O que é sexualidade para Michel Foucault? (História da Sexualidade I)

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Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Faculdade de Letras – Pós-Graduação em Letras Clássicas Disciplina: O Pensamento Filosófico Latino (LEC878) Professor(a): Anderson de Araújo Martins Esteves Mestrando: Jônatas Ferreira de Lima Souza (DRE: 116198749)

O que é sexualidade para Michel Foucault?

O conceito para Foucault, antes das pretensões de defini-lo abertamente, será bastante mastigado durante sua História da Sexualidade I. Estará disperso por toda obra. Fugindo de tais pretensões, primeiramente, ele busca encontrar essa problemática na experiência europeia nos tempos vitorianos1, tanto quanto busca um elemento primordial à discussão, uma: scientia sexualis. A experiência da sexualidade aqui é cristã e europeia2. No seu capítulo III: scientia sexualis, o autor passa a localizar conceitualmente essa “sexualidade”. Antes de mais nada, para ele, a sexualidade só pôde ser um elemento perceptível no tempo, com historicidade, graças aos mecanismos de controle do sexo, talvez, não necessariamente do ato sexual, mas do que se pode/podia ou não, no discurso que controla, falar sobre ele, sobre o sexo. Logo, para Foucault

Desde o século XVI, esse rito fora, pouco a pouco desvinculado do sacramento da penitência e, por intermédio da condução das almas e da direção espiritual – ars artium – emigrou para a pedagogia, para as relações entre adultos e crianças, para as relações familiares, a medicina e a psiquiatria. Em todo caso, há quase cento e cinquenta anos, um complexo dispositivo foi instaurado para produzir discursos verdadeiros sobre o sexo: um dispositivo que abarca amplamente a história, pois vincula a velha injunção da confissão aos médicos da escuta clínica. E, através desse dispositivo, pôde aparecer algo como a ‘sexualidade’ enquanto verdade do sexo e de seus prazeres.3

Para Foucault, a sexualidade é fruto dessa experiência cultural no tempo, do que chama de scientia sexualis – das confissões na igreja às confissões nos consultórios médicos. A sexualidade foi possível por meio do discurso sobre o sexo que imperava no comportamento das famílias, desde o meio religioso até o clínico. Esse meio favorável ao surgimento desse termo “sexualidade”, advém do mundo burguês, segundo o autor.

Reino Unido, século XIX – Era Vitoriana (Rainha Vitória e Rei Alberto). Inglaterra vitoriana e França, basicamente. 3 FOUCAULT, p. 67. 1 2

Acompanhado das questões econômicas estava o puritanismo burguês vitoriano que pretendia investigar o comportamento sexual do emergente trabalhador das industrias. Diante de múltiplas relações possíveis entre esses mecanismos de poder que vigiavam/vigiam a fala/comportamento, esses saberes sobre o sexo, Foucault ainda pretende, em seu livro, encontrar o conceito, mencionando que Se é verdade que a ‘sexualidade’ é o conjunto dos efeitos produzidos nos corpos, nos comportamentos, nas relações sociais, por um certo dispositivo pertencente a uma tecnologia política complexa, deve-se reconhecer que esse dispositivo não funciona simetricamente lá e cá, e não produz, portanto, os mesmos efeitos. Portanto, é preciso voltar a formulações há muito tempo desacreditadas: deve-se dizer que existe uma sexualidade burguesa, que existem sexualidades de classe. Ou, antes, que a sexualidade é originária e historicamente burguesa e que induz, em seus deslocamentos sucessivos e em suas transposições, efeitos de classe específicos.4

Apesar de sua complexa conceituação, a sexualidade possui um ponto de partida: a scientia sexualis; um contexto: a Europa cristã, vitoriana e burguesa; um motivo: o discurso sobre os corpos, um saber sobre o sexo, um controle por meio do discurso; em Foucault, não é possível produzir uma única percepção sobre a sexualidade. Mas esta possui, para o ocidente, um local de fala. Complementa Foucault que, Quanto a nós, estamos em uma sociedade do ‘sexo’, ou melhor, ‘de sexualidade’: os mecanismos do poder se dirigem ao corpo, à vida, ao que a faz proliferar, ao que reforça a espécie, seu vigor, sua capacidade de dominar, ou sua aptidão para ser utilizada. Saúde, progenitura, raça, futuro da espécie, vitalidade do corpo social, o poder fala da sexualidade e para a sexualidade; [...] a sexualidade, quanto a ela, encontra-se do lado da norma, do saber, da vida, do sentido, das disciplinas e das regulamentações.5

Poderemos inferir que a sexualidade seja um mecanismo fruto do discurso que busca saber e controlar o sexo, mas de forma alguma é hostil a este, não buscando repreendê-lo na prática, no entanto, pretendendo coletar informações para decidir em que lugar deve-se ou não estar o sexo, como deve comportar-se o ser humano diante do sexo, diante do discurso sobre o sexo, diante do saber sobre o sexo. Portanto, nessa linha teórica do poder dos discursos foucaultianos, a sexualidade encontra-se no plano do discurso social que lida com os comportamentos, as escolhas e os desejos do homem em detrimento do sexo – e do saber sobre o mesmo. 4 5

FOUCAULT, p. 120. FOUCAULT, p. 138-139.

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