O QUE DIZEM AS PESQUISAS SOBRE A INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA NO TRABALHO

July 5, 2017 | Autor: Floriza Gomide | Categoria: Inclusive Education, Mercados de trabajo, Pessoas Com Deficiência
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O QUE DIZEM AS PESQUISAS SOBRE A INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA NO TRABALHO Floriza Gomide Sales Rosa Marilete Geralda da Silva Perdigão Universidade Federal do Maranhão, Programa de Pós-Graduação em Educação/Mestrado em Educação – Maranhão Eixo Temático 16: Pesquisa sobre a produção do conhecimento científico em Educação Especial Categoria: Comunicação Oral RESUMO Para compreensão da educação inclusiva e sua relação com o trabalho na contemporaneidade, é preciso situá-la no contexto geral da sociedade capitalista, consideradas suas complexas relações de classe. Portanto, esta pesquisa, de natureza teórica, pretende contribuir com os estudos sobre inclusão e exclusão da pessoa com deficiência (PcD) no mundo do trabalho, a partir da análise das produções científicas dos últimos 12 (doze) anos no Brasil, propondo-se a discutir os fatores sociais, econômicos e educacionais do processo de inclusão no trabalho, destacando orientações legais, concepções e práticas includentes e excludentes da PcD das relações de trabalho no capitalismo contemporâneo. A pesquisa foi realizada a partir da análise de 17 (dezessete) trabalhos científicos, produzidos no período de 2001 a 2013, nas áreas de Educação, Psicologia e Administração, as quais deixam claro que as conquistas em âmbito legal significaram avanços na inserção da PcD no mundo do trabalho, mas pontuam inúmeros desafios a serem ainda enfrentados neste processo. PALAVRAS-CHAVES: Deficiência. Inclusão. Trabalho.

INTRODUÇÃO

As discussões acerca das relações entre trabalho e educação sempre estiveram presentes nas pesquisas educacionais, objetivando a compreensão dos processos de formação profissional para a inserção produtiva no modelo capitalista de (re)produção da existência humana. A relação quase que imediata entre desenvolvimento econômico e social de um país e seu correspondente investimento em qualificação e requalificação profissionais tem constituído tema de inúmeros debates e produções teóricas sobre educação para o trabalho; formação profissional; perfis profissionais demandados; dentre outros temas que figuram nas reflexões contemporâneas da sociedade capitalista, assentada em bases produtivas.

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A década de 90 foi marcada pelo fortalecimento do amparo legal à PcD no que se refere ao pleno exercício de seus direitos mais básicos, principalmente em relação ao direito à formação profissional e à qualificação para o trabalho. Desde a instituição da Lei de Cotas1 no Brasil, os estudos sobre a formação educacional e profissional da PcD ganharam contornos específicos de análise, voltando-se para discussões sobre a adequação ou não desses mesmos processos formativos, bem como os fatores do processo de inclusão e exclusão educacional e social da PcD. Todas essas mudanças acabam por refletir as profundas transformações que caracterizam o capitalismo a partir dos anos 90, marcado pelos ideais neoliberais e pelo intenso processo de reestruturação produtiva do capital, proposto pelo modelo de acumulação flexível. É neste novo contexto mundial, de nova conformação econômica e ideológico-política do capital, que está inserido o trabalhador, com ou sem deficiência. Neste sentido, este estudo bibliográfico pretendeu analisar a relação entre os pressupostos da inclusão social na sociedade contemporânea e a inclusão e exclusão da PcD no mundo do trabalho, bem como identificar, nas ações da sociedade civil e na legislação brasileira, fatores que interagem nesse processo. Para tanto, apresenta-se análise de parte das produções científicas realizadas no Brasil, nos últimos 12 (doze) anos, destacando seus objetivos, o contexto de realização das referidas pesquisas, os sujeitos e os principais resultados apresentados.

METODOLOGIA UTILIZADA

Para viabilizar a análise do quadro teórico, incialmente procedemos um estudo crítico sobre o estado da arte das produções científicas nas áreas de Educação, Psicologia e Administração, que versavam sobre temas específicos, referentes a inclusão e exclusão social e educacional da PcD, em diferentes abordagens teóricometodológicas. Assim, selecionamos 17 trabalhos científicos, produzidos no período de 2001 a 2013, para leitura, análise crítica e categorização teórica. As consultas foram feitas a partir do Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES e nas bases científicas das 1

A Lei Nº 8.213, de 24 de julho de 1991. (BRASIL, 1991)

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seguintes Universidades: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Universidade Federal de São Carlos. Também foram consultadas publicações científicas das Revistas Interinstitucional de Psicologia, de Administração de Empresas, de Educação Especial da Universidade Federal de Santa Maria, Brasileira de Educação Especial, Temas em Psicologia e Organizações e Sociedade. Os trabalhos analisados foram agrupados em um Plano Teórico2, definido de acordo com os temas e subtemas predominantes3 em cada pesquisa. Por fim, passamos às considerações finais da análise, chamando atenção para a necessária discussão dos conceitos e significados atribuídos às categorias inclusão e exclusão, em especial na sociedade capitalista contemporânea, em que as mudanças no mundo do trabalho reconfiguram as de relações de trabalho e o modo de ser do trabalhador.

PLANOS TEÓRICOS DE ANÁLISE

Foram identificados quatro planos teóricos nas pesquisas analisadas, que são detalhados a seguir. São eles: plano da significação; plano da relação trabalho e educação; plano das políticas públicas e plano da caracterização e análise do contexto de inclusão no trabalho.

1. O Plano da Significação

Grande parte dos trabalhos analisados situa-se no plano das significações, em que são discutidos os sentidos atribuídos à deficiência, ao trabalho e à profissionalização. São abordadas concepções, crenças e conceitos formulados histórica e socialmente pelos sujeitos envolvidos nos processos de inclusão e exclusão do mundo do trabalho. Carvalho-Freitas e Marques (2007) propõem uma análise histórica das visões compartilhadas socialmente sobre a deficiência ao longo do tempo. Ao fazer a opção 2

Chamamos de plano teórico a área temática de abrangência de cada pesquisa, ou seja, o eixo teórico da discussão. 3 Por vezes, esses temas e subtemas transitam em outros Planos Teóricos, mas foi considerado, para efeito de análise, o Plano Teórico identificado como predominantes na pesquisa analisada e/ou explicitada no objeto e objetivos dos estudos considerados.

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pelo método de análise histórica das principais invariantes ou padrões de comportamento observados, os autores identificam, na pesquisa bibliográfica empreendida, matrizes interpretativas da deficiência, que foram historicamente construídas e que são reeditadas em contextos e épocas distintas, influenciando assim as relações e comportamentos destinados às PcD no interior das empresas atualmente. Tanaka e Manzini (2005) também percorrem o plano da significação, identificando em seu trabalho o que os empregadores pensam sobre a PcD. Deixam claro que a inserção no trabalho se dá por força da Lei e que as opções de inclusão são sempre em funções com pouca exigência de qualificação e/ou de formação inicial, o que se reflete na compreensão de que uma das dificuldades para inclusão da PcD no mercado de trabalho é a falta de escolaridade dessa população, além da própria deficiência apresentada. O trabalho de Meletti (2001) é o único que trata especificamente da pessoa com deficiência intelectual (PcDI), investigando o significado que 6 PcDI, com e sem experiência

no

mercado

competitivo,

atribuem

ao

seu

processo

de

profissionalização. Por sua vez, Silva (2007) confronta as teorias sobre o significado do trabalho para 10 trabalhadores com deficiência visual, empregados em empresas públicas e privadas de segmentos industriais e de prestação de serviços da região metropolitana de Belo Horizonte. Já Pereira, Del Prete e Del Prete (2008) entrevistam individualmente 27 trabalhadores com deficiência física e 27 trabalhadores sem deficiência física, de 5 empresas de uma cidade do interior do estado de São Paulo, buscando identificar aspectos positivos e negativos associados ao trabalho na visão desses trabalhadores. As pesquisas supramencionadas, a partir do ponto de vista construído pelas próprias PcD, verificam que tanto o processo de profissionalização quanto o trabalho propriamente dito significam instrumentos de afirmação e reconhecimento social e pessoal da PcD inserida no trabalho, assim como trazem, em seu bojo, referências negativas para os trabalhadores, face às próprias contradições do sistema capitalista excludente. A constatação de que as oportunidades em atividades mais qualificadas é ainda rara para as PcD e de que é necessário repensar a preparação do trabalhador para sua inserção efetiva no mercado fica patente nas pesquisas analisadas.

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Invariavelmente, podemos constatar que as concepções sobre a deficiência e comportamentos em relação à PcD são construídos com base nas concepções de homem e de mundo em cada época.

As pesquisas acima delineadas, em

consonância com o(s) modo(s) de ver o mundo e o homem no capitalismo contemporâneo, estabelecem a estreita relação entre a produção da existência humana e os sentimentos de pertencimento social e reconhecimento da capacidade produtiva das PcD, avaliadas conforme sua participação ou não – ou mesmo conforme o juízo sobre as possibilidades ou não de participação dessas pessoas – no mundo do trabalho. Na mesma medida, estabelecem como elemento valorativo da capacidade produtiva atribuída às PcD, sua maior ou menor inserção nos processos formais de educação e de qualificação e requalificação profissionais.

2. Plano da Relação Trabalho e Educação

Os trabalhos agrupados neste Plano Teórico analisam as relações entre trabalho e educação, no contexto da sociedade capitalista. Lancillotti (2001) discute a profissionalização de pessoas com deficiência auditiva, física, intelectual, múltipla e visual mediante esforço teórico-empírico de análise de três periódicos que tratam da relação trabalho e deficiência, no período entre 1988 e 1998, e de análise de campo em 46 empresas do mercado formal de Mato Grosso do Sul. A pesquisadora observa que a inadequação dos processos de formação da PcD, o preconceito e o desconhecimento de limites e possibilidades da deficiência, compõem as principais dificuldades impostas à inserção da PcD no trabalho. Os resultados demonstraram ainda que existe uma predominância de PcD física contratadas pelas empresas em detrimento da deficiência intelectual. Aspecto que merece destaque é o alto número de trabalhadores terceirizados, confirmando a desregulamentação e precarização do trabalho na contemporaneidade. Os trabalhadores com deficiência continuam sendo alijados do mercado de trabalho formal, conforme corroborado pela pesquisadora. Mendes et al (2004) realizam uma análise crítica da produção científica discente de programas de pós-graduação em Educação e Psicologia, acerca da profissionalização de PcD no Brasil. E, assim como as demais pesquisas na área, constatam que os programas de formação ainda são precários e inadequados tanto às necessidades das PcD quanto às demandas do mercado competitivo.

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Costa et al (2011) refletem sobre a inclusão social pela via do trabalho, investigando como ocorre a qualificação profissional de PcDI nas Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE’s. Observam que as oficinas contribuem para o desenvolvimento da PcDI como um todo, mas estas não têm representado um avanço significativo em seu processo de inserção no mundo do trabalho, visto que se distanciam das demandas do mercado. Tal trabalho destaca que as pessoas com deficiência intelectual ainda permanecem excluídas do mercado em comparação às demais deficiências. Figueiredo e Johann (2013), por sua vez, discutem o Processo de Educação Profissional e Colocação no Trabalho (PECT), implementado pela Federação Nacional das APAE’s, no contexto da reestruturação produtiva do capital na década de 90. A pesquisa, ao fazer uma análise crítica das relações entre capital e trabalho, demonstra que a formação da PcD responde às transformações sociais, econômicas, políticas e culturais características dessa década, demandando para o trabalhador com deficiência as competências e habilidades requeridas pelo discurso toyotista

de

qualificação

e

requalificação,

atribuindo

ao

trabalhador

a

responsabilidade pelo seu sucesso ou insucesso no mercado de trabalho e retirando o foco das estratégias excludentes do sistema capitalista em processo de reestruturação de seu modelo de acumulação. Neres e Corrêa (2008) também versam sobre a relação trabalho e educação na sociedade capitalista contemporânea, a partir de uma análise da categoria trabalho na educação da pessoa com deficiência visual. Os autores tecem suas reflexões a partir dos pressupostos teóricos de significação do trabalho em Marx. Percorrem a história, pontuando relações, ao longo do tempo, entre educação, trabalho e deficiência, demonstrando como a sociedade se relacionou com o trabalho e como posicionou a PcD no contexto de valorização ou não desta categoria. Assim, concluem que é de fundamental importância a existência de uma proposta educacional que supere a exclusão e a necessidade de transformação das atuais relações de trabalho na sociedade capitalista, bem como o estabelecimento de um novo projeto político-social. Percebemos, nas pesquisas analisadas, que o trabalhador com deficiência vai sendo incorporado ao mercado de trabalho como forma de aproveitamento máximo da força de trabalho disponível socialmente. Nas palavras de Marx (1989, p. 262), “o

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capital é trabalho morto que como um vampiro se reanima sugando o trabalho vivo e quanto mais o suga mais forte se torna”.

3. Plano das Políticas Públicas

No Plano Teórico das Políticas Públicas foram analisadas duas pesquisas documentais, ambas de 2009. De um lado, os resultados da pesquisa de Oliveira, Goulart Junior e Fernandes confirmam que o marco legal é recente nos três contextos pesquisados. Tanto nos Estados Unidos quanto na União Europeia o conceito de deficiência se respalda no modelo social, enquanto que no Brasil o conceito de deficiência ainda se vincula ao modelo médico. Os autores percebem que os avanços e limites de cada política são específicos dos contextos de análise, mas que apresentam a tendência comum de garantir à PcD sua inserção social pela via de sua inclusão produtiva. Ribeiro e Carneiro, por sua vez, fazem uma discussão do impacto da Lei de Cotas no Brasil a partir da análise dos processos de autuação por não cumprimento da norma legal, conduzidos pela Procuradoria Regional do Trabalho de Belo Horizonte, no período de 2000 a 2007. A pesquisa demonstrou que as empresas utilizam toda sorte de subterfúgios e estratégias para adiar, reduzir ou mesmo eliminar a necessidade de contratação de pessoas com deficiência, como atendimento ao que preconiza a legislação em vigor. Destacam ainda os autores que há uma seleção velada no processo de contratação, com prioridade para a PcD física, preferencialmente o não cadeirante (diminuindo maiores adaptações da empresa).

4. Plano da caracterização e análise do contexto de inclusão no trabalho

Os estudos que se situam neste Plano Teórico destacam as demandas das empresas e da sociedade capitalista para os trabalhadores, descrevendo o perfil das PcD inseridas no mercado de trabalho, bem como analisam os aspectos que caracterizam seu processo de inserção: principais dificuldades, participação da família, procedimentos includentes e excludentes das empresas, dentre outros.

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Em sua tese de doutorado, Campos (2006) analisa os efeitos de um Programa de Habilidades Sociais para o Trabalho aplicado junto a 3 (três) trabalhadores com deficiência intelectual e deficiência física, entre 21 e 36 anos de idade, em situação natural de trabalho. Os resultados demonstraram que houve um aumento gradual, por parte dos participantes, na qualidade do desempenho de determinadas habilidades sociais, em especial as relacionadas à comunicação e à interação social. Também situada na unidade temática que analisa o perfil das pessoas com deficiência inseridas no trabalho, a pesquisa de Veltrone e Almeida (2010) investigou a inserção da PcD no mercado de trabalho em relação ao tipo de deficiência, nível de escolaridade, qualificação profissional e ocupação atual. Os resultados apresentados pelas autoras corroboram outras pesquisas realizadas na área, que constatam, além da baixa contratação da PcDI, a predileção das empresas por contratar PcD auditiva e física, com comprometimento leve da mobilidade, de modo a evitar maiores reestruturações no ambiente de trabalho. Além disso, aspectos como formação, produtividade e competitividade que orientam as práticas das empresas quanto à seleção de pessoal sem deficiência, acabam se estendendo às PcD, exigindo, portanto, a adaptação do sujeito às demandas do mercado de trabalho. O estudo de caso empreendido por Rosa e Denari (2013), busca compreender o processo de inclusão social por meio da análise da rotina de um adulto com deficiência intelectual, que não está inserido no mercado de trabalho, e de sua família. A pesquisa destaca que a exclusão do mercado de trabalho ainda é predominante na vida da PcDI, uma vez que seu processo de formação em oficinas protegidas destoa das exigências da sociedade do capital. Outro aspecto relevante do estudo é a importância da psicodinâmica familiar no processo de integração da PcD nos serviços e atividades da comunidade, bem como para sua efetiva inclusão e aceitação social. A dissertação de mestrado de Doval (2006), um estudo exploratório realizado com 40 melhores empresas para trabalhar, consideradas pelo Great Place to Work4, no período entre 1997 e 2005, foi constatado que a maioria das organizações não 4

O Great Place to Work significa “Excelente Lugar para Trabalhar” (tradução nossa). É uma empresa global de consultoria, treinamento e pesquisa, que auxilia outras empresas a construírem ambientes de trabalho considerados excelentes para se trabalhar, através da elevação do nível de confiança e da qualidade da vida profissional de seus funcionários. Surgiu nos Estados Unidos e hoje atua em 53 países ao redor de todo o mundo.

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cumpre a Lei 8.213/91, que estabelece um percentual de cotas a ser preenchido com PcD nas empresas. Os padrões socialmente estabelecidos e a falta de acesso à educação são indicados como as principais dificuldades enfrentadas pelas PcD em sua inclusão no trabalho. Além disso, a falta de condições que efetivamente promovam a inclusão da PcD, tanto objetiva quanto subjetiva, nos ambientes de trabalho, é uma das dificuldades observadas no relacionamento entre PcD e empregadores, a partir da vigência do Decreto 3.298/99 (BRASIL, 1999), e apontada pela pesquisa de Oliveira, Araújo e Romagnoli (2006). O estudo de caso de Bezerra e Vieira (2012) analisa a promoção da igualdade de oportunidade para PcDI e demonstra que não há igualdade de oportunidades no mercado de trabalho, sendo ainda necessárias muitas mudanças para a promoção efetiva da igualdade e da inclusão. A pesquisa corrobora outros trabalhos analisados, ao constatar que as PcD é que acabam tendo de se ajustar às demandas e exigências sociais.

CONCLUSÃO

Com base na leitura e análise empreendidos, e dentro dos limites do presente estudo, observamos que as pesquisas realizadas nos últimos 12 anos têm como pano de fundo a inclusão como direito humano. Embora percorram o discurso do direito humano à educação e ao trabalho, as pesquisas e debates em torno das relações entre educação, trabalho e deficiência são construídos sobre bases teóricometodológicas distintas, conforme caracterização nos planos teóricos tipificados neste estudo. Embora as pesquisas situadas no plano teórico da significação discutam os significados do processo de inclusão e exclusão no trabalho, ainda assim não se debruçam

sobre

os

significados

das

categorias

inclusão

e

exclusão,

problematizando seu sentido no contexto capitalista contemporâneo. Por outro lado, trazem

contribuições

valiosas

sobre

os

modos

de

pensar

a

deficiência

historicamente, demonstrando que essas percepções conduzem as ações direcionadas às pessoas com deficiência, tanto no espaço do trabalho, quanto na sociedade de modo geral.

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Observam que critérios de valoração como a normalidade e a utilidade da pessoa com deficiência predominam no mundo do trabalho, como resultado de uma visão médica sobre a deficiência, que pressupõe a existência de um padrão socialmente aceito, considerado este o padrão da normalidade. Aquilo que não se enquadra nesse padrão deverá se adequar, sendo útil à sociedade que o acolhe. As pesquisas ainda destacam a importância do trabalho e da profissionalização da pessoa com deficiência a partir de seu próprio ponto de vista. Observam que o trabalho representa reconhecimento social e possibilidade de superação da visão que anula o potencial da pessoa com deficiência, admitindo sua capacidade produtiva e de participação. Assim, comportam sentimentos vívidos de valoração positiva da pessoa com deficiência. Todavia, é importante ressaltar que o sistema do capital nos impele a competir e acaba considerando incapazes e fracassados aqueles que não se ajustam às exigências modernas, justificando assim o processo excludente do capitalismo pelos significados tácitos (e explícitos) da ideologia das competências. Os estudos do plano teórico da relação trabalho e educação destacam que o modelo de produção capitalista, essencialmente excludente, acaba por moldar o trabalhador com deficiência para que se ajuste à necessidade competitiva de produzir lucro e, portanto, de se reproduzir. Assim, o mercado não exige do trabalhador com deficiência mais do que exige dos demais trabalhadores, tampouco não os poupa do processo de exploração, intensificação e estranhamento do trabalho face às deficiências que apresenta, embora as use como justificativa para sua “inadequação” ao mundo do trabalho atual: exigente, dinâmico e eficiente. A análise do corpus teórico deste estudo, a partir do plano teórico das políticas públicas, demonstra que a inserção da pessoa com deficiência no mercado de trabalho tem sido uma resposta tanto à pressão social, provocada pela tensão entre classes, que caracteriza o movimento antagônico e contraditório de forças do capital, quanto da determinação legal imposta pela Lei 8.213/91 e regulamentada pelo Decreto 3.298/99. Finalmente, as constatações do plano teórico da caracterização e análise do contexto de inclusão no trabalho fortalecem as conclusões de outras pesquisas, inclusive situadas em outros planos teóricos, que observam a obediência do mercado de trabalho aos ditames do capital, em consonância com a lógica que sustenta o modelo capitalista vigente.

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Neste sentido, a discussão dos significados das categorias inclusão e exclusão e os sentidos que lhe são atribuídos no contexto capitalista de produção constituem reflexão importante para compreensão da participação e atuação da pessoa com deficiência no mundo do trabalho, bem como para desvelar processos antagônicos e que escondem, pela superfície includente que revelam, a estrutura excludente que produzem. Observa-se que a discussão sobre o papel e o significado do trabalho para o homem contemporâneo, com deficiência ou não, constitui reflexão importante e ainda necessária para compreensão do atual processo de reestruturação produtiva do capital neste século XXI. Nesta perspectiva, este estudo contribui com as discussões e o aprofundamento teórico sobre as concepções e relações entre deficiência e trabalho na sociedade capitalista contemporânea.

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LISTA DOS TEXTOS ANALISADOS BEZERRA, Sérgio S.; VIEIRA, Marcelo M. F. Pessoas com deficiência intelectual: a nova "ralé" das organizações de trabalho. Revista de Administração de Empresas, São Paulo, v. 52, n. 2, p. 232-244, mar./abr. 2012. Disponível em: . Acesso em: 01 abr. 2013. CAMPOS, Juliane A. de Paula P. Programa de habilidades sociais em situação de trabalho de pessoas com deficiência: análise dos efeitos. São Carlos, 2006. 164p. Tese (Doutorado em Educação Especial). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2006. CARVALHO-FREITAS, Maria Nivalda de; MARQUES, Antônio Luiz. A diversidade através da história: a inserção no trabalho de pessoas com deficiência. Revista O&S, Salvador, v. 14, n. 41, p. 59-78, mai./jun. 2007. Disponível em: . Acesso em: 01 abr. 2013. COSTA, Maristela Cristina de Aguiar et al. Inclusão social pelo trabalho: a qualificação profissional para pessoas com deficiência intelectual. Revista Interinstitucional de Psicologia, Belo Horizonte, v. 4, n. 2, p. 200-214, jul./dez. 2011. Disponível em: . Acesso em: 01 abr. 2013. DOVAL, Jorge Luiz Moraes. Inclusão de pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho: desafios e tendências Porto Alegre, 2006. 199p. Dissertação (Mestrado em Administração). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2006. FIGUEIREDO, Ireni Marilene Zago; Johann, J. As demandas requeridas para o trabalhador com deficiência no Brasil na da década de 1990. Revista Educação Especial, Santa Maria, v. 26, n. 45, p. 59-72, jan./abr. 2013. Disponível em: . Acesso em: 01 abr. 2013. LANCILLOTTI, Samira Saad Pulchério. A integração pelo trabalho na sociedade da exclusão. In: XXIV Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, (org) Anais Eletrônicos do Encontro Anual de PósGraduação e Pesquisa em Educação. Caxambú: ANPED, 2001. MELETTI, Silvia Márcia Ferreira. O significado do processo de profissionalização para o indivíduo com deficiência mental. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 7, n. 1, p. 77-90, 2001. Disponível em: . Acesso em: 01 abr. 2013. MENDES, Enicéia G. et al. Estado da arte das pesquisas sobre profissionalização do portador de deficiência. Temas em Psicologia, Ribeirão Preto, v. 12, n. 2, 2004. Disponível em: . Acesso em: 01 abr. 2013. NERES, Celi Corrêa; CORREA, Nesdete Mesquita. O trabalho como categoria de análise na educação do deficiente visual. Cad. CEDES [online]. 2008, vol.28, n.75, p. 149-170. Disponível em: . Acesso em: 01 abr. 2013.

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