O potencial arqueológico da comunidade quilombola Lagoa da Piranhas, Bom Jesus da Lapa, Bahia.

May 27, 2017 | Autor: F. Simões | Categoria: History, Archaeology, Bioarchaeology, African Diaspora Studies
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O POTENCIAL ARQUEOLÓGICO DA COMUNIDADE QUILOMBOLA LAGOA DAS PIRANHAS, BOM JESUS DA LAPA, BAHIA. Fernanda Libório Ribeiro Simões¹ Janaína de Almeida Netto² Wesley dos Santos Lima³

INTRODUÇÃO A partir do projeto intitulado: “Quilombando: estágio de vivência em quilombos do território Velho

Foram identificados diversos enterramentos dispersos e expostos por intempéries (os relatos indicaram a existência

Chico”, que busca integrar a universidade com as comunidades remanescentes de quilombos, foi

de mais de oito indivíduos em uma abertura de poço artesiano), fragmentos de faiança fina inglesa (entre séc.

realizada uma visita técnica ao Quilombo Lagoa das Piranhas para uma avaliação do potencial

XVIII e XIX) e fragmentos de sílex lascado. A partir dessa verificação inicial não é possível estabelecer se os

arqueológico no local. Essa visita foi oriunda de uma demanda da comunidade ao identificar os

enterramentos estão relacionados com a ocupação em um período histórico ou pré-colonial, sendo necessária a

vestígios arqueológicos em superfície e cadastrar o Quilombo Lagoa das Piranhas como um sítio

realização de intervenções sistemáticas de ampla superfície para a caracterização do contexto arqueológico.

arqueológico no CNSA (Sítio Quilombo de Piranhas - BA00466).

Sobre o conjunto arqueológico identificado foram registrados crânios infantis e adultos, ossos longos, ossos

A avaliação do potencial arqueológico foi elaborada a partir de um levantamento de superfície,

alongados e cinturas pélvicas; borda de faiança fina estilo shell edge, produzida na Inglaterra entre 1775 e 1860;

verificando as áreas com balanço sedimentar negativo próximas as residências e a zona intertidal da

fragmentos de vidro com marcas de sopro; e fragmento de sílex com alterações térmicas.

própria lagoa. Os resultados apresentados mesclam as informações obtidas através do relato oral da

CONSIDERAÇÕES FINAIS

comunidade, da ficha do CNSA, materiais identificados em superfície.

A principal demanda da comunidade com a pesquisa arqueológica é saber a procedência desses enterramentos dispersos por todo o quilombo. Ao considerarem todas as possibilidades

que

uma

pesquisa

arqueológica

pode

apresentar, existe uma inquietação dos moradores em saber se há algum tipo ligação (social ou sanguínea) com os enterramentos. Os idosos relatam que desde a infância percebem essas ossadas em superfície, mas não possuem a identidade dos enterramentos, não sendo possível fazer uma ligação direta através da memória coletiva. É notório destacar como a região quilombola Lagoa das Piranhas se encaixa na discussão acerca das migrações ocorridas do litoral para o sertão, como também se atrela ao

Figura 03: Borda de faiança fina estilo shell edge, produzida na Inglaterra entre 1775 e 1860. Local: Quilombo Lagoa das Piranhas, Bom Jesus da Lapa – BA. Foto: SIMÕES, F. L. R, 2016.

estudo da arqueologia da diáspora africana. Um território que Figura 01: Material lítico lascado com alteração térmica. A matéria-prima é o silexito que é comum em sítios arqueológicos indígenas pré-coloniais. Local: Quilombo Lagoa das Piranhas, Bom Jesus da Lapa, BA. Foto: SIMÕES, F. L. R, 2016.

ainda não foi descrito com suas particularidades, mas que conserva na memória local de sua comunidade e de forma material, vestígios humanos, de edificações e artefatos como cerâmica, que necessita de uma urgente intervenção, que favoreça a pesquisa e o levantamento de fontes que possa proteger a história dessa comunidade. Uma história que deve ter

DISCUSSÃO TEÓRICA Trabalhos realizados por Tarazona-Santos (2015) e Rodrigues (2012) ressaltam a quantidade exorbitante

o seu uso político bem estabelecido dentro da luta quilombola.

de africanos que foram retirados de suas terras para servirem de escravo no Brasil, resultando assim em um processo de imigração forçada, que além de ter desencadeado as origens africanas da população brasileira, tornou-se um objeto de estudo que vem sendo ao longo da história palco de inúmeros questionamentos que permeiam: o translado dos africanos trazidos para cá; o contato e a interelação com outros povos; a adaptação em diferentes territórios; a organização e a vivência nestes novos espaços sociais. De acordo com Ferreira (2009) “[...] o estudo arqueológico da diáspora africana permite delinear a diversidade de identidades culturais que os escravos forjaram na América.” (FERREIRA, 2009, p. 269), bem como “[...] circunscrever os espaços de formação das comunidades escravas e os distintos universos multiculturais que construíram.” (FERREIRA, 2009, p. 269). No âmbito desses estudos, a utilização da bioarqueologia como sendo uma das metodologias de pesquisa serve para ampliar as percepções do objeto de estudo, pois utiliza-se de “[...] abordagens mais complexas, que iniciam na inter pretação de estruturas funerárias e deposicionais

contendo

ossos

humanos.”

(SOUZA

E

RODRIGUES-CARVALHO, p.1),

proporcionando

compreensão

mais

assim

2013, uma

aprofundada.

Figura 04: Diversos enterramentos foram identificados em superfície. Nessa figura identificamos ossos longos e/ou alongados. Local: Quilombo Lagoa das Piranhas, Bom Jesus da Lapa – BA. Foto: SIMÕES, F. L. R, 2016.

Esses estudos convêm para não só contextualizar o negro na História e

A Arqueologia busca resgatar a história do passado destas comunidades, mas é no presente que ela é reivindicada e

em

pensada para as gerações futuras, neste caso desvendar o passado das comunidades afro-brasileiras é também dialogar

sua

própria

história,

mas

concomitantemente proporcionar aos seus

com essa temporalidade, estabelecer uma memória, edificar identidades, e tornar herança para a posteridade.

afrodescendentes,

reconhecimento e respeito de sua

REFERÊNCIAS

identidade étnica perante a sociedade

FERREIRA, Lucio M. Sobre o conceito de arqueologia da diáspora africana. MÉTIS: história & cultura, v.8, n. 16, 2009. Disponível em: http://www.ucs.br/etc/revistas/index.php/metis/article/viewFile/961/682 Acesso em: 02 de Nov. de 2016.

atual e a legislação que a rege. Figura 02: Crânio exposto por balanço sedimentar negativo, oriundo de ação pluvial. Possivelmente, um crânio infantil. Local: Quilombo Lagoa das Piranhas, Bom Jesus da Lapa – BA. Foto: SIMÕES, F. L. R, 2016.

RODRIGUES, Miguel Tadeu. Arqueologia da Diáspora Africana. 2012, p. 5. Disponível https://www.academia.edu/4960571/Arqueologia_da_di%C3%A1spora_africana Acesso em: 02 de Nov. de 2016.

RESULTADOS A análise das variáveis empregadas na obtenção dos dados (relatos, CNSA e material em superfície) apontam para um grande potencial para pesquisas arqueológicas no Quilombo, quem permeiam a

em:

SOUZA, Sheila Mendonça de; RODRIGUES-CARVALHO, Claudia. ‘Ossos no chão’: para uma abordagem dos remanescentes humanos em campo. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 8, n. 3, 2013. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/bgoeldi/v8n3/05.pdf Acesso em: 02 de Nov. 2016.

Bioarqueologia, Arqueologia da Diáspora Africana, Etnoarqueologia e Arqueologia Pública. ¹Bacharela e mestra em Arqueologia. É professora assistente do curso de História da Universidade Federal do Oeste da Bahia e coordenadora do grupo de estudos Arqueologia do Oeste da Bahia. E-mail: [email protected] ² Graduanda do curso de Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades pela Universidade Federal do Oeste da Bahia. E-mail: [email protected]

TARAZONA-SANTOS, Eduardo. Brasil e a idiossincrasia da miscigenação. v. 22, n. 1 e 2. Rev. UFMG: Belo Horizonte, 2015, p. 241. Disponível em: https://www.ufmg.br/revistaufmg/downloads/22/16-Artigo-16-p232-249.pdf Acesso em: 02 de Nov. 2016

³ Graduando do curso em Licenciatura em História pela Universidade Federal do Oeste da Bahia. E-mail: [email protected]

Para mais informações, acessem: Site: arqueologiadooestedabahia.com Facebook: @arqueologiadooestedabahia YouTube: Arqueologia do Oeste da Bahia

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