O REGIME COMPLEMENTAR DE PREVIDÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: PROGNÓSTICO DAS MUDANÇAS A PARTIR DAS ALTERAÇÕES NO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL

May 20, 2017 | Autor: Marco Cesar Carvalho | Categoria: Previdência Complementar, Direito Social, Fundos De Pensão, Regimes Previdenciários
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ISSN 2179-9148

Revista Brasileira de Direito Previdenciário Ano VI – Nº 35 Out-Nov 2016 Classificação Qualis/Capes: B1

Editores Fábio Paixão Jane Lucia W. Berwanger Melissa Folmann Walter Diab

Conselho Editorial Adriane Bramante de Castro Ladenthin – Ana Virgínia Gomes – Antônio César Bochenek Daniel Pulino – Fábio de Souza Silva – Fábio Zambitte Ibrahim – Gustavo Filipe Barbosa Garcia Ivan Mascarenhas Kertzman – José Antonio Savaris – José Ricardo Caetano Costa Laura Brito – Lucas Gonçalves da Silva – Luma Cavaleiro Scaff Marcelo Barroso Lima Brito de Campos – Marco Antônio Villatore – Marco Aurélio Serau Junior Miguel Horvath Júnior – Rodrigo Garcia Schwarz – Suzani Andrade Ferraro Teori Albino Zavascki – Wagner Balera – Wladimir Novaes Martinez Alejandro Castello (Uruguai) – Carlos Botassi (Argentina) – Carlos Daniel Luque (Argentina) Hugo Roberto Mansueti (Argentina) – Jesús Barceló Fernandez (Espanha) Jordí García (Espanha) – Jorge Cristaldo Montaner (Paraguai) José Luis Tortuero Plaza (Espanha) – Marcela I. Basterra (Argentina) María de las Nieves Cenicacelaya (Argentina)

Colaboradores deste Volume Antonio Bazilio Floriani Neto – Diego Henrique Schuster Fábio Zambitte Ibrahim – Gustavo da Gama Vital de Oliveira Marco Aurélio Serau Junior – Marco Cesar de Carvalho – Rodrigo Vaz Silva

Revista Brasileira de Direito Previdenciário Publicação bimestral da Editora Magister em parceria com o IBDP – Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário aos quais se reservam todos os direitos, sendo vedada a reprodução total ou parcial sem a citação expressa da fonte. A responsabilidade quanto aos conceitos emitidos nos artigos publicados é de seus autores. Artigos podem ser enviados para o e-mail [email protected], ou para o e-mail [email protected]. Não devolvemos os originais recebidos, publicados ou não. As íntegras dos acórdãos aqui publicadas correspondem aos seus originais, obtidos junto ao órgão competente do respectivo Tribunal. Esta publicação conta com distribuição em todo o território nacional. A editoração eletrônica foi realizada pela Editora Magister, para uma tiragem de 3.100 exemplares. Revista Brasileira de Direito Previdenciário v. 1 (fev./mar. 2011)-.– Porto Alegre: Magister, 2011Bimestral v. 35 (out./nov. 2016) ISSN 2179-9148 1. Direito Previdenciário – Periódico. 2. Direito Administrativo – Periódico. CDU 351.84(05) CDU 351(05) Ficha catalográfica: Leandro Augusto dos Santos Lima – CRB 10/1273 Capa: Apollo 13 EDITORA MAGISTER Diretores: Carlos Serra, Fábio Paixão, Nelson Colete e Ana Maria Paixão. IBDP – Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário Presidente de Honra: José Antonio Savaris; Presidente: Jane Lucia Wilhelm Berwanger; Vice-Presidente: Adriane Bramante de Castro Ladenthin; Secretária-Geral: Elenice Hass de Oliveira Pedroza; Tesoureiro: Emerson Costa Lemes. Conselheiros: Marcelo Barroso Lima Brito de Campos, Valnei Rodrigues e Aletsandra Cabral Linhares Pordeus; Conselheiros Fiscais: Edmeire Aoki Sugeta, Eugélio Luis Müller e Delzira Santos Menezes. Diretores: Diretora Científica: Melissa Folmann; Diretora de Convênios: Edmeire Aoki Sugeta; Diretora de Curso: Adriane Bramante de Castro Ladenthin; Diretor Jurídico: Leandro Murilo Pereira; Diretor de Legislação e Jurisprudência: Carlos Alberto Pereira de Castro; Diretor de TI: Emerson Costa Lemes; Diretora de Atuação Judicial e Administrativa: Gisele Lemos Kravchychyn; Diretor de Relações Institucionais: Jefferson Kravchychyn; Diretor de Relações Internacionais: Fabio de Souza Silva; Diretora de Apoio aos Associados: Ana Paula Fernandes; Diretor de Atuação Parlamentar: Daisson da Silva Portanova. Diretores Adjuntos: Diretoras de Apoio aos Associados: Elisabete de Araújo Porto e Maíra de Carvalho Pereira Mesquita; Diretores de Atuação Judicial e Administrativa: Alexandre Schumacher Triches, Noa Piatã Bassfeld Gnata e Nazário Nicolau Maia Gonçalves de Faria; Diretores Científicos: Marco Aurélio Serau Junior, Theresa Rachel Couto Correia e Diego Henrique Schuster; Diretora de Convênios a Associados: Edmeire Aoki Sugeta; Diretoras de Cursos: Viviane Masotti e Elaine Medeiros Coelho de Oliveira; Diretor Parlamentar: Valnei Rodrigues; Diretor de Relação Interinstitucional: Mauro Luciano Hauschild; Diretor de Relações Internacionais: Fabio Luiz dos Passos. Coordenadores Estaduais: Alagoas: Katia Felina de Oliveira Ferreira; Amapá: Rui Regis Cardoso Cavalcante; Amazonas: Iza Amélia de Castro Albuquerque; Bahia: Ana Izabel Jordão de Freitas Pinheiro Gomes; Ceará: Paulo Fernando Santos Bacelar; Distrito Federal: Marcelo Fernando Borsio; Espírito Santo: Valber Cruz Cereza; Goiás: Delzira Santos Menezes; Maranhão: Juliane Furtado de Almeida; Mato Grosso: Ludmila Miranda; Mato Grosso do Sul: Adalto Veronesi; Minas Gerais: Herculano José Ribeiro Junior; Pará: Liliane Francisca Costa dos Santos; Paraíba: Aletsandra Cabral Linhares Pordeus; Paraná: Leonardo Ziccarelli Rodrigues; Pernambuco: João Elizeu Leite Junior; Piauí: Alex Sandro Lial Sertão; Rio de Janeiro: Fábio Zambitte Ibrahim; Rio Grande do Norte: Arcelino Fernandes; Rio Grande do Sul: Vanessa Cenzi Farias; Rondônia: Julinda da Silva; Santa Catarina: Fabio Luiz dos Passos; São Paulo: Adriane Bramante de Castro Ladenthin; Sergipe: Arthur José Nascimento Barreto; Tocantins: Dinalva Maria Bezerra Costa. Coordenadores Adjuntos: Alagoas: Marcel Gameleria de Albuquerque Filho; Amazonas: Evanete Batista Frota; Bahia: Ivan Kertzmann; Distrito Federal: Rochele Locatelli; Goiás: Maria das Virgens Borges Marinho, Maura Campos Dominiciana, Simone Augusta Lemes de Souza e Nilzo Meotti Fornari; Maranhão: Cacilda Pereira Martins; Minas Gerais: Wânia Alice Ferreira Lima Campos; Pará: Josemi Nogueira Araújo; Paraíba: Aline Medeiros Almeida; Paraná: Mateus Ferreira Leite, Rose Kampa e Edmeire Aoki Sugeta; Pernambuco: Nubia Roberta Sobral e Gabriel Guaraná dos Santos; Rio de Janeiro: Claudinei Araujo e Zenaide Augusta Alves; Rio Grande do Norte: Rafaela Lopes de Melo Cosme; Rio Grande do Sul: Ana Raquel Grandi, Edimara Salete Salame, Eliane Patricia Boff, Emerson Rodrigues Silva, Luiza Pereira Schardosim de Barros, Maria Fátima Rambo Vogel, Maiquel Emir Becker e Renata Ramos Ferreira; Santa Catarina: Paulo Roberto Jeremias e Dilnei Marcelino Junior; São Paulo: Sandro Daniel Pierini Thomazello, João Alexandre Abreu , Audrey Liss Giorgetti e Maura Feliciano de Araújo; Sergipe: Paulo Henrique Bezerra Sarmento; Tocantins: Bruno Henrique Mastiguin Romanini.



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Sumário Doutrina 1. O Aprimoramento do Seguro de Acidentes de Trabalho por Meio da Nova Governança Fábio Zambitte Ibrahim e Antonio Bazilio Floriani Neto............................................ 5 2. A Contribuição Previdenciária do SAT/RAT e as Peculiaridades de sua Aplicação para os Órgãos da Administração Pública Gustavo da Gama Vital de Oliveira.......................................................................... 23 3. Anacronismos Jurídicos: a Interpretação Constitucional como Mecanismo de Compensação da Desarmonia Temporal entre Regras Previdenciárias Diego Henrique Schuster.......................................................................................... 40 4. O Regime Complementar de Previdência Social no Brasil: Prognóstico das Mudanças a Partir das Alterações no Regime Geral de Previdência Social Marco Cesar de Carvalho......................................................................................... 49 5. Aposentadoria Especial do Servidor Público Policial no Âmbito Federal: da Inconstitucionalidade da Aplicação da Lei nº 12.618/2012 aos Servidores com Aposentadoria Regulada pela Lei Complementar nº 51/1985 Rodrigo Vaz Silva..................................................................................................... 74 6. Seguridade Social em Tempos de Reestruturação Marco Aurélio Serau Junior...................................................................................... 83

Jurisprudência 1. Supremo Tribunal Federal – Acumulação de Proventos Antes da EC nº 20/98. Possibilidade. Direito à Segunda Aposentadoria Antes de 16.12.98 Rel. Min. Luís Roberto Barroso................................................................................. 91 2. Superior Tribunal de Justiça – Pensão por Morte. Habilitação Tardia de Dependente. Art. 76 da Lei nº 8.213/91. Efeitos Financeiros. Requerimento Administrativo. Absolutamente Incapaz. Regime Prescricional. Art. 198, I, do CC. Inaplicabilidade Rel. Min. Herman Benjamin.................................................................................. 100 3. Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais – Assistência Social. Óbito no Curso do Processo. Valores Residuais. Herdeiros. Existência de Interesse Jurídico. Questão de Ordem nº 20/ TNU. Incidente Conhecido e Parcialmente Provido Rel. Juiz Fed. Frederico Augusto Leopoldino Koehler................................................ 108

4. Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais – Aposentadoria Híbrida por Idade. Art. 48, § 3º, da Lei nº 8.213/91. Atividade Rural ou Urbana Antes do Requisito Etário ou Requerimento Administrativo. Indiferença. Idade Mínima a Ser Considerada. Cômputo do Tempo Rural Anterior à Vigência da Lei nº 8.213/91, para Fins de Carência, sem Recolhimentos. Possibilidade. Entendimento do STJ Relª Juiza Fed. Ângela Cristina Monteiro................................................................ 110 5. Tribunal Regional Federal da 1ª Região – Auxílio-Reclusão. Qualidade de Segurado. Necessidade de Caracterização da Condição de Segurado de Baixa Renda. Constitucionalidade do Art. 201, IV, da CF/88. Requisitos Preenchidos. Correção Monetária. Juros de Mora Rel. Des. Fed. Carlos Augusto Pires Brandão........................................................... 125 6. Tribunal Regional Federal da 3ª Região – Devolução de Valores. Recolhimento de Contribuições Feitas Após o Requerimento Administrativo. Devolução Indevida Rel. Des. Fed. Valdeci dos Santos............................................................................. 132 7. Tribunal Regional Federal da 4ª Região – Assistência Social. Pessoa Incapacitada de Prover a Própria Manutenção ou Tê-la Provida de outra Forma. Comprovação. Concessão Relª Juíza Fed. Conv. Ana Paula de Bortoli............................................................. 137 8. Ementário............................................................................................................ 154

Índice Alfabético-Remissivo ............................................................................... 189

Doutrina

O Regime Complementar de Previdência Social no Brasil: Prognóstico das Mudanças a Partir das Alterações no Regime Geral de Previdência Social Marco Cesar de Carvalho Mestre em Direito (área de concentração: Sistema Constitucional de Garantia de Direitos) pela Instituição Toledo de Ensino – ITE, Campus de Bauru/SP (2013-2015); Capacitação em Direito Educacional pela SATEducacional (jun-out/2015); Especialista em Jurisdição Constitucional pelo Corso di Alta Formazione in Giustizia Costituzionale e Tutela Giurisdizionale dei Diritti – III Edizione, ministrado na Università di Pisa, Dipartimento di Giurisprudenza (13-31/ jan/2014); Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela FAAP, Campus de Ribeirão Preto/SP (2009-2011); Professor do Curso de Direito (disciplinas de Direito Processual Civil, Direito do Trabalho e Previdenciário), na Libertas Faculdades Integradas de São Sebastião do Paraíso/MG.

RESUMO: Este artigo procura demonstrar como, a partir da análise do histórico da variação do limite do teto de contribuição do Regime Geral de Previdência Social, a Previdência Social, no Brasil, parece ter adotado uma nova concepção, mais liberal ou neoliberal, afastando-se da concepção de Estado Social de Direito, porque incentiva a contratação de planos de benefícios ou produtos, através do Regime Facultativo Complementar de Previdência Social e de suas entidades, abertas e fechadas, designadas Fundos de Pensão. Tal se deu a partir da promulgação da Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.98, regulamentada pela Lei Complementar nº 109, de 29.05.01, para que os segurados da Previdência Social possam, diante da política de reduzir cada vez mais o valor teto previdenciário, complementar o valor dos benefícios previdenciários oficiais, a partir dos diversos produtos oferecidos por um mercado que cresce a cada ano. Mas com essa política de Estado, a proteção social idealizada pelo constituinte originário da Constituição da República Federativa do Brasil, de 05.10.88, é enfraquecida, afastando-nos dos objetivos fundamentais de nossa República, de construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com vistas à construção efetiva de um Estado Social de Direito. Para isto, este estudo está calcado nos dados estatísticos e nas referências bibliográficas indicadas ao seu final. PALAVRAS-CHAVE: Direito Social. Regimes Previdenciários. Previdência Complementar. Fundos de Pensão.

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SUMÁRIO: Introdução. 1 O Histórico e a Variação no Limite do Teto de Contribuição para o Regime Geral de Previdência: a Busca de uma Previdência Complementar. 2 A Criação do Regime Facultativo Complementar de Previdência Social. 3 A Previdência Complementar. 4 O Mercado da Previdência Complementar no Brasil. 5 Conclusão. 6 Referências Bibliográficas.

Introdução A Previdência Social possui dois regimes distintos: o Regime Geral de Previdência Social e o Regime Facultativo Complementar de Previdência Social. O primeiro busca proteger o segurado de certas contingências, como idade avançada, doença, tempo de contribuição, assegurando-lhe benefícios a partir de suas contribuições, obrigatórias; enquanto o segundo tem natureza eminentemente complementar, contratual, daí, facultativa, buscando completar o valor do benefício do primeiro regime. Com o decorrer do tempo, a diferença entre o piso previdenciário e o seu teto variou muito, inclusive conforme a opção política adotada para a Previdência Social, diante da política de Estado de reajustar, diferentemente, o piso, que é o salário mínimo, e o teto previdenciário, o que naturalmente já fazia com que as classes alta e média nunca se sentissem protegidas pelo valor dos benefícios previdenciários. A criação do Regime de Previdência Complementar, facultativo e complementar ao regime geral, a partir da primeira grande “reforma” da Previdência Social, com a promulgação da Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.98, regulamentada pela Lei Complementar nº 109, de 29.05.01, objetivou buscar a vinculação da população economicamente ativa e com altas faixas salariais, a algum sistema fechado de poupança previdenciária, o que realmente ocorreu, e o que será demonstrado pela análise do mercado de Previdência Complementar, altamente regulado e fiscalizado em seus dois segmentos, o operado pelas entidades abertas e o operado pelas entidades fechadas, também conhecidas como Fundos de Pensão. Sendo que, a partir da Lei nº 12.618, de 30.04.2012, criou-se a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp), instituindo o regime de previdência complementar dos servidores públicos federais civis, inclusive para os membros do Poder Judiciário, do Ministério Público da União e do Tribunal de Contas da União, dando grande impulso para tal mercado. O presente artigo objetiva, a partir da demonstração do histórico da variação do limite do teto de contribuição do Regime Geral de Previdência Social, demonstrar como parecer ser inevitável, até porque é incentivada pelo Estado, a contratação de planos de benefícios na previdência complementar

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pelos segurados da Previdência Social, complementando o valor dos benefícios oficiais, a partir dos diversos produtos oferecidos por um mercado cada vez maior, evidenciando uma fuga da concepção de Estado Social de Direito para uma postura liberal ou neoliberal na Previdência Social, o que veremos a seguir.

1 O Histórico e a Variação no Limite do Teto de Contribuição para o Regime Geral de Previdência: a Busca de uma Previdência Complementar A pré-história da Previdência Complementar pode ter tido início, entre nós, com o alvará português de 22.11.1684, regulamentando o segurado privado aplicável ao Brasil, sendo que a Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil S.A., foi criada em 16.04.1904. Mais modernamente, o Decreto-Lei nº 73, de 21.11.66 dispôs sobre o Sistema Nacional de Seguros Privados, regulando as operações de seguros e resseguros (MARTINEZ, 2013, p. 1.246-1.249). Entretanto, historicamente, a Previdência Complementar no Brasil surge a partir da experiência norteamericana do Employee Retirement Income Security Act – ERISA, de 02.09.74, que é uma lei federal estabelecendo normas mínimas para planos de previdência na indústria privada, à época os chamados “montepios”, e regras exaustivas sobre o imposto de renda federal e os efeitos de transações associadas com planos de benefícios a empregados, canalizando a pou-

pança previdenciária ao mercado de capitais (PENA, 2008, p. 13). Ainda na vigência da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) – Lei nº 3.807, de 26.08.60, que padronizou o sistema previdenciário, ampliou os benefícios e estendeu o direito à saúde a todos os segurados, regulamentando o art. 1571, inciso XI, da Constituição dos Estados Unidos do Brasil2, de 18 de setembro de 1946 –, foi estabelecida uma proteção previdenciária do Estado sob a forma contributiva obrigatória da União, que detinha a competência para legislar sobre a Previdência Social (art. 21), mas também autorizava os Estados a legislarem de forma suplementar. À época, a LOPS estabelecia que o salário de benefício não poderia ser superior a cinco vezes o salário mínimo, ressalvando que este limite máximo, o chamado teto, poderia ser elevado até 10 salários mínimos vigentes, caso o segurado já viesse contribuindo sobre 1 2

“Art. 157. A legislação do trabalho e da previdência social obedecerão nos seguintes preceitos, além de outros que visem a melhoria da condição dos trabalhadores: (...) XVI – previdência, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado, em favor da maternidade e contra as consequências da doença, da velhice, da invalidez e da morte; (...) § 2º Nenhuma prestação de serviço de caráter assistencial ou de benefício compreendido na previdência social poderá ser criada, majorada ou estendida sem a correspondente fonte de custeio total.” Disponível em: . Acesso em: 29 jun. 2015.

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importância superior àquele limite (§ 2º, art. 233). Posteriormente este limite chegou a 20 salários mínimos, o que perdurou até junho de 1989. A Lei nº 6.435, de 15.07.77, que dispunha sobre as entidades de previdência privada, é considerada como o marco inicial da chamada Previdência Privada no Brasil, inicialmente regulamentada pelo Decreto nº 81.402, de 23.02.78, dispondo sobre as entidades de previdência privada, na parte relativa às entidades abertas. Muito embora os montepios e os seguros privados já existissem antes mesmo da Previdência Social. Depois, o Decreto nº 83.080, de 24.01.79, aprovou o Regulamento de Benefícios da Previdência Social, e, posteriormente, a Lei nº 6.950, de 04.11.81, fixou o limite máximo do salário de contribuição, o teto da Previdência Social, em 20 vezes o maior salário mínimo vigente. Por sua vez, a Constituição da República Federativa do Brasil, de 05.10.88 (CF/88) determinou algumas alterações no Plano de Benefícios e Custeio da Previdência Social, as quais só foram regulamentadas em 1991, através da Lei nº 8.213, de 24.07.91. A CF/88 também estabeleceu a desindexação da economia (art. 7º, IV), quando o salário mínimo nacional deixou de servir como índice de reajustamento, o que acabou gerando índice de reajustamento menor para os que ganham além do piso, culminando a longo prazo, no estabelecimento de um piso único na Previdência Social, ou seja, que todos ganharão benefício previdenciário equivalente a um salário mínimo. Extrai-se do art. 584 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) de nossa CF/88, que os benefícios de prestação continuada, mantidos pela Previdência Social na data da promulgação da CF/88 foram revistos, reestabelecendo o poder aquisitivo expresso em número de salários mínimos, que tinham na data de sua concessão, obedecendo-se a esse critério de atualização até a implantação do Plano de Benefícios e Custeio da Previdência Social, o que perdurou até a entrada em vigor do Decreto nº 357, de 07.12.91, aprovando o Regulamento de Benefícios da Previdência Social 3

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“Art. 23. O cálculo dos benefícios far-se-á tomando-se por base o ‘salário de benefício’ assim denominado a média dos salários sôbre os quais o segurado haja realizado as últimas 12 (doze) contribuições mensais contadas até o mês anterior ao da morte do segurado, no caso de pensão, ou ao início do benefício nos demais casos. § 1º O ‘salário de benefício’ não poderá ser inferior em cada localidade, ao salário mínimo de adulto ou menor, conforme o caso, nem superior a 5 (cinco) vêzes o mais alto salário mínimo vigente no país. § 2º O limite máximo estabelecido no parágrafo anterior será elevado até 10 (dez) vêzes o salário mínimo de maior valor vigente no País, quando o segurado já vier contribuindo sôbre importância superior àquele limite, em virtude de disposição legal.” “������������������������������������������������������������������������������������������������������������������ Art.�������������������������������������������������������������������������������������������������������������� 58. ������������������������������������������������������������������������������������������������������������� Os benefícios de prestação continuada, mantidos pela previdência social na data da promulgação da Constituição, terão seus valores revistos, a fim de que seja restabelecido o poder aquisitivo, expresso em número de salários mínimos, que tinham na data de sua concessão, obedecendo-se a esse critério de atualização até a implantação do plano de custeio e benefícios referidos no artigo seguinte. Parágrafo único. As prestações mensais dos benefícios atualizadas de acordo com este artigo serão devidas e pagas a partir do sétimo mês a contar da promulgação da Constituição.”

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(RBPS). Posteriormente, o Decreto nº 2.172, de 05.03.97, aprovou o novo RBPS, mas que foi substituído, por fim, pelo Decreto nº 3.048, de 06.05.99, que aprovou o Regulamento da Previdência Social (RPS), atualmente em vigor. “No Brasil, a prioridade acabou por ser o sistema estatal, ao contrário do sistema norte-americano, mas a previdência complementar passa a ter papel destacado por aqui ainda nos anos 1970, e especialmente após a EC nº 20/98.”5

Na onda das grandes reformas na Previdência Social, implementadas pelas Emendas Constitucionais ns. 20/98, 41/03 e 47/05, a Emenda Constitucional nº 41, de 19.12.03, modificando a própria CF/88 e dispositivos da Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.98, alterou o sistema de Previdência Social, estabeleceu normas de transição e fixou o limite máximo de R$ 2.400,00 para os benefícios do RGPS. Segundo o Suplemento Histórico (2011) do Anuário Estatístico da Previdência Social (AEPS)6, o teto para contribuição para o RGPS iniciou em cinco salários mínimos, a partir da vigência da LOPS (Lei nº 3.807, de 26.08.60) e foi aumentado para 10 salários mínimos, em dezembro de 1966, pelo Decreto-Lei nº 66, de 21.11.66; em junho de 1973, o teto foi aumentado novamente para 20 salários mínimos, pela Lei nº 5.890, de 08.06.73, que também alterou a LOPS. A Lei nº 6.205, de 29.04.76, estabeleceu a descaracterização do salário mínimo como fator de correção monetária, até que a Lei nº 6.950, de 04.11.81, voltou a fixar o limite máximo do salário de contribuição em 20 vezes o maior salário mínimo vigente, o que perdurou até junho de 1989, por força do parágrafo único do citado art. 58 do ADCT da CF/88. A partir de então, por força da desindexação da economia e também porque cabia ao Regulamento da Previdência Social estabelecer o índice de reajustamento dos benefícios previdenciários, o que perdurou até a edição da Lei nº 11.430, de 26.12.06, que acrescentou o art. 41-A7 à Lei nº 8.213/91, estabelecendo o índice (INPC/IBGE) e unificando a data de reajustamento 5

IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 13. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 740.

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MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. Anuário estatístico da Previdência Social: suplemento histórico (1980 a 2011). Ministério da Previdência Social, Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social. v. 1 (1980/1996) – Brasília: MPS/DATAPREV, 1997. Disponível em: . Acesso em: 7 jul. 2015. p. 23-32.

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Art. 41-A. O valor dos benefícios em manutenção será reajustado, anualmente, na mesma data do reajuste do salário mínimo, pro rata, de acordo com suas respectivas datas de início ou do último reajustamento, com base no Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC, apurado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

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para a mesma data de reajuste do salário mínimo, este até então não vinculado a índice algum. De 2003 até 2015, temos a seguinte tabela de evolução dos valores nominais do salário mínimo e teto: Norma Legal Vigência Valor do salário mínimo Valor do teto do RGPS Decreto nº 8.381/2014 01.01.2015 R$ 788,00 R$ 4.663,75 Decreto nº 8.166/2013 01.01.2014 R$ 724,00 R$ 4.390,24 Decreto nº 7.872/2012 01.01.2013 R$ 678,00 R$ 4.159,00 Decreto nº 7.665/2011 01.01.2012 R$ 622,00 R$ 3.916,20 Lei nº 12.382/2011 01.03.2011 R$ 545,00 R$ 3.691,74 Lei nº 12.255/2010 01.01.2010 R$ 510,00 R$ 3.467,40 Lei nº 11.944/09 01.02.2009 R$ 465,00 R$ 3.218,90 Lei nº 11.709/08 01.03.2008 R$ 415,00 R$ 3.038,99 Lei nº 11.498/07 01.04.2007 R$ 380,00 R$ 2.894,28 Lei nº 11.321/06 01.04.2006 R$ 350,00 R$ 2.801,56 Lei nº 11.164/05 01.05.2005 R$ 300,00 R$ 2.668,15 Lei nº 10.888/04 01.05.2004 R$ 260,00 R$ 2.508,72 Lei nº 10.699/03 01.04.2003 R$ 240,00 R$ 2.400,00 Fonte: Histórico de valor do salário mínimo e do teto para contribuição8.

Mas desde a Emenda Constitucional nº 41/03, fica claríssimo o achatamento do valor do teto da Previdência Social quando se faz a proporção do seu valor em relação ao equivalente em salários mínimos. O art. 1º da Medida Provisória nº 116, de 02.04.03, convertida na Lei nº 10.699, de 09.07.03, fixou o valor do salário mínimo a partir de 1º de abril de 2003, em R$ 240,00 e o art. 5º9 da Emenda Constitucional nº 41/03, fixou o limite máximo de R$ 2.400,00 para os benefícios do RGPS, portanto, o teto ficou equivalente a 10 salários mínimos pela última vez. Desde então a proporção em número de salários mínimos é cada vez menor, isto porque não se pode falar em equivalência de salários mínimos, pela desindexação da economia (art. 7º, IV, da CF/88). Conforme demonstrado na tabela abaixo, desde maio de 2004, quando ocorreu o reajuste do salário mínimo para R$ 260,00, o teto da Previdência Social era de R$ 2.508,72, numa proporção de 9,65 salários mínimos. Atualmente, e desde que o Decreto nº 8.381, de 29.12.2014 ficou para, a partir de 1º de janeiro de 2015, o salário mínimo em R$ 788,00, o teto de contribuição 8

Disponível em: . Acesso em: 7 jul. 2015.

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“Art. 5º O limite máximo para o valor dos benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 da Constituição Federal é fixado em R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais), devendo, a partir da data de publicação desta Emenda, ser reajustado de forma a preservar, em caráter permanente, seu valor real, atualizado pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.”

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foi limitado em R$ 4.663,75, pela Portaria Interministerial MPS/MF nº 1310, de 09.01.2015, o que representa 5,92 salários mínimos, uma grande queda em apenas uma década: Período

Mês

Valor do salário mínimo

Maior valor-teto do salário de benefício

2004 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015

Fev Maio Maio Abr Abr Mar Fev Jan Mar Jan Jan Jan Jan

R$ 240,00 R$ 260,00 R$ 300,00 R$ 350,00 R$ 380,00 R$ 415,00 R$ 465,00 R$ 510,00 R$ 545,00 R$ 622,00 R$ 678,00 R$ 724,00 R$ 788,00

R$ 2.400,00 R$ 2.508,72 R$ 2.668,15 R$ 2.801,56 R$ 2.894,28 R$ 3.038,99 R$ 3.218,90 R$ 3.467,40 R$ 3.691,74 R$ 3.916,20 R$ 4.159,00 R$ 4.390,24 R$ 4.663,75

Equivalência em número de salários mínimos 10,00 9,65 8,89 8,00 7,62 7,32 6,92 6,80 6,77 6,30 6,13 6,06 5,92

Fonte: Elaborada a partir da Tabela do Instituto de Estudos Previdenciários – IEPREV, do maior valor-teto do salário de benefício do INSS11.

Desde então, o valor do salário mínimo (piso) vem tendo ganho real, principalmente a partir da Lei nº 12.382, de 25.02.2011, que dispôs sobre o valor do salário mínimo em 2011 e a sua política de valorização de longo prazo (art. 2º12), enquanto o limite máximo de benefícios (teto) da Previdência Social está cada vez menor porque é reajustado tão somente com a inflação do período (INPC), o que, aliado à desindexação da economia, e numa progressão aritmética, fará com que dentro de 15 anos tenhamos o teto de contribuição igual ao piso, ou seja, um salário mínimo. E isto é, sem dúvida, um incentivo ou estímulo para que o segurado adote um regime de previdência complementar, na tentativa de manter ou, ao 10 Disponível em: . Acesso em: 7 jul. 2015. 11 Disponível em: . Acesso em: 7 jul. 2015. 12 “Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) (...) § 4º Lei complementar disciplinará a relação entre a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente, enquanto patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada, e suas respectivas entidades fechadas de previdência privada.”

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menos, recompor sua renda, porque somente com o benefício previdenciário oficial não o conseguirá.

2 A criação do Regime Facultativo Complementar de Previdência Social A partir da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS) – Lei nº 3.807, de 26.08.60, e até a promulgação da Lei Complementar nº 109, de 29.05.01, o regime de previdência complementar vinha sendo regulado pela Lei nº 6.435, de 15.07.77, que dispunha sobre as entidades de previdência privada, seus planos de benefícios, as condições de admissão dos participantes de cada plano, períodos de carência, normas de cálculo dos benefícios, dos pagamentos das contribuições, das condições de perda da qualidade de participante dos planos, etc. A Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988 (CF/88), alterada pela primeira grande “reforma” da Previdência Social com a promulgação da Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.98, que em seu art. 1º alterou totalmente a redação do art. 20213 da CF/88, estabelecendo, em seu caput, um regime de previdência privada facultativo, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado e regulado por lei complementar. Por sua vez, o § 4º do art. 202 da CF/88 disciplinava a relação que se daria entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente, enquanto patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada, e suas respectivas entidades fechadas de previdência privada, o que se daria através de lei complementar, se deu, posteriormente, através da Lei Complementar 108, de 29.05.01. A Lei nº 8.213, de 24.07.91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social (PBPS) previu (art. 9º14) que a Previdência Social com13 “Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) (...) § 4º Lei complementar disciplinará a relação entre a União, Estados, Distrito Federal ou Municípios, inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente, enquanto patrocinadoras de entidades fechadas de previdência privada, e suas respectivas entidades fechadas de previdência privada.” 14

“DOS REGIMES DE PREVIDÊNCIA SOCIAL Art. 9º A Previdência Social compreende: I – o Regime Geral de Previdência Social; II – o Regime Facultativo Complementar de Previdência Social. § 1º O Regime Geral de Previdência Social – RGPS garante a cobertura de todas as situações expressas no art. 1º desta Lei, exceto as de desemprego involuntário, objeto de lei específica, e de aposentadoria por tempo de contribuição para o trabalhador de que trata o § 2º do art. 21 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. § 2º O Regime Facultativo Complementar de Previdência Social será objeto de lei específica.”

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preendia tanto o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) como o Regime Facultativo Complementar de Previdência Social (RFCPS). Após longos 13 anos da promulgação da “Constituição cidadã”, bem como extrapolado em muito o prazo de 180 dias para que o Congresso Nacional apreciasse projeto de lei especial tratando do RFCPS, tal como determinava o art. 15315 da Lei nº 8.213/91, o Regime Complementar de Previdência Social foi finalmente regulamentado através da Lei Complementar nº 109/01, a chamada Lei da Previdência Complementar. Referida Lei Complementar, cujo projeto foi apresentado pela Mensagem nº 35916, de 16.03.99, transformado no Projeto de Lei PLP nº 10, de 16.03.9917, quando o Poder Executivo, através do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, encaminhou aos membros do Congresso Nacional o texto do projeto de lei complementar tratando do Regime de Previdência Complementar, a partir das razões apresentadas pelos Ministros Waldeck Ornelas e Pedro Pullen Parente, respectivamente, da Previdência e Assistência Social e interino da Fazenda. Dentre as razões dessa mensagem, destacam-se:

“2) De acordo com o mencionado artigo da Constituição Federal, decorrente da Reforma da Previdência, consubstanciada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, o regime de previdência complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social é facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por meio de lei complementar. Até o presente momento, o regime vem regulado por meio da Lei nº 6.435, de 15 de julho de 1977. 3) Como extensão lógica da Reforma da Previdência, que busca ajustar-se aos princípios de maior justiça, transferindo aos grupos mais privilegiados da sociedade maior responsabilidade em prover seus próprios meios nos casos de sobrevivência, invalidez e morte, decorre a necessidade de uma revisão do quadro regulatório do regime de previdência complementar vigente em nosso país, a fim de conferir-lhe maior credibilidade, profissionalismo, transparência e, principalmente, estabilidade de regras. (...) 11) Cabe observar, em relação à população beneficiada pelo regime de previdência complementar, que ainda existem outros 48 milhões de brasileiros integrantes da População Economicamente Ativa (PEA), que não estão vinculados a nenhum sistema fechado de poupança previdenciária 15 “Art. 153. O Regime Facultativo Complementar de Previdência Social será objeto de lei especial, a ser submetida à apreciação do Congresso Nacional dentro do prazo de 180 (cento e oitenta) dias.” 16 Diário da Câmara dos Deputados. Ano LIV 046. Quarta-feira, 17.03.99. Brasília/DF. Disponível em: . Acesso em: 7 jul. 2015. p. 9.754-9.768. 17 Diário da Câmara dos Deputados. Ano LIV 201. Quinta-feira, 2.12.99. Brasília-DF. Disponível em: . Acesso em: 7 jul. 2015. p. 58663 e segs.

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e se constituem, portanto, numa população alvo para a previdência complementar. Segundo dados da última Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios (PNAD), elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pelo menos 3 milhões de pessoas integrantes da PEA tem altas faixas salariais e bons níveis de qualificação profissional, constituindo-se em participantes potenciais da previdência complementar.” Portanto, a ideia inicial da instituição da Previdência Complementar, através

da LC nº 109/01 era: 1º) revisar o marco regulatório do regime de previdência complementar no país; 2º) buscar na população economicamente ativa e com altas faixas salariais, à época, sua vinculação a algum sistema fechado de poupança previdenciária. Não havia crítica pelo governo ao valor, principalmente, ao teto dos benefícios previdenciários do RGPS, mas é óbvio que, além de permitir que pessoas que não possuam nenhuma poupança previdenciária possam fazê-lo, a função precípua é mesmo complementar, facultativamente, à Previdência Social daqueles que fazem parte, obrigatoriamente, do RGPS. Ora, como garantir os rendimentos pós-aposentadoria daqueles que recebiam além dos 10 salários mínimos de teto previdenciário, até 2003 então? “A previdência complementar demonstra que o benefício previdenciário do INSS não é suficiente para atender a todas as necessidades do segurado, principalmente quando o limite máximo é de aproximadamente 10 salários mínimos. A Previdência Privada tem por objetivo complementar, completar o benefício oficial. Visa não prover a subsistência básica do trabalhador, mas complementar a que o Estado não pode prover. Não substitui o sistema oficial, apenas complementa.”18 Segundo a LC nº 109/01, nasceu uma política de Estado de formação de

poupança previdenciária, com o seguinte objetivo: “Art. 2º O regime de previdência complementar é operado por entidades de previdência complementar que têm por objetivo principal instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, na forma desta Lei Complementar. Art. 3º A ação do Estado será exercida com o objetivo de: 18 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. 34. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 489.

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I – formular a política de previdência complementar; II – disciplinar, coordenar e supervisionar as atividades reguladas por esta Lei Complementar, compatibilizando-as com as políticas previdenciária e de desenvolvimento social e econômico-financeiro; III – determinar padrões mínimos de segurança econômico-financeira e atuarial, com fins específicos de preservar a liquidez, a solvência e o equilíbrio dos planos de benefícios, isoladamente, e de cada entidade de previdência complementar, no conjunto de suas atividades; IV – assegurar aos participantes e assistidos o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos de benefícios; V – fiscalizar as entidades de previdência complementar, suas operações e aplicar penalidades; e VI – proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.”

O Regime Facultativo Complementar de Previdência Social (RFCPS) ou simplesmente Regime de Previdência Complementar (RPC) é regulado pelo Ministério da Previdência Social (MPS), através do Conselho de Gestão da Previdência Complementar (CGPC) e da Secretaria de Previdência Complementar (SPC), relativamente às Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC) e a fiscalização destas se dá pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC), criada pela Lei nº 12.154, de 23.12.09, como autarquia de natureza especial, dotada de autonomia administrativa e financeira e de patrimônio próprio, vinculada ao MPS. O Decreto nº 7.123, de 03.03.2010, criou o Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC), colegiado integrante da estrutura básica do MPS, exercendo a função de órgão regulador do RPC operado pelas EFPCs (art. 2º) e a Câmara de Recursos da Previdência Complementar (CRPC), órgão recursal colegiado no âmbito do MPS, a quem compete apreciar e julgar os recursos interpostos contra decisão da Diretoria Colegiada da PREVIC, encerrando a instância administrativa (art. 3º). Lembrese que, desde a Lei nº 6.435, de 15.07.77, as entidades fechadas de previdência privada já eram consideradas complementares do sistema oficial de previdência, sendo suas atividades enquadradas na área de competência do Ministério da Previdência e Assistência Social (art. 34). Já as instituições que trabalham com planos de previdência aberta têm como órgão regulador o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP),

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sendo fiscalizadas pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), do Ministério da Fazenda19. Segundo o próprio Ministério da Previdência Social informa: “A previdência complementar é um benefício opcional, que proporciona ao trabalhador um seguro previdenciário adicional, conforme sua necessidade e vontade. É uma aposentadoria contratada para garantir uma renda extra ao trabalhador ou a seu beneficiário. Os valores dos benefícios são aplicados pela entidade gestora, com base em cálculos atuariais. Além da aposentadoria, o participante normalmente tem à sua disposição proteção contra riscos de morte, acidentes, doenças, invalidez etc. No Brasil existem dois tipos de previdência complementar: a previdência aberta e a previdência fechada.”20

No Brasil o RPC é organizado em dois segmentos: o segmento operado pelas Entidades Abertas de Previdência Complementar (EAPCs), com acesso individual, e o segmento operado pelas Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPCs), também conhecidas como Fundos de Pensão, que operam Planos de Benefícios destinados aos empregados de empresa ou de grupo destas, denominadas patrocinadoras, bem como aos associados ou aos membros de associações, entidades de caráter profissional, classista ou setorial, denominados de instituidores, tal como a Ordem dos Advogados do Brasil, por suas seccionais, através do OABPREV, que é um fundo de pensão multipatrocinado pela OAB.

3 A Previdência Complementar A partir da previsão do art. 202 da CF/88, a LC nº 109/01 deu a seguinte natureza jurídica ao Regime de Previdência Complementar (RPC): “Art. 1º O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, é facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício, nos termos do caput do art. 202 da Constituição Federal, observado o disposto nesta Lei Complementar.” 19 “Lei Complementar nº 109, de 29 de maio de 2001 (DOU 30.05.01), dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar e dá outras providências. (...) Art. 4º As entidades de previdência complementar são classificadas em fechadas e abertas, conforme definido nesta Lei Complementar. Art. 5º A normatização, coordenação, supervisão, fiscalização e controle das atividades das entidades de previdência complementar serão realizados por órgão ou órgãos regulador e fiscalizador, conforme disposto em lei, observado o disposto no inciso VI do art. 84 da Constituição Federal.” 20 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. O que é previdência complementar. Disponível em: . Acesso em: 1º jul. 2015.

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Assim, suas características são: a natureza complementar à renda da Previdência Social, sendo totalmente autônomo em relação ao RGPS, de filiação facultativa, baseado na constituição de reservas (capitalização). Sua operação por entidades de previdência complementar visa instituir e executar planos de benefícios de caráter previdenciário, previamente autorizados e segundo as normas aprovadas pelo órgão regulador e fiscalizador, cujos planos de benefícios atenderão a padrões minimamente fixados, objetivando assegurar a sua transparência, solvência, liquidez e equilíbrio econômico-financeiro e atuarial, tudo na forma dos arts. 2º, 6º e 7º da LC nº 109/01. Segundo a LC nº 109/01 (arts. 31 e 36) temos entidades fechadas (EFPC) e abertas (EAPC) de previdência complementar, em que a EFPC, também designada de “fundo de pensão”, é a operadora dos planos de benefícios, organizada sob a forma de sociedade civil ou de fundação, sem fins lucrativos, que tenha por objeto operar plano de benefício de caráter previdenciário, acessíveis exclusivamente aos empregados de uma empresa ou de grupo de empresas e aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, entes denominados patrocinadores, ou aos associados ou aos membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, denominados instituidores. Portanto, as EFPCs são instituições criadas para o fim exclusivo de administrar planos de benefícios de natureza previdenciária, patrocinados por uma empresa ou um grupo de empresas ou aos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e/ ou instituídos aos associados ou aos membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial. Neste setor, a ������������������������������������������������������ Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Privada (ABRAPP)21, entidade que congrega cerca de 90% do quadro total de Fundos de Pensão existentes e funcionando regularmente no país, sendo que esse conjunto representa 1,7 milhão de participantes ativos e 96% do patrimônio do setor. As EFPCs devem seguir as diretrizes estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional, por meio da Resolução nº 3.121, de 25.09.03, no que tange à aplicação dos recursos dos planos de benefícios. São exemplos o AEROS – Fundo de Previdência dos Funcionários da VASP – Viação Aérea São Paulo; AVONPREV – Plano de aposentadoria dos empregados da AVON; GERDAU – Sociedade de Previdência Privada, instituída pela Metalúrgica Gerdau S.A.; PETROS –, que é um dos maiores Fundos de Pensão do país, fundada pela Petrobras em julho de 1970; a OABPrev-MG – Fundo de Pensão Multipatrocinado da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Minas 21 Disponível em: . Acesso em: 14 jul. 2015.

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Gerais, dentre tantas outras fiscalizadas pela Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC)22. As EAPCs são constituídas unicamente sob a forma de sociedades anônimas e com fins lucrativos, normalmente instituições financeiras e seguradoras, e têm por objetivo instituir e operar planos de benefícios de caráter previdenciário concedidos em forma de renda continuada ou de pagamento único, acessíveis a quaisquer pessoas físicas. Sua natureza com o participante é contratual, e podem oferecer planos individuais ou coletivos, regidas que são pelo Decreto-Lei nº 73, de 21.11.66 e também pela LC nº 109/01. As funções do órgão regulador são exercidas pelo Ministério da Fazenda, por intermédio do Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP), sendo a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP)23 o órgão responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguro, previdência privada aberta, capitalização e resseguro. São exemplos a Caiuá Serviços de Eletricidade S.A.; a Brasilprev Seguros e Previdência S.A.; a Bradesco Vida e Previdência S.A.; a Itaú Vida e Previdência S.A.; a Unimed Previdência Privada S.A., etc.

4 O Mercado da Previdência Complementar no Brasil Segundo a Seção XIII do Anuário Estatístico da Previdência Social (AEPS) do Ministério da Previdência Social24 (2013), que trata da Previdência Complementar no Brasil, nas Entidades Fechadas de Previdência Complementar (EFPC), o número de patrocinadores, ou seja, de empresas ou de grupos de empresas, e também os entes públicos nas três esferas, suas autarquias, fundações e sociedades de economia mista que instituam planos de benefícios previdenciários para seus empregados ou servidores, por intermédio de entidade fechada, em 2013, é de 3.078, representando um crescimento de 9,34% em relação a 2011; e o maior crescimento entre os tipos de patrocinadores deu-se exatamente no setor público federal, em que de 81 patrocinadores em 2011, chegou-se em 2013 com 294, crescimento de 262,96%, portanto, fruto também da Lei nº 12.618, de 30.04.2012, que criou a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp), instituindo o Regime de Previdência Complementar para os servidores públicos federais civis titulares de cargo efetivo da União, suas autarquias e fundações, inclusive 22 Disponível em: . Acesso em: 14 jul. 2015. 23 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. Anuário estatístico da Previdência Social. Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social – Brasília: MPS/DATAPREV. Disponível em: . p. 768. 24 Disponível em: . Acesso em: 28 jul. 2015. p. 2.

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para os membros do Poder Judiciário, do Ministério Público da União e do Tribunal de Contas da União, criando três entidades fechadas de previdência complementar (EFPC), a Funpresp-Exe, para o servidor público federal do Poder Executivo, a Funpresp-Leg, para o servidor público federal do Poder Legislativo e Funpresp-Jud, para o servidor público federal do Poder Judiciário. No setor privado, ou seja, de empresas ou de grupos de empresas, o crescimento do número de patrocinadores não foi tão exponencial, mas também se apresentou importante, porque, de 2.123 de patrocinadores em 2011, houve um crescimento de 1,68% em 2013, passando para 2.159 patrocinadores. Segundo o Consolidado Estatístico (03/2015) da ABRAPP25, em 2015 há 313 EFPCs operando em todas as regiões do país, para 2.542.448 participantes ativos, 3.909.342 dependentes e ainda 736.070 assistidos (já em gozo de benefício), em que o montante de investimento já se aproxima de R$ 700 bilhões: Comparativo Regional Regional* CentroNorte Leste

Quantidade de entidades**

%

Investimento (R$ milhões)

%

Participantes ativos

%

Dependentes

%

Assistidos

%

  38

12,1

111.356

16,2

1.465.758

18,3

1. 883.247

22,6

118.705

16,1

  18

  5,8

  27.938

  4,1

1.  93.432

  3,7

1. 131.473

  3,4

  47.481

  6,5

Nordeste

  26

  8,3

  18.394

  2,7

1.  33.262

  1,3

  91.903

  2,4

  34.353

  4,7

Sudeste

  58

18,5

334.136

48,6

1. 539.186

21,2

1.334.288

34,1

305.856

41,6

Sudoeste

119

38,0

151.897

22,1

1.133.785

44,6

1.081.719

27,7

170.890

23,2

Sul

  54

17,3

  44.372

  6,4

1. 277.025

10,9

1. 386.712

  9,9

  58.785

  8,0

Total

313

100,0

688.091

100,0

2.542.448

100,0

3.909.342

100,0

736.070 100,0

Composição regional: Centro-Norte – RO, AM, RR, AP, GO, DF, AC, MA, MT, MS, PA, PI e TO; Leste – MG; Nordeste – AL, BA, CE, PB, PE, RN e SE; Sudeste – RJ e ES; Sudoeste – SP; Sul – PR, SC e RS. ** Fonte: PREVIC Estatística Trimestral – mar/2015. *

Este número de participantes ativos, dependentes e assistidos está assim distribuído entre os instituidores dos setores privado e público: Comparativo por Tipo de Patrocínio

  0,5

Participantes ativos 1.190.774

  7,5

1. 296.517

  7,6

   1.221

  0,2

Privado

206

65,8

250.820

36,5

1.555.244

61,2

1.894.647

48,5

315.925

42,9

Público

  87

27,8

433.854

63,1

1. 796.430

31,3

1.718.178

44,0

418.924

56,9

Total

313

100,0

688.091

100,0

2.542.448

100,0

3.909.342

100,0

736.070

100,0

Regional Instituidor

**

Quantidade de % entidades*   20   6,4

Investimento (R$ milhões)   3.418

%

%

Dependentes

%

Assistidos

%

Fonte: PREVIC Estatística Trimestral – mar/2015. As informações de investimento e da população se referem também a outros planos de benefício instituídos existentes em entidades multipatrocinadas. *

**

25 Disponível em: . Acesso em: 28 jul. 2015. p. 2.

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A natureza jurídica privada, contratual, facultativa e de caráter complementar à Previdência Social, aliada ao amplo espectro de produtos, ou melhor, planos de benefícios, já que as Entidades de Previdência Complementar (fechadas e abertas) têm autonomia em relação ao RGPS, muito embora somente possam instituir e operar planos de benefícios para os quais tenham autorização específica, segundo as normas aprovadas pelo órgão regulador e fiscalizador, que no caso das EAPCs, dá-se pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e pela SUSEP. Por sua vez, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC) é quem fiscaliza as EFPCs e o Funpresp, como órgão fiscalizador dos Fundos de Pensão, vinculado ao Ministério da Previdência Social. Tendo sempre em mente o objetivo de formar uma poupança previdenciária interna, de longo prazo, promovendo a educação previdenciária e complementando a previdência oficial, para que o participante, ou seja, aquele que adere ao plano de benefícios, proteja-se da perda do poder aquisitivo pelo valor pago pela Previdência Social, inevitavelmente, dentre as características dos planos de benefícios do Regime de Previdência Complementar (RPC) estão: – a segurança do RPC, pela regulação, fiscalização e controle das entidades abertas e fechadas de previdência complementar, pelos respectivos órgãos; – os incentivos fiscais trazidos com a Lei nº 11.053, de 29.12.04, que dispôs sobre a tributação dos planos de benefício dos Fundos de Pensão, com a seguinte premissa: quanto mais tempo o participante mantiver seus recursos em um Fundo de Pensão, menos incidência de imposto de renda haverá sobre eles, já que durante a fase contributiva não há incidência de imposto de renda sobre os rendimentos do participante, somente quando realizar o resgate ou se tornar elegível ao plano de benefícios. A alíquota de incidência do imposto de renda na fonte é de 35% para recursos com prazo de acumulação igual ou inferior a dois anos, chegando a 10% quando o prazo de acumulação for superior a dez anos; – a rentabilidade dos Fundos de Pensão que tem se mostrado superior a outras aplicações disponíveis no mercado, com ganho real acima da inflação; – a representação democrática dos participantes e assistidos na gestão dos fundos (arts. 3º e 35 da LC nº 109/01) com direito à representação nos seus Conselhos Deliberativo e Fiscal, para o acompanhamento da gestão do plano de previdência; – a possibilidade de resgate: ao participante é permitido resgatar (sacar) os recursos, por ele depositados, de suas contribuições (poupança). Inclusive a possibilidade de resgate parcial, sob determinadas condições, já é discutida

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no âmbito do Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC)26, porque atualmente somente o resgate total é permitido (art. 14, III, LC nº 109/01), dando maior flexibilidade ao RPC; – a portabilidade de recursos e de transferência de participantes e respectivas reservas entre planos de benefícios, com a mudança para outro plano que lhe seja mais atraente ou mais vantajoso, e onde a EFPC, ou mesmo uma EAPC receptora, computa o prazo de captação da entidade anterior, protegendo o interesse e a liberdade de permanecer (ou não) no plano de previdência ao qual está vinculado. E tudo isto também é demonstrado, de forma oficial27 e estimulado, como uma política de Estado, através da Secretaria de Políticas de Previdência Complemen-

tar (SPPC), órgão do MPS. Mas advirta-se que a previdência complementar não visa formar simples poupança, para investimentos de curto prazo ou para suprir situações emergenciais: “Nos anos 2011/2012 foi perceptível o nascimento de uma tendência incipiente, especialmente na oferta dos produtos das entidades abertas, com grandes facilidades para resgate e livre opção por investimentos, correndo o risco de essa proteção coletiva transformar-se em poupança individual a simples aplicação financeira sem qualquer solidariedade.”28

O mercado da previdência complementar oferece planos para coberturas isoladas ou conjuntas, por exemplo em caso de morte, invalidez total ou permanente e também a cobertura por sobrevivência (doenças inesperadas, perda de rendimento, redução dos vencimentos), onde estes conferem ao participante, ao final do prazo contratado, o recebimento de um benefício à vista (pagamento único) ou sob a forma de renda continuada, complementando a Previdência Social. Se as EFPCs administram planos de benefícios exclusivamente para uma empresa ou um grupo de empresas, aos servidores públicos ou instituídos aos associados ou aos membros de pessoas jurídicas de caráter profissional, classista ou setorial, a semelhança com as EAPCs acaba sendo alcançada pela portabilidade entre os planos e entidades. Nas EAPCs os planos podem ser contratados de forma individual ou coletiva. Nelas, os produtos ou planos mais comercializados são o Plano Gerador de Benefícios Livres (PGBL) e o Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), no 26 Disponível em: . Acesso em: 31 jul. 2015. 27 MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. Fundos de pensão – instituidor. Disponível em: . Acesso em: 31 jul. 2015. 28 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário. 5. ed. São Paulo: LTr, 2013. p. 1.295.

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qual, em ambos, apenas a contribuição é definida, porque o participante paga uma quantia mensal ou faz depósitos esporádicos para gerar uma poupança que pode ser recebida de uma só vez ou convertida em parcelas mensais, cuja diferença fundamental é a tributação do Imposto de Renda: “Não obstante os diversos planos existentes no ramo privado da previdência complementar, tem-se destacado o PGBL – Plano Gerador de Benefícios Livres, nascido em 1998, um dos preferidos pelas EAPC, baseado em plano americano denominado 401-K. De acordo com o CMN – Conselho Monetário Nacional, a aplicação dos recursos pela entidade irá variar de acordo com o perfil de cada participante, podendo ser soberano, de renda fixa ou composto. Atualmente também ganha terreno o VGBL – Vida Gerador de Benefício Livre, seguro do ramo vida, mesclando aspectos deste segmento com previdência privada. É um seguro de vida com plano de previdência complementar, dependendo do que ocorrer primeiro: a morte ou a aposentadoria.”29

Conforme dito com relação à Lei nº 11.053, de 29.12.04, e a forma de tributação dos planos de benefício dos Fundos de Pensão, no VGBL os participantes, ou poupadores, não encontram benefício fiscal como no PGBL, porém, no resgate, em caso de fundo progressivo, há incidência de 15% de imposto de renda na fonte (IRRF) e no caso de fundo regressivo de 35% a 10% de IRRF sobre os valores de rendimento de seu fundo, ou seja, há o pagamento do imposto de renda somente sobre os rendimentos obtidos. No PGBL os participantes encontram benefício fiscal de IR à ordem de 12% de sua renda tributável anual, porém, no resgate, há incidência de IRRF de 15% em caso de fundo progressivo, e no caso de fundo regressivo, de 35% a 10% de IRRF sobre os valores acumulados totais, tanto nos valores aplicados quanto nos rendimentos de seu fundo, ou seja, há o pagamento do imposto de renda sobre os valores totais obtidos. Há ainda o Plano com Remuneração Garantida e Performance (PRGP) que, como a designação diz, garante no período em que o participante está acumulando sua poupança, rendimento com base numa taxa de juros e um índice de correção; o Plano com Atualização Garantida e Performance (PAGP) que também garante uma rentabilidade mínima, com base apenas num indexador, sem garantia de juros mínimos; o Vida Remuneração Garantida e Performance (VRGP) e Vida com Atualização Garantida e Performance (VAGP) que são similares ao VGBL, porém com a garantia de rendimento mínimo pela EAPC; o Fundo de Aposentadoria Programada Individual (FAPI), criado 29 IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 13. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 750.

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para garantir a acumulação de recursos, sem estabelecer um período para a contribuição, não chegando a ser considerado um plano de aposentadoria. Segundo Demonstrativo de Benefícios do Consolidado Estatístico (03/2015) da ABRAPP30, nas entidades fechadas a maior quantidade de benefícios é a aposentadoria programada, seguida das pensões e da aposentadoria por invalidez, sendo que o valor médio mensal (até dezembro 2014) pago nas aposentadorias programadas é de R$ 4.134,00: Demonstrativo de Benefícios Tipo Aposentadoria programada Aposentadoria por invalidez Pensões

Valor (R$ mil) 26.052.253,00   1.168.554,00   3.911.868,00

Quantidade 484.788   52.824 149.283

Valor médio mensal (R$) 4.134,00 1.702,00 2.016,00

Por sua vez, o mercado brasileiro de Previdência Privada aberta, segundo o Boletim Estatístico dos Mercados Supervisionados (jan/2012), da SUSEP31, cresceu 22,02% em relação a 2011, no comparativo jan/2011 e jan/2012, sendo que, em jan/2012, as empresas de EAPC verteram quase R$ 870 milhões de reais de contribuições em todos os seus planos, o que ultrapassou R$ 10 bilhões em 2011. Já segundo o Relatório – Previdência – out/2014, da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida – FenaPrevi32, que representa 71 seguradoras e entidades abertas de previdência complementar no país, a série histórica dos valores de prêmios e contribuições pagos para planos abertos de caráter previdenciário, em 2013 ultrapassou os R$ 73 bilhões, enquanto até out/2014 já havia atingido R$ 64 bilhões: 70,461

19,512

22,892

2005

2006

28,096

2007

31,847

2008

38,787

2009

46,074

2010

53,565

2011

2012

As contribuições feitas por titulares de planos abertos de caráter previdenciário somaram R$ 7,6 bilhões em outubro/2014, volume que representou 30 Disponível em: . Acesso em: 28 jul. 2015. p. 2. 31 Disponível em: . Acesso em: 1º ago. 2015. 32 Disponível em: . Acesso em: 1º ago. 2015.

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crescimento de 11,45% em comparação a igual período de 2013 (R$ 6,8 bilhões). Os planos individuais foram os que mais receberam recursos em out/2014: R$ 6,7 bilhões. Os recursos destinados a planos para menores também avançaram, foram R$ 165,1 milhões em contribuições, alta de 10,15% diante dos R$ 149,9 milhões registrados em out/2013. Também houve forte crescimento nos planos empresariais. A modalidade recebeu R$ 721,7 milhões em contribuições, valor 10,09% superior aos R$ 655,5 milhões do mesmo mês em 2013. No acumulado de janeiro a outubro de 2014, as contribuições feitas por titulares de planos abertos de caráter previdenciário somaram R$ 64,2 bilhões, alta de 10,35% diante dos R$ 58,2 bilhões registrados no mesmo período em 2013. Diante da recentíssima sanção do governo à Lei nº 13.152, de 29.07.2015, estendendo a política de reajuste do salário mínimo até 2019, porém, com veto da Presidente da República à extensão dessa forma de reajuste aos benefícios e aposentadorias do RGPS, o que se originou da Medida Provisória (MP) nº 67233, de 24.03.2015, é inevitável que, na tentativa de manter o rendimento dos benefícios previdenciários da Previdência Social, mais e mais pessoas dirijam sua poupança para o Regime de Previdência Complementar (RPC), porque cada vez mais o valor do piso e do teto do RGPS se aproximarão e, em breve, na Previdência Social apenas haverá o pagamento do salário mínimo. A discussão política no RGPS é muito mais pontual e para atender aspectos econômicos imediatos que propriamente como uma política de Estado. Não à toa que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) é o órgão mais acionado judicialmente, na tentativa dos seus segurados obterem uma tutela previdenciária: “(...) o pouco espaço reservado no cenário aos temas de direitos sociais e aos direitos previdenciários, em particular, é um dos fatores que impulsiona a exacerbação da via judicial como cenário para debate e conquista em torno de direitos previdenciários. O ideal, até mesmo para propiciar diminuição da sobrecarga de trabalho judiciário e dinamizar o julgamento das ações previdenciárias, será de que as expectativas sociais em torno dos direitos previdenciários sejam debatidas (e efetivadas) no âmbito legislativo, que é o foro natural (mas não exclusivo) de participação democrática dos cidadãos, através de seus representantes eleitos. (...) 33 Disponível em: . Acesso em: 1º ago. 2015.

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A baixa politização em torno dos direitos previdenciários se reflete também em uma atuação meramente reativa, basicamente uma agenda de preservação desses direitos diante de inovações legislativas tendentes ao retrocesso social. A falta de debate público a respeito dos direitos previdenciários (e dos direitos sociais como um todo) é estranha e inadequada, visto que a proteção social é tema político por excelência, ligado ao modelo de Estado que se pretende (de bem-estar social, Estado mínimo ou de proteção subsidiária, por exemplo) e que deve ser decidido coletivamente, na esfera própria do parlamento.”34

Não se desconhece o PL – Projeto de Lei nº 2.53935 de 1996, de autoria do Deputado Federal Arnaldo Faria de Sá (PPB-SP), apresentado em 14.11.96, para que no reajustamento dos benefícios da Previdência Social, seja aplicado um índice que reflita a variação no custo de uma cesta de consumo de indivíduos com mais de 60 anos e que se encontra aguardando designação de Relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados. Também o PL nº 3.27336, de 2008, de autoria do Deputado Federal Silvinho Peccioli (DEM-SP), apresentado em 16.04.08 para estabelecer que no reajuste dos benefícios em manutenção no RGPS seja observado o mesmo índice de reajuste do salário mínimo elevando o teto da Previdência Social,

em 10 vezes o seu piso, que se encontra tramitando com prioridade e esteja sujeito à apreciação do Plenário da Câmara dos Deputados, cuja justificativa corrobora com tudo o que até aqui foi demonstrado: “A atual política de reajuste do salário mínimo, mediante a concessão de aumentos significativamente mais elevados do que a variação inflacionária, tem acarretado expressivo prejuízo para respeitável parcela de aposentados e pensionistas do Regime Geral de Previdência Social. Assim, enquanto os segurados que contribuíram com valores próximos ao salário mínimo têm sido beneficiados com elevados percentuais de aumento real, os demais aposentados e pensionistas que contribuíram com valores maiores têm tido seus benefícios sistematicamente arrochados, vez que são contemplados apenas com os índices que apuram a variação da inflação no período. 34 SERAU Jr., Marco Aurélio. Baixo grau de “politização” e judicialização excessiva dos direitos previdenciários no Brasil: a MP 664/2014 e a Emenda Constitucional 88/2015 como cases. Revista Brasileira de Direito Previdenciário, Porto Alegre, Magister, ano V, n. 26, abr./maio 2015, p. 90. 35 Diário da Câmara dos Deputados, 20 de dezembro de 1996. Disponível em: . Acesso em: 1 ago. 2015. p. 33864. 36 Disponível em: . Acesso em: 1º ago. 2015.

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A perdurar essa prática, em poucos anos todos os segurados estarão confinados, injustamente, no mesmo patamar, ou seja, percebendo o piso previdenciário, que equivale ao salário mínimo. Sobre ser perversa, essa política trará, futuramente, efeitos perniciosos para a arrecadação previdenciária, pois desestimula os atuais contribuintes a recolherem valores superiores ao piso do salário de contribuição. Diante desse quadro, colocamos esta proposição que determina que o reajuste dos benefícios de prestação continuada ocorra na mesma data e com o mesmo índice de reajuste do salário mínimo, além de elevar para o equivalente a dez vezes o valor do menor salário de contribuição o valor do maior benefício.”37

Até mesmo a tentativa de permitir que os segurados do RGPS possam realizar contribuições adicionais, como previsto no PL nº 1.09638, de 2015, de autoria do Deputado Federal Expedito Netto (SD-RO), apresentado em 09.04.2015 e que se encontra aguardando designação de Relator na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF) da Câmara dos Deputados, mas que encontra evidente óbice prático exatamente com relação à forma de reajustamento e de fixação do teto do RGPS, porém, justificado exatamente pela busca de segurança no mercado de previdência complementar: “Desse modo, antes de ingressar no mercado de previdência complementar, seria interessante e importante que o trabalhador teria mais segurança se privilegiasse o recebimento de sua aposentadoria pelo Estado. Além disso, tal iniciativa colabora para o reforço do caixa da Previdência, na medida em que as contribuições atuais ajudam a pagar os benefícios já concedidos. Assinale-se, ainda, que nossa proposta não abre espaço para nenhuma utilização para qualquer iniciativa de abreviação do tempo de contribuição.”39

Portanto, e muito embora tivessem sido criados juntos, quando o art. 9º da Lei nº 8.213/91, previu que a Previdência Social compreendia tanto o Regime Geral de Previdência Social como o Regime Facultativo Complementar de Previdência Social ou simplesmente Regime de Previdência Complementar, as políticas de Estado, desde então, têm desprestigiado o RGPS para, numa postura liberal ou neoliberal, incentivar e estimular a previdência complementar, através das entidades abertas e fechadas, o que somente esse 37 Disponível em: . Acesso em: 1º ago. 2015. 38 Disponível em: . Acesso em: 1º ago. 2015. 39 Disponível em: . Acesso em: 1º ago. 2015.

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mercado agradece, já que nosso Estado Democrático e Social de Direito não respeita os direitos previdenciários nem aquela proteção social idealizada pelo constituinte originário da Constituição da República Federativa do Brasil, de 05.10.88, nos afastando dos objetivos fundamentais de nossa República, para a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivos estes que sempre devem nortear tanto o legislador quanto o próprio intérprete da norma, com vistas à construção efetiva de um Estado Social de Direito40.

5 Conclusão Dentre os direitos sociais previstos na Constituição da República Federativa do Brasil, de 05.10.88, a Previdência Social tem lugar de destaque, mormente para a consecução dos objetivos fundamentais de nossa República, com vistas à construção efetiva de uma sociedade livre, justa e solidária, erradicando a pobreza e a marginalização, reduzindo as desigualdades sociais e as regionais, tal como se propõe um Estado Social de Direito. A importância da Previdência Social, através do seu Regime Geral de Previdência Social, assegurando benefícios previdenciários, porém, limitados a um valor máximo de contribuição, o qual, como visto, variou de 20 a 10 salários mínimos; e a partir de 2003 até agora (2015), esta variação se acentuou, mas de forma negativa, porque, atualmente, o teto previdenciário é de apenas 5,92 salários mínimos, tanto em virtude da política de desindexação da economia quanto em virtude da própria política de reajustamento, com ganho real, do salário mínimo, fazendo com que os beneficiários da Previdência Social que recebem o piso previdenciário tenham reajustes maiores, enquanto os demais contem apenas com a correção inflacionária. Porém, a Previdência Social também havia concebido o Regime Facultativo Complementar de Previdência Social, desde a Lei nº 8.213/91, mas este somente veio a ser criado com a promulgação da Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.98, regulamentada em 2001, através da Lei Complementar nº 109, de 29.05.01, para que os segurados da Previdência Social pudessem, diante da política de Estado de reduzir cada vez mais o valor do teto previdenciário, complementar o valor de suas aposentadorias através de uma poupança previdenciária de longo prazo, de caráter facultativo e contratual, o que forma um 40 Os Professores Drs. Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior explicam muito bem esta definição de Estado Social de Direito, dissertando que: “Este modelo constitucional seria derivado da consagração do Estado de bem-estar social. Nele, o papel do Estado sofre uma profunda ressignificação, deixando o caráter de mero garantidor das liberdades individuais para assumir um papel mais ativo, quer no que tange a uma presença normativo-reguladora na economia, quer no que se refere ao desempenho de uma função prestacional em matéria social.”. o, passando pelo atendimento mgidos socialmente.to, e prosseguem amparando durante toda a sua vida. (Curso de direito constitucional. 19. ed. rev., atual. até a EC 84 de 2 de dezembro de 2014. São Paulo: Verbatim, 2015. p. 33-34)

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grande mercado chamado de Previdência Complementar, altamente regulado e fiscalizado (SUSEP e PREVIC), e operado por entidades abertas e fechadas, também conhecidas como Fundos de Pensão. Inclusive este mercado de previdência complementar experimentou grande expansão a partir da Lei nº 12.618, de 30.04.2012, que criou a Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp), instituindo o regime de previdência complementar dos servidores públicos federais civis, inclusive para os membros do Poder Judiciário, do Ministério Público da União e do Tribunal de Contas da União. Os planos de benefício da Previdência Complementar, ofertados como produtos, têm grandes vantagens sobre os benefícios da Previdência Social. Além da variedade de coberturas há a proteção contra a inevitável perda do poder aquisitivo do valor pago pela Previdência Social, some-se a isto a própria segurança da Previdência Complementar, face sua regulação, fiscalização e controle das entidades abertas e fechadas, pelos respectivos órgãos, além dos incentivos fiscais na tributação dos planos de benefício destes Fundos de Pensão. Há, ainda, uma rentabilidade muitas vezes superior a outras aplicações disponíveis no mercado, a publicidade e a representação democrática dos participantes e assistidos na gestão dos fundos, a portabilidade de recursos e de transferência de participantes e suas reservas entre os planos de benefícios, dentre outras vantagens. Sendo que no âmbito do Ministério da Previdência há a Secretaria de Políticas de Previdência Complementar (SPPC) que formula políticas públicas para o setor, demonstrando que o próprio Estado estimula a Previdência Complementar, em detrimento do Regime Geral da própria Previdência Social. São claros os resultados e os sinais desta que parece ser uma nova política de Estado, de desprestigiar a Previdência Social, em clara postura de Estado mínimo, liberal ou neoliberal, para incentivar e estimular a previdência complementar, através da contratação de planos de benefícios, pelo Regime Facultativo Complementar de Previdência Social. Que investir num plano de previdência privada, ou melhor, contratar um plano de benefício por uma entidade de previdência complementar é mesmo um bom negócio, não há dúvida, entendendo-se que não se trata de aplicação financeira, mas de uma poupança previdenciária de longo prazo, e os próprios dados estatísticos aqui demonstrados evidenciam isto. Mas deixar de privilegiar a Previdência Social, pela falta de uma política de efetivo reajustamento dos benefícios previdenciários e com o aumento do valor do teto de contribuição para que as classes econômicas mais abastadas possam ver a Previdência Social como uma forma efetiva de proteção, é um grande equívoco e um retrocesso social, já que as políticas de governo voltadas para a Previdência Social têm se mostrado meramente reativas às oscilações da economia nacional.

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O sucesso da Previdência Social, assim entendido como o bem-estar da sociedade brasileira, tal como o sucesso da previdência complementar, exige uma política de longo prazo, estável e séria na relação com todos os seus interlocutores: trabalhadores, empregadores, aposentados e Governo, para que se garanta a efetivação dos direitos fundamentais previdenciários dos segurados da Previdência Social, reduzindo as desigualdades sociais, a partir da estabilidade financeira e da manutenção do padrão de vida pós-aposentadoria. É isto o que se espera, verdadeiramente, de um Estado Democrático e Social de Direito. TITLE: The supplementary regime of Social Security in Brazil: prognosis of changes based on the General Regime of Social Security. ABSTRACT: This article aims at showing how, based on a history analysis of the variation of the ceiling of the contribution of the General Regime of Social Security, Brazilian Social Security seems to have adopted a new conception, more liberal or neoliberal, moving farther from the conception of State Ruled by Law, as it encourages the contracting of benefit plans, or products, through the Optional Supplementary Regime of Social Security, and its open and closed entities, called Pension Funds. That happened after the enactment of Constitutional Amendment no. 20, of December 15, 1998, regulated by Supplementary Law no. 109, of May 25, 2001, so that those insured by Social Security can, considering the policy of ever reducing the amount of the social-security ceiling, complement the value of official social-security benefits, from the various products offered by a market that grows every year. But with such State policy, the social protection idealized by the original constitutional convention of the Constitution of the Federative Republic of Brazil, of October 5, 1988, is weakened, moving away from the fundamental objectives of our Republic, of building a free, fair and solidary society, with a view towards the effective construction of a Social State of Law. Thus, this research is based on statistical data and bibliographic references. KEYWORDS: Social Right. Social Security Regimes. Supplementary Social Security. Pension Funds.

6 Referências Bibliográficas ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES Jr., Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 19. ed. rev., atual. até a EC 84 de 2 de dezembro de 2014. São Paulo: Verbatim, 2015. IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 13. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário. 5. ed. São Paulo: LTr, 2013. MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. 34. ed. São Paulo: Atlas, 2014. PENA, Ricardo. Previdência complementar no Brasil: história, evolução e desafios. Revista Fundos de Pensão, ABRAPP/ICSS/Sindapp, ano XXVII, n. 340, maio 2008, p. 13-15. Disponível em: . Acesso em: 21 maio 2015. SERAU Jr., Marco Aurélio. Baixo grau de “politização” e judicialização excessiva dos direitos previdenciários no Brasil: a MP 664/2014 e a Emenda Constitucional 88/2015 como cases. Revista Brasileira de Direito Previdenciário, Porto Alegre, Magister, ano V, n. 26, abr./maio 2015, p. 89-99.

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