O Palácio Maçônico do Lavradio (Publicado no Jornal do Centr.doc

May 27, 2017 | Autor: Fábio Lima | Categoria: History, História da Maçonaria
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O Palácio Maçônico do Lavradio

Fábio Souza Corrêa Lima
Graduando de História da Universidade. Federal Fluminense.
Graduando de Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.


Publicado originalmente no Jornal do Centro, v. 1, Abril de 2004.


No início do século XIX, um artista português chamado Vitor Porfírio
Borja, começou a edificar o que seria um majestoso concorrente do Teatro
Rocio (atual João Caetano). Uma casa de formas palacianas no centro da
capital imperial, na Rua do Lavradio, medindo 12 braçadas, ou seja 26,40m
de frente e fundos que levavam até a Taipa dos frades, no alto do morro de
Santo Antônio. A obra de capital próprio, exigira todos os esforços do
artífice, que ao final, por absoluta falta de dinheiro abandonou seu sonho
já com as paredes erguidas. Com a hipoteca vencida do terreno onde seria
construído o teatro, as benfeitorias criadas por Victor Borja passaram por
abjudicação diretamente ao Cônego Roque Luís de Macedo Paes e Senna, que
por sua vez deixou por herança ao seu filho Pedro Nolasco de Horta Forjar
Senna.
É por esses tempos que dizia-se perto dali: "...há indícios de não se
concluir mais, e poder servir para nela fundarmos nosso Templo...". O
prédio então erguido para ser palco de dramas e tragédias teatrais tem seu
destino mudado para sempre à senda de decisões político-históricas no seio
de seu novo ocupante, a Maçonaria.
Várias Lojas maçônicas passaram a ocupar no ano de 1832, pelo aluguel
de Rs 1:800$000 (um conto e oitocentos mil réis), o prédio ainda inacabado.
O encanto maçônico pela construção parece ter sido instantâneo pois uma
comissão para compra do prédio encabeçada pelo maçom João Militão Henriques
(responsável pela frase supracitada) já iniciava as negociações.
Em 27 de outubro de 1838 colocava-se a construção a disposição em um
leilão publicado no Jornal do Commércio, Rio de Janeiro: "...LEILÕES –
Leilão do edifício principado para teatro na Rua do Lavradio [...] à porta
da Praça do Comércio, na terça feira, 30 do corrente, às 11 horas em ponto,
farão leilão e venderão impreterivelmente a quem mais der, o edifício
principado para o teatro...". A compra, realizada pela Sociedade Glória do
lavradio, criada por ocasião da compra, onde associavam-se várias lojas
maçônicas, foi levada a cabo em 18 de agosto de 1840, pelo valor de Rs
11:000$000 (Onze contos de réis), acrescido do valor de uma sisa cobrada
pela prefeitura de Rs 1:100$000 (Um conto e cem mil réis). Então, em 1842,
muda-se para o Palácio, ainda em obras de adaptação, mas já funcionando com
22 lojas, o GOB (Grande Oriente do Brasil – Órgão de federação das lojas
maçônicas).
A importância do Palácio Maçônico pode ser mensurada a partir de um
breve relato de seu Templo Nobre, que ganhou o nome de Gonçalves Ledo –o
mentor da independência do Brasil--. O Templo Nobre Gonçalves Ledo, uma
réplica do parlamento inglês, foi inaugurado na gestão do Grão-Mestre
Quintino Bocaiúva. Ostenta uma decoração baseada nos templos egípcios, com
suas colunas douradas ricamente decoradas e luzes secundárias que ressaltam
a beleza de um teto abobadado e repleto de estrelas que se sustentam sobre
um pé direito de cerca de 8 metros. O mobiliário original, ofuscado pelo
tempo, é protegido por estofados recentes, enquanto o assoalho não menos
antigo mostra-se impecavelmente brilhante. Ao fim do salão, no centro, um
dossel todo trabalhado em madeira denuncia a importância daqueles que no
cargo de grão-mestres presidem tais sessões maçônicas. Dentre os quais,
estiveram sentados nesta posição: Deodoro da Fonseca (tendo quase todo
gabinete da recém "proclamada" República, ao seu lado como irmãos maçons),
Floriano Peixoto, Prudente de Morais, Campos Sales, Nilo Peçanha, Hermes da
Fonseca, Venceslau Brás, Washington Luís e muitos outros expoentes da
sociedade brasileira.
O corredor que nos leva a este belíssimo templo é completamente
margeado pelas bandeiras de todos os estados federados do Brasil, tendo
além destas, a bandeira empenhada por Bento Gonçalves em meio a revolução
farroupilha, repleta de motivos maçônicos, bem como encontram-se na sala ao
lado, retratos de Garibaldi, "herói de dois mundos". Na biblioteca e museu
estão também um vasta documentação histórica e literária de grande
importância, como documentos de alforria assinados por membros da corte
imperial e uma bíblia, doada pelo escritor francês Vitor Hugo a Dom Pedro
II, sendo datada de 1555.
Aliás, a família imperial esteve ainda mais perto da instituição,
pois na sala à frente, onde fica o atual Conselho maçônico estadual, entre
dois quadros que exaltam a Guerra do Paraguai está o Trono de Dom Pedro I
–maçom Guatimozim–, que o teria ocupado enquanto Grão-Mestre do Brasil. O
trono, de origem misteriosa, é todo feito em jacarandá, tendo incrustações
maçônicas em marfim entalhado e duas grandes cabeças de águia banhadas à
ouro no extremo dos descansos dos braços. No interior desta sala ainda
encontram-se espadas dos maçons Henrique Valadares e Duque de Caxias, e um
relógio carrilhão do século XIX, com 2,10m de altura e também com símbolos
maçônicos.
Ainda no interior do prédio, em um cofre de ferro gigantesco, que de
tão pesado sobrepõem-se diretamente em uma coluna, encontra-se uma
raridade, talvez a maior de todas; uma das três canetas de ouro maciço em
forma de pena, com o símbolo máximo da maçonaria, que foram ofertadas a
princesa Isabel, por ocasião da assinatura da Lei Áurea. A história do
Palácio Maçônico do Lavradio reserva ainda episódios de ameaças de
expropriação em decorrer do século XX, devido a intenções de obras de
arejamento do centro e alargamento da rua do Lavradio. Mas salvação divina
teve o palácio, pois em um dos casos, depois de muitas discussões, estando
praticamente acordados a prefeitura e os maçons sobre os terrenos de
permuta, a mudança da Capital Federal veio a postergar as intenções de
obra.
O palácio do lavradio enfrentou também décadas de má conservação e
descuidos que geraram a contaminação de centenas de seus livros históricos,
bem como a infestação de cupins que chegaram a formar casas de até 30cm em
seu forro. Contudo, segundo o responsável pelos cuidados com o acervo, Sr.
Eurípedes, o atual Grão-Mestre do GOERJ (Grande Oriente do Rio de Janeiro,
criado após a ida do GOB para Brasília) vê-se empenhado na restauração e
manutenção deste fantástico acervo, estudando a possibilidade de que no
futuro, o Palácio Maçônico receba algumas visitas guiadas do público
profano (não-maçons).
O Palácio Maçônico, em sua larga fachada estilo neoclássico
português, tem preservadas praticamente todas as características de sua
fundação. No alto de sua construção vê-se um pelicano, ressaltando a lenda
do animal que tira sangue do próprio peito para dar aos filhotes, denotando
assim a relação entre os maçons e a maçonaria. Todos os três andares detém
sacadas com a estrutura do topo em semicírculo, alternando o rosa claro e o
branco, sem dúvida destoantes do cinza "moderno" do centro da cidade. As
quatro árvores de acácia ao sopé de duas grandes colunas desenhadas no
prédio acentuam o tom acolhedor que deve ter uma congregação de irmãos. Não
obstante, como disse, um congregação de irmãos, sendo que a entrada neste
enigmático prédio não é franqueada a todos. Na tentativa de um aventureiro
de abrir o portão principal, ele se deparará com duas grandes esfinges de
bronze com um olhar fixo em sua direção, interpelando-lhe a causa de
tamanha indiscrição. Além da segurança, é claro, todos os irmãos se
conhecem e identificam-se mutuamente, sendo identificado facilmente
qualquer profano.
Sem dúvida um prédio que teve não por ocasião, mas por destino, sua
trajetória ligada a história brasileira. Hoje, seu estado geral de
conservação é bom, seu acervo, espalhado pelos três andares do edifício,
conta o amor e o esmero daqueles que pelos seus corredores transitam. Em 20
de janeiro de 1972, depois de tantos anos de ameaça e de poucos cuidados, o
Palácio Maçônico do Lavradio foi tombado pelo Patrimônio histórico e
artístico do estado da Guanabara, encontrando-se hoje finalmente
resguardado por uma boa gestão e protegido de qualquer prefeito, que com o
perdão da palavra, seja obreiro.
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