O Perfil da Atenção dos Alunos do Ensino Básico em Aulas de Educação Física

July 24, 2017 | Autor: João Petrica | Categoria: Educação Fisica, Atenção, Pensamento do aluno, Análise de ensino
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O Perfil da Atenção dos Alunos do Ensino Básico em Aulas de Educação Física.

João Petrica1 1

Instituto Politécnico de Castelo Branco. [email protected]

Resumo O objectivo fundamental da presente pesquisa era saber em que pensam os alunos durante as aulas de Educação Física de forma a construir um perfil que nos permitisse perceber melhor esta importante dimensão do processo de ensino das Atividades Físicas. Através do ATEST-EF, um instrumento que permite estudar a atenção dos alunos em aulas de Educação Física, aplicado a 1117 alunos do segundo ciclo do ensino básico, em quatro momentos diferentes da aula de Educação Física, dedicada ao ensino dos desportos colectivos, foi possível ficar com uma imagem global desse aspecto do pensamento dos alunos, de forma a podermos representar o perfil da atenção dos alunos nas aulas do movimento.

Palavras-Chave: Atenção; análise de ensino; Pensamento do aluno

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Introdução Existem alguns estudos que relacionam a atenção na sala de aula com o rendimento escolar, com destaque para o de Peterson e al. (1982), ao nível do ensino em geral. No caso da Educação Física, podemos destacar os estudos de Locke e Jensen (1974), Fahleson (1988), Solmon (1991), Lee, Landin e Carter (1992), Pereira (1995), e Carreiro da Costa, Pereira e Diniz (1996), que relacionam níveis elevados de atenção com a qualidade da prática e o sucesso dos alunos. Defendendo esta ideia, Magill (1989) entende que a atenção facilita a performance motora do indivíduo, e Singer (1986) diz que, quanto maior for a atenção do indivíduo, melhores serão os seus desempenhos motores. Na verdade a atenção, como um processo cognitivo, oferece um útil conceito para explicar como o tempo para aprender se liga à consecução dos alunos (Wittrock, 1986). De facto, parece não haver dúvida que, no ensino, se os alunos não estiverem com atenção ao que estão a fazer, a sua aprendizagem sairá inevitavelmente comprometida. Schmidt (1982) considera que há algumas definições de atenção e que o termo pode ser utilizado de diversas formas, não reunindo, portanto, o necessário consenso. Por isso, de uma forma simplista, pensamos poder adoptar a definição de que a atenção deve ser entendida como a capacidade da actividade mental para se concentrar, de uma forma selectiva, sobre um sector determinado, inibindo as actividades concorrentes e assim, aumentar a sua eficácia. A adopção desta definição prende-se com o facto de, na perspectiva pedagógica, em geral, o que se tem valorizado na atenção é a direcção das funções cognitivas e esta ser uma definição que parece reforçar, acentuar e clarificar essa direccionalidade (Pereira, 1995). A nossa opção assenta na clarificação de Wittrock (1986), ao distinguir a atenção da psicologia, com atenção selectiva, atenção voluntária, atenção sustenida e distracção, da 142

atenção utilizada ao nível da análise de ensino, da análise do processo de ensino em que o objectivo é o de descrever o ensino tal como ele é na realidade e, neste caso, em que estão a pensar os alunos quando estão a realizar as actividades físicas. Por isso, no sentido de procurar conhecer melhor o pensamento daqueles que são os sujeitos da aprendizagem, centrámos o nosso estudo nesta importante variável do processo de ensino. O objectivo fundamental da presente pesquisa era saber em que pensam os alunos durante as aulas de Educação Física de forma a construir um perfil que nos permitisse perceber melhor esta importante dimensão do processo de ensino das Atividades Físicas.

Métodos e procedimentos Para o procurar saber, utilizámos como instrumento de recolha de dados o ATEST-EF (Petrica, 2003, 2010), inspirado em Locke e Jensen (1974), Lee, Landin e Carter (1992) e Pereira (1995), e devidamente validado, em que a atenção dos alunos em Educação Física era registada em questionários distribuídos e explicados aos alunos no inicio da aula, de pergunta única, em que se perguntava aos alunos “em que estavas a pensar no momento em que ouviste o sinal?”, e de resposta fechada, em que os alunos eram convidados a escolher uma das respostas oferecidas, dentro de um leque de respostas possíveis, evitando assim demoras na procura da resposta mais adequada e, consequentemente, interrompendo o mínimo possível a actividade. Para a sua aplicação foram definidos quatro momentos distintos da aula, um na parte inicial da aula, dois na parte principal e o outro na parte final, em que o observador emitia um sinal, e os alunos deveriam deslocar-se, o mais rapidamente possível, até ao local onde

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tinham, previamente, deixado o questionário, e preenche-lo, evitando perder muito tempo com esta acção. Neste estudo foram observadas 48 turmas do 2º ciclo do ensino básico com uma média de 23/24 alunos por turma, envolvendo, portanto, um total de 1117 alunos. O estudo foi desenvolvido em dois anos lectivos, em quatro estabelecimentos de ensino, incidindo sobre seis turmas do 6º e 7º anos de escolaridade. A recolha de dados foi realizada no primeiro período do ano lectivo em que as temáticas em leccionação eram os desportos colectivos ou os jogos pré-desportivos de iniciação a atividades colectivas. Para o tratamento, os dados provenientes dos questionários são obtidos em unidades, por ter sido utilizado o registo de opções (correspondente ao registo de acontecimentos). O número total de indicações, na totalidade dos registos, permitiu tirar a média por episódio de registo, que resultou, por redução a percentagens, nos valores percentuais para cada item e que, por sua vez, por conjugação, permitiu encontrar o valor percentual para a respectiva variável. A partir dos valores percentuais foi possível construir aquilo a que chamámos de perfil da atenção dos alunos, por nos permitirem a sua apresentação através de um gráfico de barras horizontais inspirado numa lógica visual, semelhante a uma visão de perfil.

Resultados A partir das frequências de resposta obtidas para cada um dos itens, no conjunto dos momentos de interrogação, elaborámos o quadro 1, onde se apresentam as frequências por item, a média da freqüência, a percentagem de ocorrência para cada um dos itens e a percentagem cumulativa para as variáveis a que pertencem esses itens.

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Quadro 1 – Frequências, média e percentagem de resposta, por item, sub-variável e variável, relativas à atenção dos alunos.

Variável

Sub-variável

Descrição



_ X

%

%

Atenção ao Comportamento

Professor Colegas

No que o professor estava a fazer No que os meus colegas estavam a fazer

675 343

169 86

13,7 7,0

20,7

Atenção à Informação

Ouvir Relacionar

No que o professor estava a dizer No que o meu colega disse

922 196

231 49

18,7 4,0

22,7

Atenção à Tarefa

A realizar Em realização Realizada

No que vou fazer No que estou a fazer No que fiz

606 1069 324

152 267 81

12,3 21,7 6,6

40,6

Colegas Professores Amigos Familiares

No meu colega No meu professor Nos meus amigos Nos meus familiares

127 77 95 40

32 19 24 10

2,6 1,6 1,9 0,8

6,9

Na aula Exterior à Aula

no que o meu colega me fez No que vou fazer ao meu colega No que vou fazer no intervalo Num jogo de computador

80 49 141 18

20 12 35 5

1,6 1,0 2,9 0,4

5,9

Outros

Noutra coisa

161

40

3,3

3,3

Atenção Afectiva

Atenção Fora da Tarefa

Atenção Noutras Coisas

A análise do quadro permite-nos verificar que os alunos dizem estar a pensar, por ordem decrescente, no que estão a fazer (21,7%), no que o professor estava a dizer (18,7%), no que o professor estava a fazer (13,7%), no que vão fazer (12,3%), no que os seus colegas estavam a fazer (7%), no que fizeram (6,6%), no que o colega disse (4%), noutras coisas não indicadas (3,3%), no que vão fazer ao intervalo (2,9%), no colega (2,6%),... Por outro lado, os menores valores foram encontrados, por ordem crescente, para o pensamento num jogo de computador (0,4%), nos familiares (0,8%), no que vão fazer ao colega (1%), no que o colega lhes fez (1,6%), no professor (1,6%), nos amigos (1,9%), no colega (2,6%), ou no que vão fazer ao intervalo (2,9%).

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Isto quer dizer que a maior frequência de respostas diz respeito à atenção à tarefa em realização, depois, à atenção à informação do professor, à atenção ao comportamento do professor, à atenção à tarefa a realizar, à atenção ao comportamento dos colegas, à atenção à tarefa realizada, à atenção à informação dos colegas, e a menor frequência de respostas corresponde à atenção nos aspectos exteriores à escola, sejam de ordem afectiva, ou pouco relacionados com a tarefa a realizar. A conjugação dos valores percentuais dos itens relativos a cada sub-categoria, nas respectivas categorias, por um calculo percentual acumulado, permitiu saber a percentagem relativa de cada uma das principais variáveis definidas para este instrumento, que possibilita assim, à semelhança do procedimento adoptado para o perfil do comportamento do professor (Pieron, 1996; 2000), a elaboração de uma representação gráfica, através de um gráfico de barras horizontais, sobre os valores percentuais das suas principais categorias, a que chamaremos de perfil da atenção dos alunos (Figura 1). A observação do perfil da atenção dos alunos, em aulas de prática pedagógica de Educação Física do estágio para professor do segundo ciclo do ensino Básico, permite-nos constatar que a categoria que representa a maior dimensão percentual é a que se refere à atenção à tarefa, que representa uma grande parte do total da atenção dos alunos (40,6%), depois aparece a que respeita à atenção à informação, que representa uma muito menor porção, mas que ainda é considerável (22,7%), segue-se a atenção ao comportamento, com uma parte pouco inferior à anterior (20,7%), e depois, com valores já consideravelmente inferiores, aparecem a atenção afectiva (6,9), a atenção fora da tarefa (5,9%) e a atenção noutras coisas (3,3%).

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Figura 1 – Perfil da atenção dos alunos.

Comportamento

20,7

Informação

22,7

Atenção

Tarefa

40,6

Afectiva

6,9

Fora da tarefa

5,9

Noutras

3,3 0

10

20

30

40

50

60

Percentagem

A atenção à tarefa representa uma grande fatia do total do valor das categorias em apreciação, e corresponde quase ao dobro da segunda, a atenção à informação, ou da terceira, a atenção ao comportamento, que aparecem com valores muito aproximados, mas com vantagem para a primeira. Isto significa que, naquelas aulas, os alunos estão fundamentalmente preocupados com o que estão a fazer, com o que vão fazer, ou com o que fizeram, embora menos, estão também com atenção à informação prestada pelo professor, ou pelos seus colegas, e estão, por vezes, a pensar no que o seu professor, e os seus colegas, estão a fazer. O pensamento afectivo e o pensamento fora da tarefa representam uma porção muito menor da sua atenção. Estes valores não deixam de ser lisonjeiros para os professores que leccionaram as aulas, pois significa que conseguiram manter a atenção dos alunos nos aspectos mais importantes

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da vida da classe, muito no sentido preconizado por Siedentop e Tannehill (2003), para se conseguir ser um professor eficaz no ensino das actividades físicas. De facto, considerando que, como diz Wittrock (1986), se os alunos não estiverem com atenção ao que estão a fazer, a sua aprendizagem poderá sair, inevitavelmente, comprometida, os professores de Educação Física pertencentes à nossa amostra conseguiram, neste domínio, valores que concorrem para esse fim. Na realidade, esses valores não são muito diferentes dos que obtiveram Locke e Jensen (1974), para o ensino do basquetebol, conteúdo incluído nos ministrados nas aulas em apreciação, pois se considerarmos as categorias que utilizaram para estudar a atenção relativamente à tarefa, ao nível do plano motor e da habilidade global, como próximas das que utilizámos para estudar a atenção à tarefa, podemos ver que conseguiram 11% e 31%, respectivamente, que resultam muito próximos dos 40,6% que obtivemos para a atenção à tarefa. Usando o mesmo sistema que aqueles autores, Pereira (1995) registou valores de 20,1% e 27,9%, para aquelas categorias, em aulas sobre o ensino da mesma modalidade desportiva, e que, portanto, também não parecem muito distantes, apesar das diferenças na concepção, na forma e no conteúdo, das categorias utilizadas. Com as mesmas cautelas em relação ao instrumento utilizado, se considerarmos a categoria instrução, constante do instrumento produzido por Locke e Jensen (1974), e utilizado por Pereira (1995), como a que utilizámos para a atenção à informação prestada pelo professor, podemos ver que obtiveram 8% e 10,7%, respectivamente, enquanto que nós registámos 18,7%. Da mesma forma, considerando a observação e avaliação, daquele sistema, com a atenção ao que os colegas estão a fazer, do nosso, os valores de 9% e 3,6%, obtidos respectivamente pelos primeiros e pelo segundo, não estarão muito distanciados dos 7% que registámos. 148

Já algumas diferenças parecem surgir, relativamente a categorias como fora da aula e não utilizável, constantes daquele instrumento, e as nossas, relativas à atenção fora da tarefa e à atenção noutras coisas, pois os seus valores foram de 9% e 8% (Locke e Jensen, 1974), 13,8% e 7,1% (Pereira, 1995), enquanto que os nossos foram de 5,9 e 3,3%, respectivamente. Portanto, porque os aspectos relativos à atenção dos alunos, no conjunto das aulas observadas, revelaram que as categorias relacionadas com a tarefa, com a informação, e com a apreciação do comportamento, totalizam mais de 80%, e porque, no seu conjunto, não parecem nada inferiores aos obtidos nos estudos citados, pensamos que valores da ordem dos encontrados só poderão ser considerados como um elogio à sua prática docente.

Conclusões Os dados obtidos com a presente pesquisa permitiram a elaboração do perfil da atenção dos alunos em aulas de prática pedagógica de Educação Física, do estágio para professor do segundo ciclo do ensino Básico, a partir do qual constatámos que a categoria que representa a maior dimensão percentual é a que se refere à atenção à tarefa, que representa uma grande parte do total da atenção dos alunos (40,6%), depois aparece a que respeita à atenção à informação, que representa uma muito menor porção (22,7%), segue-se a atenção ao comportamento, com uma porção pouco inferior (20,7%), e depois, com valores já consideravelmente menores, aparecem a atenção afectiva (6,9), a atenção fora da tarefa (5,9%) e a atenção noutras coisas (3,3%). Isto significa que, naquelas aulas, os alunos estão fundamentalmente preocupados com o que estão a fazer, com o que vão fazer, ou com o que fizeram, e embora menos, estão também com atenção à informação prestada pelo professor, ou pelos seus colegas, e estão, por vezes, a pensar no que o seu professor e os colegas, estão a fazer, representando o 149

pensamento afectivo e o pensamento fora da tarefa, uma porção muito menor da sua atenção.

Referências Carreiro da Costa, F., Pereira, P., & Diniz, J. (1996). The Students Thoughts and Behaviors in Physical Education Classes. Lisboa: AIESEP. Fahleson, G. (1988). Self-Report of Students’ Cognitions and Time on Task During Physical Instruction. Kansas City: AAHPERD. Lee, A., Landin, D., & Carter, J. (1992). Student Thoughts During Tennis Instruction. Journal of Teaching in Physical Education, 11 (3), pp. 256-267. Locke, L., & Jensen, M. (1974). Thought Sampling: A Study of Student Attention Through Self-Report. Research Quarterly, 45, pp. 263-275. Magill, R. (1989). Motor Learning: Concepts and Applications. Dubuque: Iowa. Pereira, P. (1995). O Pensamento e a Acção do Aluno em Educação Física. Lisboa: Faculdade de Motricidade Humana, Universidade Técnica de Lisboa. Peterson, P., Swing, S., Braverman, M., & Buss, R. (1982). Students’ Aptitudes and Their Reports of Cognitive Proceses During Direct Instruction. Journal of Educational Psychology, 74 (4), pp. 535-547. Petrica, J. (2003). A Formação de Professores de Educação Física. Vila Real: UTAD. Petrica, J. (2010). ATEST-EF: Una Herramienta para Estudiar la Atención de los Alumnos en la Clase de de EF. Lisboa: Editora Altorendimiento. Pieron, M. (1996). Analyser l’Enseignement pour mieux Enseigner. Paris: Revue EPS. Pieron, M. (2000). Para Una Enseñanza Eficaz de Las Actividades Fisicas. Barcelona: Inde. Schmidt, R. (1982). Motor Control and Learning, a Behavioral Emphasis. Champaign: Human Kineticks Publishers.

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Siedentop, D., & Tannehill, D. (2003). Developing Teaching Skills in Physical Education. U.S.A.: Mayfield Publishing Co. Singer, R. (1986). El Aprendizage de las Acciones Motrices en el Deporte. Barcelona: Hispano Europea. Solmon, M. (1991). Student Thought Processes and Quality of Practice During Motor Skill Instruction. Baton Rouge: Louisiana State University. Wittrock, M. (1986). Students’ Thought Processes. In M. Wittrock, Handbook of Research on Teaching. New York: Macmillan Publishing Company.

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