O Plano Plurianual (PPA) como Agenda do Governo Federal Brasileiro

May 26, 2017 | Autor: Leonardo Leite | Categoria: Public Administration, Agenda Setting, Brazilian public administration, Public Policy
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O Plano Plurianual (PPA) como Agenda do Governo Federal Brasileiro Autoria: Ivan Trizi Amorim, Leonardo Queiroz Leite

Resumo: Este trabalho busca realizar a aproximação do conceito de agenda, definido por Kingdon (1984), com o conceito de plano plurianual no âmbito federal brasileiro (PPA), trazido pela Constituição de 1988. Entende-se que o PPA é o documento legal de planejamento público que expressa a agenda do governo brasileiro para os próximos 4 (quatro) anos. Assim, por meio de revisão de literatura, discutiremos o alcance dessa abordagem, analisando em que medida o PPA pode ser compreendido como uma grande agenda governamental, a partir da problematização sobre o processo de agenda-setting. Palavras-chave: Plano Plurianual (PPA); Agenda; Governo Federal; Planejamento; Gestão e Políticas Públicas 1. Introdução Após a promulgação da Constituição Federal do Brasil de 1988, contar com a integração dos instrumentos de planejamento tornou-se essencial para que a gestão pública possa, de maneira eficiente, exercer as atividades de sua competência e atender às demandas da sociedade, tanto em termos quantitativos como em termos qualitativos. Assim, passaram a compor o sistema de planejamento brasileiro os seguintes instrumentos: o plano plurianual (PPA), a lei de diretrizes orçamentárias (LDO) e a lei orçamentária anual (LOA). Já no campo de análise de políticas públicas, é relevante incorporarmos a noção de agenda governamental trazida por Kingdon (1984), que elaborou um modelo teórico denominado “Multiple Streams Framework”, que é amplamente empregado em estudos teóricos sobre o processo de formação de agenda, composta pelas discussões que recebem atenção do governo em momentos estratégicos. Então, por um lado, pode-se argumentar que a própria prática do processo de planejamento estratégico é uma política pública, institucionalizada pela Constituição Federal de 1988, sendo analisada a partir da perspectiva do ciclo de políticas públicas a saber: formação de agenda, formulação, implementação, monitoramento, controle e avaliação. Tem-se, por outro lado, o PPA como uma grande agenda governamental, em que os problemas ou as questões públicas – após apresentação da proposta de governo, discussão dos atores sociais e adaptação ao cenário - são expressos em políticas públicas, programas e ações. Considerando a segunda perspectiva, há também diversas agendas institucionais referentes aos diferentes níveis de governo - federal, estadual e municipal – e, no interior desses níveis, existem as próprias de cada um dos poderes - executivo, legislativo e judiciário. Mas, ao falar-se sobre agenda do setor público, como concretiza-se isso? Em que documenta manifesta-se, ou deveria manifestar-se, a agenda do governo brasileiro? Por meio de revisão de literatura, consideraremos neste trabalho o PPA como a grande agenda estratégica do governo federal, correspondendo à materialização, à prática, à instrumentalização do conceito de agenda do Kingdon, formada como decorrência da proposta política apresentada à época eleitoral, da discussão com os atores sociais e das adaptações ao cenário nacional e internacional. 2. O processo de formação de agenda: conceitos e fundamentos A noção de agenda, dentro do campo de estudos de políticas públicas, pode ser definida como o conjunto de questões relevantes na mídia, na opinião pública, ou dentro do governo, durante um período de tempo. Trata-se de um conjunto de ideias, problemas ou 1   

 

propostas de soluções de problemas públicos que captura a atenção das pessoas, que se torna discutida pelo público no dia-a-dia, noticiada na imprensa, ou que se converte em uma questão relevante junto ao governo, podendo materializar-se em programas concretos de ação governamental. Nesse sentido, o processo pelo qual as idéias competem para ganhar a atenção da mídia, do público, dos altos escalões governamentais é denominado agenda-setting (formação da agenda). A agenda de políticas governamentais abrange a análise das questões relevantes para formuladores de políticas governamentais. (CAPELLA, 2004, p.9-10) Em Agendas, Alternatives and Public Policies, Kingdon (1984) investiga as razões que levam alguns temas a tornam-se prioritários na agenda de políticas e outros não, e responde por que algumas alternativas são seriamente consideradas enquanto outras são negligenciadas nesse processo. Em suma: John Kingdon definiu seu modelo de montagem de agenda a partir de seus estudos sobre o processo de definição das agendas de discussão no Congresso norte-americano. Quase trinta anos depois da publicação da edição original de seu livro, e passados quase quinze anos da revisão de seu modelo de análise por Zahariadis, o modelo ainda permanece muito discutido, mas relativamente pouco aplicado em casos empíricos. (ZAPELINNI, 2012, p.14) Desse modo, antes de explorarmos aspectos empíricos mais específicos do nosso caso, que terá seu foco sobre o PPA, Capella esclarece o que são as políticas públicas na visão de Kingdon, numa perspectiva mais completa, para que possamos situar exatamente o ponto que nos interessa: Kingdon considera as políticas públicas como um conjunto formado por quatro processos que compreendem: o estabelecimento de uma agenda de políticas; a especificação de alternativas a partir das quais as escolhas sobre uma política vão ser realizadas; a escolha dominante entre o conjunto de alternativas disponíveis e, finalmente, a implementação da decisão. Em seu modelo, o autor se preocupa especificamente com os dois primeiros processos, denominados estágios prédecisórios: a formação da agenda (agenda-setting) e a especificação de alternativas. (2010, p.25) Nesse sentido, problemas ou questões são transformados em políticas públicas após constantes interações, barganhas e conflitos entre Estado e sociedade ou entre os diversos atores públicos e privados: burocracia estatal, parlamentares e interesses organizados; governos subnacionais e comunidades de políticas; redes temáticas centradas em torno de questões políticas específicas, entre outros. Assim, uma questão passa a fazer parte da “agenda governamental” ou “agenda sistêmica” quando desperta a atenção e o interesse dos formuladores de políticas públicas. Do reconhecimento de um problema ou questão para sua inclusão na agenda governamental, a literatura inclui como necessidades: o reconhecimento de um problema de políticas públicas; o problema estar definido como tal; haver expressamente a necessidade de intervenção estatal ou governamental; e, então, a entrada efetiva na agenda para ação pública ou governamental (FISCHER, MILLER, SIDNEY, 2007). Devido à complexidade e à quantidade de questões que se apresentam aos formuladores, apenas algumas dessas são consideradas em um determinado momento, 2   

 

enquanto outras são ignoradas. Estas podem representar a outra face do poder, ou seja, a nãodecisão. (BACHRACH E BARATZ, 1962) sobre determinada política pública. As questões consideradas pelos tomadores de decisão compõem a chamada “agenda decisional” ou “agenda institucional”, um subconjunto da agenda governamental que contempla questões ou problemas prestes a se tornarem políticas públicas, a agenda em ação. Existem também as chamadas “agendas especializadas”, ou seja, as específicas ou setoriais das áreas de políticas públicas. Nesse sentido, segundo Cobb e Elder (1972), há uma distinção entre a agenda pública (mais genérica e difusa, onde há um excesso de questões e pressões de todos os grupos sociais) e agenda de políticas governamentais propriamente dita, que é a agenda já estabelecida pelo governo como prioritária. Assim, os autores distinguem dois tipos de agenda: uma agenda sistêmica, que envolve todas as questões consideradas pelo público num determinado momento; e uma agenda formal, composta pelo conjunto de questões que estão no foco das atenções em uma instituição governamental. Segundo Kingdon (1984), no processo de especificação de alternativas, há que se considerar também alguns atores que agem para que isso ocorra: a) o presidente da República, juntamente com sua equipe da alta administração (ministros e secretários-executivos), é considerado o ator central no processo de definição da agenda por poder influenciar e determinar as questões nela presentes e por estar no topo da hierarquia administrativa e decisional do Poder Executivo; b) atores do poder legislativo, senadores e deputados federais, também exercem influência sobre a agenda governamental, principalmente por meio de elaboração, aprovação ou veto de dispositivos ou normas; c) os participantes do processo eleitoral, notadamente partidos políticos e a coalizão construída durante a campanha; d) os grupos de interesse; e) e a mídia são os principais atores no processo de formação da agenda. Ainda que a decisão final sobre uma política pública permaneça no seio das instituições responsáveis - principalmente dos poderes executivo e legislativo -, mais recentemente no Brasil, tal decisão vem sendo precedida por processo participação política, principalmente através de conselhos. Com relação ao plano plurianual, a primeira experiência de PPA participativo no governo federal ocorreu no ano de 2003, visando compreender o plano de 2004 a 2007 (BRASIL, 2003, p. 5). Ademais, há também alguns atores específicos, na acepção de Kingdon, que agem predominantemente sobre a geração das alternativas e soluções para as políticas públicas: servidores públicos, analistas de grupos de interesse, assessores parlamentares, acadêmicos, pesquisadores e consultores, ou seja, as denominadas “comunidades de políticas públicas” (policy communities). Este nicho é composto por especialistas em determinadas áreas de políticas públicas, tanto dentro quanto fora dos governos, que discutem questões que demandam ação governamental, tanto por determinação destes quanto por vontade própria, elaborando e oferecendo à apreciação do público soluções para tais questões, soluções estas que podem ser transformadas em políticas públicas específicas. Enfim, o processo político de agenda-setting está distante de configurar-se como uma seleção racional ou coerente de problemas e questões (issues) em termos de sua relevância para a sociedade, podendo levar governos, no limite, a selecionar políticas públicas contraditórias (FISCHER, MILLER, SIDNEY, 2007) Além da limitação cognitiva e de recursos financeiros, materiais, de tempo, entre outros, há também o conflito entre os atores limitando a racionalidade das escolhas. 3. Plano Plurianual (PPA) Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, passou-se a adotar o plano plurianual (PPA); a lei de diretrizes orçamentárias (LDO); e a lei orçamentária anual (LOA). 3   

 

Desse modo, no Título VI - Da Tributação e Orçamento, no Capítulo II - Das Finanças Públicas, na Seção II - Dos Orçamentos, compreendendo os artigos de 165 a 169 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, encontram-se os instrumentos de planejamento e orçamento conhecidos como PPA, LDO e LOA. Os Projetos de Lei do plano plurianual (PL-PPA), da lei de diretrizes orçamentárias (PL-LDO) e da lei orçamentária anual (PL-LOA) são de iniciativa exclusiva do chefe do poder executivo – seja da esfera federal, estadual ou municipal – conforme inciso XXIII do artigo 84 e caput do artigo 165 da CF/88. No que diz respeito ao ciclo de gestão do PPA, este pode compreender as seguintes grandes fases (que não são lineares e se retroalimentam): planejamento (prioridades estratégicas); implementação; execução; monitoramento (eficiência, eficácia e efetividade); controle (interno e externo); revisão (atualização); e avaliação (de impactos e resultados). No entanto, até a denominada fase de decisão, a política pública é constituída de palavras, discursos, retórica, normas. A partir de então, ocorre a implementação, ou seja, a ação sobre essa decisão tomada. É neste momento do ciclo que a política pública se transforma em direitos concretos, que há entrega de políticas públicas, que ocorre a ação, que a norma é aplicada – podendo ocorrer de forma top down e/ou bottow-up. A Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos (SPI), a Secretaria de Orçamento e Finanças (SOF), o Banco Central (Bacen), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a Secretaria do Tesouro Nacional (STN), a Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), a Secretaria de Política Econômica (SPE), a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU) são os principais atores governamentais, em nível federal, atuando no processo. Atendo-se ao PPA, objeto deste estudo, configura-se como o principal instrumento de materialização do planejamento político-estratégico no setor público brasileiro, principalmente devido à sua periodicidade e amplitude temática e geográfica. Ademais, de acordo com o § 4º do artigo 165 da Constituição Federal brasileiro de 1988 (CF/88): Os planos e programas nacionais, regionais e setoriais previstos nesta Constituição serão elaborados em consonância com o plano plurianual e apreciados pelo Congresso Nacional. Conforme definição presente no § 1º do artigo 165 da CF/88: A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada. No entanto, a ausência de uma legislação que regulamente a matéria, desde a promulgação da Constituição de 1988, contribui para distintas compreensões acerca dos instrumentos de planejamento e orçamento. Em outras palavras, os termos presentes nos dispositivos constitucionais são entendidos como decorrência da interpretação dos responsáveis por sua elaboração. Conforme previsto no inciso I do § 9º do artigo 165 da CF/88, cabe à lei complementar: dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização do plano plurianual, da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual. Com o PPA, procurou-se edificar e consolidar um instrumento caracteristicamente de plano no País. Então, muito além de limitar-se ao atendimento dos dispositivos constitucionais de forma genérica, deve se configurar como um instrumento de caráter gerencial inserido em um contexto mais amplo de gestão pública estratégica. Desta forma, o plano é entendido como um meio de materializar o conjunto de programas, projetos, ações (que o interligam ao orçamento), e formulado a partir da seleção alternativas existentes, 4   

 

debatidas, apropriadas, factíveis pra se atingir determinadas finalidades. Concertação, escolha e prioridade públicas são essenciais nesse processo. Segundo Paulo (2010, p.173), cabe ao plano plurianual o elo entre uma visão de Estado (planejamento de longo prazo); as políticas de governo (planejamento de médio prazo); e o orçamento anual (planejamento de curto prazo). O PPA reúne as diretrizes estratégicas que entraram na agenda do governo. É o resultado formal de um processo que envolve: as propostas defendidas no programa de governo do candidato eleito; as discussões com a equipe de governo formada; os debates realizados no Poder Legislativo (Congresso Nacional); com os representantes de governos subnacionais; e, também - ainda que mais recentemente e de maneira incipiente -, com a sociedade civil. Então, ele deve orientar as ações do governo eleito, definindo as prioridades estratégicas para a gestão pública do País levando-se em consideração a realidade vivenciada e os anseios da sociedade. Nesse sentido, compõem-se por um conjunto de programas que expressam as políticas públicas que se pretende implementadas. O período de vigência do plano compreende o que o governo pretende fazer nos próximos 4 anos (médio prazo) - ainda que apenas 3 desses anos esteja sob o seu mandato (sem contar com a possibilidade de haver reeleição). A vigência do PPA inicia-se somente a partir do segundo ano do mandato do presidente da República. Com isso, pretende-se, principalmente, garantir a discussão do Projeto entre os atores, além de sua aprovação, e estabelecer um compromisso político que ultrapassa um único mandato executivo, possibilitando continuidade às políticas públicas. Na ausência de lei complementar que regulamente os prazos de encaminhamentos, assim estabelece o artigo 35, §2º, inciso I, do Ato das Disposições Transitórias (ADCT) da CRFB/1988: O projeto do plano plurianual, para vigência até o final do primeiro exercício financeiro do mandato presidencial subsequente, será encaminhado até quatro meses antes do encerramento do primeiro exercício financeiro e devolvido para sanção até o encerramento da sessão legislativa. Desse modo, cabe explicitar que, conforme o artigo 57 da CF/88, o Congresso Nacional reunir-se- á, anualmente, na Capital Federal, de 2 de fevereiro a 17 de julho e de 1º de agosto a 22 de dezembro. Em seu primeiro ano de mandato, até o dia 31 de agosto e a cada 4 anos, o Chefe do Poder Executivo federal encaminha o PL-PPA ao Congresso Nacional, que devolve-o para sanção até o dia 22 de dezembro do mesmo ano – ou seja, até o encerramento da sessão legislativa. Assim sendo, o governo eleito possui 8 (oito) meses para discuti-lo com a sociedade – seja por meio de audiências públicas, conselhos, conferências, portais na internet, entre outros meios. A não aprovação do PPA em prazo constitucional adequado compromete a inicialização de investimentos governamentais cuja execução ultrapasse um exercício financeiro, pois, não há amparo normativo para que isso ocorra. Em nível federal, o atual Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão é o responsável pela coordenação de todo o processo, que envolve o planejamento e a elaboração do projeto de lei do PPA e a posterior gestão do PPA. 4. A relação entre a agenda governamental e o PPA A agenda governamental, para Kingdon (1984), é definida como o conjunto de assuntos sobre os quais o governo e pessoas ligadas ele, concentram sua atenção num determinado momento. No caso do nosso estudo, entendemos que o PPA constitui um tipo 5   

 

específico de agenda do governo, sistematizado em diretrizes, objetivos e metas, segundo previsão Constitucional, com duração fixada em 4 anos. Uma questão passa a fazer parte da agenda governamental quando desperta a atenção e o interesse dos formuladores de políticas que, via de regra, são os políticos eleitos com um plataforma discutida e legitimada nas eleições e posteriormente, no governo, bastante influenciada e depois transformada em propostas concretas de políticas públicas pela ação das chamadas “comunidades de políticas públicas”, conceito trazido por Kingdon e já explicitado na seção 2 deste trabalho. No entanto, dada a complexidade e o volume de questões que se apresentam a estes atores formuladores no momento de formação da agenda governamental, apenas algumas delas são realmente consideradas e passam de fato a receber a atenção do governo num determinado momento. Essas, que passam para o âmbito de atenção, compõem então a agenda decisional: um subconjunto da agenda governamental que contempla questões prontas para uma decisão ativa dos formuladores de políticas, ou seja, prestes a se tornarem políticas públicas (policies). Desse modo, cabe à lei de diretrizes orçamentárias (LDO) definir as metas e prioridades da gestão pública federal para o próximo ano (§ 2º da CF-88). Existem ainda agendas especializadas - como as agendas específicas da área de saúde, educação, meio ambiente -, refletindo a natureza setorial da formulação de políticas públicas. Ainda assim, de acordo com a CF-88, art. 165, § 4º: Os planos e programas nacionais, regionais e setoriais previstos nesta Constituição serão elaborados em consonância com o plano plurianual e apreciados pelo Congresso Nacional. A partir dos intervalos democráticos que assinalam as eleições, temos que, a cada 4 anos, o conjunto de assuntos ou problemas públicos que estão tomando a atenção governamental em um dado momento (KINGDON, 1984) passam a estar no foco da definição das prioridades do governo que está assumindo. Desse modo, alguns tópicos podem ou não permanecer na agenda que está em formação, e retornar ou não em um período subsequente. Aqui, Kingdon adota um conceito importante que ajuda a compreender este crucial momento de transição de governos que é assinalado por pressões diversas na a inclusão de interesses diversos na agenda: a ideia de “humor nacional”. De modo geral, trata-se dos “humores” do público, em larga medida influenciados pelas campanhas e pressões de grupos de interesse, pelos resultados de eleições, pela ideologia dos partidos representados no Congresso e, especialmente, pela mudança na administração do governo. (KINGDON, 1984, p.145-164). Nesse sentido, o “humor nacional” indica que o público no país tende a encarar algumas questões e problemas públicos de maneira mais ou menos homogênea, indicando aos líderes políticos o que seus eleitores pensam e valorizam como possíveis soluções em forma de políticas públicas. Assim, as pressões de forças políticas organizadas, como os grupos de interesse, mobilizam os formuladores de políticas por meio da indicação daquilo que segmentos importantes da população desejam. (KINGDON, 1984, p.146-149) Desse modo, de todos os problemas de políticas públicas relevantes, a atenção política está ligada a um subconjunto deles. Desse subconjunto, as políticas públicas estratégicas estarão expressas no plano plurianual (PPA) - ainda que, na prática, não haja consenso na opção por um modelo de PPA como uma agenda mais ampla, estratégica, que define prioridades, ou por um PPA mais detalhista, taxativo, extenso. Por meio da consulta dos PPAs federais (1991-1996 a 2016-2019), no portal do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, elaboramos a Tabela 1 a seguir para ilustrar como os planos foram estruturados e quais as linhas estratégicas foram escolhidas para formação da agenda em cada um dos períodos.

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TABELA 1 – Planos Plurianuais

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5. Considerações Finais Neste trabalho, buscamos trabalhar a aproximação de um tema típico da gestão pública (planejamento no setor público) com um tema característico da análise de políticas públicas (agenda-setting). Com isso, destacamos a importância dessa aproximação para o campo de estudos de gestão e políticas públicas, uma vez que, devido à sua natureza fortemente interdisciplinar, não é possível interpretar os fenômenos e problemas públicos de maneira estanque, sendo necessário envidar esforços para transpor os desafios da multidisciplinaridade. Nesse sentido, a partir dessa perspectiva de conjugação de duas lentes interpretativas complementares, aqui tentamos ilustrar como o PPA pode ser considerado uma agenda governamental na medida em que as questões estratégicas fundamentais contidas no Plano recebem atenção especial do poder público, passando a integrá-las numa perspectiva de médio prazo e buscando conferir aos tópicos selecionados um sentido de prioridade.

6. Referências BACHRACH, Peter; BARATZ, Morton S. Two Faces of Power. American Science Review 56: 947-952. 1962. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: . Acesso em: 04 de ago 2016. _______. Plano plurianual 2004-2007: mensagem presidencial. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos. Brasília: MP, 2003. CAPELLA, Ana Cláudia N. Perspectivas teóricas sobre o processo de formulação de políticas públicas. In Políticas Públicas no Brasil. HOCHMAN, Gilberto; ARRETCHE, Marta; MARQUES, Eduardo (orgs.). Rio de Janeiro: Fiocruz, 2007 _______. O Processo de Agenda-Setting na Reforma da Administração Pública (19952002). Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós Graduação em Ciências Sociais. São Carlos: UFSCar, 2004. COBB, Roger; ELDER, Charles. Participation in American Politics: The Dynamics of Agenda Building. Boston, Allyn and Bacon, 1972. FISCHER, Frank; MILLER, Gerald J.; SIDNEY, Mara S (editors). Handbook of Public Policy Analysis - Theory, Politics, and Methods. CRC Press, 2007. KINGDON, John. Agendas, Alternatives, and Public Policies. 3a.Ed. New York: Harper Collins, 2003. [1984] PAULO, Luiz F. Arantes. O PPA como instrumento de planejamento e gestão estratégica. Revista do Serviço Público, Brasília, ano 61, n. 2, abr./jun. 2010, pp. 171-187. ZAPELINNI, Marcelo. A montagem de agenda na gestão de recursos hídricos: uma aplicação do modelo de Kingdon no comitê do Itajaí. Trabalho apresentado no EnANPAD, Rio de Janeiro: 2012.

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