signos comuns às redes digitais e à memória dos seus públicos a fim de desenvolverem visibilidade. Esse processo, a partir dos aspectos já sinalizados, é capaz de desencadear ciberacontecimentos, sinalizando o caráter memético das ações e as potencializando. A nostalgia e a relação com a memória, fortemente presentes em Stranger Things, são temas que podem ser abordados em estudos relacionados às narrativas seriadas, a fim de entender as rupturas inauguradas por essa produção audiovisual. As articulações entre ciberacontecimentos e publicidade e propaganda, a partir das ações da Netflix, também podem, a partir de outros estudos, sinalizar valores e características referentes ao potencial de espalhamento desencadeados pelos usos da (ciber)cultura pop. REFERÊNCIAS BITTENCOURT, Maria Clara Aquino; GONZATTI, Christian; ESMITIZ, Francielle. De Rainha dos Baixinhos a Rainha dos Memes: o humor como vetor de ciberacontecimentos a partir da ida de Xuxa da Rede Globo para a Rede Record. Sessões do Imaginário, v. 20, n. 34, pp. 81-90, 2015. DAWKINS, Richard. O gene egoísta. Belo Horizonte: Itatiaia, 1979. ESPÍNDOLA, Polianne Merie. Textos e Contextos do Audiovisual na Comunicação. São Leopoldo, RS, UNISINOS, 2013. GONZATTI, Christian. Ciberacontecimento feat. Publicidade e Propaganda: but first, let me take a selfie. Monografia defendida para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social com habilitação para Publicidade e Propaganda. Unisinos, 2015. GONZATTI, Christian; ESMITIZ, Francielle; SCOPEL, Vanessa. De clarina a love wins: articulações entre ciberacontecimentos, questões de gênero e sexualidade e publicidade e

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Potencializadas pelo uso de um aplicativo em torno da série lançado pela Netflix. Mais informações: http://www.guiadasemana.com.br/em-casa/noticia/ferramenta-da-netflix-permite-criar-gifs-de-strangerthings Acesso: 08 ago. 2016.

propaganda em sites de redes sociais. Anais do VII Seminário de Mídia e Cultura, Goiânia, PPGCOM/FIC/UFG, 2015. HENN, Ronaldo. El ciberacontecimiento: producción y semiosis. Barcelona: Editorial UOC, 2014. JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. Editora Aleph: São Paulo. 2008. JENKINS, H.; FORD, Sam; GREEN, Joshua. Cultura da Conexão: criando valor e significado por meio da mídia propagável. Editora Aleph: São Paulo, 2014. KOTLER, Philip; KARTAJAYA, Hermawan; SETIAWAN, Iwan. Marketing 3.0: as forças que estão definindo o novo marketing centrado no ser humano. 9ª reimpressão, Rio de Janeiro: Elsevier, 2010. LOTMAN, Iuri. La semiosfera. Catedra: Madri, 1996. PEIRCE, Charles Sanders. The Collected Papers of Charles Sanders Peirce. Past Masters, CD-ROM. EUA, InteLex Corporation, 2002. RECUERO, Raquel. Redes Sociais na Internet. 1. ed. Porto Alegre: Sulina, 2009. ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2ª edição: Porto Alegre, Sulina; Editora da UFRGS, 2014. SANTAELLA, Lúcia. Comunicação Ubíqua. Paulus: São Paulo, 2013.

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