O procedimento dos juizados especiais na perspectiva principiológica do Novo CPC

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O procedimento dos juizados especiais na perspectiva principiológica do novo Código de Processo Civil: contraditório e motivação das decisões como alicerces do devido processo legal

Antonio Veloso Peleja Júnior* Humberto Santarosa de Oliveira** Sumário: 1. Considerações Iniciais – 2. Os princípios informadores dos Juizados Especiais – 3. A participação na visão do novo CPC: o contraditório dinâmico – 4. A adesão da perspectiva participativa como elemento informativo da principiologia dos juizados: contraditório e motivação como base do devido processo legal – 5. Conclusão – 6. Bibliografia

1. Considerações Iniciais

A busca do cidadão pela Justiça é um fenômeno mundial. À falência do modelo do Estado Liberal, que se caracterizava por uma justiça formal e pelo absenteísmo estatal quanto aos direitos sociais, seguiu-se o Estado Social, Welfare State, que reconheceu os direitos sociais, como os trabalhistas e os previdenciários. Nesse contexto, a inação estatal na concretização desses direitos, o modelo econômico dinâmico e a massificação das relações decorrente da produção em massa, inflamaram a sociedade na busca pelo Judiciário para efetivar os seus direitos. O Projeto de Florença, capitaneado por Mauro Cappelletti e Brian Garth1, mostrou-se como um divisor de águas no estudo da teoria e da prática judiciária mundial. As ondas renovatórias de acesso à justiça representaram um minucioso estudo dos pontos de estrangulamento que atingiam a população quando da procura pelo Estado para a resolução de seus conflitos. A gratuidade da justiça para os pobres, a representação dos interesses difusose os novos instrumentos de tutela visando a celeridade, a eficiência e, consequentemente, a melhor prestação jurisdicional, foram as três vertentes analisadas no

*. Mestre em Direito Processual pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Professor Universitário. Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Mato Grosso. ** Mestre em Direito Processual pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Advogado. 1 CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Brian. Acesso à Justiça. Tradução Ellen Gracie. Northfleet. Porto Alegre: Fabris, 1988.

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meticuloso estudo. O objetivo era converter “o que seria uma simples garantia formal do direito de ação em uma garantia substancial de acesso à justiça – entendida como acesso à ordem jurídica justa”2. O Brasil, todavia, não passou por um processo de amadurecimento individualizado das três ondas suscitadas. O próprio desenvolvimento atrasado da redemocratização, final dos anos 80 do século passado, é uma comprovação da assertiva.3 Até então, a busca por justiça encontrava-se em estado de pré-letargia, tendo se intensificado, entretanto, após a promulgação da Constituição de 1988. No limiar da década de 90 do séc. XX, o volume de processos submetidos ao crivo do Judiciário aumentou exponencialmente, inviabilizando as atribuições do Poder cuja função é distribuir a Justiça – fenômeno nominado por Kazuo Watanabe de litigiosidade contida. Como contrapartida aos obstáculos ao acesso à justiça, a edição de normas para combater o problema foi uma das soluções encontradas. O panorama iniciou-se, porém, antes mesmo da promulgação da Constituição de 1988, quando já se verificavam lampejos reformistas visando o acesso à justiça em terras brasileiras, do que é exemplo é a lei da ação civil pública (Lei 7.347/85). O processo civil tenta se desenvolver com a mesma rapidez das exigências sociais, que se multiplica em progressão geométrica, exigindo do Poder Judiciário, que evolui em progressão aritmética, soluções rápidas, céleres e eficientes. Dentre as medidas, duas normas merecem seu devido destaque: a Lei 7.244, de 7 de novembro de 1984, que criou os juizados de pequenas causas, bem como a Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995, que inaugurou os juizados especiais cíveis e criminais. A identidade entre os conteúdos de ambas as leis conduziu ao entendimento predominante de que a segunda das normas suscitadas revogou a primeira, uma vez que, além de incorporar suas determinações, ampliou suas diretrizes políticas e normativas.4

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GALDINO, Flávio. A evolução das idéias de acesso à Justiça. In: SARMENTO, Daniel; GALDINO, Flávio (Orgs.). Direitos fundamentais: Estudos em homenagem ao Professor Ricardo Lobo Torres. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 449.. 3 Nas palavras do Ministro Barroso, o Brasil é um país de democratização tardia (“Nos estados de democratização mais tardia (...) e, sobretudo, o Brasil, (...)”), em BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e a constitucionalização do Direito (O triunfo tardio do direito constitucional no Brasil), Revista de Direito Administrativo, nº 240, 2005, p. 19. Disponível eletronicamente em http://www.direitodoestado.com.br/artigo/luis-roberto-barroso/neoconstitucionalismo-e-constitucionalizacao-dodireitoo-triunfo-tardio-do-direito-constitucional-no-brasil. 4 A respeito, ver FUX, Luiz. A ideologia dos juizados especiais. In: Revista de Processo. São Paulo: RT, vol. 86, abr. 1997, p. 204 e seguintes.

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O aspecto social que sustentou a criação dos juizados de pequenas causas e, posteriormente, os juizados especiais, este último com espeque constitucional (art. 98, I, da CRFB/88), é elemento que dispensa comentários. Possibilitar aos cidadãos o amparo jurisdicional para dirimir problemas cotidianos não interessantes à morosa jurisdição ordinária, e isto por meio de procedimentos simplificados e rápidos, com foco na resolução amistosa do conflito,5 é corolário da cidadania democrática. Justamente por isso que os principais valores que nortearam a criação dos juizados especiais são a celeridade e a simplicidade dos procedimentos.6 O excesso de solenidade na prática dos atos processuais e a morosidade da resposta judicial eram os vilões a serem combatidos dentro de uma procedimentalização pensada para a resolução de casos de menor complexidade, na qual os pequenos e imanentes problemas de uma sociedade cada vez mais complexa pudessem ter uma rápida solução de sua controvérsia. A deformalização do procedimento dos juizados especiais é materializada no art. 2º, Lei 9099/95, que proclama os princípios da “oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade”, como os alicerces orientativos. Mas, ainda que criado na romântica visão de alcance de uma “resposta judicial tempestiva, adequada e justa”7, a estrutura basilar dos juizados merece um necessário apontamento: se a legislação permite ao autor eleger o tribunal que pretenda litigar8 – lembrando que as causas inseridas na competência dos juizados são também oponíveis nos tribunais comuns –, se a eventual escolha pelo juizado especial pelo autor impõe ao réu uma série de restrições aos direitos assegurados pela lei adjetiva cível – dentre as quais, a limitação ao direito de recorrer (v.g., as decisões interlocutórias são irrecorríveis) e de produzir provas (não se admite a produção da prova pericial9) –, bem como uma série de benesses ao autor –

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LUCON, Paulo Henrique dos Santos. Juizados Especiais Cíveis: aspectos polêmicos. In: Revista de Processo. São Paulo: RT, vol. 90, abr. 1998, p. 175. 6 Neste sentido, FUX, Luiz. Juizados Especiais – um sonho de justiça. In: Revista de Processo. São Paulo: RT, vol. 90, abr. 1998, p. 151 e seguintes; ver também WAMBIER, Luiz Rodrigues. Apontamentos sobre os juizados especiais cíveis. Op. cit.. 7 O excerto destacado é de FUX, Luiz. Juizados Especiais – um sonho de justiça. Op. cit.. Os termos destacados são variantes de uma expressão mais, qual seja, “acesso à ordem jurídica justa”, cuja autoria é atribuída ao professor Kazuo Watanabe, em Acesso à justiça e sociedade moderna. In: Participação e processo. Coord. Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco e Kazuo Watanabe. São Paulo: RT, 1988, p. 135. 8 Essa eleição do foro não se verifica nos casos sob a égide da lei 10.259/2011, que em seu art. 3º, preleciona como atribuição dos juizados especiais federais “processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar suas sentenças.”. 9 E apesar da produção probatória representar um corolário do princípio do contraditório, cuja visão contemporânea é o alicerce deste texto (GRECO, Leonardo. Garantias Fundamentais do Processo: O Processo Justo. In: Estudos de Direito Processual. Campos dos Goytacazes: Faculdade de Direito de Campos, 2005, e ainda do mesmo autor, O princípio do contraditório. In: Revista Dialética de Direito Processual, n. 24, mar.

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como o não pagamento de custas judiciais e honorários de sucumbência, exceto quando houver recurso da sentença –, é certo que a gama de valores que irradiam o simplificado procedimento dos juizados não pode ofuscar o princípio do contraditório no que se refere aos seus aspectos participativo e direito de influência. O novo Código de Processo Civil, cujo texto confere grande importância à participação das partes, inclusive auxiliando o magistrado na construção da decisão judicial, a releitura dos pressupostos dos juizados especiais à luz da legislação em gestação não poderia deixar de observar o consagrado contraditório dinâmico e o dever do juiz em expor suas razões de decidir.

2. Os princípios informadores dos Juizados Especiais Os “princípios-vetores” a direcionar a atividade processual-procedimental – que consoante Elio Fazzalari são uma só realidade, pois processo é procedimento em contraditório10 – estão sedimentados no artigo 2º, Lei 9.099/95, segundo o qual o processo se orientará pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação. O alongado tempo de tramitação processual se traduz em tríplice prejuízo: a) para a credibilidade do judiciário; b) para o titular do direito material; c) para a própria sociedade que não pode contar com uma resolução expedita que traga um “ponto final” à controvérsia. 2005), a doutrina e jurisprudência aceitam com boa parcela de parcimônia esta restrição. Merece registro, todavia, que apesar de não se admitir a prova pericial nos moldes como previstos no CPC/73, admite-se a convocação de um expert para que se manifeste sobre o objeto litigioso ou os fundamentos que influam na decisão. Neste sentido, THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – procedimentos especiais. Rio de Janeiro: Forense, vol. III, 2000, 31ª ed., p. 436. “A prova técnica é admissível no Juizado Especial, quando o exame do fato controvertido a exigir. Não assumirá, porém, a forma de uma perícia, nos moldes habituais do Código de Processo Civil. O perito escolhido pelo Juiz será convocado para a audiência, onde prestará as informações solicitadas pelo instrutor da causa (art. 35, caput). Se não for possível solucionar a lide à base de simples esclarecimentos do técnico em audiência, a causa deverá ser considerada complexa. O feito será encerrado no âmbito do Juizado Especial, sem julgamento do mérito, e as partes serão remetidas à justiça comum. Isto porque os Juizados Especiais, por mandamento constitucional, são destinados apenas a compor 'causas cíveis de menor complexidade' (CF, art. 98, inc. I)”. Interessante observar que a inquirição de “peritos” como testemunha, situação admitida por expressa disposição da Lei 9.099/95, equipara-se ao expert witness norte-americano. 10 Neste sentido, comenta o autor: “Se, pois, procedimento é regulado de modo que dele participem também aqueles em cuja esfera jurídica o ato final é destinado a desenvolver efeitos – de modo que o autor dele (do ato final, ou seja, o juiz) deve dar a tais destinatários o conhecimento da sua atividade, e se tal participação é armada de modo que os contrapostos ‘interessados’ (aqueles que aspiram a emanação do ato final – ‘interessados’ em sentido estrito – e aqueles que queiram evitá-lo, ou seja, os ‘contra-interessados’) estejam sob plano de simétrica paridade, então o procedimento compreende o ‘contraditório’, faz-se mais articulado e complexo, e do genus ‘procedimento’ é possível extrair a species ‘processo’”, cfr. FAZZALARI, Elio. Instituições de Direito Processual Civil. 1ª ed., Tradução de Elaine Nassif. São Paulo: Bookseller, 2006, p. 94.

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O processo, neste contexto, deve-se afastar de abstrações teóricas para proteger direitos concretos e efetivos. Deve-se deformalizá-lo, simplificá-lo, porque os custos do procedimento e a complexidade são obstáculos para a efetividade, o que justifica a gratuidade do procedimento dos juizados em primeiro grau de jurisdição. A emergência dos princípios no processo sobrepõe-se às simples regras infraconstitucionais. Há, então, uma mudança de paradigma: o direito é mais flexível e menos rígido, de excessivamente estático transmuda-se para dinâmico11. Apesar dessas mudanças de paradigmas, não pode ser esquecido o caro princípio do devido processo legal que se conecta com o formalismo-valorativo, porque os critérios de informalidade e de flexibilidade procedimental não são sinônimos de balbúrdia processual. Aceleração não pode ser sinônimo de açodamento porque devem ser observadas as garantias do processo em prol de uma “justiça social” que é a marca registrada do Estado Democrático de Direito12. Pois bem. O princípio da oralidade, nesse contexto, induz a uma justiça humanizada, dialogada, porque o uso da palavra oral e o contato do juiz com as partes pode assegurar a estas o direito de influir eficazmente na decisão13. A oralidade, como garantia fundamental do processo, é uma imposição do contraditório participativo14. Ela tem que ser concebida sob um dúplice aspecto: a) como a predominância da palavra oral sobre a escrita; b) com o significado de que o juiz tem que estar sempre aberto à instauração de um diálogo humano que pode assegurar o contraditório participativo e o direito das partes de influir eficazmente nas decisões. É evidente que a predominância da palavra oral tem forte componente da celeridade porque o trâmite se desburocratiza permitindo-se resultados mais rápidos. A oralidade traz a reboque, como decorrência lógica, os subprincípios da imediação, da concentração e da identidade física do juiz, que formam o chamado sistema da oralidade. Pela imediação o juiz coloca-se em contato direto com as partes e pode melhor auferir as provas que irão formar a sua convicção no momento do julgamento. Dela decorre a identidade física do juiz, de acordo com o qual o juiz que iniciou a instrução oral na audiência deve 11

OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. O formalismo-valorativo no confronto com formalismo excessivo. Disponível em: http://www.ufrgs.br/ppgd/doutrina/CAO_O_Formalismovalorativo_no_confronto_com_o_Formalismo_excessivo_290808.htm, acessado em 20.09.2014, p. 05-06. 12 FARIAS, Cristiano Chaves. Os juizados especiais cíveis como instrumento de efetividade do processo e a atuação do Ministério Público. Revista de Processo, volume 117, p. 135, setembro de 2004. 13 GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil, Introdução ao Direito Processual Civil, volume I, 3ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 470. 14 Idem, p. 470.

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prolatar a sentença por ter colhido a prova e, por isso, ter melhor convencimento para exarar o ato judicial maior (sentença). A concentração dos atos processuais induz a uma audiência una em que todos os atos orais sejam realizados em um curto espaço de tempo15. O segundo dos “princípios” mencionados no artigo 2º, Lei 9.099/95, é o princípio da simplicidade, decorrência lógica do princípio da informalidade. Ele traduz a ideia de que o procedimento dos juizados deve ser simples, direto e claro, em uma série concatenada, concentrada e enxuta de atos processuais rumo à prolação da sentença. O escopo do legislador ao inserir tal princípio foi o de elaborar um procedimento mais simples do que o rito ordinário, guardadas as proporções devidas com as causas menos complexas, objeto dos juizados especiais, mas que fosse suficiente para garantir o devido processo legal. Apesar da simplicidade, o procedimento deve ser suficiente para que o juiz prolate uma sentença que prime pela observância da segurança jurídica e pelos princípios constitucionais do processo – em suma, um devido processo legal. A esse respeito, o próprio acesso à justiça é facilitado ao se permitir o início do processo independentemente da presença de um advogado, não obstante as árduas discussões que surgiram a esse respeito. Mas para tanto impõe-se um desenho procedimental menos abstruso, de forma que o cidadão-parte possa compreender o sistema no qual está inserto e usufruir de todos os direitos que lhe são assegurados, garantindo-se, assim, a adequada proteção do seu “direito material”. A informalidade representa a relativização da formalidade. Observa-se que a intenção não é extirpar as formas, de vez que o processo há de ter um rito a ser seguido. O objetivo é decotar o excesso de formalismo, a fim de prestigiar a mais rápida proteção do direito subjetivo.16 O formalismo excessivo deve dar lugar ao formalismo-valorativo. A rigidez excessiva do órgão judiciário não mais é condizente com o estágio atual do desenvolvimento processual, ainda mais com o rito dos juizados especiais.No conceito de formalismo processual insere-se “A concentração prega a convergência de todos os atos orais em uma única audiência, ou, quando isso não seja possível, que todas as audiências sejam realizadas num curtíssimo intervalo de tempo. A concentração de atos orais,como a tentativa de conciliação, a tomada dos depoimentos e das alegações finais orais dos advogados, coloca o juiz numa posição privilegiada, na medida em que a sua cognição foi amplamente enriquecida pelo contato humano”, cfr. GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil, Introdução ao Direito Processual Civil, volume I, 3ª edição, Rio de Janeiro, 2011, Grupo GEN, Editora Forense, p. 477. 16 Destaca-se que formalismo não se confunde com a forma do ato processual porque diz respeito à totalidade formal do processo, “compreendendo não só a forma, ou as formalidades, mas especialmente a delimitação dos poderes, faculdades e deveres dos sujeitos processuais, coordenação de sua atividade, ordenação do procedimento e organização do processo, com vistas a que sejam atingidas suas finalidades primordiais”, cfr. OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. O formalismo-valorativo no confronto com formalismo excessivo. Op. cit., p. 01. 15

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a ideia de processo como organização da desordem – prática de atos ao tempo e modo adequados –, conferindo-se previsibilidade ao procedimento e evitando-se a arbitrariedade e a parcialidade do órgão judicial, ou mesmo a chicana do adversário17. A economia processual traduz o máximo de resultado com o mínimo de emprego de energia. Por seu intermédio evita-se a prática de atos inúteis, ferindo justamente a regra da economia processual. Conecta-se à essência procedimental dos juizados que se traduz pela concentração dos atos, pela oralidade, informalidade e pela simplicidade. Externa-se, na prática, quando não se admite a reconvenção, mas sim pedido contraposto; pela conciliação, contestação, instrução e julgamento na mesma solenidade ou, se inviável para a defesa, no prazo máximo de 15 (quinze) dias; pela impossibilidade de produções probatórias complexas, como a perícia, entre outras. A celeridade manifesta uma atuação rápida do Poder Judiciário com a entrega da prestação jurisdicional em tempo diminuto. O objetivo é a prática otimizada dos atos processuais, evitando-se os “prazos mortos” que em muito contribuem para a morosidade. Liga-se à duração razoável do processo, que, por sua vez, é princípio correlato ao acesso à justiça, e constitui direito humano positivado na Constituição Federal (art. 5º, LXXVIII); seu escopo é a entrega tempestiva da resposta jurisdicional estatal de molde que tenha utilidade no mundo dos fatos, garantindo àquele que tem o direito material a possibilidade de fruição, nos moldes da máxima suum cuique tribuere (dar a cada um o que é seu).18 Pois bem, pela análise dos princípios previstos no art. 2º da Lei dos Juizados Especiais, é possível perceber que os seus objetivos são a conciliação e a transação. E diferente não poderia ser: a melhor tutela dos direitos é alcançada na solução da controvérsia através do comum acordo entre as partes. A cultura da conciliação indica a institucionalização de novas formas de participação na administração da justiça e de gestão racional dos interesses. A par disso, também indica maior conscientização política19. Assim, os métodos de solução de controvérsia mostram-se

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OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. O formalismo-valorativo no confronto com formalismo excessivo, Op. cit., p. 01. Somente a título de ilustração, a informalidade que grassa nos juizados possibilita, inclusive, o julgamento por equidade (Lei 9.099/95, arts. 5º e 6º), bem como o pedido genérico (art. 14, § 2º, Lei 9.099/95). 18 A máxima era muito utilizada pelos processualistas clássicos, para quem o processo deve assegurar ao vencedor tudo aquilo que ele tem direito de receber. Neste sentido, CHIOVENDA, Giuseppe. Saggi de Diritto Processuale Civile. Roma, 1930, v. 1, p. 110. 19 GRINOVER, Ada Pelegrini. A conciliação extrajudicial no quadro participativo. In: Participação e processo, Coord. Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Kazuo Watanabe. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 278.

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como eficientes técnicas de participação da sociedade no Poder Judiciário, concretizando os vetores interpretativos dos juizados, além de conferir maior credibilidade da justiça. Todavia, repisa-se, a principiologia dos juizados exige o respeito ao devido processo legal, e para tanto, o respeito ao contraditório e à motivação das decisões judiciais é essencial. A informalidade, a celeridade ou mesmo a simplicidade não podem ser interpretados como elementos de sobreposição às garantias suscitadas. Neste sentido, mostra-se importante as previsões inseridas no novo Código de Processo Civil, cuja essência deve ser transposta para o rito dos juizados especiais. É o que se passa a expor.

3. A participação na visão do novo CPC: o contraditório dinâmico

Expostas as considerações acerca das normas processuais em vigor nos juizados especiais, é necessário correlacioná-las com as normas a se formar, notadamente o CPC de lege ferenda. O novo Código de Processo Civil tem em seus primeiros dispositivos, capítulo intitulado “Normas Fundamentais do Processo Civil”, os vetores interpretativos que devem permear a aplicação de todos os demais artigos da lei em formação. Observa-se que celeridade, isonomia, efetividade e participação, em alinhamento às demais garantias fundamentais do processo,20 conformam a alicerce valorativo do novel processo civil. E para alcançar o escopo de uma base principiológica coerente com o atual estágio de desenvolvimento do direito e da sociedade, a perspectiva democrática foi, certamente, a principal fonte de inspiração do legislador reformista. Dos dispositivos que compõem as normas fundamentais do processo civil, aqueles que ressaltam a garantia do contraditório são, certamente, os que mais tangenciam o viés participativo exigido pelo ideal democrático. A perspectiva contemporânea do princípio que assegura a participação das partes no desenvolver do processo tem, entre suas exigências, duas vertentes quase que complementares: a garantia de influência21 e a vedação às decisões surpresa22.

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Sobre as garantias fundamentais processuais ver GRECO, Leonardo. Garantias fundamentais do processo: o processo justo. In: Estudos de Direito Processual. Campos dos Goytacases: Faculdade de Direito de Campos, 2005, p. 225-286, e ainda COMOGLIO, Luigi Paolo. Garanzie minime del ‘giusto processo’ civile negli ordinamenti ispano-latinoamericani. In: Revista de Processo. São Paulo: RT, vol. 112, out-dez de 2003, p. 159176; Il "giusto processo" civile nella dimensione comparatistica. In: Revista de Processo. São Paulo: RT, vol. 133, out de 2002, p. 133 e seguintes. 21 A respeito ver CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório, Proteção da Confiança e Validade Prima Facie dos Atos Processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

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A primeira delas é corolário de uma participação efetiva, afinal somente quando as manifestações dos sujeitos processuais tiverem possibilidade de condicionarem os julgadores no processo de formação da decisão a ser tomada é que o contraditório seria concretizado; todavia, a sua concretização somente pode ser aferida em momento posterior, através das razões de decidir. Já a segunda delas, a qual se qualifica como uma antecessora ao direito de influir, reza que “é vedado ao juiz, em qualquer grau de jurisdição, decidir com base em fundamento a respeito do qual não se tenha oportunizado manifestação das partes, ainda que se trate de matéria apreciável de ofício.”23. A ideia é permitir que as partes sempre tenham condições de apresentar suas posições antes da decisão do juiz, mesmo porque a efetiva participação apenas é aferida se os argumentos dos sujeitos do processo foram analisados na decisão. Esta mudança de perspectiva, ocorrida no segundo quartel do século XX, abandona uma compreensão estática do contraditório para entendê-lo em sua vertente democrática, a qual exige a participação do cidadão em todo e qualquer ato componente do processo de deliberação estatal, inclusive na seara judiciária. Mas, é óbvio e ululante que a participação somente alcançará suas finalidades se apoiada na paridade de armas entre os litigantes, os quais devem ser probos e leais em suas condutas, cooperando entre si e com o juiz para o resultado final.24-25 Estas variantes colocamse como inerentes à efetiva participação do jurisdicionado, pois são pressupostas do direito de influir – ápice do contraditório dinâmico. O ponto nodal é a dialética. A processualística atual, sob as luzes de um Estado Democrático de Direito, deve permitir o mais amplo diálogo entre as manifestações de autor e réu. É dever do julgador atentar e verificar cada uma das proposições defendidas para, ao

Desde há muito, assim propalava TROCKER, Nicolò. Processo civile e Costituzione – problemi di dirittotedesco e italiano. Milano: Giuffrè, 1974, p. 499-502. Ainda sobre este aspecto do contraditório, NUNES, Dierle José Coelho e THEODORO JUNIOR, Humberto. O Princípio do Contraditório: tendências de mudança de sua aplicação. In: Revista da faculdade de direito do sul de minas. Pouso Alegre, ano XXV, n. 28. Jan/jun. 2009. p. 177-206 e DENTI, Vittorio. Questioni rilevabili d’ufficio e contradditorio. In: Rivista di Diritto Processuale, Padova: CEDAM, 1968. 23 O excerto representa o texto do art. 10, do projeto do novo Código de Processo Civil, remetido de volta da Câmara para o Senado para últimas deliberações antes de eventual aprovação da lei. Para maiores detalhes do texto ver em www.camara.gov.br. 24 Todas estas previsões encontram-se devidamente alocadas no novo Código, vide artigos 5º, 6º e 7º, do Código de Processo Civil em discussão. 25 Para uma melhor inteligibilidade sobre as diversas nuances do contraditório, cfr. GRECO, Leonardo. O princípio do contraditório. In: Revista Dialética de Direito Processual, n. 24, mar. 2005; SCHENK, Leonardo. Cognição Sumária – limites impostos pelo contraditório no processo civil. Rio de Janeiro: Saraiva. 2013, p. 2541; e ainda CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno:Contraditório, Proteção da Confiança e Validade Prima Facie dos Atos Processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2010. 22

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final, sob a influência dos argumentos apresentados, decidir a demanda com fulcro na lei e nos motivos apresentados pelas partes. Mas não é só, para que a participação e a influência sejam plenas, o magistrado tem que justificar a decisão não apenas com os fundamentos discutidos que corroboraram seu pronunciamento, tem também que motivar porque aqueles outros não o convenceram.26 É sobre o influxo destas ideias que toda a atividade judiciária deve ser pensada. Não se pode admitir um procedimento de formação da decisão judicial que impeça aos seus próprios afetados a maior e a mais ampla possibilidade de efetiva e concreta participação. O atual Estado Democrático de Direito não permite uma séria discussão sobre a legitimidade da atuação dos tribunais, sem o pressuposto do contraditório participativo, o qual deve ser lido e compreendido sob sua perspectiva dinâmica, a qual vem consagrada no novo Código de Processo Civil.

4. A adesão da perspectiva participativa como elemento informativo da principiologia dos juizados: contraditório e motivação como base do devido processo legal

A simplificação do procedimento dos juizados especiais não significa, e nem poderia, o abandono do diálogo entre as partes. O processo sempre teve como essência a dialética – ainda que esta concepção tenha ficado em segundo plano por alguns períodos da história27 –, perspectiva esta que não pode ser encarada com fins dilatórios e formalistas. O contraditório deve ser visto como auxílio ao magistrado no alcance da decisão, mesmo porque é por meio das informações trazidas pelas partes que o juiz obterá maiores e melhores subsídios para decidir o conflito, alcançando, assim, a melhor resposta.

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Este é o cerne da completude da motivação judicial, segunda a qual uma adequada e completa motivação judicial pressupõe não apenas a apresentação de argumentos que corroborem ou demonstrem a correção das escolhas feitas pelo magistrado, mas também é necessário apontar justificativas que indiquem os motivos pelos quais outros fatos ou outros direitos discutidos foram relegados. A respeito ver TARUFFO, Michelle. La motivación de la sentencia civil. Trad.: Lorenzo Córdova Vianello. Madrid: Trotta, 2011, p. 394-395; do mesmo autor, La motivación de la sentencia. Trad. de Maximiliano Aramburo Calle. In: Paginas sobre justicia civil. Madrid: Marcial Pons. 2009, p. 522. 27 Grande exemplo é a Alemanha nazista dos anos 30. Sobre o tema ver PICARDI. Nicola. Audiatur et altera pars: as matrizes histórico-culturais do contraditório. In: Jurisdição e Processo. Trad. Carlos Alberto Alvaro de Oliveira. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 140. O autor italiano cita passagem da obra de Emilio Betti (Diritto Processuale Civile, 1936), que afirma a possibilidade de se alcançar uma solução justa do processo sem o diálogo das partes. Em outro texto, PICARDI, Nicola. Il Principio del Contraddittorio. In: Rivista di Direitto Processuale. Padova: CEDAM, 1998, p. 673-681, p. 677, o autor afirma que Carnelutti (Lezioni de diritto processuale civile, 1936) também advogava em relação à prescindibilidade do contraditório, que, na sua visão, poderia ser útil quando existente razão para manifestação das partes, do contrário, se mostraria como um estorvo.

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A dialética processual se justifica por um motivo óbvio: a vivência dos fatos que serão subsumidos nas normas jurídicas foi experimentada pelas partes; excluí-las do procedimento, não permitindo a possibilidade de sua manifestação, significa o desvirtuamento da democracia, o abandono do elemento participativo no processo. Calcado neste raciocínio prático, a inteligibilidade do contraditório dinâmico como ponto de partida para qualificar o processo como legítimo não se afasta dos procedimentos dos juizados especiais. Ao contrário, a observância e o respeito de suas concepções devem ser ainda mais assegurados na medida em que a simplificação do processo denota a supressão de outros direitos e garantias das partes. Assim, e conforme já analisado, é proibido ao magistrado decidir com base em questões que não foram dadas as partes oportunidades de manifestação. Na mesma toada, as partes devem auxiliar o juiz na construção do pronunciamento, ou seja, elas têm o direito de influir na decisão judicial. Mas assegurar um contraditório participativo não é tudo. É preciso que as partes possam enxergar sua influência no processo. É imperioso que as partes tenham a possibilidade de controlar o seu grau de convencimento na deliberação do juiz. E o meio para tanto é através da análise das razões de decidir. A cada manifestação judicial visando ao estabelecimento de questões que possam, de alguma forma, importar em impedimentos, modificações ou extinções de posições jurídicas das partes, deve o magistrado dar a palavra para os sujeitos processuais. Aliado a este dever – o qual é imposto pelo novo código de processo civil, vide o já citado texto do artigo 10 –, o juiz tem que motivar seu posicionamento observando a lei, bem como os articulados apresentados na demanda. Eis a importância das disposições do novo Código de Processo Civil para os procedimentos dos juizados especiais. A consagração do contraditório no seu aspecto participativo, somando ao dever imposto ao juiz de motivar analiticamente as decisões judiciais (art. 1128 e art. 499, §1º29, do projeto do novo CPC), compõe a base fundamental de “Art. 11. Todos os julgamentos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”. 29 “Art. 499. São elementos essenciais da sentença: (...) § 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que: I – se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; II – empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; III – invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; IV – não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; V – se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob 28

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todo e qualquer pronunciamento judicial. A inter-relação entre contraditório e motivação é a grande virtude da nova legislação processual, pois cria amálgamas que sedimentam a natureza simbiótica das garantias processuais detalhadas. Esta mútua conexão que se estabelece entre o contraditório e a motivação das decisões30 é elemento a ser observado também nos juizados. Não é porque o seu rito seja simplificado que as garantias fundamentais que formam a estrutura basilar do devido processo legal devam ser relativizadas. Toda e qualquer deliberação estatal deve ser legítima, e para tanto se exige que o mínimo de direitos seja assegurado às partes. Concretizar as garantias fundamentais do processo, notadamente contraditório e motivação, vai muito além de um cumprimento meramente formal que prescreve a possível ouvida da parte ou um livre convencimento motivado pelo juiz sem o enfrentamento das teses presentes no processo. Autor e réu, assim como a sociedade, clamam por uma participação efetiva, bradam por uma democracia materializada. Estas perspectivas somente são alcançadas se o ponto de partida for observado, qual seja, relacionar contraditório e motivação.31 Reitera-se: esta relação é o mínimo que deve ser assegurado a todo e qualquer procedimento, inclusive nos ritos sucintos dos juizados especiais, os quais não podem padecer de decisões sem manifestações das partes, ainda que o objetivo seja privilegiar a celeridade, nem podem deixar de fundamentar e tampouco olvidar a análise das teses apresentadas pelos sujeitos processuais em razão da oralidade ou da simplicidade do procedimento, pois ainda que propagando uma motivação concisa, as razões de decidir precisam espelhar a legislação de regência e as manifestações das partes.

julgamento se ajusta àqueles fundamentos; VI – deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. § 2º No caso de colisão entre normas, o órgão jurisdicional deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão. § 3º A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé”. 30 Sobre esta relação, assim já pontuou WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. A influência do contraditório na convicção do juiz: fundamentação de sentença e de acórdão. In: Revista de Processo, vol. 168, fev/2009, p. 53 e seguintes. 31 Para uma visão mais abrangente entre contraditório e motivação, inclusive analisando as nuances de cada garantia, ver OLIVEIRA, Humberto Santarosa. A motivação das decisões judiciais como aspecto legitimador da atuação jurisdicional: a participação como pressuposto de um adequado pronunciamento judicial. 2014. 187 f. Dissertação (Mestrado em Direito Processual) – Faculdade de Direito. Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

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O esqueleto do devido processo legal, composto por contraditório e motivação das decisões,32 é incindível também nos processos do juizado especial. Ora, seja o procedimento que for, as partes podem até admitir que suas argumentações foram “desatendidas, mas jamais ignoradas”;33 e é no atendimento destas garantias que se assegura um julgamento minimamente legal e legítimo.

5. Conclusão.

O breve panorama destacado buscou relacionar a criação dos juizados especiais com as ondas renovatórias de acesso à justiça. Uma sociedade que almeja o alcance da democracia deve proporcionar meios para seus cidadãos reclamarem seus direitos, ainda que a amplitude e a complexidade destes sejam diminutas. A simplificação dos procedimentos dos juizados especiais, apoiado no aspecto da desburocratização que dificultava o acesso à justiça por parte dos cidadãos,34 foi o elemento diferenciador deste “novo” ambiente jurisdicional. Ocorre, todavia, que a deformalização do rito não significa ausência de regras e direitos. A jurisdição, sob responsabilidade estatal, deve equilibrar os valores consagrados nos juizados especiais e as garantias fundamentais asseguradas a qualquer cidadão dentro do âmbito de proteção judicial. É neste aspecto que o novo Código de Processo Civil traz o seu grande contributo. A insegurança que hoje paira sobre os procedimentos dos juizados especiais, cada qual com uma forma diferenciada de interpretar as disposições da Lei 9.099/95, e muitas delas suprimindo direitos constitucionalmente previstos, cessar-se-á a partir do momento que as 32

Na visão dos autores, a relação entre contraditório e motivação das decisões é deveras relevante para o Estado Democrático de Direito, cujo objetivo primacial é propiciar a maior e mais efetiva participação popular nos procedimentos de deliberação estatal. Desta feita, no que se refere ao contraditório, a participação será notada quanto maior for a interação e a comunicação entre as partes e o juiz – situação verificada durante todo o caminhar do procedimento. Já no que tange à exposição das razões de decidir, a participação observará um duplo escopo: primeiro, através dos motivos consegue-se verificar se a mais ampla oportunização do diálogo foi respeitada pelo magistrado (viés instrumental); e, segundo, tem como objetivo a efetivação do controle social sobre a atividade judicial. 33 O excerto é de GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A garantia de motivação das decisões judiciais na Constituição de 1988. In: Processo Penal e Democracia: estudos em homenagem aos vinte anos da Constituição da República de 1988. PRADO, Geraldo; MALAN, Diogo (coord.). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 64, mas o autor se utilizada dos ensinamentos de Fazzalari (Elio Fazzalari, Instituzioni di diritto processuale, 7ª ed., Padova, Cedam, pp. 82-3). 34 Neste ponto, verifica-se que os juizados especiais funcionaram como a exata medida de concretização dos quatro princípios que, na visão de CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. Acesso à justiça: juizados especiais cíveis e ação civil publica. Rio de Janeiro: Forense, 2000, quais sejam, a acessibilidade, a operosidade, a utilidade e a proporcionalidade.

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normas fundamentais do processo civil, notadamente o entrelaçamento entre o contraditório e a fundamentação das decisões, começar a ser imposta pela lei em formação. Isto porque o comando direto estabelecido no novo Código de Processo Civil que assegurará aos litigantes a possibilidade de manifestação, a influência na decisão e o controle do grau de convencimento do juiz, imporá a existência de uma base mínima de estruturação do devido processo legal. Calcado nestas perspectivas, o jurisdicionado terá a materialização da democracia através de sua participação no procedimento de deliberação estatal, salvaguardando-se de eventuais irregularidades ou arbitrariedades no procedimento simplificado. Este mínimo legitimador, íntima conexão entre contraditório e motivação das decisões, é elemento basilar de qualquer processo. Conclui-se, pois, que sua aplicação é naturalmente aplicável aos juizados especiais, o qual restará legalmente embasado quando da promulgação do novo Código de Processo Civil.

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