O papel de Deus no problema da Teoria da Obrigação em Hobbes

May 27, 2017 | Autor: Derocio Meotti | Categoria: Thomas Hobbes
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O papel de Deus no problema da Teoria da Obrigação em Hobbes Derócio Felipe Perondi Meotti Resumo Este artigo tem por intuito explorar os fundamentos da Teoria da Obrigação em Thomas Hobbes, cujas interpretações oscilam entre colocar ou Deus e a lei divina como fundamento da obrigação, ou o medo e o auto-interesse. Para tanto, faz-se um estudo – com ênfase no Leviatã - que visa tentar esclarecer qual é o papel de Deus no problema da Teoria da Obrigação, para então dizer se é coerente ou não colocá-Lo como fundamento para a obediência no estado civil. Palavras-chave: Thomas Hobbes. Teoria da Obrigação. Deus. 1. Introdução A primeira coisa que por nós deve ser feita para investigar o tema proposto no resumo deste artigo é investigar o papel da lei de natureza na obra hobbesiana. Em primeiro lugar, deve-se levar em consideração que o objetivo de Hobbes ao descrever como se dá a passagem do estado de natureza ao estado civil é buscar uma legitimação para a instituição do Estado. Tendo como ponto de partida uma consideração sobre as paixões humanas, Hobbes procura demonstrar que sem o controle do Estado, a vida em conjunto acabaria se degenerando em um estado de guerra perpétuo, no qual não existem nem desenvolvimento científico, nem segurança nem paz para que as pessoas possam se dedicar às suas tarefas sem se preocuparem com o perigo iminente da guerra. Para tanto, Hobbes fundamenta a instituição do Estado numa série de preceitos que a razão descobre ao calcular a cadeia de consequências que pode advir ao escolher permanecer no estado de natureza ou instituir um estado artificial1. O problema ganha contornos mais precisos quando perguntamos: esses preceitos da razão – lei de natureza – obrigam ou não? Se estes preceitos da razão forem obrigatórios já no estado de natureza, a passagem do estado de natureza ao estado civil não é nada mais do que uma consequência inevitável da lei de natureza e, portanto, seu descumprimento acarreta em punições por parte da autoridade que fundamenta esta lei. Warrender, por exemplo, em The Political Philosophy of Hobbes, diz que 

Artigo referente ao projeto de pesquisa “A Teoria da Obrigação em Thomas Hobbes”, do Prof. Dr. Clóvis Brondani, aprovado no edital 281/UFFS/2015 e vinculado ao grupo de pesquisa Ética e Filosofia Política.  Acadêmico do curso de Filosofia da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS-Chapecó) e bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), sob orientação do Prof. Dr. Clóvis Brondani. 1 Quem faz uma investigação interessante sobre o aspecto calculador da razão é Yara Frateschi. Segundo ela, “[…] para Hobbes a razão não passa de uma faculdade que calcula meios para fins postos pelo desejo, e o desejo é sempre não racional.” (FRATESCHI, 2008, p. 43).

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o estado de natureza não é um estado onde não há nenhuma obrigação, mas que esta obrigação é apenas inoperante em tal estado. Segundo ele “[...] the State of Nature is not a state where there are no obligations, but a state where circumstances are found in which many obligations are not operative.” (WARRENDER, 2000, p. 43). Esta “obrigação inoperante” atua como uma obrigação que “paira” na natureza, esperando que certas “condições de validação” (validating conditions) sejam satisfeitas, para que então esta obrigação torne-se de fato operante. Este aspecto será esmuiçado mais a frente neste texto, mas para esta introdução é importante notar que, para esta interpretação, conhecida como teológica – tendo Warrender como seu expoente – o estado civil é apenas o meio pelo qual a obrigação se torna operante, e não seu fundamento. Como veremos mais adiante, o fundamento desta obrigação, nesta interpretação, é Deus. Por outro lado, segundo uma outra linha de interpretação, conhecida como secular, se a lei de natureza não contiver em si uma obrigatoriedade já no estado de natureza, a instituição do Estado passa ser opcional, e, ao contrário do que a tese teológica propõe, não é apenas um meio pelo qual uma obrigação já existente passa a operar, mas sim a origem de toda e qualquer obrigação. Esta segunda interpretação nega que os aspectos religiosos – ou teológicos – da obra hobbesiana tenham um papel determinante na teoria da obrigação, devido ao fato de que o contratualismo do filósofo inglês se apresenta muito mais como fundado no mecanicismo, do que numa espécie de jusnaturalismo. É importante também destacar - como já mencionado acima - que a interpretação teológica identifica o fundamento da obrigação na lei divina, ou em Deus.2 Esta interpretação, segundo trechos onde Hobbes alude a isso, pressupõe que a autoridade divina seja tomada como fonte da obrigatoriedade da lei de natureza, fazendo com que ela, deste modo, seja a expressão da vontade de Deus e, portanto, sua obediência necessária para evitar a morte eterna3. O sistema de Warrender, para funcionar, precisa não apenas que certas condições de validação da obrigação sejam satisfeitas, como também precisa identificar o fundamento (ground) desta obrigação. Em sua tese, Warrender diz o seguinte: Thus if, for example, the ground of obligation is conformity to the will of God, and if ‘x’ is obligatory, it is obligatory because God’s will ‘x’. The ground of obligation in Hobbes’s doctrine is revealed when the ultimate answer is given to the question of why the civil law obliges, or, taking the problem a stage farther, to the question of why natural law obliges, and belongs to the theory of what individual is obliged to do. (WARRENDER, 2000, p. 14)

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Cf. nota 6. Cf. nota 13.

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Deste modo, fica claro que, dentro do sistema político de Hobbes entendido por Warrender, para que a obrigação torne-se operante, duas coisas precisam estar presentes: 1) as condições de validação da obrigação precisam ser satisfeitas, ou seja, as pessoas precisam ter segurança4 para obedecê-la ou capacidade de reconhecê-la (no caso, lunáticos e crianças, por não preencherem este requisito, estariam de certa forma livres da obrigação) 5, e em segundo lugar, necessita-se de um fundamento para esta obrigação, e o fundamento desta obrigação, na tese teológica, só pode ser Deus. Acerca disso, como aponta Warrender, nos vemos diante da seguinte situação: If we take the sole ground of obligation to be God’s will, and validation conditions to be sanity and security, then: a) if there is nothing in the situation that God’s will (no ground) there is no obligation at all and a moral vacuum; b) if, however, there is something which God wills which bears on the situation, then if ‘x’ is what God wills, duties may be written out as follows: All persons are obliged to perform ‘x’ except insane persons and insecure persons, and for insane and/or insecure persons ‘x’ is a suspended obligation, and if it is not specified with regard to given persons wheter they are sane and secure or not, for those persons ‘x’ is a prima-facie obligation. Likewise, the validating conditions were that the moral agent should think himself to be secure, then all persons would be obliged except those who thought themselves to be insecure, and the latter would have a suspended obligation, and so on. (WARRENDER, 2000, p. 27, as letras a) e b) foram acrescidas por mim para facilitar a compreensão)

Portanto, como fica claro em a) e b), a questão que se toma como ponto de partida de nossa investigação é a seguinte: qual é o papel de Deus na teoria da obrigação hobbesiana? É possível postulá-lo como fundamento da lei de natureza, de modo que não restem dúvidas quanto à sua obrigatoriedade? Tomando por base a discrepância entre os aspectos científicos e religiosos da obra hobbesiana e a incoerência que surge ao tentarmos unificá-la numa teoria consistente, iniciamos nossa investigação tentando descobrir se é realmente possível postular Deus como fundamento da obrigação, ou se esta obrigação reside noutro lugar.

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Warrender, por exemplo, pressupõe que a lei de natureza deve ser observada quando – e somente quando – o temor for removido (cf. POBREBINSCHI, 2003, pp. 104-105). Isso não parece ir contra a tese hobbesiana, já que Hobbes explicitamente diz que, se todos os homens fossem por natureza bons e honestos, não haveria nem sequer a necessidade de um Estado para obrigá-los a permanecerem em paz (HOBBES, 2003, p. 145). Porém, no capítulo referente às duas primeiras leis de natureza Hobbes diz que apenas uma pequena parte da humanidade têm esse caráter honesto e altruísta, enquanto a grande maioria é do outro tipo: auto-interessada (cf. HOBBES, 2014, p. 122). Logo, o fator “temor” não pode ser removido no estado de natureza, e até mesmo no estado civil ele pode apenas ser atenuado, não removido completamente. 5 “Thus such validation conditions as sanity, maturity, or, to take exemples more peculiar to Hobbes, security and belief in God, give classes of persons obliged, namely sane persons, adults, secure persons, believers, and class of persons dispensed from obligation, namely lunatics, children, insecure persons, and atheists.” (WARRENDER, 2000, p. 23).

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2. Lei de natureza: obrigatória ou não? A questão fundamental que deve ser analisada ao se investigar o papel de Deus na teoria da obrigação de Hobbes é o papel da lei de natureza. Hobbes, sobretudo no Leviatã, descreve a lei de natureza como um preceito ou regra geral, resultante do cálculo de consequências que a razão opera com as mais diversas paixões, sendo elas ou de desejo ou aversão, sendo estas paixões em última análise fruto das informações recebidas pela experiência. Hobbes define a lei de natureza do seguinte modo: […] preceito ou regra geral, estabelecido pela razão, mediante o qual se proíbe a um homem fazer tudo o que possa destruir a sua vida ou privá-lo dos meios necessários para a preservar, ou omitir aquilo que pense melhor contribuir para preservar. (HOBBES, 2014, p. 112)

Antes de nos determos mais no aspecto calculador da razão e do conteúdo deste cálculo – as paixões provenientes da experiência -, vamos nos deter às implicações próprias da definição hobbesiana desta lei de natureza. Segundo o trecho citado acima, para Hobbes a lei de natureza é uma espécie de ditame, ou conselho, que “proíbe” aos homens fazer tudo o que pode colocar sua vida em risco, ou privá-los dos meios que venham a ser necessários para que ele possa garantir sua preservação. Dada esta definição de lei natural, cabe-se perguntar a respeito do seu estatuto da obrigatoriedade: trata-se efetivamente de uma lei obrigatória no sentido estrito da palavra? Esta questão tem gerado um contínuo debate ao longo da história da interpretação de Hobbes, e podemos identificar pelo menos duas posições gerais a respeito do tema. A primeira delas, conhecida como secular ou tradicional, tende a interpretar a obra hobbesiana a partir dos princípios científicos, enfatizando a aderência de Hobbes à revolução científica. Esta interpretação, partindo do aspecto científico da tese hobbesiana, entende que a lei de natureza não tem caráter obrigatório, dado o fato que, ao contrário das leis positivas prescritas pelo soberano, elas não acarretam em punições.6 Além disso, Hobbes define categoricamente o que pode ser entendido por lei, ao dizer que “[...] a lei, em geral, não é um conselho, mas uma ordem. E também não é ordem dada por qualquer um a qualquer um, pois é dada por quem se dirige a alguém já anteriormente obrigado a lhe obedecer.” (HOBBES, 2014, p. 226). Logo, dada a ausênca de tal autoridade no estado de natureza, não há punição prevista para quem deliberadamente decida privar-se dos meios necessários à sobrevivência, ou até mesmo 6

Pogrebinschi define as interpretações seculares como aquelas que “[...] no que tange à obrigação política rejeitam a possibilidade de o fundamento obrigacional risidir na ideia de autoridade divina.” (POGREBINSCHI, 2003, p.36). Porém, como esta definição em si não implica a obrigatoriedade da lei de natureza – condicionada pela ameaça de punição – preferimos definir a interpretação secular como aquela que rejeita qualquer obrigatoriedade para a lei de natureza, devido à ausência de punição.

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à própria preservação. Esta interpretação pressupõe que a obrigação só passa a existir após a instituição do soberano, este sim podendo punir aqueles que descumprem as leis que por ele são prescritas. Quanto a isso, Warrender aponta: Commentators have tended, however, to slide from the proposition, (1) that there are no valid covenants in the State of Nature (which we can say, for the moment, is almost true), to the proposition (2) that there is no obligation to keep valid covenants in the State of Nature, and hence to regard the State of Nature as a moral vacuum and the sovereign as the creator of an obligation to keep valid covenants, which is a complete mistake. (WARRENDER, 2000, p. 41)

Ou seja, para Warrender é claro que, em Hobbes, o soberano não é responsável pela validade do contrato, mas pela garantia de que ele seja cumprido por ambas as partes. Mais adiante discutiremos esse aspecto. No que diz respeito a esse assunto, ele prossegue: Hobbes’s argument is sometimes misrepresented when the following problem is put: If the sovereign is necessary for the existence of valid covenants, how can he be instituted by covenant? If Hobbes’s theory is, however, as we suggest, that I am obliged by my covenant unless some subsequent cause of fear invalidates it, the function of sovereign is not to make valid a covenant that was previously invalid, but to prevent (by taking away subsequent causes of fear) what is already a valid covenant from becoming invalidated. (WARRENDER, 2000, p. 44)

Ou seja, o soberano não é aquele que garante a validade do contrato, mas apenas aquele que garante que a obrigação derivada do contrato torne-se operante. Deste modo, se pensarmos na lei de natureza como comando de Deus, o soberano seria apenas o responsável por torná-la operante, e não por fundar a obrigação em sentido estrito. Porém, o que Warrender parece não levar em consideração é que, como Hobbes diz no Cap. XVII, “[...] e os pactos, sem a espada não passam de palavras, sem força para dar segurança a ninguém.” (HOBBBES, 2014, p. 143), e que isso parece indicar que, ao contrário do que Warrender afirma, o contrato só se torna obrigatório quando houver uma autoridade com poder coercitivo para forçar as partes envolvidas a cumpri-lo e, antes disso, não há nenhuma ameaça de punição para quem não cumprir com sua parte. Por outro lado, a interpretação secular em geral concebe a lei de natureza como apenas um preceito, ou resultado de um cálculo de consequências com as paixões provenientes da experiência7. Por exemplo: toda vez que vi homens em guerra, percebi que aqueles que 7

É importante destacar que Hobbes faz uma distinção entre prudência e razão. A prudência é a capacidade do indivíduo em questão prever situações futuras a partir de dados já obtidos pela experiência. Ou seja: quanto mais experiência, mais prudência. Já a razão é um cálculo mais sofisticado, no qual as definições adiquirem um papel de suma importância. São as boas definições semânticas que, dentro de uma estrutura sintática adequada, proporcionam ao homem a ciência, que segundo Hobbes não se obtém pela experiência, mas pelo cálculo que a razão faz com as proposições formuladas com base nos nomes dados às coisas pelos indivíduos. Deste modo, é evidente que entre prudência e razão há uma espécie de abismo, já que enquanto a primeira não envolve a

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morrem não se movem mais, nem desfrutam das coisas que normalmente os homens desfrutam em vida. Logo, se eu quiser continuar desfrutando de tais coisas, é melhor evitar a morte do que ir ao encontro dela. A partir deste resultado do cálculo de consequências com os dados recebidos pela experiência, o homem “descobre” este preceito que serve de ponto de partida para todas8 as leis de natureza que Hobbes descreve nos capítulos XIV e XV do Leviatã: “não se deve fazer nada que atente contra a própria sobrevivência, nem deve-se privar-se dos meios necessários para preservá-la”9. Mas por que isso? Esta conclusão ou resultado do cálculo que Hobbes chama de lei de natureza é aquilo que faz com que o ser humano possa continuar desfrutando das coisas que apenas quem está vivo pode desfrutar. Em determinada parte do Leviatã Hobbes diz que sem a segurança proveniente da instituição do Estado Não há lugar para o trabalho, pois seu fruto é incerto; consequentemente, não há cultivo da terra, nem navegação, nem uso de mercadorias que podem ser importadas pelo mar; não há construções confortáveis, nem instrumentos para mover e remover as coisas que precisam de grande força; não há conhecimento sobre a face da Terra, nem cômputo do tempo, nem artes, nem letras; não há sociedade; e o que é pior do que tudo, um medo contínuo e perigo de morte violenta. E a vida do homem é solitária, miserável, sórdida, brutal e curta. (HOBBES, 2014, p. 109)

Mas outra questão pode surgir: por que tanto medo da morte? Não há a possibilidade de que numa vida após a morte as coisas sejam melhores? Por consequência do argumento, é até possível que o homem considere essa hipótese no decorrer do cálculo, porém, como ninguém nunca voltou da morte para contar o que acontece depois 10, nem o homem pôde experienciar a própria morte para saber o que acontece, a sua razão – calculando com aquilo que dispõe – lhe recomenda que evite a morte, ao invés de buscá-la. O que se percebe neste caso é que o homem pode optar por seguir ou não este conselho, que Hobbes chama de lei de natureza. Por consequência do argumento, a única linguagem, a segunda envolve. Entretanto, como neste texto o foco é a extensão deste cálculo, é importante salientar que o cálculo racional só funciona caso o que for nomeado seja inteligível, e tudo o que é inteligível ou está dentro dos limites da lógica, ou provém da experiência. Deste modo, mesmo que tratemos quase exclusivamente da razão neste texto, a prudência assume um papel importante ao trazer a experiência empírica para o cálculo, uma vez que é a partir deste conteúdo empírico que os nomes e silogismos usados no cálculo racional surgem. 8 O número de leis de natureza muda de acordo com o tratado político de Hobbes que se é analisado. Sobre este aspecto, cf. VILLANOVA, 2009. Porém, como pode se perceber no decorrer do estudo da obra de Hobbes, a difrença no número de leis de natureza não significa que a argumentação mude entre uma e outra, mas sim que as leis de natureza, independentemente do modo como sejam escritas, são escritas de um modo genérico, e podese pensar até em mais leis do que aquelas descritas por Hobbes, já que todas elas se fundam na primeira lei. 9 Cf. citação direta do texto de Hobbes no início deste capítulo. 10 Em determinado momento do Leviatã Hobbes salienta que “[...] como não há nenhum conhecimento natural da condição do homem depois da morte, e muito menos da recompensa que lá se dá à falta de palavras, havendo apenas uma crença baseada na afirmação de outros homens, que dizem conhecê-la sobrenaturalmente, ou dizem conhecer aqueles que conheceram sobrenaturalmente, não é possível, por conseguinte, considerar a falta de palavra um preceito da razão, ou da natureza.” (HOBBES, 2014, p. 127).

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“punição” para este homem é a morte natural, que em alguns casos – como no de pessoas que não suportam a vergonha de matar o próprio pai, ou que estão infelizes com a vida – é melhor do que viver. Se o homem pode optar por seguir ou não a lei de natureza, o que faz com que ele a siga, quando decide seguir? Não é apenas evitar a morte que ele quer, ele quer evitá-la para continuar desfrutando da vida, das coisas que nela lhe dão prazer ou lhe causam felicidade. Com isso, percebemos um aspecto auto-interessado no homem hobbesiano, sendo este autointeresse o motivo – ou fundamento – que o conduz ao contrato. No Leviatã Hobbes diz Que todo homem deve se esforçar pela paz, na medida em que tenha esperança de a conseguir, e caso não a consiga pode procurar e usar todas as ajudas e vantagens da guerra. (HOBBES, 2014, p. 113)

Isso significa que, se o homem quiser garantir não apenas sua própria sobrevivência, como também os meios necessários para ela, deve buscar a garantia desses meios por um destes dois modos, devido à ameaça constante de perdê-los para seus vizinhos, tão autointeressados quanto ele próprio. Contudo, no século XX, a partir dos trabalhos de Taylor e Warrender, surge uma revisão da teoria da obrigação de Hobbes, que irá destacar os aspectos morais e religiosos de sua obra. Essa interpretação irá enfatizar o cartáter moralmente obrigatório da lei de natureza como fundante da obrigação política. Em geral, os autores da interpretação teológica concordam que o contrato é o meio pelo qual os homens garantem para si os meios necessários para a sobrevivência, sendo este o meio para a instituição do Estado. Contudo, tais autores discordam da interpretação secular no que diz respeito à obrigatoriedade da lei de natureza. As duas grandes interpretações teológicas da teoria hobbesiana são de Taylor e Warrender (este segundo já citado aqui no texto). Na primeira, Taylor identifica a lei de natureza ao imperativo categórico kantiano, pressupondo que o caráter calculador da razão em Hobbes se assemelha à razão formal – ou vazia de conteúdo – de Kant, dando à lei de natureza hobbesiana um caráter deontológico, no qual, assim que descoberta determinada lei de natureza, esta lei adquire um caráter de dever11. Isto se deve porque Hobbes postula como causa primeira do mundo Deus12, que enquanto

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Segundo Pogrebinschi, “[...] são várias as analogias que Taylor faz entre os dois autores, mas a maior consequência disso, para a sua concepção de obrigação política, se traduz em dois aspectos. Primeiro, na afirmação de que o motivo da obediência é a lei natural em si e por isso ‘o comando divino deve ser obedecido como tal porque ele é um comando divino (TAYLOR, The Ethical Doctrine of Hobbes, p. 49)’. As leis de natureza, para Taylor, mais do que apenas imperativas, parecem ser também categóricas.” (POGREBINSCHI, 2003, p. 99). 12 Cf. HOBBES, 2014, p. 94.

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criador, fez o mundo segundo sua vontade. Se a lei de natureza é algo intrínseco à própria natureza, e a natureza é segundo a vontade de Deus, segue-se que desrespeitar a lei de natureza é desrespeitar a lei divina – ou vontade de Deus. É deste modo que a interpretação teológica, fazendo da lei de natureza idêntica à vontade de Deus, confere a ela um caráter impositivo, ou obrigatório. O problema, que posteriormente Warrender identifica, é que a transgressão desta lei ainda não acarreta em punição na tese de Taylor. Portanto, usando partes do texto hobbesiano que aludem a um medo da punição após a morte, Warrender complementa Taylor e diz que o “medo da morte eterna” ou “segunda morte” é maior do que o medo da morte natural e, portanto, por temer mais o castigo de Deus do que o do soberano, não seria errado desobedecer ao soberano, caso sua lei fosse contrária à lei de natureza, esta tida como lei de Deus.13 É claro que esta discussão já foge um pouco do nosso tema, indo mais ao encontro de uma espécie de direito de resistência contra o poder soberano, mas o que nos importa da tese de Warrender é o caráter que ele insere na tese teológica, sendo este o medo da punição após a morte e a expectativa de uma recompensa pelo bom cumprimento da lei de natureza. Porém, como pretendemos mostrar com nosso trabalho, é problemático seguir a tese Taylor-Warrender e colocar Deus como fundamento da obrigação, fazendo com que a lei de natureza tenha um caráter impositivo e, consequentemente, que a instituição do estado civil seja apenas uma consequência inevitável desta. É problemático porque os aspectos-chave da tese desses autores parecem desconsiderar a inclinação mecanicista de Hobbes. Tanto a “morte eterna” quanto “Deus” não passam de hipóteses, especulações do pensamento com base nos dados recebidos pela experiência. Representada pela tese Taylor-Warrender, pode-se dizer que, identificando a lei de natureza à lei divina, a interpretação teológica fundamenta a obrigação política numa obrigação já existente no estado de natureza, sendo esta fundamentada em última análise em Deus. O que vamos discutir na próxima parte é se Deus realmente pode ser considerado fundamento da obrigação política em Hobbes.

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Thamy Pogrebinschi sobre o pensameto de Warrender, por exemplo, diz que “[…] os homens hobbesianos obedecem a Deus, seja esta obediência motivada pela autopreservação ou pelo auto-interesse: vale dizer, o fundamento da obrigação é sempre teológico, apesar de sua motivação poder ser secular. No entanto, no sistema de motivos [de Warrender], quando tais considerações relativas à sansão divina deixam de ser negligenciadas e assumem seu devido lugar, o pior mal do homem deixa de ser a morte física e passa a ser a morte eterna, enquanto seu maior bem deixa de ser a paz ou a proteção e passa a ser a salvação eterna.” (POBREBINSCHI, 2003, p. 116, o que está entre colchetes foi acrescido por mim).

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3. Deus como fundamento da obrigação O que queremos dizer quando dizemos que Deus é o fundamento da obrigatoriedade da lei de natureza em Hobbes e, portanto, da obrigação política? Para tentar elucidar o papel de Deus, começaremos pelo argumento no qual se sustenta a interpretação teológica, argumento este que usa elementos do texto no qual Hobbes alude a este papel de fundamento. Porém, antes deve-se ressaltar o raciocínio no qual o aspecto mecanicista de Hobbes resulta: o homem não é algo diferente da natureza, mas sim parte da natureza, e todos os movimentos internos de sua alma nada mais são do que consequência dos movimentos externos que ressoam internamente. A estes movimentos internos damos o nome de paixões.14 A razão é a faculdade que faz um cálculo de consequências com as paixões, que podem ser de desejo ou aversão. Como as paixões, em última instância, provém da experiência – inclusive as coisas imaginadas não passam de uma reorganização destas experiências primeiramente recebidas -, pode-se dizer que a razão calcula com informações recebidas pela experiência. A lei de natureza é um desses cálculos que, como dito na parte anterior, é feito a partir de experiências ou vivências dos homens no decorrer de sua vida e, assim como esses homens e a natureza, as leis também fazem parte da natureza. Até este ponto, não vemos nenhum grande problema na explicação de Hobbes sobre a natureza e sua relação com a lei de natureza. Ela - a lei de natureza - continua não dando nenhum sinal de obrigatoriedade. O problema começa quando, ao regredir na relação de causas e efeitos, procura-se uma causa primeira para o mundo. Sobre isso, Hobbes diz no Leviatã que Aquele que de qualquer efeito que vê ocorrer infira a causa própria e imediata desse efeito, e depois a causa dessa causa, e mergulhe profundamente em direção à busca das causas, deverá finalmente concluir que existe (como até os filósofos pagãos confessavam) um primeiro motor. Isto é, uma primeira e eterna causa de todas as coisas, que é o que os homens significam com o nome de Deus. (HOBBES, 2014, p. 94)

Fica evidente nesta passagem que Hobbes opta por postular uma causa primeira para a natureza, e que essa causa é Deus. Seria difícil defender a obrigatoriedade da lei de natureza por ser idêntica à lei divina apenas com essa passagem, porém, ela é o primeiro passo para fortalecer o argumeto teológico. A segunda passagem problemática aparece no final do Capítulo XIV do Leviatã, quando o filósofo define o que é lei de natureza. Ainda no mesmo parágrafo, Hobbes diz que, “[...] no entanto, se considerarmos os mesmos teoremas como transmitidos pela palavra de Deus, que tem direito de mando sobre todas as coisas, neste caso serão propriamente 14

Cf. Cap. VI do Leviatã.

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chamados leis.” (HOBBES, 2014, p. 137). Portanto, dois aspectos precisam ser notados: 1) segundo Hobbes, Deus é a causa primeira do mundo, logo podemos deduzir que o mundo é segundo Sua vontade; e 2) se o mundo é segundo a vontade de Deus, as leis de natureza são a expressão dessa vontade, já que elas são parte de uma natureza que, ao englobar tanto o homem quanto tudo o que existe, é do jeito que é porque de acordo com a vontade de Deus. Assim, como dito no trecho acima, se considerarmos as leis de natureza como comandos de Deus, elas terão um caráter obrigatório já no estado de natureza. Porém, postular Deus como causa primeira do mundo implica em alguns problemas. O primeiro deles é em relação à definição de Deus que, mesmo sendo negativa, é categórica: Aquele que quiser atribuir a Deus apenas o que é garantido pela razão natural, ou deve servir-se de atributos negativos, como infinito, eterno, incompreensível; ou de superlativos, como o mais alto, o maior, e outros semelhantes. (HOBBES, 2014, pp. 306-307)

A questão é que, tendo Deus estas características, pode-se deduzir que ele é incausado e, consequentemente, que ele não só é causa de si, como também causa do próprio movimento. Em outras palavras, Deus é a causa primeira da relação de causas, mas ao mesmo tempo parece excluído desta relação de causas. Por que excluído? Porque, ao dizermos que Deus é incausado, atribuímos a ele uma característica que parece de todo diferente daquela das outras causas. Mesmo que esta seja uma leitura com base no argumento mecanicista de Hobbes – aquele sobre o qual fundamos nossa interpretação -, nega-se a existência de Deus no esquema da natureza de Hobbes quando nega-se a ele a caracterísitca das demais causas, que é: ter a origem de seu movimento em outro. Isso parece difícil de provar, já que em vários momentos Hobbes diz que “[...] o primeiro elo está na mão de Deus, a primeira de todas as causas [...]” (HOBBES, 2014, p. 180), o que torna complicado a partir de tais passagens dizer que Deus é apenas um recurso de retórica adotado por Hobbes. Entretanto, fica mais fácil de entender o nosso posicionamento se analisarmos outras partes do Leviatã, no qual o lado mecanicista de Hobbes salta aos olhos. Comecemos com uma parte na qual ele diz que tudo o que há no universo é corpo: A palavra corpo, na sua acepção mais geral, significa o que preenche ou ocupa um determinado espaço ou um lugar imaginado, que não dependa da imaginação, mas seja uma parte real do que chamamos o universo. Como o universo é o agregado de todos os corpos, não há nenhuma das suas partes reais que não seja também corpo, nem há alguma coisa que seja propriamente um corpo e não seja também parte desse agregado de todos os corpos que é o universo. (HOBBES, 2014, p. 330)

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Ou seja: tudo o que há é corpo, e nada há além disso. Mas Deus também não poderia ser um corpo, mesmo que seja concebido como a totalidade de corpos? Este é o problema. Retomemos o que dissemos antes: para Hobbes, Deus não é apenas a causa primeira do universo, mas também do movimento que o rege, sem ter nada como causa de Seu movimento além de si próprio. Ou seja, Deus, se for um corpo, tem em si a causa de Seu movimento. Porém, no início do Capítulo II Hobbes diz o seguinte: “[...] nenhum homem duvida da verdade da seguinte afirmação: quando uma coisa está em repouso, permanecerá sempre em repouso, a não ser que algo a coloque em movimento.” (HOBBES, 2014, p. 17). Ou seja: se Deus fosse corpo, teria necessariamente de ser movido por outra coisa para poder mover outras e, por conseguinte, dar “início” ao movimento do universo. Se ele tem em si a origem de seu movimento, ele não é corpo. Porém, se ele não for corpo, como seria Deus aquele que dá início ao movimento do universo? E o problema fica mais complexo quando percebemos que não apenas o caráter incausado de Deus é problemático porque incoerente com o restante da natureza e seu movimento, mas porque a própria inferência de Deus como causa primeira é contingente, e não necessária. O que queremos dizer com isso? Este é o segundo aspecto no qual fundamentamos nossa interpretação: a experiência. Como dito antes, o papel de calculadora da razão é fundamental para todas as conclusões ao qual o homem chega. Na primeira parte dissemos que a vida após a morte é apenas uma possibilidade e, portanto, uma segunda morte também não passa de uma possibilidade. A outra possibilidade é a de que a morte natural seja o fim derradeiro, e após isso nada mais exista. Em outras palavras, enquanto uma possibilidade é a de uma vida após a morte, a outra é a ausência de qualquer forma de vida, quer corpórea, quer espiritual. Com relação à Deus a razão opera da mesma maneira: não há informações provenientes da experiência que, ao se converterem em paixões, fundamentem a inferência de Deus como causa primeira. Porém, pode surgir o questionamento: se Deus é uma das possíveis inferências da razão, qual é a outra? A resposta é bem simples: a de que o universo não tem uma causa primeira, mas que é eterno. Pode-se resumir esta afirmação no seguinte: se postulamos Deus como causa primeira do movimento do universo, e dizermos que esta causa primeira é eterna e incausada, por que não eliminar Deus e a causa primeira da história, e dizer apenas que o próprio universo é eterno e incausado? Ou seja, a razão não tem como provar nenhuma das duas hipóteses – com isso se evidencia o caráter incompreensível de Deus - e, portanto, escolher uma em detrimento da outra é pura arbitrariedade. Se Deus como causa primeira fosse a única possibilidade de inferência, não seria errado concluir que as leis de natureza são

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idênticas à lei divina porque conforme à Sua vontade. Porém, Deus, enquanto mera possibilidade, permanece apenas uma hipótese e, portanto, toda teoria que pretenda fundamentar uma obrigação em Sua existência está sujeita à questionamentos quanto à sua legitimidade. Como não é possível para o homem provar a existência de Deus apenas com aquilo que conhece pela experiência, nem sempre a conclusão do seu cálculo será Deus como causa primeira, mas por vezes pode ser que a conclusão da razão seja que o universo é, em seu movimento de geração e corrupção, eterno. Tendo dito isso, devido ao fato de que a hipótese que dá o caráter obrigatório à lei de natureza já no estado de natureza não passar de uma hipótese para a razão, e que a outra possibilidade – universo em movimento eterno de geração e corrupção – permanece como uma conclusão igualmente possível, há fortes elementos para argumentar que Deus não pode ser o fundamento da obrigação, como pretende Warrender e a interpretação teológica em geral. 4. Conclusão Com base no que foi dito até aqui, mostra-se problemático postular Deus como fundamento da obrigação em Hobbes porque é incoerente com o universo que o filósofo inglês propõe, e também mostra-se problemático explicitar o aspecto normativo da obrigação hobbesiana negligenciando-se seu aspecto mecanicista. Isso se deve ao fato de que esta obrigação é sustentada apenas por uma crença arbitrária na existência de uma causa primeira no início da ralação de causas, sendo que, ao levar-se a sério essa inferência, vemos que ela incorre em uma série de contradições. A primeira contradição que aparece diz respeito ao aspecto incausado de Deus, que seria algo parecido com o “Incondicionado” de Kant. Em outros palavras, postular algo que viole a lei da inércia num universo que é composto apenas por corpos – como o que Hobbes propõe – é o mesmo que postular algo arbitrariamente para pôr termo a uma série cuja própria série implica uma ausência de termo. Portanto, parece-nos mais sensato partir do pressuposto de que o próprio universo, enquanto uma relação de causas e efeitos regidas pelas leis do movimento, tem um movimento eterno. Isso não significa que esteja provado que Deus não exista dentro do esquema da natureza presente na obra hobbesiana, muito menos que ele não exista para o próprio Hobbes. Isso é algo que não temos como saber. O que se quer demonstrar com este texto é que, de acordo com o que é dito sobre Deus na obra de Hobbes – sobretudo no Leviatã -, é problemático ligá-lo com o universo que Hobbes cria sem cair em contradição, e que Ele só poderia fundamentar a obrigação em um universo cuja natureza fosse de todo diferente daquele proposto por nosso filósofo.

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The role of God in Hobbes’ Theory of Obligation problem Abstract This article has as its intention to explore the basis for Thomas Hobbes’ Theory of Obligation, whose interpretations oscillate between either putting God and the divine law as its basis or the fear and the self-interest. For such, a study is done – with enphasis on Leviathan - trying to enlighten what is God’s role in the problem of Theory of Obligation, and only then say whether it is coherent or not to put Him as the basis for the obedience in the Commonwealth. Keywords: Thomas Hobbes. Theory of Obligation. God. REFERÊNCIAS FRATESCHI, Yara. A física da política: Hobbes contra Aristóteles. Campinas-SP. Editora da Unicamp. 2008. FRATESCHI, Yara. Racionalidade e moralidade em Hobbes. Doispontos. Curitiba. São Carlos. Vol. 6, n. 3 – especial; p. 195-213. Abril, 2009. GERT, Bernard. A psicologia em Hobbes. In: Hobbes. Tom Sorell (org.). Aparecida-SP: ideias & letras. 2011. (Companions & Companions). HOBBES, Thomas. Leviatã. Organizado por Richard Tuck. São Paulo. Martins Fontes. 2014. HOBBES, Thomas. Do Cidadão. Tradução, apresentação e notas por Renato Janine Ribeiro. São Paulo. Martins Fontes. 2002. HOBBES, Thomas. Elementos da Filosofia: Primeira Seção – Sobre o Corpo. Parte I – Computação ou Lógica. Campinas-SP. IFCH/Unicamp. 2005. JESSEPH, Douglas. Hobbes e o método da ciência natural. In: Hobbes. Tom Sorell (org.). Aparecida-SP: ideias & letras. 2011. (Companions & Companions). LIMONGI, Maria Isabel. A Relação entre a Razão e as Paixões na Antropologia Hobbesiana. M.I.P. Discurso (24);p. 147-158. 1994. LISBOA, Wladimir Barreto. Algumas questões acerca dos fundamentos da filosofica civil em Thomas Hobbes. Estudos Jurídicos. Unisinos. 38(3): 65-68. Setembro-dezembro, 2005. POGREBINSCHI, Thamy. O problema da obediência em Thomas Hobbes. Bauru-SP. EDUSC. 2003. SORELL, Tom. O esquema das ciências em Hobbes. In: Hobbes. Tom Sorell (org.). Aparecida-SP: ideias & letras. 2011. (Companions & Companions). VILLANOVA, Marcelo Gross. O problema das leis em Hobbes. Doispontos. Curitiba. São Carlos. Vol. 6, n. 3 – especial; p. 85-98. Abril, 2009. WARRENDER, Howard. The Political Philosophy of Hobbes. Oxford University Press. 2000.

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