O paradoxo dos gêmeos

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O paradoxo dos gêmeos a c tort∗

28 de março de 2015 O paradoxo dos gêmeos é um problema famoso em Relatividade Restrita (RR). Ele pode ser enunciado de vários modos. Nas versões mais simples, a nave viaja com velocidade constante mas ao chegar ao seu destino sofre uma aceleração instantânea, infinita, e inverte a velocidade. Nas versões mais sofisticados a aceleração da nave espacial é uma função do tempo. O problema serve também para ilustrar um modo de tratar movimentos acelerados de corpos materiais na RR. Eis aqui uma versão clássica do problema [1]: uma nave espacial parte da Terra no ano 2100 com destino a um sistema estelar distante. Um dos irmãos gêmeos nascidos em 2080 é astronauta e parte com a nave, o outro, mais sossegado, permanece na Terra. A nave tem aceleração g em relação a um sistema de referência em relação ao qual a nave está instantaneamente em repouso. O foguete acelera em linha reta durante cinco anos medidos no relógio de bordo, desacelera com a mesma taxa (em módulo) por mais 5 anos, dá a volta, acelera com aceleração g por 5 anos, desacelera com g por 5 anos e chega de volta à Terra. O gêmeo que partiu agora tem 40 anos. O gêmeo que retorna provavelmente não reconhecerá seu irmão e o novo mundo que encontrará. Inevitavelmente perguntará: - Em que ano estamos na Terra? No relógio de bordo estamos em 2140... mas tudo está tão mudado...você envelheceu tanto! - O irmão poderá retrucar: “Você demorou tanto para voltar! Até onde você foi?” Um relativista poderá explicar o que aconteceu mais ou menos assim: seja O ′ x ′ y ′ o referencial em relação ao qual a nave está instantaneamente em repouso. Neste referencial, a aceleração da nave é dada por:  g, 0 ≤ t′ < 5 anos;    −g, 5 ≤ t′ < 10 anos; a(t′ ) = (1) g, 10 ≤ t′ < 15 anos;    −g, 15 ≤ t′ ≤ 20 anos.

Consideremos o primeiro trecho da viagem interestelar. Para este trecho, a(t ′ ) = g (valor da aceleração ′ = 5 anos. A relação entre o intervalo própria apenas, nada a ver com a gravidade terrestre!) e ∆t ′ = T1/4 de tempo coordenado dt, o intervalo medido no referencial da Terra, e o intervalo de tempo próprio dt ′ , o intervalo medido pelo relógio de bordo é dado por: dt ′ =

dt , γ(t)

(2)

onde: γ(t) = r ∗

1 1−

v 2 (t) c2

email: [email protected]

1

=p

1 1 − β 2 (t)

.

(3)

2

Notas de aula – a c tort 2013

Figura 1: Rumo às estrelas! (Ilustração Débora M. Tort)

Aqui, β(t) é o parâmetro de celeridade da nave em relação ao referencial terrestre, Oxy, ou se você preferir, v(t) = β(t)c é a velocidade (magnitude) da nave em relação ao referencial Oxy. Como mencionado antes, o referencial O ′ x ′ y ′ está instantaneamente ‘colado’ à nave. Evidentemente, com uma coleção desses referenciais, um para cada instante t ′ , obtemos ′

T1/4 =

Z

5

dt ′ = 5 anos.

(4)

0

Para relacionar esta duração com a duração medida pelo observador terrestre escrevemos: ′

T1/4 =

Z

5 ′

dt =

0

Z

τ 0

dt . γ(t)

(5)

O limite superior da integral no L.D., τ , nos dá o tempo transcorrido para o observador terrestre. O problema agora é calcular γ(t) que pode ser feito da seguinte maneira: primeiro transformamos a aceleração medida pelo gêmeo na nave usando a fórmula apropriada para a transformação da aceleração: ax′

ax = γ3



v u′ 1 + 2x c

3 ,

(6)

como ux′ = 0, a nave está instantaneamente em repouso em relação ao referencial inercial O ′ x ′ y ′ que se move com velocidade v(t) em relação ao gêmeo terrestre, temos ax =

 2/3 ax′ = g 1 + β 2 (t) , 3 γ

(7)

3

Notas de aula – a c tort 2013

Figura 2: O reencontro... . (Ilustração: Josh Taylor)

já que ax′ = g. Esta equação também pode ser rescrita na forma: c Segue que

 2/3 dβ = g 1 + β 2 (t) . dt dβ [1 +

β 2 ]2/3

(8)

g dt. c

(9)

g t + C, c

(10)

=

Integrando β [1 +

β 2 ]1/2

=

onde C é uma constante de integração. Como para t = 0, a nave estava em repouso, segue que C = 0. Agora com um pouco de álgebra isolamos β(t): gt/c  2 . gt 1+ c

β(t) = s

(11)

Segue também que γ(t) =

E XERCÍCIO 1:

s

1+



gt c

2

.

(12)

Obtenha γ(t).

Agora que temos o fator cinemático γ(t) escrito em relação ao referencial terrestre podemos calcular o tempo transcorrido na Terra. De fato,

4

Notas de aula – a c tort 2013



T1/4 =

Z

τ

0

dt = γ(t)

Z

τ

0

s

dt  2 . gt 1+ c

(13)

Efetuando a integral temos: ′ T1/4 =

gτ c senh−1 . g c

(14)

Invertendo obtemos: c τ = senh g

E XERCÍCIO 2:



′ gT1/4 c



.

(15)

Obtenha a expressão para τ dada acima.

Vejamos os valores numéricos. Lembrando que 1 ano vale 31 556 926 segundos, c = 299 792 458 m/s (exata, por definição) e g = 9, 806 65,   9, 806 65 × 5 × 31 556 926 299 792 458 senh ≈ 84, 47 anos, (16) τ= 9, 806 65 299 792 458

Multiplicando este resultado por 4 teremos 338 anos, aproximadamente. Esta é a duração da viagem em relação ao referencial da Terra. No referencial da nave a viagem de ida e volta dura 20 anos. O gêmeo astronauta ao voltar no ano 2438 terá 40 anos. Seu irmão, se a biomedicina do século 25 o permitir, terá 358 anos! A distância percorrida pela nave no caminho de ida é igual a duas vezes a distância percorrida no trecho inicial, isto é: Z τ Z τ β(t) dt, (17) v(t) dt = 2 c D = 2d = 2 0

0

onde β(t) é dada pela Eq. (11). Efetuando a integral obtemos: ! r g2 T21/4′ c2 −1 . 1+ D=2 g c2

(18)

E XERCÍCIO 3: Obtenha a expressão dada acima para D. Obtenha o valor de D em anos-luz. Resposta: ≈ 160 anos-luz.

Referências [1] J. D. Jackson Classical Electromagnetism, 3rd edition 1999 (John Wiley: New York), Capítulo 11, Problema 11.6.

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