O Papel dos Novos deuses na Ilíada

August 10, 2017 | Autor: J. Pique Castanheira | Categoria: História Da Antiguidade Clássica
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História das Culturas na Antiguidade Clássica Professor Doutor Nuno Simões Rodrigues O Papel dos Novos deuses na Ilíada Este trabalho é realizado no âmbito da cadeira de História das Culturas na Antiguidade Clássica leccionada pelo professor Nuno Simões Rodrigues. Irá incidir na obra Ilíada de Homero, focando-se em particular nos deuses presentes no decurso da acção e como é que estes a influenciam e como reagem a acções realizadas por eles ou acções que presenciam. Durante o decurso do último ano da guerra de Troia, eventos presentes na Ilíada, mostram a presença de diversos deuses no decorrer das batalhas sendo vistos como elemento determinante para que um dos lados possa conquistar a vitória. Verifica-se então uma divisão por parte dos deuses sobre que lado é que estes apoiam. Do lado dos Troianos está presente Afrodite, Apolo, Ares e Ártemis, enquanto do lado dos Gregos estavam Atenas, Hera, Posídeon e Hefesto. No caso de Zeus este apresenta de certa forma uma posição neutra na maior parte do decorrer da Ilíada embora mais tarde se venha a verificar uma tomada de posição sobre qual lado deveria ganhar. É a partir destas interacções com o mundo dos homens, que se pode verificar como é que os deuses são vistos por Homero. Verifica-se de imediato na Ilíada que os deuses apoiam um dos lados conforme os seus interesses pessoais o que resulta no conflito entre eles, chegando ao ponto de interferirem directamente nas batalhas com o intuito de ajudar o lado que apoiam. Estas acções mostram assim que os deuses apresentam características bastante humanas verificando-se rivalidade entre eles. Esta intervenção dos deuses no território dos mortais é verificada por exemplo no canto III em que durante o combate entre Páris e Menelau, Afrodite intervém de modo a

que Páris se possa salvar da morte eminente1 demonstrando assim que existe um interesse pessoal por parte de certos deuses que um dos lados saia vencedor. Estas intervenções irão verificar-se ao longo do poema tanto a favor dos Aqueus como dos Troianos, pois Atenas e Hefesto participam de modo activo nas batalhas com o intuito de garantir a vitória aos Aqueus, tal como se verifica por exemplo, do lado dos troianos, Afrodite e Apolo. Para além destas intervenções directas na batalha, verificam-se formas indirectas que os deuses têm de intervir, tal como as diversas discussões existentes entre os deuses no âmbito de decidir o desfecho da guerra, sendo o episodio do concilio dos deuses o que melhor ilustra este tipo de situação2. Para além destas discussões, também se verifica no caso de Aquiles a criação de um escudo feito por Hefesto 3, a pedido de Tétis (mãe de Aquiles), no intuito de lhe dar uma vantagem na batalha contra Heitor. Estas tomadas de posição por parte dos deuses sobre quem apoiam ao longo da Ilíada irá criar um conflito entre eles, levando assim a diferentes estratagemas por parte destes de modo a enganar e ocultar as suas intenções no que toca a garantir a vitória do lado que apoiavam. Estas acções demonstram assim determinados traços característicos dos deuses representados por Homero, em que, embora de carácter divino para os mortais, apresentam defeitos pouco dignos de deuses dando-lhes um carácter mais humano do que divino em certas situações. Estas intervenções dos deuses irão causar inúmeras oscilações no possível resultado da batalha, dependendo da presença ou não dos mesmos. Verifica-se assim, que embora os deuses de Homero se apresentem como seres imperfeitos e com falhas como os mortais, ainda possuem um peso decisivo, no desenrolar da guerra. Por exemplo no canto V verifica-se do lado dos aqueus a presença de deuses como Atenas e Hefesto, possuindo assim, o exército grego vantagem em relação ao troiano. Um dos aspectos que melhor ilustra as falhas acima referidas destes deuses são as suas acções após a ordem de Zeus em relação ao seu envolvimento na guerra, referida no canto VIII, com a retirada dos deuses da guerra. É neste momento que se verifica uma

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Cif. HOMERO, Ilíada / Homero ; tradução de Frederico Lourenço, 5ª edição, Lisboa, Livros Cotovia, 2012, p.85, canto III, vv.368-382. 2 Cif. Vide, Idem, ibidem, Canto IV, v.1. 3 Cif. Vide, Idem, ibidem, Canto XVIII

desobediência ao pai dos deuses ao ignorá-lo e continuar a actuar na guerra sem que Zeus tivesse conhecimento. Esta situação de tentar encobrir acções que deveriam ser honradas entre eles ilustra de modo bem claro uma presença de características negativas muitas vezes conotadas com os humanos e que deveriam estar ausentes nos seres divinos. Verifica-se também no canto XIV o uso da mentira e manipulação entre os deuses quando Hera seduz Zeus para o distrair com o propósito de dar oportunidade aos outros deuses de actuarem livremente na batalha entre os Aqueus e os Troianos. Para além da mentira e manipulação verifica-se também a presença da vergonha quando Zeus move as nuvens por cima dele e de Hera para evitar que fossem vistos. A sua compaixão por vezes demonstrada em relação à morte de certos mortais reforça também esta ideia, mostrando nos deuses a tristeza e pena por seres que são abaixo deles como se verifica no final da Ilíada quando o corpo de Heitor mesmo após a morte é protegido pelos deuses até que lhe seja dado um enterro digno. Estes vários aspectos presentes nos deuses, de certa forma funcionam como uma humanização de figuras que na sua essência são divinas ao lhes atribuir características muitas vezes conotadas como negativas e presentes apenas nos homens, sendo estes seres imperfeitos. Outro aspecto também característico destes deuses é o facto de darem a conhecer a sua presença aos mortais, pois os heróis da Ilíada têm a consciência da presença dos deuses no campo de batalha constantemente ao seu lado a protege-los, tal como se pode verificar por exemplo no canto III, vv.439-440, em que Paris diz a Helena “(…) Hoje venceu Menelau com a ajuda de Atena; mas outra vez / serei eu a vencê-lo: também tenho deuses que me ajudem.”4. Verifica-se assim que os deuses que estão presentes na Ilíada são muitas vezes descritos como seres com bastantes falhas e em constante conflito entre eles devido a diferenças de opinião em relação ao destino dos mortais. Em contraste os mortais descritos no poema são muitas vezes representados como seres bastantes mais dignos e com características bem mais divinas do que os próprios deuses, elemento que mais tarde irá prejudicar os textos Homericos devido ao modo como os deuses são descritos. Conclui-se assim que no decorrer do poema os deuses são o elemento determinante no desenrolar da guerra, embora este seja um conflito dos mortais, o que leva a que estejam dependentes do desenrolar do conflito divino que tem funcionado em paralelo com a guerra, em que tem o seu apogeu no canto XX com a livre participação dos deuses na batalha.5

João Castanheira, nº 49118

4 5

Vide, Idem, ibidem, p.87. Vide, Idem, ibidem, p.400.

Bibliografia: - Homero, Ilíada, Tradução LOURENÇO, Frederico, 5ª edição, Lisboa, Cotovia, 2012. - BONNARD, André, A Civilização Grega, Tradução José Saramago, 1º edição, Lisboa, Edições 70, 2007. - PEREIRA, Maria Helena da Rocha, Estudos de História da Cultura Clássica, vol. I, 11ª edição, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 2012. - KITTO, Humphrey Davey Findley, The Greeks, 1ª edição, London, Penguin, 1991.

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