O papel dos traços funcionais na ecologia do fitoplâncton continental

June 16, 2017 | Autor: Jandeson Brasil | Categoria: Ecology, ENVIRONMENTAL SCIENCE AND MANAGEMENT
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Oecologia Australis 15(4): 799-834, Dezembro 2011 http://dx.doi.org/10.4257/oeco.2011.1504.04

o papel dos traços funcionais Na Ecologia do fitoplâncton continental Jandeson Brasil* & Vera L. M. Huszar

Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Departamento de Botânica, Laboratório de Ficologia, Museu Nacional. Quinta da Boa Vista, São Cristóvão, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. CEP: 20 940-040. E-mails: [email protected], [email protected]

Resumo É crescente o interesse da ecologia em agrupar organismos com base em traços funcionais das espécies devido a sua maior habilidade em predizer ou explicar a estrutura das comunidades e suas respostas às condições ambientais. O objetivo desta revisão é discutir os fundamentos da abordagem baseada em traços funcionais na ecologia do fitoplâncton continental. Primeiramente, nós identificamos os traços funcionais mais relevantes, em seguida é feita uma revisão dos estudos inovadores sobre a abordagem e, por fim, é apresentada uma breve análise dos grupos funcionais (GF) propostos por Reynolds et al. (2002), aplicada a ecossistemas aquáticos continentais brasileiros. Traços funcionais afetam a aptidão das espécies, via seus efeitos sobre reprodução e sobrevivência, podendo ser: morfológicos (ex. forma, tamanho), fisiológicos (ex. concentração e composição de pigmentos fotossintéticos, capacidade de fixação de nitrogênio, produção de toxinas), comportamentais (ex. mixotrofia, motilidade) e de história de vida (ex. reprodução assexuada/sexuada, produção de estágios de dormência). Resultados da análise multivariada baseada em dados de 33 ecossistemas aquáticos brasileiros indicaram que diferentes tipos de ecossistemas (rios, lagos, estuários e reservatórios) compartilham GF similares em estados tróficos similares. Sistemas oligotróficos foram dominados por organismos pequenos ou grandes equipados com traços funcionais, tais como flagelos ou mixotrofia, que lhes permite sobreviver em condições pobres em nutrientes. Em lagos hipereutróficos e misturados, tanto condições nutricionais de enriquecimento (que fornecem matéria suficiente para permitir o aumento no tamanho dos organismos), como diminuição na transparência da água favorecem a dominância de organismos grandes com alta razão superfície/volume, tais como cianobactérias filamentosas. Embora o esquema proposto por Reynolds et al. tenha se mostrado uma ferramenta potencial para sintetizar os tipos de comunidades em ecossistemas aquáticos brasileiros, algumas limitações podem ser assinaladas como: (i) alguns GFs são incluídos sob bases intuitivas; (ii) a necessidade de conhecimento taxonômico de um especialista, e (iii) a circularidade na inclusão de novas espécies no esquema a partir das condições onde vivem. Outros esquemas têm sido propostos visando eliminar essas limitações. Assim, estudos futuros devem dar ênfase em testar quais os esquemas que melhor predizem a composição da comunidade fitoplanctônica em relação às condições ambientais. Palavras-chave: Fitoplâncton; estrutura da comunidade; grupos funcionais; traços funcionais. Abstract THE ROLE OF THE FUNCTIONAL TRAITS ON THE PHYTOPLANKTON ECOLOGY IN INLAND WATERS. To cluster species based on their functional traits has been a growing trend in ecology due to its ability to predict or explain the structure of communities and their responses to environmental conditions. The aim of this review is to discuss the foundations of approach based on functional traits in the ecology of freshwater phytoplankton. First, we identify the functional traits relevant to phytoplankton; then we provide a review of the functional approach literature and, finally, we analyze Brazilian freshwater ecosystems using the functional groups (FG) proposed by Reynolds et al. (2002). Functional traits affect the fitness of species through their effects on reproduction and survival. These traits can be: morphological (i.e. size, shape), physiological (i.e. concentration and composition from photosynthetic pigments, capability Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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of nitrogen fixation, toxin production), behavioral (i.e. mixotrophy, motility) and life history (i.e. asexual/ sexual reproduction, production of resting stages). Results from a multivariate analysis based on data from 33 aquatic ecosystems indicate that different types of ecosystems (rivers, lakes, estuaries and reservoirs) share similar FG across similar trophic states. Oligotrophic systems were dominated by small organisms or larger one equipped with functional traits, such as flagella or mixotrophy behavior, that allow them to live in poor nutrient conditions. In mixed hipertrohic lakes, both the enriching in nutrient condition (that provide matter enough to allow the increase in the size of the organisms), and the decrease in water transparency favor the dominance of large organisms with high surface/volume ratio, such as filamentous cyanobacteria. Although the scheme proposed by Reynolds et al. has been a potential tool to sum up the community types in Brazilian aquatic ecosystems, it presents some limitations, such as: (i) some FGs have been added on the intuitive grounds, (ii) the need of taxonomic knowledge from a specialist, and (iii) cyclic reasoning. Other schemes have been proposed due to these limitations. Thus, future studies should give emphasis to test the scheme which better predict the community composition of phytoplankton in relation to environmental conditions. Keywords: Phytoplankton; community structure; functional groups; functional traits. RESUMEN EL ROL DE LOS RASGOS FUNCIONALES EN LA ECOLOGÍA DEL FITOPLANCTON CONTINENTAL. La agrupación de especies basadas en sus rasgos funcionales ha tenido una tendencia creciente en ecología debido a su mayor habilidad de predecir o explicar la estructura de las comunidades y sus respuestas ante las condiciones ambientales. El objetivo de esta revisión es examinar los fundamentos del enfoque basado en rasgos funcionales en la ecología del fitoplancton de agua dulce. En primera instancia, identificamos las características funcionales relevantes del fitoplancton; luego proveemos una reseña de la literatura sobre este enfoque, y finalmente, analizamos los ecosistemas de agua dulce brasileros usando los grupos funcionales (GF) propuestos por Reynolds et al. (2002). Los rasgos funcionales afectan la capacidad de las especies por sus efectos sobre la reproducción y la supervivencia. Estos rasgos pueden ser: morfológicos (ej. Tamaño, forma), fisiológicos (ej. concentración y composición de los pigmentos fotosintéticos, capacidad de fijación de nitrógeno, producción de toxinas), comportamentales (ej. Mixotrofia, movilidad) e historias de vida (ej. reproducción asexual/sexual, producción de etapas de reposo). Los resultados de un análisis multivariado basado en la información de 33 ecosistemas acuáticos indican que los diferentes tipos de ecosistemas (ríos, lagos, estuarios y reservorios) comparten GF similares en estados tróficos similares. Sistemas oligotróficos estuvieron dominados por organismos pequeños o grandes equipados con rasgos funcionales, tales como los flagelados o mixotróficos, que les permite vivir en condiciones pobres en nutrientes. En lagos hipertróficos y mesclados, tanto el enriquecimiento en las condiciones nutricionales (que provee la materia suficiente para permitir el aumento de tamaño de los organismos), como la disminución en la transparencia del agua favorecen la dominancia de organismos grandes con elevada relación superficie/volumen, tales como cianobacterias filamentosas. Aunque el esquema propuesto por Reynolds et al. ha sido una herramienta potencial para resumir los tipos de comunidades en los ecosistemas acuáticos brasileros, el mismo presenta algunas limitaciones, tales como: (i) algunos GFs han sido incluidos bajo bases intuitivas, (ii) la necesidad de conocimiento taxonómico de un especialista, y (iii) el razonamiento cíclico. Debido a dichas limitaciones, otros esquemas han sido propuestos. De este modo, futuros estudios deberían enfatizar en el análisis de los esquemas que predicen mejor la composición de la comunidad de fitoplancton en relación con las condiciones ambientales. Palabras clave: Fitoplancton; estructura de la comunidad; grupos funcionales; rasgos funcionales.

Introdução Ecologia de comunidades é o estudo da coocorrência de espécies, que interagem em maior ou Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

menor intensidade, em uma escala local (Lawton 1999). Devido à natureza complexa, tem sido argumentado que generalizações e predições são difíceis de serem alcançadas em ecologia de

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comunidades (Lawton 1999, Simberloff 2004). No entanto, a abordagem baseada em traços funcionais tem atraído o interesse dos ecólogos não só por tornar a ecologia de comunidades mais geral e preditiva, mas também por permitir uma ligação entre ecologia de comunidades e ecologia de ecossistemas, uma dicotomia artificial freqüentemente lamentada, mas raramente interligada (McGill et al. 2006, Westoby & Wright 2006, Webb et al. 2010). Tal interesse se deve a dois fatores: i) a abordagem funcional enfoca relações entre variáveis quantitativas [ex: traços funcionais (functional traits), variáveis ambientais, medidas de eficácia biológica (fitness)] o que resulta na identificação de padrões, e por fim, na predição; ii) os traços funcionais estão intimamente relacionados aos processos de aquisição e alocação de energia e matéria, permitindo uma ligação entre ecologia de comunidades e ecossistemas. Traço funcional é qualquer característica morfológica, fisiológica ou fenológica mensurável em nível de indivíduo, que afeta indiretamente a eficácia biológica via seus efeitos sobre crescimento, reprodução e sobrevivência (Violle et al. 2007). A abordagem funcional está baseada na teoria de nicho ecológico (Hutchinson 1957) que considera as espécies como entidades heterogêneas, as quais respondem diferentemente às condições ambientais, mudando o foco da espécie em si para seus traços funcionais. Ou seja, a idéia central da abordagem funcional é que traços, não entidades taxonômicas, são as unidades fundamentais selecionadas através de filtros ambientais (abióticos, bióticos ou barreiras à dispersão) (Weiher et al. 1998, Violle et al. 2007). A abordagem baseada nos traços funcionais permite fazer maiores generalizações do que uma abordagem baseada na filogenia. Da perspectiva funcional surge o interesse em classificar espécies em grupos que se relacionam diretamente com as funções do ecossistema. Dessa forma, grupos funcionais podem então ser definidos como um conjunto de espécies com ou sem afinidades filogenéticas, que compartilham traços funcionais similares e que respondem similarmente às condições ambientais (Lavorel et al. 1997). Fitoplâncton é um grupo polifilético de microorganismos fotossintetizantes (algas, cianobactérias e algumas poucas bactérias) adaptados

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a viverem parcial ou continuamente em águas abertas. Estima-se que exista cerca de quatro mil espécies de fitoplâncton marinho e, provavelmente, um número aproximado para o fitoplâncton de corpos de água continentais (Reynolds 2006). Em ambas as listas, além de existir uma marcante diversidade de espécies, há também uma ampla variedade de forma e tamanho entre os organismos (Reynolds 2006, Finkel et al. 2010). Tais diferenças morfológicas têm sido tradicionalmente usadas na circunscrição taxonômica das espécies. A diversidade na forma e tamanho do fitoplâncton está relacionada claramente à cinética para utilização de recursos e à susceptibilidade a processos de perda, podendo então as espécies ser classificadas de acordo com suas propriedades funcionais (Reynolds et al. 2002, Weithoff 2003, Naselli-Flores et al. 2007, Finkel et al. 2010, Kruk et al. 2010). Como a composição da comunidade fitoplanctônica afeta o funcionamento dos ecossistemas aquáticos, é importante conhecer quais fatores governam sua dinâmica. Por serem facilmente dispersos, dados seu pequeno tamanho e elevada abundância (Finlay 2002), é razoável assumir que as condições locais (estrutura física do sistema, disponibilidade de recursos, processos de escoamento hidráulico, sedimentação e herbivoria) determinarão quais espécies ocorrerão em um dado momento e lugar (Margalef 1978, Reynolds 1980, Hillebrand & Azovsky 2001, Beisner et al. 2006). Assim, as condições ambientais locais devem atuar como filtros favorecendo grupos de espécies que compartilham características adaptativas similares (Reynolds 1988, Webb et al. 2002), ainda que as espécies não sejam, de forma obrigatória, relacionadas filogeneticamente. Devido a seu pequeno tamanho, curto tempo de geração, grande tamanho populacional e fácil manipulação em laboratório, o fitoplâncton é tido como um excelente modelo para enfocar questões ecológicas fundamentais, entre elas, testar a abordagem baseada nos traços funcionais (Litchman & Klausmeier 2008). O objetivo da presente revisão é discutir os fundamentos da abordagem dos grupos funcionais na ecologia do fitoplâncton continental. Primeiramente, são apresentados os traços funcionais mais relevantes das algas planctônicas, em seguida é feita uma revisão dos estudos inovadores na abordagem com ênfase Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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em ambientes aquáticos continentais e, por fim, é apresentada uma breve análise dos grupos funcionais propostos por Reynolds et al. (2002) aplicada a ecossistemas aquáticos continentais brasileiros, a partir de dados já publicados. Principais eixos ecológicos e traços funcionais associados Nicho é considerado como o hiper-espaço n-dimensional envolvendo as tolerâncias e requerimentos de um organismo, onde n é o número de eixos ecológicos que o constitui (Hutchinson 1957). Os principais eixos ecológicos para o fitoplâncton se traduzem em: i) interceptação de luz suficiente para fixação de carbono a fim de compensar o consumo imediato pela respiração e para a manutenção da biomassa; ii) absorção de nutrientes a partir de um meio hipotônico; iii) maximização da habilidade para entrar e permanecer na camada de água iluminada; e iv) redução de perdas por herbívoros ou patógenos (Reynolds 2006, Litchman & Klausmeier 2008). Para cada um desses eixos existe uma gama de traços, desde o nível intracelular até o de população, que permite ao fitoplâncton sobreviver e reproduzirse em um dado ambiente. Nesta revisão enfocaremos apenas os traços funcionais mais freqüentemente considerados para definir os grupos funcionais do fitoplâncton, com ênfase na morfologia, luz, nutrientes e principais processos de perda. Morfologia Os organismos fitoplanctônicos mostram uma ampla diversidade de formas: algumas são robustas (esféricas, elipsóides, cilíndrico-curtas), outras achatadas ou alongadas; algumas são simples na forma superficial, outras complexas com diversos tipos de ornamentação. Além da diversidade de formas, é expressiva a variabilidade de tamanho dos organismos fitoplanctônicos, que é comparável com aquela existente entre as imensas árvores de uma floresta e as ervas que crescem em sua base (Reynolds 2006). A unidade de volume dos organismos fitoplanctônicos pode variar em até oito ou nove ordens de magnitude, indo desde cianobactérias unicelulares de ~ 1µm3 até colônias Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

mucilaginosas de Microcystis (Cyanobacteria), que podem atingir mais de 1mm de diâmetro (> 109µm3 em volume) (Reynolds 2006). O tamanho e a forma das espécies fitoplanctônicas, entre outras propriedades, determinam sua adaptabilidade aos ambientes aquáticos (Lewis 1976, Reynolds 1988, Naselli-Flores et al. 2007, Kruk et al. 2010). A expressão final da eficácia biológica de uma espécie reside em sua taxa de crescimento. A taxa máxima de replicação (rR), quando todos os recursos estão saturados, varia consideravelmente entre as espécies (~ 0,2 a 2,0d-1) e parte dessa variação é devida ao tamanho e forma das algas (Reynolds 2006, Finkel et al. 2010, Kruk et al. 2010). Além disso, rR diminui com o volume e aumenta com a razão superfície/ volume (sv-1) do indivíduo (unicelular, colonial ou filamentoso) (Figura 1). Essas relações empíricas mostram que: i) os indivíduos pequenos crescem mais rapidamente que os grandes; e ii) aqueles com maior razão sv-1 crescem mais rapidamente que organismos com uma sv-1 menor. Por exemplo, o aumento no diâmetro (d) de uma célula esférica significa aumentar as restrições ao crescimento, já que a área superficial aumenta em proporção a d2 e o volume a d3 resultando em aumento na distância intracelular que os metabólitos devem percorrer dentro da célula. A implicação disso é que células esféricas pequenas são metabolicamente mais ativas, absorvem e utilizam mais rapidamente os nutrientes e se reproduzem mais rapidamente do que as grandes. Então, se existe alguma vantagem em tornar-se maior, por exemplo, para diminuir as perdas por herbivoria, também haveria uma desvantagem dada à maior translocação intracelular dos recursos. Dessa forma, para compensar o aumento de tamanho de organismos fitoplanctônicos, o distanciamento da forma esférica foi evolutivamente selecionado (Princípio da Conservação da Razão Superfície/ Volume, Lewis 1976). Como a esfera é limitada pela superfície mínima possível, envolvendo um dado espaço tri-dimensional, qualquer distorção dessa forma aumentará a área superficial em relação ao volume envolvido e, conseqüentemente, à razão sv-1 (Reynolds 2006). O aumento na razão sv-1 confere maior tolerância às algas em condições limitantes de luz (Naselli-Flores & Barone 2007) e diminui suas taxas de sedimentação (Kruk et al. 2010).

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Figura 1. Relação do volume e da razão superfície/volume do indivíduo com a taxa de crescimento. Figura adaptada de Kruk et al. 2010. Figure 1. Relationship between individual volume and surface/volume ratio versus growth rate. Figure adapted from Kruk et al. 2010.

Embora a unidade de volume do fitoplâncton continental varie em mais de seis ordens de magnitude, a variação na sv-1 é mais restrita do que o esperado, variando apenas em duas ordens de magnitude (Reynolds 2006, Kruk et al. 2010). Segundo Lewis (1976) essa conservação da razão sv-1 é promovida por seleção natural e influencia na forma dos organismos fitoplanctônicos. A Figura 2a mostra a relação entre sv-1 e a máxima dimensão linear (MDL, maximum linear dimension) para uma variedade de formas geométricas simples comuns no fitoplâncton lacustre, onde estão sobrepostas as variações dos valores observados da razão sv-1 e MDL para as espécies fitoplanctônicas do Lago Lanao (Filipinas). Um valor mínimo de sv-1 para qualquer valor particular de MDL é dado pela linha relativa a uma esfera. Os valores sv-1 abaixo dessa linha são geometricamente impossíveis (Figura

2b). Uma ampla variedade de formas geométricas simples tem valores sv-1 abaixo da observada para as espécies fitoplanctônicas do Lago Lanao, mesmo quando a MDL está dentro da variação observada (Figura 2a). Da mesma forma, certo número de formas atenuadas simples tem valores sv-1 acima do valor máximo observado, quando MDL está dentro do limite observado para o lago Lanao. Assim, a Figura 2 mostra que se as formas correspondentes a valores particulares de MDL fossem tomadas ao acaso, a variação dos valores de sv-1 deveria ser muito maior do que a observada no lago estudado. Esses resultados levaram Lewis (1976) a concluir que a razão sv-1 é aparentemente conservada pela seleção, ao longo do processo evolutivo, de formas apropriadas de acordo com o volume da unidade ou pela seleção de um volume apropriado de acordo com a forma da unidade.

Figura 2. Relação da máxima dimensão linear (MDL) e razão superfície/volume para (a) formas geométricas simples e (b) as 25 espécies fitoplanctônicas mais abundantes do Lago Lanao, Filipinas. As formas geométricas mostradas são: 1, esfera; 2, pirâmide, 3, elipsóide prolato; 4, cone truncado; 5, cone; 6, cilindro; 7, elipsóide oblato; 8, cilindro alongado; 9, duplo cone truncado; e 10, fusiforme. A razão das dimensões para os sólidos é mostrada com relação à escala. Figura adaptada de Lewis 1976. Figure 2. Relation of the greatest axial linear dimension (MDL) and surface/volume ratio for (a) simple geometric solids and (b) the 25 most abundant phytoplankton species of Lake Lanao, Philippines. Figures shown are: 1 sphere; 2 pyramid; 3 prolate ellipsoid; 4 stout cone; 5, stout cone; 6 stout cylinder; 7 oblate ellipsoid; 8 slim cylinder; 9 slim double cone; and 10 slim double cone. The ratio of the linear dimensions for the solids is shown to scale. Figure adapted from Lewis 1976. Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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Outros traços morfológicos como aerótopos, flagelos, processos e espinhos, formação de colônias, número e disposição de células e formação de estruturas silicosas serão discutidos nos tópicos subseqüentes junto com as funções ecológicas que garantem a eficácia biológica das espécies. Luz Luz é um recurso essencial para o fitoplâncton, porém sua distribuição é heterogênea no tempo e no espaço. Em ecossistemas aquáticos a luz é fortemente atenuada pelas condições do meio (substâncias dissolvidas e partículas em suspensão, incluindo o próprio fitoplâncton), resultando em um gradiente vertical hiperbólico em intensidade e distribuição espectral (Kirk 1994). O fitoplâncton possui um conjunto de traços funcionais, que permite a captura e utilização eficiente de diferentes comprimentos de onda dentro da faixa que pode ser utilizada para a fotossíntese (400-700nm), usualmente referida como radiação fotossinteticamente ativa (PAR).

A dependência do crescimento do fitoplâncton da intensidade luminosa é descrita pela curva P-I, entre a luz (I, como PAR [µmol fótons m-2 s-1]) e alguma medida da atividade fotossintética (taxa específica, P [mg C mg-1 Chl h-1] ou taxa de crescimento, µ [ln unidades dia-1]) (Figura 3). Na parte inferior da curva P-I o crescimento aumenta linearmente, apresenta uma inclinação α e é dito como sendo limitado por luz. A partir daí, o crescimento torna-se independente da luz e é dito como sendo saturado por luz. A intensidade luminosa onde o crescimento é máximo (Pmax ou µmax) é chamada Imax. O parâmetro de saturação de luz Ik, (parâmetro de foto-adaptação) é a intensidade luminosa na qual a seção limitada por luz, sendo prolongada, intercepta a linha horizontal traçada em direção ao Pmax ou µmax. Intensidades luminosas maiores do que a Imax podem levar ao declínio da fotossíntese, sendo essa terceira seção considerada inibida por luz (Figura 3). Os parâmetros, α, Pmax ou µmax, Imax, da curva P-I e as concentrações celulares de clorofila podem ser considerados como traços para interceptação de luz (Litchman & Klausmeier 2008).

Figura 3. Taxa fotossintética (P) ou taxa de crescimento (µ) como função da intensidade de irradiação. Pmax é a taxa fotossintética em luz saturante; Ik é o parâmetro de foto-adaptacão; α é a inclinação da curva limitada por luz. Figura adaptada de Padisák 2003. Figure 3. Photosynthetic rate (P) or growth rate (µ) as a function of irradiance intensity. Pmax is the light saturated rate of photosynthesis; Ik is the photo-adaptational parameter; α is the slope from the light-limited curve. Figure adapted from Padisák 2003.

Vários mecanismos existem para garantir o potencial fotossintético das espécies mesmo em baixos níveis de irradiação. Um destes é aumentar o número de centros de captação de luz, dos quais a clorofila é um componente essencial. A maioria dos Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

organismos fitoplanctônicos é capaz de ajustar suas concentrações de clorofila dentro de uma variação de ±50% da média e de fazê-lo dentro de apenas uma ou duas gerações de células (Reynolds 2006). A implicação disto é que células com mais clorofila são

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capazes de fixar a mesma quantidade de carbono das que têm menos clorofila, a uma menor intensidade de luz. Ou seja, a concentração de clorofila é um traço chave que contribui para aumentar a inclinação α da curva P-I. A distorção da forma esférica é uma adaptação que permite as espécies fitoplanctônicas utilizarem baixas intensidades de luz. Quanto mais íngreme é a inclinação (α) da curva de crescimento dependente de luz, mais eficiente é a captação de energia luminosa.

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Valores de α são plotados na Figura 4 contra o produto da razão sv-1 com a máxima dimensão linear da alga (MDL). Essa figura mostra que as unidades fitoplanctônicas com maior flexibilidade para garantir suas eficiências de crescimento dependente de luz são aquelas com maior atenuação da forma, tornando-as melhor receptoras de luz (boas antenas de luz), pelo menos quando orientadas corretamente no campo de fluxo de fótons (Reynolds 1997, Naselli-Flores & Barone 2007).

Figura 4. Ângulo de inclinação α da curva P-I plotado contra o produto da máxima dimensão linear e a razão superfície/volume (msv-1) de algumas espécies do fitoplâncton continental: Ana, Anabaena flos-aquae; Aphan, Aphanizomenon flos-aquae; Coel, Coelastrum microporum; Dict, Dictyosphaerium pulchellum; Fra b, Fragilaria bidens; Lim red, Limnothrix redekei, Mic, Microcystis aeruginosa; Monor, Monoraphidium sp.; Ped b, Pediastrum boryanum; Pla ag, Planktothrix agardhii; Scen q, Scenedesmus quadricauda (Figura adaptada de Reynolds 2006). Figure 4. The slope α from P-I curves plotted against the corresponding values of the product of maximum linear dimension and the surface/volume ratio (m sv-1), of some freshwater phytoplankton species: Ana, Anabaena flos-aquae; Aphan, Aphanizomenon flos-aquae; Coel, Coelastrum microporum; Dict, Dictyosphaerium pulchellum; Fra b, Fragilaria bidens; Lim red, Limnothrix redekei, Mic, Microcystis aeruginosa; Monor, Monoraphidium sp.; Ped b, Pediastrum boryanum; Pla ag, Planktothrix agardhii; Scen q, Scenedesmus quadricauda. Figure adapted from Reynolds 2006.

As cadeias filamentosas de células de Oscillatoriales (Cyanobacteria) parecem ser extremamente eficientes nesse contexto, como os representantes dos gêneros Planktothrix e Limnothrix, que geralmente dominam em lagos túrbidos e mesclados (Reynolds 2006). Outro importante exemplo de espécie adaptada à sombra é a cianobactéria filamentosa potencialmente fixadora de nitrogênio Cylindrospermopsis raciborskii (Padisák & Reynolds 1998). De fato, Wu et al. (2009) observaram em seus experimentos que, em comparação com Microcystis aeruginosa e Aphanizomenon flos-aquae, C. raciborskii exibiu menor valor de Ik. Outras espécies necessitam e toleram altas intensidades de luz, como as cianobactérias heterocitadas fixadoras de nitrogênio molecular (ex. Anabaena, Aphanizomenon) e a colonial Microcystis,

que geralmente tem requerimentos relativamente altos de Ik (Padisák 2003). Flagelos e aerótopos são também traços morfológicos importantes (Kruk et al. 2010) por permitirem determinadas espécies selecionarem a profundidade ótima para sua própria fotossíntese. Por exemplo, seja em lagos rasos ou profundos, ou em culturas de laboratório, Ceratium hirundinella seleciona a camada de água recebendo entre 125 – 440µmol fótons m-2 s-1 (Harris et al. 1979, Heaney & Furnass 1980, Padisák 1985, citados em Padisák 2003). Outra adaptação fisiológica para persistir em limitação de luz é o aumento dos pigmentos fotossintéticos acessórios como as ficobilinas, carotenóides e xantofilas. Esses pigmentos aumentam Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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a amplitude da faixa do espectro luminoso que pode ser utilizado (adaptação cromática), absorvendo assim luz em comprimentos de onda complementares à absorbância por clorofila (Falkowski & Raven 2007). Tem sido observado também que mesmo espécies taxonomicamente relacionadas diferem não só em seus requerimentos de intensidade de luz, mas também na composição de seus pigmentos e, conseqüentemente, em suas habilidades para utilizar diferentes partes do espectro visível (Ting et al. 2002, Rocap et al. 2003, Stomp et al. 2004). Dessa forma, a composição dos pigmentos é um traço funcional importante, que separa nichos ecológicos de espécies e grupos funcionais diferentes, ao longo de um gradiente espectral freqüentemente associado com a profundidade e/ou cores diferente da água (Kirk 1994, Stomp et al. 2004, 2007). Dessa forma, diferenças no uso do espectro luminoso podem oferecer oportunidades para a coexistência de espécies (Stomp et al. 2004, 2007). Nutrientes Macro e micronutrientes, tais como nitrogênio, fósforo, sílica, ferro, molibdênio, cobre, zinco, etc. são recursos essenciais ao fitoplâncton. Vários traços funcionais caracterizam a absorção e utilização de nutrientes e seus valores diretamente afetam o desempenho das espécies. A dependência da taxa de crescimento sob um determinado nutriente é freqüentemente descrita como uma função da concentração interna de nutrientes, enquanto a absorção é descrita como uma função das concentrações externas (Droop 1973, Dugdale 1967):

Onde: µ∞ (d-1) é a taxa de crescimento em uma quota infinita, Q é a concentração interna de nutrientes (quota de nutriente) (µmol nutriente célula-1), Qmin é a quota mínima (quando a taxa de crescimento iguala-se a zero), vmax é a taxa máxima de absorção de nutrientes (µmol nutriente célula-1 dia-1), K é a constante de semisaturação para absorção de nutrientes (µmol nutriente Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

L-1), e R é a concentração externa de nutrientes (µmol nutriente L-1) (Figura 5).

Figura 5. Funções que descrevem absorção e uso de nutrientes: (a) cinética de absorção de Michaelis-Menten e (b) cinética da função de crescimento de Droop. vmax, taxa máxima de absorção de nutrientes; K, constante de semi – saturação para absorção de nutrientes; µ∞, taxa de crescimento da espécie em uma quota infinita; Qmin, quota mínima. Figura adaptada de Litchman & Klausmeier 2008. Figure 5. Functions that describe nutrient uptake and use: (a) MichaelisMenten uptake and (b) Droop’s growth function. vmax, maximum nutrient uptake rate; K, half-saturation constant for nutrient uptake; µ∞ ,growth rate of species at an infinite quota; Qmin, minimum quota. Figure adapted from Litchman & Klausmeier 2008.

Tais traços (µ∞, Qmin, vmax e K) variam entre espécies (Reynolds 1988, 1997, 2006, Padisák 2003), sugerindo que, sob um dado estado estável, uma espécie deve sempre crescer mais rapidamente que as outras (Tilman & Kilham 1976, Tilman et al. 1982). Geralmente a quota mínima celular de fósforo varia entre 0,2% e 0,4% do peso seco das espécies, mas em algumas algas (ex. Asterionella) esse valor pode diminuir em uma ordem de magnitude (Reynolds 2006). Outras espécies (ex. C. raciborskii, M. aeruginosa) têm a capacidade de formar depósitos internos de fósforo (aumentar o Q) em forma de grânulos de polifosfatos (Reynolds 1988, Isvánovics et al. 2000, Padisák 2003, Wu et al. 2009). O resultado dessa absorção de luxo ou consumo de luxúria (luxury uptake) é que as células podem armazenar entre 8 e 16 vezes a quota mínima e, por conseguinte, são teoricamente capazes de manter três a quatro gerações (duplicação celular) sem absorver nenhum fósforo.

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Em uma escala de tempo evolutiva, a seleção natural deve ter contribuído para uma distorção do valor das constantes de semi-saturação (K) para a esquerda na Figura 5a (Padisák 2003). Ou seja, quanto mais rápida é a capacidade de absorção em níveis baixos (sub-saturantes) de recursos, maior é a afinidade da espécie pelo nutriente e maior sua habilidade para competir por recursos escassos. Com base nesses traços fisiológicos, os experimentos conduzidos por Sommer (1984) distinguiram três grandes estratégias entre o fitoplâncton para lidar com o fornecimento variável de nutrientes: i) espécies adaptadas à velocidade (velocity-adapted), com altas taxas máximas de absorção de nutrientes (vmax) e de crescimento (µ∞), que contribuem para a rápida absorção de pulsos de nutrientes e para o crescimento rápido; ii) espécies adaptadas à estocagem (storage-adapted), com alta vmax, mas µ∞ inferior, que permite o acúmulo de reservas de nutrientes no interior da célula; e iii) espécies adaptadas à afinidade (affinity-adapted), com baixos valores da constante de semi-saturação para absorção de nutrientes (K), que são vantajosos sob limitação de nutrientes. O primeiro grupo foi proposto como sendo superior aos outros em ambientes ricos em nutrientes, o último em condições de depleção nutricional, e as espécies adaptadas à estocagem foram mais ajustadas a ambientes que apresentam flutuações nas condições nutricionais. A produção extracelular de enzimas fosfatases, as quais podem hidrolisar compostos orgânicos dissolvidos, é outro traço fisiológico importante que pode permitir algumas espécies do fitoplâncton superarem as condições extremas de limitação por fósforo (Reynolds 2006). Em estudo recente, Wu et al. (2009) observaram que a cianobactéria C. raciborskii é capaz de produzir fosfatases alcalinas extracelulares e que, juntamente com outros traços fisiológicos como maior atividade fotossintética e velocidade de absorção de fósforo, podem ser responsáveis por florações ou invasão de C. raciborskii a partir de corpos aquáticos tropicais para as regiões temperadas. Outro traço funcional chave relacionado aos requerimentos por nutrientes é a fixação de nitrogênio, que possibilita a exploração do gás nitrogênio atmosférico. Essa habilidade está restrita a algumas bactérias heterotróficas ou fotossintéticas

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e às cianobactérias (Reynolds 2006). Dentre essas últimas, sobretudo espécies da ordem Nostocales possuem essa capacidade. O potencial para a fixação de nitrogênio oferece uma vantagem competitiva sob condições de limitação de nitrogênio, embora o processo seja de alto custo energético. Outro traço funcional que suplementa os requerimentos nutricionais e aquisição de carbono em algumas espécies do fitoplâncton é a ingestão fagotrófica de bactérias e mesmo de outras algas (Zubkov & Tarran 2008). Mixotrofia (presença de comportamento heterotrófico e autotrófico de nutrição) é uma adaptação particularmente vantajosa em corpos aquáticos muito oligotróficos ou ricos em matéria orgânica e fortemente limitados por luz. Mixotrofia ocorre em Cryptophyceae (Cryptomonas), Dinophyceae (Amphidinium, Ceratium, Gymnodinium, Peridinium), Chrysophyceae (Chromulina, Chrysococcus, Chrysosphaerella, Chrysamoeba, Dinobryon, Mallomonas, Paraphysomonas, Poterioochromonas, Ochromonas, Uroglena), Prymnesiophyceae (Chrysochromulina) e Chlorophyceae (Chlamydomonas, Chlorogonium) (Padisák 2003). Processos de perda A taxa de crescimento instantânea de uma população fitoplanctônica (µ), ou seja, o acúmulo de biomassa da população, é dada pela diferença entre a taxa de replicação celular (rR) e a taxa de perdas (rL): µ = r R - rL A taxa de perdas (rL), por sua vez, inclui vários componentes, sendo cada um deles de maior ou menor importância e que afetam negativamente a dinâmica de populações do fitoplâncton: rL = rW + rS + rG + p Onde: rW, rS, rG, p são as respectivas taxas instantâneas de perda de biomassa devido ao escoamento hidráulico (washout), à sedimentação, à herbivoria (grazing) e ao parasitismo. Esses termos, sejam individualmente ou em conjunto, podem fazer com que rL > rR, de Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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tal forma que µ torna-se negativo indicando que a população vai diminuir até a extinção. Escoamento hidráulico A taxa de perda do fitoplâncton devido ao escoamento hidráulico pode ser calculada pela divisão do volume de água livre de algas que entra no corpo aquático (qS) pelo volume de água do referido corpo aquático (V): rW = qS/V Em lagos rasos e pequenos a proporção de qS para V é muito mais relevante do que em lagos maiores e mais profundos (Reynolds 1997). Assumindo que o escoamento é o principal fator de perda no primeiro tipo de lago, isso pode ser diretamente interpretado como uma indicação da taxa máxima de crescimento das algas (µ) nestes lagos. Em geral, a perda por escoamento afeta mais as espécies que apresentam crescimento lento, oferecendo uma vantagem competitiva para espécies de crescimento rápido. Isso pode explicar porque o escoamento pode causar uma mudança de dominância de cianobactérias grandes e de crescimento lento, para outros tipos de algas em lagos com elevado escoamento hidráulico (Scheffer 1998). Sedimentação A velocidade de sedimentação de espécies de algas através de um meio fluído pode ser descrita pela equação modificada de Stokes:

Onde: vs (m s-1) é a velocidade de sedimentação, g (m s-2) é a aceleração gravitacional, r (m) é o raio de uma esfera de volume idêntico ao da alga, p’ é a densidade específica da alga que está sedimentando (kg m-3), p é a densidade do meio fluido (kg m-3), ƞ é a viscosidade do meio (kg m-1 s-1) e Φ é o fator da resistência pela forma à sedimentação. Este é um número adimensional que expressa o fator pelo qual a velocidade de sedimentação de uma partícula qualquer difere da de uma esfera de volume e densidade idênticos (Padisák et al. 2003a). Para um mesmo volume e densidade, o afastamento da forma da esfera, ou seja, o aumento Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

da razão sv-1, inevitavelmente resulta em uma área superficial maior, aumentando assim o atrito com o meio circundante e, conseqüentemente, diminuindo a velocidade de sedimentação (Kruk et al. 2010). Dentre as seis variáveis na equação modificada de Stokes, três (g, p e ƞ) são constantes ou variáveis independentes. As outras três (tamanho, densidade e resistência pela forma) são propriedades do organismo e, como tal, estão sujeitas à adaptação e modificação evolutiva através de seleção natural. Então, se uma espécie planctônica evolui para diminuir sua perda por sedimentação, três situações podem ocorrer: i) diminuição de seu tamanho corporal (mas fazendo isso ela aumenta consideravelmente as chances de ser predada pelo zooplâncton); ii) diminuição da densidade específica (através de produção de aerótopos, acúmulo de gotas de óleo, regulação iônica, envolvimento por mucilagem); e iii) aumento da resistência pela forma através da seleção para organismos com protuberâncias, processos e espinhos, formação de colônias, alongamento cilíndrico, modificação do número e arranjo das células. Padisák et al. (2003a), em interessante trabalho experimental utilizando modelos artificiais de PVC dos principais tipos morfológicos do fitoplâncton, mostraram como a diversidade morfológica pode interferir na resistência ao afundamento pela forma das espécies. Obviamente, a presença de flagelos também é um traço morfológico importante para evitar perdas por sedimentação (Reynolds 1997). Kruk et al. (2010) observaram que a velocidade de sedimentação aumenta significantemente com a MDL e diminuiu com a razão sv-1. Aqueles autores ainda mostraram que a presença de estruturas silicosas contribui para a sedimentação das algas explicando 84% da variância na velocidade de sedimentação. Além disso, tem sido demonstrado que o estado nutricional e fisiológico das células influencia suas taxas de sedimentação: células vivas podem reduzir suas velocidades de sedimentação (fator vital) consideravelmente (cerca de duas a quatro vezes), quando comparado com células mortas, embora esse fenômeno ainda não seja bem compreendido (Reynolds 1997, 2006). Herbivoria e parasitismo O consumo por heterótrofos é sem dúvida uma das principais causas de perda das populações

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fitoplanctônicas. A filtração por herbívoros representa a visão tradicional e mais bem estudada sobre as interações tróficas no plâncton. Os critérios que governam o quanto e o que será ingerido são determinados pelo tamanho das populações envolvidas, pela palatabilidade das algas em relação à capacidade de filtração e ao limite de tamanho da presa que pode ser ingerida pelo herbívoro (Reynolds 1997, 2006, Padisák 2003). Por ser também um processo de perda, a taxa de herbivoria (rG) é análoga à taxa de escoamento ou diluição (Reynolds 2006) e pode ser expressa como:

Onde: ω é o coeficiente de seletividade para uma dada espécie de alga, F é o volume filtrado pelo zooplâncton por dia, e V é o volume de água do corpo aquático. No caso ótimo (ω = 1), todos os indivíduos de uma dada espécie são removidos do volume filtrado e, por fim, ingeridos. Dessa forma, se as espécies fitoplanctônicas evoluíram para reduzir suas perdas por herbivoria, isso se dá com a redução dos valores de ω. Muitos são os traços morfológicos e fisiológicos (toxinas) que contribuem para diminuir a palatabilidade ou digestão das espécies fitoplanctônicas pelo zooplâncton. A maioria dos herbívoros consome apenas certa variação de tamanho dentro de todo o espectro de partículas alimentares disponíveis. Para herbívoros filtradores, o limite inferior é delimitado pela abertura dos aparatos de filtração, enquanto o limite superior é delimitado pela capacidade do herbívoro em manipular e ingerir o item alimentar. Esses limites de tamanho geralmente dependem do tamanho do corpo do herbívoro, de modo que o microzooplâncton (< 200μm) geralmente alimenta-se de espécies pequenas enquanto o mesozooplâncton (> 200μm) pode consumir espécies fitoplanctônicas maiores (Huisman & Hulot 2005). A pressão de herbivoria sobre grandes cianobactérias coloniais (ex. Microcystis) é freqüentemente baixa, por estarem acima do limite superior das partículas que podem ser manipuladas pelo zooplâncton. Cianobactérias filamentosas (ex. Planktothrix, Cylindrospermopsis) também são resistentes à herbivoria pelo zooplâncton, uma vez que filamentos longos podem bloquear o aparato de filtração (DeMott et al. 2001). No entanto, estudos

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recentes indicam que o comprimento do filamento não deve ser considerado a priori o fator decisivo para reduzir a pressão de herbivoria ou a taxa de crescimento dos herbívoros, e que outros fatores como a toxicidade ou o baixo valor nutricional devem ser também considerados (Wilson et al. 2006, Panosso & Lurling 2010). Substâncias orgânicas dissolvidas liberadas por Daphnia magna (Cladocera) e Brachionus calyciflorus (Rotifera) podem induzir o aumento no número de células dos cenóbios de espécies de Scenedesmaceae e possivelmente o alongamento dos espinhos, como defesa contra a herbivoria (Verschoor et al. 2004). Outros estudos experimentais demonstram que a pressão de herbivoria exercida pelo protozoário flagelado Ochromonas sp. também induz a formação de colônias na cianobactéria M. aeruginosa (Yang et al. 2006, Zhen & Kong 2012), enquanto as populações dessa cianobactéria permaneceram dominadas por formas com uma ou duas células e não formaram colônias nos tratamentos controle, com cladóceros, copépodos ou rotíferos (Yang et al. 2006). O fitoplâncton também é susceptível a vários parasitas e patógenos como fungos, protozoários, bactérias e vírus (Reynolds 2006). As carapaças de sílica podem constituir um traço funcional importante contra certos tipos de herbívoros (Hamm et al. 2003) e infecções virais (Smetacek 2001), muito embora essas pesadas carapaças contribuam para aumentar a velocidade de sedimentação das espécies (Kruk et al. 2010). Bainhas mucilaginosas reduzem a palatabilidade das algas por torná-las muito grandes para o microzooplâncton ingerir, de difícil manipulação pelo mesozooplâncton e mecanicamente obstrutivas para cladóceros filtradores. Porém, se mesmo assim os organismos fitoplanctônicos mucilaginosos forem ingeridos, eles podem ainda resistir à digestão durante a passagem através do intestino de alguns consumidores (Reynolds 2007). Cianobactérias podem se defender contra predação utilizando defesas químicas. Experimentos em laboratório mostram que cianotoxinas podem inibir e em algumas vezes até mesmo matar cladóceros, copépodos e rotíferos (Ferrão Filho et al. 2008, Geng & Xie 2008, Ger et al. 2010). Algumas vezes as defesas químicas de cianobactérias são Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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induzidas pelos herbívoros. Jang et al. (2003, 2007) demonstraram que várias cepas de M. aeruginosa aumentaram a produção de toxinas em resposta a exposição direta e indireta ao zooplâncton. Reprodução Os organismos fitoplanctônicos podem reproduzir-se sexuada ou assexuadamente (Sandgren 1988). Alguns grupos taxonômicos (ex. diatomáceas, dinoflagelados e algas verdes) são capazes de realizar os dois modos reprodutivos, dependendo das condições ambientais (Kremp & Heiskanen 1999, Hiltz et al. 2000), enquanto outros (ex. cianobactérias, euglenofíceas e a maioria das criptofíceas) podem reproduzir-se apenas assexuadamente. A reprodução sexuada no fitoplâncton, assim como em outros organismos, aumenta a variabilidade genética e, conseqüentemente, as chances de adaptação das espécies a um ambiente em transformação (Barton & Charlesworth 1998, Holliday 2006, Otto & Gerstein 2006). Em diatomáceas, a reprodução sexuada é também um meio de conservar o tamanho celular e a poliploidia (a não-disjunção dos homólogos durante a meiose) um mecanismo chave para a diversificação e especiação em diatomáceas (Chepurnov et al. 2002, Koester et al. 2010). A habilidade para produzir estágios de resistência é amplamente difundida no fitoplâncton (Sandgren 1988). Esse traço funcional pode conferir uma vantagem competitiva em ambientes com longos períodos de condições desfavoráveis (resultando em crescimento lento e/ou alta mortalidade) (Nehring 1996, Lewis et al. 1999). Fatores ambientais, como a temperatura, podem ser importantes para um rápido desenvolvimento de células vegetativas a partir de estágios de dormência, alterando assim a composição da comunidade (McQuoid & Godhe 2004). Muitas florações de algas nocivas (ex. dinoflagelados e cianobactérias) têm início com uma abrupta germinação de esporos de resistência (Brunberg & Blomqvist 2003, Anderson & Rengefors 2006). Restrições ambientais ao crescimento fitoplanctônico O potencial para a produção máxima de biomassa do fitoplâncton, geralmente só é encontrado sob Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

condições ideais de laboratório em níveis saturantes de recursos, quando a taxa de crescimento instantânea (µ) é supostamente igual à taxa de replicação das células (rR). Em condições naturais esse potencial raramente é atingido devido, principalmente, à limitação por dois fatores ambientais: insuficiência de nutrientes essenciais (ex. nitrogênio e fósforo) e mistura da coluna d’água promovida pelo vento, que transporta as algas planctônicas através de um gradiente vertical de luz para além da zona eufótica (Margalef 1978, Reynolds 1988). A limitação de nutrientes ao crescimento e replicação celular corresponde a um estresse (stress). O transporte involuntário freqüente de indivíduos para além da zona eufótica, principalmente se resultar em destruição da biomassa, representa uma forma de distúrbio (disturbance). A freqüência e intensidade de estresse e de distúrbio variam amplamente entre os diferentes tipos de ecossistemas aquáticos continentais. Além disso, podem variar marcadamente dentro de um mesmo lago ao longo de um ciclo sazonal. Dado ao tamanho microscópico das algas planctônicas, ao seu curto tempo de geração (poucos dias) e à facilidade de dispersão dos organismos, não é difícil imaginar que o desenvolvimento de condições de estresse nutricional e variabilidade na mistura vertical da coluna d’água sejam as maiores forças seletivas do fitoplâncton em ambientes naturais (Margalef 1978, Reynolds 1988, 1997, 2006, Hillebrand & Azovsky 2001, Finlay 2002). Dependendo das diferenças interespecíficas em relação às tolerâncias ecológicas das espécies, qualquer variabilidade ambiental pode afetar as dinâmicas de crescimento e perda de cada população e, por fim, da comunidade fitoplanctônica como um todo. Além disso, o padrão repetitivo de diferentes espécies fitoplanctônicas ao responderem similarmente a certos gradientes ambientais sugere que é possível formular uma teoria geral baseada em seus traços funcionais. Estratégias adaptativas Os organismos vivos podem ser entendidos como sistemas simples de entrada e saída, sendo a fotossíntese a entrada de energia e matéria e os descendentes, a saída. Como qualquer organismo tem uma quantidade limitada de recursos disponíveis

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para investir em crescimento, manutenção e reprodução, a maneira pela qual esses recursos são alocados entre as várias demandas conflitantes é de fundamental interesse, pois torna possível conhecer como os organismos se adaptam ao ambiente (Pianka 2000). Estratégia de vida de um organismo pode ser entendida como sendo o padrão de alocação de recursos. A teoria de história de vida, portanto, tenta explicar como a evolução molda os organismos para que os mesmos alcancem o sucesso reprodutivo (Stearns 2000). Algumas questões básicas que podem ser respondidas através dessa teoria são: por que os organismos são pequenos ou grandes? Por que eles têm poucos ou muitos descendentes? Por que eles têm vida curta ou longa? Existem padrões ligando tipos de estratégia de vida a tipos de habitat? A essência do presente tópico é enfatizar que, como na vegetação terrestre, as espécies que compõem a vegetação pelágica em sistemas aquáticos não apresentam as mesmas tolerâncias e sensibilidades, ou seja, elas não são ecologicamente iguais. Algumas são funcionalmente mais adaptadas a operarem sob condições mais severas de limitação de luz ou de escassez de nutrientes ou de partição espacial de recursos do que outras. Essas diferenças não são ao acaso, pelo contrário, apresentam forte ligação com os traços morfológicos e fisiológicos das espécies envolvidas, os quais se desenvolveram ao longo do processo evolutivo (Reynolds 1988). O modelo de duas estratégias - seleção reK A primeira abordagem funcional, capaz de fazer ligações entre as diferentes estratégias de vida do fitoplâncton, morfologia e ambiente, foi proposta por Margalef (1978), que utilizou o conceito de estratégias adaptativas de seleção r ou K inicialmente proposto por MacArthur & Wilson (1967) e Pianka (1970). O conceito original é baseado na equação logística de crescimento, na qual r é a taxa intrínseca de crescimento e K é a assíntota da curva de crescimento ou a capacidade de suporte do ambiente. Margalef (1978) observou que as adaptações do fitoplâncton são amplamente direcionadas para um dos extremos

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do gradiente de seleção: um que rapidamente forma populações que investem em crescimento (espécies r-selecionadas) e outro mais especializado em encontrar e/ou reter recursos limitantes em um ambiente estratificado (espécies K-selecionadas). Espécies r-selecionadas de crescimento rápido têm de manter uma alta razão sv-1 e isso é mais facilmente alcançado quando seu tamanho é pequeno. Espécies K–selecionadas apresentam um alto investimento no tamanho e na forma, com comportamento adaptativo complexo como a capacidade de ajustar sua posição na coluna d’água, mas que tendem a resultar em baixa razão sv-1 e baixa taxa de crescimento. Os dois tipos de seleção são direcionados pelo genoma e são produtos da evolução dos organismos, sendo então reconhecidos como estratégias adaptativas da vegetação pelágica. A seqüência da estrutura da comunidade em relação às concentrações de nutrientes e à mistura da coluna d’água (turbulência) foi mostrada por Margalef (1978), com base em dados sazonais do fitoplâncton marinho (Figura 6a). A diagonal do gráfico representa a seqüência de dominância do fitoplâncton (seqüência principal), na qual as espécies de seleção r (ex. Thalassiosira, diatomácea) são favorecidas em condições de altas concentrações de nutrientes e de alta instabilidade (baixo estresse e alto distúrbio), enquanto as espécies de seleção K (Ornithocercus, dinoflagelado) são mais bem adaptadas às condições de estratificação térmica e limitação por recursos (alto estresse e baixo distúrbio), devido à ocorrência de flagelos que permitem seu deslocamento ativo através da coluna d’água, possibilitando ajustes às condições de luz e nutrientes ideais para seu crescimento. Muito embora esse tenha sido um trabalho inovador e de grande relevância para a ecologia do fitoplâncton ele apresenta limitações. A principal delas foi ter assumido que as variáveis, disponibilidade de nutrientes e regime de mistura, são correlacionadas, quando na verdade elas são independentes (Reynolds 1988, 1997, 2006). As condições de alta turbulência e baixas concentrações de nutrientes no canto direito inferior da Figura 6a configuram-se como um habitat inadequado para o fitoplâncton.

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Figura 6. (a) Representação dos ambientes aquáticos e os principais fatores ambientais que governam a distribuição de organismos r ou K-selecionados, segundo Margalef (1978). (b) Representação, sobre eixos similares, de mudanças periódicas no fitoplâncton conforme hipótese de Reynolds et al. (1983); espécies w são seletivamente favorecidas em colunas d’água bem misturadas. (c) Re-orientação da área triangular em (b) para fazer analogia entre as estratégias r, K e w do fitoplâncton com as estratégias primárias de histórias de vida (C, S e R) de Grime (1979), segundo Reynolds (1988). (d) Modelo conceitual de habitat sobre disponibilidade de energia (eixo x relacionado ao regime de mistura) e nutrientes (eixo y), proposto por Reynolds (1997). As letras na Figura 6d denotam os grupos funcionais de espécies dados na Tabela 2. Figura adaptada de Reynolds (1997). Figure 6. (a) Representation from aquatic systems and the main environmental factors that dictate the distribution of r or K-selected organisms, according to Margalef (1978). (b) Representation, on similar axes, from periodic changes in phytoplankton according to Reynolds et al. (1983); w species are selectively favored in water column well mixed. (c) Re-orientation from triangular area (b) to do analogy among strategies r, K and w from phytoplankton with strategies of life history (C, S and R) from Grime (1979), according to Reynolds (1988). (d) Habitat template based on light availability and nutrients, proposed by Reynolds (1997). The labels in Figure 6d represent functional groups from Table 2. Figure adapted from Reynolds (1997).

Reynolds (1980), ao aplicar o modelo conceitual de estratégias adaptativas de Margalef (1978) para o fitoplâncton de água doce, observou que a condição de altas concentrações de nutrientes e estabilidade da coluna d’água eram bem mais comuns em lagos, sendo a comunidade fitoplanctônica então dominada por organismos oportunistas e de rápido crescimento, atributos da seleção r. Sugeriu ainda que a verdadeira sucessão autogênica ràK, que ocorre sob condições físicas relativamente constantes, deveria seguir uma orientação vertical, de cima para baixo na matriz de Margalef (1978). Por outro lado, a seqüência alogênica, que resulta de uma forte e permanente variação na estrutura física (mistura/estratificação), seguiria uma orientação horizontal, segregando espécies que apresentam diferentes habilidades em relação à mistura física da coluna d’água. Era Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

necessária então uma nova categoria (estratégia), que Reynolds (1983) rotulou como w (Figura 6b). O modelo de três estratégias - seleção C-S-R Em seu artigo seminal, Reynolds (1988) formulou que as três categorias de espécies (r, K e w), selecionadas a partir das três permutações viáveis de estresse e distúrbio (Figura 6b), aproximavamse, respectivamente, das estratégias adaptativas C, S e R de plantas terrestres ao habitat a que estavam adaptadas a viver, propostas por Grime (1979) (Figura 6c). Estratégias podem ser consideradas como o agrupamento de traços funcionais que evoluíram entre as espécies, as quais são mais bem ajustadas a certas condições ambientais do que outras (Grime

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1979). Dessa forma, organismos diferentes que evoluíram para estratégias similares supostamente têm ecologias similares (Grime 1979, Reynolds 1988, 1997). De fato, Reynolds (1988) mostra que mecanismos morfológicos e fisiológicos estratégicos das espécies fitoplanctônicas têm evoluído para permitir que elas sobrevivam preferencialmente sob uma das três permutações possíveis de estresse nutricional e de distúrbio (Figura 6c). As espécies do fitoplâncton devem, portanto, ser adaptadas: i) a explorar ambientes saturados em luz e nutrientes, através de investimento em crescimento rápido e reprodução, e para fazê-lo antes de outras espécies (boas competidoras, sensu Grime); ou ii) a operar sob condições de severa depleção do suprimento externo de nutrientes essenciais (estresse-tolerantes); ou ainda iii) a tolerar transporte freqüente ou contínuo

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através de um gradiente de luz (distúrbio-tolerantes ou ruderais, sensu Grime). É, no entanto, relevante definir a terminologia utilizada por Grime (1979). O termo competidor é geralmente aplicado a espécies que, devido à sua habilidade superior de operar próximo à capacidade suporte do ambiente, tendem a eliminar espécies com habilidade inferior (Princípio da Exclusão Competitiva, Hardin 1960). Esse conceito corresponde mais proximamente ao conceito de espécies estresse-tolerantes de Grime. O termo competidor utilizado por Grime é, portanto, equivalente a uma espécie oportunista, colonizadora ou invasora. O termo distúrbio-tolerante, por fim, é mais facilmente compreendido. Para evitar confusão, Reynolds (1997) sugeriu as definições indicadas na Tabela 1.

Tabela 1. Resumo das características das estratégias adaptativas do fitoplâncton continental (baseado em Reynolds 2006). Table 1. Summary of life-history strategies from freshwater phytoplankton (based on Reynolds 2006).

C-estrategistas

S–estrategistas

R–estrategistas

Estrategistas estresse-tolerantes

Estrategistas distúrbio-tolerantes

Indivíduos pequenos

Indivíduos grandes

Indivíduos grandes

Altas razões sv-1

Baixas razões sv-1

Altas razões sv-1

Alto requerimento de luz

Baixo requerimento de luz

Crescimento lento

Crescimento rápido

Adaptados à deficiência de nutrientes

Adaptados a ambientes ricos em nutrientes e túrbidos

Equivalem à seleção–K

Equivalem à seleção r e K

Ex: Peridinium e Microcystis

Ex: Planktothrix e Asterionella

Estrategistas invasores

Alto requerimento de luz Crescimento rápido Adaptados à plenitude de recursos (luz e nutrientes) Equivalem à seleção–r Ex: Chlorella e Rhodomonas

Espécies C-estrategistas são principalmente invasoras (invasive strategists). O termo aplica-se às primeiras espécies a colonizarem novos corpos de água ou logo após a formação de novas condições hidrográficas, tais como início de estratificações térmicas (diretas ou inversas). Elas são caracterizadas pela relativa facilidade de dispersão, auxiliadas pelo tamanho pequeno (v < 103µm3), pela rápida absorção e assimilação de nutrientes e pelas altas taxas de replicação (r20 > 10 x 10-6s-1), facilitadas pela alta razão sv-1 (> 0,5µm-1). Embora a área projetada por unidade de massa seja relativamente alta [> 6,5m2 (mol C cél)-1], as propriedades de absorção de luz são

restringidas pelo pequeno tamanho dos indivíduos, requerendo uma alta incidência de luz. Representantes típicos são gêneros do pico e do nanoplâncton tais como Chlorella, Ankyra, Koliella, Chlamydomonas, Synechococcus, Rhodomonas, Chrysochromulina e Monochrysis. Espécies S são fundamentalmente estrategistas consumidoras ou estresse-tolerantes (acquisitive strategists). São tipicamente grandes (v > 103µm3), unicelulares ou em colônias grandes de pequenas e numerosas células, dotadas de motilidade ou habilidade para controlar a flutuação na coluna d’água sob condições apropriadas. Espécies relativamente Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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difíceis de serem dispersas, mas persistentes nos locais que elas colonizam. Apresentam crescimento lento (r20 < 8 x 10-6s-1) em conseqüência de suas baixas razões sv-1 (< 0,3µm-1). A área projetada por unidade de massa é pequena [< 2,5m2 (mol C cél)-1], configurando-se como espécies com alto requerimento de luz. Representantes típicos são as espécies maiores de Peridinium e Ceratium, algumas cianobactérias formadoras de florações, tais como Microcystis e Gomphosphaeria, e colônias móveis como Uroglena. Espécies R são principalmente estrategistas distúrbio-tolerantes (acclimiting), sendo tolerantes ou dependentes da mistura da coluna d’água. Os indivíduos são grandes (v > 103µm3), mas suas formas, que se afastam da esfera (atenuadas, achatadas ou recortadas), lhes conferem altas razões sv-1 (> 0,5µm-1), permitindo-lhes altas taxas metabólicas (r20 ≥ 10 x 10-6s-1) e uma grande área projetada por unidade de massa [8 a 30m2 (mol C cél)-1], tornando-as excelentes antenas receptoras de luz. Representantes típicos incluem espécies que são predominantemente r-selecionadas, como as colônias de Asterionella e os filamentos de Aulacoseira, ou espécies K-selecionadas, como os filamentos solitários de Planktothrix, Limnothrix e Lyngbya. Grupos funcionais do fitoplâncton de ambientes continentais Ecologia é a ciência que estuda padrões e processos de distribuição e abundância das espécies. Em outras palavras, tenta explicar onde, por que ou como um determinado tipo de organismo ocorre. Nos tópicos anteriores foi visto que os organismos fitoplanctônicos possuem diferentes estratégias adaptativas que, por sua vez, influenciam sua morfologia e fisiologia. Dessa forma, algumas espécies são mais prováveis do que outras de serem selecionadas, em virtude de suas maiores taxas de crescimento sob diferentes condições ambientais. O presente tópico enfatiza os agrupamentos de organismos que devem co–ocorrer sob determinadas condições ambientais, dadas suas similaridades funcionais. Antes de apresentar as bases teóricas da aplicação dessa abordagem, é importante uma breve discussão sobre a terminologia a ser adotada. Existe atualmente um uso indiscriminado de termos que criam certo grau de confusão sobre os conceitos a eles relacionados. Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

Os mais comuns são assembléias (assemblages ou assemblies), associações (associations), tipos funcionais de plantas (plant functional types) e grupos funcionais (functional groups) (Reynolds 1980, 1997, Padisák & Reynolds 1998, Kruk et al. 2002, 2010 Reynolds et al. 2002, Padisák et al. 2003b, 2009, Weithoff 2003, Mieleitner et al. 2008). Na presente revisão é adotada e encorajamos outros autores a usarem a expressão “grupos funcionais” por ser a terminologia mais recentemente usada na literatura internacional e também por não deixar implícita a idéia de uma necessária interação entre os integrantes de cada agrupamento, como seria o caso dos termos assembléia ou associação. O esquema de Reynolds et al. 2002 Não é recente a tentativa de agrupar o fitoplâncton em categorias para compreender sua estruturação e funcionalidade em diferentes condições ambientais. Hutchinson (1967) já tentou relacionar as grandes classes taxonômicas do fitoplâncton com o estado trófico e outras variáveis físicas e químicas de lagos. No entanto, a maioria das classes taxonômicas é constituída por espécies com ampla diversidade de forma e tamanho, os quais estão relacionados à utilização de recursos e à susceptibilidade a processos de perda (Reynolds 2006, Naselli-Flores et al. 2007, Kruk et al. 2010). Dessa forma, a predição da composição da comunidade em nível de grandes grupos taxonômicos pode não ser tão bem sucedida quanto à abordagem baseada em grupos funcionais (Kruk et al. 2002, 2011). O elegante trabalho de Reynolds (1980), adotando uma abordagem utilizada em ecologia de vegetais superiores terrestres, em uma época em que os pacotes estatísticos ainda não eram facilmente disponíveis, representa a primeira abordagem de grupos funcionais para o fitoplâncton. Reynolds (1980) apresenta um modelo geral para predizer a variação do fitoplâncton através da interação principalmente de duas variáveis: i) disponibilidade de nutrientes e ii) estabilidade da coluna d’água. Baseado em dados de 12 ciclos anuais do fitoplâncton de quatro lagos e de dois mesocosmos no norte da Inglaterra, Reynolds (1980) agregou em 14 grupos funcionais as espécies que freqüentemente coexistiam e que aumentavam ou diminuíam simultaneamente. Esses

o papel dos traços funcionais Na Ecologia do fitoplâncton continental

grupos foram rotulados com códigos alfa-numéricos, cuja mudança temporal deveria seguir umas das três direções: i) sucessão autogênica (determinada principalmente pela disponibilidade de nutrientes em um ambiente físico relativamente estável); ii) reversão (formada pela breve perturbação física da estrutura do ambiente, seguida pelo retorno das condições similares a aquelas obtidas no “estado estável” prévio); e iii) mudança (shift, resultante de uma perturbação física mais prolongada ou mais intensa, levando ao estabelecimento de um “novo” estado estável). Naquele trabalho o autor apresentou ainda os fatores possivelmente críticos para o crescimento de cada um dos 14 grupos, juntamente com as características biológicas relevantes a sua sobrevivência. Desde então muitos esforços têm sido feitos no sentido de ampliar o modelo inicial, principalmente no que se refere à adição de novos grupos funcionais a partir de dados de diferentes corpos aquáticos ao redor do mundo. Aproximadamente 20 anos após aquela primeira tentativa, as bases para a abordagem foram sintetizadas no livro de Reynolds

815

(1997), mas apenas após publicação do artigo clássico de Reynolds et al. (2002) tal abordagem passou a ser mais difundida. Nesse último trabalho é apresentada uma lista atualizada com 31 grupos funcionais, os quais se baseiam não apenas nos traços funcionais dos organismos, mas também nas condições ambientais sob as quais as espécies fitoplanctônicas devem ocorrer, indicando ainda possíveis padrões de co-ocorrência (Tabela 2). Apesar de esses novos agrupamentos terem sido definidos sob bases intuitivas (Reynolds et al. 2002), vários estudos utilizando análises estatísticas multivariadas validam a abordagem para relacionar a composição da comunidade fitoplanctônica às condições ambientais (Kruk et al. 2002, Becker et al. 2009a). Dois fatores garantem a validade dos grupos funcionais: i) o maior poder discriminatório do esquema em explicar a mudança na composição da comunidade, quando comparado com a classificação filogenética em grandes grupos taxonômicos (Kruk et al. 2002); e ii) a clara relação entre morfologia e fisiologia das espécies que integram um mesmo grupo funcional (Reynolds & Irish 1997).

Tabela 2. Grupos funcionais do fitoplâncton de águas continentais (extraído de Reynolds et al. 2002). Table 2. Functional groups of freshwater phytoplankton (redrawn from Reynolds et al. 2002).

Códigos

Hábitats

Representantes típicos

Tolerâncias

Sensibilidades

A

Lagos claros, freqüentemente bem misturados, pobres em nutrientes

Urosolenia, Cyclotella comensis

deficiência de nutrientes

aumento do pH

B

Lagos pequenos a médios, verticalmente misturados, mesotróficos

Aulacoseira subarctica Aulacoseira islandica

deficiência de luz

aumento do pH, depleção Si, estratificação

C

Lagos pequenos a médios, misturados, eutróficos

Asterionella formosa, Aulacoseira ambigua

deficiência de luz e C

exaustão de Si, estratificação

D

Corpos aquáticos rasos, túrbidos, enriquecidos, incluindo rios

Synedra acus, Nitzschia spp.

escoamento

depleção de nutrientes

N

Epilímnio mesotrófico

Tabellaria, Cosmarium, Staurodesmus

deficiência de nutrientes

estratificação, aumento do pH

P

Epilímnio eutrófico

Fragilaria crotonensis, Aulacoseira granulata, Closterium aciculare, Staurastrum pingue

luz moderada deficiência C

estratificação, depleção de Si

T

Epilímnio profundo, bem misturado

Geminella, Mougeotia, Tribonema

deficiência de luz

deficiência de nutrientes

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

816

BRASIL, J. & HUSZAR, V.L.M.

Continuação da Tabela 2

Códigos

Hábitats

Representantes típicos

Tolerâncias

Sensibilidades

S1

Camadas de mistura túrbidas

Planktothrix agardhii, Limnothrix redekei, Pseudanabaena

condições altamente deficientes de luz

escoamento

S2

Raso, camadas de mistura túrbidas

Spirulina, Arthrospira, Raphidiopsis

condições deficientes de luz

escoamento

SN

Camadas de mistura quente

Cylindrospermopsis, Anabaena minutissima

condições deficientes de luz e N

escoamento

Z

Camadas de mistura claras

Synechococcus, Picoplâncton procariótico

escassez de nutrientes

deficiência de luz, herbivoria

X3

Lagos rasos, camadas de mistura claras

Koliella, Chrysococcus, Picoplâncton eucariótico

condições de baixa alcalinidade

mistura, herbivoria

X2

Rasos, camadas de mistura claras, lagos meso eutróficos

Plagioselmis, Chrysochromulina

estratificação

mistura, herbivoria

X1

Camadas de mistura rasas em condições enriquecidas

Chlorella, Ankyra, Monoraphidium

estratificação

deficiência de nutrientes, herbivoria

Y

Lagos geralmente pequenos, e enriquecidos

Cryptomonas

condições de baixa luz

fagotróficos

Lagos geralmente pequenos, oligotróficos

Dinobryon, Mallomonas, Synura

condições de escassez de nutrientes, (recorrem à mixotrofia)

deficiência de CO2

F

Epilímnio claro

Clorofíceas coloniais, Botryococcus, Pseudosphaerocystis, Coenochloris, Oocystis lacustris

condições de escassez de nutrientes alta turbidez

deficiência de CO2

G

Coluna d’água rasa, rica em nutrientes

Eudorina, Volvox

condições de alta luz

deficiência de nutrientes

J

Lagos, tanques e rios rasos e enriquecidos

Pediastrum, Coelastrum, Scenedesmus, Golenkinia

condições de baixa luz

K

Coluna d’água rasa, rica em nutrientes

Aphanothece, Aphanocapsa

mistura profunda

H1

Nostocales fixadoras de nitrogênio

Anabaena flos–aquae, Aphanizomenon

baixas concentrações de N e C

mistura, baixas condições de luz e P

H2

Nostocales fixadoras de N em lagos mesotróficos maiores

Anabaena lemmermanni, Gloeotrichia echinulata

baixas concentrações de N

mistura, baixas condições de luz

E

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

817

o papel dos traços funcionais Na Ecologia do fitoplâncton continental

Continuação da Tabela 2

Códigos

Hábitats

Representantes típicos

Tolerâncias

Sensibilidades

U

Eplímnio de verão

Uroglena

Condições de escassez de nutrientes

deficiência de CO2

LO

Epilímnio de verão em lagos mesotróficos

Peridinium, Woronichinia, Merismopedia

Condições de nutrientes segregados

deficiência de CO2, mistura prolongada ou profunda

LM

Epilímnio de verão em lagos eutróficos

Ceratium, Microcystis

concentrações muito baixas de C

mistura, baixas condições de luz

M

Mistura diária de lagos eutróficos pequenos em baixas latitudes

Microcystis, Sphaerocavum

alta insolação

escoamento, condições de baixa luz

R

Metalímnio de lagos mesotróficos, estratificados

Planktothrix rubescens, Planktothrix mougeotii

condições de baixa luz, forte segregação

instabilidade

V

Metalímnio de lagos eutróficos, estratificados

Chromatium, Chlorobium

condições muito baixas de luz, forte segregação

instabilidade

W1

Pequenos corpos de água, matéria orgânica

Euglenóides, Synura, Gonium

alta DBO

herbivoria

W2

Lagos rasos mesotróficos

Residentes do fundo Trachelomonas

?

?

Q

Lagos húmicos pequenos

Gonyostomum

alta coloração da água

?

A separação das algas com base em sua morfologia coincide substancialmente com as distribuições das mesmas espécies entre diferentes tipos de hábitats diferenciados sobre as bases de acessibilidade à luz e da disponibilidade de nutrientes (Reynolds 1997). A distribuição dos principais grupos funcionais do fitoplâncton continental pode ser ilustrada sob um modelo do hábitat (Figura 6d). Os eixos representam a disponibilidade de energia e nutrientes no ambiente e indicam a maior parte da variabilidade entre os ambientes limnéticos. As formas retangulares traçadas são propostas para representar os limites respectivos para cada grupo funcional. Por exemplo, o grupo S que se estende no quadrante superior direito (lagos rasos hipereutróficos) e o grupo E, no quadrante inferior esquerdo (eplímnio pobre em nutrientes de lagos oligotróficos). Os grupos menos tolerantes ao

estresse e/ou distúrbio localizam-se no quadrante superior esquerdo, representando habitat rico em nutrientes e com plenitude de energia. As formas usadas na Figura 6d, na verdade, estão dispostas dentro da matriz triangular das estratégias primárias adaptativas das algas C, S e R (Figura 6c). Assim como ocorre para as estratégias de seleção r e K, nem todos os organismos fitoplanctônicos ajustamse perfeitamente dentro de uma ou outra das categorias C, S e R e muitos mostram caracteres intermediários entre elas. No entanto, é interessante observar que as condições intermediárias na morfologia e fisiologia dos organismos de fato coincidem com as condições intermediárias dos ambientes (Reynolds 1997). O espaço C-S é preenchido por gêneros tais como Dinobryon, Dictyosphaerium, Sphaerocystis, Eudorina, Volvox, Aphanocapsa, Aphanothece e Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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BRASIL, J. & HUSZAR, V.L.M.

muitas espécies de Anabaena, Aphanizomenon e Gloeotrichia. O gradiente, nessa série, expressa uma diminuição da razão sv-1, da taxa máxima de crescimento e da tolerância a temperaturas mais baixas, mas aumenta a habilidade para explorar e conservar nutrientes. Esses são organismos dos grupos E-F de lagos oligo-mesotróficos ou dos grupos funcionais G-H-K de lagos mais eutróficos. Algas no eixo C-R incluem predominantemente diatomáceas cêntricas (grupos A-B) de lagos claros, e os gêneros Scenedesmus e Pediastrum (grupo J) de lagos rasos e rios enriquecidos. O intervalo R-S é representado por espécies de crescimento lento, consumidoras, mas altamente aclimatadas aos gradientes de densidade da água, como Planktothrix rubescens, Planktothrix mougeotii e Planktolyngbya limnetica que formam o grupo funcional S. Por fim, membros dos gêneros Cryptomonas mostram uma mistura das características de todas as três estratégias adaptativas sendo unicelulares, com células de tamanho moderado (1 a 4 x 103µm3), razões sv-1 intermediárias (0,3 a 0,5µm1 ) e taxas de replicação intermediária (r20 ~ 10 x 10-6s1 ). As células são móveis com capacidade de regular suas posições dentro de um gradiente de densidade e capazes de se adaptar aos níveis de baixa luz por formarem florações na primavera em lagos pequenos; são importantes no estabelecimento da comunidade

após estratificação e ainda podem constituir máximos metalimnéticos (Reynolds 1997). A Figura 6d é apenas ilustrativa, mas pode ser útil dentro de uma perspectiva de descrição florística de diferentes tipos de lagos, ou ainda por permitir rastrear a variação temporal do fitoplâncton, com base apenas numa figura bi-dimensional (Reynolds 2006). Atualização do esquema de Reynolds et al. 2002 O sistema de classificação de Reynolds et al. (2002) tem sido particularmente influente na abordagem dos grupos funcionais conforme indicado pelas 303 citações até novembro de 2011 (Web of Science). Em suas considerações finais, os autores postulam que o esquema está ainda em construção e convidam aos ecólogos do fitoplâncton a fazerem suas contribuições. Assim, a abordagem prosseguiu evoluindo e nove novos grupos funcionais foram adicionados (Padisák et al. 2003b, 2006, Callieri et al. 2006, Borics et al. 2007, Souza et al. 2008). Em 2009 é publicada (Padisák et al. 2009) uma consolidação da proposta de Reynolds et al. (2002), assinalando os usos da referida abordagem e seus equívocos e atualizando a lista para os então 40 grupos funcionais propostos até aquela data (Tabela 3).

Tabela 3. Atualização com os novos grupos funcionais do fitoplâncton continental após a proposta de Reynolds et al. 2002 (extraído de Padisák et al. 2009). Table 3. Update from functional groups of freshwater phytoplankton from Reynolds et al. 2002 (based on Padisák et al. 2009).

Códigos

Hábitats

Representantes típicos

Tolerâncias

Sensibilidades

NA

Lagos oligo-mesotróficos, atelomíticos, de baixas latitudes

Cosmarium, Staurodesmus, Staurastrum

condições intermediárias de luz, deficiência de nutrientes

mistura profunda, baixas condições de luz

MP

Lagos rasos inorganicamente, túrbidos

Surirella spp., Fragilaria construens, Cocconeis sp.

baixas condições de luz

estratificação

TC

Águas constantemente eutróficas, ou rios com baixo fluxo com macrófitas emergentes

Cianobactérias epifíticas, Oscillatoria spp., Phormidium spp., Lyngbya, Rivularia

TD

Águas constantemente mesotróficas ou rios com baixo fluxo com macrófitas submersas

Desmídias epifíticas e metafíticas, algas verdes filamentosas, diatomáceas que residem no sedimento

Ambientes altamente lóticos

Diatomáceas epifíticas, Nitzschia spp., Navicula, Gomphonema spp., Fragilaria spp., Achnanthes spp.

TB

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

o papel dos traços funcionais Na Ecologia do fitoplâncton continental

819

Continuação da Tabela 3

Códigos

Hábitats

Representantes típicos

Tolerâncias

Sensibilidades

ZMX

Lagos oligotróficos profundos, subalpinos

Synechococcus spp., Ceratium hirundinella

XPh

Lagos alcalinos, pequenos, temporários, ricos em cálcio, e bem iluminados

Phacotus lenticularis, Phacotus sp.

condições de alta luz

deficiência de CaCO3

WS

Lagos permanentes, freqüentes em lagos de inundação, em materiais húmicos

Synura

alta coloração da água

alta radiação

W0

Rios e tanques extremamente orgânicos

Chlamydomonas, Pyrobotrys, Chlorella

Outras propostas para agrupamentos funcionais do fitoplâncton A proposta de Salmaso & Padisák 2007 Com base em análises multivariadas envolvendo dados de dois lagos profundos (Lago Garda, Itália e Lago Stechlin, Alemanha), Salmaso & Padisák (2007) propuseram um novo esquema de classificação. O critério adotado para discriminar os grupos inclui

motilidade, capacidade potencial para obter carbono e nutrientes por mixotrofia, requerimentos específicos de nutrientes, tamanho e forma, e presença de envoltório mucilaginoso. Esse critério, juntamente com a separação das cianobactérias de outras algas e incluindo uma subdivisão baseada nas diferentes estratégias de vida, resultou na diferenciação de 31 grupos (Tabela 4). Uma das limitações deste esquema é o fato de ter como base apenas dois lagos profundos de clima temperado.

Tabela 4. Descrição dos 31 grupos morfo-funcionais propostos por Salmaso & Padisák (2007). Table 4. Description from 31 morpho-functional groups proposed by Salmaso & Padisák (2007).

Flagelados

Não flagelados

1 Grandes (colonias ou unicelulares)

1a Grandes Chrysophyta/Haptophyta 1b Grandes Dinophyta 1c Grandes Euglenophyta

2 Pequenos unicelulares

2a Pequenos Chrysophyta/Haptophyta 2b Pequenos Dinophyta 2c Pequenos Euglenophyta 2d Cryptophyta

Maioria autótrofos

3 Phytomonadina

3a Phytomonadina unicelulares 3b Phytomonadina coloniais

Cyanobacteria

4 Unicelulares

4 Cyanobacteria unicelulares

5 Coloniais

5a Filamentos finos 5b Grandes Chroococcales com vacúolos 5c Outras grandes colônias, a maioria Chroococcales sem aerótopos 5d Colônias pequenas, Chroococcales 5e Nostocales

Mixotróficos potenciais

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

820

BRASIL, J. & HUSZAR, V.L.M.

Continuação da Tabela 4

Diatomáceas

Outros unicelulares

Outros coloniais

6 Grandes

6a Grandes Centrales 6b Grandes Pennales

7 Pequenas

7a Pequenas Centrales 7b Pequenas Pennales

8 Grandes

8a Grandes unicelulares – Conjugatophyta/Chlorophyta 8b Grandes unicelulares – outros grupos

9 Pequenos

9a Pequenos unicelulares – Conjugatophyta 9b Pequenos unicelulares – Chlorococcales 9c Pequenas Chrysophyta 9d Unicelulares pequenos – outros grupos

10 Filamentos

10a Filamentos – Chlorophyta 10b Filamentos – Conjugatophyta 10c Filamentos – Xanthophyta

11 Colônias não filamentosas

11a Chlorococcales – colônias sem mucilagem 11b Chlorococcales – colônias mucilaginosas 11c Outras colônias

A proposta de Mieleitner et al. (2008) Posteriormente, Mieleitner et al. (2008) identificaram grupos funcionais do fitoplâncton usando a combinação de conhecimento prévio sobre taxonomia e fisiologia das espécies e análises de agrupamento, levando em conta uma base de dados de longo prazo de três lagos Suíços (Walensee, Zürich e Greifensee) com diferentes estados tróficos. Nesse sistema de classificação, os autores usaram as divisões taxonômicas como a unidade básica da análise. Cada grupo taxonômico foi subdividido em vários subgrupos com base nos padrões de ocorrência das espécies, agrupando aquelas que apresentaram padrões similares, em 16 grupos funcionais (grupo A). As espécies, no entanto, podem apresentar padrões de ocorrência similares, mas possuírem diferentes traços

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

funcionais. Por isso a segunda etapa desse esquema de classificação consiste em combinar a análise de dados com o conhecimento biológico das espécies (Tabela 5). No último estágio da análise, os grupos de ocorrência são agregados para além dos limites taxonômicos, baseados na similaridade dos traçoschave das espécies (taxas de crescimento, constantes de semi-saturação para luz e fósforo, requerimentos por sílica, velocidade de sedimentação e habilidade para fixar nitrogênio). O esquema sugere níveis hierárquicos possíveis de agregação para 11 (grupo B), 8 (grupo C), 6 (grupo D), 5 (Grupo E) e 4 (grupo F) grupos funcionais (Tabela 6). A escolha de um grupo ou outro fica a critério do especialista. Além da subjetividade, o pequeno número de lagos a partir dos quais o esquema de classificação foi elaborado é outra limitação dessa abordagem.

821

o papel dos traços funcionais Na Ecologia do fitoplâncton continental

Tabela 5. Resumo das propriedades dos primeiros 16 grupos funcionais propostos por Mieleitner et al. (2008). As seguintes abreviações são usadas: μ: taxa de crescimento, KI e KP: constante de semi-saturação para luz e fósforo, Si req.: requerimento por sílica, v: velocidade de sedimentação, Nfix: habilidade para fixar nitrogênio. As propriedades chaves estão destacadas em negrito. Chr=Chrysophyta, Din-Dinophyta, Cya=Cyanobacteria, Chl=Chlorophyta, Bac=Bacillariophyta, Cry=Cryptophyta. Table 5. Summary of the properties of the 16 groups proposed by Mieleitner et al. (2008). The following abbreviations are used: μ: specific growth rate, KI and KP: half saturation constants for light and phosphate, Si req.: requirement for silica, v: sedimentation velocity, Nfix: ability to fix nitrogen. Key properties are printed in bold. Chr=Chrysophyta, Din-Dinophyta, Cya=Cyanobacteria, Chl=Chlorophyta, Bac=Bacillariophyta, Cry=Cryptophyta.

Grupo

Nome

µ

palatabilidade

KI

KP

Si req

v

motilidade

Nfix

A1, Cya .1

Cianobactérias mucilaginosas

Médio

Baixo

Alto

Alto

Não

Muito baixa

Alguns aerótopos

Maioria não

A2, Cya.2

Planktothrix rubescens

Baixo

Muito baixo

Muito baixo

Baixo

Não

0

Aerótopos

Não

A3, Cya.3

Aphanizomenon flos-aquae

Baixo

Muito baixo

Baixo

Baixo

Não

0

Aerótopos

Sim

A4, Chr.1

Crisofíceas pequenas

Muito alto

Alto

Baixo

Baixo

Não

0

Sim

Não

A5, Chr.2

Crisofíceas pequenas

Muito alto

Alto

Baixo

Baixo

Não

0

Sim

Não

A6, Chr.3

Crisofíceas grandes (Dinobryon)

Médio

Baixo

Médio

Baixo

Baixo

0

Sim

Não

A7, Bac. 1

Diatomáceas pequenas

alto

Alto

Baixo

Médio

Sim

Médio

Não

Não

A8, Bac.2

Diatomáceas pequenas

alto

Alto

Baixo

Médio

Sim

Médio

Não

Não

A9, Bac.3

Diatomáceas grandes

Médio

Baixo

Baixo

Baixo

Sim

Alto

Não

Não

A10, Bac.4

Diatomáceas grandes

Médio

Baixo

Baixo

Baixo

Sim

Alto

Não

Não

A11, Din.1

Gymnodinium

Baixo

Muito baixo

Alto

Alto

Não

0

Sim

Não

A12, Din.2

Ceratium, Peridinium

Baixo

Muito baixo

Alto

Alto

Não

0

Sim

Não

A13, Cry.1

Criptofíceas pequenas

Muito alto

Alto

Baixo

Baixo

Não

0

Sim

Não

A14, Chl 1

Algas verdes pequenas

Alto

Alto

Alto

Alto

Não

Baixo

Alguns

Não

A15, Chl.2

Algas verdes grandes

Baixo

Baixo

Alto

Alto

Não

Baixo

Não

Não

A16, Chl.3

Algas verdes grandes

Baixo

Baixo

Alto

Alto

Não

0

Sim

Não

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

822

BRASIL, J. & HUSZAR, V.L.M.

Tabela 6. Hierarquia dos grupos funcionais propostos por Mieleitner et al. (2008). Chr= Chrysophyta, Din=Dinophyta, Cya=Cyanobacteria, Chl=Chlorophyta, Bac= Bacillariophyta, Cry=Cryptophyta. Table 6. Hierarchy of functional groups proposed by Mieleitner et al. (2008). Chr= Chrysophyta, Din=Dinophyta, Cya=Cyanobacteria, Chl=Chlorophyta, Bac= Bacillariophyta, Cry=Cryptophyta.

Grupos -A

Grupos - B

Grupos - C

Grupos - D

Grupos - E

C1 pequenos flagelados

D1 pequenos flagelados

E1 pequenos

Grupos - F

A13, Cry.1 A4, Chr.1

B1 “pequenos flagelados”

A5, Chr.2 A14, Chl.1 A7, Bac.1 A8, Bac.2 A9, Bac.3 A10, Bac.4 A15, Chl.2 A16, Chl.3

B2 “pequenas algas verdes”

F1 pequenos

B3 “pequenas diatomáceas”

C2 pequenas diatomáceas

D2 pequenas diatomáceas

E2 pequenas diatomáceas

B4 “grandes diatomáceas”

C3 grandes diatomáceas

D3 grandes diatomáceas

E3 grandes diatomáceas

F2 grandes diatomáceas

E4 grandes

F3 grandes

E5 Pl. rub

F4 Pl. rub

B5 “grandes algas verdes”

C4 grandes algas verdes

A6, Chr.3

B6 “Dynobryon”

A11, Din.1

B7 “Gymnodinium”

C5 Gymnod.

A12, Din.2

B8 “Ceratium, Peridinium”

C6 Cer., Perid.

A1, Cya.1

B9 “cianobactérias”

A3, Cya.3

B10 “Aphanizomenon flosaquae”

A2, Cya.2

B11 “Planktothrix rubescens”

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

D4 grandes

C7 cianobactérias

D5 cianobactérias

C8 Pl. rub

D6 Pl. rub

o papel dos traços funcionais Na Ecologia do fitoplâncton continental

A proposta de Kruk et al. 2010 Embora traços fisiológicos das espécies, como por exemplo, as constantes de semi-saturação de absorção de luz e nutrientes, sejam de grande relevância para a abordagem funcional, a atual escassez de informação sobre esse tipo de traço (Weithoff 2003) limita nossa habilidade de chegar a uma classificação funcional do fitoplâncton a priori (Reynolds et al. 2002, Salmaso & Padisák 2007, Mieleitner et al. 2008). Em contraste, traços morfológicos são relativamente simples de medir (Weithoff 2003) e suas relações com a fisiologia das espécies são potencialmente bem definidas (Lewis 1976, Reynolds 1988, 1997, Naselli-Flores et al. 2007, Finkel et al. 2010). Em recente estudo, baseado em dados de 711 espécies de 211 lagos distribuídos em quatro zonas climáticas na América do Sul, Europa e América do Norte e cobrindo uma ampla variedade de condições ambientais, Kruk et al. (2010) propuseram uma nova classificação funcional do fitoplâncton baseada exclusivamente na morfologia dos organismos. Nove traços morfológicos facilmente mensuráveis foram utilizados: volume, área superficial, MDL, razão sv-1, presença de mucilagem, flagelos, aerótopos, heterocitos e demanda por sílica. Para validar a

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seleção desses traços morfológicos, os autores analisaram sua relação com traços fisiológicos (ex. taxa máxima de crescimento) e com dados demográficos (ex. biomassa média da população). O novo sistema proposto não requer conhecimento de traços fisiológicos das espécies, condicionamento ambiental e afiliação taxonômica. Além disso, por sua construção objetiva e independente do habitat, não apresenta a circularidade das outras abordagens que incluem as condições ambientais como critério para a inclusão de novas espécies. A nova classificação foi denominada como “Classificação Funcional Baseada na Morfologia” (CFBM), em inglês Morphologically Based Functional Classification), e os grupos funcionais assim separados como “Grupos Funcionais Baseados na Morfologia” (GFBM), em inglês Morphologically Based Functional Groups. Os sete grupos formados são descritos na Tabela 7 e as bases para classificar novas espécies são resumidas em forma de chave dicotômica na Tabela 8. Kruk et al. (2011) observaram que os GFBM podem ser mais bem relacionados às condições ambientais do que os grupos funcionais propostos por Reynolds et al. (2002) ou grupos filogenéticos. Além disso, a CFBM tem se mostrado eficiente em predizer o estado trófico de lagos (Pacheco et al. 2010).

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

Grupo taxonômico

Chlo,Chro, Osci, Xant, Ulot

Chry

Nost, Osci

Chlo, Osci, Xant, Zygn

Cryp, Dino, Eugl, Volv, Chlo

Baci

Chlo, Chro, Osci

Descrição

Organismos pequenos com alta razão S/V

Organismos pequenos flagelados com estruturas silicosas

Filamentos grandes com aerótopos

Organismos de tamanho médio faltando traços especializados

Flagelados unicelulares de tamanho médio a grande

Organismos não flagelados com estruturas silicosas

Grandes colônias mucilaginosas

GFBM

I (n=87)

II (n=69)

Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

III (n=45)

IV (n=183)

V (n=122)

VI (n=98)

VII (n=106)

629 1,010469 1541 8,1-8708

1543 12,748255 2444 2,4164779 3143 7,857106

43152 10,92,4e+6

Anabaena crassa, Aphanizomenon issatschenkoi, Cylindrospermopsis raciborskii, Limnothrix planctonica, Planktothrix agardhii

Coelastrum microporum, Micractinium pusillum, Monoraphidium griffithii, Pediastrum duplex, Scenedesmus quadricauda, Pseudanabaena limnetica, Arachnochloris minor, Closterium acutum, Zygnema sp. Cryptomonas ovata, Ceratium hirundinella, Gymnodinium cnecoides, Euglena próxima, Trachelomonas curta, Pyramimonas longicauda, Chlamydomonas globosa

Acanthoceros zachariasii, Aulacoseira granulata, Cyclotella atomus, Cyclotella meneghiniana,Urosolenia eriensis, Asterionella formosa, Cylindrotheca closterium

Botryococcus braunii, Eutetramorus fotii, Oocystis lacustris, Aphanocapsa delicatissima, Microcystis aeruginosa, Romeria okensis

12.9 0,3120

Chlorella minutissima, Scenedesmus ellipticus, Synechocystis aquatilis, Chroococcales < 1µm, Jaaginema pallidum, Monodus sp., Stichococcus bacillaris Chromulina gyrans, Dinobryon cylindricum, Mallomonas pulcherrima, Pseudopedinella sp.

V (µm3)

Táxons representativos

3062 24,487616

1344 19,217473

764 8,920997

791 29,118200

1553 19,64598

308 4,72783

134 2,38191

S (µm2)

1,0 0-6,0

1,1 0,23,6

1,2 0,14,9

1,6 0,15,1

1,7 0,44,3

1,6 0,36,8

5,1 1,528,7

S/V (µm-1)

30,1 3,5244

44,1 2,8244

17,5 2,1190

37,0 4,6700

95,7 2,5259

17,1 2,0164

7,8 0,843,6

MDL (µm)

0,04 0-1

0,00 0

0,00 0

0,00 0

1,00 1

0,00 0

0,02 0-1

Aer

0,00 0

0,00 0

1,00 1

0,00 0

0,00 0

1,00 1

0,03 0-1

Fla

1,00 1

0,00 0

0,00 0

0,00 0

0,27 0-1

0,00 0

0,06 0-1

Muc

0,00 0

0,00 0

0,00 0

0,00 0

0,64 0-1

0,00 0

0,00 0

Het

0,00 0

1,00 1

0,00 0

0,00 0

0,00 0

1,00 1

0,00 0

Sil

Tabela 7. Descrição dos sete Grupos Funcionais Baseados na Morfologia (GFBM) do fitoplâncton obtidos a partir de mais de 700 espécies e 200 lagos. Retirado de Kruk et al. (2010). Média e intervalo de variação dos traços. MDL=máxima dimensão linear; S=superfície; V=volume; Aer=aerótopos; Fla=flagelos; Het=heterocitos; Sil=Sílica; Baci=Bacillariophyceae; Chlo=Chlorococcales; Chro=Chroococcales; Chry=Chrysophyceae; Cryp=Cryptophyceae; Dino=Dinophyceae; Eugl=Euglenophyceae; Nost=Nostocales; Osci=Oscillatoriales; Ulot=Ulothricales; Volv=Volvocales; Xant=Xanthophyceae; Zygn=Zygnematophyceae. Table 7. Description of the seven morphologically based functional groups (MBFG) of phytoplankton obtained from more than 700 species and 200 lakes. Redrawn from Kruk et al. (2010). Mean and range of the traits MDL= maximum linear dimension; S=surface área; V=volume; Aer=aerotopes; Fla= flagella; Het=heterocytes; Sil= siliceous exoskeletal structures. Baci=Bacillariophyceae; Chlo=Chlorococcales; Chro=Chroococcales; Chry=Chrysophyceae; Cryp=Cryptophyceae; Dino=Dinophyceae; Eugl=Euglenophyceae; Nost=Nostocales; Osci=Oscillatoriales; Ulot=Ulothricales; Volv=Volvocales; Xant=Xanthophyceae; Zygn=Zygnematophyceae.

824 BRASIL, J. & HUSZAR, V.L.M.

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o papel dos traços funcionais Na Ecologia do fitoplâncton continental

Tabela 8. Chave para classificar o fitoplâncton em Grupos Funcionais Baseados na Morfologia (GFBM). V, volume (µm3); S/V, razão superfície: volume (µm-1); MDL, máxima dimensão linear (µm). Retirado de Kruk et al. (2010). Table 8. Key for classifying phytoplankton into morphologically based functional groups (MBFG). V, volume (µm3); S/V, surface:volume ratio (µm-1); MDL, maximum linear dimension (µm). Redrawn from Kruk et al. (2010).

1 Presença de flagelo

1’ Ausência de flagelo

2 Presença de estrutura silicosa

Grupo II

2’ Ausência de estrutura silicosa

3 MDL < 2µm

Grupo I

3’ MDL > 2µm

Grupo V

2 Presença de estrutura silicosa

Grupo VI

2’ Ausência de estrutura silicosa

3 Presença de mucilagem

4 Presença de aerótopos

4’ Ausência de aerótopos

3’ Ausência de mucilagem

4 V < 30µm3

4’ V > 30µm3

5 S/V > 0,6µm-1

Grupo III

5’ S/V < 0,6µm-1

Grupo VII

5 V < 10µm3

Grupo I

5’ V > 10µm3

Grupo VII

5 MDL < 20µm

Grupo I

5’ MDL > 20µm

Grupo IV

5 Presença de aerótopos

Grupo III

5’ Ausência de aerótopos

Grupo IV

Grupos funcionais e qualidade da água

o i-ésimo grupo funcional no dado tipo de lago (ver Padisák et al. 2006):

A abordagem dos grupos funcionais também tem sido utilizada para determinar a qualidade da água. Padisák et al. (2006) desenvolveram o índice Q para avaliar o status ecológico de diferentes tipos de lagos estabelecidos pela Water Framework Directive (WFD), baseado no esquema de classificação dos grupos funcionais de Reynolds et al. (2002). O índice Q leva em conta a contribuição relativa (pi, onde pi = ni/N; ni é a biomassa do i-ésimo grupo funcional; N = biomassa total) dos grupos funcionais para a biomassa total do fitoplâncton e um fator (F) estabelecido para

O número resultante da equação acima varia entre 0 e 5, que de acordo com as cinco categorias de qualidade da água do WFD pode ser compreendido como: 0-1 ruim; 1-2 tolerável; 2-3 médio; 3-4 boa, e 4-5 excelente. Alguns autores têm utilizado esse índice tanto em regiões temperadas (Borics et al. 2007, Becker et al. 2010) como tropicais e subtropicais (Crossetti & Bicudo 2008a, Becker et al. 2009a), tendo concluído que o índice Q foi Oecol. Aust., 15(4): 799-834, 2011

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BRASIL, J. & HUSZAR, V.L.M.

uma ferramenta útil para a avaliação ecológica dos sistemas estudados indicando que poderia ser utilizado com sucesso em programas de monitoramento. O índice mostrou-se também como uma ferramenta mais coerente do que índices gerais de estado trófico em sistemas naturalmente enriquecidos em fósforo (Becker et al. 2010). Grupos funcionais em sistemas aquáticos brasileiros Os estudos sobre grupos funcionais no Brasil efetivamente publicados encontram-se em 26 artigos que abrangem rios (Soares et al. 2007) e córregos (Carneiro et al. 2010), um estuário (Costa et al. 2009), um lago profundo natural (Souza et al. 2008), lagoas costeiras (Huszar et al. 2000, Alves de Souza et al. 2006), lagos de inundação (Huszar & Reynolds 1997, Huszar et al. 2000, Melo & Huszar 2000, Nabout et al. 2006, 2009, LoverdeOliveira & Huszar 2007, 2010, Bovo-Scomparin & Train 2008, Nabout & Nogueira 2008), grandes reservatórios (Silva et al. 2005, Borges et al. 2008, Gemelgo et al. 2009) e pequenos reservatórios (Huszar et al. 2000, Moura et al. 2007, Crossetti & Bicudo 2008a, b, Dantas et al. 2008, Fonseca &

Bicudo 2008, 2010, Becker et al. 2009a, b, Rangel et al. 2009). Com o objetivo de examinar a relação entre os grupos funcionais em diferentes tipos de sistemas aquáticos brasileiros, nós analisamos dados de literatura para um estuário, dois rios, duas lagoas costeiras, oito lagos de inundação, um lago natural profundo, cinco grandes reservatórios (>30km2 de área) e 14 pequenos reservatórios (
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