O Papel Da Liderança Em Organizações Do Terceiro Setor

May 23, 2017 | Autor: Gabriel Isboli | Categoria: Leadership, Third Sector, Third Sector Studies
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O PAPEL DA LIDERANÇA EM ORGANIZAÇÕES DO TERCEIRO SETOR 2-2016(106-121) Gabriel Henrique Pimenta Isboli* Luiz Tatto**

RESUMO

O terceiro setor é composto de organizações privadas com fins públicos, que não executam suas atividades visando lucratividade dos seus acionistas, mas buscam o cumprimento de suas atribuições de forma a gerar ganhos ao setor da sociedade ao qual são voltadas. Muitos dos funcionários que trabalham nessas organizações são voluntários, executando suas tarefas sem visar retorno financeiro. Com isso, tornase importante destacar a importância do líder, pessoa responsável por inspirar os voluntários e guiar a organização em suas atividades. O estudo aqui desenvolvido busca elucidar aspectos fundamentados em três pilares centrais: organizações, terceiro setor e liderança. Assim, foi feito um ensaio teórico, objetivando compreender a relação dessas três bases, resultando em uma discussão dos papéis desempenhados pelos líderes em organizações pertencentes ao terceiro setor, de modo que assim evidenciem sob quais aspectos esses líderes devem basear suas atuações, visando sempre o sucesso da organização em que atua. O resultado alcançado foi a identificação de cinco papéis principais: motivador, buscador de recursos, controlador da qualidade, antecipador de tendências e preparador de sucessores. Embora os autores pesquisados chegassem a esse consenso sobre os papéis desempenhados, não houve um indicativo sobre um melhor perfil de liderança para esse tipo de organização. Assim, concluiu-se que não existe um “passo-a-passo” pronto, mas conhecimentos em teorias motivacionais e padrões de liderança que podem fornecer base para o líder desempenhar os papéis esperados com excelência, mesmo em situações incomuns, para assim atingir as metas estabelecidas. Palavras-chave: Liderança. Terceiro setor. Organizações. Voluntariado.

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Doutorando em Administração (Universidade Estadual de Maringá - UEM), Mestre em Administração (UEM), Especialista em Marketing pelo MBA Gestão de Varejo e Vendas (UEM). E-mail: [email protected]. ** Doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Email: [email protected].

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1 INTRODUÇÃO

As organizações atuam orientadas para diferentes enfoques. O primeiro setor é composto pelas empresas com finalidades lucrativas que interagimos todos os dias, direta ou indiretamente. Tais empresas são muito comuns de serem encontradas e os objetivos dessas organizações podem ser generalizados ao ponto de defini-los a uma ótica como acumular cada vez mais riquezas. O segundo setor é composto pelas organizações controladas pelo Estado, ou seja, são organizações públicas onde as atividades desenvolvidas possuem finalidades voltadas à população como um todo. Se o primeiro setor é composto por organizações privadas para fins privados e o segundo setor é composto por organizações controladas pelo Estado, como podemos caracterizar então esse chamado ‘terceiro-setor’? O terceiro-setor é composto por organizações privadas, mas que atendem a interesses públicos. É o caso, por exemplo, das entidades de fins filantrópicos, organizações da sociedade civil de interesse público, fundações, organizações sociais, serviço voluntário, instituições de ensino filantrópico, associações e as tão conhecidas organizações não governamentais (ONGs). Liderança é um assunto alvo de variados estudos, com diversas obras tratando sobre essa temática, como é possível verificar em Stauffer (2007), Tannenbaun e Schmidt (1987), e obras classificadas como “autoajuda”, por exemplo. Ao mesmo tempo, é um assunto amplo que possibilita aprofundamento em diversos aspectos. Existem diversas teorias que visam explicar formas de motivar as pessoas, ou como o líder é caracterizado com base em suas atitudes – como Locke et al (1981), Herzberg (1964) e Maslow (1943). Mas, também, existem estudos relacionados aos papéis que o líder desempenha nas organizações, como os realizados por Stauffer (2007), Robbins (2005) e Uyterhoen (1986), por exemplo. O ensaio teórico que se segue buscou explorar qual o papel desempenhado pelos líderes em organizações do terceiro-setor, compreendendo as atribuições que essas pessoas possuem e quais suas contribuições. Assim, o estudo foi dividido da seguinte forma, buscando melhor entendimento: inicialmente, encontram-se caracterizados os pilares do tema,

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apresentando os conceitos-chave e também o desenvolvimento do título do estudo propriamente dito. Depois, estão apresentados os indicativos metodológicos presentes, demonstrando que há validade científica na construção. Por fim, são apresentadas as considerações finais, seguidas por todo o referencial utilizado.

2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 ORGANIZAÇÕES

Os indivíduos convivem em agrupamentos visando sobrevivência e cumprimento de objetivos comuns há milênios. Desse modo, as sociedades antigas desenvolveram, mesmo que rudimentarmente, o conceito de organizações. Tal conceito

refere-se

ao

agrupamento

de

pessoas

visando

atingir

objetivos

preestabelecidos pelo grupo, desenvolvendo-se, ao longo das gerações, chegando até as noções capitalistas das organizações. As organizações podem ser entendidas como a união de recursos dedicados a uma finalidade (ou finalidades) comum. Assim, elas apenas existem na presença de pessoas capazes de desenvolver uma comunicação, dispostas a auxiliar, através de uma ação conjunta, o cumprimento de objetivos comuns (MAXIMIANO, 2009; CHIAVENATO, 2006). Verificando os pensamentos defendidos pelos autores acima, existe uma convergência para o entendimento de que organizações são grupos de pessoas dedicados a fins comuns. Com isso, apura-se que as organizações apenas direcionam os objetivos conforme a razão de existência da mesma, seja ela lucrativa ou não, privada ou governamental, por exemplo.

2.2 TERCEIRO SETOR E ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS

Dentre diversos ramos de atuação em que uma organização pode operar, é possível caracterizar em três formas fundamentais: organizações de cunho econômico, político ou social. Nesse trabalho, será dada ênfase às organizações de cunho social, chamadas também de organizações do ‘terceiro setor’. Este setor pode ser entendido como aquele onde se encontram as organizações sem fins lucrativos. Essas organizações desenvolvem serviços voltados ao benefício

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de um determinado segmento da sociedade sem buscar auferir vantagens econômicas, sendo que o lucro obtido é revertido aos projetos desempenhados e à manutenção da própria instituição, principalmente (NANUS; DOBBS, 2000). De acordo com Nanus e Dobbs (2000), toda nação é composta por organizações pertencentes a algum dos setores já nominados. Cada um desses setores comporta atividades específicas e também responsabilidades condizentes com a natureza da organização. Adicionam que o terceiro setor atua auxiliando no desenvolvimento social, ajudando direta e indiretamente. Ajudam as pessoas diretamente beneficiadas com a atividade desenvolvida, como também em uma relação de longo prazo, em que podem acabar modificando padrões da sociedade, como a diminuição dos índices de criminalidade, por exemplo. O terceiro setor pode ser subdividido nos seguintes desmembramentos: (a) entidade de fins filantrópicos; (b) organização da sociedade civil de interesse público; (c) associações; (d) fundações; (e) organização social; (f) serviço voluntário; (g) instituições de ensino filantrópicas; e (h) organizações não governamentais (ONGs) (BOUDENS, 2000; CARRION, 2000). Para fins do ensaio aqui desenvolvido, foca-se apenas a última classificação, ou seja, as organizações não governamentais, em vista de prezar por uma maior delimitação nesse primeiro momento exploratório de estudo. Carrion (2000, p. 239) define as ONGs da seguinte forma:

Dentre o conjunto de organizações referidas, as ONGs parecem ser aquelas cujas ações mais se aproximam do trabalho capaz de contribuir para o desenvolvimento da cidadania. Em grande parte remanescentes dos movimentos sociais que atuaram na resistência aos governos militares, e de entidades que pioneiramente passaram a realizar atividades constitucionalmente atribuídas ao Estado, tais como defesa dos direitos humanos, elas corresponderiam ao ‘segmento mais politizado’ do terceiro setor, no Brasil.

Embora o terceiro setor seja constituído por diversos tipos de organizações (conforme apontado anteriormente), aqui se aborda a terminologia ‘organização não governamental’ (ONG) como sinônimo de ‘terceiro setor’, englobando todas as suas subdivisões, com o propósito de tornar a leitura mais fluida e demonstrando a articulação teórica, uma vez que o foco do estudo não é discutir conceitos, tal como feito por Cazzolato (2009).

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Contribuindo para uma melhor compreensão sobre o que é o terceiro setor, Drucker (1997) indica que as instituições sem fins lucrativos executam determinado serviço como forma de gerar mudanças em um indivíduo e, posteriormente, em uma determinada sociedade. Tal definição é compatível com as apontadas por Boudens (2000), Nanus e Dobbs (2000). Vê-se, então, que, de acordo com as visões expostas pelos autores, o terceiro setor baseia-se em atividades relacionadas com a melhoria da sociedade, desenvolvendo programas e atividades que resultem, direta ou indiretamente, na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos ali inseridos. Variando conforme o tipo de atividade desempenhada, uma organização é classificada com diferentes denominações para os fins legais, embora o propósito seja comum – colaborar com a sociedade.

2.2.1 O papel das organizações do terceiro setor

As organizações do terceiro setor buscam desempenhar atividades de cunho social no ambiente em que se encontram, de modo a contribuir com as realidades que acabam por ser postas em segundo plano pelos outros dois setores, o econômico e o político. Como os trabalhos desempenhados por essas organizações não visam lucro, nota-se que o crescimento dessas instituições fica bastante dificultado, uma vez que nem sempre são encontrados colaboradores para a causa, de modo que a sobrevivência depende muito de doações e de líderes para guiá-las durante as suas atividades. Mas, afinal, qual o papel das organizações do terceiro setor? De acordo com Nanus e Dobbs (2000), a definição defendida é a de que, assim como as empresas são o instrumento primário do setor econômico, as organizações do terceiro setor detêm a mesma importância no setor social, assim como o setor político possui os órgãos governamentais representando tal posição. Os autores ainda argumentam que essas organizações transcendem a noção popular de que são apenas instituições de caridade, em que pessoas com alto poder aquisitivo aliviam seus sentimentos de culpa através de doações, afirmando que tais organizações vão muito além de tal estereótipo. Acrescentam que tais organizações contribuem direta e indiretamente no desenvolvimento da sociedade, em uma relação de benefício mútuo entre trabalhador-beneficiado, além de também

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considerar uma relação de longo prazo, pois as ajudas hoje despendidas poderão contribuir para a edificação de uma sociedade mais igualitária no futuro. Sabendo que o Estado não possui os recursos necessários para tratar de modo eficaz todas as necessidades particulares de variados segmentos da sociedade, ele então estimula a criação de organizações do terceiro setor, conforme relatado por Bresser-Pereira (2008). O autor expõe que o Estado considera não possuir os meios necessários, então delega para outras organizações a responsabilidade de atuar nessas carências sociais, uma vez que considera as organizações pertencentes ao terceiro setor mais capacitadas para desenvolver um trabalho mais bem conduzido nessas questões. De modo a exemplificar esta relação, Nanus e Dobbs (2000) citam alguns exemplos que clarificam a participação das organizações do terceiro setor na sociedade. Não apenas aqueles diretamente beneficiados pelas atividades das organizações do terceiro setor são agraciados, mas também quem ajuda, como no caso dos escoteiros, em que tais jovens, por situarem-se em uma idade em que ainda estão em processo de formação intelectual, poderão desenvolver uma sociedade mais centrada em responsabilidades, podendo proporcionar uma diminuição dos índices de criminalidade no longo prazo. Outro exemplo citado pelos mesmos autores é o caso de que as organizações do terceiro setor também desempenham um papel de sustentação econômica e governamental, pois os custos para administrar as questões sociais seriam muito maiores caso as organizações do terceiro setor parassem de atuar, o que geraria custos adicionais englobando as atividades desempenhadas, bem como o trabalho voluntário (que passaria a ser remunerado) e as doações que deveriam ser adquiridas via transações comerciais. Outra situação relatada por Nanus e Dobbs (2000), como uma utilidade das organizações em questão, é que elas atuam efetivamente no desenvolvimento humano das sociedades (seja diretamente nos bairros/cidades onde se encontram inseridas, como também em diversos países, compartilhando assim uma ideologia com vários povos), auxiliando no desenvolvimento de valores morais (como os escoteiros), fornecendo perspectiva histórica (como os museus), e ainda cuidados de saúde (como hospitais comunitários). Quando uma empresa privada contrata algum funcionário que teve contato com alguma dessas organizações, contrata junto toda a experiência que o mesmo adquiriu, como a iniciativa, altruísmo, comunicação e autocontrole, por exemplo.

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Demonstrando um alinhamento com o pensamento desses autores, de que as organizações do terceiro setor não devem ser vistas unicamente sob o prisma de instituições de caridade, Souza (2005, p. 137) relata, em sua tese de doutorado, que os focos dessas instituições podem ser muito variados, englobando diversas frentes sociais, como “[...] promoção da cultura, saúde, educação, assistência social, defesa do meio ambiente, dos direitos humanos, da democracia etc”. Complementando os pontos, Drucker (1997) aborda a ideia de que tais instituições não desejam que os usuários finais sejam consumidores dos serviços prestados, mas que estes sejam executores das atividades, provocando mudanças nos seres humanos. Drucker ainda adiciona, na mesma obra, que as organizações do terceiro setor vendem conceitos e abstrações como uma espécie de vetores para a consecução dos objetivos desejados como, por exemplo, o caso de um doente em um hospital comunitário: você não vende a doença para o médico, mas sim a oportunidade de o médico tornar melhor a vida da pessoa ao fornecer-lhe saúde. Essa é a forma que o marketing em uma organização desse tipo deve seguir: “vender” conceitos, em uma aproximação à orientação para o mercado, como visto em Isboli (2015). Levando em consideração as informações e exemplificações encontradas, é possível verificar que o terceiro setor é um importante potencializador do desenvolvimento social. As organizações nele inseridas desempenham variados papéis no auxílio da sociedade. Contribuem desde situações de ação imediata, como a construção de moradias para famílias vítimas de desastres naturais, até atividades cujos impactos serão passíveis de mensuração apenas no longo prazo, como o caso dos escoteiros, em que se busca lapidar o caráter e fomentar a responsabilidade do jovem, para que este impacte positivamente na sociedade em momento futuro.

2.2.2 Perspectivas futuras

O terceiro setor está presente globalmente há tempos, tendo desempenhado incontáveis trabalhos, contribuindo com edificações que visam melhorar a vida das pessoas. Mesmo com as dificuldades de consolidação no meio, esse tipo de organização apresentou grande crescimento nos últimos anos. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2012, 2008) faz um comparativo da trajetória do

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crescimento referente às organizações sem fins lucrativos, no qual se analisa o espaço de tempo compreendido entre 1996 até 2005. Neste estudo, informa-se que, em 1996, havia pouco mais de 211 mil organizações do terceiro setor e, em 2010, houve um crescimento de aproximadamente 164%, atingindo o número total que ultrapassa

556

mil

organizações.

Essa

evolução

demonstra

a

crescente

preocupação da sociedade com as desigualdades presentes no território nacional. Sobre esse setor, entre os anos de 2002 e 2005, vê-se na pesquisa de IBGE (2008) o relato de que o maior crescimento ocorreu com as instituições ligadas ao meio ambiente (61% de aumento no período), demonstrando questão evidente nos dias atuais dos cuidados focados com a preservação ambiental e sustentabilidade. Outro setor que também figurou com o crescimento expressivo foi o de atividades ligadas à religião (18,9%). Por outro lado, a pesquisa supracitada relata que as instituições prestadoras de atividades ligadas à “Saúde, Educação e Pesquisa e de Assistência Social” registraram uma perda na participação das instituições, saindo de 22,9% do total das instituições em 1996 para registrarem a marca de 18,9% em 2005. Desse modo, tomando os dados coletados pelo IBGE, é possível afirmar que a maior preocupação da sociedade sobre a preservação ambiental acaba acarretando a criação de instituições voltadas a essa causa. Do mesmo modo, podese dizer que, conforme novas oportunidades surgem para melhorar a sociedade, novas instituições surgem para desenvolver tais atividades.

2.3 LIDERANÇA

Liderança é o processo que leva as pessoas a dedicarem esforços para o cumprimento de atividades e objetivos almejados por organizações ou outras pessoas, resultando em comprometimento dos liderados. É resultante da influência que uma pessoa gera sobre um indivíduo ou sobre um grupo de indivíduos para fazer com que estes compartilhem da mesma visão e busquem o cumprimento da tarefa. Nanus e Dobbs (2000, p.113) direcionam o conceito de liderança para as organizações do terceiro setor: "O líder de uma organização do terceiro setor é uma pessoa que organiza os recursos intelectuais, de pessoal e de capital para movê-la na direção certa".

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Considerando que a imagem que o líder precisa trabalhar não pode passar uma mensagem negativa e arrogante (sob o risco de dificilmente obter o apoio e colaboração dos membros da organização), Uyterhoen (1986) diz que o gestor se comporta de três posições, diferentes e em conjunto, no processo de execução de suas atividades: de superior, de subordinado e de igual aos demais. Superior por precisar traçar estratégias para cumprimento das metas e desenvolver métodos de controle dos resultados; possui papel de subordinado por receber ordens de alguém (mesmo que esse gestor seja o Presidente da organização, recebe ordens de outras fontes, como as legislações aplicadas à sua organização) e precisa cumprir tais instruções; e também desempenha o papel de ser um igual aos outros na organização, pois também precisa trabalhar e auxiliar o corpo de pessoal nas dificuldades encontradas para que todos atinjam os objetivos traçados.

2.3.1 Motivação

Embora seja um atributo de natureza intrínseca aos indivíduos, existem formas de compreendê-lo. A motivação pode ser entendida como uma força interna presente em cada indivíduo, que pode ser estimulada por fatores variados, uma vez que cada indivíduo possui seus próprios valores e crenças, sentindo-se mais ou menos motivado conforme o estímulo. Sobre esse assunto, John P. Kotter, professor aposentado da Harvard Business School, abordado no artigo de Stauffer (2007), menciona que o que faz as iniciativas funcionarem é conquistar as pessoas não pelo pensamento, mas sim pelo sentimento, auxiliando esforços a ganharem impulso. Direcionando o conceito para o prisma do terceiro setor, o que gera disposição para o voluntário desempenhar suas atribuições, segundo Dohme (2001), é o altruísmo, este ligado a sentimentos particulares ao indivíduo, como: fazer a diferença, usar habilidades que possui, desenvolvimento pessoal, satisfação em fazer parte de um grupo e identificação pessoal com a causa. Seguindo a linha de raciocínio defendida por Casado (2002), nota-se que precisamos, inicialmente, compreender em que se baseia o conceito de motivação para podermos nos aprofundar, posteriormente, nas características de liderança, uma vez que é importante uma compreensão prévia sobre as peculiaridades dos liderados, de modo que o gestor possa extrair o máximo possível dos recursos

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humanos que dispõe. Com isso, nota-se a necessidade do uso de fundamentação por meio de teorias acadêmicas, como serão expressas a seguir.

2.3.2 Liderança no terceiro setor

Nesta seção, serão discorridas as funções atribuídas àquelas pessoas que desfrutam

da

posição

de

liderança

das

organizações

do

terceiro

setor,

compreendendo também as funções de: motivador intraorganizacional; agente de mudança; angariador de melhores condições para a organização; desenvolvedor de parcerias; responsável pelo aumento da rede de contatos; e preparador de sucessores. Iniciando a abordagem dessa questão com Nanus e Dobbs (2000, p. 20), esses expressam a seguinte visão, de modo bem objetivo sobre o que representa o líder de uma organização sem fins lucrativos: “[...] o líder de uma organização do terceiro setor é uma pessoa que organiza os recursos intelectuais, de pessoal e de capital da organização para movê-la na direção certa”. Esses mesmos autores ainda relatam que o líder nessas organizações possui quatro direções que acaba seguindo nos trabalhos sob seu domínio: fonte de motivação e inspiração, auxiliando os comandados nos desdobramentos das atividades; buscador de recursos, agindo fora da organização na tentativa de conseguir ajuda e apoio de colaboradores; controlador da qualidade dos serviços oferecidos à sociedade, primando pelos índices de eficácia organizacional; e também antecipador de tendências, sendo um visionário de modo a prever acontecimentos que serão importantes à organização. Sobre líderes, Zaleznik (1986) aponta que estes costumam, além de assumir riscos inerentes ao posto exercido, também ‘procurar’ situações dessa natureza, especialmente em casos onde identificam que há oportunidades e recompensas que possam ser consideradas favoráveis. Levando esse conceito para a ótica do terceiro setor, o exposto é característico como papel dos líderes, uma vez que tais pessoas visam sempre guiar a organização rumo ao crescimento. A definição entra em congruência com a de Nanus e Dobbs (2000), já que ambos partilham da opinião que os líderes agem em função do cumprimento das metas estabelecidas. Acerca da característica de angariar recursos para as organizações, expressa anteriormente por Nanus e Dobbs (2000), Cazzolato (2009) concorda com essa característica ao dizer que, embora seja função de todos colaborar com o acúmulo

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de recursos e consequente crescimento organizacional, é importante que o responsável por tal tarefa seja alguém qualificado e preparado que, normalmente, acaba por ser o próprio líder, pois se espera que o mesmo já saiba como reagir aos momentos em que é preciso racionalizar os recursos para crescer e também os momentos em que é necessário investir para recebimento posterior. Outro ponto que Zaleznik (1986) possui visão semelhante à de Nanus e Dobbs (2000) é a noção de que o líder também desempenha o papel de agente da mudança, apresentando a necessidade de “[...] alterar profundamente as relações humanas, econômicas e políticas” (ZALEZNIK, 1986, p. 20). No terceiro setor, essa característica fica evidente nos líderes, uma vez que estes se preocupam em entregar ao seu sucessor uma organização melhor que aquela recebida, potencializando as forças dela e fazendo escolhas de importância para o futuro. Além disso, resta ressaltar que o líder não estará sempre presente na organização, portanto uma atribuição que lhe é cabida se refere à preparação de sua sucessão, em vista de que os trabalhos realizados continuem a ser desenvolvidos nos anos subsequentes, independente de fatores como falecimento do gestor ou incapacitações diversas que impossibilitem o desempenho das funções (BRIGHT, 1986). Desse modo, as visões expressas pelos autores, apresentados ao longo da seção, torna possível concluir que o líder nas organizações do terceiro setor pode agir de variadas formas. Age como motivador, fazendo os colaboradores compartilharem com a causa, doando seus esforços e empenhando-se para a consecução dos resultados. Busca recursos, realizando novas parcerias que ajudem a organização a melhorar suas condições de atividades e então conseguir executar atividades mais bem elaboradas, aumentando a eficiência e eficácia organizacional. Controla a qualidade das atividades, visando sempre fazer com que tais atividades satisfaçam as necessidades da sociedade. É visionário, de modo que antecipe oportunidades de colaborar ainda mais para a sociedade. E, não menos importante, prepara sucessores, de modo que a organização continue a se desenvolver mesmo quando os atuais gestores não puderem se fazer presentes.

3 INDICATIVOS METODOLÓGICOS

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Todo estudo científico é dotado de métodos para coleta e análise dos dados levantados, de modo que tais ferramentas fundamentem de forma confiável o trabalho desenvolvido. Trata-se de uma construção exploratória, buscando identificar o papel da liderança no terceiro setor, formando um ponto inicial em pesquisas que, futuramente, venham a quantificar as considerações aqui levantadas. Nesse entendimento, para reforçar a qualidade da pesquisa qualitativa exposta aqui sob a forma de um ensaio teórico, cuja validade já se vê identificada em trabalhos como Isboli (2015) e Senra (2015), toma-se como base Tracy (2010), fornecendo oito pontos para observação: 1) Valor do tópico; 2) Alto rigor; 3) Sinceridade; 4) Credibilidade; 5) Ressonância; 6) Contribuição significativa; 7) Ética; e 8) Coerência. Este artigo é construído por meio de um levantamento referente a trabalhos de diferentes décadas, apontando valor científico presente ao longo dos anos, além de conduzir uma construção pautada em reflexões advindas de vasta base teórica, explicitando como as obras se interconectam, em vista de demonstrar a validade da problemática levantada e reflexão decorrente das obras. Através da avaliação dos pares, busca-se demonstrar a coerência da construção.

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO

Com base nas informações expostas anteriormente, vê-se que o terceiro setor sofreu grande crescimento nas últimas décadas, presente de forma cada vez mais atuante na sociedade, abrangendo aspectos outrora negligenciados por órgãos governamentais, os quais posteriormente estimularam a criação de instituições especializadas na atuação de determinada problemática identificada na sociedade, por considerarem que tais organizações sociais podem desenvolver um trabalho melhor ao invés de o Estado ser o responsável exclusivo por todas as questões sociais. Vale considerar que não existe uma fórmula mágica para o desempenho máximo dos liderados, afinal existem grandes variáveis culturais que influenciam o comportamento das pessoas. Como exemplo, a política utilizada por um líder para conseguir o comprometimento dos seguidores no Brasil pode destoar muito dos resultados obtidos pela mesma prática aplicada na Suécia, conforme podemos observar no estudo de Foy e Gadon (1987).

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Considerando que os papéis desempenhados pelo líder no terceiro setor giram em torno das cinco bases detalhadas anteriormente (motivador, buscador de recursos, controlador da qualidade, antecipador de tendências e preparador de sucessores), o importante para o líder de uma organização desse tipo, então, não é ‘seguir’ as medidas tomadas em uma situação específica de sucesso, mas sim manter uma tendência a realizar atos que estejam em consonância com esses princípios de liderança. Deste modo, não será uma cópia de atitudes empregadas em uma situação ocorrida, mas sim a criação de uma cultura de formas de pensamento, as quais irão construir estratégias de liderança que buscam manter os empregados estimulados em seus trabalhos nas organizações, e também estas a continuarem atingindo seus propósitos à sociedade.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo desenvolvido orbitou em torno de três pontos fundamentais: organizações, terceiro-setor e liderança. Tais conceitos tiveram como propósito explicar, através de um ensaio teórico, qual o papel desempenhado pelos líderes nas organizações pertencentes ao terceiro setor. O terceiro-setor é uma classificação de empresas que atuam em segmentos da sociedade, podendo auxiliar o Estado em alguns segmentos, ou seja, são organizações privadas com finalidades públicas, frequentemente estimuladas pelo próprio Estado na criação e administração dessas, uma vez que o próprio Estado compreende que tais organizações podem desempenhar atividades especializadas de melhor modo que ele próprio, caso necessitasse desenvolver todos esses trabalhos integralmente. Sabendo que os propósitos das organizações do terceiro-setor são diferentes das empresas tradicionais do primeiro setor (lucro), o tratamento com os colaboradores do terceiro-setor deve ser diferenciado, já que o voluntariado não visa bonificações materiais e aborda questões muito mais pessoais, tornando assim essencial a figura de um líder, alguém para tornar as pessoas motivadas para contribuir ao bom andamento organizacional. No terceiro-setor, o líder desenvolve, basicamente, cinco papéis fundamentais: motivador

dos

colaboradores,

buscador

de

recursos,

controlador

qualidade, antecipador de tendências e preparador de sucessores.

da

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Para a realização de tais atribuições, vimos que não existe um “passo-apasso”, mas, valendo-se de conhecimentos/teorias motivacionais e também sobre padrões de liderança, é possível desenvolver formas de pensamento que atendam tais necessidades, sendo um melhor líder em variadas situações. Por fim, observa-se que o assunto relatado permite o desdobramento de futuros estudos, levando essa pesquisa exploratória para realidades como uma pesquisa aplicada. Como exemplo, o uso de técnicas como análise fatorial exploratória e/ou análise de conteúdo em pesquisas com gestores de organizações do terceiro setor podem identificar se os papéis de liderança aqui apresentados são identificados no cotidiano.

THE ROLE OF LEADERSHIP IN THIRD SECTOR ORGANIZATIONS

ABSTRACT

The third sector is composed by private organizations with public purposes, that do not execute their activities looking for their stakeholders profit, but seek compliance of their duties to generate gains to the sector of the society they are geared. Many of the employees that work at these organizations are volunteers, executing their jobs without looking for financial return. In this view is important to note the importance of the leader, person responsible to inspire the volunteers and guide the organization in its activities. This study looks for elucidate aspects based on three pillars: organizations, third sector and leadership. It was developed a theoretical essay aimed to understanding the relation between these three basis, resulting in a discussion about the roles performed by the leaders in organizations belonged to the third sector, so that exposes under which circumstances these leaders must base their acts, ever aiming the success of the organization that they work. The result achieved was the identification of five roles: motivator, seeker of resources, quality controller, anticipator of tendencies and preparation of successors. Although the researched authors came to this consensus about the roles played, it did not come to an indicative about the best profile of leadership to this kind of organization. So, it was concluded that does not exist a “walkthrough” built, but the knowledge in motivational theories and patterns of leadership can provide basis to the leader plays the expected roles with excellence, even in unusual situations, in this way achieving the established goals. Keywords: Leadership. Third sector. Organizations. Voluntary service.

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