O Papel das Práticas de Comunicação do Coletivo no Exercício da Cidadania

August 14, 2017 | Autor: Lauriberto Pompeu | Categoria: Politics, Movimentos sociais
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O Papel das Práticas de Comunicação do Coletivo no Exercício da Cidadania

Ana Nayanne Jereissati SAMPAIO[1]
Carolina de Oliveira GOMES[2]
Clara Marques de SOUSA[3]
Francisco Valfredo de Matos JÚNIOR[4]
Lauriberto Carneiro Pompeu de Sousa BRASIL[5]
Mylena Ceribelle Gadelha SANTOS[6]
Rebecca Costa RAMOS[7]
Rodrigo Sávio Muniz da SILVA[8]
Rosiane de Melo FRANÇA[9]
Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE


RESUMO: As discussões acerca do uso da bicicleta como um meio efetivo de transporte cotidiano vêm movimentando grupos sociais e, consequentemente, acarretando o surgimento de coletivos especializados no assunto. O presente artigo se debruçará sobre as questões básicas que envolvem a formação de um coletivo dentro da sociedade, sobre as implicações do mesmo na realidade da população, além das relações desse tipo de movimento com as mídias alternativas e convencionais. Para a exemplificação, traremos uma análise baseada a partir da formação da Associação Ciclovida, que tem como discussão principal o questionamento do carro como principal meio de transporte, e a divulgação de outros meios, como o skate e o patins - com foco principal na bicicleta. O papel destes coletivos dentro de uma sociedade é essencial, justamente por mostrar a luta sobre as mais diversas causas, mas também por evidenciar a organização de movimentos como este e demonstrar como tudo acontece.


PALAVRAS- CHAVE: CICLOVIDA; MOVIMENTOS SOCIAIS; COLETIVOS.


Introdução

Seja para lazer, locomoção rápida ou até mesmo como um meio de transporte alternativo, a bicicleta, que teve seu primeiro modelo distribuído no ano de 1818, possui espaço cativo em quase todas as sociedades mundo afora. O que se percebe é que, atualmente, diversos movimentos buscam o reconhecimento deste meio não só como prática de lazer ou desporto, mas sim como um instrumento que promove a renovação de ideais dentro da sociedade.
Divulgar que a utilização desse meio de transporte proporciona diversos benefícios, (o maior respeito ao meio ambiente, a fuga do trânsito voraz das grandes cidades, um meio de transporte que colabora com o condicionamento físico de seu usuário, e muitas outras questões) e tentar mudar a realidade "carrocrata" (SAKAMURA, Celso) vivida por grande parte das cidades atualmente, utilizando a conscientização adquirida pela educação. O surgimento de movimentos pró-utilização de bicicletas vêm crescendo e a definição de seus objetivos vem ficando cada vez mais clara. Por este motivo, é importante entender o que coletivos como o Ciclovida buscam apoiando causas como esta.

1. Relação do coletivo com a política e o mundo

O movimento Ciclovida, Associação dos Ciclistas Urbanos de Fortaleza, é considerado por seus membros uma associação independente, cujo principal objetivo é aumentar o uso da bicicleta e reduzir o uso de veículos motorizados individuais, tanto carros como motos, diminuindo os efeitos nocivos destes para a sociedade. De acordo com Touraine, 2006, "O essencial, aqui, é reservar a ideia de movimento social a uma ação coletiva que coloca em causa um modo de dominação social generalizada". Nesse sentido, considera-se a Ciclovida como um movimento social.

O transporte por bicicleta fica muito mais barato, com enorme vantagem para certas distâncias, além de fazer bem à saúde colabora para que não se polua o meio ambiente. Estimular o uso de bicicletas em cidades brasileiras por meio do sistema de bicicletas públicas, ciclovias, e campanhas de esclarecimento sobre o respeito e os cuidados para com os ciclistas constitui medida de muito bom senso. (Acessado em 20 de agosto de 2014. Link:).

A associação atuava, inicialmente, junto ao Massa Crítica, que é um movimento de "celebração" da bicicleta como um meio de transporte. O Massa Crítica é um movimento internacional e sem líderes - de organização horizontal - que promove a ocupação das ruas a partir do uso das bicicletas. Grupos de pessoas se reúnem para as chamadas "bicicletadas", objetivando quebrar toda a monotonia e a agressividade do trânsito. "A Massa Crítica então serve para nos mostrar que quando nos juntamos e apoiamos uns aos outros, podemos fazer frente à qualquer oposição." (Acessado no dia 21 de outubro de 2014. Link: ).
O Movimento já foi aderido por localidades como Nova York, Londres, Portugal, Moçambique e São Paulo. Sempre sendo articulado com movimentos ambientalistas, por defenderem uma pauta na qual caracteriza o automóvel de uso privado como uma catástrofe para o meio ambiente, tanto em termos físicos como em termos sociais. (Acessado no dia 21 de outubro de 2014. Link: )

Sentindo a necessidade de uma associação que representasse os ciclistas de Fortaleza e pudesse lutar pelos seus direitos junto ao poder público, fundou-se a Ciclovida, que com o tempo adquiriu organização e passou a atuar por conta própria.
Celso Sakuraba, diretor- presidente da associação, contou que a legitimação do coletivo perante a sociedade de Fortaleza foi gradual. Sem apoio oficial da Prefeitura da cidade, o coletivo foi organizando ações que os proporcionou mais visibilidade.

No final de 2013, a Ciclovida organizou a Semana da Mobilidade em Fortaleza. Esse evento estava diretamente relacionado com o "Dia Mundial sem Carro" (22 de setembro)." A partir dessa Semana da Mobilidade e da grande adesão da sociedade civil, a Ciclovida começou a se organizar na prática como uma associação independente. (SAKURABA, Celso. Integrante do movimento Ciclovida).

1.1 Vinculação Política

O movimento declara não ter nenhuma vinculação política, mas afirma que são sempre procurados, principalmente em campanhas eleitorais, para participar de reuniões e manifestações. Tal tentativa de tornar o movimento parte de campanhas políticas observou-se na visita à ação Escola Bike Anjo (EBA), que aconteceu no dia 12 de outubro. A ação foi promovida pelo Ciclovida em parceria com o Bike Anjo, que é um projeto nacional fundado em São Paulo que proporciona que ciclistas experientes possam ajudar as pessoas não só a aprender a andar de bicicleta, mas também a utilizá-la como meio de transporte de forma segura e consciente.
No mesmo espaço onde ocorria o EBA, estava acontecendo uma ação da Prefeitura de Fortaleza, também relacionada à causa das bicicletas, e uma 'bicicletada' para o então candidato Aécio Neves. Devido à falta de sinalização tornou-se difícil identificar qual parte pertencia, de fato, às ações da associação Ciclovida.


1.2 Anarquismo e outros movimentos sociais pelo mundo


Por ter seu início dentro das ações do Massa Crítica, que é um movimento anarquista, a associação tem uma boa relação com o movimento e respeita o ideal proposto, mas não é uma bandeira levantada pelo mesmo. Na associação Ciclovida, não há um prédio fixo para as reuniões, e existe, como eles mesmo classificam, uma pequena verticalização necessária para a organização e o funcionamento do movimento, mas as decisões são tomadas em conjunto pelos associados.
Eles têm cargos (diretoria, presidência, secretaria e tesouraria), cada um com dois representantes. Essas pessoas são os responsáveis por coordenar as ações, cuidar das finanças e representar, no caso da diretoria, aquilo que foi decidido coletivamente com os associados. Segundo Celso Sakuraba, integrante da Ciclovida, "[...] quando a diretoria fala em nome da associação, ela fala o que a associação decidiu, através do conjunto dos associados.".
Existe uma pluralidade imensa de movimentos sociais no Brasil, fator muito importante para o desenvolvimento da sociedade, mas, de acordo com o coletivo, na cidade de Fortaleza estes coletivos não tem vez de se expressar. O presidente da Associação compara a situação com a cidade de São Paulo, onde os movimentos sociais tem um maior diálogo com as secretarias municipais:


Se a Prefeitura se recusa a receber essas pessoas, você vai ter uma grande revolta da sociedade em si. E é o que precisa aqui em Fortaleza. A gente precisa parar de se acostumar com esse autoritarismo da Prefeitura, dessa vontade da Prefeitura de se reunir apenas com as pessoas que ela quer reunir. Eu acho que a sociedade como um todo, mesmo que ela não esteja de acordo com aquela reivindicação específica, ela precisa perceber que o direito de manifestar e de conversar com a Prefeitura é de todo mundo. É um direito universal. (SAKURABA, Celso. Integrante do movimento Ciclovida.)

2. Relação do coletivo com a mídia convencional e a alternativa e suas práticas de comunicação


2.1. Relação do coletivo com as mídias


É comum que o uso de bicicletas e de ônibus em substituição aos transportes individuais como motos e carros, não seja uma pauta de destaque nos principais veículos da imprensa. Na maioria dos casos, quando os jornais abordam o tema mobilidade urbana, eles privilegiam a cobertura de medidas de mobilidade que afetam essencialmente os veículos motorizados individuais, como o que aconteceu na cobertura dos jornais O Povo e Diário do Nordeste sobre a construção do viaduto no cruzamento da Avenidas Antônio Sales com a Engenheiro Santana Júnior.
A relação do coletivo com a mídia convencional enfrenta diversos problemas e impasses, como também alguns pequenos momentos de auxílio e ganho. De um modo geral, o coletivo quantifica que sua relação com os meios tradicionais de comunicação não é das melhores, vistos que a bicicleta como meio de transporte e alternativa aos transportes individuais não costuma ser uma pauta recorrente de maneira positiva nos meios. O coletivo tende a nutrir receio ao lidar com a mídia convencional quando necessita ou quando é solicitado, mas, de caráter pacifista, também tendem a auxiliar o máximo possível na mudança de como a pauta da bicicleta como meio alternativo pode ser abordada por esses meios e a sempre dialogar com todos os meios de modo a ressaltar a importância desse tipo de manifestação na cidade, em busca de notoriedade e amplitude de suas ações e de seus ideais, agregando mais pessoas aos seus movimentos. Já em relação à mídia alternativa, o Ciclovida mantém uma relação harmoniosa e de gratidão, como um ponto, inclusive de ajuda quanto à mídia convencional:
"A gente teve as ações de pintura da ciclofaixa cidadã da Massa crítica (..) e houve uma repercussão muito grande por causa da mídia alternativa. A mídia alternativa fez um vídeo muito bonito, muito bem-feito, e a gente chegou a ficar em terceiro lugar entre os vídeos mais vistos do Brasil, no Youtube. Gerou uma repercussão muito grande e a mídia teve a obrigação de cobrir a ação, então apareceu no Diário do Nordeste, apareceu no O Povo." (SAKURABA, Celso).


Neste caso, como a mídia convencional acabou se pautando pela mídia alternativa* e vendo-se obrigada a cobrir de uma maneira não-negativa a ação, o movimento cicloativista inteiro se beneficou da mudança de pauta, o que refletiu na nova visibilidade positiva para o movimento Ciclovida, que faz parte do movimento cicloativista e configura-se como o maior movimento do tipo em Fortaleza. A ação da mídia alternativa, neste caso, foi imprescindível para o movimento, o que corrobora sua importância e força para as comunicações, pautando os grandes meios quando atinge alta divulgação e dando visibilidade a movimentos que antes sofriam com a falta de cobertura, necessária às suas ações. Neste ponto, a mídia alternativa atinge seu propósito, descrito por Góes:
"Tim O´Sullivan (1994 apud ATTON, 2001) introduz a noção de mudança social radical como um objetivo primário da mídia alternativa, que rejeita e desafia as políticas institucionalizadas e estabelecidas, no sentido que defendem mudança na sociedade ou, ao menos, uma reavaliação crítica dos valores tradicionais (ATTON, 2001). Para O´Sullivan, a mídia alternativa defende a mudança social, busca envolver as pessoas (cidadãos) em seus processos e são comprometidos com a inovação na forma e conteúdo." (GOÉS, 2006)


A mídia alternativa atinge seu propósito no caso citado por provocar a mudança de visão do meio tradicional sobre uma temática social que antes se perdia na espiral do silêncio ou ganhava pouca voz por não ser do interesse institucionalizado, mas apenas do interesse social e do cidadão comum. Aqui, a mídia altenativa dá visibilidade à causa cicloativista e pauta a mídia tradicional, o que auxília o Coletivo Ciclovida em todo o seu propósito de luta.
Ainda assim, os movimentos sociais que militam pelo uso de meios de transporte alternativos, como o Massa Crítica e o Ciclovida, continuam com carência de representação nos meios de comunicação, que tendem a apenas ouvir fontes oficiais que não delimitam de forma adequada e ampla o problema da mobilidade urbana e suas formas alternativas aos transportes individuais e privilégio dessas alternativas.


2.2. O Coletivo Ciclovida e suas mídias

Na sua mídia interna e sua comunicação com meios externos, o coletivo admite ser onde reside um fraco do grupo, um ponto que necessita de muitas melhorias para gerar maior alcance de suas ações e de seus ideais. No mais, as atividades de comunicação do Ciclovida se edifica principal e quase unicamente pelas divulgação e movimentação em redes sociais, ressaltando a tese de Castells, citado por Góes:
"Uma vez que a Internet torna-se um meio importante de comunicação e organização da sociedade, é óbvio que os movimentos sociais também a usem para atuar, informar, recrutar, organizar, dominar e contradominar. A comunicação de valores e a mobilização em torno de significados tornam-se fundamentais"( CASTELLS, 2001 apud GOÉS, 2006).


Na questão de mídia interna, o Ciclovida baseia praticamente todas as suas comunicações entre membros por meio principalmente de redes sociais, como a comunicação no Facebook e por email, organizando-se com euniões pré-agendadas que não necessitam de tanta comunicação para serem confirmadas, também valendo-se da comunicação via Whatsapp e telefone convencional, mas numa escala muito menor que a da rede social.



O Coletivo conta, de foma externa, apenas com uma página oficial no Facebook (https://www.facebook.com/CiclovidaFortaleza), que utiliza de forma maciça para divulgar eventos, ações, notícias e diálogos com seus seguidores sobre mobilidade urbana cicloativismo, auxiliando também, às vezes, em sua comunicação interna, como confirmação de reuniões abertas ou discussões que envolvam os membros e chamadas para novos membros e simpatizantes. A importância da página no Facebook é de extema importância para o coletivo, a partir dela eles conseguiram a grande notoriedade de suas ações e a sua demanda de novos membros, como também de novos participantes de suas ações. No evento EBA, Escola Bike Anjo, estudado neste caso como pesquisa de campo, foi possível ter-se um panorama desta importância: todas as pessoas abordadas tiveram conhecimento da ação pela rede social e seu compartilhamento ou acompanhavam a rede social do grupo com afinco afim de saber novas ações, eventos e discussões em torno do cicloativismo.
O site do coletivo ainda se encontra em construção e seus membros consideram que a comunicação interna e externa passará para um outro nível de chamada de público e divulgação de seus valores por ser um meio particularmente do coletivo, sem mediação de outra rede social, apesar de sua importância.
Ainda na discussão sobre seus meios de comunicação externa e interna, é importante ressaltar a fala do coletivo ao reconhecer sua carência neste sentido, justificando-se em ser um coletivo relativamente novo e que trabalha com voluntariado, o que os faz carecer de conhecimentos que aprimorem sua organização comunicacional: "Nossa oganização interna ainda é muito frágil no sentindo que a gente ainda está aprendendo a se organizar. Começamos a tentar uma organização como 'associação' apenas no final de 2013", (SAKURABA, Celso). O Coletivo Ciclovida também sente a necessidade, com o passar do tempo, da criação de uma assessoria de comunicação ou departamento de comunicações dentro de suas divisões internas, o que facilitará o contato com o coletivo e a busca de informações mais precisas e melhor diálogo com as mídias e com quem busque informações de atividades.

3. O coletivo, a política e o exercício da cidadania

Toda associação se constitui a partir de um agrupamento de pessoas. Esse coletivo de indivíduos, para ter coesão social, precisa de um objetivo de luta. Esse objetivo está intrinsecamente ligado a um julgamento de valor: do que possui o valor de certo e do que possui o valor de errado. O certo vira propósito, bandeira de luta; o errado vira oposição. É necessário deixar claro que a raiz desse tipo de julgamento encaixa-se dentro do que Durkheim chamou pelo conceito de "julgamento de valor", ponta extrema da dicotomia fechada pelo conceito de "julgamento de realidade".
O "julgamento de realidade" diz respeito ao comportamento relacionado a certos objetos: de quais gostamos, de quais preferimos.
Julgamentos semelhantes não têm, portanto, por função atribuir às coisas um valor que lhes pertença, mas somente afirmar os estados determinados do sujeito. Dessa forma, as predileções que assim se expressam são incomunicáveis. Aqueles que as experimentam podem dizer que as experimenta ou, pelo menos, que acreditam experimentá-las, mas não podem transmiti-las a outrem. Fazem parte de suas pessoas e não podem ser separadas. (DURKHEIM, p. 53)


Já o conceito de "julgamento de valor" é completamente diferente. Dentro da dinâmica dele, é atribuído um caráter objetivo ao ser ou à coisa que está sendo referida. Esse caráter objetivo é importante para que as afirmações sejam feitas em ordens impessoais, visto que a avaliação sendo revelada por um aspecto de ordem coletiva será considerada mais objetiva do que seria se esta fosse revelada por aspectos de ordens individuais.
Isto porque a opinião pública traz de suas origens uma autoridade moral pela qual se impõe aos particulares. Ela resiste aos esforços que são feitos para violentá-la; reage contra os dissidentes, tal qual o mundo exterior reage dolorosamente contra aqueles que tentam se rebelar contra ele. Ela censura aqueles que julgam as coisas morais por princípios diferentes daqueles que ela prescreve; ridiculariza os que se inspiram numa estética diferente da sua. (DURKHEIM, p. 54)


Ao advogar que os coletivos, quando escolhem um objetivo, perpassam por um processo de julgamento de valor, afirmamos que o julgamento de valor exprime a relação de algo com um ideal. Essa relação, como já explicitado na citação de Durkheim, gera uma dinâmica de coerção, militância e afirmação. O interessante é perceber que, quase sempre, a lógica de um coletivo destoa da lógica vigente na sociedade em que está inserido, o que mostra uma divergência de julgamentos de valor, logo, de valores.
Como o Ciclovida se considera parte do movimento cicloativista, que pretende aumentar o uso da bicicleta e reduzir o uso de veículos motorizados individuais, tanto carro como moto, o valor que ele carrega é o de massa que quer fazer oposição ao modelo tradicional de mobilidade. A associação pretende discutir sobre a mobilidade urbana e repensar a forma que ela vem sendo feita, querendo, então, que a prioridade das políticas públicas não sejam mais os carros, e sim as pessoas.
No momento em que o coletivo Ciclovida se mostra como contraponto a algo, ele exerce o que Manuel Castells, na obra "Redes de indignação e esperança", chama de contra-poder. O autor considera contrapoder a competência que possuem os atores sociais para desafiar o poder interno das instituições sociais a fim de reivindicar a representação de seus valores e interesses. A constante interação entre poder e contrapoder configura o Estado e as outras instituições que regulam a vida das pessoas.
Percebemos, então, que, se existe um contrapoder e que este, em si, é uma representação de poder, o poder é algo que não está qualificado para poucos. O poder é de todos. Basta ser exercido. À luz de Foucault, temos esta temática trabalhada com mais detalhe.
O poder não possui uma localização fixa, nem proprietário, muito menos pode ser apropriado como bem ou riqueza. O poder é algo circulante, que só funciona e se exerce em rede. Os indivíduos estão suscetíveis a exercer ou sofrer sua ação. Ele não é aplicado às pessoas, pois é fluído e apenas passa por elas.
O poder - consideramos aqui também o contrapoder que, para nós, é um tipo de poder -, então, não é algo que possa se dividir entre aqueles que o possuem e o detêm exclusivamente. Poder não se dá nem se troca. O poder só existe em ação.
O Cicliovida, ao exercer contrapoder, exerce política. É importante frisar que a política exercida pelo Ciclovida acontece na sua forma alternativa, pois as ações e ideologias incentivadas pelo movimento (uso da bicicleta como transporte alternativo, educação no trânsito, conscientização ambiental), constituem-se como força contrária às políticas tradicionais.
Acompanhando o cariz alternativo do fazer política do Ciclovida, temos a comunicação, alimentada interna e externamente, que dá visibilidade para a política perpetrada pelo coletivo. Quando tornada pública, visível, essa política alternativa, no caso, urbana, aponta para uma nova forma de exercer a cidadania.
Antes de abordá-la, precisamos definir, primeiro, o que é cidadania. Para Marshall, a cidadania política aborda a participação do povo no exercício do poder político. Tal participação concretiza-se, segundo Marshall, como exercício efetivo, por parte desse mesmo povo, no direito de escolher os seus governantes. Porém, percebemos o seu caráter limitado e a sua instabilidade, já que a instância de escolha governamental é feita a partir de um ramal já predito pela dinâmica partidária, a participação por voto é esporádica e não constrói uma continuidade efetiva, a escolha do voto não necessariamente exige um contrato fidedigno entre governante e os seus eleitores, o que faz com que a micropolítica se apresente como necessidade básica na vida política do país. Com isso, percebemos como as pretensões políticas individuais são distanciadas e mediadas. A mediação não seria um problema se esta não fosse realizada no interior da esfera pública, mas sim para além dela.
O grau de insuficiência de representação popular apresentado por essa forma de cidadania é colocada em tensão quando a militância de grupos como o Ciclovida apresentam novas entradas no espaço político. Essa militância acontece através da realização de eventos como a Escola Bike Anjo. O evento é um projeto nacional, fundado em São Paulo, que tem como objetivo que ciclistas experientes possam ensinar pessoas a não só aprender a andar de bicicleta, mas utilizá-la como meio de transporte de uma forma mais segura, consciente. Manutenção básica da bicicleta, qual tipo de bicicleta comprar, medidas de segurança no trânsito e dicas de trajetos, são alguns dos conhecimentos que a Bike Anjo se preocupa em disseminar. Em Fortaleza, o Ciclovida promove a Escola Bike Anjo em parceria com o Bike Anjo.
A educação ambiental e urbana perpetradas nas ações do coletivo fazem com que as vivências urbanas dos seus participantes mude. Com a mudança da experiência afetiva para com a cidade, temos o desenvolvimento de novas pautas destes cidadãos ativos. O requerimento destas, luta também do Ciclovida, como mais ciclofaixas, respeito ao ciclistas, muda a participação direta e indireta do cidadão para com a vivência política, visto que necessidades de cidadãos são visibilizadas, aceitas, pensadas, pedidas e viabilizadas através de processos de participação cidadã, logo, cidadania.

Conclusão


O artigo apresentado aqui tem como propósito maior mostrar a importância dos movimentos sociais para disseminar ideias, exercer força política e exercer cidadania. Utilizando como exemplo o caso do Coletivo Ciclovida, pudemos entender como funciona as articulações de um movimento que busca afirmar novos ideais dentro de uma sociedade. Através da luta pela utilização de meios de transporte diferentes dos carros, que já são habituais, como por exemplo: utilização das bicicletas, dos skates, dos patins e etc, o coletivo mostra sua força política em articular militantes do movimento em prol da causa.
Mas claro, um dos focos principais, como pode ser notado, é a relação destes movimentos com os tipos de mídia já tradicionais e também com os mais alternativos. É importante notar a diferença no destaque, na abordagem. Como meios diferentes, os interesses são outros e as práticas de comunicação não são exercidas da mesma maneira. Pensando assim, podemos chegar à conclusão em alguns pontos.
Podemos concluir também que algumas das reivindicações dos movimentos sociais ligados à mobilidade urbana ainda estão em processo de legitimação, pelo menos em Fortaleza. Pois, apesar de a Prefeitura ter avançado muito, com medidas como a criação de ciclofaixas, ainda é preciso que seja feito ainda mais, como oferecer uma maior oportunidade do cidadão comum sugerir o que deve ser feito na questão da mobilidade urbana.
Também foi observado que alguns setores da mídia tradicional, precisam oferecer uma maior representatividade para aqueles que acreditam em maneiras alternativas de transporte, como os transportes coletivos e as bicicletas. Algo que de certa forma já acontece em jornais como O Povo e em alguns coletivos de comunicação, como o Nigéria, mas que ainda é bastante deficiente no Diário do Nordeste.
O que procuramos mostrar aqui, e gostaríamos de reiterar, é que estes coletivos são importantes para o desenvolvimento de muitas causas dentro da sociedade. Muitas vezes, eles são os responsáveis por suscitar os debates políticos, por angariar um número maior de pessoas para determinadas causas e também pautar alguns dos assuntos veiculados na mídia, ainda que de forma diferenciada.










REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS



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