O QUE VAI SER QUANDO CRESCER? PROJETOS DE VIDA DE JOVENS TRABALHADORES

May 31, 2017 | Autor: M. Castelo Branco | Categoria: Young People, Políticas Públicas, Juventud, Formación profesional, Project in Life, Proyecto De Vida
Share Embed


Descrição do Produto

Local: João Pessoa, Paraíba
Data: 16/03/2016
Autores:
Manuella Castelo Branco Pessoa
Doutoranda em Psicologia Social na Universidade Federal da Paraíba,
pesquisadora convidada no Instituto de Iberoamérica de la Universidad de
Salamanca (Espanha); Pesquisadora no Núcleo de Pesquisa e Estudos sobre o
Desenvolvimento da Infância, Adolescência e Juventude (Nupedia); Membro da
Red Iberoamericana para la Docencia e Investigación;
[email protected]; Cidade Universitária - Campus I, Castelo
Branco, 58000000 - João Pessoa, Paraíba, Brasil; (83) 32167337

Maria de Fatima Pereira Alberto
Professora na Universidade Federal da Paraíba, no Programa de Pós-Graduação
em Psicologia Social (Mestrado e Doutorado); Coordenadora do Núcleo de
Pesquisa e Estudos sobre o Desenvolvimento da Infância, Adolescência e
Juventude (Nupedia); Membro da Red Iberoamericana para la Docencia e
Investigación en Derechos de la Infancia (REDidi); [email protected];
Cidade Universitária - Campus I, Castelo Branco, 58000000 - João Pessoa,
Paraíba, Brasil; (83) 32167337

Tâmara Ramalho de Souza Amorim
Doutoranda em Psicologia Social na Universidade Federal da Paraíba,
Pesquisadora no Núcleo de Pesquisa e Estudos sobre o Desenvolvimento da
Infância, Adolescência e Juventude (Nupedia). [email protected]; Cidade
Universitária - Campus I, Castelo Branco, 58000000 - João Pessoa, Paraíba,
Brasil; (83) 32167337

Fernanda Moreira Leite
Psicóloga Escolar da Rede de Escolas Municipal de João Pessoa; Pesquisadora
no Núcleo de Pesquisa e Estudos sobre o Desenvolvimento da Infância,
Adolescência e Juventude (Nupedia). [email protected]; Cidade
Universitária - Campus I, Castelo Branco, 58000000 - João Pessoa, Paraíba,
Brasil; (83) 32167337

Sumário:
Resumo......................................................................
............................................................................
..................01
Introdução..................................................................
............................................................................
..................01
Juventude, políticas públicas de formação para o trabalho: qual a relação?
...........................................................02
Projeto Integrado de Aprendizagem
Profissional................................................................
.....................................03
Método......................................................................
............................................................................
....................03
Resultados..................................................................
............................................................................
...................04
Discussão...................................................................
............................................................................
...................07
Considerações
Finais......................................................................
...........................................................................0
8
Referências.................................................................
............................................................................
..................09

O QUE VAI SER QUANDO CRESCER? PROJETOS DE VIDA DE JOVENS TRABALHADORES

Resumo
Este artigo tem como objetivo analisar os projetos de vida oportunizados
por uma experiência de profissionalização de jovens egressos de políticas
sociais. A pesquisa foi realizada em duas etapas: (1) história de vida
tópica dos jovens, realizada de forma individual; (2) realização do grupo
de discussão, analisado através da organização dos relatos e observações,
sendo relacionados elementos de ordem singular e coletiva das vivências que
ali emergiram. Dez jovens participaram da primeira etapa da pesquisa; e
quatro desses aceitaram participar do grupo de discussão. Emergiram
discursos sobre o que significa ter passado por outras políticas sociais;
como foi ter ocupado outros lugares que não imaginavam, como a Universidade
e o SENAI; e ainda como essas experiências contribuíram para a construção
dos projetos de vida desses jovens. Foi possível verificar que, a partir de
suas inserções concretas, esses jovens foram modificando seus projetos de
vida, mostrando que ressignificaram também vivências anteriores, em outros
espaços. Apesar dos pontos positivos indicados por esses jovens em relação
à formação profissional recebida, ainda se percebe em suas falas a presença
de um discurso de individualização do processo de formação, assumindo que a
oportunidade não é para todos, porém atribuem a si toda a responsabilidade
pelo sucesso ou fracasso.
Palavras-chave: juventude, formação profissional, políticas sociais,
projeto de vida.

Introdução
O presente artigo tem como objetivo analisar os projetos de vida
oportunizados por uma experiência de profissionalização de jovens egressos
de políticas sociais. As políticas sociais têm sido utilizadas como
ferramentas de garantia de direitos do cidadão, e as políticas públicas
como uma ferramenta para enfrentar um dado problema (Santos, Oliveira,
Paiva & Yamamoto, 2012), no caso deste artigo, a formação e inserção
profissional de jovens. Como exemplo, tem-se o próprio discurso de posse da
Presidente da República Federativa do Brasil em 2015, versando sobre
aumento do investimento público na formação profissionalizante de jovens
(Câmara dos Deputados, 2015). Além disso, atenta-se para a legislação
brasileira, com a mudança na Constituição Federal assegurando também ao
jovem seus direitos (Art. 227), dentre eles o de profissionalização; e
ainda através da criação do Estatuto da Juventude (Lei n° 12.852/2013),
garantindo acesso à profissionalização, cultura, lazer, entre outros
direitos.
O que vem sendo revelado, a partir da literatura, é que os jovens dão
sentido ao trabalho, à formação e ao futuro com base em suas vivências. Em
pesquisa realizada por Macêdo, Alberto e Araújo (2012) com jovens
participantes do Programa Jovem Aprendiz (PJA), realizado pelo SENAC,
quando perguntados sobre o que esperavam ser no futuro, foi perceptível o
desejo dos jovens entrevistados em ascender socioeconomicamente e de
conseguir uma melhor inserção no mercado de trabalho do que seus pais.
Nesse sentido, questiona-se: O que esse tipo de experiência (o ingresso em
política de formação profissional) representa para esses jovens? A política
pública de formação de jovens para o mercado reproduz a cultura vigente de
formação de jovens pobres para o trabalho? Possibilitará a construção de
projeto de vida a partir da experiência profissional ofertada?
Os jovens modificam e/ou ressignificam seus planos e projetos de futuro
a partir da inserção no trabalho em detrimento da continuidade dos estudos,
havendo uma ausência de sentido imediato para a escola (Mancebo & Maia,
2010). Em estudo comparativo entre jovens universitários e jovens moradores
de favelas, Ramos, Seidl-de-Moura e Pessôa (2013) identificaram também que
os modos de planejar o futuro tendem a variar em função das limitações e
possibilidades presentes para jovens desses diferentes contextos. Assim, os
projetos de vida se encontram ligados às condições e possibilidades de uma
pessoa, lidando com o paradoxo do desconhecido e também com certa
previsibilidade quando se pensa sobre as suas condições de vida (D'Avila,
Krawulski, Veriguine & Soares, 2011).
Dessa forma, percebe-se que para se analisar projetos de vida é
necessário levar em conta as vivências desses jovens e também o contexto em
que estão expostos. Vigotski (2006) considera o homem um ser social,
entendendo que as condições socioculturais o transformam profundamente,
provocando assim seu desenvolvimento. Considerando-se juventude uma
categoria histórica e constituída socialmente, assume-se que seu
desenvolvimento também é perpassado pelo contexto, assim como sua
trajetória de vida e seus projetos de vida. Diante disso, considera-se
relevante para efeito deste artigo a compreensão das categorias teóricas
vivência e projeto de vida, entrelaçadas com a questão da juventude.
O interesse por algo, segundo Vigotski (2006), surge quando se
desenvolvem as atrações; a partir daí as relações com o meio também se
modificam. Esse interesse pode levar, segundo o autor, ao projeto de vida,
que seria a força que move o desenvolvimento durante a juventude. Esses
projetos são adquiridos, desenvolvem-se, sendo considerados como um
processo vital, enraizados nas bases orgânicas e da personalidade,
articulados com a realidade.
Uma das vias que possibilita essa construção de projetos de vida é a
forma como cada sujeito vivencia sua realidade. No decorrer da ontogênese
(Vigotski, 2006), a vivência adquire um papel de articuladora entre o
núcleo interno (processos mentais singulares) e externo (percepções de
objetos), contemplando, dessa forma, todo tipo de conteúdo mental. Assim, a
vivência se dá como uma apreensão do real, de forma fluida, tendo como
função fazer uma inter-relação entre os aspectos cognitivos e afetivos,
influenciando o desenvolvimento em seus diversos aspectos.
Essa dimensão dialética da vivência possibilita o desenvolvimento como
algo com períodos estáveis e críticos, que se dá a partir de certas
condições materiais, e de como se vivenciam tais acontecimentos (Vigotski,
2006). Acontecimentos que são diferentes em cada etapa da vida, cada uma
com uma força motriz. No caso da juventude o estabelecimento de interesses
é a força motriz dessa etapa que se materializa em projetos de vida. Como
retratam Maia e Mancebo (2010) o projeto de vida não é único, vai sendo
formado por variados projetos, que são alterados a partir das
possibilidades e oportunidades ao sujeito apresentadas. É, pois, resultado
das práticas sociais, da relação dialética entre a história de constituição
da psique do sujeito e a experiência atual deste.

Juventude, políticas públicas de formação para o trabalho: qual a relação?
A juventude é assumida no presente texto enquanto uma condição social,
transcendendo as questões físicas, biológicas e etárias. Tal categoria tem
sido historicamente marcada como uma fase de instabilidade associada a
problemas sociais (Tommasi, 2014; Sposito, 2011). Isso suscita a
necessidade de se conceber que as juventudes são construídas através das
relações sociais, e influenciadas pelo momento histórico e cultural,
afetadas pelas questões concretas do contexto social. Uma das questões que
afetam a juventude diz respeito ao desemprego e qualificação profissional
(Dalarosa & Souza, 2014).
O Relatório de Tendências Mundiais de Emprego (OIT, 2014), mostra que
13,1% da população juvenil mundial, com idade entre 15 e 24 anos, não
possuem emprego formal. No Brasil (IBGE, 2013), os jovens de 15 a 24 anos
representam 16,6% da população total; e entre os ocupados, tem-se que: 2,4%
são jovens com idade entre 15 e 17 anos, 3,5% tem de 18 a 19 anos e 10,9%
estão entre 20 e 24 anos. Segundo o MTE (2011), a juventude brasileira
tenta aliar trabalho e estudo, sendo necessário levar em conta a
heterogeneidade das experiências juvenis de escolarização e trabalho no
Brasil. Paradoxalmente, como aponta Pochmann (2013), o aumento do nível
escolar não traz a garantia de inserção profissional, pois esses jovens se
deparam com um contexto de baixo investimento e precarização do mercado de
trabalho.
Diante de tal problematização, que juventude é essa que se situa no
presente texto? São jovens pobres, com idades de 14 a 24 anos, com uma
trajetória de inserção em diversas políticas sociais, como por exemplo:
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil1[i] (PETI), PJA [ii], entre
outras.
O Brasil apresenta marcas históricas do elitismo, autoritarismo e
exclusão, como afirmam Santos, Oliveira, Paiva e Yamamoto (2012). Essas
marcas se veem presentes no cotidiano das camadas mais vulneráveis, que se
encontram em um cenário no qual a desigualdade social é acentuada, como por
exemplo, os jovens pobres. Tal histórico interferiu diretamente no
estabelecimento de políticas voltadas a esse público. O início do
investimento em escolas profissionalizantes por parte do Estado brasileiro
data de meados de 1930, mas é só no final dos anos 1990 que os programas de
qualificação começaram a ser reformulados, através dos Programas de Geração
de Empregos e Formação Profissional (Máximo, 2012). Também foi lançado, a
partir daí o termo risco social e passa-se a pensar políticas de juventude
como uma forma de problema social a ser combatido. Assim, a própria
condição juvenil se apresenta mais uma vez como um elemento problemático em
si (Tommasi, 2014).
São criadas, então, políticas que funcionam, em grande parte, numa
perspectiva assistencialista, que reafirmam a ideia da formação
profissional atrelada ao disciplinamento e comportamento (Dalaroza & Souza,
2014), trazendo um caráter de prestação de favores ao invés de garantia de
direitos (Máximo, 2012). Essas políticas também desenham, formam e
instituem os modos de viver de jovens pobres na contemporaneidade. Dessa
forma, os programas sofrem os efeitos das ideias de juventude elaboradas
pela sociedade, e ao mesmo tempo provocam efeitos nas imagens e concepções
que a sociedade constrói desses jovens (Sposito, 2011).
Apesar de estarem longe do ideal, essas políticas se mostram
necessárias, pois possibilitam o acesso à formação, sendo vistas pelos
jovens como uma oportunidade, uma forma de superar a situação em que viviam
e ainda de construir novos projetos de vida. Porém, mostram-se
insuficientes ainda, pois carecem de continuidade e articulação (Santos,
Oliveira, Paiva & Yamamoto, 2012).

Projeto Integrado de Aprendizagem Profissional
Na tentativa de oportunizar a formação profissional de jovens ex-
educandos do PETI através do PJA, foi criado o Projeto Integrado de
Aprendizagem Profissional. Resultados encontrados em pesquisas a respeito
do PJA (Máximo, 2012; Macêdo & Alberto, 2012) mostraram que eram
necessários alguns pré-requisitos para conseguir se inserir no referido
programa, como por exemplo, a escolarização. Percebeu-se que muitos jovens
ficavam de fora, entre eles os educandos egressos do PETI, que muitas vezes
não alcançavam o grau de escolaridade exigido pelo PJA.
Então, numa articulação envolvendo o Fórum Estadual de Prevenção e
Erradicação do Trabalho Infantil (FEPETI), Superintendência Regional do
Trabalho e Emprego (SRTE), Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP),
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), Coordenadoria da
Infância e Juventude (COINJU) e Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
construiu-se o Projeto Integrado de Aprendizagem Profissional. Este foi
dividido em etapas: A primeira foi o levantamento do número de educandos do
PETI que estavam sendo desligados do programa por conta da faixa etária
(para viabilização do transporte e cursos) - essa etapa teve como
responsável a coordenação do PETI. A segunda etapa foi a composição de
turmas para os cursos de português e matemática, realizados na UFPB e tinha
como objetivo preparar para a seleção do programa de profissionalização,
teve como responsável PMJP, PETI e UFPB. A terceira foi a formação
profissionalizante e inserção na prática na empresa - essa etapa teve como
responsável o SENAI.
Dessa forma, o presente artigo se propõe a analisar os projetos de vida
oportunizados por essa experiência de profissionalização vivenciada pelos
jovens egressos dessas políticas sociais. No momento da pesquisa[iii] que
originou o presente artigo, o Projeto Integrado já havia finalizado sua
segunda turma de jovens. Este contou com dois cursos profissionalizantes:
costura industrial e auxiliar administrativo.

Método
Participantes
Dez jovens participaram da primeira etapa da pesquisa, entre esses,
quatro jovens aceitaram participar do grupo de discussão: Bianca (18 anos),
Mateus (19 anos), Duarte (19 anos) e Eu Sei (19 anos). Vale salientar que
todos os jovens que participaram da primeira etapa da pesquisa foram
contatados, porém apenas quatro deles puderam participar desse segundo
momento. As justificativas se deram, por parte de uns no sentido da falta
de tempo por conta do atual emprego.
Procedimentos
Foram cumpridos todos os preceitos éticos pertinentes à pesquisa com
humanos, conforme à época da pesquisa (Resolução 196/96). O contato inicial
foi realizado com o SENAI, onde foi possível acessar os números telefônicos
dos jovens, com os quais se fez o contato e agendaram-se as entrevistas. A
primeira etapa da pesquisa, referente à escuta da história de vida dos
jovens, foi realizada de forma individual. Já na segunda etapa, em que foi
realizado o grupo de discussão, solicitou-se a participação de um
pesquisador colaborador para auxiliar na execução do grupo.
O intervalo de tempo entre a aplicação de uma técnica e outra foi de
seis meses. As histórias de vida foram escutadas nas casas dos jovens e
também em seus locais de trabalho. O grupo de discussão aconteceu na UFPB,
pois se caracterizou como um espaço de fácil acesso a todos, dispondo ainda
de uma sala para sua realização. Na execução do grupo, cada um dos
participantes sorteava o tema que seria discutido; quando a discussão sobre
o tema sorteado se esgotava, realizava-se o sorteio de um novo tema. Os
temas abordados foram: a contribuição do Projeto Integrado para o futuro;
relação com a escola e com o SENAI; oportunidade; escolha do curso; o que é
estar na UFPB; o que é ser menino (a) do PETI.
Vale salientar que, no ato das entrevistas, foi perguntado aos
participantes como eles gostariam de ser chamados na pesquisa. Alguns
escolheram nomes fictícios, justificaram como sendo a escolha de nome que
dariam para um filho e outros preferiram utilizar os nomes reais.
Instrumentos e Ferramentas
Foram adotadas duas ferramentas de coleta de dados: a história de vida
tópica e o grupo de discussão, a primeira com foco individual e a segunda
com foco coletivo, utilizando-as como complementares. A história de vida
tópica enfatiza determinada situação ou etapa da vida do entrevistado
(Minayo, 2010). A pergunta geradora utilizada foi: "Conte-me o que
aconteceu com sua vida a partir da sua entrada no PETI até hoje".
O grupo de discussão enquanto método de pesquisa começou a ser
utilizado a partir da década de 1980, principalmente nas pesquisas sobre
juventude (Weller, 2006). A interação nos grupos de discussão constitui uma
importante experiência, cenas e fatos são mencionados emergindo
significados semelhantes e/ou diferentes, constituindo um mosaico pelas
combinações das histórias (Freitas, Souza & Kramer, 2007). No caso deste
artigo, as questões discutidas no grupo emergiram das histórias de vida
desses jovens, acessadas no primeiro momento da pesquisa, com a finalidade
de verificar de que forma o que emergiu individualmente através da história
de vida foi contemplado enquanto vivência coletiva.
Análise de Dados
Para analisar os elementos que emergiram nas histórias de vida
individuais e no grupo seguiram-se os seguintes passos: transcrição da
gravação; leitura de material; organização de relatos e observações; e, por
último, a análise final com as inferências e interpretações da
pesquisadora, relacionando-se elementos de singularidades e coletividades
das vivências que ali surgiram.
Foram levados em conta elementos expressos nas entrevistas individuais
e que voltaram a surgir na coletividade, identificando algumas diferenças,
mudanças de opinião, novas experiências e formas de vivenciar os
acontecimentos (Dejours, 1997). Além disso, foi percebido o processo
reflexivo que foi evidenciado na discussão realizada em um grupo. As falas
dos jovens participantes fizeram a composição do texto apresentando pontos
de divergências, similaridades e singularidades. Os temas discutidos no
grupo foram abordados em forma de subtítulos, respeitando a ordem do
sorteio.

Resultados
Quem são esses jovens?
Mateus tinha 19 anos na época da pesquisa, definiu-se como negro, tinha
como escolaridade o Ensino Médio completo e morava em um bairro de João
Pessoa cujo IDH[1] era de -0,59[iv]. Na época da pesquisa estava
trabalhando na empresa onde realizou a parte prática do Projeto Integrado e
era um dos contribuintes para a renda total de sua família.
Duarte tinha 19 anos durante a pesquisa, definiu-se como negro, tinha
como escolaridade o Ensino Médio completo e morava em um bairro de João
Pessoa cujo IDH é de 0,04. Participou dos dois cursos de profissionalização
oferecidos pelo SENAI: o de costura industrial e de auxiliar
administrativo. Porém, na entrevista e no grupo ele usou como referência o
curso de auxiliar administrativo. No momento da pesquisa ele se encontrava
trabalhando efetivamente na empresa onde fez o estágio de auxiliar
administrativo, numa indústria na área de produção de alimentos.
Bianca tinha 18 anos, definiu-se como parda, tinha como escolaridade o
Ensino Médio completo e morava em um bairro de João Pessoa cujo IDH é de
0,04. Ela fez o curso de auxiliar administrativo e estagiou na área da
construção civil. Na época da pesquisa Bianca se encontrava inserida em
outro PJA, ou seja, participando pela segunda vez do Programa.
No momento da pesquisa Eu sei tinha 18 anos, definiu-se como branco,
tinha como escolaridade o Ensino Médio completo e morava em um bairro de
João Pessoa cujo IDH é de -0,36. Ele fez o curso de auxiliar administrativo
e estagiou em uma empresa de engenharia. Através do Projeto Integrado, Eu
Sei conseguiu se inserir no mercado de trabalho e no momento da pesquisa se
encontrava trabalhando em uma das secretarias municipais, exercendo uma
função administrativa.

Lugares ocupados: os caminhos traçados
O contar de suas histórias de vida deu acesso a uma parte das
trajetórias vividas por esses jovens. Através disso, foi possível perceber
que os lugares que ocuparam deixaram marcas nesses jovens, que os fizeram
reagir aos acontecimentos em suas vidas a partir dessas marcas e das
relações que foram estabelecidas. Emergiu na fala deles: o PETI, a
universidade e o SENAI.
Ser menino e menina PETI
Um dos achados nas entrevistas individuais diz respeito à imagem que se
faz a respeito dos meninos e meninas que fazem parte do PETI. Essa é uma
questão que perpassou quase todas as entrevistas, trazendo dois sentidos: o
de que meninos e meninas que participaram do PETI dificilmente ocupariam os
espaços pelos quais eles passaram; bem como o sentido de que "apesar de
serem do PETI", no PJA não foram tratados com diferencial.
Considerando-se esse achado da entrevista individual, a pergunta foi
direcionada ao grupo, e ao ser lida para o grupo gerou inquietações em
todos, porém alguns se mostraram mais envolvidos devido à sua vivência no
espaço do PETI e às experiências que passaram naquele período. Assim, de
forma geral, os jovens concordaram e trouxeram em suas falas o
posicionamento de que a sociedade tem uma visão negativa a respeito dos
meninos e meninas que participam do PETI.
Em relação à visão negativa, é muito forte a questão das drogas. Eles
chamam a atenção para essa forma de ver os educandos do PETI como possíveis
usuários de drogas, afirmando que esta é uma forma equivocada de visualizar
o programa e defendendo que este, muitas vezes, é que consegue retirá-los
da situação de risco.
ES: "Que um monte de gente que entra no PETI acha que vai sair de lá
drogado, vendendo maconha, só que é ao contrário. O programa lá ajuda a
evitar isso." (Eu Sei, sexo masculino, 18 anos).
D: "Hoje mesmo, era pra mim ta no mundo das drogas, não vou mentir. Mas
com o incentivo da professora, a professora chegava, não só como uma
professora minha, mas como uma amiga minha mesmo. Me apoiava... Ela faz
isso por todo mundo, ela não comenta. Mas comigo ela chega e comenta:
Hoje eu me sinto orgulhosa por você, eu me sinto feliz porque eu não
pude salvar muita gente, mas você... A gente conta nos dedos a vida que
a gente conseguiu salvar. A gente chegava sentava, aconselhava, eu
chorava, chorei nos braços dela. Todo mundo critica, mas eu não..."
(Duarte, sexo masculino, 19 anos).
Diante de tantas negações e visões estigmatizantes, os jovens chamam
atenção para o tratamento que receberam em todas as etapas do PJA; alguns
destacaram que no SENAI se sentiram acolhidos, sentiram-se tratados como os
outros alunos aprendizes que entraram no processo por meio da seleção
direta.
O estar na universidade
Nas entrevistas individuais os jovens trouxeram elementos de como
interpretaram essa rápida passagem pela UFPB durante o Projeto Integrado.
Ter contato com a diversidade universitária proporcionou vivências a
respeito de como funciona a universidade e possibilitou ainda engajar-se em
projetos promovidos pela universidade.
D: "Primeiro na UFPB a gente tem a visão de vários... De tudo que você
pode querer ser. Estar aqui já era, tipo assim... Poxa, daqui eu posso
sair, eu vou poder escolher, entendeu, pra onde eu quero ir..."
(Duarte, sexo masculino, 19 anos).
Um deles faz uma analogia se referindo a UFPB como um carro caro, que
todos querem, mas poucos podem possuir. Nesse caso, para ele, os poucos são
aqueles que têm melhores condições financeiras, que têm a oportunidade de
estudar e acessar espaços que não são reservados para todos.
ES: "Você começa a ficar curioso né... É porque assim, antes você diz
assim UFPB, o cara pensa que UFPB é até um carro caro, que você não
pode ter, sabe? Que ninguém vai ter a oportunidade de ter, universidade
é coisa pra quem, sabe, que tem dinheiro. Não é todo mundo que pode
ter, a gente não tem a capacidade de... E até, nas escolas a gente
escuta assim, como a gente já tinha falado." (Eu Sei, sexo masculino,
18 anos).
D: "É a visão de quem ta lá fora: se eu tivesse isso aí. É o caso... e
eu tivesse na UFPB... Tava feito na vida..." (Duarte, sexo masculino,
19 anos).
Para eles a etapa realizada na universidade vem como uma grande
possibilitadora de conhecimento. Diferente da escola e mais parecida com o
SENAI, é possível aprender com os colegas e em conjunto com o professor.
O ser aluno SENAI
Outra regularidade que emerge a partir das falas dos jovens nas
entrevistas individuais é a ideia de ser um aluno SENAI. Essa questão
emerge enquanto um status de reconhecimento para os familiares desses
jovens e bairros em que vivem, mas também na hora de procurar um emprego e
se inserir no mercado de trabalho.
O grupo, de forma unânime, posiciona-se no sentido de que ser um aluno
SENAI é ser um trabalhador diferenciado, por conta da formação recebida por
eles. Além disso, gera curiosidade nos conhecidos que não conseguiram
entrar no SENAI, narrando que frequentemente são perguntados a respeito da
formação que lá receberam e que chegam até a dar dicas de como se comportar
em algumas ocasiões.
B: "Você tem a oportunidade né, de estar... Você fica dizendo: não,
queria tanto aprender isso, como será? Minha tia mesmo falou: Não,
Bianca, como é? Consegui uma entrevista de emprego. Aí me pergunta:
Como eu devo agir? Como eu devo me impor. O que eu devo falar, o que eu
não devo falar? Eu sento se mandar ou só sento se eu quiser ou se
mandarem? E pequenas coisas. Aprende que a gente dá..." (Bianca, sexo
feminino, 18 anos).
Mais uma vez a mudança no comportamento perpassa as questões colocadas
a priori. A adultização e mudança de comportamento foram demandas
aparentemente aceitas pelos jovens que participaram do Projeto Integrado.
São mudanças no cotidiano que vão modificando e constituindo-os como jovens
trabalhadores.
Relação com a Escola regular e o SENAI
Os jovens entrevistados trazem um histórico de escola pública, permeado
por difíceis vivências, destacando-se em suas falas uma falta de sentido
imediato ao estar na escola. Ao referir-se à vivência no SENAI, os jovens
trazem questões de cunho mais imediatista, já que esta instituição é mais
voltada para a profissionalização, referindo-se à experiência como geradora
de perspectivas de futuro, por remeter-se a experiências mais concretas do
que a escola. Trazem ainda questões comportamentais, já que, segundo eles,
a escola ainda é um lugar de brincadeiras e bagunça, e o SENAI representa o
lugar de responsabilidade e compromisso. Ou seja, quando se remete à
escola, os jovens não visualizam sua aplicabilidade, diferentemente do
SENAI.
Outro ponto mencionado pelos jovens como divergente entre escola e
SENAI se dá em relação aos professores. Na comparação feita por eles, o
professor da escola formal aparece muitas vezes como alguém que está pouco
interessado em dar aula, e quando o faz não passa o conteúdo de forma
completa. Pelo fato de a escola não exigir uma parte prática, os
conhecimentos lá passados não aparecem enquanto tendo uma aplicabilidade
para esses jovens. A situação da escola ainda se agrava quando é colocado
em pauta o vestibular, pois os jovens entrevistados, quando questionados
pela pesquisadora, afirmam que está também não prepara sequer para o
vestibular.
ES: "No SENAI não, ou você aprende ou se tora todinho pra trabalhar
[...] na escola a gente só vê teoria, e a maioria da cobrança mesmo é
no SENAI, só que além de você ser cobrado lá, muito! Você vive ali."
(Eu Sei, sexo masculino, 18 anos).

A escolha do curso profissionalizante
Desde as entrevistas individuais, foram encontradas contradições na
fala dos jovens a respeito de como foi feita a escolha pelo curso de
formação. Eles explicaram que, na realidade, não foi exatamente uma escolha
deles, precisaram optar entre as duas possibilidades ofertadas pelo Projeto
Integrado.
Atrelado a isso, somou-se o sentimento de medo por parte desses jovens.
Como os cursos não tiveram início na mesma época (primeiro, foi realizado o
curso de costura industrial), os jovens que optaram por esse curso o
fizeram muito mais pelo receio de perder a oportunidade e também por medo
de o outro curso (auxiliar administrativo) não acontecer.
Uma terceira questão emerge em meio às justificativas dadas por eles:
julgavam o curso de costura como voltado ao público feminino. Durante as
aulas do Projeto Integrado havia uma relação de brincadeiras direcionadas
aos jovens que faziam o curso de costura, como ser chamado de alfaiate
pelos colegas.
Para eles os cursos que foram ofertados davam chances diferentes diante
do mercado de trabalho. O curso de costura, na visão dos jovens, dava menos
chance de inserção e de crescimento profissional. Diferente deste, o curso
de auxiliar administrativo se mostrava como mais oportunizador em relação à
inserção no mercado de trabalho e ao crescimento pessoal e profissional.
Um fato interessante surgiu em meio à conversa do grupo de discussão:
foi revelado que um deles tinha participado dos dois cursos. Ele tentou
explicar o que já havia sido constatado e relatado pelos companheiros de
grupo, porém trazendo a riqueza da vivência nos dois cursos:
D: "Costura é só ali aquela sempre a mesma coisa. Eu estagiei na
produção, é mormaço, quintura, tudo..." (Duarte, sexo masculino, 19
anos).
ES: "Costura só evolui pra overloque (Risos)." (Eu Sei, sexo masculino,
18 anos).
M: "É justamente o crescimento, como Duarte falou. Esse crescimento
você não consegue enxergar na costura. Na costura você vai de uma
simples pra mais avançada aí aumenta um pouquinho, mas é sempre
costura." (Mateus, sexo masculino, 19 anos).
O que emergiu individualmente se apresenta como algo coletivo,
vivenciado por outros. Assim, um deles exemplifica a questão da escolha do
curso como sendo um dos caminhos que lhes foram ofertados. Em uma escolha,
segundo este jovem, faz-se a opção por caminhos que te levam a melhores
resultados a depender da concepção de cada um. Emerge em suas falas que um
dos critérios para a escolha desse caminho é o do crescimento, pois,
segundo ele, todo mundo busca crescer na vida.
ES: "É como a vida, a gente tem um monte de caminho, aí num caminho tem
uma chance de você ir pra uma ponte bem bonita, outra tem uma ponte de
madeira, outro vai atravessar em cima de uma corda, ou você tem que
nadar, qual você vai escolher? O que você acha que tem mais
crescimento! Não é desmerecendo o trabalho da costura, mas é que se
você trabalhar numa costura e crescer até pra um overloque, na
brincadeira, no caso, mas você só vai ficar naquilo. No começo da vida
ninguém quer ser pião, ninguém quer, você pode até passar como pião,
mas você não quer ficar. Ninguém que ficar como pião." (Eu Sei, sexo
masculino, 19 anos).

Vislumbrando o futuro a partir do projeto integrado
Para os jovens participantes da pesquisa, o Projeto Integrado se
constitui em dois momentos: o curso preparatório de português e matemática,
realizado na UFPB (no qual a contribuição pedagógica do Projeto é no
sentido do reforço) e na formação teórico-prática, que inclui a formação
teórica oferecida pelo SENAI e a prática realizada na Empresa (no qual o
aprendizado do ofício proporcionado pelo curso profissionalizante é a
contribuição). Esses dois momentos, a partir das condições que lhes foram
dadas, proporcionaram a construção de projetos de vida.
Outro ponto interessante é ver que antes do Projeto Integrado, eles
imaginavam seu futuro de uma forma, e fica nítido na fala desses jovens que
a imagem que tinham do seu futuro foi modificada a partir dessa inserção. O
que se encontrou foram três momentos de projetos de vida: o antes do
projeto, durante o projeto e depois do Projeto Integrado.
As falas que se referem ao antes do Projeto Integrado trazem vivências
sofridas de jovens que precisavam trabalhar para conseguir se manter e para
isso se agarravam a qualquer possibilidade que aparecesse. Além disso,
havia também uma tendência muito forte a seguirem as mesmas profissões que
os pais. Como exemplo, as falas que se referem a antes da entrada no
Projeto Integrado:
M: "Então eu trabalhando nesse lava jato eu tava só trabalhando e
trabalhando, chegava em casa cansado, tarde da noite, pegava 7 da
manhã, cansado, eu tava desestimulado até mesmo aos estudos. Então, eu
tava desestimulado aos estudos, não tava nem com a intenção de fazer
vestibular de novo, após eu voltar aos estudos no Senai, eu tive uma
visão diferente..." (Mateus, sexo masculino, 19 anos).
D: "O único caminho que eu via era trabalhar assim como meu pai,
comerciante, na feira, vendendo fruta, e através desse projeto já abriu
novas janelas." (Duarte, sexo masculino, 19 anos).
B: "Eu não sei, a minha tia inscreveu eu e minha prima, aí depois de
três meses aí a gente começou." (Bianca, sexo feminino, 18 anos).
ES: "Quando saí do Peti, não tinha o que fazer, tava só esperando dar a
idade pra trabalhar, no que aparecesse. Porque olha, você foi guiado
até aquele momento, quando não estão mais te guiando você procura se
guiar, mas só que nem todo mundo mora em bairro bom, em canto bom, a
maioria né... A pessoa vê droga, vê aquilo ali, puxando pra aquilo
ali." (Eu Sei, sexo masculino, 18 anos).
Com a entrada no Projeto Integrado é perceptível uma mudança nas falas
dos jovens. A inserção em algo concreto, que mostrou possibilidades
concretas, as relações que lá construíram, a história de vida de cada um
até ali, trouxe uma ressignificação. Seguem as falas referentes à vivência
durante o projeto:
M: "E agora eu comecei não quero mais parar, então eu to procurando
abrangir meus conhecimentos e quanto terminar esse curso eu pretendo
fazer um preparatório pro vestibular..." (Mateus, sexo masculino, 18
anos).
D: "Eu quero fazer a carreira de administração e aumentar de emprego."
(Duarte, sexo masculino, 19 anos).
B: "É me formar, seguir minha carreira de advogada, ser uma boa
profissional, ser independente, ter minha própria casa..." (Bianca,
sexo feminino, 18 anos).
ES: "Eu quero fazer administração pra ganhar dinheiro e fazer música
como um hobby..." (Eu Sei, sexo masculino, 18 anos).
Os participantes que revelaram mudanças no projeto de vida nesses seis
meses de intervalo apresentaram algumas similaridades, dentre elas, a
justificativa de que outras oportunidades foram surgindo a partir dessas
suas inserções e vivências como jovens trabalhadores. As necessidades do
dia a dia mostraram para eles outras demandas profissionais, além das
financeiras.
M: "Eu tava pensando em administração, só que disseram que dá pouco
dinheiro... Você também tem que procurar o conhecimento por que através
do seu conhecimento você vai adquirir evolução, aí então eu acho que eu
pensava em administração, e desisti também." (Mateus, sexo masculino,
19 anos).
B: "Pelo fato de eu tá trabalhando em obra, eu me interessei muito por
fazer engenharia ou técnica em edificação, aí eu to vendo melhor ,
porque direito,eu não tenho nada contra ,vou dizendo logo,minha vontade
era de fazer direito." (Bianca, sexo feminino, 18 anos).
ES: "Aí eu fiz um curso, na área de direito, aí meu professor: "vai Eu
Sei , vai Eu Sei, direito, direito". Aí agora eu tô investindo nessa
área, na área de música." (Eu Sei, sexo masculino, 18 anos).
Já o participante que permaneceu com o projeto de vida similar ao que
foi dito na entrevista individual o justifica também pela oportunidade de
fazer a graduação na área e crescimento na própria empresa. Segue a
comparação das falas nos dois momentos:
Pesquisadora: Parece que só Duarte quer continuar na administração.
D: "É sim, continuo, ano que vem já vou começar a fazer a graduação.
Vou começar já ano que vem, aí a empresa vai conciliar, vai pagar pra
mim." (Duarte, sexo masculino, 19 anos).
Após essas falas, o próprio grupo começou a refletir sobre o que haviam
falado, e foram percebendo os porquês dessas mudanças e da continuidade no
caso de um deles: M: "Eu acho que essas mudanças de intencionalmente, que a
gente teve, eu acho que é a realidade que a gente tá vendo da real
possibilidade de você se encaixar numa oportunidade melhor né." (Mateus,
sexo masculino, 19 anos). Ou seja, o momento da discussão em grupo também
possibilitou que esses jovens elaborassem suas vivências e também a forma
como foram construindo seus projetos de vida.

Discussão
Diante dos resultados expostos, pode-se verificar que a inserção em
espaços diferenciados gera modificação nos projetos de vida dos jovens,
pois as condições concretas vão influenciando o caminho que eles escolhem
para seguir, mostrando também a heterogeneidade e pluralidade das
experiências desses jovens (Tommasi, 2014; Maia & Mancebo, 2010). O SENAI é
mencionado por eles como referência, onde aprenderam sobre
responsabilidade, e que os fazia sentir estimulados a buscar, pois a
prática na empresa exigia ainda mais deles.
Em contrapartida, trazem a escola como um lugar que não atende às
necessidades dos jovens, diferente do curso profissionalizante que traz
algo concreto. Isso é corroborado por Dalaroza e Souza (2014) e também
discutido por Porchmann (2013), problematizando que a escola vem ocupando a
função de transmissora de conhecimentos fragmentados, formando de maneira
aligeirada, fomentando o processo de exclusão.
As falas dos jovens revelam que, semelhante ao defendido por Vigotski
(2006), o PJA e a experiência no SENAI proporcionaram uma atração pela
prática ali ofertada e realizada por eles, de forma que tal atração
proporcionou a construção de projetos de vida naquele sentido, ou seja, a
partir da colaboração das condições concretas, foi possível construir
projetos de vida. Como é possível visualizar nas falas desses jovens, a
escola é vista como algo que é obrigatório, mas que não traz uma
aproximação das suas realidades, muito menos mostra possibilidades de um
futuro melhor a partir dos estudos.
Como afirma Vigotski (2006), o interesse por algo surge quando se
desenvolve as atrações; a partir daí as relações com o meio também se
modificam. A relação com os estudos foi modificada a partir da etapa do
curso vivenciada na universidade, mesmo não sendo como universitários. As
falas dos jovens revelam que faz parte dos projetos de vida de todos voltar
a estudar, mas agora fazendo um curso de graduação.
Eles ressignificam os estudos a partir da possibilidade de entrada na
universidade e do que isso pode significar em suas vidas. Se por um lado
percebe-se em suas falas que a universidade está distante da população, por
outro, a partir da inserção no Projeto há uma modificação em suas
vivências: a possibilidade de inserção na universidade passa a ser
cogitada, confirmando o que é dito por Ramos, Seidl-de-Moura e Pessôa
(2013) e por D'Avila, et al. (2011) sobre os planos para o futuro variarem
de acordo com as possibilidades dos contextos.
Projetos de vida foram construídos a partir de suas vivências em todas
as etapas do Projeto Integrado. Nas etapas vivenciadas na UFPB e no SENAI,
modificam-se as ideias acerca dos estudos, e ao se inserirem na empresa,
passam a pensar na possibilidade de seguir uma carreira naquele sentido, e
ainda é reforçada a ideia de que precisam voltar a estudar, como uma forma
de ascender em seus atuais empregos.
Observa-se também mudança nos projetos de vida a partir do momento em
que são contratados como trabalhadores efetivos e passam a ter vivências
como tal. Começam a se familiarizar melhor com suas funções no trabalho e a
partir daí traçam, em sua maioria, novos projetos de futuro: fazer uma
graduação, mudança de cargo, entre outros. Estes são reformulados a partir
das oportunidades dadas pelas empresas e a prática cotidiana de
funcionário.
Tais mudanças nos projetos de vida estão de acordo com o que é
encontrado por Maia e Mancebo (2010) em seus estudos sobre
profissionalização de jovens. O projeto de vida não é único, vai sendo
formado por variados projetos, sendo alterados a partir das possibilidades
e oportunidades ao sujeito apresentadas. São as vivências, relações
estabelecidas, histórias de vida e as condições materiais que fazem com que
esses projetos de vida sejam modificados, ou não. Assim, de acordo com o
que se vislumbra a partir das vivências desses jovens, os projetos de vida
vão desenvolvendo-se a partir das condições concretas acessadas (Vigotski,
2006).
Um paradoxo que emerge em suas falas é que há uma individualização
nesse processo, pois ao mesmo tempo em que assumem que nem todos os jovens
alcançam a oportunidade de estar num espaço de formação e inserção
profissional, atribuem a si toda a responsabilidade de conseguir acessar
esses espaços. Ou seja, a partir da vivência modifica-se a informação
interiorizada de que não conseguiriam chegar a tal espaço, porém, depois de
alcança-lo, interiorizam que agora só depende deles para tal.
Dessa forma, individualizam a questão, usam a lógica da
competitividade, na qual o indivíduo é posto como o mais importante
elemento dentro da sociedade, pensado e reproduzido desde a modernidade
(Dalarosa & Souza, 2014). Sustentam essas crenças, sentimentos, ações e
integram-se à constituição de seus projetos de vida, ou seja, individualiza-
se completamente o projeto de vida, não se dão conta que este é construído
a partir das vivências e demandas sociais (Maia & Mancebo, 2010).
Individualizando, tira a responsabilidade do Estado de garantir as
condições de educação, trabalho etc. Como apontam Santos, Oliveira, Paiva e
Yamamoto (2012), os jovens são culpabilizados e considerados responsáveis
pela situação de desemprego e precária inserção no mercado de trabalho.
Cria-se, sobretudo, a ideia de que quando aparece uma oportunidade cabe
apenas ao jovem aproveitá-la, alimentando uma tônica de que quando as
portas se abrem, deve-se procurar não fechá-las, como foi visto também por
Máximo (2012) e Macêdo e Alberto (2012). Os jovens, na maioria das vezes,
aceitam essa ideia.
Outro ponto interessante que emerge na pesquisa é o lugar que se ocupa
ao participar de políticas públicas, mostrando que, como aponta Sposito
(2011), as marcas das políticas e dos afetos pelos quais passaram ao longo
das suas vidas, marcam suas vidas e, como afirma Vigotski (2006), constroem
as suas subjetividades, influenciando assim a construção de seus projetos
de vida de acordo com essas inserções.
São histórias e situações similares, vivência de pobreza, necessidade
pessoal e familiar de inserção em um trabalho na tentativa de contribuir
financeiramente em casa, como as encontradas por Dalarosa e Souza (2014),
Tommasi (2014) e Máximo (2012). São histórias que trazem também as formas
singulares de se vivenciar certos acontecimentos, uns mais afetados, outros
menos. E é justamente a partir dessas histórias, vivências, como se pode
verificar nas falas dos jovens entrevistados, que seus projetos de vida são
construídos e modificados.

Considerações Finais
De forma geral, percebeu-se que esses jovens carregam consigo as marcas
das políticas e das relações pelas quais passaram em sua trajetória de
vida. É possível perceber também que eles se constituíram enquanto sujeitos
e construíram seus projetos de vida de acordo com essas inserções e
vivências, que também trouxeram modificações em suas escolhas e em seus
projetos de vida. A inserção no Projeto Integrado trouxe para esses jovens
elementos que são da ordem do concreto, de realizações possíveis, em
detrimento de suas vivências na escola, ou seja, eles conseguiam visualizar
o sentido e aplicabilidade, o que auxiliou na construção de seus projetos
de vida na direção dos cargos que ocuparam nas empresas. Mas, por outro
lado, percebeu-se também que eles reproduzem o discurso da individualização
desse processo, pois entendem que está no indivíduo a responsabilidade de
conseguir o sucesso, mesmo reconhecendo que nem todos os jovens possuem as
mesmas oportunidades.

Referências
Câmara dos Deputados. (2015). Íntegra do discurso de posse da presidente
Dilma Rousseff no Congresso. Recuperado de
http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/ noticias/POLITICA/480013-
INTEGRA-DO-DISCURSO-DE-POSSE-DA-PRESIDENTE-DILMA-ROUSSEFF-NO-
CONGRESSO.html
Dalarosa, A. A. & Souza, J. P. (2014). Orientações internacionais nas
políticas de educação e trabalho para a juventude no contexto
brasileiro. Conjectura: Filos. Educ., 19(2), 84-107.
Dejours (1997). O fator humano. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas.
D'Avila, G.T., Krawulski, E., Veriguine, N. R. & Soares, D. H. P. (2011).
Acesso ao ensino superior e o projeto de "ser alguém" para vestibulandos
de um cursinho popular Psicologia & Sociedade; 23 (2), 350-358
Freitas, M. T., Souza, S.J. & Kramer, S.(2007). Ciências humanas e
pesquisa: Leituras de Mikhail Bakhtin. São Paulo: Cortez
IBGE (2013) Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio. Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística.
Macêdo, O J V & Alberto, M F P (2012) O sentido da formação profissional no
contexto da aprendizagem. Estud. psicol. (Natal), 17(2), 223-232
Maia, A. A. R. M. & Mancebo, D. (2010) Juventude, trabalho e projetos de
vida: ninguém pode ficar parado Psicologia Ciência e Profissão, 30 (2).
Máximo,T. A. C. O. (2012) Significado da formação e inserção profissional
para gestores e aprendizes egressos do programa jovem aprendiz Tese
apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social da
Universidade Federal da Paraíba.
Minayo, M. C. de S. (2010). O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa
em saúde. 12ª ed. São Paulo: Hucitec.
OIT (2014) Tendencia Mundiales del Empleo:¿Hacia una recuperación sin
creación de empleos? Organización Internacional del Trabajo
Porchman, M. (2013) Juventudes na transição para a sociedade pós-
industrial. In: Macambira, J. & Andrade, F. R. B. Trabalho e formação
profissional: juventudes em transição. Fortaleza: IDT, UECE.
Ramos, D. O., Seidl-de-Moura, M. L. e Pessôa, L. F. (2013) Jovens e metas
para o futuro: Uma revisão crítica da literatura Estud. psicol.
(Natal),18(3),
Santos, L. I. C., Oliveira, A. M., Paiva, I. L. e Yamamoto, O. H. (2012)
Juventude e violência: trajetória de vida e políticas públicas. Estudos e
Pesquisas em Psicologia, 12(2), 521-538.
Sposati, A., Ramos, F., Koga, D, Conserva, M., Gambardella, A. & Silveira
Jr, J.C. (2010) Topografia social da cidade de João Pessoa, João Pessoa:
Editora Universitária da UFPB
Sposito, M. P. (2011) Breve balanço sobre a constituição de uma agenda de
políticas voltadas para os jovens no Brasil. In: Papa, F. C. & Freitas,
M. V. (Org.) Juventude em pauta: políticas públicas no Brasil. São
Paulo: Peirópolis.
Tommasi, L. (2014) Juventude, projetos sociais, empreendedorismo e
criatividade: dispositivos, artefatos e agentes para o governo da
população jovem. Passagens. Revista Internacional de História Política e
Cultura Jurídica, 6(2), 287-311.
Vygotski, L.S. (2006) Obras escogidas. Madrid: Visor.
Weller, W (2006) Grupos de discussão na pesquisa com adolescentes e jovens:
aportes teórico-metodológicos e análise de uma experiência com o método.
Educação e Pesquisa, 32(2), 241-260.

-----------------------
[1] Índice de Desenvolvimento Humano

-----------------------
[i] Programa de Erradicação do Trabalho Infantil: um dos programas mais
importantes da chamada rede de proteção social construída pelo governo
federal na década de 1990. Tenta possibilitar o acesso e a permanência de
crianças e jovens na escola e também retirá-los do trabalho precoce,
oferecendo um benefício financeiro e atividades socioeducativas em
contrapartida.
[ii] Programa Jovem Aprendiz: regulamentado através da Lei 10.097, de 19 de
dezembro de 2000, alterada a idade pelo Decreto nº 5.598, de 1º de dezembro
2005. É desenvolvido por meio de atividades técnicas e práticas sob a
orientação de entidades qualificadas em formação técnico-profissional. Os
cursos de formação têm como função fornecer ao aprendiz conhecimento
teórico e prático de um determinado ofício.
[iii] Pesquisa de mestrado, realizada no ano de 2012.
[iv] Os Índices de Desenvolvimento Humano estão baseados na Topografia da
Cidade de João Pessoa (Sposati, et al., 2010), e os seus valores são
discriminados a partir de cada bairro da cidade.
Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.