O PAPEL DA IGREJA CATÓLICA DE LONDRINA DURANTE A DITADURA MILITAR

June 6, 2017 | Autor: Vinícius Assis | Categoria: Ensino de História, Londrina, História do brasil república
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O PAPEL DA IGREJA CATÓLICA DE LONDRINA DURANTE A DITADURA MILITAR

Alan Diego Baptista Vinícius Augusto Andrade de Assis PIBID/História/UEL Resumo: Este trabalho faz parte das atividades do Projeto Minha cidade no período da Ditadura Militar do PIBID História 2014 da Universidade Estadual de Londrina, orientado pela Professora Marlene Cainelli1 e desenvolvido no Colégio Hugo Simas. Trabalharemos neste projeto com o conteúdo sobre a Ditadura Civil Militar no Brasil especificamente na região de Londrina e o papel da Igreja Católica dentro desse contexto, trabalhado com os alunos do 9º D do Colégio Estadual Hugo Simas. O mesmo faz parte do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina. O objetivo é trabalhar com os alunos a reflexão sobre como a Igreja se posicionava perante o que vinha ocorrendo no país dentro do período ditatorial a partir de seu contexto, a sua região. Trabalharemos com a ideia de perspectiva da cognição histórica situada proposta, por Maria Auxiliadora Schimdt (SCHIMDT, 2009), onde a partir de um estudo exploratório antecipado, buscaremos compreender qual o conhecimento sobre os conceitos e conteúdos que os mesmos possuem sobre a temática e a partir daí buscar ampliar o campo de debate com apresentação de fontes históricas locais e gerais, sempre buscando um diálogo entre o local, o nacional e a contemporaneidade do aluno. Atualmente, com o advento dos 50 anos do Golpe, da comissão da verdade e de outras séries de eventos que vem ocorrendo, vemos a oportunidade de discutir as transformações pela qual a nossa sociedade e as instituições religiosas presenciam, contribuindo assim para a formação do senso crítico e de analise do aluno. Palavras Chaves: Igreja; Ditadura; Ensino de história; Cognição histórica. Financiamento: CAPES

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Professora do departamento de História da UEL e coordenadora do PIBID de História.

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Ao planejar nossas aulas optamos por trabalhar com dois conceitos. Um deles o de cognição histórica situada, que é apresentado e analisado por Maria Auxiliadora Schimidt (SCHIMIDT, 2009). Ao analisar os PCNs a autora destaca três tipos de entendimento da aprendizagem histórica, as formas e meios pela qual o aluno tem acesso ao conhecimento, como se apropriam e incorporam valores repassados pela escola a sua vivência e a análise a partir do pressuposto da diferenciação do modo informal de saber escolar, da qual o aluno adquire informações. O outro conceito utilizado em nosso planejamento de aula foi o de “aula oficina”, defendido por Isabel Barca (BARCA, 2004), onde partimos nossa exposição sobre a temática a partir da discussão levantada pelos alunos com base em seus conhecimentos prévios, e daí direcionamos o andamento das aulas proporcionando uma troca de experiências entre aluno e professor. Para trabalhar o papel da Igreja no período ditatorial, se fez necessário um estudo exploratório, onde buscamos conhecer o meio a qual o aluno pertence, sua orientação religiosa (para trabalhar com os diversos e possíveis conhecimentos e posicionamentos do aluno ante a Igreja Católica que teve importante papel nesse contexto histórico), seu posicionamento sobre a disciplina de História e qual seu conhecimento prévio sobre a temática a ser abordada A ditadura civil militar do Brasil. O estudo exploratório se deu com observações da sala durante aulas ministradas pela professora titular e supervisora de nossa intervenção Sandra Regina Denipoti, com temáticas diversas, além da aplicação de um questionário de conhecimentos prévios e sociocultural. Apresentaremos abaixo algumas tabelas que acreditamos ser necessária para compreensão do meio onde aplicamos nossas aulas. A sala de aula conta com 34 alunos, da qual estavam presentes 32 alunos na data da aplicação do questionário prévio. Ao serem questionados com a seguinte questão: “Possui alguma pratica religiosa ou religião? Qual?” o quadro de resposta foi:

Respostas

Meninos

Meninas

Católicos

4

10

Evangélicos

4

9

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Não Possui

1

2

Cristão

1

-

Congregação Cristã no Brasil

-

1

Estudo exploratório (Alan e Vinícius, 2014).

Dos meninos, nenhum especificou prática alguma. Das meninas, duas alegam pratica de só usarem saias, uma de que frequenta grupo de oração, uma de que vai as missas com a família, uma alega que não frequenta a igreja, apesar de católica e seis de que não possuem nenhuma prática. Ao serem indagados sobre o que é História, o quadro de resposta foi:

Opções

Meninos

Meninas

Tudo que já aconteceu no mundo.

7

12

A disciplina História.

2

1

O passado.

4

5

Uma interpretação do passado.

7

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Ao apresentarmos a questão “Porque você acha importante aprender História? Justifique.”, conseguimos o seguinte quadro de respostas:

Categorias É importante aprender sobre o passado somente pelo

Meninos Meninas 7

10

2

-

1

9

-

1

-

2

passado. É importante aprender sobre o passado para mudanças no futuro. É importante aprender sobre o passado para compreender o presente. É importante aprender sobre o passado para compreender o presente e repensar o futuro. Outros

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Das meninas que optaram por outros, uma não vê importância, mas acha interessante e uma acredita ser importante para passar no vestibular. Ao ser apresentado a questão “O que você pensa quando ouve falar em Ditadura Militar no Brasil?”, o quadro de respostas foi:

Alternativas Período da política brasileira em que os militares governaram o Brasil.

Meninos Meninas 10 16

Falta de democracia, ou seja, repressão a quem fosse contra a Ditadura.

4

15

Censura à artistas que criticassem aos militares. Momento em que o Brasil cresceu milagrosamente, deixando de ser um país agrário.

2 -

6 5

Momento decisivo do Brasil na luta contra o comunismo.

5

4

Ao analisarmos esses dados podemos ter uma noção da compreensão e do grau de desenvolvimento cognitivo dos alunos, podendo assim traçar metas e métodos de intervenção. Nossa intervenção foi planejada para ter a duração de quatro aulas, no entanto, devido o envolvimento e participação dos alunos o conteúdo programado foi ministrado em oito aulas oficinas. O objetivo de nossas aulas foi o de levar os alunos a refletir além dos fatos apresentados no livro didático que indicam como foi o período ditatorial no Brasil, mas também fazer com que pensassem, discutissem e dissertassem sobre as mudanças de mentalidades, pensamentos, posicionamentos e ações ocorridas durante os anos de 1964-1985, dito Ditadura brasileira e quais atitudes demonstram essas mudanças. Em nossas avaliações analisamos a progressão do conhecimento dos alunos sobre os conceitos que envolvem a ideia de ditadura e suas percepções sobre a temática, trabalhamos segundo e visão de outras disciplinas. A ideia foi de desenvolver o senso crítico e de análise do aluno, além da conscientização dos perigos de adesão ás diversas causas sociais e políticas sem um profundo estudo sobre os ideais, objetivos e meios de ação para alcançar os devidos fins.

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Como objetivos mais específicos, pretendíamos, ainda que inicialmente desenvolver a capacidade de associar qualquer evento histórico com a ideia de processo e continuidade, aprimorar a capacidade de ordenar e debater ideias, além de propor formas de ação para mudanças e conscientização do próximo para melhor. Conscientizá-los que a mudança de sua forma de pensar e agir não é desagradável, mas a ausência de reflexão sobre o mundo que nos cerca sim. Proporcionamos aos alunos a experiência de trabalhar com documentos primários, como trechos do manifesto dos bispos do Paraná que foi publicado na Folha de Londrina. Com isso trouxemos também a noção de que o meio onde vivemos é parte integrante com participação ativa na história do país, aproximando algo que para eles parece ser distante da sua realidade, isso também foi facilitado pelo fato da Folha de Londrina ser um jornal influente na comunidade do Norte do Paraná até os dias de hoje. Iniciamos nossa intervenção buscando a participação dos alunos, de forma a fazer com que expusessem aos demais o que cada um entendia por ditadura. As respostas foram das mais diversas, desde “período de governo regido por militares”, “modelo de governo que visava proteger o país do comunismo”, “período onde não havia liberdade de expressão”, “período com leis mais severas”, “período onde não havia eleições”, “período de produção musical com críticas veladas” entre outras. Com base nessas exposições, definimos ditadura, ressaltando seu caráter autoritário e violento. O princípio das aulas se dava em extrair ao máximo possível o conhecimento do aluno, quando as ideias dos alunos iam ficando escassas, adotávamos o método de sugestão, e a partir daí os mesmos iam associando essas sugestões a conhecimentos diversos e assim formulando novas ideias. Quando chegávamos a um impasse, onde o aluno não compreendia algum termo ou não dominava algum conceito, adotávamos métodos expositivos fazendo com que discutissem o que lhes fora apresentado. Para trabalhar a temática, primeiro optamos por discutir o que foi o período ditatorial, suas características, seus desenvolvimentos, fatos mais marcantes, principais agentes, entre outros elementos que víamos ser de relevância para a compreensão dos debates. Foi solicitado também que os alunos coletassem com pessoas conhecidas que vivenciaram o período 2839

ditatorial suas impressões e assim terem uma noção de visões sobre a ditadura e ter com que compararem posteriormente essas visões com suas conclusões resultantes dos debates nas aulas. Após essas discussões iniciamos o debate sobre os papeis da Igreja, a ideia deste tema foi idealizada pelos professores Marco Antonio Neves Soares 2 e Sandra Denipoti, estes afirmaram a importância da discussão nas escolas sobre a posição da Igreja Católica como instituição em relação ao regime militar no Brasil. Apresentando dois trechos do manifesto dos Bispos do Paraná que fora publicado no dia 01 de abril de 1964, data da consolidação dos militares no poder, a matéria foi publicada no dia 03 de abril. O documento é uma prova contundente do apoio da Igreja ao golpe. Dentre as diversas temáticas com posicionamentos favoráveis aos militares, optamos por trabalhar o trecho onde os bispos exaltam a necessidade de barrar os avanços comunistas no país, onde alegam que por possuir uma filosofia materialista, o comunismo se torna incompatível com os princípios cristãos. O documento finaliza alegando que a Igreja tem uma posição crítica ao capitalismo “egoísta e indiferente” e que “continua a condenar os excessos de lucros e de poderio econômico”. Por essa parte do manifesto se fez possível a discussão sobre qual a visão da população sobre o capitalismo, pois suas opiniões também eram formadas a partir dos posicionamentos da Igreja. Ressaltado que a maioria da população urbana compartilhava desse pensamento e que a população rural que não lutava por reformas agrárias estava em sua maioria indiferente ao que ocorria no país, apesar dos reflexos do governo na economia. Assim como a população rural e interiorana se manteve indiferente ao pré-golpe e ao golpe, o mesmo ocorreu durante os períodos de perseguições e torturas, já que devido a dificuldade de circulação da notícia, censura e a não vivência da violência por parte dos militares tudo isso se tornava distante dessa população, ressaltando é claro exceções em algumas regiões. O segundo trecho trabalhado do documento em questão diz respeito ao apoio da Igreja as reformas na constituição, mas que a forma como os “comunistas” a conduziam, satisfaria os interesses particulares de algumas

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Professor do departamento de História da UEL e coordenador do PIBID de História.

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camadas apenas, que iam contra os três poderes democráticos da Nação e que se concretizada fosse prejudicaria o bem comum, já que subverteria a ordem. O documento encerra apelando e dando apoio as forças armadas, para que zelassem pelos altos interesses de um Brasil que nasceu sob o signo da Cruz de Cristo. Ressalta ainda os valores cristãos e a necessidade dos cidadãos de bem em participar da vida político-partidária, associações de classes, movimentos, etc. O que levanta a hipótese da não avaliação de futuros danos a democracia que um golpe e um governo ditatorial poderia causar a sociedade. A publicação na Folha foi parcial, sendo recortado apenas o que era conveniente ao momento, optamos por não trabalhar com o documento na íntegra, pois tornaria o debate demasiadamente complexo. Trabalhando com trechos do que foi publicado com recursos extras como as entrevistas, exposições e um filme, poderíamos chegar a uma reflexão menos densa e mesmo assim válida e eficaz sobre a temática. Para expandir as discussões sobre os diversos papeis da Igreja em todo o período ditatorial, apresentamos trechos do filme “Batismo de Sangue”, que mostra frades católicos sendo torturados. Com esses dois documentos (o manifesto e o filme), conseguimos juntamente com os alunos analisar a mudança

de

posicionamento

da

Igreja

mediante

o

desenrolar

dos

acontecimentos. A Igreja Católica não apoiou as torturas. Logo que as mesmas começaram a Igreja se posicionou contra esses atos, mas mediante a violência que era crescente e a truculência dos que estavam no governo, a instituição se viu ameaçada caso se posicionasse contra o governo, ateve-se assim a criticar apenas os atos de torturas e não os responsáveis por elas, o governo. De acordo com estudos realizados sobre a posição da Igreja católica diante das torturas, podemos afirmar que uma forma que os clérigos encontraram em resistir a brutalidade que ia tomando proporções cada vez maior foi a de dar refúgio e apoiar os guerrilheiros em sua logística, mas temendo as consequências não se manifestava abertamente contra o governo e a favor da guerrilhas. Assim que os militares no governo tiveram conhecimento desse apoio, as torturas começaram a ser aplicadas também a membros da mesma. Essa 2841

ação teve como consequência um posicionamento mais significativo da Igreja contra os atos de tortura e como o governo estava sendo direcionado. A oposição da Igreja Católica, ainda que moderada, juntamente com outros fatores, como o tempo foi desgastando as ações dos militares, e posicionando a população contra o que o, ocorria no país, levando a principio uma abertura no governo e culminando depois no restabelecimento da democracia. Para aproximar a discussão da realidade dos alunos, foi discutido o papel da base militar de Apucarana (município de região metropolitana de Londrina), para onde os presos políticos da região eram enviados para serem interrogados e torturados. Foi apresentado também o papel da Igreja Católica de Londrina no combate as ações opressoras do governo na região, contando com o apoio do Bispo de Londrina que outrora assinou o manifesto dos bispos do Paraná que declarou apoio aos militares. Para avaliar o desenvolvimento da compreensão dos alunos em relação à temática, foi solicitado um texto dissertativo onde trabalhassem com a entrevista feita antes das discussões sobre a temática, com as anotações das discussões das aulas, relacionando como pensavam a ditadura brasileira antes das aulas e a que conclusões chegaram ate o momento. O resultado foi positivo dentro do que se pretendia com as aulas, que era o de mostrar que um fato possui diversas versões, que mudanças de pensamentos e posicionamentos ocorrem, que tudo é um processo e que o que fica na memória coletiva fatos mais impactantes ou que afetam de forma mais significativa os que estão envolvidos, mas que antes e depois desses fatos, existiu e continua a existir ações, que se as mesmas não forem refletidas e se não nos posicionarmos de forma consciente, tudo pode se repetir, pois a história não tem fim, ela aconteceu, esta acontecendo e continuará a acontecer.

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Bibliografia

CASTEX, Lilian Costa. O CONCEITO SUBSTANTIVO DITADURA MILITAR BRASILEIRA (1964-1984) NA PERSPECTIVA DE JOVENS BRASILEIROS: UM ESTUDO DE CASO EM ESCOLAS DE CURITIBA – PR. 2008. Dissertação (Mestrado em Educação) – Setor de Educação, Universidade Federal do Paraná. Curitiba. Disponível em: http://www.lapeduh.ufpr.br/arquivos/2010-02-28-10-33-48dissertacao2008castex.pdf - Acesso em 30.07.2014 FAUSTO, Boris. HISTÓRIA DO BRASIL. 14º Ed. Editora da Universidade de São Paulo, 2012. São Paulo. SCHMIDT, Maria Auxiliadora. Cognição histórica situada: Que aprendizagem é esta? In: SCHMIDT, Maria Auxiliadora. BARCA, Isabel. APRENDER HISTÓRIA: PERSPECTIVAS DA EDUCAÇÃO HISTÓRICA. 1ª Ed. Editora Unijuí, 2009. p. 21-48. AUTORIA COLETIVA DOS BISPOS DO PARANÁ. Manifesto dos bispos do Paraná examina a crise do país e pede solução legal. Folha de Londrina, Londrina, 03 de abril de 1964, Caderno Política. BARCA, Isabel. Aula Oficina: do Projeto à Avaliação. In: PARA UMA EDUCAÇÃO DE QUALIDADE: Atas da Quarta Jornada de Educação Histórica. Braga, Centro de Investigação em Educação (CIED)/ Instituto de Educação e Psicologia, Universidade do Minho, 2004, p.131-144.

Filmografia Batismo de Sangue. Helvécio Ratton. 2007. Drama. Brasil. Baseado no livro homônimo de Frei Betto de 1983.

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