O protagonismo dos repórteres e a legitimação do real nos bastidores do Profissão Repórter (TCC)

May 20, 2017 | Autor: Alisson Paiva | Categoria: Television Studies, Legitimacy, Televisão, Profissão Repórter, Protagonismo, Legitimação
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Alisson Paiva Rocha

O protagonismo dos repórteres e a legitimação do real nos bastidores do Profissão Repórter

Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas - FAFICH Departamento de Comunicação Social Belo Horizonte – junho de 2013

Alisson Paiva Rocha

O protagonismo dos repórteres e a legitimação do real nos bastidores do Profissão Repórter

Monografia apresentada ao curso de Comunicação Social da FAFICH/UFMG como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de bacharel em jornalismo. Orientador: Prof. Bruno de Souza Leal

Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas - FAFICH Departamento de Comunicação Social Belo Horizonte – junho de 2013 1

RESUMO

O objetivo deste trabalho é analisar a participação dos repórteres no programa televisivo Profissão Repórter. Acredita-se que compreende no protagonismo desses profissionais os principais modos com que joga o programa a fim de criar laços com seu público espectador. Somado ao seu caráter jornalístico, o teor dramatúrgico que compõe as reportagens refletem a importância dada ao processo de produção da reportagem bem como à atuação dos repórteres. Portanto, este estudo visa compreender as razões e efeitos pretendidos com a exibição dos bastidores e do trabalho dos repórteres, compreendendo sua importância no cenário televisivo.

Palavras-chave: Profissão Repórter, televisão, atuação, protagonismo, legitimação

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ABSTRACT

The objective of this work is to analyze the participation of reporters in the television program Profissão Repórter. It is believed that is in the protagonism of these professionals the main ways with which the program plays to create ties with its viewing public. In addition to his journalistic character, the dramaturgical content that composes the reports reflects the importance given to the process of production of the report as well the acting of the reporters. Therefore, this study aims to understand the reasons and effects intended by displaying the backstage and the work of reporters, understanding its importance in the television landscape.

Keywords: Profissão Repórter, television, acting, protagonism, legitimacy

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LISTA DE IMAGENS Imagem 1: Vinheta de abertura do Profissão Repórter..............................................18 Imagem 2: Raphael Prado revela bastidores...............................................................30 Imagem 3: Repórteres conversam com diretor do núcleo...........................................32 Imagem 4: Gabriela Lian entrevista criança…….......................................................33 Imagem 5: Raphael Prado mostra-se sensibilizado.....................................................35 Imagem 6: Gabriela Lian se emociona com relato das vítimas..................................36 Imagem 7: Enquadramentos ocultam identidade da personagem...............................37 Imagem 8: Thiago Jock e Paula Akemi discutem abordagem....................................39 Imagem 9: Caco Barcellos fala de sua abordagem ....................................................40 Imagem 10: Flashback retoma cena de Neymar…….................................................41 Imagem 11: Caco Barcellos ajuda jovens na rua…………........................................42 Imagem 12: Paula Akemi recebe orientações de Barcellos........................................45 Imagem 13: Victor Ferreira comenta situação do posto.............................................47 Imagem 14: Paula Akemi investiga informações na redação…….............................49 Imagem 15: Thaís Itaqui se comove com pacientes………........................................53 Imagem 16: Paula Akemi diz não ter encontrado familiars de Gildete......................55 Imagem 17: Mensagem deixada na última cena do episódio .....................................56 Gráfico 1: Distribuição regional de episódios - em porcentagem …………….....…19 Gráfico 2: Editorias dos episódios apresentados entre 2006 e 2010 ..........................20 Gráfico 3: Relação de programas e subtemas apresentados........................................21 Gráfico 4: Caracterização da audiência do programa Profissão Repórter..................22 Gráfico 5: Lista de programas do Profissão Repórter..............................................125

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SUMÁRIO 1. CARACTERIZAÇÃO DO PROGRAMA .......................................................... 7 1.1 O Programa ..................................................................................................... 7 1.2 Trajetória ......................................................................................................... 8 1.3 Características do programa ........................................................................... 14 1.4 Temas ............................................................................................................ 19 1.5 Audiência e público ....................................................................................... 21 1.6 Interatividade ................................................................................................. 22 1.7 Bastidores ...................................................................................................... 23 2. JORNALISMO E ATUAÇÃO .......................................................................... 28 2.1 Descrição do corpus ...................................................................................... 29 2.2 O protagonismo dos repórteres....................................................................... 56 3. ANÁLISE ........................................................................................................... 59 3.1 O olhar subjetivo do repórter ......................................................................... 59 3.2 Os bastidores dos bastidores .......................................................................... 62 3.3 História narrada ............................................................................................. 65 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 71 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................. 74 6. ANEXOS................................................................................................................ 79 6.1 Transcrição Profissão Repórter Abuso sexual ................................................. 79 6.2 Transcrição Profissão Repórter Abuso sexual ................................................. 93 6.3 Transcrição Profissão Repórter Abuso sexual ............................................... 107

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AGRADECIMENTOS É com alívio mas também com dor no coração que me despeço temporariamente da minha vida universitária. Durante essa longa jornada, muitos momentos, pessoas, aprendizados, enfim, me fazem sentir orgulho de olhar para trás e ver o quanto mudei. E durante esse tempo muitas coisas especiais fizeram parte de minha (trans)formação e por isso eu não poderia deixar de agradecer a tudo isso – e não é pouco! Agradeço primeiramente à minha família. Ao meu pai pelo apoio e confiança, à minha mãe por me confortar em todas as horas, pela preocupação e dedicação, e ao meu irmão pela amizade incondicional. Agradeço também a Universidade, aos mestres e às tantas oportunidades de crescimento que contribuíram para minha formação. Ao Bruno Leal, pela paciência e orientação. Agradeço também à Tinno Comunicação pela acolhida, pela amizade, respeito e pelo aprendizado constante. Aos grandes amigos de Campo Belo, Belo Horizonte, Viçosa, de Portugal e de outros cantos do mundo, pela motivação, pelo apoio e pela força. Por todos os momentos compartilhados, de conversas, de risos, de viagens, de afetos, enfim, por cada segundo que eu tive o privilégio de dividir com vocês. A todos aqueles que estão sempre ao meu lado, ainda que distantes, torcendo por mim. E um obrigado especial aos amigos que me ajudaram com o projeto, com valiosas dicas, correções, os que não me deixaram perder o foco e também aos que me tiraram o foco! Enfim, sou grato a todos vocês que de alguma forma caminharam ao meu lado, me inspiraram e me abriram os olhos, com quem troquei tantas experiências e bons momentos. Agradeço, enfim, pelos desafios que superei, pelos medos que venci, pelos momentos em que me arrisquei, pelo autoconhecimento, pela valorização do trabalho, da vida, das pessoas. Por ter aprendido que posso crescer no contato com o outro, com as diferenças e com meus próprios defeitos. E por reconhecer ainda que sou feito de tudo isso, e que o fim desta etapa marca apenas o inicio de tantas outras.

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1. CARACTERIZAÇÃO DO PROGRAMA PROFISSÃO REPÓRTER 1.1 O Programa O programa Profissão Repórter, que atualmente é exibido às terças-feiras em temporadas anuais na Rede Globo, teve seu início no dia sete de maio de 2006 como um quadro da revista eletrônica semanal Fantástico. Mas foi somente em junho de 2008 se tornou um programa autônomo e ganhou espaço semanal na programação dessa mesma emissora. Comandados pelo jornalista Caco Barcellos 1, profissionais recém-formados se propõem a mostrar a rotina dos jornalistas, os bastidores da produção de uma matéria televisiva e o envolvimento dos repórteres no exercício de sua profissão. O programa também é reconhecido pelas matérias de denúncias, por abordar temas ditos delicados e pela promessa de dar uma visão alternativa àquelas que já são construídas pela mídia tradicional. No site do programa, o Profissão Repórter assim é descrito: Caco Barcellos e sua equipe de jovens repórteres vão às ruas, juntos, para mostrar diferentes ângulos do mesmo fato, da mesma notícia. Cada repórter tem sempre uma missão, um desafio a cumprir. Será que eles vão conseguir? No Profissão Repórter, você acompanha tudo. Os desafios da reportagem. Os bastidores da notícia2.

Dessa forma, o programa se apoia nitidamente na figura de seu idealizador Caco Barcellos e não deixa dúvidas quanto sua intenção jornalística, que seria oferecer mais do que apenas as informações sobre um determinado fato, mas também marcas do processo de construção e elaboração da reportagem, por meio do trabalho dos repórteres. Dessa forma, a atuação dos repórteres é um elemento essencial para a construção da narrativa que o programa propõe. Assim, como observam Danielle Gross e Paula Paschoalick (2012), a estrutura do programa se relaciona de um lado com a reportagem e de outro com a narrativa, que é, na verdade, a história da própria reportagem e de quem a faz. Em consonância com sua proposta, as edições revelam bastidores da gravação, diálogos informais entre repórteres e fontes, making of, dentre outros recursos

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Cláudio Barcelos de Barcellos é jornalista e repórter especializado em jornalismo investigativo. Nascido na periferia de Porto Alegre, tem realizado grandes reportagens e documentários sobre injustiça social e violência, com as quais já recebeu mais de vinte premiações. Com mais de vinte anos de carreira, trabalha para a Rede Globo e já escreveu para as revistas Veja e IstoÉ. 2

Do site G1. Disponível em: http://www.g1.globo.com/profissao-reporter Acesso: 10/04/13 7

televisivos que têm por objetivo mostrar “os diferentes ângulos da mesma notícia”. Segundo o editor Caco Barcellos, a exibição dos bastidores tem como objetivo apenas revelar o processo de produção da reportagem: “fazemos a exposição de nossos bastidores, porque às vezes eles falam muito, mas sempre tendo muito claro para os telespectadores que nossa estrela é a reportagem e não nós”. (CHIARONI, 2012, p.39). Portanto, estes são importantes recursos que parecem reforçar para o telespectador que existem diferentes versões, mas nunca uma versão finalizada pela edição do repórter - quem irá interpretar, decidir ou julgar serão os espectadores –, o que geraria um efeito de transparência no processo de produção televisivo. Igualmente, pode-se pressupor que ao exibirem as câmeras, os cenários distorcidos e conversas informais, o Profissão Repórter consegue mostrar também que ali existe uma pessoa que vivencia a feitura da reportagem, que tem sentimentos e se envolve com as histórias dos personagens que encontram. E, conforme os termos de Alexandre Figueirôa et al (2013), assim também estariam os telespectadores, uma vez que acompanham tudo "junto" dos jornalistas.

1.2 Trajetória Segundo o idealizador do programa, Caco Barcellos, o Profissão Repórter surgiu de uma vontade pessoal de contar uma história sob diversos ângulos. Ele começou a pensar no projeto na década de 1990 e a ideia original era reunir colegas já experientes para produzirem, juntos, essas reportagens. Alguns anos depois, ele percebeu que, para se ter diferentes visões de um mesmo fato, era necessário construir um grupo que fosse, antes de mais nada, heterogêneo. Barcellos, então, saiu a procura de parceiros jovens, críticos e dispostos a encarar desafios e que sobretudo fossem idealistas – por isso a ideia de selecionar para o programa jornalistas recém-formados. Além de idealizador, Caco Barcellos é editor e também atua como apresentador e repórter, especialmente como entrevistador. Ele participou de 98,66% dos episódios desde o início até o final da temporada de 2010. (PASCHOALICK; GROSS, 2012). Dessa forma, foi criado o Profissão Repórter que, antes de se tornar o programa que conhecemos hoje, passou por diversas fases, embora tenha mantido seu formato original até os dias atuais. No entanto, desde sua estreia em 2006 até os dias atuais, o programa passou por transformações tanto em seus aspectos técnicos quanto em questões relacionadas ao “perfil” do programa. 8

O Profissão Repórter tem como diferencial seu caráter híbrido, diferente dos programas televisivos até então veiculados no país. Já em sua primeira exibição, no dia 9 de maio de 2006, o programa quebrou um paradigma ao exibir uma reportagem sobre um único tema (pichação), ocupando doze minutos na programação do Fantástico - que geralmente transmite reportagens em média de seis minutos de duração (CHIARONI, 2012) . Na voz de Pedro Bial, o programa foi apresentado pela primeira vez no semanário Fantástico da seguinte forma: O jornalismo à flor da pele. O repórter Caco Barcellos entra em campo com uma equipe de jovens jornalistas para mostrar com quantas informações, com quantas imagens, com quanta emoção se faz uma reportagem.

E seguido pela apresentadora Glória Maria: “Estreia agora o Profissão Repórter. Na reportagem de hoje, os pichadores em ação”. Na primeira reportagem, que mostrou a ação de pichadores em São Paulo e Brasília, o programa já apontou seu processo “transparente” de produção. Caco Barcellos fala para as câmeras sobre a dificuldade de encontrar um grupo de pichadores que se dispusesse a falar com o programa. Na mesma edição, contou também que a sugestão de pauta partiu do cinegrafista Caue Angeli e que todos os integrantes participam de todas as etapas de produção do programa. Ao final, foram exibidos os erros dos repórteres durante a reportagem. Três semanas depois, na segunda edição do quadro no Fantástico, o repórter Felipe Gutierrez compartilhou com o público sua falta de intimidade com o vídeo: “Essa foi a primeira vez que gravei como repórter diante das câmeras, e foi mais difícil do que eu imaginava”. A equipe do Profissão Repórter na época de sua estreia foi composta por oito jornalistas recém formados, sendo sete repórteres: Ana Paula Santos, Caio Cavechini, Felipe Gutierrez, Júlia Bandeira, Juliana Maciel, Nádia Bochi e William Santos; e a coordenadora de produção, Mariane Salerno. Embora de roupagem nova, a temática do programa se manteve diversificada e sempre voltada para a “democratização” de coberturas, daqueles temas pouco abordados, "esquecidos" pela tradicional mídia brasileira: jovens, a vida nos centros urbanos, violência, drogas, fé, prostituição, religião, futebol, saúde, distúrbios alimentares, educação, mundo rural, trabalhadores, dentre outros. E até mesmo a profissão de repórter foi tema do programa, veiculado no dia 28 de maio de 2006, com a edição que foi intitulada “Os caçadores de notícia”. A matéria mostrava o dia a dia de profissionais da comunicação, cinegrafistas e fotógrafos de 9

celebridades – os paparazzi - que ganham a vida com notícias e imagens exclusivas. O mesmo também com a edição de 16 de julho de 2006, com o tema “Bastidores de uma matéria”, em que a deficiente visual Danieli Haloten, jornalista, ajuda em uma pauta sobre desemprego. No início do programa, Caco Barcellos anuncia: O Profissão Repórter de hoje começa onde termina toda reportagem de televisão: na ilha de edição, onde os melhores momentos da gravação são selecionados para ir ao ar. Esta é também a primeira vez que nossa equipe trabalha com uma convidada especial.

Neste mesmo sentido, em um momento anterior, na edição do dia 11 de junho de 2006, o programa também acompanhou a movimentação da imprensa na cobertura jornalística do julgamento da jovem Suzane von Richthofen, na época acusada de assassinar os pais. Aqui, observa-se a extrapolação dos seus bastidores, na tentativa de mostrar o próprio trabalho, tendo como base o trabalho de outros profissionais. Essa edição, ao contrário das demais, tem como foco a cobertura da mídia sobre o acontecimento, e não somente o crime em si – que já havia repercutido de diversas formas (ou da mesma forma, como sugere o programa) e pelos mais diversos meios de comunicação. De uma forma geral, o Profissão Repórter parece almejar dar maior profundidade aos temas que aborda sob a perspectiva da neutralidade por trás do “olhar de diversos ângulos”. Embora se parta do pressuposto da impossibilidade de dar conta do real como ele de fato acontece (FIGUEIRÔA et al, 2003), os mecanismos utilizados pelo programa fazem parte de uma lógica de produção televisiva que busca “criar realidades”. E este movimento só seria possível através do “pacto de leitura” que é tratado entre ambas as entidades – o programa e seus telespectadores. (GARCÍA-NOBLEJAS, 2005). Portanto, mesmo se tratando de uma estratégia aqui vista como geradora de efeito de transparência, a atuação dos repórteres no programa em questão não tem a intenção nem o efeito de simular qualquer outra coisa que os telespectadores não pudessem perceber. Como afirma Umberto Eco, embora a televisão queira desaparecer enquanto sujeito do ato de comunicação, ela não engana seu público, pois este sabe perfeitamente que “aquilo que vê (real ou fictício) está bem longe é visível justamente graças ao canal televisivo”. (ECO, 1984, p. 91).

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O que acontece, na verdade, é que o programa compartilha determinados códigos com seus telespectadores para que possam ingressar na programação proposta e ter sua experiência individual. A atuação dos repórteres neste caso, enquanto parte dessa lógica produtiva, é um traço da nova abordagem que o Profissão Repórter apresenta na televisão especialmente no que toca às discussões relacionadas aos padrões jornalísticos. No entanto, suas maiores novidades foram sentidas nas qualidades estéticas e de linguagens narrativas. O programa é dinâmico, tem edição acelerada, fragmentada e utiliza-se de diversos efeitos de dramatização do agitado trabalho dos repórteres. A divisão do programa é feita em diversos micro-blocos que são unidos como em um mosaico. Esse artifício pretende sugerir aos telespectadores a ideia de que as apurações acontecem simultaneamente, a cada momento. (LUCINDA, 2008). Conforme relata Bruno Teixeira Chiaroni, “(...) editado de forma fragmentada com efeitos gráficos e sonoros, além de narrativas costuradas de maneira não-linear”. (CHIARONI, 2012. p. 27). Para o autor, trata-se de um novo fazer jornalístico enquadrado na figura dos repórteres que relatam notícias e, mais ainda, o modo como são produzidas. Antes de se tornar um programa autônomo, o Profissão Repórter passou por uma fase transitória que a atração era apresentada em edições especiais. Ao todo foram exibidos cinco edições especiais, sendo duas no ano de 2006, enquanto ainda fazia parte do Fantástico – com destaque para o episódio “Vida no Mar, que foi ao ar no dia 14 de dezembro; e três edições especiais no ano de 2007, que foram ao ar em noites de quinta-feira nos dias 30 de agosto (O Brasil sobre duas rodas), 18 de outubro (O Brasil da Hora-Extra) e 13 de dezembro (Em busca do sucesso). Como se pode notar, as edições especiais foram todas dedicadas exclusivamente à assuntos referentes à vida dos trabalhadores brasileiros, tema que foi bastante tratado no decorrer da longa jornada do programa. Essas exibições tiveram duração média de 45 minutos, televisionadas logo após o programa humorístico A Grande Família. Eles foram dirigidos por Caco Barcellos e Marcel Souto Maior, com edição de Janaina Pirola e Nathalia Fernandes. A equipe de reportagem desses especiais era composta por Caco Barcellos, Ana Paula Santos, Caio Cavechini, Felipe Gutierrez, Gabriela Lian, Julia Bandeira, Nadia Bock e Mariane Salerno.

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No ano de 2007 o programa fez parte do Fantástico não apenas em exibições especiais, mas como um quadro fixo da grade da programação. O programa, que tratava dos mais variados assuntos, apresentava-se enquanto uma equipe de jovens repórteres que se aventurava pelo país em busca de “histórias marcantes, descobertas e novas experiências”, comandados pelo já experiente jornalista Caco Barcellos. A partir de 2008, mais precisamente no dia 3 de junho, devido ao sucesso significativo que teve na grade da emissora 3 , conquistou um lugar fixo na programação semanal, o que também resultou no aumento do tempo de exibição do programa. O quadro tinha duração média de dez minutos no Fantástico e chegou a ocupar o triplo do tempo, com programas de até trinta minutos, divididos em dois blocos. Foi a partir desse ano que o programa passou a se apresentar semanalmente às terças-feiras, em alta definição (HD) - e reprisado no canal Globo News aos sábados às 7:30 e às 20:30h 4 -, conquistando grande apreço pela audiência ao exibir os bastidores, o trabalho e envolvimento dos repórteres. O Profissão Repórter substituiu o Linha Direta, outro programa exibido pela Rede Globo, também de caráter investigativo, porém com uma característica mais voltada para a criminalidade, matérias de denúncia e coberturas policiais. Este, diferentemente do Profissão Repórter, apresentava uma narrativa híbrida que se misturava entre relatos de cunho documental e as simulações que eram produzidas pelo próprio programa. Ao final do Linha Direta eram sempre exibidas informações sobre os criminosos foragidos, a foto para identificação e o telefone da produção, convidando os telespectadores a denunciarem caso soubessem de algo. Uma característica comum entre o Linha Direta e o Profissão Repórter seria, segundo Kleber Mendonça (2002), a “transparência da linguagem como efeito ideológico, produzido no momento mesmo da fala”, isto é, a construção da trama por meio de imagens narradas, que provocam a sensação de credibilidade no espectador. No Profissão Repórter, por exemplo, em diversos momentos as imagens são utilizadas para confirmar aquilo que os repórteres acabaram de narrar ou, na mesma medida, utilizam da narração para explicar as imagens que o telespectador está assistindo – um discurso redundante que reforça e confirma aquilo que está sendo dito pelos jornalistas. 3

Em sua primeira exibição no novo horário, alcançou 21 pontos de média. Em 10 de julho, alcançou seu melhor índice, de 22 pontos. 4 Do site da Globo News. Disponível em: http://especial1.g1.globo.com/globo-news/index.php. Acesso em: 6/6/2013. 12

No período em que o Profissão Repórter adquiriu seu próprio espaço na programação, integravam a equipe os repórteres: Caio Cavechini, Felipe Gutierrez, Gabriela Lian, Julia Bandeira, Mariane Salerno, Nathalia Fernandes, Thais Itaqui e Thiago Jock. Eles formaram a primeira equipe do programa em seu primeiro ano como programa semanal da TV Globo e formaram, durante muito tempo (e alguns até os dias atuais) o subgrupo dos repórteres fixos, que teve participação mais expressiva no conjunto geral dos episódios veiculados até o ano de 2010. A nova fase do Profissão Repórter enquanto um programa autônomo na grade oficial da Rede Globo foi inaugurada com o episódio “À espera de um coração”, no dia 3 de junho de 2008. O episódio retratou a longa espera de pacientes nas filas de transplantes no Instituto do Coração (InCor), em São Paulo, acompanhando os personagens desde a burocracia necessária para conseguir um transplante até o momento da cirurgia de implantação do órgão no receptor, e teve grande repercussão nacional devido a delicadeza e profundidade do tema. Esta edição se apoiou fortemente nas personagens entrevistadas, pessoas que enfrentavam o problema da espera nas filas pela doação de órgãos no país. O ano de 2009 foi marcado pelos temas de grande sucesso como a Garota da Laje (Concursos), da história do surdo que volta a ouvir e se assusta com a própria voz (Barulhos), de um carroceiro desiludido que virou poeta nas ruas de São Paulo (Artistas da noite), pelo caso do marido que fez uma declaração de amor à companheira vencida pelo câncer (Vida e Morte) e pelos dois episódios sobre o Crack, que renderam ao Profissão Repórter o prêmio de jornalismo da TV Globo. No mesmo ano, o programa também recebeu o Troféu Imprensa de Melhor Programa Jornalístico de 2008, concorrendo com outros programas da mesma emissora já conhecidos e de grande audiência como o próprio Fantástico e Globo Repórter. Enquanto esteve no Fantástico também foi premiado com o V Prêmio Jovem Brasileiro, como melhor quadro de conteúdo jornalístico produzido e apresentado por jovens. Desde então, o programa venceu diversas premiações. Dentre outros prêmios, os mais importantes são:

Premiações do Profissão Repórter durante sua trajetória: 2007 - Prêmio TV Press, na categoria melhor programa jornalístico de TV. 2006/2007/2008 - Prêmio Jovem Brasileiro; 2007 - Finalista do prêmio Mídia da Paz; 13

2007 - Prêmio AMB de Jornalismo; 2008 - Troféu Top of Business nacional; 2008 - Prêmio Extra de Televisão, na categoria melhor programa do ano; 2010 – Prêmio de jornalismo da TV Globo na categoria edição de programa de rede pela matéria Crack. O ano de 2010 foi marcado por uma interrupção no progressivo aumento de episódios o que, segundo Gross e Paschoalick (2012), se explicaria devido a dois grandes acontecimentos que provocaram redução do espaço na grade da televisão: as eleições presidenciais e a Copa do Mundo. Neste sentido, também é valido observar que o programa não se pauta somente pelos temas não recorrentes na mídia tradicional. Em diversas vezes, o programa igualmente deu destaque para acontecimentos de repercussão mundial, embora tenha buscado dar uma abordagem diferente, especialmente no período que compreende entre o final de 2009 e meio de 2010. A título de exemplificação: como foi feito no episódio do julgamento de Suzane von Richthofen (11 de junho de 2006), já mencionado anteriormente, e também nos episódios: Chuva no Rio (13 de abril de 2010), Terremoto no Haiti (6 de abril de 2010), Terremoto na Indonésia (13 de outubro de 2009) e Final do Brasileirão (8 de dezembro de 2009), Mineiros no Chile (19 de outubro de 2010) e SWU (13 de outubro de 2010), dentre outros.

1.3 Características do programa O Profissão Repórter sem dúvidas tem grande importância no telejornalismo brasileiro por inaugurar um formato inusitado, que trouxe uma série de inovações para o cenário jornalístico e televisivo. Essas novidades se deram tanto em relação aos aspectos técnicos e estéticos, quanto relacionado à linguagem e formas narrativas. Dessa forma, ao revelar os bastidores de sua produção, o programa inaugura a atração como gênero visual e, assim, tensiona os conceitos do jornalismo e de formatos televisivos. Segundo o autor Fernando Resende (2012), para abarcar o Profissão Repórter, a leitura desse “texto audiovisual” deve partir de três lugares fundamentais: i) o jornalismo, problematizado a partir de seus entraves e desafios; ii) a televisão, como suporte que em muito reitera certos dogmas engendrados no pensamento e na prática do jornalismo, e iii) o próprio audiovisual que, na sua tessitura e no seu dado contexto, evoca e reforça a ideia de uma realidade passível de ser fielmente registrada. (RESENDE, 2012, p.54).

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O Profissão Repórter dá especial atenção para a multiplicidade de sentidos e vozes e, com isso, gera uma espécie de confusão, que gira em torno das fontes e dos próprios repórteres, o que geraria mais empatia e identificação com os telespectadores. Ainda segundo Resende, no programa em questão a ilusão de transparência é duplamente reforçada. Isso devido a impressão de desordem que é provocada pela colagem de dois tempos - o vivido (o que é exibido nas imagens) e o narrado, de forma que “as imagens que pretendem explicar o mundo apresentam-se como espelhos”. (2012, p.60) Porém, uma estratégia de aproximação comum de Profissão Repórter, e talvez a mais visível, está na exibição das câmeras – uma câmera filma outra. Uma câmera é manuseada pelos cinegrafistas que acompanham os repórteres, enquanto que a segunda, em primeira pessoa, fica nas mãos dos próprios repórteres, que filma a partir de sua própria visão. Eles filmam seus entrevistados, a si próprios e por vezes até mesmo os cinegrafistas. Este realismo provocado pela metalinguagem das câmeras, conseguido através do making of, privilegia o processo de produção da reportagem, inacabada, em construção. A sensação de realidade neste caso é a sensação da telepresença, permitida por meio da inserção do telespectador através da câmera, como se ele estivesse ali testemunhando a cena e, portanto, pode olhar ao redor e explorar o extracampo - os bastidores. (ARANTES; MUSSE, 2010). Segundo Mariane Murakami essas são, na verdade, conjuntos de instruções que aparecem para “demarcar ainda mais essa transparência e fazer o espectador saber que o cameraman é tomado como enunciador real”. (2012, p.209). O foco dessas câmeras são as personagens, mas também são outros detalhes sutis, movimentos de close que, guiados pelas sensações dos repórteres, ganham significado e tomam sentido na narrativa – como fotos, enfeites e objetos pessoais dos entrevistados. Na visão de Chiaroni, “a sensação é a de que estamos diante de uma cobertura em tempo real e as personagens são sua matéria-prima” (2012, p. 35), o que confere marcas de real, no sentido de que o próprio telespectador poderia estar ali, adentrando e percorrendo a sala das personagens, observando os detalhes, o quadro na parede, e as fotos de família nos porta-retratos. Em uma segunda perspectiva, o foco das câmeras também se volta para os próprios repórteres, na tentativa de revelar seus sentimentos, anseios, angústias, reações, e o próprio processo de feitura da reportagem, sua lógica produtiva e seus

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impasses. No entanto, como defende Chiaroni, o foco narrativo não se estabelece apenas no repórter ou nas personagens: Uma variável que possibilita um jogo de enunciações – ora o repórter narrando, ora Caco Barcellos ou as próprias personagens. Muitas vezes, todos ao mesmo tempo. Assim, como reforça Mota (2001, p.127) sobre o trabalho de captação, é a “câmera que toma decisões sem pensar, guiada só pelo instinto”. (CHIARONI, 2012, p.39).

Dessa forma, a câmera no Profissão Repórter, assemelha-se, aparentemente, à linguagem do documentário: cria laços de afetividade e proximidade para com a narrativa. O repórter é o mesmo que filma, que conta, que interage e conduz a reportagem - uma impressão cumplicidade. Em alguns trechos, tem-se a narrativa em primeira pessoa. É o repórter como testemunha "direta" da observação, pois sua intimidade com a câmera a faz se comportar como se estivesse atracada a ele, ao corpo que ele usa em movimentos de aproximação ou afastamento, rotação, o que produz quadros poucos comuns, tal qual a linguagem do documentário. (MOTA, 2001). Assim, o repórter se revela, se apresenta e traz para o produto televisivo a experiência que adquire no ato mesmo da confecção da reportagem. Aliás, porque não dizer que o “processo” da aprendizagem e da reportagem é exatamente aquilo que busca o programa ao revelar seus bastidores – a emoção do dia a dia da profissão vista por jovens repórteres que estão, de certa forma, aprendendo a fazer aquilo que em teoria já está sendo feito. E, agora, acompanhado pelos telespectadores. Sobre os movimentos de câmera, o idealizador do programa, Caco Barcellos explica que se trata de uma tentativa do público olhar o cara que filma também. Na verdade, seria acompanhar o processo. É como se o cinegrafista profissional fosse o público assistindo às captações e a segunda câmera trazendo esse bastidor. Desde o começo, eu sempre acreditei que tem tanta coisa que acontece na nossa vida de repórter e que o público não sabe, né, pulando a cerca, pulando o muro. E um detalhe: a segunda câmera tem a vantagem de não chamar tanto a atenção. Com a câmera grande, em muitos locais, ela transforma a realidade, ela mascara o que está se passando5.

Assim, a câmera, que se preocupa menos com a qualidade de imagem do que com o conteúdo que captura, traz consigo traços de informalidade que contrapõe uma estética mais conservadora do jornalismo de referência. Elas se complementam com o som direto (sons da rua, dos ambientes externos), dos ruídos e dos silêncios e ainda

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Entrevista cedida a Bruno Teixeira Chiaroni, em 22/06/2011 (CHIARONI, 2012) 16

sofrem intervenções, interrupções, intercalam entre planos ora abertos, ora fechados, transições rápidas e movimentos curtos. O conjunto de imagens, sons e cortes em Profissão Repórter é complexo, polifônico, heterogêneo, a começar já pela vinheta de abertura do programa, que se moderniza a cada temporada, a partir de 2008. A vinheta é, de certo modo, reveladora do ritmo que é empregado pela edição do programa. Rápida, intensa e dinâmica, mostra ícones que representam o trabalho dos jornalistas e cinegrafistas, como as câmeras, microfones e ilhas de edição, de forma frenética, não diferente da rotina desses profissionais.

Imagem 1: Edição, câmera e a rotina intensa dos profissionais são tema da vinheta de abertura do programa (Reprodução/ TV Globo)

Em relação à lógica de montagem do Profissão Repórter, ele se diferencia dos demais programas telejornalísticos por não seguir uma linearidade dos fatos. Geralmente as reportagens são apresentadas sob a direção de “eixos”, que são normalmente três. Trata-se dos “tipos”, “personagens”, “visões” sobre um mesmo assunto, que serão conduzidas pelo programa. Porém, a transição entre cada eixo se intercala de forma fragmentada, por meio de vinhetas que são na verdade pequenos trechos da vinheta de abertura. A sensação que parece provocar é a de simultaneidade – dinâmico, como a rotina da cobertura que é feita pelos repórteres. Isto porque ao intercalar entre os eixos do programa, as diversas matérias que constroem a reportagem vão se concluindo de forma conjunta, como se aqueles profissionais estivessem trabalhando ao mesmo tempo, de diferente lugares. Em muitas das reportagens, os repórteres inclusive conversam entre si via telefone, o que evidencia a tentativa de mostrar (ou simular) o processo simultâneo da construção da reportagem. O desempenho e ação dos jornalistas durante o desenvolvimento das reportagens, ao serem revelados na televisão, também suscita uma importante discussão. Ao exibirem seu processo de aprendizagem, eles também colocam em 17

questão as discussões referentes ao próprio jornalismo. Enquanto os jovens inexperientes aprendem e discutem a melhor forma de filmagem, técnicas de abordagem, de edição, etc., eles também mostram ao público espectador que apesar do esforço da apuração, também existe ali algumas escolhas, que podem ser do repórter, do editor, do editor, do programa. Essas são práticas que geralmente levantam discussões sobre questões éticas e de boas práticas da profissão, quando, por exemplo, exibem as discussões de pauta, na redação e o trabalho que é realizado nas ilhas de edição - este último com menor frequência -, em que Caco Barcellos auxilia os novatos. Nestes momentos, os repórteres menos experientes ouvem as opiniões do editor Barcellos, dicas sobre o que poderia ser retirado, acrescentado, enfim, melhorado. Dessa forma, o programa também explicita suas escolhas editoriais, revela modelos de hierarquias das informações, das fontes e muitas vezes também é utilizado para justificar suas escolhas em determinadas situações, em geral polêmicas, embaraçosas ou que poderiam ser consideradas um desvio do padrão ético jornalístico. Esses são elementos que dizem respeito ao posicionamento metanarrativo do Profissão Repórter ao transformar as discussões internas do jornalismo em componente da própria reportagem. Portanto, esta característica do programa faz com que o público possa entender as decisões que foram tomadas pelo repórter, ou pelo menos ter consciência de que o conteúdo que está assistindo é feito por meio de escolhas de determinadas pessoas. (XAVIER, 2010). Ao observar as particularidades de Profissão Repórter, especialmente no que diz respeito às técnicas utilizadas pelo programa, alguns elementos chamam a atenção. Baseado nas informações do banco de dados disponibilizado por Gross e Paschoalick (2012) – com análises realizadas durante o período entre a primeira exibição em 2006 e o último episódio de 2010, observa-se: Embora se trate de um programa cujo slogan pretende exibir os bastidores da notícia, as discussões de pauta e conteúdo são exibidas apenas em 22 episódios dos 149 analisados (até o ano de 2010), o que representa menos de 15%. Em se tratando de discussões de edição, o número sobe para 21%, o que ainda é menos do que se esperava. Da mesma forma, o programa também não faz uso constante de câmeras escondidas, que foram utilizadas em apenas 20% dos programas; a videorreportagem, 18

que aparece em 22% e as imagens de arquivo, utilizadas em 38% do escopo de 149 episódios analisados. Um dado importante também se refere ao uso da autorreferencialidade, que segundo as pesquisadoras, são concernentes às menções extra episódios (indicações de conteúdos publicados na Internet) e entre episódios (citações e referências a programas anteriores, retomada de reportagens), que correspondem apenas a 11% nos casos entre episódios e 4,3% extra episódicos.

1.4 Temas O Profissão Repórter tem a maioria de suas reportagens gravadas na região Sudeste do Brasil, o que pode explicar-se pelo fato de serem os locais onde a emissora Rede Globo está mais presente. 46,6% das reportagens foram realizadas no Sudeste, contra 0,67% do Centro Oeste, 1,34% do Norte, 3,36 do Nordeste, 1,34 do Sul, 3,36 de reportagens no exterior e os outros 46% foram episódios com regiões variadas. A distribuição em porcentagem das regiões abordados pelos programas entre 2006 e 2010 pode ser vista no gráfico abaixo.

Gráfico 1: Distribuição regional de episódios - em porcentagem. (PASCHOALICK; GROSS, 2012)

Com relação aos temas abordados no decorrer do programa, Gross e Paschoalick (2012) se basearam nas editorias consagradas pelo jornalismo tradicional a fim de tentar enquadrar e analisar as temáticas do Profissão Repórter. Dos 149 programas analisados, a maioria foram relacionadas às editorias cotidiano (56); 19

comportamento (31); policial (17); cultura (12) e saúde e bem-estar (8). Os outros temas foram economia, esportes, política, internet, educação e ciência e tecnologia. Nota-se, contudo, uma evolução dos temas entre o período de 2006 a 2008, o que nos revela que os temas “cotidiano” e “comportamento humano” apresentaram significativo crescimento quando o programa se torna semanal; em oposição à editoria policial, que sofreu redução. A ocorrência das editorias pode ser analisada no gráfico abaixo.

Gráfico 2: Editorias dos episódios apresentadas entre 2006 e 2010 em números percentuais - amostra 149 episódios. (PASCHOALICK; GROSS, 2012)

Mas, apesar da redução da editoria policial, os (sub) temas ligados à violência têm aumento gradativo na programação do Profissão Repórter. Os subtemas mais frequentes no período foram: Violência e conflitos (26), Mercado de Trabalho, carreira e talentos (11), tragédias e acidentes (7), drogas (6), prostituição (4), entre outros (Conf. Gráfico 3). Assim, o programa se consolidaria como um programa jornalístico voltado para assuntos do cotidiano, com preponderância a situações que envolvem violência e riscos. Estes dados mostram dados característicos do programa no que diz respeito às escolhas predominantes dos temas e assuntos que abordam, o perfil que deseja seguir, bem como sobre seu público alvo, que será visto no tópico a seguir.

20

Gráfico 3: Número absoluto de programas de acordo com os subtemas apresentados. Profissão Repórter traz a questão da violência como principal subtema (PASCHOALICK; GROSS, 2012)

1.5 Audiência e público O Profissão Repórter vai ao ar às terças-feiras, às 23h55, para mais de 73 mil telespectadores, segundo dados da afiliada da Rede Globo, TV Diário. Os índices de audiência do Profissão Repórter, baseando-se nas médias dos episódios de cada temporada, marcaram: 21 pontos em 2008; 20 em 2009; 14 em 2010; 13 em 2011 e 12 em 2012.6 Segundo dados do Ibope de agosto de 2012, o público predominante do Profissão Repórter é assim dividido:

6

Do site TV Diário. Disponível em www.tvdiario.com.br. Acesso em 15/05/2013 21

Gráfico 4: Caracterização da audiência do programa Profissão Repórter. (Fonte: IBOPE / Workstation – Mogi das Cruzes – Agosto/12)

1.6 Interatividade A partir de 2008, quando o Profissão Repórter passa por uma restruturação e se torna um programa fixo na programação da Rede Globo, nota-se também a importância dada às ferramentas web, que passaram a ser utilizadas em complemento ao programa na TV. Foi criado um blog da redação, com informações sobre os programas e, mais ainda, com vídeos extras, curiosidades, dentre outros, que não vão ao ar. Esses recursos passaram a ser cada vez mais utilizados, acompanhando as mudanças de contexto da sociedade, como o alavancamento das redes sociais, como Twitter e Facebook. Dessa forma, o Profissão Repórter tem utilizado dessas ferramentas a fim de interagir com os telespectadores, que além de comentar, elogiar ou criticar o programa, pode também dar ideias e colaborar na busca por novas histórias. O blog, em especial, é a ferramenta em que os repórteres têm mais espaço e liberdade para expor suas opiniões e comentários sobre a reportagem que produziram. Após as reportagens mais polêmicas, complicadas, difíceis, geralmente são publicados vídeos de relatos dos próprios repórteres dizendo sobre sua experiência de 22

vencer os “desafios da reportagem”, uma espécie de diário/relatório de reportagem. Isso mostra que, a ideologia da questão “humana” envolvida no trabalho do repórter que é valorizado no programa é também levantada e incentivada no meio digital. Mais importante aqui é a interatividade que a ferramenta propicia com os espectadores, em um espaço como o blog dedicado à discussões das matérias, da atuação dos repórteres, enfim, em que a produção pode receber o feedback de seu público. Assim, percebe-se que há um interesse em envolver o público na produção de uma reportagem, pois pode visualizar melhor o trabalho dos jornalistas, do cinegrafista e da produção da reportagem de uma forma geral. Por meio do ambiente virtual, no site do programa, o telespectador pode acompanhar e aprofundar ainda mais nos bastidores dos bastidores do Profissão Repórter. Nos vídeos extras, os repórteres falam sobre as reportagens mais marcantes de sua trajetória, detalhes de produções mais complexas ou mais delicadas, ou como conseguiram alguma informação, enfim, diversas informações que estavam no extracampo do programa exibido na televisão, ou ainda vídeos gravados propriamente para a seção Extras. Em geral esses vídeos possuem conteúdos mais leves, ou pelo menos na forma mais informal como são realizados. Recentemente, além de cenas extras, o site também criou um novo quadro chamado “Por dentro do vídeo”, que tem um conteúdo mais técnico, voltado para a questão do vídeo. Nele, os cinegrafistas ensinam a manusear as câmeras, ajustar a iluminação em ambientes diversos e algumas dicas para capturar melhor o áudio de acordo com as situações. É interessante observar que os repórteres cinematográficos Felipe Bentivegna e Rafael Batista falam para um público bem geral, e dão dicas também voltadas para dispositivos “não profissionais”, como câmeras digitais caseiras, ou vídeos gravados por celular. 1.7 Bastidores Diante da revelação dos cenários até então escondidos por trás da câmera, bem como das conversas e sensações vivenciadas pelo repórteres, o Profissão Repórter, parece diminuir a distância dos telespectadores dos profissionais do jornalismo, bem como do programa em si. Nesse sentido, pode-se inferir que o programa utiliza estratégias de aproximação com os espectadores que geram e sustentam a familiaridade destes com o

meio

televisivo.

Segundo

Elizabeth

Duarte,

essas

estratégias

são 23

a

metadiscursividade e auto-reflexividade. A metadiscursividade é um fenômeno discursivo que pode ser manifesto em nível inter e intratextual. Segundo a autora, o metadiscurso se funda em um procedimento de referenciação da ordem da recursividade, pois volta-se para um outro discurso, pré-existente a ele, do qual ele fala, constituindo-se esse em condição de sua existência e em sua razão de ser. Nessa perspectiva, todo metadiscurso atualiza relações intertextuais que se pautam por certas condições de precedência temporal. (DUARTE, 2004, p.3)

Já a auto-reflexividade é um procedimento de autorreferenciação da ordem da incidência. Isto é, implica a presença de um sujeito que faça de si próprio objeto do discurso por ele mesmo produzido. A autora sustenta ainda que a televisão só exibe os bastidores quando estrategicamente propõe essas visitas guiadas pelas câmeras com uma função: a de aproximação e de interiorização de seu público: há determinados laços de cumplicidade e afetividade que só se estabelecem quando se permite ao outro que adentre nossa cozinha. (DUARTE, 2004, p.15)

A partir daí, a exibição das câmeras, diálogos informais, reuniões de pauta, enfim, constituiriam, de acordo com estes autores, mecanismos que são geradores de aproximação e, mais ainda, de transparência do processo produtivo. Além disso, o Profissão Repórter se propõe a dar voz aos "culpados", às vítimas e aos mais diversos personagens de que se utilizam para construir uma narrativa jornalística, muitas vezes com maior ênfase para estes do que para os especialistas - que normalmente são as fontes primárias tradicionais do jornalismo. Segundo afirmação da diretora executiva do programa, Janaína Pirola, “as histórias humanas são importantes na narrativa do Profissão Repórter porque geram identificações por parte das pessoas”. Sobre a escolha das personagens, é interessante observar que quando se trata de assuntos mais curiosos, como prostituição, crime e juventude, em sua grande maioria a produção do programa esforça-se em encontrar fontes ou “tipos” diferentes, que possuam histórias emblemáticas e inusitadas, tornando a reportagem mais atrativa, como é o caso de Dona Rosinha, uma prostituta de 73 anos. Embora o programa dê bastante destaque à figura dos personagens e fontes, o fio condutor da narrativa do programa se baseia propriamente na figura dos repórteres, bem como em sua rotina de trabalho e do seu fazer jornalístico. Esta, 24

talvez, seja a característica que mais se destaca no Profissão Repórter, por se tratar de um programa jornalístico de formato híbrido (SERELLE, 2009) e que se constrói e se baseia em uma metanarrativa (DUARTE, 2004). A exibição dos bastidores, ainda pode ser considerada como indício da autorreferencialidade que, segundo Umberto Eco, são características próprias da televisão: Ela fala de si mesma e do contato que estabelece com o próprio público. Não interessa o que diga ou sobre o que ela (também porque o público, com o controle remoto, decide quando deixá-la falar e quando mudar de canal). Ela, para sobreviver a esse poder de comutação, procura entreter o espectador dizendo-lhe “eu estou aqui, eu sou e eu sou você”. (ECO, 1984, p. 183)

Ainda segundo Eco, essas também são características que servem para reduzir a diferença entre informação espetáculo. Assim, a autorreferencialidade no programa em questão, estaria ligada à “alteração da sociabilidade, que ocorre pela mediação da experiência humana pela técnica e por processos de produção simbólica midiatizado”, conforme apresentam Eloisa Klein e Mariana Bastian (2008). Já com relação a atuação dos repórteres, a hibridização se faz presente na medida em que estes permeiam dimensões tanto reflexivas (bastidores da notícia) quanto representativas (desafios da reportagem) durante a reportagem. Conforme acredita-se, no caso do Profissão Repórter, os repórteres conduzem a narrativa ainda que não exerçam papeis de protagonistas. Assim, a proposta inicial do programa de “revelar os bastidores”, então, se suportaria basicamente na figura dos jovens jornalistas, como apontam Gross e Paschoalick: A proposta de desvelar ‘os bastidores da notícia e os desafios da reportagem’ consolida-se com cenas de making of, recurso que se apoia mais em testemunhos humanizados dos repórteres que vão a campo do que em situações de pré e pós-produção das reportagens, como discussão de pauta e edição. (PASCHOALICK; GROSS, 2012, p. 46)

Dessa forma, nota-se que no Profissão Repórter os profissionais possuem uma importante função de conduzir o narrar do programa, afinal seu testemunho torna-se aqui parte da matéria jornalística. Ainda segundo Gross e Paschoalick, por diversas vezes a atuação do repórter ganha, inclusive, mais atenção do que a própria notícia. Embora variável, as pesquisadoras identificaram uma tendência para a maior valorização das notícias a partir de 2009, enquanto que em 2010 o foco se deu mais

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em função das histórias das personagens, buscando um equilíbrio entre o que as autoras diferenciam como “bastidores” e “desafios”. Diante da exibição não desproposital da ação dos jornalistas, conforme apresenta Mariana Duccini (2012), é preciso olhar mais criticamente para o posicionamento destes repórteres. A autora nos chama a atenção para atuação dramática dos mesmos, que ela destaca enquanto sendo um dos polos modalizadores de Profissão Repórter que, “como ‘desafio da reportagem’, prevê a constituição do sujeito-repórter por meio de recursos de figuração, estratégias de representação e construção do testemunho”. Neste caso, como reforça a autora, a dimensão testemunhal acontece por meio da protagonização dos jornalistas, dos relatos, e da própria construção imaginária da figura do repórter. As reportagens de interesse humano em Profissão Repórter ganham, então, uma adição ao relato: a manifestação das posições do sujeito-repórter. O enfoque à figura e à vida da principal personagem (fonte) da matéria tornase uma história completa, com começo, meio e fim. (LUCINDA, 2008). Assim, o programa assume alguns elementos dramáticos, como a locução em off feita pelos repórteres durante a reportagem - o relato humanizado, que confere marcas do jornalismo literário. Dessa maneira, a linguagem do programa aparenta dialogar com diferentes formas de narrar tais como o jornalismo televisivo em si, a do documentário e também da dramaturgia. O nível jornalístico seria, no caso, aquele ligado diretamente à notícia, do conteúdo informativo, como fatos, dados, apuração e montagem, assim como a entendemos classicamente no jornalismo. Já sua forma dramatúrgica televisiva se relacionaria à constituição técnica das imagens, que utiliza-se da linguagem melodramática a partir de elementos tradicionalmente utilizados na narrativa ficcional clássica. Aqui, a colagem de dois tempos e a mistura entre o real e o ficcional são características fundamentais. Por fim, a linguagem de documentário do Profissão Repórter se dá principalmente diante do movimento de câmeras. Ressaltando, porém que o termo não se refere às produções cinematográficas e sim à produções telejornalísticas. E é a partir dele, no momento da edição, que a narrativa é costurada, superando, como aposta Kleber Mendonça (2002) “a tensão existente entre o nível jornalístico e (...) o nível da simulação”. Ele reforça ainda que será exatamente neste momento que “será 26

garantido o efeito de realidade que permeia todos os esquetes, fundamental no acatamento da estratégia do programa”. (MENDONÇA, 2002, p.70) Para outros autores, embora a atitude da exibição dos repórteres demonstre mais transparência no processo produtivo, pode também ser considerada uma auto exposição inadequada, uma vez que, ao revelar os profissionais, o teor informativo da notícia seria desprivilegiado em detrimento da protagonismo dos profissionais durante a construção da reportagem. A “cena do jornalismo” se transformaria, assim, em uma espécie de espetacularização da notícia ou do jornalista. Por outro lado, como observa Marcela Xavier (2010), o programa inaugura uma nova postura ética do jornalista, caracterizada não mais pela neutralidade. A credibilidade adquirida pelo aparente distanciamento dos fatos é substituída pelo envolvimento dos profissionais, que conquistaria a confiança do público. Assim sendo, acredita-se que compreende-se na figura do repórter um dos principais responsáveis pela criação de laços com o público espectador, na medida em que se mostra, vive, sente e narra os acontecimentos diante dos olhos de todos. No entanto, conforme almeja este estudo, e considerando que há em Profissão Repórter um considerável teor dramatúrgico, seja na narrativa do programa seja na atuação dos repórteres, busca-se então compreender quais são os motivos e os porquês da revelação e atuação desses profissionais. Quais são, afinal, as razões para tal exibição e, mais ainda, do papel de protagonistas que é desempenhado pelos repórteres em Profissão Repórter?

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2. JORNALISMO E ATUAÇÃO Para o presente estudo, foram selecionadas três edições do Profissão Repórter, que serão analisadas sob a perspectiva da atuação dos profissionais, buscando compreender de que forma isso se dá no programa e quais seriam as razões e os modos pelos quais o fazem no decorrer das reportagens. Portanto, a escolha das referidas edições teve como principal princípio a observação dos mecanismos com que joga o programa, baseado no desempenho dos repórteres ao se revelar nos bastidores da produção da reportagem. Mais além, o estudo também buscará abranger a contribuição disso para confiar ao programa os laços e interações esperados com seu público. As edições escolhidas para análise são: “Violência Sexual”, exibida no dia 5 de abril de 2011; “Abuso de álcool por jovens”, que foi ao ar no dia 19 de abril de 2011 e, por fim, “Idosos esquecidos em hospitais”, exibida no dia 18 de dezembro de 2012. Conforme apresentado nos capítulos anteriores, parte-se do pressuposto de que o programa Profissão Repórter utiliza-se de diversas estratégias para criar laços de afetividade com o público e assim ganhar a confiança por parte do mesmo. A exibição dos bastidores, enquanto recurso que atribui a sensação de transparência do processo televisivo é também de natureza metanarrativa, o que confia marcas da credibilidade que buscam os programas jornalísticos televisivos. Os episódios escolhidos, bem como em outros do Profissão Repórter, apresentam importantes características que despontam o protagonismo dos repórteres ao expor sua rotina e, de forma convocativa, prendem a atenção dos telespectadores interessados em acompanhar o processo de produção de uma reportagem jornalística televisiva. No entanto, como observa-se, ao dizer de si mesmo e do processo produtivo, o repórter - que de certo modo também se torna personagem da reportagem - parece reforçar seu poder de fala e, assim, confere maior credibilidade ao fato que narram. Isso nos leva a deduzir que são eles, os repórteres, os principais atores da narrativa do Profissão Repórter e, portanto, fundamentais para se compreender os jogos utilizados pelo programa na busca pela legitimação das realidades propostas em sua narrativa. As edições indicadas nesta pesquisa serão estudadas de acordo com essa premissa.

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2.1 Descrição do corpus 1ª edição - Violência sexual (05/04/11)

A primeira edição escolhida para a análise foi o programa exibido no dia cinco de maio de 2011, cujo tema abordado foi Violência Sexual. Os repórteres Gabriela Lian e Raphael Prado, mostram os casos de atendimento a vítimas de estupro no hospital Pérola Byington. A reportagem, que também tem a participação de Caco Barcellos, acompanha o trabalho dos profissionais que lidam diariamente com diversos casos de mulheres e crianças, vítimas de casos de violência sexual, e os traumas que sofrem, especialmente nos casos em que a vítima engravida do estuprador. Esta edição mostra a história de vítimas abusadas na rua, no trabalho, a caminho da escola e até mesmo dentro de casa, por familiares. Fala também sobre os casos de aborto - quando permitido – e o preconceito que gira em torno do tema, como ocorre durante a reportagem, na recusa de algumas enfermeiras em prestar ajuda a uma paciente de uma cirurgia de interrupção de gestação. Nos casos em que o aborto não é permitido, a vítima ainda pode optar por encaminhar o bebê para a adoção. O programa tem duração total de 28’21’’, divido em dois blocos. Na chamada, que é montada com cenas curtas e cortes rápidos, Caco Barcellos aparece andando pela recepção do hospital, em São Paulo, de onde anuncia o tema do programa. As ilustrações e o trabalho gráfico das transições de imagens durante o programa utilizam os desenhos dos rostos de mulheres que estão pintados na fachada do hospital. A passagem de Barcellos, tem duração de 1’35’’ e é intercalada primeiramente pela cena de uma criança relatando seu medo diante do ocorrido e depois por imagens da reação dos repórteres sensibilizados diante da cena que assistem no hospital. Depois, Caco Barcellos retoma o assunto chamando a atenção para os relatos das vítimas e a cena corta para a imagem em que uma criança diz para a repórter Gabriela Lian que quer revelar um segredo. O próximo tópico são as vítimas que engravidam, e após a narração em off de Barcellos, são exibidas imagens em que a equipe do hospital decide pela autorização do aborto de uma vítima. Logo depois, a cena corta para uma vítima que agoniza de dor, devido aos efeitos da cirurgia. Por fim, Caco Barcellos anuncia: “o pedido de socorro das vítimas mais frequentes: As crianças abusadas dentro de casa” e finalmente corta para imagens de crianças traumatizadas relatando o abuso que sofreram. 29

O programa começa com cenas de pés de várias mulheres transitando pela porta do hospital e depois, sem identificar a assistente social, o câmera foca no detalhe do bordado do uniforme dela com os dizeres: “Referência da Mulher”. Primeiramente, em off, Barcellos narra como a reportagem foi feita pelo repórter Raphael Prado, que passou 12 dias nos corredores do hospital, registrando histórias de violência sexual e o drama daquelas que engravidaram. Depois, segurando a câmera o próprio repórter se filma enquanto conta, em um relato, como conduziu a reportagem, em uma cena que ocupa 1’15’’ do programa: Raphael Prado: Nossa equipe fica numa sala improvisada, para não atrapalhar a rotina do hospital. Durante uma semana foram as assistentes sociais quem pediram autorização para gravar as entrevistas. Nenhuma mulher aceitou falar. Decido então fazer o pedido pessoalmente: Rafael Prado (conversando com a vítima): - Meu nome é Raphael, sou do Profissão Repórter, da TV Globo. A gente está fazendo uma reportagem sobre o trabalho aqui do ambulatório de violência sexual. Nós não vamos te identificar. Não estamos mostrando nenhum dos pacientes. Você acha que tem algum problema? Podemos gravar? (Profissão Repórter, 05/04/11)

Esta cena chama a atenção, assim como em diversos outros momentos deste mesmo episódio, porque o repórter mostra para o público a dificuldade que encontrou em conseguir abertura das fontes entrevistadas, reforçando o quão delicado está sendo seu trabalho naquele ambiente, especialmente por lidar com vítimas já sensibilizadas, conforme mostra seguinte imagem:

Imagem 2: i) Raphael Prado filma seu próprio relato; ii) O repórter durante o processo de abordagem às fontes; iii) Ele convoca o repórter cinematográfico. (Profissão Repórter, 05/04/11)

O repórter reitera por diversas vezes o cuidado que tem ao tocar no assunto, ao abordar as fontes e ao mostrar que não pretende atrapalhar o andamento das atividades no hospital. No diálogo a seguir, podemos observar com mais exatidão quando ele esclarece sua intenção ao conversar com uma de suas fontes: Repórter (em off): Para minha surpresa, as mulheres não se incomodam que um repórter homem grave os relatos.

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Repórter: Eu quero perguntar isso para você, aliás, você acha que a minha presença aqui de alguma forma está te constrangendo? Você quer dizer coisas que você não está dizendo? Eu me retiro. Vítima: Não, não, pode ficar. Por mim... Repórter (em off): Vamos preservar a identidade das vítimas. As vozes serão distorcidas. (Profissão Repórter, 05/04/11)

Em um vídeo extra, os repórteres comentam sobre a reportagem e ambos relatam que tiveram muito cuidado para não “resgatar” memórias ou detalhes do trauma das vítimas. A reportagem segue com trechos de entrevistas das vítimas com a assistente social, em que dizem sobre o caso do abuso que sofreram e também sobre sua situação psicológica. Os rostos das crianças e vítimas são sempre desfocados, e as imagens predominantes são dos movimentos, detalhes das mãos, do ambiente e por diversas vezes dos próprios repórteres diante daquelas cenas. Assim, é através da reação dos repórteres que o telespectador interage com a sensação dos relatos e do sofrimento das vítimas. A seguir, novamente em off, Raphael Prado explica que nos primeiros dias que ficou no hospital, um número chamou sua atenção: 53% das vítimas de violência sexual são crianças, menores de 12 anos. Portanto, ele e sua parceira Gabriela Lian decidem falar com o diretor do núcleo do hospital: Raphael (conversando com o diretor do núcleo): Nem eu, nem ninguém na redação com quem eu conversei, nós não conseguimos ficar indiferentes com essa quantidade mesmo de casos. É impressionante. Quinta-feira da semana passada foram 12 atendimentos, 10 para crianças. Raphael (em off): A partir da segunda semana de plantão, propomos ao diretor do núcleo que meu trabalho fosse dividido em duas reportagens. Raphael (conversando com o diretor do núcleo): Então ficaremos eu com os casos de aborto e Gabriela com os casos de crianças vítimas de violência. (Profissão Repórter, 05/04/11)

Esse diálogo é interessante porque traz a discussão de pauta, que geralmente ocorreria dentro da redação, para um diálogo que foi travado com o diretor do núcleo do hospital. Os repórteres mostram que sentiram abalados ao notarem o alto índice de crianças vítimas de violência sexual e que por isso a reportagem deveria ganhar um rumo diferente a partir dali. A cena de bastidores, neste caso, se dá em uma conversa no meio do corredor do hospital e revela os percalços que podem ocorrer durante uma reportagem - como a alteração da pauta (Conf. Imagem 3). Esta cena também 31

exemplifica a forma como o repórter narra em off o que faz (propor a divisão do trabalho em duas reportagens) e, logo em seguida, traz a imagem dele realizando a ação (imagens dele ao propor a divisão para o diretor do núcleo).

Imagem 3: Os repórteres conversam com o diretor do núcleo nos corredores do hospital. (Profissão Repórter, 05/04/11)

Gabriela Lian, então, encarregada de se dedicar aos casos de crianças abusadas, conversa com uma vítima. Durante a conversa ela mostra detalhes do nervosismo da criança quando toca no assunto. Nesta cena, como também em outros momentos, Gabriela Lian narra o acontecimento enquanto as imagens mostram exatamente o que ela está dizendo. Com medo de estar atrapalhando a conversa da criança com a assistente social, o repórter Raphael levanta-se e sai da sala: “Eu acho que é melhor a gente sair um pouquinho”. Gabriela, que fica na sala, ouve o relato e depois conversa com a avó da criança, que fala sobre a dificuldade em ter que denunciar o próprio filho. Enquanto a avó fala de dentro da sala com Gabriela, a câmera – que está do lado de fora - filma as expressões da repórter entre a porta semiaberta, ao ouvi-la. Este recurso também é utilizado em outras cenas, provavelmente porque as fontes não podem ser reveladas – por uma questão ética - e também na intenção de mostrar a sensação dos jornalistas ao lidar com a situação. Durante o relato da criança, Gabriela fica dentro da sala, enquanto a câmera permanece ligada de fora e, enquanto filma a porta fechada, capta o áudio do microfone que está do lado de dentro, como mostra a imagem a seguir:

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Imagem 4: i) Gabriela Lian fala com a criança, vista pela porta semiaberta. ii) A câmera permanece ligada, com a porta fechada. (Profissão Repórter, 05/04/11)

A segunda vítima, de dez anos, pede para a mãe sair da sala porque ele tem um segredo a contar. Gabriela conversa com o menino durante 1’20’’ e o questiona se ele quer contar esse segredo para alguém que está ali. E ele responde que não pode revelar na televisão e ela conclui: “O segredo não será revelado”. Esta cena é importante porque faz referência, mesmo que de forma indireta, à própria televisão. O garoto tem consciência de que seu segredo se tornaria público caso fosse gravado pelo programa. O diálogo prossegue, e a repórter pergunta ao menino se ele gostaria que ela dissesse o nome do agressor na televisão. Dessa forma, ela reforça que a televisão poderia, caso quisesse, exercer um serviço: Vítima: Mas você vai falar o meu nome? Repórter: Não. Não vou falar o seu nome. Vítima: Só vai falar o nome do agressor? Repórter: Também não. Você gostaria que eu falasse o nome dele? Vítima: Não, mas mesmo assim eu queria que ele fosse denunciado. (Profissão Repórter, 05/04/11)

Um corte transfere a cena para outro hospital, onde Caco Barcellos está conversando com a assistente social Avani Maria. Ela fala sobre a frequência dos casos que acontecem dentro de casa. Caco Barcellos questiona sobre como ela lida com sua vida pessoal depois de ouvir tantos relatos dramáticos diariamente em seu trabalho. Ele entra em aspectos mais íntimos ao extrapolar o ambiente de trabalho da entrevistada, como no diálogo a seguir, que se prolonga por 1’50’’: Caco Barcellos (em off): A cada meia hora ela ouve um relato dramático.

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Caco Barcellos: No seu dia a dia, assim, como que é o seu trabalho, você observa que o trabalho está presente fora daqui, na sua vida? Avani: (...) Eu ouço: “Eu não esperava que isso fosse acontecer dentro da minha própria casa”. Quer dizer, eu também sou vulnerável a isso. Caco Barcellos: Então você pensa: “poderia acontecer com você”. Avani: Poderia acontecer dentro da minha casa. Caco Barcellos: Avani, você é casada? Avani: Sou viúva. Caco Barcellos: Mas a visão que você tinha dos homens, mudou depois desse trabalho? Avani: Não posso generalizar. São homens e são mulheres. Homens que cometem esse tipo de crime, mas eu não posso generalizar. (Profissão Repórter, 05/04/11)

Embora os outros repórteres também o façam, geralmente é Caco Barcellos - o repórter mais experiente - que se responsabiliza pela parte mais “intimista” das entrevistas. É ele quem adentra, além das casas, o mundo interior das personagens entrevistadas. O jornalista parece tentar conhece-las além de seu lado “vítima”, mas também seu interior, seus sentimentos, sua condição mais humanizada. Depois, o programa segue para os setores onde são realizados os tratamentos psicológicos e onde se localiza a farmácia do hospital, locais onde são feitos os exames e dadas as medicações aos pacientes. A enfermeira conta que os efeitos colaterais dos remédios são o principal motivo pelo qual as vítimas interrompem o tratamento. Durante o almoço, Caco Barcellos conversa com as funcionárias sobre um caso impressionante que aconteceu no dia: uma menina de 16 anos que fez aborto há seis meses e que tentou suicídio. Caco revela (em off): “A história pra nós também surpreende. Conhecemos a jovem um dia antes.” Então, a próxima personagem é Daniela Pedroso, a psicóloga que atendeu essa paciente. O jornalista acompanha ligações da médica para o hospital onde a menina está internada e depois seguem para a casa de Daniela, onde Caco Barcellos a entrevista sobre aspectos relacionados a sua vida pessoal, e sobre como ela coordena seu trabalho quando não está dentro do hospital. De volta ao hospital Pérola Byington, Raphael Prado acompanha o depoimento de outra vítima. Com duração de 1’40’’, a cena mostra o relato de uma 34

criança de 12 anos que demonstra estar muito abalada, com medo, e que está grávida. A assistente informa a ela e sua mãe que ela não poderá fazer o procedimento do aborto e elas optam por entregar o bebê para adoção. Durante esse diálogo, a câmera está enquadrada na expressão do repórter, que se mostra visivelmente incomodado com a situação.

Imagem 5: O repórter Raphael Prado mostra-se sensibilizado diante da situação da vítima. (Profissão Repórter, 05/04/2011)

Um corte retoma a cena de Caco Barcellos, que mostra a sala de Macroscopia, onde está o banco de dados do hospital. O material genético ajuda a justiça a prender vários agressores, como o caso do eletricista acusado de engravidar duas vezes a própria filha. Depois disso, o jornalista vai conversar com a tia da vítima, que conta mais detalhes do fato. Depois, vai até a casa da própria vítima, onde mostra detalhes da casa, da família, até que a vítima chega em casa chorando: Vítima: Eu cheguei, quando eu “tava” lá em baixo, o pessoal já chegou perguntando “o que está acontecendo, a Globo tá aí?”. Aí eu falei que não sei o que está acontecendo, não é nada. “É por causa daquilo, é por causa daquilo que aconteceu contigo e com teu pai”. Uma menina ali me xingou de galinha. Tem um monte de pessoas falando que eu não ia prestar mais. Aqui, essa casa me traz muita lembrança ruim. (Profissão Repórter, 05/04/11)

A vítima, talvez sem intenção, conta que foi vítima de um constrangimento pelo fato da reportagem da Globo estar em sua casa, diante da reação dos vizinhos. Depois, a entrevista segue com o desejo da menina de se tornar policial, para trabalhar na Delegacia da Mulher e poder defender as vítimas de violência sexual, como ela. De forma geral, a entrevista de Caco Barcellos adentra mais nos aspectos emocionais e

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íntimos da vítima, do que diretamente relacionados a aspectos da violência que ela sofreu, assim como todas as outras no decorrer desta edição. Uma vinheta traz a imagem novamente para o hospital, onde a repórter Gabriela Lian conversa com a assistente social Analita. Ela atende dois casos muito parecidos: meninas novas, abusadas pelos primos mais velhos. E as duas crianças são filhas de mães que também foram violentadas na infância. Durante esse diálogo a repórter mostra-se visivelmente envolvida com a história da mãe, que também conta sobre quando foi violentada ainda criança. Em seguida, a mãe diz para a repórter sobre seu sentimento de culpa pelo que aconteceu com a filha - enquanto a câmera enquadra a expressão de Gabriela, comovida. No final da conversa, a mãe fala da reação da filha quando ela pediu perdão: Repórter: Qual foi a reação da sua filha quando viu você chorando? Mãe: “Não chora mamãe, vai ficar tudo bem”. (...) Repórter: Te ajudou? (Profissão Repórter, 05/04/11)

Depois de alguns segundos em silêncio, a repórter olha para a criança que está desenhando, depois volta seu olhar para a mãe. E como em um gesto de compaixão, a pergunta se aquilo havia ajudado a mãe a superar.

Imagem 6: Gabriela Lian se emociona ao ouvir o relato de duas vítimas, filhas de mães que também sofreram abuso durante a infância. (Profissão Repórter, 05/04/11)

O segundo bloco do programa mostra uma reunião no hospital Pérola Byington em que a equipe do hospital, médicos, assistentes e psicólogos discutem sobre a aprovação de um aborto, que é marcado para o dia seguinte. Raphael Prado 36

acompanha um aborto feito pelo método da aspiração e depois acompanha o aborto de Maria (nome fictício) que faz aborto por meio de medicamentos. Sem identifica-la a personagem é filmada apenas em planos detalhe (closes de suas expressões) ou planos mais gerais (Conf. Imagem 7).

Imagem 7: Planos ocultam a identidade da personagem Maria (Profissão Repórter, 05/04/11)

Durante a madrugada, as enfermeiras de plantão se negaram a ajudar Maria porque eram religiosas e contrárias ao aborto. A psicóloga Daniela tenta promover o encontro da paciente com a chefe das funcionárias para fazer a reclamação, mas não é possível porque o aborto aconteceria naquela hora. O repórter mostra-se engajado na tentativa de ajuda-la, mas devido à urgência do procedimento cirúrgico naquele momento, se retira da sala dizendo ao cinegrafista: “Acho bom a gente ficar lá fora, não é?”. Após a cirurgia, na saída de Maria, Raphael conversa com a paciente, perguntando aspectos de sua autoestima e seus sentimentos após o procedimento: “Na entrevista com a psicóloga Daniela, você falou uma coisa que me impressionou bastante”. Então um flashback remonta a cena em que a paciente fala com a psicóloga: “Desde que eu soube que eu estou grávida, a cada dia que eu me olho no espelho, volta. Então, isso não sai...”. Em seguida, o repórter a pergunta: “Depois do aborto você já se olhou no espelho?”. Desde sua primeira aparição, a história da personagem Maria ocupa 3’20’’, o que corresponde a quase 60% do segundo bloco da edição. O final da reportagem sugere que além desses casos, muitas outras mulheres continuam em tratamento no hospital, e que aquelas cenas continuam a se repetir. O repórter acompanha a conversa de mais uma vítima com a assistente social que a pergunta se ela pretenderia continuar o tratamento. O repórter então, decide deixar a sala, deixando esta história no ar, como quem sugere continuidade: “Vou deixar vocês conversarem...”. 37

Após o término do programa, junto aos créditos, Caco Barcellos convida os telespectadores a visitarem o site do Profissão Repórter, onde se encontra a relação do serviço de atendimento às vítimas de violência sexual no Brasil. 2ª edição – Abuso de álcool por jovens (19/04/11)

O segundo programa analisado foi ao ar no dia 19 de abril de 2011. A equipe acompanha três festas pelo país, onde se encontram jovens que abusam do consumo de álcool. Em São Paulo, os repórteres Paula Akemi e Thiago Jock mostram o ritmo de vida de muitos jovens que trocam os estudos pela festa que acontece todos os dias na porta da faculdade. Eles conversam com os alunos, falam da preocupação dos pais e sobre a posição da diretoria da faculdade. Enquanto isso, Caco Barcellos cobre um show de rock em Porto Alegre e se depara com muitos jovens alcoolizados e em más condições na rua, sem atendimento. Já os repórteres Gabriela Lian e Victor Ferreira estão em uma “festa de peão” no interior de São Paulo, onde o atendimento no posto médico não para durante toda a noite. O episódio, que é divido em dois blocos, tem duração total de 27’03’’. Já na chamada anunciam que o programa vai cobrir três diferentes festas: quinta feira em frente a faculdade; sexta-feira em uma “festa de peão”; e sábado em um show de rock. A narração em off de Caco Barcellos é acompanhada por imagens de jovens “virando” bebidas alcoólicas e passando mal devido ao excesso do álcool. E diz: “O Profissão Repórter investiga porque os jovens brasileiros estão bebendo cada vez mais cedo e cada vez mais”. As cenas seguintes já revelam o tom da abordagem desta edição do programa. Em São Paulo, jovens que bebem muito em vez de estudar; em Porto Alegre adolescentes que bebem muito e não conseguem se divertir, a preocupação dos pais e os postos médicos lotados na “festa de peão” de Bragança Paulista. O programa começa de uma forma que chama a atenção. Os repórteres Paula Akemi e Thiago Jock estão em frente a uma universidade paulistana, em meio a uma multidão de jovens que bebem e se divertem no meio da rua Taguá. Paula questiona Thiago como eles deveria abordar os jovens naquela situação: Paula Akemi: A gente tá aqui em frente a uma faculdade em São Paulo, bem aqui na porta. Qual que você acha que pode ser nossa abordagem, Thiago? Thiago: É, então... É sempre constrangedor chegar nesse momento. Muita gente no bar aqui em frente... 38

Caco Barcellos (em off): O desafio dos repórteres Paula Akemi e Thiago Jock é falar sobre o consumo de álcool com os universitários. Paula Akemi: Você acha que a gente abre o jogo, pra falar que é a matéria? Thiago Jock: Assim, pra se aproximar você vai ter que puxar uma conversa mais “quebra-gelo”, digamos assim. Mas, é importante você dizer do que se trata a matéria, desde o começo, eu acho. (Profissão Repórter, 19/04/11)

Como se pode observar, ela fala com Thiago Jock, mas na verdade, parece se comunicar com o público, especialmente porque começa sua fala dizendo: “A gente está aqui na porta de uma faculdade (...)”, o que é revelador da simulação da espontaneidade dos repórteres nesta cena. A repórter então entra no meio das rodas de amigos perguntando qual é a bebida que eles estão bebendo, qual o curso que eles fazem e os horários das aulas - no caso, a aula que eles deveriam estar em vez de estar ali bebendo. A maioria das imagens, em plano geral, mostra as rodas de amigos e a rua cheia de jovens, com destaque para as garrafas e copos com bebidas alcoólicas nas suas mãos.

Imagem 8: Thiago Jock e Paula Akemi discutem sobre como abordar os jovens na porta da Faculdade. (Profissão Repórter, 19/04/11)

Acompanhado pela voz de Paula, um infográfico mostra que os universitários bebem mais do que a população em geral: 60% afirmam que consumiram álcool no último mês. Na população geral são 38%. Os dois repórteres estão a procura de um personagem que realmente abuse do álcool e conversam entre si sobre dificuldade em diferenciar os que estão ali “na farra” daqueles que de fato bebem sem controle. Esse diálogo, assim como a primeira edição analisada, também se relaciona com a

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discussão

de

pauta

e

decisões

dos

repórteres

sobre

como

abordar

o

assunto/entrevistado. Um corte transfere a matéria para Porto Alegre. De dentro do carro, Caco Barcellos explica: “Nosso foco aqui é buscar meninos entre treze e vinte e poucos anos. Jovens, alcoolizados”. Um gráfico aparece na tela acompanhada da voz do repórter: 71% dos jovens de Porto Alegre experimentaram bebida alcoólicas entre os 10 e 18 anos.

Imagem 9: i) De dentro do carro, Caco Barcellos fala sobre a abordagem da reportagem; ii) Gráfico mostra dados do consumo de álcool por jovens em Porto Alegre .(Profissão Repórter, 19/04/11)

Ele sai para a rua e conversa com os jovens, perguntando sobre os hábitos e a frequência com que eles consomem bebidas alcoólicas – aparentemente, uma tentativa de comprovar a estimativa que acaba de ser apresentada pelo infográfico. Em off, Barcellos diz que às três horas da madrugada as consequências do excesso da bebida começam a aparecer. Enquanto isso, sua fala é ratificada com as cenas de jovens sendo carregados por amigos, sentados no chão e passando mal na rua. De volta para a rua Taguá, Paula entrevista Poliana Tupinambá, uma vizinha que enfrenta todos os dias o “bloqueio” dos estudantes para chegar até sua casa com seu carro. A repórter entra dentro do veículo para fazer o percurso junto da moradora, enquanto conversam. Depois, voltam para o meio dos jovens e conversam com eles sobre como fazem para sair das aulas. Um deles diz que o professor dá presença para que possam sair – e só ficam os nerds. Em seguida, Paula vai falar com um estudante de 19 anos que eles filmam “virando” uma garrafa de cachaça. O apelido dele é Neymar, e ele será uma personagem de maior destaque mais adiante.

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A próxima cena é de Paula, ainda na rua, falando ao celular com Caco Barcellos. Ela fala sobre a situação do lugar, as fontes que encontraram. Durante a ligação, ela ressalta que encontraram uma catadora de latinha que dizia que o ponto ali era muito bom porque tinha muita latinha. A resposta de Barcellos não é mostrada, e a cena corta para a entrevista com a catadora. A cena anterior chama a atenção pela tentativa de mostrar uma apuração em tempo real – como se Caco Barcellos e Paula estivessem realizando as entrevistas de forma simultânea; além do destaque que é dado à personagem – uma catadora de latinha – que possibilitaria uma abordagem diferente ao excesso de consumo de álcool partindo da quantidade de latas no chão do local, e não somente pelos estudantes. Ao avistar Neymar saindo de carro, Thiago Jock tenta alertar o estudante sobre o perigo de estar dirigindo após ter ingerido bebida alcoólica: Thiago Jock : E aí Neymar, tudo em ordem, cara? Paula Akemi: Você está bem para dirigir? Neymar: Vossa Senhoria acha que eu estou bem? Thiago Jock: Nós temos registro de você bebendo meia garrafa de pinga... acho que é suficiente, não é? Você sabe que pode estar dirigindo uma arma aí também. (Profissão Repórter, 19/04/11)

Enquanto Thiago fala sobre ter o registro do jovem bebendo pinga, uma imagem em flashback exibe a cena (Conf. Imagem 9). Embora os jovens repórteres se mostrem preocupados com a situação do rapaz, a resposta de Neymar não aparece na matéria. No entanto, a cena é finalizada com o jovem acelerando o carro e saindo o que, de certa forma, nos sugere que o estudante não se importou com a recomendação.

Imagem 10: Efeito de flashback retoma a cena em que o jovem Neymar “vira” uma garrafa de pinga. (Profissão Repórter, 19/04/11) 41

E, também, reforça a mensagem dos perigos do abuso de álcool por jovens, tema conduzido no decorrer do programa. Diante de cenas como essa, também é possível notar o uso do silêncio que, em certos casos, pode deixar alguma interpretação subentendida. Um corte conduz a reportagem novamente para Porto Alegre, com Caco Barcellos. Nas cenas seguintes, que somam o tempo de 1’42’’, ele anda pelas ruas e encontra muitos jovens na rua sem atendimento e tenta ajudar: Barcellos: Tudo bem aí? O que houve com seu amigo? Jovem: Meu amigo está um pouco mal, estou esperando meu irmão chegar pra levar nós. Barcellos: Você viu o pulso dele? O que ele bebeu? Jovem: Ele bebeu só cachaça, daqui a pouco ele tá bem. Barcellos: Deixa eu levantar a cabeça dele... Você quer que eu ligue pra a ambulância, alguma coisa? Jovem: Não, daqui a pouco meu irmão tá aí. Muito obrigado. Barcellos (em off): Vou em busca de socorro. No caminho eu encontro outros jovens bêbados, sendo carregados. (Profissão Repórter, 19/04/11)

Atrás da casa de shows, o repórter descobre uma área reservada para o atendimento dos jovens alcoolizados. A equipe do Profissão Repórter foi impedida de filmar o local pelos seguranças: “Não filma aí, não filma. São todas crianças. Não pode filmar aqui. É criança, meu querido, tá expondo pessoas menores”. E Caco Barcellos responde: “Mas se é criança por que vendem bebida?”. E depois diz que por terem sido impedidos de mostrar o atendimento voltaram às ruas onde o socorro aos adolescentes continuava.

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Imagem 11: Durante a reportagem, Caco Barcellos tenta ajudar alguns jovens que passam mal na rua. (Profissão Repórter, 19/04/11)

Aqui, a exibição dos bastidores parece vir a reforçar sua atividade e seu posicionamento diante da situação. Barcellos volta para procurar o adolescente que parecia desmaiado, mas descobre que ele conseguiu se levantar e foi até o posto. Um corte muda o cenário da reportagem. Em Bragança Paulista, interior de São Paulo, os repórteres Gabriela Lian e Victor Ferreira estão em uma “festa de peão” que reúne 30 mil pessoas. Da mesma forma que os repórteres Paula Akemi e Thiago Jock, Gabriela e Victor também começam a abordar os jovens perguntando sobre o tipo da bebida que eles estavam bebendo. A partir das “misturas” das bebidas típicas da festa, Gabriela diz: “Viemos pra mostrar o reflexo de toda essa mistura no posto médico da festa”. Já de início, o médico informa à equipe que eles não têm autorização para filmar dentro do posto médico. E a repórter explica: “Horas antes da nossa chegada, a prefeitura trocou a assessoria de imprensa com quem tínhamos combinado a reportagem”. Então decidem andar pela festa. Logo, encontram Geovani, um jovem muito alcoolizado que está a caminho de casa, na companhia do amigo Gabriel. A repórter o acompanha. Também na saída da festa, Caco Barcellos, de Porto Alegre, se senta ao lado de um adolescente que disse que bebeu para tentar se aproximar das meninas. Durante a conversa, ele admite para Barcellos que não adiantou nada, porque vomitou e não se divertiu. Caco Barcellos pergunta a ele se poderia visita-lo em sua casa no dia seguinte. No entanto, no outro dia, já na porta da casa do garoto, o pai informa que ele saiu de casa com os amigos. Barcellos, então, entra na casa para conversar com o pai: Às seis da manhã a gente estava com seu filho. Conversamos bastante. E ele disse “eu não estou muito bem, estou um pouco alterado porque eu bebi muito”. Ele contou? Ele falou para o senhor desse nosso encontro, com a televisão, com o Profissão Repórter? (Profissão Repórter, 19/04/11)

Nesse diálogo, é interessante notar a metarreferência direta que o repórter faz ao mencionar o “encontro com a televisão, com o Profissão Repórter”. O diálogo segue e o pai conta que se preocupa com o filho, mas que ele também fazia o mesmo quando era jovem, e por isso trata o assunto com mais naturalidade. Ele também fala com a madrasta e a filha dela, que relatam a mesma situação.

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Na cena seguinte, o especialista Flávio Pechansky, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul explica sobre os problemas que o álcool provoca em jovens com a idade em que o cérebro está em formação. Uma vinheta faz o corte e nos conduz para o interior de São Paulo, onde Gabriela Lian anda pelas ruas acompanhando o jovem Geovani. Eles se encontram com a mãe de uma amiga, que conta que não é raro ver esse grupo de amigos exagerando na bebida. Durante a conversa, Geovani quase se envolve em uma briga na rua. A cena do jovem alterado passa por um efeito de transição de imagem. A cena que se segue começa com a pergunta de Gabriela: “Qual que é sua lembrança de ontem?”. A entrevista acontece no dia seguinte, e ele conta que no mês passado gastou o salário todo em festa e a repórter o questiona se ele não ajudou os pais com esse dinheiro. É interessante observar que a reportagem não revela como a repórter combinou de encontrar Geovani no dia seguinte, como foi feito com a entrevista anterior de Caco Barcellos e também com o Neymar nas cenas seguintes. Ao final da conversa com Geovani, após um corte, a repórter narra em off que à noite ele estaria de novo na “festa de peão”, mas não conseguiram encontra-lo. As imagens, ao mostrar o ambiente lotado, confirmam o motivo de não terem o encontrado. A repórter volta a insistir na importância do registro do atendimento no posto de saúde e finalmente conseguem gravar. Eles falam com os enfermeiros que contam sobre os riscos do consumo excessivo do álcool, como convulsões, coma alcoólico e aspiração do próprio vômito. Sexta-feira, em São Paulo, Paula Akemi está pela terceira noite seguida na porta da faculdade. Ela mostra a dificuldade de se movimentar no meio da multidão. As entrevistas continuam mostrando menores consumindo bebida alcoólicas, e os jovens bebendo no horário de aula. Depois, Paula e Thiago vão até a porta da faculdade e pedem ao segurança para fazer imagens de dentro do prédio – para mostrar como é o movimento visto de dentro da sala de aula mas, por telefone, o segurança não recebe autorização para deixa-los entrar. Da redação, Caco Barcellos orienta a repórter: “Pois é, Paula, a gente precisava aqui, de uma maneira mais contundente, essa negativa deles. Por que só temos aqui a negativa do segurança, é isso?”. As cenas mostram o segurança fazendo a ligação e responde que a chefia não havia permitido. Então, com um corte voltam novamente para a redação, de onde os 44

jornalistas debatem sobre a pauta, enquanto assistem a cena pelo monitor do computador: Caco Barcellos: Tá vendo? Não está dito claramente. Tem que dizer assim... você diz quantos dias você ficou. E registramos muita gente, muitos estudantes dessa universidade que em vez de estudar, trocaram os estudos pelo álcool. “Na porta da casa de vocês. Como é que vocês explicam isso? Vocês estão fazendo alguma coisa para evitar isso?” Paula Akemi: Você acha que é melhor eu ir pessoalmente ou por telefone? Caco Barcellos: Acho que pessoalmente e com câmera, pra mostrar com a sua voz você dizendo pra alguém. Não pode ignorar. Esse diretor, ou presidente, seja quem for, seja assessoria, tem que passar no meio dessa multidão de gente alcoolizada pra chegar à universidade. (Profissão Repórter, 19/04/11)

É interessante observar neste diálogo que Caco Barcellos revela a lógica da reportagem e explica o motivo pelo qual a repórter terá que voltar ao local e insistir em falar com a coordenação da faculdade. E durante sua fala, as imagens que são exibidas no vídeo mostram cenas da “multidão” na porta da faculdade. Dessa forma, ele já explicita o posicionamento do programa com relação ao fato e mostra ao público como funciona essa tomada de decisão na produção de uma matéria jornalística. Outro detalhe é que quando ele responde que a repórter deve ir pessoalmente e com a câmera, podemos observar que ele olha rapidamente para a câmera que o filma e também para o cinegrafista que a segura. Assim, ele realça a presença da câmera ali no momento da conversa, dentro da redação.

Imagem 12: Na redação, a repórter Paula Akemi recebe orientações de Caco Barcellos. (Profissão Repórter, 19/04/11)

O segundo bloco, começa com a voz de Paula Akemi dizendo que avistou Neymar. E enquanto um flashback relembra a cena em que o jovem vira uma garrafa de cachaça, ela fala em off: “Conhecemos Neymar na noite anterior. Com essa cena, 45

ele chamou a nossa atenção”. (Conf. Imagem 10) Ele confessa que não foi à aula novamente porque teria palestra. Paula pede para acompanha-lo no dia seguinte. Um corte os leva para a porta da casa do personagem e Paula anuncia: “[ele está] chegando de carro vermelho, já ficou nosso conhecido nosso nessa matéria”. Em conversa com o pai, ele menciona o nome do garoto e a repórter brinca: “É Gabriel seu nome, é? Eu não sabia até agora”. O pai fala que se preocupa com o excesso do filho e também pelo fato dele dirigir, mas como Gabriel recebe uma pensão da mãe, já falecida, o pai não tem como controlar os gastos do filho. Neymar mostra as diversas multas que recebeu por estacionar em local proibido, na rua Taguá, onde bebe em frente a faculdade. Ao final da conversa, Neymar se despede e diz que vai comprar bebida e voltar para a Taguá. Em off, enquanto mostra imagens da multidão fechando a rua na porta da faculdade, Paula diz: “Também voltamos para a rua Taguá. Vamos ouvir o que a Faculdade tem a dizer sobre as cenas que registramos”. O vice-reitor Arthur de Macedo diz que a faculdade faz palestras sobre álcool e drogas orientando os alunos e que os professores reprovam os alunos ausentes. Mas que eles não têm controle do que ocorre fora dos muros da faculdade. A entrevista dura cerca de 40’’. Uma vinheta corta para Bragança Paulista e Gabriela Lian mostra o movimento intenso do ambulatório. Ela conversa com o próprio colega Victor Ferreira e eles falam sobre suas impressões sobre o que veem: Gabriela: vinte atendimentos em 40 minutos. Pelo menos uma meia dúzia que já foi pro hospital, certo? Não é impressionante? Victor Ferreira: É, a maioria tem saído direto pro hospital porque aqui dentro também não dá pra ficar, não é? (Profissão Repórter, 19/04/11)

Logo depois, a repórter oferece ajuda a uma jovem com sinais de embriaguez. Acompanhando de dentro do ambulatório, eles mostram a quantidade de jovens e o intenso fluxo no local. As imagens mostram alguns jovens desesperados, gritando, preocupados com os amigos que passam mal. As enfermeiras, com tanto movimento, não podem parar para dar entrevista, o que talvez justifique o fato do diálogo dos repórteres mencionado anteriormente.

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Imagem 13: Segurando a segunda câmera, o repórter Victor Ferreira comenta sobre a situação no posto médico (Profissão Repórter, 19/04/11)

No final, rapidamente, uma das enfermeiras diz: “A quantidade da ingestão de álcool. Aqui é demais, eles estão bebendo demais”. Assim, a especialista reforça o que dizia a reportagem desde o início, e o programa é finalizado. No entanto, a reportagem não responde o que o editor Caco Barcellos havia anunciado no início do programa: “O Profissão Repórter investiga porque os jovens brasileiros estão bebendo cada vez mais cedo e cada vez mais”. Junto aos créditos do programa, Caco Barcellos convoca os telespectadores para acessarem o site do Profissão Repórter, onde se encontra a relação dos serviços de saúde e de organizações que ajudam os jovens a evitar problemas com o álcool. 3ª edição – Idosos esquecidos em hospitais (18/12/12)

A terceira edição eleita para análise foi exibida no dia 18 de dezembro de 2012, tendo como tema o drama de idosos abandonados em hospitais e clínicas de São Paulo. A reportagem mostrou a triste história de idosos e crianças que foram esquecidos pelas famílias e que vivem solitários em abrigos. Esta foi a última edição do ano de 2012, exibida na véspera das festas de Natal, e mostrou também como esses pacientes de sentem nessa época do ano. Em um outro eixo, o programa também aborda os casos das crianças que são abandonas, muitas delas que passam a vida toda no hospital. O programa se inicia com cenas de idosos caminhando solitários pelos espaços de um abrigo. A câmera distante os coloca em uma posição que ocupa um pequeno espaço no vídeo em relação ao cenário, o que parece reforçar a ideia da solidão. Na 47

chamada, Caco Barcellos apresenta os eixos que conduzirá no programa: o atleta, a engenheira química, o abandono no fim da vida. Um corte deixa a reportagem com Paula Akemi, que vai em busca de histórias de quem perdeu o contato com os parentes e de quem não sabe mais a própria identidade. As imagens são de idosos sem expressão, com o olhar perdido. Em seguida, imagens de crianças nos hospitais, cobertas pela voz da enfermeira dizendo que elas não recebem visitas. Transferem a cena para a passagem da repórter Thais Itaqui. Ela conversa com os profissionais do hospital que passam a fazer papel de pai e mãe dessas pessoas, esquecidas pela família. A reportagem começa com a repórter Paula Akemi andando pelo corredor do Hospital Dom Pedro II, na Zona Norte de São Paulo. Ela fala que dos 400 pacientes dali, 150 perderam qualquer vínculo com a família e 50 deles não sabem mais quem são. Depois, vai falar com a Dona Conceição, uma senhora de 73 anos que foi encontrada na rua sem documentos. Ela começa a entrevista elogiando o colar da idosa, mostrando um cuidado na abordagem. No entanto, depois de uma série de perguntas sobre sua vida e sua família, Dona Conceição se despede e se levanta repentinamente. A repórter acredita ter incomodado a paciente, e fala para o cinegrafista: “Acho que eu fiz muita pergunta, ‘né’? Deve incomodar um pouco”. No entanto, minutos depois Dona Conceição volta para falar com a repórter. Em off, Paula explica que essa reportagem se esforçará em tentar ajudar o hospital a encontrar informações sobre Dona Conceição: Paula Akemi (em off): A diretora do hospital nos apresenta Dona Conceição com a esperança de que nossa reportagem ajude a desvendar o passado dela. Paula Akemi: É uma espécie de quebra-cabeça, meio solto, assim... Sueli Pires (diretora do Hospital): Isso mesmo. Vamos ver se a gente tem a possibilidade agora de resgatar melhor essa história. Paula Akemi (em off): Começamos com a expectativa de encontrar um final feliz. Sueli Pires: Com certeza uma família está procurando por ela. (Profissão Repórter, 18/12/12)

Logo após o diálogo, a cena corta para a redação, onde a repórter está em um computador investigando sobre a vida de Dona Conceição. Olhando para a câmera, Paula Akemi diz:

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Paula Akemi: Coloquei o nome da Conceição na Internet, o nome completo dela, e apareceu aqui um documento do Diário Eletrônico da Justiça Federal da 3ª região. É de maio desse ano: Despejo por falta de pagamento. Ah, tem uma advogada aqui! (Profissão Repórter, 18/12/12)

Vale ressaltar que essa cena faz-se importante no sentido de que apresenta marcas nítidas da atuação da repórter quando, por exemplo, simula ter encontrado naquele mesmo momento, diante da câmera, o contato da advogada (Conf. Imagem 14).

Imagem 14: Diante da câmera, Paula Akemi investiga informações sobre Dona Conceição. (Profissão Repórter, 18/12/12)

A repórter vai até a casa onde Dona Conceição foi despejada e mostra uma foto dela para os vizinhos que a reconhecem. Quando uma das vizinhas fala sobre a neta de Dona Conceição, um flashback retoma a imagem da primeira entrevista em que ela fala sobre a neta – um efeito que aparentemente se relaciona aos lapsos de memória da paciente. Uma vinheta conduz a matéria para a casa de repouso onde está Caco Barcellos. Ele apresenta Dona Kazue, uma idosa de 62 anos que mora lá há 5 anos. Engenheira química, ela conta para Barcellos que ela gostaria de estar em casa com seu irmão. Ela tem esquizofrenia, mas não precisava viver internada. A médica Beatriz Perez confirma, e diz que o hospital não possui contato de nenhum familiar. Durante a entrevista, Caco Barcellos se interessa por aspectos mais pessoais de Dona Kazue, como a profissão, casamento, amor e filhos. É interessante notar que a conversa dos dois é intercalada por trecho em off em que o repórter explica, adianta ou confirma alguns dados que depois serão reforçados pela própria personagem, como no diálogo a seguir: Caco Barcellos (em off): Dona Kazue tem apenas 62 anos

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Caco Barcellos: Quanto tempo a senhora está aqui? Dona Kazue: 5 anos Caco Barcellos: E a sua família, onde está? Dona Kazue: Ah, eu “tô” abandonada... Caco Barcellos (em off): O irmão a deixou no hospital e nunca mais voltou Caco Barcellos: Você gostaria de estar onde, hoje? Dona Kazue: Em casa. Caco Barcellos: Com quem? Dona Kazue: Com o meu irmão. Caco Barcellos (em off): Foi o irmão quem inspirou Dona Kazue na escolha da profissão. Caco Barcellos: A senhora é Engenheira Química? Dona Kazue: Engenheira Química. Caco Barcellos: Fez faculdade onde? Dona Kazue: Na Poli. Caco Barcellos: Boa universidade, não é? (...) Caco Barcellos (em off): Ela não se casou, nem teve filhos. Caco Barcellos: Por que que a senhora nunca casou, posso saber? Dona Kazue (sorrindo): Ah, não deu tempo! (Profissão Repórter, 18/12/12)

Caco Barcellos constrói um diálogo em que as respostas de Dona Kazue e suas narrações se intercalam e se completam como na sequência da conversa que vão travando diante da câmera. Isso parece provocar a sensação de um consenso, de veracidade das informações. No entanto, a necessidade da narração intercalando o diálogo parece colocar o repórter em posição de destaque em relação à própria fonte, na medida em que é ele quem conduz a “história”, assim como o faz durante a entrevista. Esta cena tem duração de 1’10’’. Na cena seguinte, ele conversa com a médica Beatriz, responsável por fazer com que as famílias aceitem de volta os parentes que ficaram velhos e doentes. Ela explica que os homens são os que possuem mais dificuldade de inserção na família na hora da alta devido a perda dos vínculos familiares. Eles encontram Jorge Isaias, o ex50

lutador de boxe. Caco se dirige para o cinegrafista (com som em background): “O Jorge, que você acabou de filmar, Rafael, é um ex-boxeador. Será que ele tem condições de falar comigo ou não?”. Dessa forma, envolve o cinegrafista na reportagem e desvela a presença da câmera que o acompanha. Caco Barcellos fala com Jorge, de 87 anos, que está sentado em uma cadeira de rodas. Ele representou o Brasil nas Olimpíadas de Helsinki em 1952. O repórter pede para que ele mostre as mãos e as marcas do boxe. Segundo os médicos, as pancadas que ele recebeu no ringue contribuíram para o aparecimento da doença. Hoje ele praticamente não anda e tem falhas de memória. Quando recebeu alta, há 5 anos, seu Jorge estava mais forte. A médica Beatriz explica que a institucionalização, ou seja, deixar um paciente recluso, internado, não é bom para a saúde deles. Caco Barcellos vai até a casa da mulher de Seu Jorge, que conseguiu na justiça impedir o Hospital de mandalo de volta para casa. Com um corte, a vinheta leva a reportagem de volta para o hospital onde está Dona Conceição. Paula Akemi recebe as vizinhas da paciente, que foram visita-la. Elas conversam com a antiga vizinha e contam como ela era. Com falhas na memória ela não se recorda bem de suas vizinhas e se sentam para conversar. Ao final, da mesma forma que havia feito com Paula Akemi no início da reportagem, Dona Conceição se despede repentinamente e sai. A repórter fala com as vizinhas: “Depois de encontrar vocês eu fui até a polícia, na Delegacia de Desaparecidos”. Depois, corta para a passagem em que ela grava saindo da delegacia: Paula Akemi: Eu não pude gravar lá dentro da delegacia, mas as informações que me passaram foram o seguinte. Ninguém da família da dona Conceição jamais esteve aqui pra prestar queixa de que ela estava desaparecida. O último registro que tem dela é de março desse ano, quando um abrigo da prefeitura encontrou a Conceição. Quem foi buscar ela foi um genro. Mas desde então não se sabe o que aconteceu pra ela ter parado de novo no hospital em Junho. (Profissão Repórter, 18/12/12)

A repórter vai atrás de mais informações na imobiliária do bairro onde Dona Conceição morava. E, por fim, consegue encontrar uma filha dela. De dentro da redação, a repórter investiga e encontra o contato da filha. E diante das câmeras, tenta entrar em contato com a escola onde ela trabalha. Olhando para a câmera, ela completa: Paula Akemi: A filha da Dona Conceição não quis gravar entrevista, mas por telefone ela me contou que foi abandonada pela mãe quando ainda era criança. Ela também disse que no começo desse ano, até tentou levar a mãe 51

para morar com ela. Mas que a Dona Conceição ficou muito agressiva e fugiu. Paula Akemi (em off): Por carta, a direção do hospital informou que a filha de Dona Conceição não autoriza qualquer divulgação da imagem ou voz de sua mãe. Decidimos exibir a reportagem porque a história de Dona conceição representa a de muitos outros idosos. Dona Conceição recebeu visita da filha. Mas como não tem para onde ir, continua morando no hospital. (Profissão Repórter, 18/12/12)

Este trecho mostra-se especialmente importante no que diz respeito à opção da repórter em divulgar a imagem de Dona Conceição, ainda que não tenha sido permitido pela filha. Ela se justifica pelo fato de que o caso representa o caso de muitos outros idosos no país. Assim, ela mostra que o jornalismo também exige tomadas de decisões e isso se torna parte da matéria. Com um corte, Caco Barcellos é quem aparece no vídeo e está entrando no apartamento de Neide Carvalho, mulher do ex-boxeador Jorge Isaías. Em conversa com Neide, o jornalista fala sobre aspectos da vida pessoal, do passado do casal, do tempo em que Jorge competia. Ele mostra fotos pessoais do casal e medalhas de Jorge. Neide explica que Jorge está no hospital porque ele não podia ficar em casa por apresentar riscos e porque não aceitava ser cuidado pela enfermeira. Ela visita Jorge no hospital uma vez por mês. A cena seguinte mostra o dia em que ela vai entregar um presente de Natal para seu marido no abrigo. Durante a festa de Natal do abrigo, Dona Kazue recebe a visita de Nelita, que vai com frequência ao hospital visitar os idosos que não recebem visitas de familiares. Uma vinheta corta para a parte em que Thaís Itaqui fala sobre as crianças que não recebem visitas. Como ela mesma anuncia, onde o “abandono acontece no começo da vida”. Na Associação Cruz Verde, ela fala das diversas crianças que conheceu, em geral crianças com paralisia cerebral grave e que foram esquecidas pela família. A superintendente da associação Marilena Pacios fala que eles não se acostumam com o sofrimento das crianças e com a condição de abandonados. Em seguida, uma imagem mostra a repórter abalada passando a mão na cabeça, como quem passa por uma situação complicada, enquanto narra em off: Thais Itaqui (em off): O primeiro olhar é difícil. O coração fica apertado. (Imagens de crianças com paralisia) Thais Itaqui (em off): Mas conhecer melhor essas pessoas me fez bem

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(imagem da repórter pegando na mão de um paciente e dizendo em tom de brincadeira): Ele não quer largar minha mão mais! (Profissão Repórter, 18/12/12)

Nesta cena, a repórter contextualiza a situação não somente nos aspectos factuais, mas também dá detalhes de seus próprios sentimentos e do envolvimento diante dos pacientes que conheceu durante a reportagem.

Imagem 15: Thaís Itaqui se comove com os pacientes: “O primeiro olhar é difícil. O coração fica apertado” (Profissão Repórter, 18/12/12).

De uma forma geral, nessa reportagem, a repórter Thais Itaqui de fato parece conduzir sua reportagem baseando-se em seus relatos e experiências pessoais durante os dias que ficou no hospital. A repórter conversa com Dudu, um paciente que mora ali há 34 anos. Ele escreveu um livro com a ajuda de uma fonoaudióloga. Thaís Itaqui também mostra as fotos do paciente com algumas pessoas famosas. Após um corte, Caco Barcellos apresenta o casal de idosos Benedito e Maria, cuidados pela filha que foi orientada pelo hospital do Servidor. Dentro da casa, como de costume, o jornalista observa detalhes do ambiente e pergunta as personagens sobre aspectos de sua vida pessoal. Dirigindo-se para Benedito, indaga: “O que o senhor acha da sua vida hoje?”. Ele acompanha o trabalho de Regina para cuidar dos pais. Maria quase não enxerga e tem dificuldades de se locomover. O pai, Benedito, está cego e quase não escuta. Barcellos pergunta detalhes do almoço que a filha Regina está fazendo para o pai, e sentado à mesa, ao ouvir o pai reclamar da comida, sorri olhando para o cinegrafista, transmitindo a ideia de entender as dificuldades de cuidar de idosos.

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Ele também mostra a quantidade de receitas médicas, remédios e cuidados que eles necessitam e ressalta sempre o grande esforço da filha. Nesse sentido, pretendendo mostrar o empenho da filha em ajudar sua família, diálogos como esse são constantes no decorrer desse quadro: Caco Barcellos: Você mal colocou sua mãe na cama e já tem outra tarefa? Regina (sorrindo): Tenho... Olha pai, já trouxe o leite pro senhor. Tá quente! Vê se está bom. Caco Barcellos: Regina, eu contei, tarefas como essa, passar um creme no joelho do seu pai, eu contei 36 no seu dia. Você está cansada hoje, como é que você está?! (...) Regina: Eu faço de coração. Eu amo o meu pai e minha mãe, minha família toda. Caco Barcellos: Belo exemplo o seu. Regina: Obrigada! Caco Barcellos: Bom descanso, tchau! (Profissão Repórter, 18/12/12)

Uma vinheta conduz o programa para o hospital onde está Thais Itaqui, com as crianças. Ela conversa com mães e parentes de pacientes internados com paralisia. “Ao carinho da mãe, o filho responde com o olhar”. Em contraste com seu quadro anterior – sobre as crianças que não recebiam visitas -, a repórter destaca a importância das visitas para os pacientes. E diz em off: “dos 205 pacientes, cerca de 80 não tem contato com a família. E estes fazem dos funcionários pais, mães, tios...”. O trabalho da assistente social Maria Silvério é lembrar os familiares de visitar seus parentes internados. Ela faz o controle das visitas. Após uma ligação, um irmão vem visitar um dos pacientes e Thais Itaqui acompanha um pouco da conversa dos dois irmãos. O segundo bloco é sobre três batizados que acontecem na Associação Cruz Verde e os padrinhos das crianças são os próprios enfermeiros do hospital. Em um segundo eixo, Paula Akemi acompanha a festa de Natal do Hospital Dom Pedro. Ela conversa com Gildete que passa o Natal sozinha há oito anos no hospital e se queixa de viver sozinha. A cena seguinte mostra um diálogo em que Gildete, no meio da festa, pergunta à repórter se ela havia encontrado alguém da família dela: “E aí? Não achou ninguém da minha família?”. A repórter nega com a cabeça.

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Imagem 16: Paula Akemi diz não ter encontrado nenhum familiar de Gildete. (Profissão Repórter, 18/12/12).

Depois, a repórter explica que conheceu Gildete na primeira vez que foi ao Hospital. Ela saiu jovem de Minas para trabalhar em São Paulo e perdeu o contato com a família, mas se lembrava de uma sobrinha, Eliana, que Paula Akemi tentou ajudar a encontra-la. Paula diz, em off: “Tentamos encontrar Eliana, mas não conseguimos”. Esta cena é interessante se observarmos o modo como a reportagem lida com o fracasso em ter encontrado a prima de Gildete. Ao revelar essa parte da história, a repórter mostra seu esforço em tentar ajuda-la, mas o programa não revela mais detalhes sobre a prima a qual procurava para que, por exemplo, os telespectadores pudessem colaborar. Em seguida, fala com Dona Jacolina, que vive 66 anos no hospital. Ela acompanha a idosa e mostra detalhes do seu quarto. Depois conversam sobre os namorados que ela teve dentro do hospital, escondido das freiras. A matéria, então, é finalizada com Dona Jacolina dizendo: “Mas você sabe que as coisas são assim, quando é proibido que a gente quer, não é?”. Junto dos créditos, Caco Barcellos se despede da última edição de 2012 e convida os telespectadores a acessarem o portal do programa, onde estão os demais episódios do ano: “O Profissão Repórter volta no ano que vem. Até lá você pode ver os programas dessa temporada no nosso site. Bom fim de ano e até 2013.” Após os créditos, a última cena do episódio mostra o portal de entrada do hospital, visto de dentro, com a mensagem “Você trouxe alegria, volte sempre!”. Em contraposição, na imagem, está um idoso sentado de costas, solitário no interior do hospital, conforme ilustra a Imagem a seguir: 55

Imagem 17: Última cena da edição deixa uma mensagem aos telespectadores. (Profissão Repórter, 18/12/12).

2.2 O protagonismo dos repórteres Com base nos programas apresentados, algumas considerações podem ser feitas acerca das características que chamam mais atenção no programa que é objeto deste estudo. O principal critério que diz respeito à atuação dos repórteres se refere à revelação de seus sentimentos e envolvimentos durante a reportagem. Em todos os episódios analisados, eles expõem suas opiniões e emoções relacionadas às situações que vivenciam. De fato, em Profissão Repórter, o envolvimento dos profissionais parece ganhar uma grande importância ao desvelar os bastidores da confecção da reportagem. Quando se trata das fontes entrevistadas, é possível observar que em muitas vezes é dado maior destaque a detalhes do que a própria imagem da pessoa, especialmente nos casos em que a imagem não é revelada. Os detalhes podem dizer um pouco dos aspectos sociais e psicológicos das mesmas, como se a caracterizasse de forma indireta. Caco Barcellos é quem predominantemente adentra as casas e vai mais além, desvendando aspectos mais íntimos das pessoas com quem conversa. Mas, de um modo geral, o programa parece tentar sempre atingir uma profundidade maior no contato com as fontes. Ainda nesse sentido, vale ressaltar que as entrevistas são conduzidas de forma que os depoimentos das fontes se intercalam com a fala do repórter, em narração. Assim, parecem contar uma história que é criada pelos próprios jornalistas, e que será confirmada pela presença dos mesmos nos locais, diante de pessoas que vivenciam os fatos, além da experiência do próprio repórter, que também ganha significado. Nota-se ainda que os repórteres se preocupam em mostrar o modo como a 56

reportagem está sendo conduzida. Falas como: “Ficamos em uma sala improvisada”, ou “Como iremos identificar os jovens que abusam de álcool?”, por exemplo, além de dizer do trabalho dos repórteres, mostram também como a reportagem se constrói sob o ângulo dos bastidores. E, conforme se pressupõe, é de interesse do programa que isso seja revelado, uma vez que o backstage é parte integrante da narrativa do Profissão Repórter. Em diversos momentos, os jovens repórteres também se utilizam da exibição da técnica para justificar algumas posturas, por exemplo quando a repórter Paula Akemi diz: “não pude gravar dentro da delegacia”, tentando justificar o fato de não ter imagens da conversa que aconteceu naquele lugar. Também no caso em que a repórter Gabriela Lian conta: “Horas antes da nossa chegada, a prefeitura trocou a assessoria de imprensa com quem tínhamos combinado a reportagem”, ela utiliza de sua fala como o argumento pelo fato de não ter gravado no posto médico naquela hora e, além disso, reforça o problema da organização de uma festa na qual há muitos jovens embriagados. Depois ela ainda mostra que por um trabalho de insistência da equipe, finalmente conseguiram gravar dentro do posto médico – evidenciando mais uma vez seu esforço jornalístico. Da mesma forma, nos casos em que as fontes se recusam a fornecer entrevistas, os repórteres parecem confirmar aquilo que pretendem dizer ao deixar subentendido que a outra parte não quis se manifestar. Neste mesmo sentido, também é recorrente uma atitude de auto avaliação por parte dos repórteres. No episódio “Violência Sexual”, por exemplo, o repórter Raphael Prado teme incomodar o trabalho do hospital e sai da sala por diversas vezes. Da mesma forma, Paula Akemi o faz, quando, após a retirada repentina de Dona Conceição, fala para o repórter cinematográfico: “Acho que eu fiz muita pergunta, não é? Deve incomodar um pouco”. Assim, acredita-se que eles também queiram reforçar para o público o cuidado e as dificuldades no trato com suas fontes. Nos casos dos episódios “Violência Sexual” e “Idosos Abandonados”, em que os temas são mais delicados, isso se mostra mais recorrente. E ao que parece, a estratégia mais comum utilizada pelo programa é tirar o foco das fontes e dar maior visibilidade ao sentimento que é expresso pelo repórter ao lidar com a situação. Assim, ao revelar suas emoções, falhas e sentimentos, os repórteres parecem dizer para o público que, enquanto pessoas normais, estão sentido o mesmo que o telespectador sentiria caso estivesse ali.

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Outra consideração importante é a busca por evidenciar o “serviço” do jornalismo. Na reportagem “Idosos abandonados”, quando Paula Akemi decide investigar o passado de Dona Conceição para tentar ajuda-la, ou quando o repórter Caco Barcellos tenta ajudar os jovens nas ruas de Porto Alegre em “Abuso de álcool por jovens”, tentam mostrar que há uma preocupação em não apenas exibir o fato mas também de participar e colaborar quando possível. O fracasso também é parte da profissão como o caso de Dona Gildete. Ainda sobre o “serviço” do jornalismo à sociedade, os episódios apresentam diversas inferências direta e indiretamente sobre a televisão ou sobre o próprio Profissão Repórter, um movimento metanarrativo que também se apresenta como sendo peculiar ao programa. A título de exemplificação, têm-se as cenas em que Gabriela Lian pergunta ao garoto se ele quer que o nome do agressor seja veiculado na televisão; e a cena em que Caco Barcellos menciona o “encontro com o Profissão Repórter”, ao conversar com o pai de um adolescente de Porto Alegre. Em uma perspectiva mais geral, ainda podem ser mencionadas outras estratégias como a interação com os cinegrafistas, os diálogos travados entre os próprios repórteres e o uso dos flashbacks enquanto características comuns às edições estudadas. Contudo, resta saber em que medida todas essas particularidades apresentadas dizem respeito à atuação dos repórteres, que trazem características da dramaturgia para o jornalismo –, de que forma e por que razões aparecem no programa. Qual seria o motivo do destaque que é dado à figura dos jornalistas e que legitimidade o programa busca com isso? Por fim, esses atributos pertinentes ao Profissão Repórter contribuem para uma análise mais detalhada de acordo com a bibliografia apresentada no primeiro capítulo e que será discutida no próximo tópico.

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3. ANÁLISE Diante da observação dos episódios apresentados e na tentativa de desvendar as intenções da atuação dos repórteres no programa Profissão Repórter, o corpus deste estudo foi divido em grupos de relevância. Acredita-se, assim, que estes grupos representam, embora ainda não atinjam a completude das análises, os principais aspectos referentes à atuação dos repórteres. O primeiro grupo é formados pelas cenas em que são exibidas características da subjetividade dos repórteres. Seja por meio da opinião ou pela demonstração de envolvimento e sentimentos na produção da reportagem. O segundo grupo agrega as cenas em que são revelados os bastidores – as informalidades da construção da reportagem em Profissão Repórter. Neste grupo estão as discussões de pauta, edição e conversas paralelas. Por fim, o último grupo integra as cenas em que os jornalistas “narram” os acontecimentos. Neste sentido, estão incluídas as cenas em que eles relatam, antecipam, explicam, evidenciam e justificam o que é exibido pelas imagens. Vale ressaltar, portanto, que embora divididas, essas categorias não são rígidas, pelo contrário se apresentam constantemente de forma intercalada no decorrer dos episódios sendo, portanto, complementares.

3.1 O olhar subjetivo do repórter Com relação ao primeiro grupo, observa-se nos episódios analisados que o programa aborda os sentimentos dos repórteres e das fontes com quem conversam, de forma a trazer suas histórias para mais perto dos espectadores. Conforme afirma a diretora executiva do programa, Janaína Pirola, “as histórias humanas são importantes na narrativa do Profissão Repórter porque geram identificações por parte das pessoas”. Dessa forma o programa, ao mesmo tempo em que tenta destrinchar aspectos mais íntimos das fontes, revela marcas das sensações dos repórteres que são vivenciadas no ato mesmo da construção da reportagem. Portanto, o programa se concebe sob dois importantes eixos que dizem da relação pretendida com seu público e que se concretizam através do desnudamento das fontes e dos jornalistas em ação. De um lado, observa-se o modo como os repórteres, em especial Caco Barcellos, adentram as casas das pessoas e as questionam sobre intimidades; enquanto que de outro, são os próprios repórteres que se expõem – dizendo suas opiniões e percepções sobre o caso que relatam.

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Na edição “Idosos abandonados”, por exemplo, a ação do repórter Caco Barcellos torna-se visível quando ele tenta saber detalhes da intimidade das fontes. Na extensa entrevista com Dona Kazue, o jornalista a indaga sobre aspectos de sua vida pessoal, como a universidade em que estudou e os amores de sua vida. A senhora, que já mora há cinco anos no abrigo diz a ele que está abandonada e, em seguida ele a pergunta: “Você gostaria de estar onde hoje?”. É possível que o repórter já esperasse que a resposta fosse estar em casa, no entanto opta por pergunta-la. Por outro lado, na cena em que o Jefferson Drezett fala sobre a adolescente que havia tentado suicídio no episódio “Violência sexual”, o mesmo repórter revela: “A história para nós também surpreende. Conhecemos a jovem um dia antes”. Assim, compartilha sua experiência individual e também de sua equipe durante as gravações daquela reportagem. Nese sentido, e em conformidade com a afirmação de Janaína Pirola, Umberto Eco analisa que estes movimentos são de fato uma forma de criar aproximação com os espectadores e com a própria “realidade” da narrativa televisiva, na medida em que os repórteres “invadem” a intimidade das fontes, adentram suas casas e locais de trabalho, trazendo seus dramas interiores para dentro da sala do telespectador: Nesses casos aceita-se que frequentemente o público manifeste identificações e projeções, vivendo na história representada as próprias pulsões e adotando como modelos os protagonistas dessa mesma história. (ECO, 1984, p.187)

Assim sendo, reforça-se a ideia de que tanto as histórias das fontes quanto as reações que elas provocam nos repórteres durante a feitura da reportagem são importantes porque criam laços de identificação com o público, seja pela aproximação, seja pelo distanciamento do problema social. Por isso o programa evidencia pessoas comuns que vivenciam os fatos retratados na reportagem e que têm, por vezes, suas histórias de vida transformadas na base condutora da narrativa. No que diz respeito à atuação dos repórteres, bem como a estrutura do próprio programa, pode ser dividida em duas instâncias: 1) de sua natureza jornalística e investigativa, enquanto atores sociais - os repórteres atuam como testemunhas dos fatos, de real presença e confiabilidade nos problemas públicos que trazem à tona; e 2) de sua atuação representativa, ao dizer de seu trabalho, ao revelar técnicas e processos de produção da reportagem, ainda que isso seja claramente editado, planejado e atuado no sentido de produzir simulações dos desafios os quais se propõem a revelar. 60

No episódio “Violência sexual”, por exemplo, o repórter Raphael Prado por diversas vezes se retira da sala, com o pretexto de que não quer atrapalhar o trabalho das assistentes sociais. Ao incluir na reportagem a cena em que ele se incomoda com a situação, ele demonstra aos telespectadores o quão frágil, dramática e complexa é aquela situação – e também deve sê-lo para quem o assiste. Na cena em que os repórteres Raphael Prado e Gabriela Lian conversam com o médico diretor do Núcleo de Atendimento à Mulher no corredor, ele diz “Nem eu, nem ninguém na redação com quem eu conversei, nós não conseguimos ficar indiferentes com essa quantidade mesmo no caso. É impressionante!”. Assim, além de expor para o público sobre sua decisão de dividir a reportagem em dois eixos – cena dos bastidores – também revela que ele e sua equipe ficaram espantados com o alto número de crianças vítimas de abuso sexual – e que por isso o fato deveria ganhar um destaque na reportagem em questão. Uma das cenas mais nítidas neste mesmo episódio é a que Gabriela Lian conversa com a mãe de uma das vítimas que também foi abusada na infância. A repórter se mostra envolvida com a história que é contada pela mãe e suas expressões de compaixão para com a fonte são evidenciadas nas imagens. Neste momento a câmera filma a mãe de costas e é a expressão da repórter que está em destaque no vídeo. Gabriela se emociona, fica durante um tempo sem palavras e mostra-se de certa forma incapaz de continuar a entrevista sem seu “lado humano”. Então, prossegue aparentemente piedosa, perguntando à mãe se o perdão da filha a havia ajudado. Ao observar a participação dos repórteres nos episódios apresentados, pode-se inferir que ambas as técnicas – jornalismo e atuação dos repórteres – são parte da natureza autoafirmativa e legitimadora da televisão, conforme já apresentado, com o propósito de produzir efeitos de realidade e credibilidade em seus espectadores. Portanto, o Profissão Repórter fala muito mais de si do que dos assuntos de interesse público de que tratariam por princípio. Visto que o envolvimento dos repórteres e a exibição de suas reações nas edições analisadas não são despropositais, embora talvez almejassem que passasse despercebido, nota-se que o programa explora os “afetos” desse personagem que, no caso, se transforma no próprio repórter. E isso pode ser compreendido de duas formas: primeiramente em sua experiência individual, que parece distancia-lo do drama dos personagens de forma a evidenciar que aquilo não faz parte da vida do repórter e, talvez, nem dos espectadores. Esse distanciamento justificaria, portanto, o 61

motivo da cena ser tão comovente/atraente tanto para o repórter quanto para os telespectadores. E a segunda forma, quando nas discussões entre os próprios repórteres (seja diante das câmeras ou na ilha de edição), esboçam o que sentiram no momento das gravações. Essa última seria, no caso, uma forma de evidenciar e dar sentido ao processo da reportagem ou, nas palavras de Márcio Serelle, de “jogar luz sobre a experiência afetiva, estabilizando-a. (SERELLE apud SANTOS, 2012, p.184-185). Entretanto, o grupo dos bastidores será melhor detalhado mais adiante. Ao oferecer aos telespectadores a oportunidade de conhecer a televisão por dentro, seus aspectos técnicos e sua lógica narrativa que é conduzida pelos jornalistas, o programa duplica seus objetos de mediação e, dessa forma, por meio da linguagem metatelevisiva provoca a opacidade da experiência televisiva, como conclui Serelle: A realidade mediada jornalisticamente (aquela que empresta subtítulos ao programas, como tema) torna-se, portanto, pano de fundo para que a mediação televisiva possa seduzir por si mesma, na construção de uma metanarrativa sobre a formação de repórteres, expostos na condição especular de personagens. (SERELLE, 2009, p.172)

Diante dessas colocações sobre os aspectos apontados em Profissão Repórter, cabe inferir que ao compreender o papel dos repórteres, pode-se dizer que estes também se constituem enquanto atores ou personagens que conduzem e dão sentido à narrativa produzida pelo discurso do programa. Isso justifica, portanto, tal visibilidade que é dada à subjetividade dos jovens repórteres. Além disso, não se pode deixar de perceber que estas cenas estão intimamente ligadas à revelação dos bastidores e das conversas informais que dão sentido à atuação desses repórteres e é este o tema que será discutido no próximo grupo.

3.2 Os bastidores dos bastidores Diferentemente das outras reportagens jornalísticas, o Profissão Repórter possui como distintivo de sua narrativa a inclusão dos processos que a constituem. O extracampo que geralmente não é mencionado nos programas jornalísticos televisivos, aparece enquanto elemento fundamental e constitutivo da reportagem e, por isso, chama a atenção. Segundo Marshall McLuhan (2003), ao trazer à tona aquilo que se passa antes e durante a apuração do fato reforça ainda mais o teor informativo do programa, uma vez que “atende ao telespectador exigente, que gosta de ‘experiências em profundidade’ ”. (MCLUHAN, 2003, p. 373. Considerando ainda a subjetividade que é colocada neste âmbito, conforme 62

apresentado no tópico anterior, a união do que denominamos “atuação dos repórteres” com as “cenas de bastidores” parecem se complementar no programa em questão. A cena em que os repórteres conversam com o diretor do núcleo mencionada anteriormente, por exemplo, é reveladora da construção da pauta no ato mesmo da apuração da reportagem. Teoricamente, os repórteres que saem às ruas já possuem uma pauta definida, embora ela possa ser modificada – e muitas vezes é – durante sua produção, no entanto, geralmente isso não é revelado no produto final. De forma contrária, em Profissão Repórter o imprevisto pode – e deve – fazer parte de sua narrativa. Isso explicaria, portanto, o motivo da exibição da cena em que os repórteres Paula Akemi e Thiago Jock discutem a melhor forma de abordagem no início do episódio “Abuso de álcool por jovens”. Esta cena não possui outra importância para o público que não a de mostrar o modo como essa reportagem está sendo feita. E dessa mesma forma, esse tipo de cena se repete em diversos outros momentos no decorrer do programa. Aliás, vale mencionar que a dinâmica de Profissão Repórter também é construída por marcas que anunciam simultaneidade no processo de construção da reportagem. Como já mencionado no capítulo 2 deste estudo, os efeitos especiais que alternam os “eixos” da narrativa parecem dar a sensação de uma reportagem que é construída ao mesmo tempo, por diferentes repórteres e em diferentes lugares – diferentes visões de um mesmo fato. Como exemplo, tem-se a cena em que Paula Akemi conversa com Caco Barcellos pelo celular no episódio “Abuso de álcool por jovens”. A voz de Barcellos responde do outro lado da linha “Tudo bem. Onde você está, Paula?”. Assim, somos levados a acreditar que eles conversam entre si enquanto ambos produzem essa reportagem. A repórter o responde e fala sobre a situação na rua onde está e sobre a personagem que encontraram, mas a resposta do editor não aparece. Depois dessa parte, a reportagem se alterna (por meio de uma vinheta) exatamente para Porto Alegre, onde está Caco Barcellos, que anda pelas ruas oferecendo ajuda a jovens embriagados. Diante das observações apontadas sobre o modo como o Profissão Repórter explora “os fundos” de sua reportagem, é interessante aqui apresentar algumas reflexões sobre as noções de transparência e opacidade provocadas pelo extracampo dos bastidores. Segundo Serelle (2009), os bastidores exibidos no programa deixam de exercer a função de bastidores na medida em que são filmados e produzidos para serem televisionados. Para o autor, os limites dos bastidores televisivos estão cada vez mais indefiníveis, pois se tornam espaço de encenação. Por isso, acredita que

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quase nenhuma espontaneidade, ingenuidade ou tensão não-encenada pode ser mais captada nesses «bastidores», pois rapidamente essas imagens tornaram-se lugares-comuns, parte do espetáculo, forçando esses indivíduos midiáticos a se comportar, mesmo naquele espaço que, a priori, estaria fora da vista dos espectadores, como se estivessem em ‘situação de televisibilidade’. (SERELLE, 2009, p.170)

Assim, conforma-se com a ideia de que a exibição dos bastidores tem, além dos recursos estilísticos do programa, a intenção de criar significados e laços de afinidade com o público. Vale acrescentar que a própria confusão provocada em relação a sua natureza (real e ficcional), constitui uma estratégia para sustentar a condição de seu mundo autorreferencial, que é evidenciado pela exibição dos bastidores e dos processos de produção televisivos o que, para Eco, reflete o desejo do efeito de verdade buscado pelo programa: Com essa finalidade tais programas encenam o próprio ato da enunciação, através de simulacros da enunciação, como quando se mostram as telecâmaras que captam aquilo que acontece. Uma complexa estratégia de ficções põe-se a serviço de um efeito de verdade. (ECO, 1984, p.191)

Não se trata portanto, da verdade em si, mas a busca por credibilidade. Na cena em que Paula Akemi investiga sobre o passado de Dona Conceição no episódio “Idosos abandonados”, ela sugere algo de espontaneidade ao encontrar o contato da advogada naquele mesmo momento, bem diante da câmera. No entanto, conforme observado por Serelle, pode-se inferir que não há de fato espontaneidade neste momento. Mais além, uma vez que a narrativa de Profissão Repórter está sendo construída também pela encenação dos repórteres - nos termos de Serelle -, nota-se também uma preocupação maior dos mesmos em participar ativamente da apuração da notícia, uma vez que o seu esforço também ganhará visibilidade na reportagem. Vale ressaltar, no entanto, que a atuação dos repórteres não tem como efeito a ilusão de verdade sem que haja consenso com os telespectadores. Como apresenta Duarte (2007), os meios televisivos produzem discursos a partir do modo como ela quer que sua narrativa seja reconhecida, “dando a conhecer ao telespectador o modo como ele deve interagir com o produto que lhe está sendo ofertado”. (DUARTE, 2007, p. 7). Pode-se perceber, no caso do Profissão Repórter, que há, então, um pressuposto de que os espectadores reconhecem que o apresentado é uma configuração de mundo feita pelas linguagens, mas se permite convencer por aquilo que vê. Esta afirmação está de acordo também com o conceito de “pactos de leitura” (NOBLEJAS, 2005) exposto anteriormente. 64

Dessa mesma forma os repórteres, ao interagir com as cenas, com os cinegrafistas e entre eles mesmos estão, na verdade, apenas evidenciando a presença das câmeras e dos outros profissionais que estão ali colaborando para a construção daquela matéria jornalística. Os bastidores têm ainda uma função de conferir a noção de transparência que ocorre diante do “apagamento” das estruturas de produção, ou seu aparecimento como estratégia de evidenciar a ficcionalidade do repórter (SERELLE, 2009). E, assim, confere a sensação que o programa “não esconde nada” do telespectador, uma vez que ele também pode ver e vivenciar o extracampo. Assim, observa-se que o presente estudo se apresenta enquanto um revelador dos bastidores, da produção da notícia e com isso gera efeitos de reconhecimento por parte dos espectadores e legitimidade. Em contrapartida, os espectadores devem aceitar esse convite, de acompanhar o percurso dos repórteres na construção da notícia proposto pelo programa, conforme antecipado, por meio do “pacto de leitura”.

3.3 História narrada Não raramente os jornalistas são representados em um imaginário coletivo como atores sociais – aqueles que investigam e lutam pelos direitos da sociedade. Por isso, nota-se intensa busca pela autenticação do real, para garantir a confiabilidade por parte dos espectadores, em consonância com a premissa da “objetividade e imparcialidade” almejada pelo discurso jornalístico. Sobre isso, Patrick Charaudeau (2006) comenta que é natural que todo sujeito que deseja relatar um acontecimento se veja diante de um problema entre realismo e ficção, no entanto, “a instância midiática tem problemas particulares ligados às restrições do contrato de informação”. (CHARAUDEAU, 2006, p. 156). Diante disso, a TV apela para o que podemos chamar de “representações”, ou simulações do real, afim de mobilizar a afetividade dos telespectadores e assim desencadear o interesse pela informação que lhe é transmitida. Para tanto, a mídia procede “a uma encenação sutil do discurso de informação, baseando-se, ao mesmo tempo, nos apelos emocionais que prevalecem em cada comunidade sociocultural e no conhecimento do universo de crenças que aí circulam”. (CHARAUDEAU, 2006, p. 92). O autor explica que o contrato de informação midiática é, em seu fundamento, marcado pela contradição: finalidade de fazer saber; finalidade de fazer sentir. Este último relaciona-se às escolhas estratégicas apropriadas à encenação da informação para satisfazer o princípio de emoção ao produzir efeitos de dramatização. E é nesse 65

sentido, sobre a contradição do contrato de informação, que se tenta aqui explicar o formato do programa Profissão Repórter, pois em seu formato híbrido é possível notar marcas tanto do fazer saber – em seu lado jornalístico e informativo – quanto de seu lado fazer sentir – através das fontes e principalmente por meio da atuação dos repórteres. Assim, como se acredita, o programa consegue, por meio da narração das histórias, construir a dramatização a que se propõe, de forma a oferecer ao seu público uma narrativa aceitável e credível. Por narrativa, se aceita como verdadeiro o conceito de que é “um fenômeno que transcende em muito o fazer jornalístico e sua conformação textual. Narrar é um modo de estabelecer um modo de compreensão do mundo, de configurar experiências e realidades, de comunicar-se com o outro”. (LEAL, 2013, p.28). O efeito de narração de Profissão Repórter é, então, um relato humanizado que contextualiza e guia a narrativa do programa e isso só pode ser obtido quando o repórter assume uma postura de interlocutor. Nas primeiras cenas do episódio “Violência sexual”, por exemplo, em que o repórter Raphael Prado, enquanto segura a própria câmera, relata sobre os dias em que acompanhou o trabalho no hospital, ele fala mais de seu trabalho do que sobre informações do tema propriamente dito: Raphael Prado: É o primeiro dia que eu fico aqui no hospital Pérola Byington, em São Paulo, pra tentar acompanhar uma vítima de violência sexual. Depois de sete horas de espera, mais ou menos, ontem... Hoje já é o segundo dia que eu estou aqui no hospital Pérola Byington e tem dois casos já que a Assistente Social vai atender de violência sexual. Nossa equipe fica numa sala improvisada, para não atrapalhar a rotina do hospital. Durante uma semana foram as assistentes sociais quem pediram autorização para gravar as entrevistas. Nenhuma mulher aceitou falar. Decido então fazer o pedido pessoalmente: - Meu nome é Rafael, sou do Profissão Repórter, da TV Globo. A gente está fazendo uma reportagem sobre o trabalho aqui do ambulatório de violência sexual. Nós não vamos te identificar. Não estamos mostrando nenhum dos pacientes. Você acha que tem algum problema? Podemos gravar? - Wellington (chama o câmera) Raphael Prado (em off): Para minha surpresa, as mulheres não se incomodam que um repórter homem grave os relatos. - (...) Eu quero perguntar isso para você, aliás, você acha que a minha presença aqui de alguma forma está te constrangendo. Você quer dizer coisas que você não está dizendo?! Eu me retiro. Vítima: Não, não, pode ficar. Por mim... 66

Raphael Prado (em off): Vamos preservar a identidade das vítimas. As vozes serão distorcidas.

E somente depois é que o repórter começa a falar com as vítimas e contar sobre os casos de violência que elas vivenciaram. Outro aspecto interessante diz respeito à presença dos repórteres nos locais onde acontece o fato. Talvez como um legado do jornalismo gonzo que, embora seja mal visto pela maioria dos profissionais traz como principal característica a imersão total do repórter no universo da matéria, os programas televisivos atuam muitas vezes em função de mostrar a realidade a partir da presença dos profissionais. Nos casos em que a reportagem não é transmitida ao vivo, são utilizadas outras técnicas para “trazer para o presente” a situação vivenciada pelos repórteres. E isso é, sem dúvidas, um modo de conferir marcas do real à narrativa, ainda que esse testemunho seja também parte da atuação dos repórteres envolvidos. Essas estratégias são melhor explicadas por Lanham (1981), que conceitua a enargia e martirya como conceitos clássicos do jornalismo utilizados para construções de sentido, efeitos de real e presença dos repórteres no local da cena. Nas palavras do autor a enargia é a descrição clara, lúcida e vívida, por exemplo, quando a repórter fala exatamente a mesma coisa que é transmitida na imagem em exibição – uma estratégia de redundância. Já a martirya tem como função “confirmar algo pela própria experiência de alguém”. (LANHAM, 1981 apud SOARES, 2012). Isto pode ser observado em diversos momentos em Profissão Repórter, quando os narradores contam exatamente aquilo que se vê nas imagens. Um exemplo concreto é quando, no episódio sobre “Violência sexual”, a repórter Gabriela Lian utiliza da enargia quando diz “O menino aperta as mãos sem parar. A assistente social percebe o nervosismo”. Neste momento ela explica com suas palavras o que o telespectador já pode ver com nitidez através da imagem. Já com relação à martirya seus exemplos mais contundentes acontecem especialmente nas cenas em que os repórteres não possuem imagens do fato que falam e, por isso, precisam convencer os espectadores de que aquilo é verdade. Na cena em que Paula Akemi fala sobre sua apuração de dentro da delegacia, ela explica: “Eu não pude gravar lá dentro da delegacia, mas as informações que me passaram foram o seguinte (...)”. Com isso, ela

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exibe o motivo pelo qual não possui as imagens da conversa com o delegado mas, por estar ali, saindo de dentro da delegacia, seu relato ganha maior confiabilidade. Como se observa, em Profissão Repórter, essas estratégias são de certa forma empregadas no sentido de afirmar ou até mesmo de justificar as ações dos repórteres diante de suas atitudes, reações, ou tomadas de posição. Talvez por isso, e na tentativa de manter sua posição de “repórter ser social” (MAINGUENEAU apud SOARES, 2012, p.197), os protagonistas que conduzem a narrativa se expõem, se justificam e, mais importante, reforçam seu poder de fala. Recorrendo aos conceitos de Charaudeau, o efeito de verdade adquirido pela narração do Profissão Repórter se fundamenta em duas “provas” de veracidade da informação, que seriam a autenticidade e a explicação. Segundo o autor, a autenticidade caracteriza-se pela possibilidade de atestar a própria existência dos seres do mundo, validação que confere ao discurso um “real de transparência”. Para tanto, é utilizado o princípio da designação, que diz: “O que é verdadeiro eu mostro a vocês”. (CHARAUDEAU, 2006, p.55). E isso pode ser confirmado pela própria imagem ou pelo uso de objetos, documentos, dentre outros. Além da própria presença física dos repórteres no local da cena, esta prova pode ser visualizada em diversas cenas nas quais as personagens são descritas por meio de detalhes psicológicos, quando mostram as fotos de família, a organização da casa, quadros na parede ou documentos oficiais, como cartas, processos, etc. Com relação à segunda prova, a explicação, ela se relaciona com a possibilidade de explicar o porquê dos fatos, o que as motivou e a finalidade daquelas que foram protagonistas. O ideal de uma boa explicação consiste na retomada do lugar de origem dos fatos e o principal meio discursivo para entrar nesse imaginário é a elucidação, que diz: “eis porque as coisas são assim”. (CHARAUDEAU, 2006, p.56). Nos programas analisados isso pode ser notado com as entrevistas com especialistas ou pela própria exposição dos “diferentes ângulos da mesma notícia”, ou seja, a exposição de opiniões diversas. Mas a principal forma observada é por meio da conversa informal que ocorre nos bastidores da notícia. Os repórteres conseguem elucidar a narrativa da reportagem quando revelam os motivos pelos quais tomam certas decisões, por que estiveram ali ou de que forma foram tratados por alguma autoridade. No episódio “Idosos abandonados”, a repórter Paula Akemi conversa com a filha de Dona Conceição, que não autoriza a veiculação da imagem da mãe. No 68

entanto, dado que a idosa se torna uma das principais fontes dessa reportagem, Paula assim se justifica: Paula Akemi (em off): Por carta, a direção do hospital informou que a filha de Dona Conceição não autoriza qualquer divulgação da imagem ou voz de sua mãe. Decidimos exibir a reportagem porque a história de Dona conceição representa a de muitos outros idosos. (Profissão Repórter, 18/12/2013)

Esta cena é preenchida com a imagem da carta enviada pela direção do hospital, o que elucida e concebe autenticidade ao que está sendo dito, como nos termos de Charaudeau. Considerando ainda a construção do real por meio da locução dos repórteres, uma cena que chama a atenção é a que Caco Barcellos entrevista a paciente Dona Kazue. Em uma longa cena que dura cerca de 1’10’’, o repórter fala sobre diversos aspectos da vida da idosa, que mora há mais de cinco anos no abrigo. É interessante notar a forma como o diálogo é construído no programa, de forma que Barcellos narra em off de forma intercalada as imagens em que a própria responde às suas perguntas. Nessa intercepções, o repórter adianta, explica e complementa informações provavelmente adquiridas em outros momentos da conversa, conforme se observa: Caco Barcellos (em off): Dona Kazue tem apenas 62 anos Caco Barcellos: Quanto tempo a senhora está aqui? Dona Kazue: 5 anos Caco Barcellos: E a sua família, onde está? Dona Kazue: Ah, eu “tô” abandonada... Caco Barcellos (em off): O irmão a deixou no hospital e nunca mais voltou Caco Barcellos: Você gostaria de estar onde, hoje? Dona Kazue: Em casa. Caco Barcellos: Com quem? Dona Kazue: Com o meu irmão. Caco Barcellos (em off): Foi o irmão quem inspirou Dona Kazue na escolha da profissão. Caco Barcellos: A senhora é Engenheira Química? Dona Kazue: Engenheira Química. Caco Barcellos: Fez faculdade onde? Dona Kazue: Na Poli. 69

Caco Barcellos: Boa universidade, não é? (...) Caco Barcellos (em off): Ela não se casou, nem teve filhos. Caco Barcellos: Por que que a senhora nunca casou, posso saber? Dona Kazue (sorrindo): Ah, não deu tempo! (Profissão Repórter, 18/12/12)

Como se nota, a locução do programa é guiada pelos repórteres, no entanto, corroborada pelas fontes. Dessa forma, os jornalistas deixam suas fontes “falar por eles”, ou confirmar o que eles dizem, o que na verdade também é uma construção, seleção e edição da reportagem. Conforme os preceitos do próprio jornalismo, as entrevistas e os personagens são mecanismos legitimadores do discurso. Por meio dos entrevistados, os jornalistas confirmam aquilo que dizem sem, no entanto, se comprometerem. Porém, ao colocar na voz dos personagens exatamente aquilo que intencionalmente o repórter, e o programa, diria, nada mais é que um modo de reiterar o poder de fala daquele que possui a palavra final - os jornalistas. Neste sentido, Juliana Doretto e Renata Carvalho da Costa (2012) questionam: Podemos considerar também se, no entanto, quando o repórter parece recuar de seu protagonismo (...) e parece dar maior destaque ao entrevistado, ele não estaria apenas reafirmando seu papel como repórter, e assim reforçando ainda mais seu protagonismo. (SOARES, 2012. p.82-83)

Este movimento parece provocar a sensação de um consenso, o que nos leva a crer que a narração do programa é também um mecanismo gerador de efeitos de realidade, ao reforçar e confirmar a fala dos próprios repórteres.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com Umberto Eco, a televisão tem sofrido diversas modificações, evoluindo sempre inserida nos contextos sociais. Neste sentido, o Profissão Repórter contribuiu em grande medida para a criação e reconhecimento de novos formatos de programas jornalísticos ao aproximar seu público dos bastidores da produção televisiva. No entanto, como o autor observa, o dispositivo televisivo fala menos do mundo exterior e mais de si mesmo, do contato que estabelece com o público (ECO, 1984) e é exatamente a partir dessa consideração que este trabalho se propôs a analisar o programa em questão - partindo do pressuposto de um posicionamento metanarrativo do Profissão Repórter. Embora acredite-se em um considerável grau de “encenação” na atuação dos repórteres, é preciso ressaltar a premissa de que o jornalismo, apesar de utilizar de estratégias de construção de efeitos de real, é “construído, legitimado e inevitavelmente renovado na história e na cultura” (SOARES, 2012, p.54) - o que chama a atenção também para a esfera de recepção. A partir das características ressalvadas nas edições escolhidas para este estudo, buscou-se definir as estratégias relacionadas ao protagonismo dos repórteres e as razões da revelação de sua subjetividade, opiniões e emoções. De uma forma geral, essas propriedades têm como principal objetivo criar vínculos de proximidade com o público telespectador, bem como gerar efeitos de transparência e realidade – próprios da instância televisiva. E, assim, o profissional desempenharia ao mesmo tempo um exercício de autorreferencialidade e reforço cíclico de seu poder de fala, especialmente devido ao teor dramático que confere à narrativa. Os sentimentos dos repórteres são intercalados com as emoções das fontes entrevistadas no programa. A fusão dessas duas instâncias forma, então, a dimensão dramática de Profissão Repórter a partir do que Charaudeau (2006) denomina como sendo uma “encenação sutil do discurso de informação”. E neste caso o elemento da dramaturgia fica implícito no programa por meio da dinâmica da própria reportagem. Em alguns momentos são as histórias das fontes é que predominam enquanto que em outras situações são os próprios repórteres é que sobressaem. No entanto, ainda que as histórias das fontes ganhem certo destaque, a relação destas com os jornalistas é consideravelmente mais explorada no programa. Assim, como foi apresentado por Doretto e Costa (2012), o que poderia indicar um “recuo” do repórter pode, na verdade, reforçar ainda mais seu protagonismo. 71

Neste sentido, cabe inferir que os anseios dos jovens repórteres que saem às ruas em busca dos diferentes ângulos do mesmo fato são, em certa medida, direcionados pela edição do programa e pela narrativa dramatizada que é construída por eles mesmos. Os aparatos técnicos, a edição rápida, fragmentada, a transição entre as diferentes histórias, as interações e diálogos dos bastidores, tudo isso contribui em grande medida para que o programa consiga o efeito de transparência e simultaneidade. Mas as reportagens, como se nota, têm basicamente a história do processo como eixo central, bem como os esforços da reportagem e o trabalho que é feito pelos repórteres em busca daquelas informações. Assim, ao criar vínculos e afetos com o público, ao exibir cenas de autorreflexão (sobre o programa e a profissão de jornalista), ao apoiar-se nos bastidores e no discurso da “transparência”, os jornalistas trazem sinais de real para a narrativa do programa. Ao questionarem sobre o próprio fazer jornalístico, por exemplo, problematizando o desafios da reportagem, revelam as estruturas de produção e, com isso, as deixa menos evidente, conforme aponta Eco (1984). São, portanto, os repórteres, exercendo o papel de personagens é quem conduzem e dão sentido à narrativa do programa, guiando os telespectadores sobre como devem interagir com o programa. Também por meio da atuação dos repórteres e exibição dos bastidores, o Profissão Repórter consegue evidenciar a presença das câmeras conferindo, portanto, a sensação de transparência provocada pelo apagamento das estruturas de produção. E dessa forma, as cenas de bastidores têm como princípio complementar as histórias que são narradas – seja para confirmar, refutar, detalhar ou explicar o trabalho dos repórteres e a construção daquela reportagem. Os bastidores exercem, portanto, a fundamental estratégia de dar a ver os processos produtivos da televisão. Como afirma Jean-Louis Comolli (2009), a hipervisibilidade dada ao meio faz com que os espectadores percam a inocência diante das imagens. (COMOLLI, 2009 apud SOUZA, 2009). Este seria, nas palavras do autor, o desejo secreto do espectador: “nada mais ver, de tanto ver. Ver, enfim, demais, para finalmente não mais ver”. Somente assim, o Profissão Repórter poderia obter sucesso em sua empreitada que convida o telespectador, desde o princípio a “acompanhar de perto” tudo o que se passa de trás e diante das câmeras. Diante das características já apontadas no decorrer deste tópico, observando a interrelação entre os grupos apontados no início deste capítulo (“subjetividade”, 72

“bastidores” e “narração”), pode-se se concluir que o programa consegue, por meio da reportagem, combinar esses elementos que são, na verdade, estratégias da legitimação de sua narrativa e que conferem a credibilidade almejada. Isso se dá por meio da “sutil encenação” que parte da instância de produção, enquanto que, do lado da recepção, se concretiza pelo contrato social – pelo desejo do espectador de ver e vivenciar a experiência que lhe é proposta. E é assim que o programa sustenta a principal característica que o difere dos demais programas jornalísticos televisivos, por apresentar uma narrativa embebida de paixões, não somente pela forma como constrói suas reportagens, mas especialmente pelo modo como “leva” essas informações aos seus telespectadores – por meio do protagonismo dos repórteres, que se envolvem com a reportagem, que por sua vez também se tornará cativante.

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6. ANEXOS 6.1 TRANSCRIÇÃO PROFISSÃO REPÓRTER: VIOLÊNCIA SEXUAL Edição do 5/04/2011 Duração: 28’21’’ CHAMADA CACO BARCELLOS: Esse hospital acolhe mulheres e crianças violentadas no caminho do trabalho, da escola e dentro de casa. O tratamento das vítimas da violência sexual é o tema de hoje, no Profissão Repórter. CRIANÇA: Fiquei com medo, não queria mais sair na rua, fiquei com trauma. OFF CACO BARCELLOS (com imagens dos repórteres desconfortáveis diante da situação): CACO BARCELLOS: E os relatos: GABRIELA LIAN (repórter) pergunta a uma criança: E esse segredo você quer contar para... alguém aqui?! CACO BARCELLOS: E as vítimas que engravidam: VÍTIMA: Imagina olhar pra “cara” desse bebê, como é que vai ser? JEFFERSON (diretor do ambulatório): O caso tem a sua aprovação? AVANI: (Assistente Social): Tem. JEFFERSON: Está aprovada então a interrupção da gestação. OFF CACO BARCELLOS: A difícil decisão de fazer um aborto. VÍTIMA: Como isso dói, meu Deus... REPÓRTER saindo da sala: Ela está muito incomodada, né?! OFF CACO BARCELLOS: O pedido de socorro das vítimas mais frequentes. As crianças abusadas dentro de casa: CRIANÇA: Ele vai me pagar por isso, porque a culpa é dele... CRIANÇA 2: E eu não fiz isso não, não fiz... ASSISTENTE (diz à criança): Você está mais calminha?! CRIANÇA: “Tô”. 79

CACO BARCELLOS: Os bastidores da notícia. Os desafios da reportagem. Agora, no Profissão Repórter. VINHETA OFF CACO BARCELLOS: Todos os meses, mais de 200 mulheres procuram esse hospital no centro de São Paulo para relatar um trauma. ASSISTENTE SOCIAL: Aconteceu um estupro ou foi só uma tentativa? VÍTIMA: Chegou a acontecer. CACO BARCELLOS: Aqui funciona o ambulatório de violência sexual do hospital público Pérola Byington. VÍTIMA: Chegou um homem, me pegou por trás e falou “cala boca” e colocou a arma na minha cabeça. OFF CACO BARCELLOS: O repórter RAPHAEL Prado passou 12 dias nestes corredores. Registrou histórias de violência sexual e acompanhou o drama de quem engravidou do estuprador. 2:20 RAPHAEL PRADO: É o primeiro dia que eu fico aqui no hospital Pérola Byington, em São Paulo, pra tentar acompanhar uma vítima de violência sexual. Depois de sete horas de espera, mais ou menos, ontem... Já é o segundo dia que eu estou aqui no hospital Pérola Byington e tem dois casos já que a Assistente Social vai atender de violência sexual. RAPHAEL PRADO: Nossa equipe fica numa sala improvisada, para não atrapalhar a rotina do hospital. Durante uma semana foram as assistentes sociais quem pediram autorização para gravar as entrevistas. Nenhuma mulher aceitou falar. Decido então fazer o pedido pessoalmente: 3:00 Meu nome é Raphael, sou do Profissão Repórter, da TV Globo... A gente está fazendo uma reportagem sobre o trabalho aqui do ambulatório de violência sexual. Nós não vamos te identificar. Não estamos mostrando nenhum dos pacientes. Você acha que tem algum problema? Podemos gravar? -

Wellington (chama o câmera)

OFF RAPHAEL: Para minha surpresa, as mulheres não se incomodam que um repórter homem grave os relatos.

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- (...) Eu quero perguntar isso para você, aliás, você acha que a minha presença aqui de alguma forma está te constrangendo. Você quer dizer coisas que você não está dizendo?! Eu me retiro. Vítima: Não, não, pode ficar. Por mim... Vamos preservar a identidade das vítimas. As vozes serão distorcidas. 3:35 OFF RAPHAEL: Os dramas começam a ser revelados na sala das assistentes sociais. A violência sexual geralmente acontece em um dia comum, à caminho do trabalho ou da escola. ASSISTENTE: Você estava vindo da escola? Como é que foi? VÍTIMA (estudante, 13 anos): Foram dois caras. Eles me levaram pra um lugar que eu não conheço. Também não vi o caminho. Me levaram para um lugar fechado onde ocorreu o fato. VÍTIMA 2 (vendedora, 19 anos): Eu tava indo pro serviço. Eram umas oito e meia da manhã. Ele veio por trás de mim, colocou a faca bem aqui e falou pra mim “entra dentro do carro senão eu te mato”. ASSISTENTE: O ocorrido foi no seu trabalho. Como que está essa questão trabalhista? VÍTIMA 3 (vendedora, 27 anos): No caso, eu pedi pra me afastar. Falei que não ia voltar mais porque eu não ia passar mais vergonha. Foi muito constrangimento. ASSISTENTE: Ele não usou preservativo? VÍTIMA: Não, eu levei foi um murro. ASSISTENTE: Ele usou foi arma de fogo? VÍTIMA: Uhum. Todo momento. Ele falou que seu eu não calasse a boca ele iria estourar só os miolos. 4:30 ASSISTENTE: Como é que você está se sentindo? VÍTIMA (Vendedora, 19 anos): Com medo. Não consigo nem trabalhar mais. ASSISTENTE: Os funcionários lá do seu trabalho ficaram sabendo que você foi estuprada ou você não contou pra ninguém? VÍTIMA (vendedora, 27 anos): Ficaram. ASSISTENTE: Aí isso te deixou, assim, abalada? Com vergonha? VÍTIMA: Uhum... É. Na verdade eu evito até minha família. ASSISTENTE: E o seu marido, como que ele tá com você...? VÍTIMA: Ah, ele fica fazendo pergunta. 5:00 OFF RAPHAEL PRADO: Nos primeiros dias que eu fiquei no hospital, um número me chamou a atenção: 53% das vítimas de violência sexual são crianças, menores de 12 anos.

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(Conversando com o diretor do núcleo): Nem eu, nem ninguém na redação com quem eu conversei, nós não conseguimos ficar indiferentes com essa quantidade mesmo no caso. É impressionante. Quinta-feira da semana passada foram 12 atendimentos. 10 para crianças. OFF RAPHAEL PRADO: A partir da segunda semana de plantão, propomos ao diretor do núcleo que meu trabalho fosse dividido em duas reportagens. (Conversando com o diretor do núcleo): Então ficaremos eu com os casos de aborto e Gabriela com os casos de crianças vítimas de violência. 5:35 OFF CACO BARCELLOS: Em dois dias de gravação, a repórter Gabriela Lian ouviu relato de 10 crianças abusadas sexualmente. OFF GABRIELA LIAN: As crianças querem aparecer na televisão, mas nós não podemos mostrar. Elas são muito novas e passaram por um grande trauma. MÃE DA VÍTIMA: Ele pode ficar sabendo? VÍTIMA (criança, 4 anos): Pode MÃE DA VÍTIMA: Eles também podem ficar sabendo? VÍTIMA: Podem. GABRIELA LIAN: O menino tem 4 anos. Ele veio com a avó para fazer uma denúncia contra o pai. ASSISTENTE: Então você vai pintando e vai contar pra mim o que está acontecendo com você. Tá bom? GABRIELA LIAN: Ele começa a pintar. E para imediatamente quando fala sobre o abuso que sofreu do pai: VÍTIMA: A gente foi tomar banho junto e ele falou cada bobeira! ASSISTENTE: Por que? O que ele fala de bobeira? VÍTIMA: Muito palavrão. ASSISTENTE: Você “tava” bem descontraído pra falar, agora você ficou um pouquinho nervoso, o que foi que aconteceu? OFF GABRIELA LIAN: O menino aperta as mãos sem parar. A assistente social percebe o nervosismo. ASSISTENTE: Vamos ficar calminho... VÍTIMA: Ele fala muito palavrão. Ele diz que não pode falar nada errado, mas ele fala. ASISSTENTE: Você tá mais calminho? VÍTIMA: Tô. ASSISTENTE: Tá bom, então pode pintar. Você vai pintando e vai contando. AVÓ: O que você falou pra mamãe quando você chegou lá na tua casa? 82

7:00 ASSISTENTE: Aqui não é polícia não! Tá parecendo polícia! RAPHAEL PRADO: Deixa eu sair daqui... ASSISTENTE: Você quer contar ou não quer contar? A gente respeita. VÍTIMA: Quero. ASSISTENTE: Se quiser falar fala, se não quiser também não fala não. VÍTIMA: Não... ASSISTENTE: Não?... RAPHAEL PRADO: Eu acho que é melhor a gente sair um pouquinho... GABRIELA: Parte de nossa equipe decidiu sair. Eu continuo na sala, sem a câmera. OFF GABRIELA: A vó conta que o pai tentou fazer sexo oral com o filho. O menino fica ainda mais nervoso: VÍTIMA: Eu não fiz isso, não! AVÓ: Ele saiu chorando e eu pensei que “tava” chorando por chorar. VÍTIMA: E eu não fiz isso, não! Não fiz! OFF GABRIELA: para proteger o neto, a avó acaba de denunciar o próprio filho. GABRIELA: Imagino que deva ser muito difícil para a senhora acusar o seu filho nesse caso. AVÓ: É, para mim está sendo muito difícil tá acusando ele dessa coisa que eu acho que é uma barbaridade que aconteceu dentro da minha casa. Nesse dia ele saiu chorando lá do banheiro. Eu ainda discuti com ele e tudo. Aí ele pegou a criança e falou “O filho é meu, eu faço o que eu quero”. 8:05 GABRIELA: A assistente social Avani atende a denúncia de outro garoto. VÍTIMA: Eles vão ficar muito assustados com o que aconteceu comigo. - Quem vai ficar assustado? - O pessoal que vai assistir. - Ah, você acha que eles vão ficar assustados? OFF GABRIELA: O menino tem 10 anos e não quer que a mãe fique na sala. - Você pediu pra sua mãe sair da sala, não foi? Mas a sua mãe já sabe de tudo, não já?! VÍTIMA: Porque eu tenho vergonha.... OFF GABRIELA: A denúncia é contra um vizinho. Com linguagem infantil, o menino explica que o homem abriu a calça. VÍTIMA: Aí depois ele “tava” pedindo pra eu tocar. ASSISTENTE: Você não tocou nele? VÍTIMA: Não, foi só olho no olho. 83

ASSISTENTE: Tá. Ele não tocou em você... VÍTIMA: Não. OFF GABRIELA: Ele diz que ainda tem um segredo a contar. GABRIELA: E esse segredo você quer contar para alguém aqui? VÍTIMA: Bom, mas se eu contar, aí não posso revelar na televisão. Não contei isso nem pra minha mãe. 9:06 OFF GABRIELA: O segredo não será revelado. VÍTIMA: Mas você vai falar o meu nome? REPÓRTER: Não. Não vou falar o seu nome. VÍTIMA: Só vai falar o nome do agressor? REPÓRTER: Também não. Você gostaria que eu falasse o nome dele? VÍTIMA: Não, mas mesmo assim eu queria que ele fosse denunciado. VINHETA 9:30 ASSISTENTE: E aí, como é que foi, conta um pouquinho, você não quer falar? É difícil? OFF CACO BARCELLOS: Avani é uma das treze funcionárias do ambulatório de violência sexual. ASSISTENTE: E o quê você está sentindo agora? Muita raiva? VÍTIMA: (afirma com a cabeça) OFF CACO BARCELLOS: A cada meia hora ela ouve um relato dramático. CACO BARCELLOS: No seu dia a dia, assim, como que é o seu trabalho, você observa que o trabalho está presente fora daqui, na sua vida. 10:00 AVANI MARIA TELA (assistente social): Como que é? É como diz assim, eu não escuto, eu ouço: “Eu não esperava que isso fosse acontecer dentro da minha própria casa”. Quer dizer, eu também sou vulnerável a isso. BARCELLOS: Então você pensa: “poderia acontecer com você”. AVANI: Poderia acontecer dentro da minha casa. BARCELLOS: Avani, você é casada. AVANI: Sou viúva. BARCELLOS: Mas a visão que você tinha dos homens, mudou depois desse trabalho? AVANI: Não posso generalizar. São homens e são mulheres. Homens que cometem esse tipo de crime, mas eu não posso generalizar. OFF BARCELLOS: São as assistente sociais que encaminham os pacientes para o tratamento psicológico e médico dentro do hospital. 84

ASSISTENTE: Você está tomando medicação? Vomitou? Se vomitou tem que repor. Espera um pouco e toma novamente. BARCELLOS: Aqui é a farmácia principal do hospital? ASSISTENTE: Isso. 11:00 BARCELLOS: Como é o procedimento quando alguém chega aqui com a primeira queixa da violência sexual? MAIARA DIAS (médica): Se houver o estupro real, o contato com o sêmen do agressor, aí é feito uma bateria de medicações. OFF BARCELLOS: O paciente recebe um kit de medicamentos. Só para combater o vírus da AIDS é preciso tomar seis comprimidos por dia. 180 no mês. Muitas desistem. CACO BARCELLOS: Efeito colateral desses medicamentos? MÉDICA: Muito! E é geralmente isso que faz com que elas parem de tomar os remédios. Muita náusea, muito vômito, muito epigastralgia, que é dor de estômago... OFF BARCELLOS: Na hora do almoço as assistentes sociais, médicas e psicólogas discutem o caso mais impressionante do dia. BARCELLOS (pergunta à assistente): Você conhecia essa vítima? ASSISTENTE: Conheci. Fui eu quem atendi. BARCELLOS: E você de alguma maneira se surpreendeu, ou não? ASSISTENTE: Me surpreendi. E eu me encontrei com ela na última consulta e ela parecia muito feliz, muito tranquila. OFF BARCELLOS: Elas falam de uma menina de 16 anos que fez o aborto no hospital há 6 meses e que tentou suicídio. 12:00 JEFFERSON DREZETT (diretor do ambulatório): E o que me surpreendeu é que não havia nenhum sinal aparente, pelo menos nesses contatos recentes que a gente teve, que fosse uma situação que pudesse terminar em uma tentativa de suicídio que é, óbvio, pra nós extremamente grave. OFF BARCELLOS: A história pra nós também surpreende. Conhecemos a jovem um dia antes. DANIELA PEDROSO (psicóloga, ao telefone): Eu queria saber da nossa pacientezinha que está aí com você. O que aconteceu? OFF BARCELLOS: Daniela liga para o hospital onde a menina está internada. DANIELA PEDROSO: Saí 15 dias de férias e voltei, e atende-la, e aí fico pensando, 15 dias ela ficou sozinha. Mas também a gente não pode levar o paciente pra casa

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com a gente, ou alterar os planos da nossa vida por conta de paciente. Mas, assim, você fica pensando. OFF BARCELLOS: Daniela trabalha há 14 anos no hospital. Nas férias, ela continua ligada ao trabalho. 13:00 DANIELA (em sua casa, mostra fotos em seu computador): Aqui é um show no navio. Aqui ele (o cantor Roberto Carlos) tá momento de entregar as rosas... BARCELLOS: Bom, nesses shows você sempre com o celular, você disse. DANIELA: a gente prefere saber, tentar coordenar, tentar ajudar, mesmo a distância, do que olhar a ligação, atender e depois? O que será que aconteceu? É pior você viver com aquela dúvida de não ter podido ajudar. VINHETA RAPHAEL (repórter) – posso chamar meu colega então? (o câmera) OFF: - A menina procurou o hospital na companhia da mãe. Ela só tem 12 anos e foi estuprada à caminho da casa da avó. VÍTIMA: Chegou um homem, me pegou por trás e falou “cala boca” e colocou a arma na minha cabeça. Aí mandou eu entrar dentro do carro e eu entrei. Aí ele falou da minha família. “Se você falar pra sua mãe ou pra alguém da sua família sua tia morre, sua mãe e mais quem você gosta”. RAPHAEL: Mas era uma pessoa conhecida? VÍTIMA: Não, eu não sei, eu não vi porque estava de capuz preto. OFF RAPHAEL: Com medo, ela ficou em silêncio. VÍTIMA: A única coisa pra mim é minha mãe pra me criar, porque meu pai já é falecido (chora). Eu fiquei com muito medo de matar minha tia e a minha mãe. Eu fiquei com medo, não queria sair na rua, fiquei com trauma. (filma o repórter) 14:05 ASSISTENTE: E aí como é que você descobriu a gravidez, como que foi? VÍTIMA: Eu não descobri. Eu senti uma dor aqui e uma dor de cabeça. Aí eu mandei a minha mãe me levar no médico e aí ela foi descobrindo. OFF RAPHAEL: O aborto em caso de estupro pode ser feito até a vigésima semana de gestação. E o feto não pode ter mais de 500 gramas. O feto da menina tem 560. 14:24 ASSISTENTE: Não dá pra fazer o procedimento. Então a gente vai encaminhar para o pré natal, pra um serviço onde ela possa ter atendimento psicológico, atendimento médico. Qual é o desejo de vocês? (imagens da expressão do repórter recebendo a notícia) MÃE DA VÍTIMA: Eu não quero essa criança. VÍTIMA: Eu também não. 86

MÃE: Não pela criança, porque ela não tem nada a ver. Mas, assim, imagina olhar para a cara desse bebê como que vai ser? OFF RAPHAEL: Se ela não quiser a criança ela pode encaminha-la para a adoção RAPHAEL: - Mas agora vão encaminhar para a adoção. MÃE DA VÍTIMA: Aham... 15:00 BARCELLOS: A história de cada aborto está resumida de forma científica nessa sala da Macroscopia. Aqui tem um banco de dados com informações preciosas pra identificação do agressor. MÉDICA: Essa é a geladeira. BARCELLOS: Que material é? MÉDICA: São restos ovulares. É um material que sai.. intrauterino. BARCELLOS: É o banco de dados aí de DNA. OFF BARCELLOS: Esse material ajudou a justiça a mandar para a cadeia um eletricista, acusado de engravidar 2 vezes a própria filha. ASSISTENTE: Ele foi preso antes dela ser internada. OFF BARCELLOS: A menina interrompeu a segunda gravidez com um aborto aqui no hospital. Decidimos procurar a tia da menina, que foi a primeira pessoa da família a saber do abuso. - Como que foi o começo disso, ela explicou? TIA DA VÍTIMA: Explicou. Foi aos 10 anos de idade, todos os momentos que ele tinha, assim, que a mãe vai pra igreja, que a mãe não tivesse dentro de casa, ele ia e assediava. Isso foram quase quatro anos. OFF BARCELLOS: A tia lê a carta que o pai escreveu da cadeia. TIA DA VÍTIMA (lendo) : “Você tirou um peso das suas costas em ter denunciado. Eu tenho meus filhos pra cuidar e nesse lugar que estou todo mundo quer me matar por causa do que aconteceu... Me manda uma garrafa de chá de erva cidreira, uma garrafa de suco de maracujá da fruta...” OFF BARCELLOS: A família da menina mora na grande São Paulo em uma casa de um único cômodo. CACO BARCELLOS: Aqui é a cozinha? MÃE DA VÍTIMA: É, aqui é tudo! BARCELLOS: Como é que vocês se organizam pra dormir aqui? Quando seu marido estava aqui, como é que era? MÃE: Aqui era minha cama. BARCELLOS: E sua filha? Ah, esse beliche aqui. Vocês dormiam aqui. 17:00 OFF BARCELLOS: A menina chega da rua chorando. 87

VÍTIMA: Eu cheguei, quando eu “tava” lá em baixo, o pessoal já chegaram perguntando “o que está acontecendo, a Globo tá aí”. Aí eu falei que não sei o que está acontecendo, não é nada. “É por causa daquilo, é por causa daquilo que aconteceu contigo e com teu pai”. Uma menina ali me xingou de galinha. Tem um monte de pessoas falando que eu num ia prestar mais. Aqui nessa casa me traz muita lembrança ruím. BARCELLOS: Você quer sair dessa casa? VÍTIMA: É... OFF BARCELLOS: A menina já com 14 anos ainda não aprendeu a cuidar do bebê VÍTIMA: Ela não fica muito comigo não. Ela chora pela minha mãe. Ela chama minha mãe de mãe. OFF BARCELLOS: A menina me fala de seus planos para mudar a vida. 18:00 VÍTIMA: Minha profissão eu queria de delegada, policial. BARCELLOS: Policial? Mas por que você quer ser policial? VÍTIMA: Pra eu proteger aquelas pessoas que a mesma coisa que aconteceu comigo. BARCELLOS: Ah, você quer trabalhar na delegacia da mulher? VÍTIMA: É... Aquelas pessoas... aquelas meninas de 10.. até com... como eu vi lá no Pérola Byington, uma menina de cinco anos, quatro anos... VINHETA ANALITA (Assistente social): Enquanto a gente conversa a gente pede a criança pra ficar desenhando pra não ficar muito atenta no que a gente tá conversando. - Vou escolher um desenho bem bonito pra você. Olha, tem de anjinho, tem do homem aranha... OFF GABRIELA (repórter): A assistente social Analita atende a dois casos muito parecidos: Meninas novas, abusadas pelos primos mais velhos. E as duas crianças são filhas de mulheres que também foram violentadas na infância. ANALITA: eu estava lendo aqui o Boletim de Ocorrência... tem um adolescente envolvido. Ele é familiar? MÃE DA VÍTIMA: Ele é sobrinho. 19:00 OFF GABRIELA: A menina tem 6 anos. A mãe encontrou sangue pela casa. O estuprador é um primo de 14 anos. ASSISTENTE: Ela está tendo um problema com a medicação, vômito, diarreia? MÃE DA VÍTIMA: - Tá com diarreia e vomitou ontem quando ela tomou um dos remédios. 88

OFF GABRIELA: A mãe agora se culpa por ter deixado a filha sozinha com o primo. ASSISTENTE: Pode ficar tranquila, você fez sua obrigação de mãe. Quando ela crescer ela vai saber que aconteceu isso, que a mãe dela estava do lado dela, foi procurar ajuda, foi ao médico. Então vai ser super importante pra ela saber que ela teve apoio. Que a mãe procurou ajuda, procurou atendimento, que não achou uma coisa natural, uma coisa normal, porque não é. MÃE DA VÍTIMA: E agora vai pra um lugar, conta. Vai pra outro tem que contar. Tudo tem que contar. Eu já não queria isso. (imagens da reação da repórter ao ouvir o relato da mãe) OFF GABRIELA: A outra criança estava na casa dos primos. A mãe trabalhava de manicure no salão vizinho. MÃE DA VÍTIMA: Eu falei, “Por que você não chamou a mamãe?” Ela falou “Eu pedi socorro, mas você fechou o portão”. Eu não aguento mais passar por isso. Eu não aguento mais. 20:00 OFF GABRIELA: A menina de quatro anos foi abusada pelos primos mais velhos. As únicas crianças com quem ela brincava. MÃE DA VÍTIMA: É triste, você se revolta, você chora. No momento que eu fiquei sabendo eu quis fazer justiça com as próprias mãos. Eu quis bater. Eu achei melhor parar de trabalhar. Por que, assim, vai atrás de escola não acha vaga, deixa com um e não dá certo, deixa com outro e tem adolescente na casa... Não tem como.. como é que trabalha? Em todo lugar.. casa... tem filhos, tem criança, tem meninos, tem meninas, como é que faz? OFF GABRIELA: A mãe está revivendo um drama. Ela tinha 6 anos quando também passou por isso. MÃE: Foi adulto. Um adulto que me pegou na rua com a promessa que ia comprar doce. Aí me levou pra um terreno baldio e me violentou. Eu lembrava muitas coisas. Muitas coisas eu lembrava... 21:00 GABRIELA: É mais difícil pra você viver isso ou você ver sua filha sofrendo de algo parecido? MÃE: Ver a minha filha. Eu queria que fizessem comigo de novo, não com ela. VÍTIMA (criança): Ele vai me pagar por isso, por que ele não tem... ele vai pagar por isso porque é a casa dele, não vai vim mais.. minha casa... porque a culpa é dele. MÃE: Aí depois mais tarde eu conversando com ela eu pedi que ela me perdoasse. E que a culpa foi minha e eu chorei muito. 89

GABRIELA: qual foi a reação da sua filha quando viu você chorando? MÃE: “Não chora mamãe, vai ficar tudo bem”. GABRIELA: Te ajudou? MÃE: (responde que não) VINHETA BARCELLOS: No próximo bloco: A equipe médica que faz o aborto permitido por lei: REPÓRTER: Não durou nem 10 minutos? MÉDICA: Nem 10 minutos. Ela é super rápida e super segura. BARCELLOS: As vítimas violentadas que interrompem a gravidez: (imagem de uma paciente) BARCELLOS: E o preconceito num momento tão difícil (Enfermeira diz à paciente): - Enquanto enfermeira e diretora da enfermagem eu peço desculpas pelo que aconteceu... VINHETA 2º BLOCO: (Reunião da equipe de médicos) SANDRA: Meu nome é Sandra e eu sou psicóloga. ROSELI: Eu me chamo Roseli e sou assistente social DANIELA: Daniela psicóloga OFF RAPHAEL: A equipe do doutor Jefferson se reúne para decidir sobre a realização um aborto. SANDRA: O tipo de violência foi um estupro. Força física e grave ameaça. Ocorreu no percurso do trabalho... RAPHAEL: A paciente tem mais de 40 anos, quatro filhos e está separada do marido. SANDRA: Ela demonstra um grande sofrimento e aí foi orientada das alternativas e optou pelo aborto. OFF RAPHAEL: O aborto é proibido no Brasil, só pode ser feito se houver risco de vida para a gestante ou em caso de estupro. ROSELI: Ela tem muito medo de reencontrar o agressor, ela fala de depressão e até de sentimento de desistência de viver. JEFFERSON (pergunta à Sandra): O caso tem a sua aprovação, dentro dos limites técnicos... SANDRA: Tem, tem... 90

(Equipe concorda) OFF RAPHAEL: A equipe esta convencida de que a gravidez foi resultado de um estupro JEFFERSON: Está aprovada então a interrupção da gestação. OFF RAPHAEL: O aborto é marcado então para o dia seguinte. RAPHAEL: Tá tensa, tá nervosa com o procedimento? VÍTIMA: Tô um pouquinho nervosa OFF RAPHAEL: Até 13 semanas de gravidez os médicos usam o método da aspiração RAPHAEL: Já acabou o procedimento? Não durou nem 10 minutos. MÉDICA: Nem 10 minutos. Ela é super rápida e super seguro. OFF RAPHAEL: Terminado o aborto ela volta para o quarto. Na cama ao lado está outra mulher, uma paciente que conhecemos na véspera. DANIELA PEDROSO (psicóloga): Qual é sua idade Maria? MARIA (paciente): 20. OFF RAPHAEL: Maria é um nome fictício. Ela foi violentada quando voltava da faculdade. MARIA: Eu tomei uma pancada na cabeça e fiquei inconsciente. DANIELA: A partir de então o que você se lembra, Maria? MARIA: Quando eu acordei eu estava no interior de um carro, no banco de trás... OFF RAPHAEL: Maria está grávida de 17 semanas. Ela não contou para a família porque a mãe sofre de uma doença grave. DANIELA: Então conta um pouquinho pra mim o que você pensou, o que você sentiu, quando você ficou sabendo dessa gestação, Maria. MARIA: Eu entrei em pânico, eu só não me jogo na frente de um carro porque o amor próprio é muito maior e... não dá. OFF RAPHAEL: São onze e meia de uma quarta-feira. O aborto será provocado por medicamentos (...) CORTE: Já é quinta-feira. RAPHAEL: E aí, como está? MARIA: estou ficando irritada... OFF RAPHAEL: Na sexta de manhã, reencontro Maria ainda quarto: (imagens da paciente sentindo dores provocadas pelos medicamentos) 91

Na noite anterior ela passou 7 horas sem atendimento depois que a bolsa se rompeu. As duas enfermeiras de plantão, que são religiosas, recusaram ajuda. MARIA: Eu ouvia eles discutindo quem ia me atender, quem não ia me atender. Uma falava que não queria e a outra falava que também não ia vir, porque não gostava desse tipo de caso. E aí depois chegou a médica, era umas seis horas da manhã, por aí, umas cinco e pouco, seis horas... RAPHAEL: Você ficou das 10:40h, no momento que rompeu a bolsa, até as 6h da manhã sozinha? MARIA: Até as 6h da manhã sozinha. Aí depois eu ouvi um burburinho de uma... eu não sei quem era, falando “Ah, tá vendo, tem que sofrer mesmo, bem feito, isso não é coisa que se faça. Vai pagar pelos pecados”. OFF RAPHAEL: A psicóloga Daniela dá uma sugestão. DANIELA: Você se importaria de contar isso que aconteceu pra chefe delas? MARIA: Não... OFF RAPHAEL: Mas não dá tempo de promover o encontro... RAPHAEL: É melhor.. acho bom a gente ficar lá fora, né? OFF RAPHAEL: O aborto dura 15 minutos. Acontece ali mesmo, no quarto. Logo depois, a chefe da enfermagem procura Maria: CHEFE DA ENFERMAGEM: Assim, dizer pra você que a gente vai tá apurando tudo muito direitinho pra poder tá punindo essa funcionária que foi negligente com você, tá bom? Enquanto enfermeira e diretora da enfermagem eu peço desculpas pelo que aconteceu... RAPHAEL: Na entrevista com a psicóloga Daniela você falou uma coisa que me impressionou bastante: MARIA (para a psicóloga) - E desde que eu sei que estou grávida, cada dia que eu me olho no espelho, volta. Então, isso não sai. RAPHAEL: Depois do aborto, você já se olhou no espelho? MARIA: Já, hoje de manhã, arrumando o cabelo. RAPHAEL: E como foi a sensação? MARIA: Muito diferente, muito. É assim, outra pessoa, com certeza. RAPHAEL: Planos? MARIA: Vou dar continuidade aos planos que eu tinha antes. Trabalho, algumas conquistas pessoais que eu já tinha como meta, algumas viagens. RAPHAEL: Então tá. Boa sorte na sua vida. OFF RAPHAEL: No dia que Maria deixou o hospital 700 mulheres e crianças continuavam em tratamento no Pérola Byington. PACIENTE: - eu tive medo de sair por causa disso aí... ASSISTENTE: Você sabe que aqui a gente tem acompanhamento médico e psicológico. Aí você pretende continuar conosco?... PACIENTE: Sim... 92

RAPHAEL: vou deixar vocês conversarem, tá? - FIM -

6.2 TRANSCRIÇÃO PROFISSÃO REPÓRTER: ABUSO DE ÁLCOOL POR JOVENS Edição do 19/04/2011 Duração: 27’03’’ CHAMADA CACO BARCELLOS: Quinta-feira em frente a faculdade: (imagens de jovens virando bebidas alcoólicas) CACO BARCELLOS: Sexta-feira numa festa de peão (imagens de jovens sendo internados) ENFERMEIRO: - Aquele aqui é a terceira vez que vem pra cá. Os dois vão para o hospital CACO BARCELLOS: Sábado num show de rock (imagens de jovens sendo carregados na rua) CACO BARCELLOS: O Profissão Repórter investiga porque os jovens brasileiros estão bebendo cada vez mais cedo e cada vez mais. OFF CACO BARCELLOS: Em São Paulo, os universitários esvaziam garrafas e garrafas em vez de estudar. CATADORA DE LATINHA: - Se eles estudassem metade do que eles bebem, já tinham se formado ó... faz tempo! 1:00 CACO BARCELLOS: Em Porto Alegre, os jovens que vão para a noite, mas não conseguem se divertir. CACO BARCELLOS: Adiantou chegar muito louco? JOVEM: Não adiantou... eu não curti nada... CACO BARCELLOS: O descontrole faz lotar o posto médico GABRIELA LIAN (repórter): A gente registrou uns 20 atendimentos pelo menos, em 40 minutos? CACO BARCELLOS: A preocupação dos pais. PAI: Todo os dias eu dou bronca nele, não tem jeito. CACO BARCELLOS: E o que dizem os filhos no dia seguinte JOVEM: no mês passado eu gastei o meu salário todo bebendo. CACO BARCELLOS: Os bastidores da notícia, os desafios da reportagem. Agora, no Profissão Repórter. 93

VINHETA PAULA AKEMI (repórter), fala com o seu companheiro repórter Thiago: A gente tá aqui em frente a uma faculdade em São Paulo, bem aqui na porta. Qual que você acha que pode ser nossa abordagem, Thiago? 2:00 THIAGO JOCK: É, então... É sempre constrangedor chegar nesse momento. Muita gente no bar aqui em frente... OFF CACO BARCELLOS: O desafio dos repórteres Paula Akemi e Thiago Jock é falar sobre o consumo de álcool com os universitários. PAULA AKEMI: Você acha que a gente abre o jogo, pra falar que é a matéria? THIAGO JOCK: Assim, pra se aproximar você vai ter que puxar uma conversa mais “quebra-gelo”, digamos assim. Mas, é importante você dizer do que se trata a matéria, desde o começo, eu acho. (A repórter Paula aborda vários estudantes na rua:) Oi, o que você tem aí? Um “uisquinho”, pra dar uma aquecida. Que horas começa sua aula? - 19:15h E aí, já são 19:15h! - Então! Vou entrar daqui a pouco! OFF PAULA AKEMI: Ainda é quarta feira, mas já tem muita gente por aqui. Estamos em frente a uma faculdade. ESTUDANTE: Faço Engenharia. PAULA AKEMI: Você vai estudar engenharia depois de beber? - Ah, vou tentar. Se não der eu vou ficar aqui até as 23h. ESTUDANTE 2: Já passa no mercado, já compra tudo e deixa aqui guardado já. 3:00 Que aula que você está tendo agora? - Agora? Contabilidade. - Métodos quantitativos. - Computação aplicada. - Filosofia. - Aula de vivências humanas! OFF PAULA AKEMI: Uma pesquisa mostra que os universitários bebem mais do que a população em geral. 60% afirmam que consumiram álcool no último mês. Na população geral são 38%. 94

THIAGO JOCK CONVERSA COM PAULA AKEMI: A dificuldade é ver saber quem tá só na farra e quem realmente abusa do álcool PAULA conversa com jovens: É que a gente tá procurando alguém que abusa mesmo, que não tem limite. JOVEM: É que a Aline ainda não tá aqui. É uma amiga nossas mas se ela tivesse ela poderia te dizer! Imagem: Jovens gritam “pinguça” para Aline. PAULA AKEMI (pergunta a Aline): Por que você acha que eles lembraram de você? ALINE FERNANDA PINTO (estudante): Ah, não sei. Acho que porque eu sou muito divertida, muito brincalhona e porque eu bebo um pouquinho. Quanto você costuma beber por noite? - Ah, não sei... um tanto bom, viu! 3:58 OFF PAULA AKEMI: Aline é estudante de Educação Física. Ela estuda no período noturno e mora com o irmão mais velho. THIAGO JOCK: O que seu irmão fala quando você chega em casa meio alterada? Aline: A última vez ele deu um “rala” bem danado pra mim. Pra nunca mais eu fazer isso. VINHETA 4:15 CACO BARCELLOS (em Porto Alegre): Nosso foco aqui é buscar meninos entre 13 e 20 e poucos anos. Jovens... alcoolizados. OFF: 71% dos jovens de Porto Alegre experimentaram bebida alcóolica entre os 10 e 18 anos. CACO BARCELLOS pergunta a um grupo de jovens: Vocês bebem, vocês gostam de beber? (Os jovens afirmam que sim) CACO BARCELLOS: Socialmente, radicalmente, como que é? JOVENS: Sim... , socialmente. CACO BARCELLOS: Já tomaram porre, por exemplo? JOVENS: Já, sim. OFF CACO BARCELLOS: Orientados pelo quarteto achamos o lugar onde os adolescentes de Porto Alegre se reúnem para beber. CACO BARCELLOS: Dá pra ver ali na calçada umas garotas passando mal... 5:00 95

CACO BARCELLOS: Você machucou hoje? JOVEM: Eu estava meio alcoolizado e derrubei uma garrafa de vodca. O que você estava fazendo? JOVEM: Eu estava bebendo e acabei caindo por cima do meu braço. CACO BARCELLOS: Você foi no pronto socorro hoje? JOVEM: Não, já fui, já fui! CACO BARCELLOS: E continua a beber? JOVEM: Continuo bebendo! Porque não pode parar de beber, né? Porque senão não dá certo, não tem graça. OFF CACO BARCELLOS: Às três da madrugada, as consequências do excesso da bebida começam a aparecer. Reencontro os quatro meninos que conheci no começo da noite. CACO BARCELLOS: Até que horas vão? JOVENS: Até amanhecer. No mínimo até as 8h vai. VINHETA 5:35 OFF PAULA AKEMI: Noite de quinta-feira. Voltamos para a frente da faculdade que tem 25 mil alunos. POLIANA TUPINAMBÁ (vizinha da faculdade): Eu moro aqui na rua. PAULA AKEMI: Você passa isso todos os dias? POLIANA TUPINAMBÁ: Praticamente todos os dias. PAULA AKEMI: Podemos entrar no seu carro e ir com você? POLIANA TUPINAMBÁ: Pode, pode! POLIANA TUPINAMBÁ: Certa vez, quando eu fui falar com um cara “Olha, por gentileza, você é um cara que faz Direito. Pensa no meu direito. Eu preciso passar nessa rua”. E ele tava bêbado zoou da minha cara. O outro perguntou se eu queria apanhar aqui. 6:05 PAULA AKEMI: Qual é a tática pra passar aqui? POLIANA TUPINAMBÁ: É empurrar um pouquinho. Se você esperar eles darem licença eles não dão licença. Às vezes você não consegue, você tem que tentar uma ré... porque lá... dar uma volta até o pessoal ir embora. 6:18 OFF PAULA AKEMI: Reencontramos Aline, a estudante de Educação Física. PAULA AKEMI: E aí, como está hoje? ALINE: É o segundo copo. PAULA AKEMI: O segundo copo? ALINE: Tá tranquilo! É água! (risos) PAULA AKEMI: Que aula que você está tendo agora? 96

ESTUDANTE: De Publicidade. Meu professor foi embora. ESTUDANTE 3: - A gente conversa com o professor para dar presença pra gente. Aí ele dá e agente vem pra cá. PAULA AKEMI: O professor fica sozinho lá, e tudo bem? ESTUDANTE: Ah, ficam só os “nerds” lá na sala. 7:00 OFF PAULA AKEMI: O estudante de cabelo moicano toma cachaça como se fosse água. O apelido dele é Neymar. Tem 19 anos e estuda Educação Física. THIAGO JOCK: E essa camiseta aí? Vodca? ESTUDANTE: É porque tipo... eu fui tomar juízo, mas só tinha vodca! Quero que Deus abençoe a todos e que a nossa repórter beba um gole da minha mistura. THIAGO JOCK: Ela não pode. PAULA AKEMI: Desde quando você bebe? ESTUDANTE: Ah, eu comecei tarde. Comecei com 16, 17 anos. Paula liga para o Caco Barcellos: PAULA: Oi Caco, aqui é a Paula. Tudo bem? BARCELLOS: Tudo bem. Onde você está, Paula. PAULA AKEMI (por telefone): Eu estou aqui no centro, que fica perto de duas faculdades. Tem um colégio também. Agora que deu uma diminuída no movimento. Que a aula acabou faz tempo agora é mais ou menos meia noite. A gente encontrou uma catadora de latinha. Ela disse que o ponto aqui é muito bom, tem muita, muita latinha mesmo. PAULA: Quanto que você catou hoje? CATADORA DE LATINHA: Aqui já tem mais ou menos uns 8 quilos. Se eles estudassem metade do que eles bebem, já tinham se formado ó... faz tempo! 8:00 CATADORA DE LATINHA: As vezes alguém passa mal eu procuro ajudar também. Se cai no chão eu procuro levantar também. PAULA: Você já ajudou alguém? CATADORA DE LATINHA: Já. As meninas são piores. Porque antigamente as meninas reclamava que os homens bebiam demais, agora elas estão bebendo ao contrário. THIAGO JOCK: E aí Neymar, tudo em ordem, cara? PAULA AKEMI: Você tá bem para dirigir? NEYMAR: Vossa Senhoria acha que eu estou bem? THIAGO JOCK: Nós temos registro de você bebendo meia garrafa de pinga... acho que é suficiente, né? Você sabe que pode estar dirigindo uma arma aí também. VINHETA 8:30 97

OFF CACO BARCELLOS: No fim de semana que passo em Porto Alegre, 7 mil jovens se reúnem num show de rock. CACO BARCELLOS: Uma cena, esse rapaz no poste está ali cuidado do amigo que está aparentemente desmaiado no chão. BARCELLOS: Tudo bem aí? O que houve com seu amigo? JOVEM: Meu amigo está um pouco mal, estou esperando meu irmão chegar pra levar nós. BARCELLOS: Você viu o pulso dele? O que ele bebeu? JOVEM: Ele bebeu só cachaça, daqui a pouco ele tá bem. BARCELLOS: Deixa eu levantar a cabeça dele... 9:05 CACO BARCELLOS: Você quer que eu ligue pra a ambulância, alguma coisa? JOVEM: Não, daqui a pouco meu irmão tá aí. Muito obrigado. OFF BARCELLOS: Vou em busca de socorro. No caminho eu encontro outros jovens bêbados, sendo carregados. BARCELLOS: Que idade você tem? JOVEM: 17 BARCELLOS: Você tá passando mal? JOVEM: Tô mais ou menos BARCELLOS: Vontade de vomitar? JOVEM: Eu já vomitei no banheiro. OFF BARCELLOS: Atrás da casa de show, descobrimos uma área reservada para atendimento aos jovens alcoolizados. SEGURANÇA: Não filma aí, não filma. São todas crianças. Não pode filmar aqui. É criança, meu querido, tá expondo pessoas menores. CACO BARCELLOS: Mas se é criança por que vendem bebida? SEGURANÇA: É, não pode. Isso também tá errado, não pode. OFF BARCELLOS: Impedidos de mostrar o atendimento voltamos à rua, onde o socorro aos adolescentes continua. CACO BARCELLOS: Veio buscar a filha? PATRÍCIA ESCOBAR (assistente social e mãe): Buscar a filha. BARCELLOS: Preocupados? PATRÍCIA ESCOBAR: Bastante. A primeira vez que ela sai, assim. BARCELLOS: Muita gente embriagada ou não? FILHA: Sim, lá fica direto, né. Eles vêm com a mochila cheia de bebida já. É terrível. 10:05 OFF BARCELLOS: Volto em busca do rapaz que parecia desmaiado. 98

PESSOAS NA RUA: Ele levantou e conseguiu chegar até o posto. O amigo dele levou ele. VINHETA 10:22 OFF CACO BARCELLOS: Os repórteres Gabriela Lian e Victor Ferreira estão em uma festa do peão que reúne 30 mil pessoas no interior de São Paulo. GABRIELA LIAN: Uísque com o quê? - com gelo. -pinga com mel GABRIELA LIAN: Os drinks tradicionais até saem bastante aqui na festa de Bragança Paulista. Mas o que faz sucesso mesmo são as bebidas mais... diferentes: - Suor de virgem. É vinho, morango, champanhe, açúcar e leite condensado. - É uma bebida de vinho com abacaxi. - É bom, tem uísque, menta, vodca, tem tudo. OFF GABRIELA: Viemos pra mostrar o reflexo de toda essa mistura no posto médico da festa. 11:00 MÉDICO: Dentro não está autorizado filmar. OFF GABRIELA: Horas antes da nossa chegada, a prefeitura trocou a assessoria de imprensa com quem tínhamos combinado a reportagem. ORGANIZAÇÃO (por telefone): Eu lamento não poder atender vocês. OFF GABRIELA: Decidimos andar pela festa. Em poucos minutos encontramos um jovem muito alcoolizado. GEOVANI: Geovani. GABRIELA: Você é maior ou é menor? GEOVANI: Eu sou de maior, tenho 19 anos. GABRIELA: E conta pra mim o que aconteceu hoje? GEOVANI: Hoje? Eu bebi muito, todo mundo vai me levar e vai deitar na minha cama. “E é nóis!” OFF: Os amigos tentam faze-lo beber água. O amigo Gabriel consegue convence-lo a ir para casa. 12:00 GABRIELA: E vão só vocês dois? GEOVANI: Vamos, vamos só nós dois.

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GABRIEL (amigo): Sempre eu que levo ele de volta, né, irmão!? Você mistura todas as bebidas de uma vez só. GEOVANI: Eu misturo tudo. A hora que eu vejo que eu tô ruim. Aí que eu bebo mais, tá ligado. Eu bebo muito, muito, muito, bebo bastante, pra amanhã cedo eu chegar e falar assim “nossa, eu tô aqui”. Aí que eu bebo mais ainda. VINHETA 12:30 CACO BARCELLOS: Posso sentar aí do seu lado um pouquinho? Bater um papo aqui, só um minutinho. Como é que você tá? Parece que você não está muito bem não... JOVEM: Eu não tô muito bem... OFF BARCELLOS: Ele diz que bebeu para se aproximar das meninas. JOVEM: Eu acho que os jovens de hoje querem chegar mais loucos na festa e tal. Eu admito isso porque hoje eu cheguei muito louco hoje na festa BARCELLOS: Adiantou chegar muito louco? JOVEM: Não adiantou... eu não curti nada... BARCELLOS: Qual era o seu objetivo? JOVEM: Só vomitei... BARCELLOS: Eu poderia te visitar na sua casa, amanhã, a tarde? JOVEM: Poderia, poderia. 13:10 PAI (pela janela): Saiu! CACO BARCELLOS: Ah, não acredito. PAI: Foi pra Ipanema com uns amigos... BARCELLOS: Ela falou que eu viria aqui? PAI: Ele falou que conversou contigo, mas não falou que tu viria. BARCELLOS: O senhor bateria um papo comigo? PAI: Tranquilo! BARCELLOS: O senhor permite que filme.. aqui? PAI: Tranquilo! OFF BARCELLOS: O pai do adolescente trabalha em uma metalúrgica. BARCELLOS: Às seis da manhã a gente tava com seu filho. Conversamos bastante. E ele disse “eu não estou muito bem, estou um pouco alterado porque eu bebi muito”. Ele contou? Ele falou para o senhor desse nosso encontro, com a televisão, com o Profissão Repórter? PAI: Sim, ele falou, mas não explicou coisas que tu perguntou ele não me falou nada. Perguntei pra ele o que é que tu tinha conversado e ele não se lembrava. Aí, dali eu deduzi que ele estaria um pouquinho alto, né! BARCELLOS: Você sabe que ele faz isso? PAI: Sim, normalmente nessa idade a gente faz. Eu fazia também. BARCELLOS: Com que idade o senhor fazia? PAI: Com 15 a gente começa a tomar um pouquinho de álcool. 100

OFF BARCELLOS: O adolescente tem 15 anos. Ele bebe fora de casa, mas não bebe na frente do pai. PAI: Quando nós temos churrasco, alguma coisa, todo mundo bebe uma cerveja normal e ele normalmente é “refri”. OFF BARCELLOS: A madrasta tem uma filha adolescente. CACO BARCELLOS: ele falou que ontem a gente teve com ele? PAI: Falou! Não contou nada, porque não lembra de nada do que ele te disse. OFF BARCELLOS: Renata tem 15 anos e também gosta de beber. RENATA: Bebo pouco. Até eu ficar feliz, vamos dizer. Tontinha, assim, eu paro. BARCELLOS: Qual é o volume pra te deixar feliz? RENATA: Aí já é... BARCELLOS: É lata ou garrafa? RENATA: Lata. Ah, não sei... BARCELLOS: Três, duas? RENATA: Não!! Mais! BARCELLOS: Cinco!? RENATA: Pra mais! BARCELLOS: Sete? RENATA: É.... BARCELLOS: Quem bebe mais, você ou ele? RENATA: Eu. Ele é mais tranquilo que eu. BARCELLOS: E você ouve isso sorrindo? MADRASTA: Chorar não adianta, né! (risos) Não. Assim.. A gente tem uma relação bem aberta, né. A gente orienta bastante. “Não bebe muito”. O ideal seria não beber. Tu vai controlar um adolescente não beber se não tiver junto? Quase que impossível, né?! 15:20 FLÁVIO PECHANSKY (Universidade Federal RS): Um jovem de 10, 12, 13, 15 anos de idade, ele está com o seu cérebro em formação. Em especial algumas zonas nobres do cérebro, que são as responsáveis pelas ações, pelo juízo crítico e pela ponderação ainda estão em fase de maturação. O álcool vai lesar neurônios, e inclusive quando um neurônio é lesado ele, mesmo tendo alguma capacidade de recuperação, pode não se recuperar completamente. VINHETA 15:50 GEOVANI: - “Eu olho essa mina faz tempo, velho” OFF GABRIELA: No caminho pra casa, Geovani encontra a mãe de uma amiga

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GABRIELA: E essa turma você já viu eles bebendo outras vezes? MÃE: Um monte!! Esse, ele, Geovani com o João... o menino que gosta da minha filha. Já vi passar em loja de R$1,99, comprar garrafa de vinho e bebendo pela rua... Mau exemplo. E bebendo pela rua a pé... OFF GABRIELA: Geovani tenta arrumar briga na rua. (...) 16:40 GABRIELA: Qual que é sua lembrança de ontem? GEOVANI: Poucas coisas, viu? GABRIELA: Já tinha acontecido assim, desse jeito? GEOVANI: Nossa, várias vezes. Várias vezes. GABRIELA: Com que frequência? GEOVANI: Cinco, quatro vezes por semana. GABRIELA: E essa bebida te atrapalha de alguma forma na sua vida? GEOVANI: Atrapalha um pouco (...) No mês passado eu gastei o meu salário todo bebendo. GABRIELA: Em um mês você gastou mil e oitocentos reais, em festa. GEOVANI: Isso, em festa. GABRIELA: E não pagou nenhuma conta, não ajudou seus pais com esse dinheiro... GEOVANI: Não... 17:20 OFF GABRIELA: À noite, Geovani está de novo na festa de peão, mas não conseguimos encontra-lo. Voltamos a insistir na importância do registro no posto de saúde. E conseguimos gravar. ENFERMEIRO: Nós vamos levar dois pros hospitais. Tem uma hora que o excesso da bebida tem que ter tratamento hospitalar. GABRIELA: Quais são os perigos, os riscos desse consumo excessivo? ENFERMEIRO: Olha, o principal risco é ele vomitar e aspirar. O segundo é o coma, o como alcóolico. E acompanhado de convulsões e complicações. 18:00 GABRIELA: Meninas vêm com frequência? ENFERMEIRO: Com frequência. Essa diferença não existe mais. O consumo é idêntico. É igual pra todos (...) Vamos remover aquele outro lá (...) Aquele ali é a terceira vez que vem... os dois vão para o hospital. VINHETA OFF PAULA AKEMI: Sexta-feira. Pela terceira noite seguida, voltamos à faculdade. PAULA AKEMI: Nosso desafio é tentar chegar até a porta da faculdade, que fica lá do outro lado dessa multidão. (...) Tem um cara de cadeiras de rodas aqui na frente

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PAULA AKEMI: Dá pra se movimentar por aqui? CADEIRANTE: É só pedir licença, todo mundo compreende e sai da frente. Você faz amigo, conhece todo mundo! PAULA AKEMI: Tem uma moto bem aqui atrás querendo passar, carro na frente. OFF PAULA AKEMI: Enquanto alguns tentam passar, a turma de Neymar e de Aline já tomou conta de um pedaço da rua. 19:02 PAULA: Quantos nos você tem? MENOR: Eu? 17. PAULA: E você tá bebendo o quê? MENOR: Uísque com energético. PAULA: E pode? MENOR: Não pode. Mas a gente bebe! MENOR 2: Eu tô bebendo vinho. PAULA: Você tem 13 e ele tem 15? O que vocês vieram fazer aqui? MANOR 2: Curtir, tia. Curtir, pegar mulher... PAULA AKEMI: Teve aula hoje? ESTUDANTE: Tive PAULA AKEMI: De quê? ESTUDANTE: Teoria geral do Direito. As duas primeiras e vim pra cá depois, não tive amis aula. PAULA AKEMI: Como assim, não teve mais aula? ESTUDANTE: A professora não veio... (Os repórteres conversam com o segurança da faculdade): PAULA: A gente queria entrar no prédio, fazer umas imagens THIAGO: A gente queria mostrar de dentro da sala de aula, como é o movimento fora. (Na redação: ) CACO BARCELLOS: Pois é, Paula, a gente precisava aqui, de uma maneira mais contundente, essa negativa deles. Por que só temos aqui a negativa do segurança, é isso? PAULA AKEMI: É, do segurança. CACO BARCELLOS: Porque você fez a outra por telefone... PAULA AKEMI: por telefone SEGURANÇA (por telefone): Eles estão querendo entrar dentro do Direito pra poder filmar a rua aqui... SEGURANÇA: A chefia não tá permitindo... CACO BARCELLOS: Tá vendo. Não está dito claramente. Tem que dizer assim.. você diz quantos dias você ficou. E registramos muita gente, muitos estudantes dessa universidade que em vez de estudar, trocaram os estudos pelo álcool. “Na porta da 103

casa de vocês. Como é que vocês explicam isso? Vocês estão fazendo alguma coisa para evitar isso?” PAULA AKEMI: Você acha que é melhor eu ir pessoalmente ou por telefone? CACO BARCELLOS: Acho que pessoalmente e com câmera, pra mostrar com a sua voz você dizendo pra alguém. Não pode ignorar. Esse diretor, ou presidente, seja quem for, seja assessoria, tem que passar no meio dessa multidão de gente alcoolizada pra chegar à universidade. CACO BARCELLOS: No próximo bloco CACO BARCELLOS: A palavra da universidade sobre as cenas que registramos. (Imagem da repórter entrando na diretoria) O fim da noite no posto médico na festa do peão. (imagens de uma jovem passando mal na festa) E a preocupação de um pai. (- todo dia eu sou bronca nele, não tem jeito!) 2º BLOCO: PAULA AKEMI: - Ele já reconheceu a gente de longe OFF PAULA AKEMI: Conhecemos Neymar na noite anterior. Com essa cena, ele chamou a nossa atenção. PAULA AKEMI: Foi pra aula hoje? NEYMAR: Ah, hoje o pessoal falou que tinha palestra... E palestra é um tanto quanto desagradável, um tanto monótono, um tanto quanto maçante, digamos assim. Por isso que hoje a gente já veio pra cá e amanhã a mesma coisa. PAULA AKEMI: Posso te acompanhar amanhã? NEYMAR: Pode, do jeito que você quiser. PAULA AKEMI: Onde você mora? NEYMAR: Moro a 21km daqui. O bairro é Jardim Ingá. PAULA AKEMI: chegando de carro vermelho, já ficou nosso conhecido nosso nessa matéria. NEYMAR: Minha casa, aquele ali é meu pai. PAULA AKEMI (para o pai): Oi, tudo bem? A nossa matéria é sobre bebida alcoólicas. Isso também preocupa o senhor? PAI: - Também. Eu aviso sempre ele “bebe menos”, mas não tem jeito. Eu sempre falo pra ele, Gabriel “maneira na bebida”. Porque é perigoso. Carro ainda... Ele sabe de tudo. PAULA AKEMI: É Gabriel seu nome, é? Eu não sabia até agora. Você mostra a sua casa lá pra gente um pouquinho? E sua mãe? 104

NEYMAR: Minha mãe é falecida, eu não tenho irmão. OFF PAULA AKEMI: Gabriel perdeu a mãe aos 14 anos. THIAGO JOCK: A mãe faz muita falta? LUIZIARO DA SILVA (pai de Gabriel): Faz, faz falta. A mãe sempre falava “ O Gabriel não tem respeito. Porque você dá muita moleza”. Depois ela faleceu, ele tinha 14 anos. E eu fiquei cuidando dele, mas é.... todo dia eu dou bronca nele, não tem jeito. OFF PAULA AKEMI: A última bronca foi por causa de uma série de multas. Oito por estacionar em local proibido. Em frente ao bar lá da rua da faculdade. GABRIEL: É, teve uma semana, em fevereiro, na segunda semana, eu levei multa de estacionamento no dia 5, no dia 7 e no dia 9. Segunda, quarta e sexta. 2:00 OFF PAULA AKEMI: Todo mês Gabriel recebe uma pensão deixada pela mãe. O pai já não consegue controlar o filho, que sempre tem dinheiro para gastar. LUIZIARO: Eu ligo pra ele, às vezes 5h da manhã, ele está com os amigos. “Gabriel, vai chegar que horas?”. “Relaxa pai, vai dormir, relaxa, relaxa”. Eu fico muito preocupado, o Gabriel é muito novo. Muito novo para andar por aí como ele faz, beber com os amigos. Ele é muito novo. Tá começando a vida agora, então não pode ficar nessa. Ficar só bebendo... PAULA AKEMI: Mas isso preocupa o senhor? LUIZIARO: Com certeza. Preocupação é muita pelo Gabriel nessa bebida. Você nem imagina. PAULA AKEMI: E aí Neymar, vai pra onde agora? GABRIEL: Vou comprar bebida e vou pra Taguá. PAULA AKEMI: Vai pra aula? GABRIEL: Não! Não falei aula, falei Taguá! Abraço para os meus professores. Que Deus abençoe. Vai Corinthians. 2:50 OFF PAULA AKEMI: Também voltamos para a rua Taguá. Vamos ouvir o que a Faculdade tem a dizer sobre as cenas que registramos. PAULA AKEMI: Ontem tinha muita gente na rua. De fechar a rua mesmo, muito estudante. Quinta-feira mais gente e sexta feira mais gente ainda. OFF PAULA AKEMI: O vice-diretor disse que a faculdade faz palestras educativas sobre álcool e drogas e que o professor reprova o aluno ausente.

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ARTHUR DE MACEDO (vice-reitor): Nós temos feito orientações aos nossos alunos, nós temos uma preocupação em fazer com que eles se conscientizem inclusive de que eles estão aqui para estudar. Que eles estão aqui para aprender. Agora, o que eles fazem fora dos muros daqui da universidade a gente realmente não tem controle. VINHETA OFF GABRIELA: O movimento do ambulatório cresce a cada instante. GABRIELA: vinte atendimentos em 40 minutos. Pelo menos uma meia dúzia que já foi pro hospital, certo? Não é impressionante? VICTOR FERREIRA: É, a maioria tem saído direto pro hospital porque aqui dentro também não dá pra ficar, né? 4:00 JOVEM: Liga pro meu tio pra me buscar, ele vai buscar muito eu, moça, por favor... GABRIELA: Você quer ajuda? JOVEM: Não, ele vai me xingar muito. OFF GABRIELA: A menina cai na festa e também é carregada para o ambulatório. GABRIELA: O que aconteceu com ela? JOVEM: Irmã: Ah, não sei... GABRIELA: Ela é sua amiga? JOVEM: É minha irmã. GABRIELA: Ela tem quanto anos. JOVEM: Ela tem 15. GABRIELA: O que ela bebeu? JOVEM: Bebeu de tudo. MÉDICA: Só um minuto bem, que ela não está bem. Depois eu falo com você. -Tamires, prepara a glicose, bem. Duas ampolas. OFF GABRIELA: Enquanto a glicose está sendo preparada, a menina foge. Os seguranças da festa subiram, foram atrás da garota. SEGURANÇAS: Perdemos ela. Ela foi mais rápida. Ela correu, e nós não podemos pôr a mão em mulher. 5:00 ANGELA MARIA ABDALA (médica): É efeito do álcool, o paciente perde totalmente a noção. Ela estava com uma hiperventilação, muito alcoolizada. OFF GABRIELA: São 4 horas da manhã. A maioria das pessoas atendidas no posto da festa foi levada para o hospital. GABRIELA: O que mais te impressionou? 106

ANGELA MARIA: A quantidade da ingestão de álcool. Aqui é demais, eles estão bebendo demais. - FIM 6.3 TRANSCRIÇÃO PROFISSÃO REPÓRTER: IDOSOS ABANDONADOS Edição do dia 18/12/2012 Duração: 29’ 34’’ CHAMADA: CACO BARCELLOS (de dentro da enfermaria): O Profissão Repórter encontrou idosos e crianças que passam a vida sozinhos, esquecidos pela família, nos hospitais de São Paulo. OFF CACO BARCELLOS: O atleta olímpico: (close no rosto da personagem) CACO BARCELLOS (enquanto mostra medalhas, fotos e recortes de jornais da personagem): Olha que bonita essa aqui. Décimo quinto Jogos Olímpicos, Helsinki. 1952. OFF CACO BARCELLOS: A engenheira química: (close na personagem, sentada sozinha em um banco, balançando as pernas): - Você gostaria de estar onde hoje? - Em casa - Em casa? - Em casa... OFF CACO BARCELLOS: O abandono no fim da vida. Imagens de idosos nos corredores do abrigo. VINHETA PAULA AKEMI (do corredor de um abrigo): Fomos em busca da história de quem perdeu o contato com os parentes: PACIENTE (Gildete), suplicando pela visita de um parente: Eliana, vem me ver Eliana! OFF PAULA AKEMI: E de quem não sabe mais a própria identidade: (close no rosto da personagem) PAULA AKEMI (entrando na garagem de vizinhos da personagem): A gente, na verdade, está à procura da família de uma senhora que morava aqui nessa rua. Voz da enfermeira em off, com imagens das crianças no abrigo: A Ingrid não tem visita, o Breno também não recebe visita, o Elito também não recebe visita. O Nicolas também não recebe visita... 107

THAIS ITAQUI (de dentro do hospital): Os profissionais que fazem o papel de pai e mãe: PACIENTE: Mamãe! REPÓRTER: Ela é a mamãe? PACIENTE: Mãe! ENFERMEIRA (enquanto olha para uma criança, paciente do hospital): - Padrinho, pai, mãe, somos... tudo para eles. OFF THAIS ITAQUI: E o apelo por uma visita: Uma profissional do hospital, por telefone, liga para os parentes de um paciente: - Então, a gente está ligando porque faz tempo que não vem ninguém da família visita-lo. No pátio do abrigo, a repórter conversa com dois irmãos: REPÓRTER: Você é o irmão dele? IRMÃO DO PACIENTE: Sou irmão Mãe de um paciente diz emocionada enquanto acaricia seu filho em uma maca: Tem que ter alguém fazendo carinho, sabe? Mostrando pra ele que ele não está sozinho. (chora) CACO BARCELLOS: Os bastidores da notícia. Os desafios da reportagem. Agora, no profissão repórter. VINHETA OFF PAULA AKEMI: Este lugar lembra o passado. Para muitos que estão aqui, um passado sem laços. Para outros, um passado sem memórias. PAULA AKEMI (caminhando pelo corredor do hospital): - Aqui no Hospital Dom Pedro II, na Zona Norte de São Paulo, vivem 400 pacientes. 150 perderam qualquer vínculo com a família e 50 deles não sabem mais quem são. A repórter conversa com a paciente Dona Conceição: Que bonito esse colar aqui! OFF PAULA AKEMI: Dona Conceição (73 anos) chegou a 5 meses e é uma das mais novas moradoras. Foi encontrada na rua sem nenhum documento. PAULA: Olha, a senhora está com aliança? CONCEIÇÃO: É... estou com a aliança PAULA: É?! qual que é o nome do seu marido? CONCEIÇÃO: Francisco PAULA: Você sabe onde é que está seu marido? CONCEIÇÃO: Trabalhando. PAULA: Trabalhando? Você mora onde? 108

CONCEIÇÃO: Ah.. eu moro aí, né... OFF PAULA AKEMI: Perdida entre a vida real e a vida que imagina, Dona Conceição diz que tem dois filhos. PAULA: E já vieram visitar? CONCEIÇÃO: Aqui? Não... No abrigo... Eles não... não gostam de me amolar aqui. Aqui não é o lugar deles, né?! PAULA: (...) CONCEIÇÃO: Tchau, viu?! (A paciente levanta repentinamente e deixa a sala) PAULA: Acho que eu fiz muita pergunta, né?! Deve incomodar um pouco. OFF PAULA AKEMI: Minutos depois, ela veio falar comigo de novo. PAULA: Esse é seu quarto? É. PAULA: Posso entrar? Pode. PAULA: Olha, tem uma foto de criança aqui. CONCEIÇÃO: É minha netinha. PAULA: É? CONCEIÇÃO: É. PAULA: Como é que ela chama? CONCEIÇÃO: Rayane. PAULA: Não... Aqui está escrito Lara. (a repórter olha o cartão que está junto com a foto) CONCEIÇÃO: Tiraram e puseram essa daqui, mas ela é Rayane... 3:37 OFF PAULA AKEMI: A diretora do hospital nos apresenta Dona Conceição com a esperança de que nossa reportagem ajude a desvendar o passado dela. PAULA: É uma espécie de quebra-cabeça, meio solto, assim... SUELI PIRES (diretora do Hospital): - Isso mesmo. Vamos ver se a gente tem a possibilidade agora de resgatar melhor essa história. OFF PAULA AKEMI: Começamos com a expectativa de encontrar um final feliz. Sueli Pires: - com certeza uma família está procurando por ela. 4:00 Da redação, a Paula Akemi investiga: Coloquei o nome da Conceição na Internet, o nome completo dela, e apareceu aqui um documento do Diário Eletrônico da Justiça Federal da 3ª região. É de maio desse ano. Despejo por falta de pagamento. Ah, tem uma advogada aqui!

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Por telefone a advogada diz: - Eu despejei a Dona Conceição. Então eu não a conheci pessoalmente. 4:28 PAULA AKEMI (Na porta da casa): - Foi aqui dessa casa que a Dona Maria da Conceição foi despejada. Vou perguntar o vizinho. PAULA: Com licença, tudo bem? Boa tarde! Eu sou do Profissão Repórter. A gente está, na verdade, está à procura da família de uma senhora que morava aqui nessa rua. VIZINHO: Ela tinha... ela tem um filho, se não me engano. OFF PAULA AKEMI: Mostro uma foto de Dona Conceição. VIZINHOS: É ela mesmo! CLÁUDIA SANTOS (vizinha): Eu vendia picolé e ela vinha comprar picolé comigo pra netinha dela. PAULA AKEMI:: Ela tem netinha? CLÁUDIA SANTOS: Tem sim, filha! É essa netinha que eu tô falando pra você, é filha do filho, que quando ele trazia, ela tinha que pedir nas portas dois ovos. Ela pedia um. Quando a neta estava aí ela pedia dois. 5:00 Flashback para a cena em que Dona Conceição fala da neta: - É minha netinha... - É?... Mesmo? VINHETA Caco Barcellos conversa com idosos no pátio do hospital: PACIENTE: - Aqui, não vai filmar!? CACO BARCELLOS: - Ah, sim! PACIENTE: Não vai fazer pergunta? CACO BARCELLOS: - Ah, eu quero. Quero fazer, posso?! OFF CACO BARCELLOS : Dona Kazue tem apenas 62 anos CACO BARCELLOS: Quanto tempo a senhora está aqui? KAZUE: 5 anos BARCELLOS: E a sua família, onde está? KAZUE: Ah, eu tô abandonada... OFF CACO BARCELLOS: o irmão a deixou no hospital e nunca mais voltou BARCELLOS: Você gostaria de estar onde, hoje? KAZUE: Em casa. BARCELLOS: Em casa? KAZUE: Em casa... BARCELLOS: Com quem? 110

KAZUE: Com o meu irmão. OFF CACO BARCELLOS: Foi o irmão quem inspirou Dona Kazue na escolha da profissão. BARCELLOS: A senhora é Engenheira Química? KAZUE: Engenheira Química. BARCELLOS: Fez faculdade onde? KAZUE: Na Poli. BARCELLOS: Na Poli, aqui em São Paulo? KAZUE: Aqui em São Paulo. BARCELLOS: Boa universidade, né?! OFF CACO BARCELLOS: Ela não se casou, nem teve filhos. BARCELLOS: Por que que a senhora nunca casou, posso saber? KAZUE: Ah, não deu tempo (risos) BARCELLOS: Teve namorados? KAZUE: Tive. BARCELLOS: Quantos? KAZUE: Dois. BARCELLOS: Qual foi o grande amor da sua vida? KAZUE: Não tive! (risos) 6:00 OFF CACO BARCELLOS (com cenas de Dona Kazue solitária pelo hospital): Dona Kazue tem esquizofrenia, mas o que ela me contou está de acordo com as informações do Hospital. Ela é doente. Mas não precisaria viver internada. 6:20 CACO BARCELLOS (pergunta para a médica do Hospital): - E esse irmão? BEATRIZ PEREZ (médica): - Nem nomes, nem endereços. Não temos nenhuma referência desse irmão concreta. Números de telefone, nomes... não obtemos retorno. 6:22 OFF CACO BARCELLOS : Nesta casa de repouso vivem 33 pacientes que foram abandonados pela família do hospital do servidor publico de São Paulo. CACO BARCELLOS (dentro do refeitório do hospital): - É um exagero dizer que essa cena que a gente está vendo aqui... BEATRIZ PEREZ: Vai ser cada vez mais frequente... Se nós observarmos aqui, a maioria dos pacientes teria condição de ficar em domicílio. Eles não exigem grandes cuidados. OFF CACO BARCELLOS: O trabalho da médica Beatriz é fazer com que as famílias aceitem de volta os parentes que ficaram velhos e doentes.

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CACO BARCELLOS (caminhando pelo hospital): Olha aqui ao lado são vários homens, aqui a direita. BEATRIZ PEREZ: Sim, os homens são aqueles que a gente tem mais dificuldade de inserção da família no momento da alta. CACO BARCELLOS: Por causa da perda dos vínculos... BEATRIZ PEREZ: Exatamente. Pelo enfraquecimento de vínculos familiares. 7:00 No pátio do Hospital, um médico aponta para o paciente e diz ao Caco Barcellos que este é o Jorge. CACO BARCELLOS: Jorge Isaías!? BG: O Jorge, que você acabou de filmar, Rafael, é um ex-boxeador. Será que ele tem condições de falar comigo ou não?! JORGE (dá a entrevista da cadeira de rodas): Campeão brasileiro, campeão paulista. OFF CACO BARCELLOS: A voz sai fraca. Mas orgulhosa do passado. Seu Jorge Isaías (87 anos) representou o Brasil nas Olimpíadas de Helsinki em 1952. CACO BARCELLOS: Posso pedir uma coisas para o senhor? Podia mostrar a sua mão? Tem alguma marca do boxe, não? JORGE: Dedo quebrado. Onze operações. CACO BARCELLOS: O senhor sofreu nocaute, algum? JORGE: Não... OFF CACO BARCELLOS: As pancadas que recebeu no ringue contribuíram para a doença de Seu Jorge. BARCELLOS: Que idade o Sr. Está hoje? JORGE: ... BARCELLOS: Não lembra muito bem... CACO BARCELLOS: Hoje ele praticamente não anda e tem falhas de memória. Quando recebeu alta, há 5 anos, seu Jorge estava mais forte. 8:02 BEATRIZ: Esta institucionalização não é boa para a saúde. CACO BARCELLOS: A senhora chama de institucionalização, assim, é a vida de um interno, um recluso?! BEATRIZ: Isso, um interno, uma pessoa reclusa, sem contato com familiares, sem contato com a vida externa. Sem aquele contato diário com amigos. E com o que está ocorrendo no mundo. A pessoa fica isolada. 112

8:25 OFF CACO BARCELLOS: Vamos em busca da mulher de Seu Jorge, que conseguiu na justiça impedir o Hospital de manda-lo de volta para casa. VINHETA 8:30 OFF PAULA AKEMI: Levamos Cláudia e Lina (vizinhas de Dona Conceição) até o Hospital D. Pedro II pra ter certeza que a senhora internada aqui é mesmo a antiga vizinha delas. As vizinhas chegando ao Hospital: É ela mesma! Está boa, Dona Conceição!? Lembra de mim?! DONA CONCEIÇÃO: Eu lembro de você, não sei da onde. CLÁUDIA (vizinha): Ah, menina, a senhora vivia chamando lá no “carrão”, dos cachorros, lembra? DONA CONCEIÇÃO: Lembro...! CLÁUDIA: Dá um abraço! Que saudade! O quê que a senhora tá fazendo aqui? DONA CONCEIÇÃO: Trabalhando. LINA (vizinha): Ela até que está bem! Ela estava pior, sabe? Ela estava bem... bem desgrenhada. ENFERMEIRA: Já estava sem os dentes? LINA: Não. CLÁUDIA: - E o cabelo era aqui, ó! (aponta para a região da cintura) O quê que aconteceu com seu cabelo, que você.... PAULA AKEMI: Tinha o cabelo comprido?! (pergunta à Dona Conceição) DONA CONCEIÇÃO: Tinha. Daqui, até aqui. (fala, mostrando a altura da cintura) CLÁUDIA: Cortou? Ficou bonita, heim?! Vamos sentar um pouquinho pra gente conversar... LINA: Viu como ela está diferente? CLÁUDIA: Tá mais gordinha. Tá bem alimentada! Tá limpinha. Tá gostando daqui?! DONA CONCEIÇÃO: Tô bem aqui, tô gostando... 113

CLÁUDIA: Não tá sentindo falta da família? DONA CONCEIÇÃO: Não...

Dona Conceição se levanta repentinamente para sair.

PAULA AKEMI: Já vai, Dona Conceição? CLÁUDIA: A senhora já vai? Tchau, querida. Fica com Deus. Muita saúde, muita paz. Tudo de bom pra senhora. DONA CONCEIÇÃO: Obrigado, tchau. 10:00 A repórter Paula Akemi conversa com as vizinhas: Depois de encontrar vocês eu fui até a polícia, da Delegacia de Desaparecidos. PAULA AKEMI(saindo da Delegacia): Eu não pude gravar lá dentro da delegacia, mas as informações que me passaram foram o seguinte. Ninguém da família da dona Conceição jamais esteve aqui pra prestar queixa de que ela estava desaparecida. O último registro que tem dela é de março desse ano, quando um abrigo da prefeitura encontrou a Conceição. Quem foi buscar ela foi um genro. Mas desde então não se sabe o que aconteceu pra ela ter parado de novo no hospital em Junho. 10: 24 OFF PAULA AKEMI: Na imobiliária do bairro onde Dona Conceição morava, conseguimos pistas do filho dela. O endereço de duas casas e de uma loja no Brás. Não encontramos o filho em lugar nenhum. Mas localizamos a filha de Dona Conceição. 10:40 PAULA AKEMI (de dentro da redação): Encontrei que ela é professora, da rede municipal aqui de São Paulo. Talvez alguém na escola tenha o telefone dela. PAULA AKEMI: A filha da Dona Conceição não quis gravar entrevista, mas por telefone ela me contou que foi abandonada pela mãe quando ainda era criança. Ela também disse que no começo desse ano, até tentou levar a mãe para morar com ela. Mas que a Dona Conceição ficou muito agressiva e fugiu. 11:00 OFF PAULA AKEMI: Por carta, a direção do hospital informou que a filha de Dona Conceição não autoriza qualquer divulgação da imagem ou voz de sua mãe. Decidimos exibir a reportagem porque a história de Dona conceição representa a de muitos outros idosos. Dona Conceição recebeu visita da filha. Mas como não tem para onde ir, continua morando no hospital. 114

VINHETA CACO BARCELLOS entrando no apartamento da mulher de Seu Jorge: Tudo bem e a senhora? NEIDE CARVALHO (mulher de Jorge Isaías): Tudo bem?! OFF CACO BARCELLOS: A mulher de Seu Jorge, o ex-boxeador que conhecemos na casa de repouso mora na Zona Sul de São Paulo. BARCELLOS: Que foto é essa? NEIDE: De casamento. BARCELLOS: Olha... Que ano foi? NEIDE: Sessenta e... oito. Eu como ele não sabia que ele era famoso naquele tempo... BARCELLOS: Tem uma fotografia... Olha só.. Você me dá licença? (para ver e mostrar as fotos) Aqui é uma luta dele, ó. CACO BARCELLOS (lendo um documento): “Federação Paulista de Pugilismo. Tendo sido campeão paulista também integrou a equipe do Brasil de boxe no ano de 1952 na Olimpíada realizada em Helsinki”. BARCELLOS: O quê que a senhora tem aí? Dá licença? NEIDE: São as medalhas dele, quando ele lutava. BARCELLOS: Olha, que bonita essa aqui. 12:24 BARCELLOS: Vocês tiveram filhos? NEIDE: Não. Não tivemos... BARCELLOS: Por que? NEIDE: Naquele tempo não tinha o modernismo de hoje. Aí passou. Aí veio a idade. E pôr filho no mundo com a idade também não dá, né?! 12:38 OFF CACO BARCELLOS: A idade também trouxe a doença e as dificuldades. Há 5 anos a Dona Neide conseguiu na justiça que seu Jorge não saísse mais do Hospital. 12:48 BARCELLOS: Por que que ele está lá e a senhora está aqui? NEIDE: Por que ele caía muito. E... ele acordava, deixava fogo ligado, e eu tinha que trabalhar... eu pus uma enfermeira, ele não quis a enfermeira, destratou a enfermeira. Eu gostava dele... Gosto dele, né?! Tenho pena dele também, né... BARCELLOS: A senhora tem saudades dele? NEIDE: Tenho, eu sinto muita falta. 13:20 OFF CACO BARCELLOS: Dona Neide visita Seu Jorge uma vez por mês. (imagens da reunião de Natal dos idosos no abrigo) 115

NEIDE: eu trouxe o presente de Natal do Papai Noel. CACO BARCELLOS: O quê que é o presente? NEIDE: É um pijama.

NELITA: - Dona Kazue, fala pra ele se eu sou sua amiga ou não sou! KAZUE: - Ela é minha amiga! CACO BARCELLOS: Como é que começou, Kazue, essa amizade? KAZUE: Entre uma visita e outra nós nos conhecemos. OFF CACO BARCELLOS: Nelita vinha ver a irmã, que ficou por 4 meses internada. Hoje dá carinho no lugar dos parentes que não aparecem na festa de Natal. NEIDE fala para Kazue: E eu também te amo, tá bom? Nós duas! VINHETA 14:99 THAIS ITAQUI (entrando no Hospital): Vou conhecer crianças internadas nesse hospital. Aqui, o abandono acontece no começo da vida. OFF THAIS ITAQUI: Kayo (4 anos) chegou em março. A mãe nunca veio visita-lo. ENFERMEIRA: Ele olha pra gente e sorri! Ele tá sorrindo pra ele, olha! (risos) OFF THAIS ITAQUI: Vitória (4 anos) viu a mãe pela última vez em dezembro do ano passado. 14:35 OFF THAIS ITAQUI: Na Associação Cruz Verde, em São Paulo, também conheci a Laura, o Luciano... ENFERMEIRA (enquanto faz carinho em Luciano): - Como todos eles, adora carinho... OFF THAIS ITAQUI: Crianças que tem paralisia cerebral grave e foram esquecidas pela família. TASSIANA ANDRADE (enfermeira) diz, apontando para os pacientes: A Ingrid não tem visita, o Breno também não recebe visita, o Elito também não recebe visita. O Nicolas também não recebe visita... THAIS ITAQUI: - Vocês se acostumam com isso? MARILENA PACIOS (superintendente da Associação) – Não. O que eu digo é sempre assim: Nós não nos acostumamos. Nem com o sofrimento deles, nem com essa condição de abandonados, entendeu?

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15:15 OFF THAIS ITAQUI (passando a mão na cabeça): O primeiro olhar é difícil. O coração fica apertado. 15:25 OFF THAIS ITAQUI: Mas conhecer melhor essas pessoas me fez bem THAIS ITAQUI, enquanto segura a mão de um paciente: - Ele não quer largar minha mão mais! (brinca) THAIS ITAQUI lendo a ficha do paciente: “Data da internação, 25 de junho de 73”. Ele tinha 9 anos. OFF THAIS ITAQUI : A última visita que teve foi da mãe, em 1990. Dudu (44 anos) não consegue andar e tem dificuldade pra falar. THAIS: Ah, ele é São Paulino também! DUDU: Igual eu THAIS: Nesse quarto só entra são paulino? DUDU: Não! Pode entrar todo mundo. 16:03 OFF THAIS ITAQUI : Ele mora aqui há 34 anos. THAIS ITAQUI (lendo um livro escrito por Dudu): Minha casa verde, Carlos Eduardo dos Anjos Souza... caminhada dele.. quando nasceu... OFF THAIS ITAQUI : O livro, ele lançou com a ajuda de uma fonoaudióloga. THAIS: Olha aqui a foto dele. Sorridente aqui, ó. Simpático. DUDU (mostra o livro): Olha! THAIS: Nossa, a Ivete Sangalo! (olhando para o porta retratos). Ele tem foto com um monte de gente famosa aqui! DUDU (mostrando sua família em um porta-retratos): Minha mãe, eu, outro sobrinho... THAIS: E eles vêm bastante aqui? DUDU: Às vezes. VINHETA 16:48 CACO BARCELLOS: Vamos conhecer agora um casal de idosos que tem um cuidador orientado pelo hospital do Servidor. Eles se chamam Benedito de Jesus e Dona Maria Antônia. OFF CACO BARCELLOS: Dona Maria tem 91 anos. Quase não enxerga e tem dificuldades para se locomover. Seu Benedito tem 83 anos. Está cego e quase não escuta? 117

CACO BARCELLOS: O quê que o senhor acha da sua vida hoje? BENEDITO: Ah, eu não posso me queixar. Tenho uma bela de uma família, graças a Deus. Tenho minha filha caçula aí que cuida da gente, porque eu não faço mais nada sozinho... OFF CACO BARCELLOS : Regina foi treinada pelo hospital para cuidar dos pais. REGINA: Vamos almoçar, né, pai?! CACO BARCELLOS: o quê que você está fazendo pro almoço aí? REGINA: Arroz, feijão e filé de frango. REGINA (dando comida para o pai): ó, pai, experimenta o filé de frango para ver se tá bom, se o senhor gosta. BENEDITO: hum.. não quero não, tá duro. 18:02 CACO BARCELLOS (olhando o armário onde ficam os remédios): Olha a quantidade de remédios aí, Regina. REGINA: Aqui é.. os remédios só da mãe. Aqui é a vitamina, que ela toma de manhã... CACO BARCELLOS: E agora aí o quê que é? REGINA: Esses aqui são do pai. CACO BARCELLOS: E como é que você sabe quando tem que dar, quando não tem que dar... tanta coisa assim... REGINA: Tem as receitas. Tem da mãe e tem do pai. Apesar de que eu não preciso mais porque eu já sei, né?! CACO BARCELLOS: Já decorou REGINA: Já sei de cor. CACO BARCELLOS: É!? Dez receitas... REGINA (para o pai): Deixa eu medir sua pressão. CACO BARCELLOS: todo dia você tem que medir a pressão dele? BENEDITO: meu pulso está doendo... REGINA: Doze por seis. BENEDITO: Doze por seis? Pressão de criança! CACO BARCELLOS: qual é esse outro aparelhinho aí? REGINA: É o aparelhinho da insulina. CACO BARCELLOS: Por causa da Diabetes. REGINA: É. BENEDITO: Pegou!? REGINA: Espera um pouquinho. Olha, tá alta! OFF CACO BARCELLOS: Os enfermeiros do hospital ensinaram Regina a aplicar as injeções. BARCELLOS: Você aplica é no braço? REGINA: É no braço, porque na barriga ele não gosta. 118

19:00 OFF CACO BARCELLOS: Dez da noite. Hora de colocar a Dona Maria na cama. CACO BARCELLOS: Você mal colocou sua mãe na cama e já tem outra tarefa? REGINA: (risos) tenho. Ó pai, já trouxe o leite pro senhor. Tá quente, heim. Vê se está bom. CACO BARCELLOS: Regina, eu contei, tarefas como essa, passar um creme no joelho do seu pai, eu contei 36 no seu dia. Você está cansada hoje, como é que você está?! REGINA: Eu deito e já capoto! BENEDITO: Desculpa, eu vou deitar. CACO BARCELLOS: Lógico, fique a vontade. BENEDITO: Minha filha precisa dormir, precisa descansar. O batente dela é duro. OFF CACO BARCELLOS: Seu Benedito gosta de dormir no sofá. Com medo que ele caia, Regina passou a dormir no colchão no chão da sala. REGINA: Eu faço de coração. Eu amo o meu pai e minha mãe, minha família toda. CACO BARCELLOS: Belo exemplo o seu. REGINA: Obrigada! CACO BARCELLOS: Bom descanso, tchau! VINHETA 20:08 OFF THAIS ITAQUI : Na Associação Cruz Verde, os pacientes podem receber visita toda quinta e todo domingo. THAIS ITAQUI: Os familiares vem até o quarto porque tem os pacientes que não podem descer, né!? Dona digna vem toda semana. THAIS: Ele está há quanto tempo aqui? DIGNA DA SILVA (mãe de Amaro): Ele está aqui há 42 anos e 6 meses. THAIS ITAQUI: Nossa! DIGNA: O amaro, ele era perfeito. Teve meningite e ficou assim. OFF THAIS ITAQUI: Ao carinho da mãe, o filho responde com um olhar. DIGNA: Eu converso com ele e ele se mexe, entendeu!? Então os médicos falam assim que ele me conhece, assim, pela voz. Ele sabe que eu sou a mãe dele, entendeu? (Imagens de Digna chorando) ENFERMEIRA: Ele fica muito feliz quando a mãe vem.

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ENFERMEIRA: Porque tudo o que a gente quer é que eles continuem sendo amado pelas famílias. A gente acha que as famílias não precisam abandona-los, entendeu?! OFF THAIS ITAQUI : Amaro é o paciente mais antigo do Hospital. Felipe chegou há 3 meses. A repórter se dirige à Maria Auxiliadora, tia de Felipe: THAIS: É seu filho? MARIA: Meu sobrinho. THAIS: Qual a importância dessa visita pra ele? MARIA: Ah, eu acredito que é tudo. Tem que ter alguém, tem que ter alguém fazendo carinho, sabe? Mostrando pra ele que ele não está sozinho. (chora) Ninguém quer ficar aqui abandonado, principalmente pela família. Não é, meu amor?! OFF THAIS ITAQUI: Dos 205 pacientes, cerca de 80 não tem contato com a família. E esses, fazem dos funcionários pais, mães, tios... DUDU (paciente): Ela é minha mãe. THAIS ITAQUI: E ele te chama de mãe há quanto tempo? MARIA MARTA GOMES (Auxiliar de enfermagem): Nossa, desde sempre, né, Dudu?! Ele fala: “Mamãe, eu te amo”. Você precisa ver que lindo. É chique ele, né!? PACIENTE: É mamãe THAIS: Ela é mamãe? 22:00 OFF THAIS ITAQUI: Outras mães postiças também ocuparam o lugar das famílias. TEREZINHA PADOVAN (voluntária): Você vê neles que, quando tem uns que recebem mais visita de família eles são mais diferentes. THAIS ITAQUI: Qual é a diferença? TEREZINHA: Eles são mais alegres. Muito mais alegres, né!? MARIA, funcionária do hospital liga para parentes de um paciente: FAMILIAR: Alô?! MARIA: Então, a gente está ligando porque faz tempo que não vem ninguém da família visita-lo. 22:30 OFF THAIS ITAQUI : O trabalho de Maria é lembrar pais, mães e irmãos que alguém está esperando por eles. MARIA SILVÉRIO (assistente social): Nunca tem um motivo claro, né, sempre desculpas. “Ah, não deu pra ir”, “esse ano eu tive problema”, “minha mãe faleceu”, “meu irmão não estava bem”... OFF THAIS ITAQUI : Ela faz um controle de todas as visitas. Lendo a lista: 120

“Magda, Marcelo, Bianca, nenhuma visita... Na lista de hoje, famílias que não vêm a mais de um ano. MARIA (por telefone): Amauri, eu estou ligando porque o Flávio tá me pedindo pra ligar pro senhor, né!? Que está com saudade... AMAURI: Essa semana com certeza eu vou aí, eu estou com saudade dele também.

No pátio, Amauri, o irmão de Flávio, conversa com ele: AMAURI: Vai ter bolo? FLÁVIO: Eu não sei ainda... A repórter conversa com eles: THAIS ITAQUI: Você é irmão dele? AMAURI: Sou irmão! Eu não moro aqui em São Paulo, moro em Piracicaba, né?! THAIS ITAQUI: Você sente falta desse irmão aqui, Flávio? FLÁVIO: Ele é São Paulino! AMAURI: Eu sou São Paulino e ele é Corintiano. A nossa briga é essa! (brinca) Você sabe que a gente não esquece de você, né?! Você sabe disso, né!? VINHETA 23:40 OFF CACO BARCELLOS: No próximo bloco: THAIS ITAQUI: Um batizado aqui no hospital e os padrinhos são os próprios funcionários. OFF CACO BARCELLOS: A festa de natal longe da família (imagens da festa de Natal do hospital) 2º BLOCO: MARILENA PACIOS (superintendente da Associação): Hoje teremos quatro batizados e coincidentemente são todas pacientes que não são visitados, não têm família, são abandonados. OFF THAIS ITAQUI : Boa parte dos abandonados da Associação cruz Verde é mantido com doações. É o caso da data de hoje, que marca uma data importante para um adulto e três crianças. O pequeno Kayo é um deles. - Eu sou a madrinha dele! - E trabalha aqui no hospital? - E ele é padrinho também? - Sou o padrinho - E trabalha aqui? - Trabalho aqui. - Que bacana. Aqui, os funcionários acabam virando padrinhos. - Padrinho, pai, mãe, somos... tudo pra eles. 121

- Vocês compraram a roupinha dele!? Mostra pra mim?! - Tá ali em cima. - Que gracinha! OFF THAIS ITAQUI : Carolina cuida de Drieli como enfermeira. CAROLINA PENA (enfermeira): Na verdade quando ela chegou eu que admiti ela, fiz todos os procedimentos iniciais, né, da admissão dela. E me apaixonei. Ela faz aniversário no mesmo mês que eu. OFF THAIS ITAQUI: Agora, quer cuidar como madrinha. CAROLINA: E é uma certeza que ela vai ter alguém pra cuidar, porque padrinho é pra isso, né?! Padrinho é pra vinda inteira. OFF THAIS ITAQUI : Frei Anacleto batiza os pacientes da Cruz Verde há 25 anos. Já virou um grande amigo. FREI ANACLETO GAPSKI: É sempre importante trazer, mesmo nesse momento que a gente tem tantas crianças com tantas limitações, a gente perceber que Deus ama cada um de uma maneira especial. 1:50 Thais Itaqui conversa com a mãe de Kayo: - Agora tá batizado Kayo! - Tem filhos? - Tenho uma menina de 7 anos. E agora tenho um menino! (risos) Ganhei mais um, né, Kayo! VINHETA 2:10 OFF PAULA AKEMI: Festa de Natal aqui no Hospital D. Pedro hoje. PAULA: Há quanto tempo que passa o Natal aqui?! GILDETE (57 anos): Há 8 anos. Eu fico muito triste porque eu fico lembrando do meu povo. Eu fico sozinha... eu sinto um pouco muito sozinha. OFF PAULA AKEMI: Dona Gildete não quer mais viver assim GILDETE (pergunta à repórter no meio da festa): E aí? Não achou ninguém da minha família? PAULA nega com a cabeça... OFF PAULA AKEMI : Conheci dona Gildete na primeira vez que fui ao hospital D. Pedro II. Ela está aqui há 8 anos, desde que teve um derrame. Ela saiu ainda jovem de MG para trabalhar como arrumadeira em SP e perdeu o contato com a família.

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GILDETE: Eu tenho mais irmãos em Minas. É oito. Seis mulheres e três homens. OFF PAULA AKEMI: Ela se lembra de uma sobrinha. PAULA: Como ela chama? GILDETE: Eliana PAULA: Cadê a Eliana? GILDETE: Eu não sei... OFF PAULA AKEMI: Tentamos encontrar Eliana, mas não conseguimos. Gildete suplica olhando para a câmera: Eliana, vem me ver Eliana! Você lembra que você, fui eu quem trouxe você de Minas!? 3:28 No meio da festa, a repórter Paula conversa com Jacolina: PAULA: Por que que você está rindo sozinha? JACOLINA: A minha bengala ia fugindo sozinha. Acho que ela tá querendo dançar! (risos) OFF PAULA AKEMI : Na festa de Natal eu também reencontrei Dona Jacolina (73 anos) PAULA: Todos anos a senhora está aqui, no Natal? JACOLINA: Tô aqui desde de 46. OFF PAULA AKEMI : São 66 anos vivendo no hospital PAULA: Por que que está vivendo daqui há tanto tempo? JACOLINA: Ah, minha mãe morreu. Meu pai “desembestou”, largou todo mundo. OFF PAULA AKEMI: Dona Jacolina veio pra cá menina, por causa de uma poliomielite. Nunca mais foi embora. JACOLINA: A minha cama é essa aqui. PAULA: A primeira? Tem boneca! JACOLINA: Tem! (risos) Eles usam roupa de roupa de acordo com a temperatura. PAULA AKEMI: Ah, hoje tá bem friozinho! JACOLINA: É, tão de macacão... PAULA AKEMI: Tem roupinha deles? Fica onde? JACOLINA: Fica no armário. 4:30 PAULA: E namorado, já teve namorado? JACOLINA: Já PAULA: Aqui dentro do hospital? JACOLINA: Aqui mesmo! Paciente daqui da casa! PAULA: É, e como é que ele era? JACOLINA: Ah, namorei uns dois ou três. Eu namorava escondido. 123

PAULA: Por que escondido? JACOLINA: Das freiras... PAULA: (risos) Não pode namorar aqui? JACOLINA: Não... Agora pode. Mas você sabe que as coisa é assim, né, quando é proibido que a gente quer, né?! CACO BARCELLOS: O Profissão Repórter volta no ano que vem. Até lá você pode ver os programas dessa temporada no nosso site. Bom fim de ano e até 2013. - - FIM - -

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GRÁFICO 5: LISTA DE PROGRAMAS DO PROFISSÃO REPÓRTER

Lista de Programas do Profissão Repórter Data 11/06/13 04/06/13 28/05/13 21/05/13 14/05/13 07/05/13 30/04/13 23/04/13

Tema Passageiros e motoristas de ônibus enfrentam problemas

Duração 1º Bloco 19:49

Duração 2º Bloco 04:41

Como a falta de creches afeta a vida das famílias Falta de vagas na UTI Dificuldades das vítimas da seca no Nordeste

20:17 22:50 23:48

05:52 05:29 04:56

Casos de estupro no Brasil Rotina do metrô de São Paulo Curiosas e diferentes misturas musicais Profissão Repórter acompanha o maior festival religioso do mundo

23:32 21:55 19:56 23:56

05:21 04:07 04:27 05:41

16/04/13 09/04/13 02/04/13

Voluntários que salvam vidas

21:31

06:39

O caminho da exploração dos trabalhadores A vida no complexo do Alemão

22:01 23:23

07:19 05:41

18/12/12 11/12/12 04/12/12

Esquecidos nos hospitais As mais longas viagens do Brasil Mulheres abusam do álcool

24.02 24.36 21.49

05:32 05.14 07.09

27/11/12 20/11/12 13/11/12

Conflitos entre Israel e Palestina Cidade em plena transformação Vítimas da guerra entre a polícia e o crime organizado

23:44 20:36 21.35

05:44 07:55 05:00

06/11/12

Brasileiros aproveitam o domingo de diferentes maneiras pelo país

20:40

03:07

30/10/12 23/10/12 16/10/12

Brasileiras deixam o país para se prostituírem Jovens Conectados Avenida Brasil

25.18 22:31 24.01

3.53 06:03 05:00

09/10/12 02/10/12 25/09/12

Eleições Disputadas Crianças vítimas do crack 24 horas no centro de São Paulo

22:29 24.00 19.32

06:58 04:44 06:03

18/09/12 11/09/12 04/09/12

Violência urbana Competições na terra, na água e no ar Uso abusivo de remédios controlados

23:41 23:45 19:06

05:24 04:51 08:24

28/08/12 21/08/12 14/08/12 07/08/12

Jovens ansiosos buscam espaço no mercado de trabalho Defensoria pública Bailes Funk Roupas baratas

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31/07/12 24/07/12 17/07/12

Gringos no Brasil Fechamento do lixão de Gramado A vida dos idosos

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10/07/12 03/07/12 26/06/12

Trabalho Infantil Corinthians na Libertadores Sonho da Universidade

22:18 24.05 23:14

07.12 05:49 04:45

19/06/12 12/06/12

Mulheres no crime Vida no mangue

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05/06/12

Hospitais do interior do Brasil

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29/05/12 22/05/12 15/05/12

Abuso sexual de crianças Em busca da fama Jovens casais

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08/05/12 01/05/12 24/04/12

Seca no Nordeste e alagamento no Norte Reabilitação Transplante de órgãos

22:15 21:36 23:16

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17/04/12 10/04/12 03/04/12

A volta dos brasileiros que moravam no exterior A rotina de disciplina e treino dos praticantes de MMA Os bastidores da morte de Roberto Laudísio

20/12/11

Médicos Voluntários

29/11/11

Protestos em 2011

25/10/11

Caminhoneiros

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04/10/11

Prostitutas

06/09/11

Futebol

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19/07/11 14/06/11 17/05/11

Jovens e drogas Cadeia Investigação

22:03 22:55 21:20

05:57 05:53 05:38

10/05/11 03/05/11 26/04/11

Brega Bebês abandonados Canteiro de obras

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19/04/11 12/04/11 05/05/11

Abuso de álcool por jovens Treinamentos Violência sexual

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Bope Noite paulistana Sala de aula

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30/11/10 23/11/10 16/11/10

Ocupação Saúde Crack

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09/11/10 02/11/10

Emergência Alcoolismo

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26/10/10

Falta pai

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Chile SWU Deficientes

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28/09/10 14/08/10 03/08/10 20/07/10

Romeiros Especial Criança Esperança Adoção Violência contra mulher

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13/07/10 06/07/10 29/06/10

Vida de gado Baladas Chuvas no Nordeste

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22/06/10 08/06/10 01/06/10

Guerra pelos filhos Copa do Mundo Concursos

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05:09 05:13 05:49

25/05/10 18/05/10 11/05/10

Prostituição Coração Homossexualidade

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07:43 06:16 06:04

04/05/10 27/04/10 20/04/10

Crack Roberto Carlos Universitários

23:51 24.30 23:31

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13/04/10 06/04/10 15/12/09 08/12/09

Chuvas no Rio Haiti Vida e Morte Final do Brasileirão

20:39 24.04 24.18 21:23

05:36 05:19 04:23 04:23

01/12/09 24/11/09 17/11/09

Brasileirão O grande dia Dia de praia

24.02 21:56 24.21

06:25 05:14 04:57

10/11/09 03/11/09 27/10/09

Rush Reencontros Cavalos

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20/10/09 13/10/09 06/10/09

Doenças Psiquiátricas Terremoto na Indonésia Heliópolis

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29/09/09

Dia da Feira

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22/09/09 15/09/09 08/09/09

Violência entre casais Vida nas alturas Lixo

20:44 23:04 22:29

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01/09/09 25/08/09 18/08/09

Jovens em perigo Tudo por um filho Prisões

24.25 20:33 25.48

04:02 06:20 05:02

11/08/09 04/08/09 28/07/09

Sorte Delivery Gangues

18:57 22:25 20:28

06:11 04:35 04:49

21/07/09 14/07/09 07/07/09 30/06/09

Concursos Crack 2 Chegadas e Partidas Crack

20:48 22:06 22:30 23:59

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13/06/09 16/06/09 09/06/09

Crianças em perigo 1 ano de lei seca no Brasil Isolados

21:44 21:26 21:53

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02/06/09 26/05/09 19/05/09

Riscos da vaidade Bombeiros Escola de Periferia

21:59 23:33 24.49

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12/05/09 05/05/09 29/04/09

Artistas da noite Chaves de casa Profissão Repórter procura novo repórter

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28/04/09

Luta por emprego

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Profissão Repórter procura novo repórter Barulho Desafios da balança

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Profissão Repórter procura novo repórter Chuvas em SC Dia de Casamento

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02/12/08 25/11/08 18/11/08

Tragédia em SC Os bastidores de um julgamento polêmico Os desafios de quem trabalha com alimentação no Brasil

18:35 21:02 18:36

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11/11/08 04/11/08 28/10/08 21/10/08

O mundo dos empregados domésticos O trabalho no Porto de Santos A histeria dos fãs do Calypso e de Elvis Cegos lutam para superar as dificuldades

21:35 19:16 18:20 21:25

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14/10/08 07/10/08 30/09/08

A festa religiosa do Círio de Nazaré Sedução, conquista, a qualquer hora e lugar A corrida do ouro no Brasil

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23/09/08

Acompanhe a noite em diferentes trabalhadores da madrugada

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16/09/08

Queimadas e desmatamento da Amazônia

16/09/08 09/09/08 02/09/08

Bombeiros voluntários lutam contra o fogo no MT A jogatina no Brasil Jovens cineastas produzem clipe de banda

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02/09/08 26/08/08 05/08/08

Proliferação de câmeras altera rotina das grandes cidades O drama das famílias de desaparecidos Morte e vida nas maternidades brasileiras

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05/08/08 29/07/08 22/07/08

Melhores momentos do chat com a equipe do PF Os desafios e surpresas da vida e do trabalho debaixo da terra A vida na linha de tiro

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15/07/08 08/07/08

As imprudências dos motoristas que bebem antes de dirigir O universo da indústria do sexo

01/07/08

Dia de pagamento

24/06/08

Hospital de Guerra

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18/06/08

Entrevista com o diretor de Assuntos Corporativos do Metrô

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17/06/08

A luta por espaço no meio da multidão

16:29

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10/06/08 03/06/08

Os dois universos do futebol O drama dos transplantes no Incor

09/03/08

Profissão repórter apura o caso que chocou o interior paulista

18/02/08

Crianças enfrentam dificuldades para chegar à escola

02/12/07

Os repórteres entram em campo

04/11/07

A seca que atinge 387 municípios no Nordeste

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09:35 08:08 Não disponível Não disponível Não disponível Não disponível

16/11/07

Os bastidores do caso Renan Calheiros

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19/08/07

Festa de Barretos

22/07/07

A tragédia do vôo JJ 3054

08/07/07

As saídas para quem anda endividado

01/07/07

Sobrevivente da violência conhece a realeza

24/06/07

Os festejos de São João

17/06/07

Os sem-documentos

10/06/07

A união contra o preconceito (Parada do Orgulho Gay)

03/06/07

A história de Esmeralda Ortiz

27/05/07

O aumento de viciados em crack

20/05/07

A obsessão pela beleza

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A visita do Papa Bento XIV

06/05/07

O caos na Praça Sé

29/04/07

Prostituição Infantil

08/04/07

Protestos contra o aquecimento global

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01/04/07

Estudantes africanos no Brasil

25/03/07

Operação salvamento

18/03/07

O crescimento do telemarketing

11/03/07

Os bastidores da visita de Bush ao país

04/03/07

Profissão Repórter vai até a cidade mais violenta do país

21/01/07

O dia de visita em presídios

03/12/06

O destino dos boias-frias

12/11/06

Casos de casamentos

05/11/06

A vida por casa em São Paulo

22/10/06

Vida de caminhoneiro

15/10/06

Vida de circo

08/10/06

Coleta de lixo na grande São Paulo

24/09/06

Uma corrida contra o tempo pela vida

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O roubo de carro nas grandes cidades

10/09/06

Jovens vidas interrompidas

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03/09/06

Perigos da grande rede

20/08/06

Vida subterrânea

13/08/06

Violência contra mulher

06/08/06

Drama nos aeroportos

30/07/06

As grandes torcidas organizadas de São Paulo

23/07/06

Vida de modelo

16/07/06

Deficientes no mercado de trabalho

09/07/06

A vida de quem ganha nos sinais

25/07/06

A capital do comércio popular

11/07/06

Julgamento que virou circo (caso Suzane von Richthofen)

28/05/06

Os caçadores de notícia

21/05/06

Um desafio na colheita de cana

14/05/06

Cortadores de cana

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Edições especiais

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07/05/06

Os pichadores em ação

14/12/06

A vida no mar

30/08/07

O Brasil sobre duas rodas

18/10/07

O Brasil da Hora Extra

13/12/07

Em busca do sucesso

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