O Papel da Administração Parlamentar

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I - INTRODUÇÃO

A Constituição da República de Angola (CRA), no seu artigo 141.º, define a
Assembleia Nacional como sendo o Parlamento da República de Angola,
exercendo as três funções clássicas, nomeadamente a de representação
política, de legislar e de fiscalização.

Dentre as suas competências políticas, avulta, sem sombra de dúvidas, o
exercício do poder legislativo, revestindo as suas deliberações a forma de
(art.166.º CRA):

Leis de revisão constitucional;

Leis Orgânicas;

Leis de bases;

Leis de Autorização Legislativa;

Resoluções.

Nos termos da CRA (art. 167.º) a iniciativa legislativa cabe aos Deputados,
aos Grupos Parlamentares e ao Presidente da República, sendo o processo
legislativo regulado em sede do Regimento Interno (Lei n.º 13/12 de 2 de
Maio), nos seus artigos 168.º e seguintes.

Canotilho, Gomes[1] (1983) e, na sua esteira, outros autores, com as
devidas adaptações, define o Procedimento Administrativo como "um complexo
de actos, qualitativa e funcionalmente heterogéneos e autónomos, praticados
por sujeitos diversos e dirigidos à produção de uma lei no Parlamento[2]".

Quanto à nós, mais do que os conceitos, importa reter a ideia de um
conjunto de fases ou etapas que vão desde a proposição da lei até a sua
entrada em vigor, como sejam[3]:

a fase da iniciativa (arts. 168.º e sgs do RIAN): consiste
na proposição da lei;

a fase da instrução: traduz-se num conjunto de
procedimentos, que vão desde a entrada e admissão, até ao
debate na especialidade[4], (art. 175.º e sgs do RIAN);

a fase da aprovação: traduz-se na adopção do Projecto ou
Proposta de Lei, que compreende três momentos fundamentais,
nomeadamente, a votação na generalidade, a votação na
especialidade e a votação final global (arts. 191.º a 196.º);

a fase da promulgação: consiste na assinatura da lei pelo
Presidente da República (art. 119.º, al. R);

a fase da eficácia: consiste na entrada em vigor da lei.

O Parlamento é, por tradição um órgão autónomo, dispondo de um poder de
auto-regulação, razão pela qual a Constituição outorga-lhe a competência
organizativa (art. 160.º), nos termos da qual estabelece a sua própria
organização interna, que se analisa na faculdade de eleger os seu próprios
órgãos, tais como o Presidente, os Vice-Presidentes, os Secretários da Mesa
e constituir a sua Comissão Permanente, as Comissões de Trabalho
Especializadas, as Comissões Eventuais e as Comissões Parlamentares de
Inquérito[5].

De acordo com o artigo supracitado da CRA, a Assembleia Nacional pode "
exercer as demais competências conferidas pela Lei Orgânica e demais
Legislação Parlamentar". Donde se infere que, além da função política e
legislativa, no quadro daquela trilogia clássica, o Parlamento Angolano
exerce outras funções, tais como a electiva, a autorizante e a
administrativa.

É esta última que interessa, aqui e agora. Terá o Parlamento uma dimensão
administrativa? Em caso afirmativo, que fins prossegue nesta vertente? Qual
é o regime jurídico de uma tal administração e como se relaciona com a
Administração Pública em geral?

A resposta parece residir na Lei n.º 4/10, de 31 de Maio - Lei Orgânica da
Assembleia Nacional (LOAN) - que segundo o seu artigo 1.º " regula os
instrumentos de gestão administrativa, financeira e de apoio técnico, que
permitem à Assembleia Nacional o desenvolvimento das suas atribuições",
repousando tais competências nos órgãos internos, nomeadamente o Plenário,
a Comissão Permanente, o Presidente e o Conselho de Administração (arts.
6.º, 7.º e 8.º).

No quadro da chamada Administração Parlamentar, ocupa um lugar central a
Secretaria Geral da Assembleia Nacional, consubstanciada num conjunto de
serviços hierarquizados, sob a dependência de um Secretário Geral (art. 3.º
da LOAN).

Nos termos do art.25.º da LOAN, cabe à Secretaria Geral da Assembleia
Nacional:

a) Garantir o suporte técnico e administrativo no domínio das
actividades de apoio ao Plenário, à Comissão Permanente, à Mesa,
às Comissões de Trabalho Especializadas e aos demais órgãos que
funcionem junto da Assembleia Nacional ou na sua dependência;

b) Elaborar estudos técnicos especializados necessários à
actividade da Assembleia Nacional;

c) Executar outras tarefas necessárias à actividade da Assembleia
Nacional.

Do que se deixa exposto, está lactente a importância dos serviços
administrativos no exercício das funções legislativa, representativa e
fiscalizadora do Parlamento.

O presente trabalho tem, pois, por objecto a determinação do papel da
Administração Parlamentar no processo legislativo. O estudo reputa-se, a
nosso ver, de grande relevância e actualidade, numa altura em que a própria
Mesa da Assembleia Nacional, por ocasião da cerimónia de encerramento da II
Sessão Legislativa, veio a terreiro reconhecer no seu Relatório de Balanço,
que a actividade parlamentar vinha sofrendo constrangimentos, dentre os
quais:

A falta de quadros especializados para o apoio técnico às Comissões
de trabalho;

A má formação dos Funcionários Parlamentares;

Como contrapartida, o Relatório sublinha a necessidade de:

Inscrição no OGE de uma verba para o recrutamento de novos técnicos
visando o reforço da assessoria legislativa e parlamentar;

A formação técnica e profissional dos quadros actuais;

A necessidade da aceleração da revisão do Regimento e da Lei
Orgânica da Assembleia Nacional;

Acresce à tudo isto, um crescente criticismo da sociedade e, em particular,
da academia, sobre a qualidade das leis produzidas pela Assembleia
Nacional, a falta de regulamentação de muitas delas, a falta de estudos de
impacto normativo e orçamental, a alegada falta de fiscalização dos actos
do Executivo, a falta de aproximação entre os deputados e eleitores, etc.

Aqui chegados, importa alertar, desde logo, que o nosso estudo procurará,
se não abstrair-se, pelo menos, distanciar-se tanto quanto possível, das
querelas do foro político-partidário, embora não seja fácil, tendo em conta
a própria natureza do Parlamento.

Com esta empreitada, pretende-se, tão só, diagnosticar a Administração
Parlamentar, na sua evolução desde 1992 até aos nossos dias, avaliar as
reformas já ocorridas e as tendências das que estão em curso e visualizar
cenários para o futuro. Por outras palavras, pretende-se aferir em que
medida existirá um nexo de causalidade entre a administração parlamentar e
a produtividade e qualidade das leis emanadas do Parlamento, trazendo à
ribalta, o papel incontornável dos Funcionários Parlamentares, uma
realidade geralmente ausente nas abordagens habituais[6].

II - FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

O que fazer para que a Administração Parlamentar possa prestar um
apoio técnico e administrativo mais eficaz, eficiente e efectivo ao
processo legislativo parlamentar?

Como fazer para que a mudança da Assembleia Nacional para a sua
imponente sede, recém-construída, não signifique apenas "vinho novo em
odres velhos?"

III - OBJECTIVOS

III. A. Objectivo Geral: Contribuir para a definição de um Plano de
Reformas da Administração Parlamentar, por forma a poder corresponder
aos desafios do Processo legislativo.

III.B. Objectivos Específicos

1. Avaliar as reformas introduzidas em 2009, emitir um juízo opinativo
sobre as tendências da reforma em curso e contribuir para a definição
dos vectores estratégicos das futuras reformas;

3. Demonstrar o nexo de causalidade entre o apoio técnico ao processo
legislativo e a produção legislativa em quantidade e qualidade;

4. Evidenciar o papel dos funcionários parlamentares;

5. Explorar a vertente científica do conceito de Administração
Parlamentar.

IV. HIPÓTESES

Na base do desempenho pouco satisfatório da Administração Parlamentar no
apoio ao processo legislativo estarão os seguintes factores:

1. O caótico quadro jurídico-legal;

2. O não cumprimento de importantes preceitos normativos do
Regimento e da Lei Orgânica da Assembleia Nacional[7];

3. O exíguo número de técnicos especializados;

4. A deficiente formação técnica e profissional da maior parte dos
quadros existentes;

5. A falta de expectativas motivacionais e previsionais;

6. Os efeitos perniciosos decorrentes da cultura organizacional
herdada do passado.

V. METODOLOGIA

Tendo em conta a complexidade e multiplicidade dos fenómenos a abordar,
vamos lançar mão a tantos métodos quantos se mostrarem necessários,
incluindo soluções transdisciplinares, para atingir os resultados
esperados.

1. Desde logo, a nossa pesquisa será exploratória na medida em que
assenta sobre uma matéria ainda pouco trabalhado, sobretudo do ponto
de vista doutrinal, devendo tentar repensar e estabelecer novos
conceitos e paradigmas, à luz da nossa vivência e visão sobre a
Administração Parlamentar[8];

2. Por conseguinte, vamo-nos socorrer do método bibliográfico, analisando
as leis que conformam o Direito Parlamentar Angolano[9], com incursões
ao direito comparado de outros países, sempre que necessário, devendo
ocupar um lugar privilegiado a discussão dos estudos teóricos já
realizados e conhecidos em torno do assunto.

3. Serão ainda usados outros como:

a) Método dialéctico: vamos procurar investigar as causas,
explorando o nexo entre elas e os efeitos.

b) Método dedutivo: na determinação dos fenómenos, privilegiaremos
o raciocínio que parte do geral para o particular;

c) Método histórico: vamos investigar instituições preexistentes,
as reformas já levadas a cabo e a sua influência no presente;

d) Método comparativo: pretendemos fazer um estudo de direito
comparado, confrontando a nossa realidade com a de outros
Parlamentos, em especial, os da nossa matriz;

e) Método Estatístico: indispensável ao processamento, análise e
interpretação de resultados.

f) Método funcionalista: vamos caracterizar as principais unidades
orgânicas, com particular enfoque para aquelas que mais
directamente intervêm no processo legislativo, sugerindo
eventuais alterações na sua estruturação orgânica;

g) Método monográfico: Sem nos abstrairmos da função pública, em
geral, o nosso trabalho traduzir-se-á fundamentalmente num
estudo de caso: o Parlamento Angolano.

Quanto às técnicas, usaremos o questionário, que se pretende fechado, não
dando margens para os inquiridos argumentarem, mas tão só, aderir às opções
de resposta por nós sugeridas; o grupo alvo será a comunidade parlamentar,
num universo de 15 pessoas, sendo 7 Deputados[10] e 8 Funcionários
Parlamentares; os dados a acolher serão processados com recurso ao sistema
informático Excel e representados em gráficos.

VI. REVISÃO LITERÁRIA

O Parlamento é um centro de disputa, concertação e de convergência de
vontades políticas, enfim, um órgão por excelência político e legislativo.

Mas é hoje um facto incontroverso, que o Parlamento reveste outras
dimensões, tais como, a dimensão administrativa[11], conforme o afloramos
supra e a seu tempo tentaremos desenvolver com recurso a diversos
quadrantes da doutrina do Direito Constitucional e Administrativo.

Com efeito, todos os Parlamentos dispõem de órgãos internos que se ocupam
da administração e gestão dos seus recursos humanos, materiais
(patrimoniais e financeiros) e imateriais (direitos autorais e outros). A
Assembleia Nacional de Angola não foge à regra, contando com uma
Administração Parlamentar, prevista na LOAN como um conjunto de" Serviços
Hierarquizados, denominados "Secretaria Geral".

Põe-se, assim, a questão de saber que fins prossegue a Administração
Parlamentar, sendo certo que o Parlamento não se confunde com a
Administração Pública, tendo em conta o princípio da separação de poderes?

À propósito, é particularmente elucidativa a posição de Feijó, Carlos e
Paca, Cremildo[12] (2013), segundo a qual, "a função legislativa não visa,
em concreto, satisfazer necessidades colectivas, mas tão somente, definir
em abstracto, quais são essas necessidades e como satisfaze-las".

Deste modo, cabe ao nosso estudo demonstrar que a Administração Parlamentar
prossegue os fins teleológicos da própria Assembleia Nacional, garantindo o
apoio técnico e administrativo indispensável a realização das suas
múltiplas funções, sendo a mais importante a de legislar.

Neste sentido, Buange, Camilo Gomes (2012)[13]. que afirma que " o fim da
Administração Parlamentar é, pois, o de auxiliar, de modo regular e
permanente, o exercício adequado da função legislativa, constitucionalmente
encarregue à Assembleia Nacional", sendo de aquiescer que tal auxílio é
extensivo à todas outras funções cometidas ao Parlamento, tais como a de
representação popular e de fiscalização dos actos do Governo e da
Administração Pública.

O autor supracitado explica, com rigor científico, porque que o Parlamento
e os Tribunais - além das suas tradicionais funções de legislar e dirimir
conflitos - prosseguem actividades próprias da administração pública,
relativizando-se, assim, o princípio da separação de poderes entre o
Executivo, o legislativo e o judicial[14].

Araújo, Raul (2012)[15] diz que "não é suficiente formar Comissões
Parlamentares Permanentes e nelas fazer integrar os Parlamentares mais
capazes tecnicamente. Para que elas possam fornecer ao Parlamento uma
resposta eficaz à capacidade técnica do Governo, é indispensável que elas
sejam dotadas de um quadro auxiliar com capacidade. É este o exemplo da
experiência americana. As Comissões Parlamentares Permanentes do Senado e
da Câmara dos Representantes são dotadas de um staff altamente qualificado,
o que lhes permite fazer o acompanhamento e controlo da actividade do
Executivo e da administração".

Na verdade, o Executivo tem sempre atrás de si uma grande máquina, cujo
acompanhamento não é fácil por parte do Parlamento.

O nosso estudo propõe-se, pois, demonstrar o peso da máquina burocrática e,
em especial, dos Funcionários Parlamentares, nas performances dos processos
que ocorrem no Parlamento.



CPPPGL da Faculdade de Direito em Luanda, aos 23 de Setembro de 2014



O MESTRANDO

GERALDO CAMBIETE













































V - BIBLIOGRAFIA

Amaral, Diogo Freitas: Curso de Direito Administrativo, 2.ª Edição,
2013, Almedina, Portugal;

Araújo, Raul: A função Política da Assembleia Nacional, Revista n.11
da FDUAN, 2012.

Buange, Camilo Gomes: o Exercício do Poder Decisório em Matéria
Administrativa na Assembleia nacional, Caleidoscópio, 2012;

Canotilho, José Joaquim Gomes, Direito constitucional e Teoria da
Constituição, 7.ª Edição, Edições Almadina, Portugal;

Constituição da República de Angola;

Carvalho, Eduardo: Metodologia do Trabalho Científico, 2.ª Edição,
2009, Lisboa;

Cristina Queiróz: o Parlamento como factor de Decisão Política,
2009, Coimbra Editora, Portugal;

Feijó, Carlos e Paca, Cremildo, Direito Administrativo, 3.ª Edição,
Mayamba Editora, Luanda;

Gouveia, Jorge Barcelar: Direito Constitucional de Angola, FDUAN,
Lisboa/Luanda;

Lopes, Lívio: Parlamento Caboverdiano: os Fundamentos de uma
Reforma, Alfa-Comunicações, Praia, Cabo-verde, 2014;

Lei Orgânica da Assembleia Nacional;

Massuanganhe, Israel Jacob: Repensando na Administração Pública: as
Expectativas Humanas na Gestão Estratégica do Serviço Público, Revista
da FDUAN n.º1, 2013.;

Massuanganhe, Israel Jacob : Lições de Metodologia de Investigação e
Pesquisa Aplicada, CPPPGL da FDUAN, 2014.

Neto, António Pitra: Apontamentos sobre Matérias de Direito
Administrativo, Mayamba Editora, 1.ª Edição, 2011;

Regimento da Assembleia Nacional;

Teixeira, Carlos e dos Santos, Onofre, Direito de Angola, FDUAN, 1.ª
Edição, 2014;












-----------------------
[1] in Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª Edição, pag.
871 e sgs. Almedina, Coimbra.

[2] Uma definição que em nossa modesta óptica, peca por defeito, ao deixar
de fora a competência concorrencial do Executivo.

[3] Segundo Carlos Feijó, parafraseado por Gouveia, Jorge Barcelar, Direito
Constitucional de Angola, Lisboa/Luanda, 2014.

[4] Podendo haver lugar a audição pública, se necessário ( art. 185.º do
RIAN).

[5] São os chamados órgãos internos, que Gomes Canotilho, no seu Direito
Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª Edição, pag 632.º, Almedina,
Coimbra e, na sua esteira outros autores Portugueses e angolanos que
denominam por órgãos auxiliares (Jorge Balcelar Gouveia, Calos Feijó e
Cremildo Paca, Raul Araújo, entre outros).



[6] Ou seja, o Parlamento por detrás das câmaras.

[7] A falta de law enforcement, na perspectiva anglófona.

[8] A Administração Parlamentar, mais do que um conjunto de serviços, pode
ser também encarada como uma ciência voltada para a gestão dos Parlamentos.

[9] Pelo menos até aqui não nos ocorre aventurarmo-nos nas areias movediças
do conceito e autonomia didactico-científica do chamado Direito
Parlamentar.

[10] Vamos procurar ouvir todas as sensibilidades políticas representadas
no Parlamento.

[11] Para já, GOUVEIA, Jorge Barcelar, em Direito Constitucional de Angola,
pag.424, 1.º &.

[12] Direito Administrativo, 3.ª Edição, Mayamba Editora, PAG. 84, Luanda.

[13] O Exercício do Poder Decisório em matéria Administrativa na Assembleia
Nacional, PAG.59, Caleidoscópio, Portugal.

[14] Idem, pags. 14 e 15.

[15]A função política da Assembleia Nacional, in Revista da Faculdade de
Direito, Luanda, pag18.
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