O que é uma \"boa\" fotografia?

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O que é uma "boa" fotografia?

© Renato Roque, imagem de projecto Arca de Noé

Alguns responderão imediatamente com alguma candura à pergunta formulada que "Uma fotografia boa é muito simplesmente aquela de que gostam". Não questionamos esta resposta simples, ainda que esta subjectividade, que hoje nos parece indiscutível, fosse inaceitável antes do século XVIII e do Romantismo. Mas esta nota não pretende discutir a subjectividade do gosto ou do belo, nem sequer os critérios individuais, mas sim tentar encontrar os critérios dominantes ao longo da história da fotografia para dizer que uma determinada fotografia é ou não é "boa". A qualidade de uma fotografia era avaliada tradicionalmente por critérios técnicos e por critérios estéticos. Há certamente outros critérios, históricos, científicos, sociais ou políticos, mas eram sobretudo os dois tipos enunciados que permitiam a alguém afirmar que uma determinada fotografia era uma “boa" fotografia. Os critérios técnicos parecem ter sido herdados em grande parte da história da fotografia e das inovações tecnológicas, sobretudo no campo da óptica e da química, que foram rapidamente corrigindo “limitações” do processo fotográfico primitivo, e que possibilitaram muito cedo imagens bem focadas, muito nítidas, capazes de reproduzir com enorme exactidão o real e com um grande equilíbrio tonal, desde os negros aos brancos, com todas as gamas de cinzentos. Sem estas inovações, o naturalismo de Alfred Stieglitz, de Edward Steichen ou de Paul Strand não teria sido possível, e muito

menos a Nova Visão de László Moholy-Nagy, a Nova Objectividade de August Sander ou a fotografia directa de Walker Evans. Os critérios estéticos, se esquecermos para já o pictorialismo que se baseava em critérios herdados da pintura, estiveram quase sempre associados ao que se poderia definir genericamente como uma “nova visão” que a fotografia permitia revelar. Temos portanto técnica e visão, como os dois vectores em que a “boa” fotografia se apoiava. O domínio da técnica e uma visão apurada dotavam um fotógrafo dos meios necessários para fazer “boas” imagens e possibilitavam a sua avaliação criteriosa e justa pelo público e pelos companheiros de actividade. Critérios técnicos e técnico-estéticos(visão), portanto. Poder-se-á argumentar que a contemporaneidade alterou esta realidade e que a chamada fotografia/arte contemporânea teria introduzido e até tornado quase única uma terceira componente na “qualidade” da fotografia: o pensamento, muitas vezes designado como conceito. As transformações tecnológicas, sociais, culturais e artísticas do final do século XX teriam tornado o pensamento a componente mais importante de uma fotografia que pretende assumir uma intervenção artística contemporânea. Será verdade? Observa-se facilmente que na maioria dos casos tal facto não é nada evidente. Na realidade, muita da chamada fotografia contemporânea, paradoxalmente, parece valorizar pouco a reflexão ou o pensamento, oferecendo-se-nos, ora sem quaisquer critérios, ora, surpreendentemente, novamente a sobrevalorizar critérios técnicos, ainda que sob novas roupagens. Será esta a razão por que a técnica e a visão continuam no presente a ser os alicerces fundamentais da formação académica em fotografia?

© Renato Roque, 2014

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