O POTENCIAL SEMÂNTICO DA TIPOGRAFIA NO DISCURSO GRÁFICO

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O POTENCIAL SEMÂNTICO DA TIPOGRAFIA NO DISCURSO GRÁFICO.

Priscila Cloque Fagundes Porto Alegre – 2015/01

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SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................... 03 2. TIPOGRAFIA, DEFINIÇÃO ............................................................................................................. 05 3. SEMÂNTICA E SEMIÓTICA, DEFINIÇÃO .............................................................................. 07 4. RELAÇÃO TIPOGRAFIA X SEMÂNTICA ................................................................................ 09 5. METODOLOGIA ................................................................................................................................... 15 6. CONCLUSÃO ........................................................................................................................................ 16 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................... 17

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O POTENCIAL SEMÂNTICO DA TIPOGRAFIA

Priscila Cloque Fagundes

RESUMO Esta pesquisa tem como objetivo central investigar e compreender o potencial semântico da tipografia de acordo com os principais autores da área. Para tal, a metodologia abordada consistiu em pesquisas bibliográficas exploratórias, em livros e artigos publicados, e baseou-se em autores como Joly, Jury, Lupton, Santaella, Spiekermann, Frutiger, entre outros. Palavras-chave: Tipografia, Semântica, Semiótica, Design.

1 INTRODUÇÃO Embora muitas vezes nem percebamos, a tipografia está muito presente no nosso cotidiano. Nas grandes mídias impressas, nos emails de trabalho, na embalagem de seu biscoito preferido e, até mesmo, nos cartazes feitos à mão fixados nas gôndolas dos supermercados... Basta olharmos em volta por um minuto para percebermos que a tipografia é ubíqua e assaz necessária. Para entendermos tipografia precisamos voltar no tempo. Os primeiros escritos, que precedem o primeiro alfabeto, foram os hieróglifos egípcios entalhados na pedra ou traçados a tinta em rolos de papiro. Eram sequências de imagens que, assim como os pictogramas, representavam palavras. Com o passar dos anos a escrita egípcia foi se modificando e evoluindo. Em meados de 2000 a.C., surge a primeira escrita alfabética, onde signos eram utilizados para representar consoantes. Muito mudou no estilo de escrita até o primeiro livro feito com tipos móveis, a Bíblia de Gutenberg, ser impresso, em 1445. Os tipos móveis, esculpidos artesanalmente em metal duro, reproduziam a caligrafia dos manuscritos da época. Posteriormente, chamaríamos este estilo de gótico. Segundo Nazarian (2011), se o processo da fabricação de tipos permaneceu o mesmo durante muitos séculos, a aparência da tipografia mudou quase que

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imediatamente. Com o passar dos séculos novas formas de impressão foram inventadas e, consequentemente, um novo tipo de linguagem. A escrita cursiva, os tipos romanos, as primeiras famílias tipográficas, a fotocomposição, a revolução industrial e, finalmente, a revolução digital. Atualmente temos acesso a uma infinidade de famílias tipográficas em nossos computadores. Para Nazarian (2011, p.6) “a tipografia é um produto cultural de massa com milhões de usuários.” A tipografia está diretamente ligada à linguagem. Afinal, letras formam palavras, e as palavras são o veículo da comunicação. A forma como a palavra se mostra (tamanho, peso, disposição, etc) pode alterar seu significado perante o leitor. Segundo Jury (2006) a tipografia e a escrita sempre estiveram interligados, dado a tipografia ser a disciplina e profissão que atua como intermediário entre o conteúdo da mensagem e os leitores da mensagem. Já a forma de interpretação da mensagem está diretamente relacionada à semiótica que, de acordo com Jury (2006), estuda o significado de todos os signos da sociedade. Ele diz ainda que “alguns teóricos sustentam que a semiótica é a ciência melhor qualificada para determinar a lógica da cultura. A linguística, a retórica, a semântica e a grafologia recaem todas sob o domínio da semiótica.” (JURY, 2006, p.73) Eis que chegamos ao tema central deste artigo: O potencial semântico da tipografia. Em tempos de procura por mídias tecnológicas e informações de fácil e rápido acesso, percebemos necessário ressaltar o potencial semântico da tipografia no discurso gráfico. A composição tipográfica, e seu uso com valor de imagem, são capazes de comunicar e gerar uma interpretação semântica eficaz? Nossa investigação parte da seguinte problema: Investigar o potencial semântico da tipografia no discurso gráfico segundo os principais autores da área. O trabalho – desenvolvido a partir de pesquisa bibliográfica exploratória com abordagem qualitativa – foi estruturado em três seções, sendo o primeiro, Tipografia, Definição, onde abordamos as diferentes definições de tipografia e sua importância no cotidiano de acordo com Bringhurst, Jury, Góis, Meggs e Spiekermann. Nele, é possível observar como a tipografia evoluiu com o passar do tempo e continua em constante ampliação.

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Na seção seguinte, definimos semântica e semiótica com base em Cançado, Joly, Santaella, Saussure, Pierce e Quentin. Explicamos o que é um signo e passamos, resumidamente, pela sua classificação em três grandes grupos. Na seção final, Relação Tipografia x Semântica, investigamos as diferentes abordagens da semântica visual tipográfica segundo Frutiger, Garcez, Góis, Lupton, Saltz e Spiekermann.

2 TIPOGRAFIA, DEFINIÇÃO O significado de tipografia sofreu inúmeras alterações com o decorrer dos anos. Sua importância para o design gráfico é indiscutível, já que está presente em, praticamente, toda peça de design. A princípio, estava associada diretamente à indústria da impressão com tipos móveis – criada por Johannes Gutenberg na Alemanha, no início do século XV. Para Meggs (2009, p.90), “tipografia é o termo para impressão com pedaços de metal ou madeira independentes, móveis e reutilizáveis, cada um dos quais com uma letra em alto-relevo em uma das faces.” No entanto, com a evolução da tecnologia e do design gráfico, segundo Jury (2006, p.8), a palavra tipografia é cada vez mais usada para designar a disposição de qualquer material escrito e já não se aplica apenas ao trabalho dos tipógrafos. Ainda, o poeta e tipógrafo Robert Bringhurst atribui a seguinte definição ao termo tipografia: “A tipografia é o ofício que dá forma visível e durável – e, portanto existência independente – à linguagem humana – seu cerne é a caligrafia – a dança da mão viva e falante sobre um palco minúsculo e suas raízes se encravam num solo repleto de vida, embora seus galhos sejam carregados de novas máquinas ano após ano. Enquanto a raiz viver, a tipografia continuará a ser uma fonte de verdadeiras delícias, conhecimento e surpresas.” (BRINGHURST, 2005, p.17)

Bringhurst (2005, p.10) completa dizendo que a tipografia está presente para honrar o seu conteúdo, e que representa algo visual e histórico.

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Se fôssemos criar uma quarta definição, com base nas citações dos autores destacados a cima, poderíamos dizer que a tipografia é a responsável por transmitir forma à linguagem através da impressão e reprodução da escrita. Entretanto, Jury (2006) aponta as dificuldades em estabelecer elementos especificamente definíveis para tipografia: “A série básica de caracteres, previsivelmente necessários para qualquer texto longo, incluirá maiúsculas, minúsculas, algarismos alinhados e não alinhados, sinais de pontuação, maiúsculas pequenas (versaletes), diacríticos (acento agudo [ó], acento grave [ò], circunflexo [ô], til [õ], etc.), caracteres matemáticos (frações, os símbolos algébricos da adição, subtração e multiplicação, vírgula, etc.), símbolos monetários (libra, dólar, iene, etc.), caracteres de referência (algarismos elevados e ideogramas de remissão [* † ‡ ¶ §], etc.), marcas gráficas (vinheta, chaveta, etc.), abreviaturas (&, etc.) e caracteres de ligaturas (fi, fl, etc.). Todos estes caracteres serão necessários em tipos romanos e em itálicos e pelo menos em duas espessuras diferentes.” (JURY, 2006, p.14)

A passagem da oralidade à escrita, somada ao aparecimento da imprensa, foram cruciais para a evolução natural da escrita. Para Góis (2004, p.14) “ambos os passos representam amplas revoluções nesta rede evolutiva, e tanto a revolução da escrita como a revolução tipográfica, se revelaram marcos históricos no desenvolvimento do pensamento cultural humano.” “Se pensar que a escolha de uma fonte tipográfica é algo de pouca importância, porque ninguém notaria a diferença mesmo, você ficaria surpreso em saber que especialistas gastam um tempo enorme e muito esforço aperfeiçoando detalhes que não são vistos por olhos não treinados.” (SPIEKERMANN, 2001, p.17)

A tipografia desempenhou um importante papel na evolução da comunicação e do design gráfico. Por exemplo, hoje sabemos que fontes proporcionalmente espacejadas proporcionam uma melhor leiturabilidade e legibilidade. Porém, suas regras de aplicação estão constantemente em movimento e evolução. Quebrar estas regras, em determinadas ocasiões e com bom senso, pode destacar a mensagem tornando a comunicação mais eficiente.

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3 SEMÂNTICA E SEMIÓTICA, DEFINIÇÃO A semiótica estuda o significado de todos os signos na sociedade. Tem, por isto, maior âmbito dentre qualquer outro método de análise. Surgiu no início do séc. XX, tendo como pioneiros o suíço Ferdinand de Saussure (1857-1913) e o norteamericano Charles Sanders Pierce (1839-1914). Saussure, segundo Joly (1994), dedicou sua vida a estudar a língua, partindo precisamente do principio de que “a língua não era o único sistema de signos que exprima idéias do qual nos servimos para comunicar. Imaginou por isso a semiologia como uma ciência geral dos signos 1 , e no seio da qual a linguística, o estudo sistemático da língua, teria a primazia e exerceria o seu domínio.” (JOLY, 1994, p.33) Saussure isolou as unidades constitutivas da língua e estudou a natureza do signo linguístico. Desenvolveu uma teoria que, segundo Joly (1994), viera a ser o mais complexo e mais vasto dos sistemas de expressão. Já Pierce foi mais a fundo, e tratou de elaborar uma teoria geral dos signos, que abrangesse a língua numa perspectiva mais vasta. Para ele, o signo possui uma materialidade que vai ao encontro dos nossos sentidos. “Podemos vê-lo (um objeto, uma cor, um gesto), ouvi-lo (linguagem articulada, grito, música, ruído), cheirá-lo (diversos odores: perfume, fumaça), tocá-lo ou ainda saboreá-lo.” (JOLY, 1994, p.35) Com isso, concluímos que a interpretação do signo se dá de pessoa para pessoa, a partir de suas memórias, do conhecimento adquirido com o decorrer da sua vida, da sua cultura e do contexto onde está inserido. Quentin (2009, p.48) exemplifica dizendo que a palavra preto só significa o que significa em relação a outras cores. Ou seja, toda palavra ou imagem é um signo que só tem significado por causa da sua própria relação com outros signos. Porém, para Pierce, todos os signos possuem uma estrutura comum – que liga o significante ao referente e ao significado – mas nem por isso eles são idênticos. "Uma palavra não é a mesma coisa que uma fotografia ou um vestido, um painel rodoviário, uma nuvem, uma postura, etc. e no entanto todos podem significar algo diverso de si próprios e constituir-se portanto como signos." (JOLY, 1994, p.38)

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SAUSSURE, Ferdinand. Curso de Linguística Geral. Paris: Payot, 1916

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Com base nisto, Pierce separou e classificou os signos em três grandes tipos: o ícone, o índice e o símbolo. Joly ilustra: “O ícone corresponde à classe dos signos cujo significante mantém uma relação de analogia com aquilo que ele representa, ou seja, com o seu referente. Um desenho figurativo, uma fotografia, uma imagem de síntese representando uma árvore ou uma casa são ícones na medida em que eles se assemelham a uma árvore ou a uma casa. [...] O índice corresponde à classe dos signos que mantém uma relação causal de contigüidade física com aquilo que eles representam. É o caso dos signos ditos naturais como a palidez para a fadiga, a fumaça para o fogo, a nuvem para a chuva, mas também a pegada deixada por uma pessoa na areia ou pelo pneu de um carro na lama. Por fim, o símbolo corresponde à classe de signos que mantém com o seu referente uma relação de convenção. Os símbolos clássicos, tais como as bandeiras para os países ou a pomba para a paz, entram nesta categoria, o mesmo sucedendo com a linguagem, considerada aqui como um sistema de signos convencionais.” (JOLY, 1994, p. 38 e 39)

Conforme Costa e Raposo (2010, p.11) “os signos em geral têm uma variedade infinita, inesgotável, e uma só lei os define: signo é tudo aquilo que significa. Do ponto de vista da semiótica, signum tem diversas acepções: sinal, marca, índice, rasto, impressão, sintoma, símbolo, selo, etc.” Para estes dois autores, cada signo tem um significado, um som e uma história. Santaella (2004) é bastante sucinta ao articular que “o nome semiótica vem da raiz grega semeion, que quer dizer signo” e que “semiótica é a ciência dos signos.” A autora completa dizendo que “o signo é uma coisa que representa uma outra coisa: seu objeto” e exemplifica: “A palavra casa, a pintura de uma casa, o desenho de uma casa, a fotografia de uma casa, o esboço de uma casa, um filme de uma casa, a planta baixa de uma casa, a maquete de uma casa, ou mesmo o seu olhar para uma casa, são todos signos do objeto casa. Não são a própria casa, nem a idéia geral que temos de casa.” (SANTAELLA, 2004, p.12)

Segundo os principais autores, a semântica é considerada uma ciência relativamente recente. Ela está diretamente ligada à linguística e, de acordo com Stephen (1973) estuda o significado das palavras. Conforme Cançado (2008, p.16), semântica é o ramo da linguística voltado para a investigação do significado das

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sentenças. Para ela, o conhecimento semântico que o falante tem de sua língua faz com que ele saiba, por exemplo, quando duas sentenças diferentes descrevem a mesma situação e quando se referem a situações contraditórias. Para Jury (2000), a semântica trata da maneira como manipulamos a linguagem para que faça sentido. E completa: “Sempre que nos é possível, procuramos estruturar e/ou classificar a nossa informação para torná-la mais acessível. O tipógrafo recorrerá ao alinhamento, justaposição, distinções hierárquicas e às convenções da leitura sancionadas, bem como às competências da arte tipográfica para assegurar que o sentido das palavras é apreensível.” (JURY, 2000, p. 78)

Schaff (1968) recorre à publicação de Michel Bréal, Essai de Sémantique, Science des Significations, para definir a ciência: “Para Bréal, a semântica era a ciência cujo objeto consistia em estudar a causa e a estrutura dos processos de mudanças nas significações das palavras.” (apud BRÉAL, 1904, p. 8)

4 RELAÇÃO TIPOGRAFIA X SEMÂNTICA Como vimos no capitulo anterior, a semântica estuda o significado das palavras e a maneira como manipulamos a linguagem para que ela faça sentido. A tipografia comunica através de palavras. Segundo Góis (2004) a tipografia é o elo visível da ligação da forma visual à linguagem, ao dar atenção a si própria antes de ser lida. “As variantes na sua forma e na sua orientação podem não ser mais do que variantes formais, mas a verdade é que as letras podem ter diferentes características formais sem deixar de ser conhecidas como letras, sendo por isso que existe uma quantidade enorme de fones disponíveis no nosso mercado.” (Góis, 2004, p. 22)

Atualmente, diferentes combinações de formas gráficas vêem sendo utilizadas como uma nova linguagem. Góis (2004, p.10) ainda coloca que “a procura de transmissão de conteúdos fonéticos e de ideias nos revela uma nova escrita formalizada na abreviação e na utilização de novos mecanismos de transmissão de estados de espírito e sentimentos.”

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Para Ellen Lupton (2006), a tipografia transformou o texto em uma coisa, em um objeto material com dimensões conhecidas e localizações fixas. Ela cita Walter Ong (1981) ao referir-se à imprensa como responsável pela transformação da palavra em um objeto: Contudo, Pereira Garcez (2014), diz que “ao criar um tipo de letra, o gráfico, calígrafo, tipógrafo, designer ou comunicador gráfico está a transformar traços e desenhos em formas concretas, que resultam em signos precisos, cada traço ou desenho é uma unidade indivisa e irredutível.” Já, o renomado designer de tipos, Adrian Frutiger (2002) faz uma curiosa analogia entre a carroceria dos carros e os tipos sans serif – criados, em meados do século XX, devido à necessidade de uma nova forma de letra básica destinada à impressão e comunicação contemporâneas – e diz que “em certos âmbitos do design, a sensibilidade diante as formas é muito perspicaz: assim, por exemplo, uma pessoa apaixonada por carros distinguirá imediatamente qualquer mudança, por mínima que seja, no formato de uma carroceria.” Para ele, é possível observar um fenômeno similar em relação a forma de uma letra tipográfica. “Graças à invenção das tecnologias contemporâneas de criação de caracteres digitais, o ritmo de renovação de um tipo básico (de leitura) acelerou consideravelmente, mas ainda muito mais lento que o da carroceria de um veículo.” (FRUTIGER, 2002, p. 30)

Figura 01: Analogia de Adrian Frutiger, Carros x Tipografia. Fonte: FRUTIGER, Adrian. Em torno de La Tipografia, 2002.

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Frutiger também compara a escrita com calçados, e exemplifica sua teoria da seguinte maneira: Na Figura 02, o sapato clássico, elegante e cômodo, é comparado com a fonte Garamond, do século XVI. O sapato esportivo é comparado à Excelsion Standard, utilizada para textos longos – equiparando que ambos são adequados para longas distâncias (de leitura e de percurso). Por último, o sapato do dia-a-dia, robusto e semelhante aos tipos sans serif do século XX, usados com frequência em anúncios e cartazes.

Figura 02: Analogia de Adrian Frutiger, Sapatos x Tipografia. Fonte: FRUTIGER, Adrian. Em torno de La Tipografia, 2002.

Para Spiekermann, muitas vezes as letras têm a árdua tarefa de comunicar fatos lógicos e/ou vestir as palavras para fazê-las parecer mais agradáveis. Ele, assim como Frutiger, também faz uma interessante analogia com sapatos e tipos: “Ninguém usaria os mesmos sapatos para dançar, correr um quilômetro, escalar uma montanha e caminhar até o escritório – ao menos, não muitas pessoas o fariam. Enquanto os seus pés podem permanecer com quase a mesma forma, eles precisam de diferentes tipos de suporte, proteção e, de fato, melhoram no desempenho dessas tarefas e de muitas outras.” (SPIEKERMANN, Erik, 2011, p. 43)

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Spiekermann, ainda, instiga o leitor a combinar determinadas tipografias com sapatos de diferentes épocas e estilos, como um quebra-cabeça. Vale ressaltar que, devido à limitação de itens apresentados na experiência proposta pelo autor, as combinações se tornam razoavelmente prováveis. Porém, é possível obter interpretações diferentes das apresentadas. O resultado é bastante interessante, e, podemos vê-lo aqui:

Figura 03: Analogia de Erik Spiekermann, Sapatos x Tipografia. Fonte: SPIEKERMANN, Erik. A linguagem visual da Tipografia, 2011.

No livro Design e Tipografia, Saltz fala sobre o conteúdo emocional sugerido pelo texto, com base na tipografia. Para ela, a forma das letras pode ampliar o peso emocional do texto, ou seja, “o traçado delicado de uma itálica fluida pode conduzir melhor um poema sobre a natureza, a estrondosa aclamação de uma pesada slab serif pode esquentar um pronunciamento político.” (SALTZ, Ina, 2009, p.14)

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Figura 04: Anúncio página dupla usado como exemplo de bom design, onde a tipografia e as cores utilizadas transmitem “diversão”, do inglês “fun”. Fonte: SALTZ, Ina. Design e tipografia, 2009.

Com base na declaração da autora, entendemos que a escolha apropriada da tipografia é essencial ao caráter da mensagem e pode atribuir qualidades ou, quando mal aplicada, depreciar a credibilidade do texto.

Para Hyndman (2015, p.38) a tipografia pode funcionar como um transmissor de voz humana e comunicar os tons e as qualidades da voz visualmente. Com base neste pensamento, ela organizou um questionário online onde perguntou como as fontes tipográficas Cinema, Bodoni, Klute e VAG Rounded, soariam se fossem música. Cinema, com suas formas geométricas quadradas e terminações retas, foi associada à música eletrônica (auto-tuned, techno, industrial, etc.) e transmitiu ansiedade e inquietação. Bodoni transmitiu calmaria e alegria, sendo associada à música clássica, ao jazz e ao som melódico. Da mesma forma que a Cinema, a tipografia Klute comunicou ansiedade, porém, foi associada ao funk, punk e aos estilos musicais mais pesados. Por último, a fonte VAG Rounded foi associada a sons relaxantes, suaves e alegres, comunicando tranquilidade de acordo com os entrevistados. O resultado completo da pesquisa pode ser visto na imagem a seguir:

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Figura 05: Resultado da pesquisa online de Sarah Hyndman. Fonte: HYNDMAN, Sarah. Type Taster, 2015.

A autora pesquisou pelas mais diversas formas de comunicação visual associadas à tipografia. Hyndman, em mais uma de suas pesquisas online, mostra que uma tipografia rounded e bold está diretamente associada aos sabores doces; enquanto tipografias geométricas e destorcidas lembram sabores cítricos como vemos na imagem a baixo:

Figura 06: Resultado da pesquisa online de Sarah Hyndman. Fonte: HYNDMAN, Sarah. Type Taster, 2015.

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Hyndman foi ainda mais além e, a partir dos resultados obtidos em uma nova pesquisa

elaborada

por

ela,

concluiu

que

fontes

tipográficas

possuem

personalidade. Nesta pesquisa, designers e não-designers responderam questões como "qual profissão esta fonte teria?". Foi concluído que, por exemplo, Helvetica teria uma personalidade neutra e convencional, enquanto Times New Roman seria intelectual e clássico. Observamos, então, um padrão nas interpretações semânticas da tipografia de acordo com o que ela pretende comunicar. Uma fonte bold irá transmitir peso, já uma fonte pequena e delicada irá transmitir leveza. A tipografia, por si só, pode comunicar o que quiser: sentimentos, cheiros, sons, idéias, etc. Não é somente um componente gráfico, é uma ferramenta de transmissão e comunicação.

5 METODOLOGIA Segundo Gil (1987, p.17), pode-se definir pesquisa como o procedimento racional e sistemático que tem como objetivo proporcionar respostas aos problemas que são propostos. Neste artigo, que propõe investigar e compreender o potencial semântico da tipografia, o processo metodológico aplicado em seu desenvolvimento enquadra-se na categoria de pesquisa exploratória com abordagem qualitativa. Para Gil (1987), estas pesquisas têm como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito. Gil (1987, p.41) completa dizendo que, "embora o planejamento da pesquisa exploratória seja bastante flexível, na maioria dos casos assume a forma de pesquisa bibliográfica ou de estudo de caso." No artigo proposto, a pesquisa foi desenvolvida com base em material já elaborado, fundado em livros, teses e artigos científicos.

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6 CONCLUSÃO A tipografia exerceu um papel fundamental para a evolução da comunicação e do design gráfico. Hoje sabemos que parte desta evolução ocorreu devido à necessidade de comunicar e transmitir mais do que oralidade. Após a pesquisa realizada, foi possível compreender que a semântica estuda o significado das palavras e a forma como manipulamos a linguagem. De acordo com os principais autores da área, aqui citados, percebemos que a tipografia é capaz de transmitir simbolismo semântico através de sua forma e aplicação. A forma das letras pode ampliar o peso emocional do texto, como sugere Saltz (2009) e Hyndman (2014); podendo comunicar visualmente sons, sabores, odores, sentimentos, atitudes, etc. Vimos, também, que a interpretação dos signos e, conseqüentemente da tipografia, se dá de pessoa para pessoa a partir de suas memórias. Porém, é possível notarmos um padrão na interpretação destes signos. Ou seja, uma fonte tipográfica rounded, por exemplo, está diretamente associada ao doce, ao infantil e à diversão, enquanto uma fonte tipográfica serifada como a Times New Roman está conexa ao clássico, à sofisticação e à seriedade. O assunto abordado possui um número escasso de referencial teórico publicado e muito a ser discutido e compreendido dada a sua importância e, por tanto, é interessante continuar a investigar o potencial semântico da tipografia e elaborar pesquisas que reforçam e alimentem as conclusões apresentadas aqui. A tipografia continuará a evoluir e a mídia exigirá cada vez mais novas formas de comunicar e transmitir a informação, seja de forma visual ou sensorial. Por isso nós, designers, devemos continuar a pesquisar maneiras de manipular a tipografia para comunicar sempre de forma eficaz.

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REFERÊNCIAS Livros BRINGHURST, Robert. Elementos do estilo tipográfico. São Paulo: Cosac Naify, 2005. COSTA, RAPOSO, Joan, Daniel. A Rebelião dos Signos: A alma da letra. Lisboa: Dinalivro, 2010. GIL, Antonio. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2002. HYNDMAN, Sarah. Type Taster. Type Tasting, 2015. JOLY, Martine. Introdução à Análise da Imagem. Lisboa: Éditions Nathan, 1994. JURY, David. O que é a tipografia? Barcelona: Gustavo Gili, 2000 LUPTON, Ellen. Pensar com Tipos: Guia para designers, escritores, editores e estudantes. São Paulo: Cosac Naify, 2006. MEGGS, Philip. História do Design Gráfico. São Paulo: Cosac Naify, 2009. NAZARIAN, Elisa. Como criar em Tipografia: Design Museum. Belo Horizonte: Gutemberg: 2011. SALTZ, Ina. Design e tipografia: 100 fundamentos do Design com tipos. São Paulo: Edgard Blucher, 2009. SANTAELLA, Lúcia. O que é a Semiótica. São Paulo: Brasiliense, 2004. SCHAFF, Adam. Introdução à semântica. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. STEPHEN, Ullmann. Semântica: Uma introdução à ciência do significado. Lisboa: Fundação Calouste Gulbekian, 1973.

Dissertações e Teses GÓIS, Pedro. A Significação dos Signos Tipográficos no Discurso Gráfico. Universidade de Barcelona, dez. 2004. PEREIRA GARCEZ, Rafaela. A face das Letras: Uma exploração através de sinestesias visuais. Instituto de Arte, Design e Empresa (IADE-U), dez. 2014.

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