O Rei, a nobreza e a Batalha do salado (1279-1340)

Share Embed


Descrição do Produto

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ ESCOLA DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES LICENCIATURA EM HISTÓRIA

SAVIUS MIGUEL POVALUK

O REI, A NOBREZA E A BATALHA DO SALADO (1279-1340)

CURITIBA 2015

SAVIUS MIGUEL POVALUK

O REI, A NOBREZA E A BATALHA DO SALADO (1279-1340)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em História da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Licenciado em História. Orientador: Prof. Drª. Adriana Mocelim de Souza Lima.

CURITIBA 2015

Dados da Catalogação na Publicação Pontifícia Universidade Católica do Paraná Sistema Integrado de Bibliotecas – SIBI/PUCPR

P879r 2015

Povaluk, Savius Miguel O rei, a nobreza e a Batalha do Salado (1279-1340) / Savius Miguel Povaluk ; orientadora, Adriana Mocelim de Souza Lima. – 2015. 83 f. ; 30 cm

TCC (História) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2015 Bibliografia: f. 80-83

1. História. 2. Nobreza. 3. Guerra. Idade Média - História. I. Lima, Adriana Mocelim de Souza. II. Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Escola de Educação e Humanidades. III. Título.

CDD 20. ed. – 981 Biblioteca Central

SAVIUS MIGUEL POVALUK

O REI, A NOBREZA E A BATALHA DO SALADO (1279-1340)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em História da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de licenciado em História.

COMISSÃO EXAMINADORA

_____________________________________ Professor (a) Dra. Adriana Mocelim de Souza Lima Pontifícia Universidade Católica do Paraná

_____________________________________ Professor (a) Dr. Wilson Maske Pontifícia Universidade Católica do Paraná

CURITIBA, 17 DE JUNHO DE 2015.

Dedicado em memória de José Povaluk

AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço a Deus por ao longo de minha vida guiar-me através de sua Graça, principalmente neste momento de conclusão de mais uma etapa em minha vida.

Agradeço aos meus familiares, em especial minha mãe Iracema Kito Povaluk por estar sempre ao meu lado me incentivando e acreditando em minha capacidade, além de me ajudar com a parte financeira em determinados momentos, através de seu enorme esforço e trabalho.

Quero agradecer a todos os professores que tive em minha vida, pois sem a formação que me deram jamais eu teria chego à graduação. De maneira especial, agradeço a professora Adriana Mocelim de Souza Lima, que desde o início do curso acompanhou meus passos, e contribuiu não só para a escolha do tema deste estudo, como também me orientou com muita atenção e carinho.

Por último e não menos importante, gostaria de agradecer a certas pessoas muito próximas que me deram ânimo e apoio nos momentos de fraqueza, nervosismo e desespero, assim como nos momentos de euforia e alegria. Não citarei nomes para não ser injusto, e sem querer acabar esquecendo alguém, mas com certeza tais pessoas sabem que a elas me refiro.

RESUMO No final do século XIII é possível visualizar no reino Portugal, os primeiros efeitos da política de centralização régia iniciada pelo rei Afonso III, tendo sua continuidade com seus sucessores D. Dinis e D. Afonso IV. É também a partir deste período que se tem uma redução das operações de Reconquista, fazendo com que esta nobreza medieval portuguesa que era estruturada e encontrava sua importância e função em tal fenômeno, enfrente um processo de transformação, pois era necessário reestruturar essa nobreza para se ajustar ao novo momento vivido no reino. Então, a nobreza buscava novamente compor seu lugar na sociedade. Para compreendermos como se deu este processo, recorremos à narrativa da Batalha do Salado de 1340, adicionada ao Livro de Linhagens do Conde Pedro de Barcelos por um refundidor mais ou menos quarenta anos depois. Esta batalha foi um episódio marcante na história, pois se trata do reflexo de uma mentalidade ainda presente na Península Ibérica que remete ao processo de Reconquista cristã. Tal processo demonstrou que havia uma mentalidade de cruzada e cavalaria pertencente à nobreza portuguesa, que enfrentava não só os conflitos com o poder régio, mas também sofria com uma estratificação interna cada vez mais acentuada; e é a partir desta mentalidade em que a mesma irá difundir sua importância para a sociedade. Portanto, a narrativa da batalha serviu como meio para esta nobreza sustentar sua posição de relevo mediante o fortalecimento do poder régio, além de demonstrar que o rei ainda dependia desta própria nobreza para governar. Palavras-chave: Nobreza Medieval. Batalha do Salado. Reconquista.

ABSTRACTO A finales del siglo XIII, se puede ver el reino de Portugal, los primeros efectos de la política de centralización real iniciadas por el rey Alfonso III, y su continuidad con sus sucesores D. Dinis y D. Afonso IV. También es de esta época que ha habido una reducción en las operaciones de Reconquista, haciendo con que medieval nobleza portuguesa que fue estructurada y se encontró con su importancia y su papel en este fenómeno, se enfrentan a un proceso de transformación, que era necesario reestructurar la nobleza adaptarse al nuevo tiempo vivido en el reino. Entonces, la nobleza buscó de nuevo componer su lugar en la sociedad. Para entender cómo fue este proceso, se recurre a la narración de la batalla de Salado, in 1340, añadido a las cepas del libro de Pedro Conde de Barcelos por un refundidor unos cuarenta años más tarde. Esta batalla fue un episodio notable en la historia, porque es el reflejo de una mentalidad aún presentes en la Península Ibérica, que se refiere al proceso de Reconquista cristiana. Este proceso demostró que había una mentalidad de cruzada y de caballería perteneciente a la nobleza portuguesa, que se enfrentó no sólo conflicto con el poder real, pero también sufría de una estratificación interna cada vez más pronunciada; y es a partir de esta mentalidad que va a transmitir su importancia para la sociedad. Por lo tanto, la narración de la batalla sirvió como un medio para esta noble mantener su posición de liderazgo mediante el fortalecimiento del poder real, y demostrar que el rey seguía dependiendo de la propia nobleza para gobernar. Palabras-clave: Nobleza Medieval. Batalla Del Salado. Reconquista.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ed.

Edição

Ed.

Editor

f.

Folha

p.

Página

Vol.

Volume

SUMÁRIO 1

INTRODUÇÃO ............................................................................................... 8

2

CONTEXTO: O REINO DE PORTUGAL (1279-1340) ................................. 11

2.1

D. DINIS (1279-1325) ................................................................................... 11

2.2

GUERRA CIVIL DE 1319-1324 .................................................................... 21

2.3

D. AFONSO IV (1325-1340) ......................................................................... 28

3

A ARISTOCRACIA....................................................................................... 33

3.1

A NOBREZA MEDIEVAL PORTUGUESA .................................................... 36

4

A RECONQUISTA........................................................................................ 46

5

A BATALHA DO SALADO .......................................................................... 51

5.1

ANTECEDENTES DA BATALHA ................................................................. 51

5.2

A BATALHA .................................................................................................. 56

6

CONCLUSÃO............................................................................................... 76

7

FONTES ....................................................................................................... 80

8

REFERÊNCIAS ............................................................................................ 81

8

1 INTRODUÇÃO Dentro do Reino de Portugal, o século XIV foi um período conturbado marcado por conflitos políticos entre a própria nobreza, desencadeando assim uma série de transformações, reestruturação, e adaptação perante o rei e a sociedade. Tais processos tiveram seu início a partir do reinado de D. Dinis (1279-1325). Assim, o primeiro capítulo tem como objetivo apresentar o contexto do reino de Portugal e suas vicissitudes a partir do reinado de D. Dinis, onde o seu intuito era evitar que a nobreza continuasse a usufruir demasiadamente de honras e direitos senhoriais, porque julgava que era o rei quem deveria tomar as decisões como árbitro maior. Além da visualização do contexto durante o reinado de D. Dinis, o primeiro capítulo tem sua continuidade também na apresentação contextual do reinado de Afonso IV (1325-1357), que assume após a morte de D. Dinis. No entanto, é importante destacar que será abordada a conjuntura de seu reinado até o ano de 1340, quando ocorre a Batalha do Salado, que é o tema central deste estudo, e cumprindo assim o primeiro objetivo. Portanto, para o primeiro capítulo, foram utilizados como principais referenciais teóricos os autores José Mattoso, onde seus estudos abrangem de forma detalhada o período a ser analisado referente à Historia de Portugal; apontando que se caracterizou uma acentuação do processo de concentração do poder político na pessoa do rei. Para avaliar este quadro, também serviram os estudos de Joaquim Veríssimo Serrão. Serviram como fonte primária, assim como as crônicas do rei D. Dinis e D. Afonso IV, ambas de Ruy de Pina, escritas no século XV, pois apesar de servirem como biografias destes reis também serviram para retratar os acontecimentos da época referente. Convém destacar também que foram utilizados diversos artigos, teses e dissertações que possibilitaram maior explanação acerca do conteúdo. Após ser trabalhado no primeiro capítulo o contexto de Portugal entre o final do século XIII até meados do século XIV, passamos para o segundo capítulo, o qual tem como objetivo trazer à luz o conceito de aristocracia e a estruturação da nobreza durante o período da Baixa Idade Média em linhas gerais. Portanto, utilizando como material de apoio a obra chamada A Sociedade Feudal, escrita por Marc Bloch, As Três Ordens ou o Imaginário do Feudalismo, da autoria de Georges Duby

9

forneceram assim elementos suficientes para compreender além do próprio significado de aristocracia, também como se dava a estratificação da mesma. Assim, em um segundo momento foi direcionado a atenção exclusivamente para a nobreza medieval portuguesa no período já mencionado. Nesse sentido, o segundo capítulo irá averiguar a transformação desta nobreza, que anteriormente a política de centralização régia, estava organizada para a guerra e o processo de reconquista cristã; para posteriormente se reorganizar após o fim das operações de reconquista, que servirá de gancho para o próximo capítulo. Assim, referente à nobreza medieval portuguesa, foi utilizado novamente duas obras de José Mattoso: principalmente sua obra intitulada Ricos-Homens, Infanções e Cavaleiros, e a outra: A Nobreza Medieval Portuguesa: a família e o poder. Também serviram de apoio para este momento, a pesquisa feita por Adriana Mocelim de Lima, intitulada “A Nobreza Medieval Portuguesa no Livro de Linhagens do Conde Pedro de Barcelos”, e diversos artigos sobre o tema. Não podemos deixar de mencionar também Adeline Rucquoi, que com o seu livro História Medieval da Península Ibérica contribuiu em diversos momentos deste estudo. Já para o terceiro e último capitulo, tomamos como ponto de partida a questão referida no capítulo anterior, onde é possível visualizar que a nobreza medieval portuguesa estava inserida no processo de Reconquista cristã. Assim, num primeiro momento, iremos nos debruçar para esta questão, buscando esclarecer o que este processo representou e quais suas motivações, tendo como objetivo identificar o ideal de Cruzada e Reconquista presente na sociedade portuguesa no período do século XIV. Após verificarmos este processo de Reconquista, partiremos para o objeto central deste estudo: A Batalha do Salado de 1340. Esta batalha foi um episódio marcante na história, pois se trata do reflexo de uma mentalidade ainda presente na Península Ibérica que remete ao processo de Reconquista cristã. Tal processo demonstrou que havia uma mentalidade de cruzada-cavaleiresca pertencente à nobreza portuguesa; a qual demonstrava este paradigma também como um caráter sagrado, além de evidenciar as relações sociais e de poder desta nobreza. Diante deste quadro é que se apresentam os questionamentos que serviram de problemáticas para este estudo:

10

a) Quais os papéis da nobreza e da monarquia tardo-medieval na Batalha do Salado? b) Quais fatores explicam e justificam a presença do relato desta batalha no Livro de Linhagens do Conde Pedro de Barcelos? No anseio de responder tais questões, será apresentada neste terceiro capítulo a narrativa da Batalha do Salado, que está inserida no título vinte e um do Livro de Linhagens do Conde Pedro de Barcelos. Além disso, esta narrativa serviu como fonte primária para este estudo, pois é através dela que tal batalha é lembrada, e assim, especialmente neste sentido que temos por objetivo analisar a Batalha do Salado e sua narrativa como peça chave para enaltecer a nobreza da época. Assim, como referencial teórico para este capítulo derradeiro, além dos já citados anteriormente, também utilizamos principalmente a obra de Ricardo da Costa: A Guerra na Idade Média: um estudo da mentalidade de cruzada na Península Ibérica; tal obra demonstra a mentalidade de cruzada no imaginário cavaleiresco ibérico durante a fase de Reconquista e de qual forma esta mentalidade cruzadística é utilizada ao longo do período. Também foram fundamentais os estudos de Fátima Regina Fernandes que contribuiu com diversos artigos referentes ao tema. Após apresentada a estrutura em que este estudo está organizado, além de trazer não só os autores que servirão como referencial teórico, mas também os objetivos a serem cumpridos bem como a solução das problemáticas; passaremos a seguir para o primeiro capítulo, trazendo assim o contexto de Portugal nos reinados de D. Dinis e D. Afonso IV.

11

2 CONTEXTO: O REINO DE PORTUGAL (1279-1340) Iniciaremos o primeiro capítulo fazendo uma contextualização do Reino de Portugal durante o período que vai do início do reinado de D. Dinis em 1279 e seu término em 1325, quando este falece e quem assume o trono é seu filho Afonso, tornando-se assim o Rei Afonso IV, o qual irá reinar de 1325 até 1357, ano em que morre. Porém, convém destacar que iremos estudar a conjuntura de seu reinado até o ano de 1340, quando ocorre a Batalha do Salado, a qual será trabalhada posteriormente. A necessidade de se contextualizar o reino português durante este período mencionado se dá mediante o intuito de compreender o que se passava em Portugal sobre diversos aspectos – políticos, sociais, religiosos e econômicos; assim como a relação com os reinos vizinhos. Diante das observações supracitadas, passaremos a partir de agora a estudar o reinado de D Dinis. 2.1 D. DINIS (1279-1325) Após a morte de Afonso III1 quem assumiu o trono português foi o Infante e herdeiro Dinis, o qual teve ascensão à coroa portuguesa em 1279, tornando-se o sexto rei de Portugal. Já nos primeiros anos de seu reinado D. Dinis demonstrou êxito e astúcia que herdara do pai ao consolidar uma aliança com o reino de Aragão mediante um casamento entre ele e Isabel, filha de Pedro III 2 rei de Aragão. Este feito demonstrou que:

_______________ 1

Afonso III de Portugal (1210-1279), também conhecido como O Bolonhês por ter se casado com a condessa Matilde II de Bolonha, é filho de Afonso II e Urraca de Castela. Assumiu o reino de Portugal em 1245 após seu irmão Sancho II ser deposto, vai reinar até sua morte em1279, dando lugar a D. Dinis. Durante seu reinado comandou o processo de Reconquista, que em virtude desta em 1249 incorporou o território do Algarve ao reino. No ano de 1253, desposou D. Beatriz, filha de Afonso X de Castela e por este motivo, envolveu-se em conflitos com a Igreja. Já no fim de seu reinado novos conflitos com a igreja causaram sua excomunhão em 1268 pelos arcebispos de Braga e Porto, além do papa Clemente IV. Mais tarde em 1279 buscou a reconciliação com a Igreja restituindo a esta tudo o que havia confiscado, porém ainda com a pena de interdito do reino. Morreu em 1279 e foi sepultado no mosteiro de Alcobaça. RUCQUOI. Adeline. História Medieval da Península Ibérica. Lisboa. Editorial Estampa, 1995. Op. Cit., p. 195-279. 2 Pedro III de Aragão (1239-1285), cognominado O Grande, assumiu o trono em 1276 e reinou até 1285. Filho de Jaime I e Iolanda da Hungria, casou-se com Constancia de Hohenstaufen em 1262, a

12

tratava-se de uma aliança valiosa, porque Aragão acabava então de adquirir uma importância fundamental na economia e na política mediterrânica e porque Pedro III (1276-1285) e, sobretudo seu filho, e irmão de Isabel, Jaime II (1291-1327) exerceram um papel de primeiro plano na diplomacia peninsular. (MATTOSO, 1997. p.128)

Tratando-se de uma estratégia política, as negociações para o casamento foram lentas, pois os dois reinos – de Portugal e Aragão – precisavam certificar-se de que o mesmo não se tratava apenas de uma manobra política, o que caracterizou um período de intensas trocas de informações entre os reinos. As negociações: iniciadas em 1280, com o envio de uma embaixada portuguesa a Aragão, incluíram, no ano seguinte, uma embaixada aragonesa à corte de D. Dinis; depois, em Abril de 1281, a generosa carta de dotação da futura rainha com o senhorio de três vilas e a segurança de doze castelos; mais tarde, em Fevereiro de 1282, em Barcelona, o casamento por procuração. E finalmente em Junho seguinte, em Trancoso, as bodas dos dois esposos. (MATTOSO, 1997, p.128)

Com o casamento consolidado, Portugal passava a exercer maior presença no cenário político da Península Ibérica, tendo em vista que Aragão exercia uma importância econômica e política na região mediterrânica. Para o reino aragonês, tratava-se de uma aliança importante, pois “trazia a possibilidade de unir-se a um reino forte, que poderia ser de grande auxilio em sua política externa”. (MOCELIM, 2007. p. 21) D. Dinis herdou de seu pai também alguns problemas graves que necessitavam de serem resolvidos com certa urgência, como é o caso do conflito com o alto clero e a Santa Sé, em virtude do qual foi lançado um interdito geral. Mesmo com a necessidade de se resolver esta questão, o processo de apaziguamento entre Portugal e a Igreja foi complicado e demorado, tendo em vista que o conflito se estendia desde o reinado de seu pai. Então com a morte de Afonso III, houve a possibilidade de solucionar tal conflito. As negociações entre a Coroa portuguesa e a Igreja iniciaram-se novamente em 1281, as quais: parece terem começado por iniciativa de D. Dinis, que se reuniu na Guarda com os bispos que então haviam no reino. Aí, depois de se terem lido os documentos emitidos por Gregório X, os bispos debateram durante várias qual era herdeira de Manfredo da Sicilia, adquirindo então os direitos sobre a ilha. Durante todo o seu reinado, centrou-se na expansão da Coroa de Aragão no Mediterrâneo. Uma de suas importantes realizações foi solucionar alguns dos problemas internos concedendo, em 1283, a formação da União aragonesa, e prestando juramento ao "Privilegio General", que defendia os privilégios da nobreza. Morreu em 1285 na cidade de Vilafranca de Penedès e deixou como herdeiro Afonso III (1265-1291), porém este por não deixar herdeiro, quem irá assumir o trono será o secundogênito da sucessão Jaime II. Id. Op. Cit., p. 195-279.

13

semanas as questões pendente, provavelmente já sem a presença do rei. Chegaram finalmente a um texto de acordo, que lhe foi apresentado em Évora em Abril de 1282. Daí, estando reunido em cortes, escreveu ao papa, então já Martinho IV, a pedir que o ratificasse. A resposta demorou. Veio só em 1284, com a exigência de numerosas emendas e instruções a dois delegados apostólicos, o bispo de Leão e o arcediago de Ledesma, encarregados pelo papa de persuadir o rei a aceitar a nova versão . (MATTOSO, 1997, p. 127)

O processo de aproximação e reconciliação referido entre o clero e o rei ainda estava longe de se consolidar, pois nos próximos anos, o rei D. Dinis demonstrou não tratar com prioridade este assunto. Mediante a presença dos delegados apostólicos enviados por Martinho IV, reuniu-os no ano seguinte, em 1285, na Corte de Lisboa. Então os bispos escreveram ao novo papa Honório IV, afirmando que o monarca português “teria mandado ler os artigos propostos por Martinho IV sem a presença do clero e apenas para declarar que a ordenação papal havia caducado com a sua morte”. (MATTOSO, 1997, p. 127) No entanto, o rei resolveu nomear dois embaixadores seus para negociarem com a Santa Sé, a qual por ordens do papa foram três cardeais para se reunir com os embaixadores portugueses. Porém não conseguiram chegar a um acordo, pois o papa Honório IV veio a falecer em 1287 e foi substituído por Nicolau IV. Finalmente em 1289, “as duas partes chegaram a um acordo, firmado em um texto com 40 artigos, que foram aprovados pelo papa em sete de março do mesmo ano” (MATTOSO, 1997, p. 127), conseguindo assim, o encerramento dos problemas da Coroa com a Igreja. Ao mesmo tempo em que D. Dinis buscava resolver os conflitos com a Igreja, também tratava de outros assuntos políticos, em especial suas medidas relativas “à pronta aplicação da justiça, como forma de conter a criminalidade, contribuindo para o sossego das populações, (...), procurava uma ação mais justa, estando mais disposto a proteger os povos do que exercer dureza sobre eles” (SERRÃO, 1979. p.247). Neste cenário, o rei D. Dinis estava dando continuidade ao trabalho que seu pai havia começado que era criar bases sólidas para o funcionamento do reino. Na esfera político-administrativa, D. Dinis tratou de recuperar os direitos senhoriais que eram sonegados pela nobreza e aperfeiçoar assim a justiça do reino. Ao direcionar para si a concentração do poder econômico e político mediante as inquirições gerais, as quais: destinam-se a fazer o cadastro dos nobres de seus rendimentos senhoriais. Mesmo àqueles que são de origem pública, como os que derivam de

14

prestações de natureza fiscal, se equiparam aos exigidos de virtude da autoridade feudal. (MOCELIM, 2007. p.29)

Portanto fazendo uso das inquirições, ao rei: permitiu-lhe,combater eficazmente o poder senhorial, embora seja difícil dizer até que ponto se limitou a impedir a sua natural proliferação ou conseguiu mesmo reduzi-lo ou atrofiá-lo de maneira efectiva. A luta travada entre a coroa e os detentores do poder senhorial constitui, de facto, um dos aspectos mais mercantes do reinado e da actuação política de D.Dinis. Demonstrando uma grande capacidade de decisão, utilizou os instrumentos jurídicos ao seu dispor para fazer prevalecer a sua vontade e demonstrou que não hesitava em pegar em armas quando era necessário para atingir os seus objectivos. (MATTOSO, 1997, p. 136)

Sendo assim, “o seu reinado teve a marca da primeira administração completa que houve em Portugal, na elaboração de leis assentes na realidade política, econômica e social, assim como na obrigação do seu integral cumprimento”. (MOCELIM, 2013. p.255) Diante deste cenário, observou-se que durante todo o seu reinado não admitia que a nobreza tivesse seu princípio de soberania e que, somente o rei tinha este atributo, proibindo assim, que o mesmo fosse utilizado no poder senhorial pela nobreza. Ainda nos primeiros anos em que D. Dinis passou a exercer o seu reinado, necessitou dedicar uma atenção cuidadosa a questões familiares em relação ao seu direito de trono. Tais questões envolviam o Rei com o seu irmão, o infante D. Afonso. O conflito entre os irmãos dava-se logo após a morte de D. Afonso III, em referência ao direito de sucessão do trono. Afonso III foi casado duas vezes, a primeira com a condessa de Bolonha chamada Matilde, e a segunda vez com Beatriz de Guillen, filha bastarda do rei de Castela Afonso X3, estabelecendo assim uma relação política com o reino vizinho. _______________ 3

Afonso X de Castela nasceu em 1224, sendo primogênito de Fernando III de Castela e Isabel de Hohenstaufen e recebeu como cognome “O Sábio”. Ainda Infante, participou na tomada de várias praças andaluzes, entre as quais Múrcia, Alicante e Cádis, na reconquista durante o reinado do seu pai, Fernando, O Santo. Porém enquanto rei teve que renunciar à posse do Reino do Algarve pelo Tratado de Badajoz de 1267. Na política interna, enfrentou diversas rebeliões, das quais se destacam a dos mudéjares (mouros em territórios controlados pelos cristãos) em 1264 e o problema sucessório nos últimos anos do seu reinado. Foi casado desde 1246 com Violante de Aragão, filha de Jaime I, o Conquistador. O seu primogênito legítimo e herdeiro do trono, Fernando de La Cerda, morreu em 1275. Afonso X passou a defender os direitos sucessórios do seu neto primogénito de Fernando, Afonso de Lacerda, mas D. Sancho, seu segundo filho e irmão de Fernando, reclamou a sucessão para si, recebendo poderosos apoios à sua causa. Apesar de ter deserdado o seu filho Sancho por decreto a 8 de Novembro de 1282, este viria a ser coroado como Sancho IV após a sua morte em 1284. No meio cultural, realizou a primeira reforma ortográfica do castelhano, idioma que adoptou como oficial em detrimento do latim. È atribuído a Afonso X a autoria da A Primeira Crónica Geral de

15

Fruto do primeiro casamento, D. Dinis nasceu em 1261 sendo, portanto, primogênito de D. Afonso III e: considerava-se o legítimo sucessor; já o infante Afonso, secundogênito, alegava que, quando Dinis nascera, o casamento estava sob condenação papal, em função do grau de parentesco que ligava Afonso III à Beatriz, filha de Afonso X de Castela. Para que pudesse afastar qualquer possibilidade do Infante Afonso assumir o reino, Dinis e seus partidários consideraram o casamento do Infante Afonso com Violante ilegítimo, em função do grau de parentesco que havia entre eles. (MOCELIM, 2013, p.259)

Este problema de sucessão do trono entre os irmãos acabou ganhando proporções maiores e tornando-se uma questão de senhorio. O Infante Afonso herdou de seu pai: os senhorios de Portalegre, Marvão, Arronches e castelo de Vide, propriedades situadas na região fronteiriça de Portugal com Castela, territórios livres de jurisdição régia, podendo o Infante Afonso transmitir esses bens, quando morresse aos seus descendentes. (MOCELIM, 2013, p.259)

No casamento com Violante4 o Infante Afonso teve três filhas: Isabel, Constança e Maria; as quais se casaram com importantes famílias castelhanas que estavam envolvidas na disputa pelo trono. Fato este que acabou por aumentar as desavenças entre Afonso e D. Dinis, culminando em um conflito que ocorre em três períodos, e a paz entre os irmãos sendo estabelecida somente em 1299. O primeiro conflito surge quando em 1281 o Infante Afonso resolve cercar a vila de Vide fortificando-a com muros e erguendo uma torre além de transformar a vila em um Castelo sem a autorização régia. Provavelmente: D. Dinis tivesse, sobretudo pretendido evitar a constituição de um potentado feudal hereditário, especialmente perigoso para a coroa por estar situado na fronteira entre Portugal e Castela, e poder, por isso mesmo, aliar-se com o reino vizinho contra o seu senhor. (MATTOSO, 1997. p.136)

Este conflito só foi resolvido no ano seguinte por meio de um acordo entre os irmãos em Estremoz, confirmada pelo Infante que: além de prometer derrubar as fortificações militares que tinha mandado fazer, comprometeu-se a ser armado cavaleiro pelo rei e a ficar seu vassalo durante toda a vida, excepto se viesse a obter algum reino ou condado fora Espanha, em castelhano Primera Crónica General ou Estoria de España entre 1260 e 1274. Idem, p. 177-268. 4 Violante de Aragão nasceu em 1236, filha da princesa Iolanda da Hungria e de Jaime I de Aragão, casou em 1246 com Afonso X de Leão e Castela e morreu em 1301. Idem. p.328.

16

de Portugal. O rei, por seu lado, aumentaria o seu rendimento anual em 35000 libras, que seriam pagas em terras, dinheiro ou panos. (MATTOSO, 1997, p.136)

Ao contrário das inquirições feitas por seu pai em 1220 e 1258 que destinavam “principalmente a registrar os foros e rendas pagos a el-rei, embora mencionassem também aqueles que tinham sido sonegados por fidalgos, ordens militares ou senhores eclesiásticos” (MATTOSO, 1997, p.137), a inquirição de 1284 tratava: principalmente de averiguar de que maneira tinham sido adquiridas e transmitidas aos actuais detentores as honras dos fidalgos. Nelas se relatam também problemas de jurisdição, como as funções, direitos, rendimentos e formas de designação dos mordomos e juízes régios, assim como casos anteriores de demandas e conflitos ocorridos entre nobres e representantes do rei. (MATTOSO, 1997, p.137)

Foi diante deste cenário que ocorreu o segundo conflito no mesmo ano de 1284 ao término da inquirição, onde os nobres não se contentaram com a atitude ofensiva da administração central. Nas cortes de 1285 os nobres protestaram contra o rei em virtude da quebra de imunidade senhorial. Então “foi talvez o clima de contestação criada nesta ocasião que incitou o Infante D. Afonso a desencadear uma verdadeira revolta contra D. Dinis” (MATTOSO, 1997, p.137), chegando a suscitar parte da nobreza a voltar-se contra o Rei em revoltas armadas. Assim, o Infante D. Afonso aliou-se a Álvaro Nunes de Lara, que sustentava uma guerra contra o rei de Castela, Sancho IV, sendo a região fronteiriça entre os dois reinos o principal ponto de resistência. Em decorrência da associação entre o Infante D. Afonso e Álvaro Nunes de Lara, os Reis de Portugal e Castela se associaram para combatê-los entre outubro e novembro de 1287 quando D. Dinis e Sancho IV cercaram o Infante português em Arronches, fazendo com que o infante devesse submeter-se a: assinar um acordo na cidade de Badajoz em meados de dezembro. Aí, além de renovar os compromissos feitos em 1282, obrigava-se a mandar seus alcaides dos castelos de Marvão e de Portalegre que prestassem homenagem ao rei, como garantia de que não utilizaria contra ele estas duas importantes fortalezas. Por outro lado, resignava-se a trocar a vila de Arronches pela de Armamar, perto de Lamego, sinal evidente de que D. Dinis estava preocupado com a eventualidade de revolta de uma praça-forte perto da fronteira. (MATTOSO, 1997, p.137)

A última etapa deste confronto com seu irmão ocorreu em 1299, quando o rei D. Dinis contando com a ajuda das ordens militares de Avis e do Templo, nos meses

17

entre maio e outubro deste mesmo ano; tratou de cercar o Infante Afonso em Portalegre. Além de contar com a ajuda das ordens militares, o Rei estabeleceu um acordo com Sancho IV de Castela o casamento de seu filho primogênito D. Afonso 5 com a infanta D. Beatriz, filha de Sancho IV; assim como o de sua filha D. Constança com D. Fernando6, futuro herdeiro da coroa de Castela. Assim, o acordo estabelecido com os reis D. Dinis e Sancho IV: pretendia liquidar a ambição dos genros de D. Afonso, que se haviam rebelado contra Sancho IV e se serviam dos referidos castelos para mover guerra ao próprio rei. O que deu origem a que D. Dinis, em 1299, fosse cercar Arronches, Marvão e Portalegre, onde o irmão ao tempo se achava, levando-o a assinar um acordo para que muito contribuiu a rainha Santa Isabel. Foi assim que o infante D. Afonso resignou às quatro vilas para receber, a título de indemnização, Sintra, Ourém e outros lugares da comarca de Lisboa. (SERRÃO, 1979. p.249)

A partir deste acordo assinado entre D. Dinis e o Infante Afonso: o que estava em causa para o nosso monarca não era o reconhecimento dos direitos senhoriais do irmão, mas o justo receio de que, com base nos castelos do Alentejo, este viesse a criar problemas à integridade do Reino que o Tratado de Alcanices havia praticamente definido. (SERRÃO, 1979, p.249)

_______________ 5

Afonso XI de Castela nasceu em 1311, sendo filho de Fernando IV e Constança de Portugal, sendo, portanto neto da Rainha Santa Isabel e o rei D. Dinis de Portugal; no ano seguinte foi coroado como rei tendo apenas alguns meses de vida. Portanto o reino ficou sob a regência de D. Maria de Molina até o ano de 1321 quando esta morre. Afonso XI assumiu a coroa de Castela em 1325 quando atingiu a maioridade. Já nos primeiros anos restaurou a ordem no reino, exerceu uma política enérgica frente a uma nobreza revoltada. Procurou melhorar a administração régia, criando magistrados urbanos nomeados pelo poder real; conduziu uma política prudente no conflito entre a França e a Inglaterra. Armado cavaleiro no mosteiro real de Las Huelgas em Burgos a 1331, iniciou imediatamente um conflito contra o seu sogro Afonso IV de Portugal, que cessaria com a aliança entre os dois monarcas para a Batalha do Salado. RUCQUOI. Adeline. História Medieval da Península Ibérica. Op. Cit.p. 195-279 6 Filho de Sancho IV e D. Maria de Molina, Fernando nasceu em dezembro de 1285 em Sevilha. Assumiu o reino após a morte de Sancho IV, porém como era menor de idade, D. Maria de Molina assumiu a regência até 1301, quando ele atinge a maioridade. No período da regência houve alguns conflitos com a nobreza pela questão da sucessão do trono, pretendido para o seu primo Afonso de Lacerda por uma facção de nobres encabeçada pelo seu tio, o Infante D. João. Esta pretensão fora originada quando o seu pai Sancho IV se apoderara do trono legado a Afonso de Lacerda, em desrespeito a vontade testamentária do rei anterior Afonso X. Havia também conflitos com Portugal, onde o rei D. Dinis acabou por aceitar terminar a invasão em troca das vilas de Serpa e Moura. Pelo Tratado de Alcanises firmou a Paz com Castela. Fernando IV Casou-se em 1302 na cidade de Valladolid com Constança, infanta de Portugal, filha da Rainha Santa Isabel e do rei D. Dinis I de Portugal. Seu reinado foi apoiado numa política de cedências. Uma das decisões importantes do novo rei foi o acordo de fronteiras com Jaime II de Aragão em 1304, a Sentença Arbitral de Torrellas: estabeleceu-se o limite para Castela na margem direita do rio Segura, incluindo a cidade de Múrcia, conquistada por Jaime de Aragão a Fernando de Castela com o auxílio de Afonso de Lacerda. RUCQUOI. Adeline. História Medieval da Península Ibérica. Op. Cit.p. 177-279.

18

Após o desfecho dos conflitos com o irmão, o rei D. Dinis saiu com seu poder fortalecido perante todos, o que revela uma postura firme contra as jurisdições senhoriais. Não obstante D. Dinis dedicar esforços a questões administrativas internas, precisou ainda envolver-se na política externa com seus vizinhos peninsulares. Foi o caso da questão de sucessão de trono em Castela, após a morte de Sancho IV. Neste momento, as questões políticas internas de Castela se aqueceram, pois surgia aí um problema de tutoria do herdeiro do trono, que se tratava de D. Fernando, o qual possuía somente nove anos quando seu pai morreu. Assim sendo, a mãe do príncipe castelhano, Maria de Molina “teve a tutoria questionada pelos infantes: Henrique (irmão de Afonso X), João (irmão de Sancho IV), Afonso e Fernando de La Cerda, filhos do primogênito de Afonso X.” (MOCELIM, 2013. 261) Observando a instabilidade política em Castela, os reis D. Dinis e Jaime II de Aragão desejavam demarcar suas fronteiras com o reino vizinho além de enfraquecê-lo politicamente, utilizando por meio de campanhas contra Castela. Desta forma, para Portugal agir desta maneira representaria: por um termo sobre as disputas com Castela pelo Algarve, até com possibilidades de avançar suas fronteiras sobre Badajoz e Andaluzia, [...], para Aragão, uma Castela enfraquecida significava um empecilho a menos para que o Reino aumentasse sua área sobre o Mediterrâneo e realizasse a conquista do Reino de Múrcia.” (GIMENEZ, 2005. p.262)

Com o reino de Portugal alcançando seu interesse, restava Aragão posicionar-se nesta situação. Então, “Jaime II aliou-se à França e reconheceu Afonso de La Cerda como único herdeiro do trono castelhano.” (GIMENEZ, 2012. p.102) Com esta atitude, Jaime II rompeu um acordo político de quatro anos firmado por uma aliança matrimonial, uma vez que: el matrimonio con la infanta Isabel de Castilla, hija de Sancho IV y de Da. Maria de Molina, a pesar de haber ostentado dicha infanta el título de reina de Aragón durante el tiempo que vivió en esta corte, quedo sin efecto por renuncia del monarca antes de haberse consumado. (MARTINES, 1948. p.3)

Por sua vez, os infantes castelhanos buscaram formar alianças cada qual de acordo com seus interesses e possibilidades. O Infante: D. João busca o apoio de D. Dinis, que o reconhece como rei, o que leva o novo tutor do pequeno rei, o infante D. Henrique, a comprar posterior

19

neutralidade do soberano português mediante a promessa de lhe entregar as povoações de Moura, Serpa Aroche e Aracena, de demarcar a fronteira luso-castelhana em litígio e de renovar a promessa do casamento de Fernando com D. Constança. (MATTOSO, 1997, p.129)

Para firmar este compromisso, em 1295 os dois reis se encontram em Cidade Rodrigo junto à presença de Maria de Molina, a qual serviu de juíza neste episódio. Posteriormente, “o infante D. João aceitava a autoridade de Fernando IV e ratificava este acordo.” (MATTOSO, 1997, p.129) Durante este episódio, a inexperiência política do jovem monarca castelhano e as divergências que ocorriam internamente representaram para Portugal uma oportunidade de reconsiderar suas alianças políticas. No ano seguinte ao acordo, isto é, em 1296, novamente os infantes que reclamavam para si o trono castelhano promovem uma tentativa de retirar o trono de Fernando IV. Assim, Segundo José Mattoso, (1997, p.129) “os infantes D. João e D. Afonso de La Cerda partilham o reino entre si, atribuindo Leão, Galiza e Astúrias ao primeiro, Castela e Andaluzia ao segundo e Múrcia ao rei de Aragão”. Junto a estes dois infantes, quem resolve dar apoio é o D. Dinis, ao enviar centenas de cavaleiros para ajudar o infante D. João. Então os três: marcharam de Salamanca sobre Tordesilhas e Simancas com o intuito de conquistar Valhadolid. Dão-se também combates entre castelhanos e portugueses na fronteira alentejana. Mas a resistência e a diplomacia castelhanas, organizadas por D. Maria de Molina, permitem vencer ou resistir a todos os adversários. (MATTOSO, 1997. p.129)

Entretanto, a tentativa dos dois infantes que contou com a ajuda do monarca português, conforme mencionado não surtiu efeito, pois “devido a diplomacia dos dois reinos, Portugal e Castela reaproximaram-se e assinaram, em 1297, um novo tratado de cooperação e amizade”; (MATTOSO, 1997. p.129) foram ainda a partir deste Tratado, firmando na cidade de Alcañices, renovadas as antigas promessas de casamentos já citadas anteriormente entre Fernando de Castela e D. Constança filha de D. Dinis; assim como a infanta Beatriz, irmã do jovem rei castelhano com o outro filho de D. Dinis, o futuro rei Afonso IV. Foi também fruto deste tratado, as demarcações do território de Portugal, “fronteira esta que manter-se-ia até hoje, com pequenas alterações”. (MARQUES, 1996. p. 110) Por último, necessitava legitimar os casamentos definidos. Então, em março de 1300:

20

D. Dinis voltou a encontrar-se em Cidade Rodrigo com os soberanos de Castela, para com eles repartir os custos das bulas que era necessário obter em Roma para a legitimação de Fernando IV e para as dispensas de parentes dos dois casamentos combinados em Ancañices, importante para a legitimação da autoridade do soberano castelhano. De facto, no ano seguinte, Fernando IV atingia a maioridade e recebia as bulas, celebrava as suas bodas com D. Constança em Janeiro de 1302. (MATTOSO, 1997, p.130)

A partir daí, D. Dinis volta suas atenções para o seu próprio reino, visando dar continuidade às questões administrativas, visando combater o poder senhorial. No ano de 1301, D. Dinis promove novas inquirições: Em quase todo o Minho e em parte da Beira: depois, em 1303, de novo no Minho e em Tás-os-Montes; e finalmente, em 1307, nestas mesmas províncias e na Beira. Entretanto, em Maio de 1305, promulgava a lei que proibia os nobres de armarem cavaleiros os vilãos dos concelhos, declarando que só o rei podia exercer este privilégio. (MATTOSO, 1997. p.138)

Sendo assim, para ser mais efetiva a sua política de fortalecimento do aparelho administrativo e até mesmo o papel do estado, o rei passou a contar com as relações estabelecidas entre seus filhos bastardos com membros da nobreza portuguesa mediante os acordos matrimoniais, fazendo com que retornasse á coroa importantes senhorios. Nota-se, portanto, que: uma das estratégias usadas pelos monarcas portugueses durante toda a idade média para ampliar e solidificar sua permanência no poder apoiava-se nos favores que recebiam de uma nobreza constituídas por linhagens de bastardia régia. Essa pratica política mostrou-se mais significativa ainda quando os filhos bastardos dos reis constituíram-se em aliados importantes para auxiliar os monarcas nos seus projetos políticos. (GIMENEZ, 2005. p.70)

Foi este o caso quando o rei D. Dinis recebeu o apoio no seu processo de centralização por Afonso Sanchez. O monarca português teve com diferentes mulheres em torno de cinco a seis filhos bastardos: D. Afonso Sanches, que depoys ho chamarom d Albuquerque, que este D. Afonso foy depoys casado com Dª. Branqua, filha de Pero Anes de Portugal, filho de D. Yoão dAbodym, e de Dª. Constamça Mendez filha de . Martim Garcia de Souza, e de Pedro que depojs foi conde de Portugal, e D. João Afonso ouue ElRey de huma boa dona do Porto; e D. Fernando Sanchez, e Dª Marja, que casou com D. Yoão de La Cerda. E outra Dª Marja, que foi monja de Odiuelas. (PINA, [1500]. p.17)

Dois dos filhos de D. Dinis ocuparam cargos importantes no reino português. Foi o caso de Afonso Sanches, que em 1312 foi nomeado mordomo-mor, chegando

21

assim a possuir um dos mais altos cargos dentro da hierarquia política e social do reino. O outro filho trata-se de Pedro Afonso, que herdou o condado de Barcelos, tornando-se assim o terceiro conde de Barcelos e posteriormente, em 1317, foi nomeado Alferes-mor, recebendo também funções militares. Portanto, D. Dinis colocou seus filhos bastardos em cargos que até então eram somente destinados a membros da alta nobreza: Afonso Sanches foi mordomo Mor entre 1312 e 1323; Pedro Afonso foi o terceiro conde de Barcelos, nomeado em 1314 e Alferes Mor em 1315 e 1317; João Afonso foi Alferes Mor entre 1318 e 1325 e Mordomo Mor entre 1324 e 1325. (MOCELIM, 2007, p.17)

Tais movimentos políticos de D. Dinis fizeram com que os nobres, os quais vinham desde 1285 se opondo ao rei de maneira passiva, ou através de apelos judiciais resolvessem; por volta de 1316, a se opor ao monarca de forma mais direta, recorrendo então ao filho de D. Dinis, o Infante Afonso, recurso para: torná-lo o seu leader, para que a oposição se transformasse em guerra civil. Era a reação a uma política centralizadora que não havia sabido utilizar com tanta habilidade como no reinado anterior os apoios de uma parte da nobreza. (MATTOSO, 1997, p.137)

Assim, em 1317, o infante Afonso resolve demonstrar oposição ao seu pai abertamente, em resistência a sua política, atraindo para si a nobreza descontente com as ações do rei e desencadeando assim uma revolta que dois anos mais tarde, isto é, em 1319, tornar-se-á uma guerra civil que durará até 1324. 2.2 GUERRA CIVIL DE 1319-1324 As hostilidades entre D. Dinis e o príncipe Afonso ganharam tantas proporções que no ano de 1319 o herdeiro passou a exigir do rei que lhe fosse entregue a justiça do reino. Os fatores que contribuíram para tal atitude foram em primeiro lugar pelas constantes queixas da nobreza “que estava descontente e se sentia prejudicada diante da forma como o rei vinha fazendo uso do poder judicial para reprimir o abuso dos monarcas”. (MOCELIM, 2007. p.36) Portanto, esta nobreza depositava esperanças no Infante Afonso. Por seu turno, o Infante Afonso demonstrou descontentamento pela atitude de seu pai conceder cargos importantes aos seus filhos bastardos, como foi o caso de Pedro Afonso ter recebido em 1314 o condado de Barcelos e o cargo de Alferes Mor. Então esta atitude do rei D. Dinis

22

representava, aos olhos do Infante Afonso, que o rei fez o que fez para afastá-lo do trono. Diante destas circunstâncias, o Infante Afonso recorreu para sua sogra e rainha de Castela, Dª. Maria de Molina, a qual escreveu uma carta destinada á D. Dinis pedindo para ele que: largasse o governo do Reyno ao Principe D. Affonso, com hombros para sustentar o pezo, que sem muyta opressaõ naõ poderião levar os de tão diferentes annos; sedo certo, que o deixar a coroa, não era deixar a vida; & ficando na cabeça de seu Filho, ficava menos perdida, que ganhada, [...], que mays honorifico era para sua Magestade o descansar, que o cahir; & mays gloriozo seria para sua coroa o perpetuala, que o perdela; imortalizando seu nome na duraçaõ da fama, que publicaria em todas as idades o discreto proceder de hum Rey, que pòde, & soube tanto, & mays, que a natureza, & a fortuna; poys a pezar da sorte, & do tempo deixava a hum Filho, que só nacera herdeiro. (JESUS, 1985, p.101)

D. Dinis, ao receber esta carta, se mostra afrontado e como represália, “resolveu acusar seu filho publicamente, apresentando-o em revolta aberta contra ele, num manifesto que mandou ler em Santarém em 1 de julho de 1320, no qual lhe fazia severas acusações” (MATTOSO, 1997. p.140). Entre as acusações, o rei também divulgou uma Bula feita pelo Papa João XXII que declarava a falsidade de um documento elaborado pelos aliados do Infante; o conteúdo deste documento também afirmava que o rei estaria disposto a legitimar o reino para seu filho bastardo Afonso Sanches, ao invés do próprio Infante. Além disso, a Bula papal também solicitava a paz entre as duas partes, orientando a união entre os vassalos do infante e o rei. O responsável nesta tentativa de reconciliação tratava-se de D. Geraldo Domingues, bispo de Évora. Porém a conversação de paz entre o rei e o infante não ocorreu, pois “em 5 de Março de 1321 o bispo foi assassinado por dois partidários de D. Afonso, Afonso Novais e Nuno Martins Barreto, junto da Igreja de Santa Maria de Estremoz” (PIZARRO, 2008. p.360), demonstrando assim que uma aproximação entre as duas partes não seria possível. Ao circular a Bula pelo Reino, D. Dinis procurou também, alertar aos partidários do filho, “o grave dano que estavam causando, por meio da violência e da mentira, para desacreditar a autoridade real”. (SERRÃO, 1979. p.264) Dois meses depois, o rei mandava ler em Lisboa um segundo manifesto contra seu filho, manifesto este que contava os diversos casos de assassinatos e má feitoria dos partidários do filho. Por sua vez, o Infante D. Afonso resolve então adotar uma postura mais ofensiva e direta. Para tanto, primeiramente tomou medidas preventivas a sua

23

família, isto é, envia sua esposa e seu filho Pedro para a cidade de Alcanizes, protegendo-os da guerra. Nesta altura dos acontecimentos o infante já ocupara a região de Leiria. O Infante Afonso contava com o apoio dos “bispos de Lisboa e do Porto, membros da nobreza de corte, outros pertenciam à segunda ou a terceira nobreza, sendo seus mais ativos partidários filhos segundos ou bastardos”; (MOCELIM, 2004, p. 9), onde estes últimos eram os protagonistas das ações mais violentas, dos crimes que o rei lhes atribuía e que pretendia castigar. Portanto, o infante recebe maior influência dos nobres da região ao norte do Rio Mondego, onde havia maior presença de forte presença senhorial. Já o rei D. Dinis tinha como partidários: três de seus filhos bastardos Afonso Sanches, João Afonso e Fernão Sanches, oficiais da corte, alguns nobres de segunda, o bispo de Évora, o deão do Porto, os mestres de ordens militares, poucos chefes de linhagens, fidalgos, filhos segundos além de indivíduos de pouca expressão e membros dos concelhos. (MOCELIM, 2004, p. 9)

Sendo assim, o Rei buscava seu apoio na região sul, onde havia maior concentração dos concelhos. De acordo com José Mattoso (1997, p. 172) “alguns membros da nobreza resolveram optar pela neutralidade da guerra, é o caso dos membros das famílias dos Teixeiras, Silvas, Cunhas, Correias, Albergarias e Limas”. Diversos membros destas famílias buscaram se distanciar da guerra, esperando o resultado final em posição de neutralidade. Tendo em vista que os conflitos estão em eminência de ocorrer e dadas às proporções que abrangem todo o reino, é evidente que os vizinhos peninsulares iriam prestar atenção e se envolveriam direto ou indiretamente neste conflito. Foi este o caso de Aragão. Primeiramente partiu do monarca português enviar cartas ao rei Aragonês, Jaime II, com queixas sobre o comportamento e intenções do seu filho Afonso; enviara junto à carta uma cópia do segundo manifesto. Como resposta, Jaime II escreve alegando que se havia um culpado pelo comportamento do filho e da distância entre o pai, tratava-se do próprio monarca. Como resposta, em oito de julho D. Dinis envia uma nova carta relatando dos acontecimentos no reino para o rei Aragonês, e que este ultimo, por sua vez responde em agosto: manifestando o comportamento de seu sobrinho e aconselhando prudência e bom senso a D. Dinis, informando-o de que enviaria proximamente um emissário para tentar a concórdia entre as partes, e efectivamente a 15 de

24

Setembro foi enviado a Portugal Frei Sancho de Aragão.(PIZARRO, 2008, p. 374)

Diante deste cenário, “em 17 de Dezembro, D. Dinis apresenta o seu terceiro manifesto, ainda em Lisboa. Nesta altura devia já pretender obter o apoio da opinião pública para a acção armada que, de facto, desencadeou logo a seguir” (MATTOSO, 1997, p. 140). Após apresentar o manifesto, o monarca também desterrou Dª. Isabel para a cidade de Alenquer, por desconfiar que a rainha estivesse apoiando o filho contra o governo do Rei. Este terceiro manifesto diferencia-se dos dois primeiros em alguns pontos: em primeiro lugar, o facto de dirigir este manifesto ao Concelho de Lisboa, demonstra que pretendia o apoio concelhio para as suas acções, em segundo lugar, os remoques que faz a intromissão da rainha e ao apoio que o infante várias vezes pedia ao rei de Aragão, dizendo que os acompanhavam o infante nada tinham que devesse à rainha, e também que o infante nada tinha que viesse de Aragão mas sim do rei seu pai, e terceiro e ultima afirmação do rei de que o infante pelos actos e atitudes, já não merecia a fidelidade de ninguém, porque o infante, pelas obras em que andou e anda e pelos seus cometimentos feitos até aqui, e que agora faz atacando o Rei, desnaturou-se do Rei e da sua terra e dos seus naturais. (PIZARRO, 2008. p.378)

Foi neste período que Frei Sancho chegou a Portugal para cumprir o que havia prometido Jaime II, de promover uma conciliação entre D. Dinis e o infante Afonso. Todavia, já era demasiado tarde, pois os atritos e desavenças entre os dois “avolumaram-se de tal forma que entre meados de dezembro de 1321, D. Afonso partiu com sua força de Coimbra em direção ao norte ocupando os castelos da Feira, Vila Nova de Gaia e do Porto.” (MATTOSO, 1997, p. 140) Mais tarde, tratou de atacar e cercar a cidade de Guimarães, local onde se encontrava refugiado o meirinho-mor do rei, Mem Rodrigues de Vasconcelos, o qual assumiu a responsabilidade de defender a cidade. Como resposta às investidas do infante, o rei D. Dinis retomou a cidade de Leiria, a qual havia “sido oferecida ao infante por traição do alvazil e antigo copeiromor do rei, Domingo Domingues e de outros cidadãos principais, o rei prendeu-os no mosteiro de Alcobaça, onde se tinham refugiado, e condenou-os a morte por traição.” (PIZARRO, 2008. p.384) Dando continuidade as suas investidas para retomar as cidades perdidas, o Rei dirigiu-se para Coimbra e a cercou em março de 1322.

25

Percebendo os avanços régios, o Infante resolveu abandonar o cerco que havia estabelecido em Guimarães e rumou para Coimbra a fim de intervir no cerco promovido pelo pai. Não obstante, o infante enviou um pedido de auxílio para o seu irmão, Pedro Afonso7, o qual ainda se encontrava exilado em Castela8. Respondendo ao chamado do irmão, o Conde regressou de Castela para ajudar o irmão além de resolver suas questões e reconciliar-se com o Rei, no intuito também de reaver seus bens que haviam sido tomados. Em função das proporções que esta guerra civil estava ganhando, o Papa João XXII, sentiu a necessidade de intervir e voltou a escrever para a Rainha Dª Isabel, pedindo para que esta se portasse como mediadora entre o infante Afonso seu filho, e o rei D. Dinis. Então, “quando as tropas do Rei e do Infante se encontraram nas proximidades de Coimbra, mesmo com alguns conflitos, iniciaramse as conversações de paz”. (MOCELIM, 2013, p. 277) Sendo assim, Dª Isabel que se encontrava em Alenquer, em função do banimento e desterro que havia recebido como penado próprio rei D. Dinis, deixa a cidade de Alenquer e parte para Coimbra, contando também com a ajuda do Conde Pedro. A partir deste momento, a Rainha Isabel irá estabelecer as negociações entre as duas hostes. Para evitar conflitos, D. Dinis retira-se com sua hoste para a cidade de Leiria, ao passo em que o infante e suas tropas se estabelecem na cidade de Pombal. _______________ 7

Pedro Afonso foi o primeiro filho bastardo do rei D. Dinis, e sua mãe foi Grácia Aires; nasceu por volta de 1285 e faleceu em 1354. Embora fosse filho ilegítimo do rei, foi acolhido e criado na Corte Régia desde muito jovem; tal medida foi solicitada pela própria Rainha Isabel para que os filhos bastardos do rei fossem criados num ambiente político, ao qual serviriam de objetos para angariar influencias políticas para a Coroa Portuguesa, através de negociações de casamentos para com estes bastardos. Já no ano de 1298, o rei escreveu um testamento contendo uma cláusula em que dava plenos poderes para a Rainha Isabel ser tutora e administradora de seus filhos bastardos. Pedro Afonso foi casado duas vezes, a primeira com Dona Branca Peres de Sousa, o segundo casamento foi com Maria Ximenez Coronel, cuja família possuía grande prestígio em Aragão. Seu pai, D. Dinis, sempre o tratou com proteção e o garantiu posses em Lisboa, Estremoz, Sintra entre outros; também recebeu heranças de João Soares, frei da Ordem do Templo e em 1307 tornou-se mordomo da Infanta Beatriz. Tornou-se titular de forma vitalícia o Condado de Barcelos no ano de 1314, e três anos mais tarde, passou a ser Alferes-mor. Ao Conde Pedro é atribuído a autoria de algumas obras literárias, sendo duas suas principais obras: O Livro de Linhagens, e a Crônica Geral de Espanha de 1344. MOCELIM, Adriana. “Segundo conta a estória...” A Crônica Geral de Espanha de 1344 como um retrato modelar da sociedade hispânica tardo medieval. 2013, p. 8-11. 8 O Conde Pedro foi exilado após ser nomeado Alferes-mor, e provavelmente valendo-se do acumulo destas funções, liderou um combate contra seu também irmão Afonso Sanches. É importante ressaltar, que o Conde sempre se postou a favor do pai, D. Dinis. Entretanto, também era de seu interesse, permanecer aliado do Infante, o qual futuramente seria o Rei. Por se sair vitorioso deste combate contra seu irmão, causou desgosto ante a Coroa, sendo, portanto, desterrado e exilado em Castela, assim como os outros que se opuseram ao Rei. MOCELIM, Adriana. “Segundo conta a estória...” A Crônica Geral de Espanha de 1344 como um retrato modelar da sociedade hispânica tardo medieval. 2013, p. 8-35.

26

Ao desenvolverem as negociações de apaziguamento, ambas as hostes acordaram em pontos a cumprir e a respeitar. Portanto, o infante Afonso receberia o senhorio da cidade de Coimbra, dos castelos de Montemor-o-Velho, da Feira, da Gaia e do Porto que havia conquistado anteriormente, porém devia prestar homenagem ao rei; que o rei perdoaria a todos aqueles que nas rebeliões passadas haviam tomado partido do infante, além de receberem restituição de seus bens. Já para os interesses régios, o príncipe colocaria para fora de sua casa os responsáveis pelos crimes, para que a justiça regia pudesse agir sobre eles; que o Infante seria obrigado a prestar homenagem ao Rei, pelas terras que recebia, comprometendo-se a não fazer guerra e nem celebrar a paz sem a ordem do Rei; daquele dia seria obediente e fiel; que perdoaria os excessos régios; que esqueceriam os escândalos e as vexações passadas. (2013, p. 276).

Segundo José Mattoso (1997, p. 140), “estes acontecimentos deviam ter abalado seriamente a saúde de D. Dinis, então com 61 anos de idade”, pois pouco tempo se passou desde o acordo de paz estabelecido em maio de 1322 quando D. Dinis enfrentando os problemas de saúde resolve redigir um segundo testamento, o qual “deixava como testamenteiros a rainha D. Isabel, o bastardo D. Afonso Sanches, Frei Estêvão Vasques, prior do Hospital, Gonçalo Pereira, deão da sé do Porto, Frei João, monge beneditino e seu confessor, e um Estêvão da Guarda. (SERRÃO, 1979. p. 265) O período de paz foi curto, pois em outubro do ano seguinte, isto é, de 1323, novamente iniciaram os conflitos por parte do Infante Afonso, o qual enviou uma carta ao rei D. Dinis exigindo que o mesmo convocasse Cortes em Évora. Atendendo ao pedido do filho, após convocar as Cortes, o Rei mandou enviar um aviso ao filho com detalhes sobre a data que a mesma ocorreria. Entretanto aconteceu que “o infante não compareceu, descumprindo obrigações que haviam sido acertadas na concordata do ano anterior. Em Santarém, deu inicio à reunião de suas forças com a finalidade de conquistar Lisboa.” (MOCELIM, 2013. p. 276-277) A razão do descontentamento do Infante que o levou a reiniciar o conflito com seu pai figurava na pessoa de Afonso Sanches, “pois além de Afonso exigir do pai a confirmação de seus direitos de herança ao trono e à Justiça do reino, solicitava que o cargo de mordomo do seu meio-irmão fosse retirado” (GIMENEZ, 2008. p. 63) O conflito de fato se deu quando as duas hostes encontraram-se na região das cidades de Alvalade e Loures, na região próxima a cidade de Lisboa e

27

Santarém. Para evitar um conflito ainda maior surge como interventora novamente a Rainha Dª Isabel no intuito de promover a paz. Passado algum tempo, se deu a derradeira etapa destes conflitos que vinham se arrastando ao longo dos últimos anos. Chegando o Rei à Santarém em 1324 para encontrar com o Infante, o mesmo não permitiu a entrada do pai na cidade, além de ocorrer um combate entre as hostes, D. Dinis contou com o apoio de seus filhos bastardos Pedro Afonso e João Afonso de La Cerda. Finalmente, em fevereiro do mesmo ano foi assinado um novo acordo de paz. Neste acordo o rei D. Dinis aumentou em 10000 libras as rendas do herdeiro e comprometeu-se a retirar o cargo de mordomo-mor a Afonso Sanches. Substituiu também o meirinho-mor, Mem Rodrigues de Vasconcelos, por Vasco Pereira e o meirinho da casa real, Lourenço Anes Redondo, por Lourenço Mendes. Era uma efetiva cedência às reclamações de seu filho e da nobreza senhorial. Mas todos deviam desejar o fim das violências. Em maio de 1324,chegou a Santarém o arcebispo de Compostela, enviado pelo papa para confirmar os acordos estabelecidos, tendo assim, com a solenidade da sua presença, dar um carácter sagrado à celebração da paz. (MATTOSO, 1997. P. 140.)

Com o fim desta guerra civil que ocorreu nestes últimos cinco anos, nota-se que “não era possível acabar facilmente com os privilégios senhoriais da nobreza”, (MOCELIM, 2013. p. 279) tendo em vista que as medidas de centralização do poder e da administração na figura do rei foram os principais motivos que causaram a reação desta nobreza. Portanto, em função destas medidas adotadas pelo monarca, “os Concelhos têm em mente que os únicos prejudicados eram os nobres, mas passado este momento, já durante o reinado de D. Afonso IV, viram que também eles foram afetados”. (LACHI, 2000. P. 25) Percebe-se também que D. Dinis desempenhou esforços para consolidar uma posição de destaque político dentro da Península Ibérica, além de realizar um dos mais importantes feitos para Portugal, que foi estabelecer a fronteira territorial praticamente como conhecemos nos tempos atuais, salvo pequenas alterações. Assim, dando suporte a esses seus feitos, constatamos a sua habilidade na promoção de mudanças institucionais, cuja consecução confiou a juristas [...], dando impulso à constituição de uma rede de agentes reais, habilmente recrutados, entre os mesmos sobressaindo como seu critério de escolha principalmente a competência, o que era uma inovação pois o que vigorava até esse momento era o do prestígio familiar.(2000, p. 25-26)

28

Portanto, depois de constituída essa estrutura possibilitou maior eficiência na administração do reino, sendo representada pelo monarca e não demorando então, para surgirem “as condições adequadas que o soberano precisava para ter em suas mãos o controle de toda a orgânica administrativa.” (2000, p. 26.) O rei D. Dinis, que estava com a saúde seriamente debilitada já desde os últimos tempos da guerra civil “morreu em Santarém, em 7 de janeiro de 1325.” (MATTOSO, 1997. p. 140) Então após a sua morte: vieram a Portugal algumas embaixadas a apresentar os pêsames pelo seu desaparecimento. De Castela manifestaram as suas condolências à rainha viúva D. Isabel e ao novo rei D. Afonso IV. (MORENO, 1997. p. 38)

O rei foi sepultado no mosteiro de São Dinis, na cidade de Odivelas. 2.3 D. AFONSO IV (1325-1340) Com a morte de D. Dinis em 1325 quem vai assumir o trono é seu filho Afonso IV, um dos principais personagens da Batalha do Salado. Este rei logo que assumiu o trono, tratou de “convocar as Cortes nas cidades de Évora, as quais chamaram ricos homens, cavaleiros, bispos abades, priores e representantes de cabidos e procuradores dos concelhos” (1997. p.406), no intuito de reunir para junto do rei o pais como um todo: povo em geral, nobreza e o clero. Esta convocação, “foi a primeira vez, desde 1254, ano das primeiras Cortes comprovadas, que Cortes foram convocadas para jurar um Rei acabado de subir ao trono” (MOCELIM , 2007. p.43). Não obstante além de fazer todo o sentido da convocação das cortes em função do inicio de um novo reinado, segundo Bernardo Vasconcelos e Souza: ganhava ainda um maior significado face ao conturbado período que se vivera nos últimos anos do governo de D. Dinis e aos receios que o herdeiro da coroa tinha de que lhe retirassem tal prerrogativa. Nesta óptica, é bem provável que as Cortes de Évora tenham também sido confrontadas com a proposta, ou, melhor dizendo, a imposição régia, para liquidar o conflito entre o novo monarca e aqueles que ele considerava constituírem uma ameaça em aberto. (2009, p.82)

Diante desta posição adotada, serviu também para anunciar a tônica que seria o seu reinado. Sendo assim, foi nesta época que havia retomado os conflitos com Afonso Sanches que se arrastavam desde os tempos da guerra civil entre 1319 e 1325. Por mais que tivesse prometido na época em que era infante ao seu pai, D. Dinis que iria

29

apaziguar-se com o meio-irmão, não pôde evitar ter que resolver tais questões com Afonso Sanches, pois este representava ao agora Rei um perigo. Aproveitou então, nestas mesmas Cortes, para acusar o seu meio-irmão, João Afonso, de traição, pois “se colocando ao lado de Afonso Sanches e não hesitando em apoiá-lo na guerra, João Afonso quebrara o dever de servir o seu rei e de lhe ser leal, não se mostrando reconhecido pelo bem que Afonso IV lhe concedera” (2009, p.86). Assim, a sentença régia imposta para João Afonso foi a pena de morte. Em decorrência da sentença que o monarca aplicou ao seu meio-irmão João Afonso, “fez com que Afonso Sanches pegasse em armas, reunisse forças em Castela e invadisse Portugal” (MOCELIM, 2013. p.281). Em seguida, invadiu a vila de: Trás-os-Montes, e Alentejo, além de invadir as terá de Braguança, onde queimou e roubou mujtos lugares e fez neles grandes danos, assim como em teras de Riba do Diana, onde praticou roubos queimas e catyveyros, causando pânico a toda populylacion. (PINA, 1953. P.148)

Este conflito que envolvia o Rei e seu meio-irmão tratava-se de uma guerra feudal, todavia estava na eminência de se tornar uma guerra entre dois reinos, Portugal e Castela; então o Rei de Castela, Afonso XI, passou a intervir também neste conflito. No entanto, a situação em que se encontrava Afonso XI era um tanto complicada, pois de um lado almejava promover um estreitamento nas relações entre os reinos, buscando assim consolidar a paz; ao tempo em que “tinha obrigação de defender o senhor de Albuquerque, sogro de Afonso Sanches, contra as investidas de Afonso IV, era obrigação de suserano a vassalo.” (MOCELIM, 2013. p.281) Em resposta as investidas promovidas pelo seu meio-irmão, o monarca português ordenou que o “exercito português do comando de Gonçalo Vaz, mestre de Avis” (SERRÃO, 1979, p.267) marchasse em direção ao norte senhorial. Entretanto, o exército foi derrotado na cidade de Ouguela, o que “levou D. Afonso IV a invadir o reino vizinho e arrasar a vila de Codeceira.” (1979, p.267) Outra personagem a tomar partido nesta guerra foi a: Rainha Santa Isabel, da sua clausura de Coimbra, aonde se remetera, temia o pior e enviava ao filho recados. Recados de paz e de restituição ao bastardo dos bens espoliados. Mas a contenda durou três anos e só terminou porque Afonso Sanches, tendo adoecido gravemente, suspendeu as operações. Negociou a paz e da negociação obteve a restituição de todos os bens confiscados. (MATTOSO, 1997. p.407)

30

Após se ter alcançado a paz, Afonso Sanches não pode gozar por muito tempo da mesma, pois ainda nas negociações para tal já estava com a saúde debilitada, e não resistindo, morreu ainda em 1329. Aproveitando-se do momento de estabilidade e paz ao findar os conflitos internos e externos, Afonso IV volta suas atenções para configurar e realizar uma série de iniciativas diplomáticas com os seus vizinhos peninsulares. Foi também neste período, que o “Tratado de Agreda, celebrado em 1304 entre D. Dinis de Portugal, D. Fernando IV de Castela, D. Jaime II de Aragão e o Infante D. João de Castela, que estabelecera a concórdia entre todos, é ratificado em 1328.” (LALANDA, 1989. p.125) Entretanto tal aliança entre os reinos mais uma vez demonstraria ser frágil, pois, no acordo de paz entre Portugal e Castela: Afonso IV de Portugal entregou sua filha, D. Maria, para se casar com Afonso XI, De Castela. Em contrapartida, o rei castelhano entregou ao rei de Portugal, sua prima, D. Branca, de Castela, a fim de que estabelecesse laços matrimoniais com o Infante Pedro, filho do rei de Portugal e herdeiro do trono. (GIMENEZ, 2012. p.108)

Neste momento, é importante observarmos sob quais condições em que Afonso XI de Castela tornara-se rei, “num clima de intrigas palacianas, de forte reação senhorial à política de seu pai quanto às propriedades nobres e aos concelhos, e de disputa pela regência do reino” (LALANDA, 1989. p.132). Portanto, nessa conjuntura em que se encontrava o reino de Castela, onde havia “conflitos internos envolvendo nobres e prelados de Castela que se dividiam entre obedecer ao Rei ou a Juan Manuel, seu rival” (MOCELIM, 2013 p.282). O objetivo de Afonso XI era desfazer a perigosa confederação entre este senhor castelhano João Manuel, e D. João cognominado O Torto, senhor de Biscaia e sobrinho de Afonso IV De Castela, que havia se firmando por meio de um “pacto feito entre D. João Manuel e D. João, o qual previa que D. João Manuel entregasse sua filha, D. Constança, para se casar com D. João, o Torto, em troca de seu apoio para a tutoria do Infante Alfonso XI” (GIMENEZ, 2012. p.107). Este pedido foi aceito por D. João Manuel, e casou-se então D. Constança e João o Torto. Entretanto, quando estes se casaram, a D. Constança era muito jovem e, portanto ainda não havia sido consumado o casamento. Foi neste meio tempo que D. Afonso XI, para

31

resolver este conflito entre seus opositores e também para buscar aliança favorável, Segundo Lalanda: parece ser de boa política tornar-se genro de um de seus principais opositores, D. João Manuel, poderoso duque de Panafiel e viúvo duma irmã de Afonso IV de Aragão (e consequentemente, sobrinha da “Rainha Santa” Isabel de Portugal). (LALANDA, 1989. p.132)

Portanto, D. Afonso XI tenta desfazer este acordo e decide se casar com Constança Manuel, a mesma infanta que D. João Manuel havia prometido para o João o Torto. Tal atitude fez com que o João o Torto se voltasse contra o seu antigo aliado castelhano e também ao rei Afonso XI, porém esta atitude revoltosa de D. João lhe custou a vida. Diante desta situação, apesar dos acordos firmados para a realização do matrimonio entre Afonso XI e D. Constança essa aliança ganhou novos contornos na política peninsular quando repudiou a esposa e se casou com a infanta Maria, filha do rei de Portugal. Assim: essas indecisões e mudanças de atitudes do rei castelhano devem ser entendidas também, como conseqüência de diversas vicissitudes e a ações movidas em torno de diferentes grupos políticos, mais especificamente, da alta nobreza, que disputavam privilégios durante a minoridade do rei Afonso XI. (GIMENEZ, 2012. p108)

Foi então que o Infante Pedro, que havia obtido dispensa papal em 1325 para casar-se com a Infanta Branca, alegou que a infanta Branca era doente e não poderia ter filhos, e, portanto a repudia e assim, a partir de 1331 pensa-se no casamento com D. Constança Manuel. Para tanto: as negociações com D. João Manuel iniciaram-se secretamente em 1336 são tornadas conhecidas do rei castelhano, a quem é pedido conselho pelo sogro; com esta atitude visa-se garantir que a passagem da noiva pelos territórios régios não será impedida sob qualquer pretexto. Afonso XI assegura que não haverá qualquer impedimento; todavia, quando em 1337 é chegado o momento de D. Constança vir para Portugal, ordena a seus fronteiros que impeçam a saída de D. João Manuel e que cerquem seus companheiros. (LALANDA, 1989, p. 133)

Em virtude destas ações promovidas por parte de D. Afonso XI, certamente acarretaria em conflito. Assim: A guerra estalou, esparguil terror e sangue em toda a terra e no mar, invasões e contra-invasões, surtidas e escaramuças, incêndios e pilhagens, massacres e prisioneiros – o costume. E, como de costume, o povo português e castelhano, o de mais perder. Três anos de histeria destruidora,

32

1336 a 1339. Galiza Entre Douro e Minho, Alentejo, Badajoz, terras de Huelva, Algarve oriental, costa andaluzana, foram cenários do sangrento vendaval. E ainda o mar e regiões costeiras, desde Gibraléon a Lisboa e de Porto até Vigo. (MATTOSO, 1997. p.408)

Para finalizar esta guerra e estabelecer a paz, reuniram-se em julho do mesmo ano para assinar o acordo em Sevilha. Para tal se consolidar, contou com a influência do papa Bento XII e do rei da França. Então, na questão dos territórios conquistados um frente ao outro, foram devolvidos; e na questão matrimonial D. Constança Manuel casava com o infante D. Pedro e a rainha D. Maria era assumida novamente por Afonso XI. Portanto, segundo José Mattoso, “cada vez mais a guerra se mostrava um modo inepto para o alargamento fronteiriço de Portugal para Castela; e vice-versa.” (1997, p. 408) Não obstante, como resultado do acordo assinado restabelecendo a paz entre os reinos de Portugal e Castela; haveria de servir também para que a cristandade ibérica agora unida possa enfrentar o inimigo comum: o muçulmano, que estava se aprontando para invadir os reinos. Dito a partir desde momento em que os reinos ibéricos resolveram suas querelas que demandavam tamanho esforço e habilidade política, estes reinos passaram a desfrutar da paz mútua. Além disso, alcançada a estabilidade política e militar na Península Ibérica, assim como observando o cenário exposto, consideramos então que o cenário contextual deste estudo apresenta-se de forma satisfatória. Sendo assim, passaremos a identificar alguns elementos importantes que se mostrarão fundamentais para a sequência deste estudo.

33

3 A ARISTOCRACIA Finalizada no capitulo anterior a contextualização do reino português durante o período de reinado de D. Dinis até o início do século XIV, mostra-se importante que neste momento seja dedicada uma atenção direcionada à estrutura social no reino, especialmente no que tange a aristocracia e sua estratificação. Desta maneira, faz-se necessário compreender como estava organizada a sociedade portuguesa. Todavia, em um primeiro momento, é ainda mais importante que seja trabalhado e exposto o próprio conceito de aristocracia durante a Baixa Idade Media. Não obstante, convém salientar que o mesmo será apresentado aqui de maneira breve por dois principais motivos: o primeiro porque em linhas gerais, o tema “Aristocracia” se trata de um conceito demasiado amplo e complexo, tornando assim impossível de ser levado a cabo neste estudo, sem deixar de mencionar também o recorte temporal que seria muito mais amplo; e segundo, porque não seria este o intuito deste estudo. Com efeito, iniciaremos de uma definição breve e geral, para em seguida tratar especificamente do contexto português. Partindo do pressuposto em que no Ocidente Medieval, a aristocracia era a grupo social de maior proeminência e que esta era caracterizada pela conjunção do comando dos homens, do poder sobre a terra e da atividade guerreira, percebe-se que o critério de definição para esta aristocracia pode variar. No entanto, esta noção de aristocracia, na ideia de Jérôme Baschet (2006), deve ser construída pondo ênfase sobre a dominação senhorial exercida por uma minoria cujos contornos permanecem por muito tempo bastante abertos e fluídos, no lugar da noção de nobreza.9 É importante frisar, que a caracterização de “nobre” é bastante freqüente, porém somente no final da Idade Média, que se observa esta categoria, por assim dizer, fechada e definida, por um conjunto de critérios estritos – onde um dos principais é o sangue e que tem um papel primordial – possui uma pertinência como unidade. Tal como grupo, e não como qualidade, é apenas a forma tardia e _______________ 9

O vocábulo “nobreza” foi pouco utilizado até o século XIII. COSTA, Rircado da. A Guerra na Idade Média: um estudo da mentalidade de cruzada na Península Ibérica. p. 98. Já para Marc Bloch, entre os séculos IX e XI a palavra “nobre” (em latim nobilis) não aparece muitas vezes nos documentos de época, mas ela limitava-se a marcar, fora de qualquer acepção jurídica precisa, uma preeminência de fato ou de opinião, conforme critérios variáveis. Ela comporta, quase sempre, a ideia de uma distinção de nascimento; mas também a de certa fortuna. – Bloch, Marc. A sociedade Feudal. p. 317.

34

consolidada da aristocracia medieval. Sendo assim, Baschet segue nos dizendo que: se a noção de aristocracia só tem sentido em função das relações de dominação que as representações sociais da excelência vêm legitimar, é necessário precisar que a caracterização como “nobre” não tem sentido fora da dualidade que a opõe aos não-nobres. (BASCHET, 2006, p.110)

Portanto ser nobre é, em primeiro lugar, uma pretensão a se diferenciar do comum, por um modo de vida, por atitudes e por sinais de ostentação que vão das vestimentas aos modos à mesa; mas acima de tudo, por um prestigio herdado dos antecedentes. Com efeito, a nobreza é, “de inicio, esta distinção que estabelece uma separação entre uma minoria que exibe sua superioridade e a massa dos dominados, confinados a uma existência vulgar e sem brilho.” (BASCHET, 2006, p.110) No final do século IX, podemos perceber a composição da sociedade dividida em três categorias ou ordens. Os três componentes desta sociedade eram, seguindo o modelo clássico de Adalberão de Laon (século XI), os oratores, bellatores e laboratores, ou seja, os clérigos, os guerreiros e por último os trabalhadores. 10 Portanto, esta construção simbólica de uma unidade pertencente a uma sociedade cristã, onde mesmo que cada categoria social tenha seu papel único definido, mostra-se importante para compreender o imaginário e estatuto de nobreza, comum nos países do ocidente medieval. Neste sentido, Toda sociedade é simbólica na medida em que utiliza práticas simbólicas ou na medida em que o seu estudo pode provir de uma interpretação do tipo simbólico. Mas isto é tanto mais verdadeiro em relação á sociedade feudal quando é certo que esta reforçou a simbologia inerente a toda e qualquer sociedade (LE GOFF, 1993. p. 325).

Pertinente ainda sobre a questão da estrutura aristocrática, Georges Duby construiu um modelo que veio a marcar profundamente a investigação sobre a história social - incluindo as vertentes cultural e das mentalidades - a nobreza medieval. Seguindo seus estudos, Duby trabalha com a proposta da tri funcionalidade formulada por Georges Dumézil, quando este analisa a divisão social e ideológica de grupos indo-europeus. Na obra deste filólogo a divisão da sociedade _______________ 10

DUBY, Georges. As Três Ordens ou o Imaginário do Feudalismo. Lisboa: Editoria Estampa. 1994 p. 16.

35

em três ordens explicaria um sistema de organização pragmático. Entretanto, Duby aproveita esta ideia não para utilizá-la como uma explicação prática de seu tema, mas sim como um elemento ideológico, advindo do imaginário que buscava uma ordenação representativa de sociedade feudal. (PETERS, 2011 p. 10-20) Já para Ricoeur, o fenômeno ideológico “está ligado à necessidade, para um grupo social de conferir-se numa imagem de si mesmo, de representar-se, no sentido teatral do termo de representar e encenar”. (RICOEUR, 1983, p.68) Todavia, esta aristocracia, que se define por um lado, pela convergência de dois grupos sociais distintos: o primeiro pelo prestígio de suas origens sejam elas condais, reais, principescas, e demonstram um conjunto de valores que exprimem sua participação na defesa da ordem pública. Por outro lado, têm-se os miles ou milites11, os quais eram simples guerreiros a serviço dos castelões, vivendo em sua corte, e que por volta do ano mil ainda não constituíam um grupo coerente, mesmo que exercendo uma função de caráter militar. Porém sua ascensão parece clara na medida em que passam a receber terras como recompensa de seus serviços. Assim: É preciso, no entanto, evitar perpetuar o mito da ascensão da cavalaria dos milites, como se fosse, desde o inicio, um grupo constituído, cujo estatuto foi melhorando para, finalmente, fundir-se com a nobreza carolíngia. Se é certo que a aristocracia conhece, então, uma renovação e integra em seu seio novos membros, em geral de estatuto modesto, a fusão que se opera é bastante relativa, uma vez que continuam importantes as distâncias, reconhecidas como tais, entre os grandes (magnates), que reivindicam altas atribuições de origem carolíngia, e os simples cavaleiros (milites) do castelo. (BASCHET, 2006, p. 111)

Por fim, para caracterizar a forma do poder desta aristocracia configurada em torno do termo miles, Jèrome Baschet (2006, p. 111-113) enfatiza que a castelanização do Ocidente, entre os séculos X e XII, é o fundamento dessa reorganização. A partir de então, os castelos são os pontos de ancoragem em torno dos quais se define o poder aristocrático e o termo miles serve, agora, para categorizar o conjunto daqueles que realizam direta e exclusivamente a dominação _______________ 11

A palavra miles (no singular ou milites no plural) era utilizada para definir o indivídio pertencente à cavalaria. A origem destes milites é de difícil precisão e delimitação. Inicialmente, isto é, no final do século IX, após a dissolução do império carolíngio, os historiadores perceberam que este grupo social encontrava-se bastante próximo da aristocracia rural originária da nobreza carolíngia (os nobiles ou nobiliores). Mas com o passar do tempo este grupo nobilitou-se, ascendeu socialmente e passou a ser confundido com a própria nobreza. COSTA, Ricardo da. “Ramon Llull (1232-1316) e o modelo cavaleiresco ibérico: o Libro del Orden de Caballería”, In: Mediaevalia, Textos e Estudos, 1112 (1997), Porto, Universidade Católica Portuguesa, p. 231-252.

36

social de um espaço organizado pelos castelos. Assim, o castelo é o coração a um só tempo prático e simbólico do poder da aristocracia, de sua dominação sobre as terras e os homens. 3.1 A NOBREZA MEDIEVAL PORTUGUESA Concluída a breve abordagem sobre o conceito de aristocracia e como a mesma se desenvolveu em linhas gerais, chegou o momento em que este estudo direcionará a atenção exclusivamente para o reino de Portugal. Como ponto de partida, a questão que se apresenta inicialmente consiste em trazer à luz a própria definição de quem é esta nobreza medieval portuguesa. De início, é importante salientar que não trataremos aqui da evolução da própria nobreza desde suas origens, por questões já mencionadas anteriormente, as quais também se justificam pelo seguinte fator: trata-se de um assunto extensivo e complexo que não compete ser averiguado nesta ocasião; no entanto, será necessário fazer certos recuos e avanços cronológicos, para que se possam compreender alguns aspectos de como se estruturou a nobreza medieval portuguesa. Logo após Henrique de Borgonha12 se casar com a infanta bastarda D. Teresa em 1096, e quando este recebeu do rei de Castela e Leão, Afonso VI 13, o Condado Portucalense, observa-se que: _______________ 12

Nasceu em Borgonha 1066 e morreu em Astorga em 1112. Pai de D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal. Quarto filho de Henrique de Borgonha, bisneto de Roberto I de França, sobrinho da rainha Constança de Leão, sobrinho-neto de Santo Hugo, abade de Cluny e irmão dos duques Hugo e Eudes. Escolhe a carreira militar que segue na Península Ibérica ao serviço de Afonso VI de Leão. É cruzado, combatendo os Mouros no Sul da Península. Graças ao prestígio que granjeia e quando Afonso VI se sente ameaçado na fronteira ocidental do reino pelos Almorávidas, grupo berbere oriundos do norte da África e adeptos do Islã, o rei leonês, considerando-o um chefe militar experimentado, concede-lhe a mão da sua filha ilegítima Teresa (a mãe desta era Ximena Nunes) e entrega-lhe o governo dos antigos condados de Portucale e Coimbra, até aí unidos à Galiza e administrados pelo seu primo Raimundo. D. Henrique procura as simpatias da nobreza, concedendo importantes imunidades às famílias mais poderosas, escolhendo-as como componentes da sua corte em Guimarães; controla os núcleos urbanos e mercantis; fortalece e desenvolve as comunidades rurais, servindo-se da cavalaria vilã e do povoamento dessas zonas para deter o avanço dos islâmicos. Disponível em Acesso em 28 mai. 2015. 13 Afonso VI, o Bravo, foi rei de Leão (1065-1109), de Castela (1072-1109) e da Galiza (1073-1109). Filho e sucessor de Fernando Magno, reuniu os vários territórios que seu pai havia repartido pelos cinco filhos e fez-se aclamar em Burgos, pondo assim termo aos conflitos entre leoneses e castelhanos pela hegemonia do centro peninsular. Alargou o domínio cristão na Península Ibérica, com auxílio de Cid, impondo-se junto de vários reinos Taifas do Al-Andaluz. Devido à superioridade alcançada sobre os príncipes cristãos e muçulmanos, intitula-se, desde 1077, Imperator Totius

37

o surgimento desta referencia de autoridade castelhana-leonesa se configurava como uma resposta ao avanço do poder senhorial não condal durante a crise monárquica de finais do século XI e, principalmente do segundo quarto do século XII. (CARVALHO, 2008. p. 13)

Então, nesta região, certas famílias nobres exerciam as funções judiciais, militares e fiscais sem intervenção ou delegação por parte da monarquia ou de algum conde. Desta forma, com a ascensão de D. Henrique à posição de conde de Portucale, representava, portanto, um movimento de organização ante a intensidade das forças centrífugas medievais características do período, agravadas pelas peculiaridades peninsulares, dentre elas o processo da Reconquista14. De acordo com José Mattoso, o princípio do século XII foi fundamental na consolidação de formações “nacionais” na região ibérica: o processo da difusão dos poderes de natureza pública, extra-econômica, e a sua utilização na gestão e organização dos domínios e senhorios por parte da aristocracia nobre foi mais precoce nas áreas próximas dos centros políticos ligados aos reis de Leão. (MATTOSO, 1993, apud CARVALHO, 2008 p. 52)

Todavia, ainda generalizados na península desde princípios do século XI, os poderes senhoriais tiveram um papel determinante no exercício de poder sobre as realidades regionais; poderes estes que as monarquias e autoridades condais precisaram lidar. No entanto, neste sentido, Adeline Rucquoi nos lembra que: Os reinos da Península Ibérica no decorrer da Idade Média não pensavam no poder em termos de fixação territorial. O poder dos príncipes hispânicos vinha, sobretudo de uma missão divina: a de reconquista da península aos infiéis para a entregar a cristandade. Fosse em Aragão, Castela ou Portugal e indiretamente Navarra, os reis eram justificados por essa tarefa, e a extensão de seus territórios as terras retomadas aos Muçulmanos era apenas uma prova de submissão a Deus e a seus mandamentos. (RUCQUOI, 1995. p. 215)

Paralelamente a este cenário, o reino português enfrentava também um problema referente à sua própria nobreza, a qual passava por uma crise que vinha desde o século IX, e também uma transformação, no sentido de que a mesma, por Hispaniæ("Imperador de Todas as Espanhas"). Conquistou o reino de Toledo (1085), onde estabeleceu a sua corte. Em 1078 substituiu a liturgia moçárabe, ou visigótica, pela romana. Foi derrotado pelos Almorávidas, comandados por Yusuf, em Zalaca (Sagrajas), perto de Badajoz (1086), e em Uclés (1108). Em 1096 entregou a seu genro, Henrique de Borgonha, o Condado Portucalense. Faleceu em Toledo a 30 de outubro de 1109. À sua morte o trono foi herdado por sua filha, D. Urraca, esposa do Conde Raimundo de Borgonha. Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2015. Disponível em . Acesso em 28 mai. 2015. 14 Referente ao processo de Reconquista, o mesmo será trabalhado no capitulo seguinte.

38

se tratar de uma nobreza condal, estava em decadência. Segundo José Mattoso (1982), percebe-se que entre o início do século IX e meados do século XI, a passagem de uma família se dava através do parentesco horizontal, de estrutura cognática, sem o predomínio de qualquer ramo sobre os colaterais, que caracterizara as famílias da nobreza condal; para outra realidade, a qual impusera uma estrutura agnática e patrilinear, ao que parecia adotado pelas famílias de Infanções15 a partir de meados do século XI, que valorizava a primogenitura e a varonia e subalternizava os filhos segundos e as filhas, afastando-os da herança familiar com vista a garantir que o respectivo patrimônio permanecesse indiviso e, portanto, concentrado nas mãos do chefe da linhagem. Desta maneira: as distintas linhagens definiam-se, assim, pela sua descendência de um antepassado comum, geralmente por linhas varonis, estando esse elo associado à fixação de um nome de família, frequentemente de origem geográfica (toponímica), mas também em muitos casos com raiz em patronímicos ou, em outros, tendo por base alcunhas do fundador ou fundadores da linhagem. Embora de forma tardia, as linhagens portuguesas tiveram a sua específica tradução heráldica, em regra no século XIII ou mais tarde (Mattoso 1982; Sousa 2000, 241 e segs., e 276-283), passando o apelido de cada linhagem a estar associado a um específico brasão de armas. (MONTEIRO, 2012. P. 49)

Com efeito, observa-se que houve uma transformação da nobreza, de uma nobreza antiga, a qual remontava, tradicionalmente, às famílias dos Infanções de Entre Douro e Minho: Sousões, Braganções, da Maia, Baiões e Gascos ou Riba Douro16, as quais eram linhagens cujo poder radicava na posse de terras, situadas no Norte do reino, e que tinham resultado de eventuais presúrias17. “Posse que lhes vinha já desde séculos, pois algumas daquelas linhagens já se atestam naquelas paragens, desde a segunda metade do século X, como os Sousas e os da Maia”. (INSTITUTO PORTUGUÊS DE HERÁLDICA, 2014, p. 217) _______________ 15

O termo infanções pode ser interpretado como: cavaleiro, pertencente ao séquito ou bando armado de um senhor, geralmente o rei ou os condes; jovem, nobre de nascimento, o juvenes na acepção de Georges Duby, ou seja, os filhos segundos das linhagens. Mas tal já não sucedia no século XII, onde esta última definição tendia a predominar. Isto quer dizer que infanção era uma categoria social, constituída por uma aristocracia de sangue, que se caracterizava pela função guerreira e se distinguia do clérigo e do camponês. [...] Era igualmente o termo usado nas cartas de foral, para distinguir os cavaleiros de nascimento, dos cavaleiros vilãos, ou seja, os nobres dos que o não eram. MATTOSO, José. Ricos homens, infanções e cavaleiros. A nobreza medieval portuguesa nos séculos XI e XII. 2 ed., Lisboa: Guimarães, 1982. (Coleção História e Ensaios, n. 2).p. 113. 16 Sobre estas primeiras linhagens portucalenses, cf. MATTOSO, José. 1994, p. 161-257. 17 PRESÚRIA. Título especial a que eram concedidas aos nobres certas terras por eles conquistadas aos infiéis, durante a reconquista cristã e a formação territorial de Portugal In Dicionário da Língua Portuguesa com Acordo Ortográfico [em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2015. Disponível em: Acesso em 4 abr. 2015.

39

As linhagens mais tradicionais, ou alta nobreza, historicamente se arrogava poderes e privilégios que não se reconhecia na nobreza mais recente – isto é, séculos XI e XII. As uniões matrimoniais se estabeleciam através de um círculo de relações estreito, num sistema que José Mattoso classificou de endogâmico: Sem querer fazer afirmações de que não me encontro seguro, queria todavia exprimir a hipótese de que a prática endogâmica das famílias condais dos séculos X e XI corresponde, até certo ponto, a uma separação dos nobres em estratos sociais e, portanto, a uma tendência dos magnates para se distinguir da aristocracia menos poderosa. (MATTOSO, 1994, p. 386)

Já no século XIII, através de casamentos entre estas famílias, esta nobreza passa a ser tratada como: uma nobreza em cenário senhorial e rural, ocupada com o exercício dos seus poderes e com as práticas militares. O conhecimento das letras, que lhes era estrangeiro, ficava para os monges aos quais cabia registrar os aniversários dos senhores seus protectores, [...] em termos gerais, a base da argumentação discursiva daqueles senhores era a antiguidade das respectivas linhagens relativamente à Casa Real, e a precedência do exercício daqueles seus poderes senhoriais, relativamente às disposições régias que visavam colocar o Rei como senhor dos senhores. (INSTITUTO PORTUGUÊS DE HERÁLDICA, 2014, p. 217-218)

Portanto, o fato de serem detentores de terras e que isso lhes dava certa autonomia, era o que os tornavam mais problemáticos. Com efeito, tudo isso surgiu num momento em que parecia claro para os últimos membros daquelas velhas e primordiais linhagens, que o monarca já não se encontrava como só mais um entre os outros, mas sim um “Senhor dos Senhores”, cujo poder se estava estabelecendo superiormente ao de todos os senhores do seu reino, quer eles fossem mais ou menos poderosos. Neste momento em que esta nobreza está passando por uma transformação, convém observar de forma mais atenciosa, como os papéis da monarquia e da nobreza são definidos e aproximam-se dos moldes que conhecemos de administração e corte régia em seu sentido mais comum. Para se ter uma ideia mais exata do que significa este momento de modelagem do reino, vejamos com as palavras de Antonio José Saraiva: Politicamente, só a partir da crise de 1383-1385 a nacionalidade portuguesa aparece inteiramente definida. Até essa data, o reino de Portugal, ao lado dos de Leão, Castela e Aragão, insere-se num conjunto político peninsular instável, cuja fisionomia só vem fixar-se no século XV [...] Culturalmente, este conjunto de estados forma uma unidade estruturada por um certo

40

número de cortes reais e senhoriais, de conventos e sedes episcopais, de universidades, em constantes intercâmbios. (SARAIVA, [19--], p. 11. Apud MARTINS, 12)

Compreendemos então que o reino encontra-se, num sentido político, ainda muito instável, por ser ainda um reino “jovem”, e que se explica também, justamente por necessidade de organização política e social, num sentido mais estrito. Tratando-se do maior nobre, o rei, a este era atribuída a responsabilidade pela segurança do reino, assim, era preciso que contasse com os nobres para arregimentar combatentes. Fazia-se necessário, portanto, o uso de estratégias de estabelecimento de poder - seja da parte do rei, quanto da alta e baixa nobreza, e também do clero – as quais baseiam-se numa espécie de jogo, que originou-se juntamente com o reino português, e por isso, não é simples dissociar os poderes e influências que cada categoria dispunha. Com efeito, essa necessidade exigia do monarca constantes acordos com a nobreza, hora a seu favor, hora contra, para manter esta nobreza sob controle. Junto do poder militar, está o poder político. Sendo o monarca o primeiro entre os nobres, sua importância na política do reino é indiscutível, embora, o rei não fosse imune a severas disputas de coroa, muito menos ao enfraquecimento de poder. Porém, para esta nobreza: a proximidade em relação ao rei tornava-se decisiva para a manutenção dos direitos senhoriais, tal fato deve-se ao fortalecimento do poder régio português a partir da segunda metade do século XIII. O rei torna-se cada vez mais um árbitro das questões entre as outras forças sócio-políticas do reino, em particular da nobreza. (MOCELIM, 2004. p 31)

No que diz respeito à administração de justiça, “o rei era ‘o primeiro magistrado jurisdicional’” (SERRÃO, 1978, p. 151), cabendo-lhe o veredicto em última instância sobre quaisquer questões de justiça. Ainda assim, esta prática torna-se regra apenas através das ordenações afonsinas, como se verifica no Livro de Leis e Posturas.18 _______________ 18

Afonso III, ao compor o Livro de Leis e Posturas, Irá fixar as praticas judiciais consuetudinárias da Corte em leis escritas. Tal mudança legislativa implica em transferir as disputas do campo de batalha para os tribunais, possibilitando ao súdito o acesso à justiça régia, com normas regulares de ação as quais atingem o universo social. Por sua vez o rei, ao propor tais transformações, intervém diretamente nas jurisdições locais, revogando sentenças, corrigindo arbitrariedades e parcialidades dos tribunais locais. O que interfere diretamente nas relações privadas de cunho senhorial. Ao ampliar os grupos atingidos por sua ação, amplia também sua base de apoio político, uma vez que se sentem beneficiados por estas mesmas medidas. Disponível em . Acesso em 02 jun. 2015.

41

Outro aspecto interessante sobre o poder do rei, refere-se à cunhagem de moedas, a qual podemos inferir que esta era mais uma razão para desavenças entre a monarquia e nobreza19. E na medida em que o uso de moedas se intensificava, maior o poder do rei sobre seu valor e circulação, e maior sua interferência na economia do reino. Voltemos agora à nobreza. Oposto à imagem de um grupo coeso, este segmento social também se estratifica e se comporta de maneira distinta, de acordo com a origem do título nobiliárquico. Desta maneira: A divisão tradicional da nobreza em três categorias hierarquicamente diferentes – cavaleiros, infanções e ricos homens –, embora apoiada, de facto em textos legais a partir da segunda metade do século XIII, oculta uma realidade social certamente mais fluida do que parece exprimir. (MATTOSO, 1997, p. 152)

Portanto, esta distinção entre ricos-homens20, infanções e cavaleiros21, não é suficientemente exata para corresponder à realidade, embora também não seja fácil substituí-la por outra, a não ser a mais vaga e imprecisa de nobreza superior, média e inferior, havendo assim, um paralelismo entre uma e outra apenas na camada superior: os ricos-homens pertencem à alta nobreza, mas os infanções e cavaleiros não correspondem obrigatório e estritamente à média nobreza. Todavia, tal hierarquização não deve ser observada de maneira rígida, eventualmente, pode haver mobilidade dentro da nobreza, tratando-se de uma realidade bastante fluida. O acesso à nobreza, “apesar das tentativas ou dos lamentos de alguns (...), não estava fechado e, se havia poucos casos de perda de foros, em contrapartida o movimento de ascensão não parava.” (RUCQUOI, 1995, p. 221) Neste sentido, podemos citar os Infanções, os quais constituem um segmento da nobreza, que vinha se afirmando paralelamente desde o tempo do Condado Portucalense, até este vir a ser o Reino _______________ 19

O rei dispunha não apenas do benefício de ‘bater a moeda’, como se arrogou este direito de a ‘quitar’ e ‘levantar’, alterando a liga metálica para depreciar e subir o seu valor nominal. A coroa podia assim recolher mais dinheiro, enfraquecendo a moeda corrente. MATTOSO, José. Org. e SOUZA, Armindo de. História de Portugal: a monarquia feudal (1096-1480).Lisboa: Estampa,1997. p. 151. 20 são propriamente, até o fim do século XIII, aqueles que receberam do rei pendão ou caldeira, isto é, que são seus representantes como governadores de terras e que, por isso tem para com ele uma dependência vassálica, apesar de se encontrarem no topo da escala social. Op. Cit., p. 177 21 Os cavaleiros constituem a categoria inferior da nobreza. As indicações fornecidas pela terminologia mostram, portanto, que durante o século XII, a categoria dos cavaleiros é ainda aberta: tanto inclui nobres como não nobres. Além disso, constitui, provavelmente, uma via de acesso à nobreza: os filhos de cavaleiros que o não são per naturam, podem provavelmente tornar-se tais, e, deste modo, acabarem por enfileirar nas hostes da nobreza. MATTOSO, José. Ricos homens, infanções e cavaleiros. Op. Cit. p. 113.

42

de Portugal. Entretanto, no período do reinado de Afonso III (1248-1279) e suas estratégias de fortalecimento régio, é que os encontramos mais próximos à monarquia e assumindo papeis de certo relevo no reino. Assim: os infanções dos séculos XII e XIII [...] permanecem como segunda categoria da nobreza [...]. A categoria dos infanções aparece como estrato médio, entre a cavalaria e os ricos homens em textos legislativos desde a época de Afonso III. (MATTOSO, 1982. p.113)

Podemos inferir que a aristocracia mais tradicional era um poder antagônico ao poder monárquico, e para neutralizá-la, o apoio dos “nobres de segunda categoria” era útil ao rei. Ainda assim, mesmo que menosprezada pelo grupo nobiliárquico superior, esta categoria não deixava de ser nobre. Em troca de seu apoio, o rei oferecia a estes nobres cargos administrativos e reconhecimento régio. Este favorecimento apenas aumentava a distância entre os estratos nobiliárquicos alto e baixo: “ao mesmo tempo, a ascensão social dos cavaleiros vilãos e a emergência social dos nobres de segunda categoria por oposição à alta nobreza senhorial levam a uma estratificação clara da nobreza” (MATTOSO, José. 1995, apud MARTINS, 2003. p. 18.) Percebe-se, desta maneira, que durante e após o reinado de Afonso II (12121223), a nobreza, que até então era definida como “de serviço” passou a ter uma importância maior, pois desempenhando um papel de grupo que contribuía na execução da centralização régia, rivalizava-se com a nobreza senhorial. Já durante o reinado de Afonso III esta mesma nobreza de serviço, transformou-se em uma nobreza cortesã, que ainda continuava a depender do rei, embora ainda demonstrasse uma simbólica superioridade mediante o uso de instrumentos culturais. Portanto, com o poder real vindo a se tornar mais evidente e mais forte, contando ainda com o apoio das cidades de seus reinos, coincidiu com o enfraquecimento de uma nobreza que havia perdido com as revoltas, ou em campanhas contra os muçulmanos, uma grande parte de seus membros, além de não conseguir criar novas fontes de rendimento permanentes. Assim, o “enfraquecimento da antiga nobreza, permitiu a partir de meados do século XIII e XIV, a ascensão de uma nova nobreza de diferentes origens, vinham de linhagens de uma pequena nobreza fundiária, de zonas setentrionais, rurais e montanhosas.” (RUCQUOI, 1995, p. 221)

43

Portanto, o que caracteriza e representa este período conturbado que a nobreza enfrenta, é que ao encarar um longo e gradativo processo de transformação, esta mesma nobreza necessita afirmar-se perante o rei. Outro fator essencial, é que esta nobreza durante o século XIII havia sido formada no interior de uma sociedade organizada para a guerra, a qual: é o fator dominante que estrutura a sociedade e sua economia na Península Ibérica. Porém ela não é uma situação permanente, pois há períodos de relações de tréguas que permitem comercio e política entre os reinos, além de momentos com operações militares e confrontos. Tratando-se de uma sociedade de fronteiras, a sociedade ibérica caracteriza-se por uma mobilidade social (RUCQUOI, 1995, p. 216)

Diante do exposto, a situação de guerra é a peça chave para identificar que esta nobreza estava estruturada em função da guerra, onde o século XIII representou para a nobreza um período de crise e de readaptação em função do fim das operações de Reconquista; trazendo assim o esgotamento de diversos proveitos que a guerra proporcionava. Com o término das operações de Reconquista, e, consequentemente, tornando-se

escassas

as

oportunidades

desta

nobreza

servir

as

armas,

apresentava-se neste momento um processo de extinção de ideal de nobreza vigente até então. Não obstante, houve outros fatores que possibilitaram a difusão de uma nova concepção de nobreza: “o gosto pela História, em particular da Antiguidade, o interesse dispensado a autores como Cícero, Valério Máximo e Vegécio, as influências francesas e a penetração do direito romano desde os fins do século XII;” (RUCQUOI, 1995, p. 246) e desta maneira, a cavalaria22 passou a ser vista como uma virtude e como uma profissão querida por Deus a fim de promover o bem estar do homem. Com efeito: As ordens militares, criadas durante a primeira cruzada na Terra Santa serviram como fonte para a difusão do ideal de cavalaria dentro da nobreza medieval portuguesa, foram ainda as “divulgadoras, na Península, da mentalidade cruzadística: a guerra santa, seu motivo, sua ideologia. A Reconquista ibérica possuiu especificidade própria. Foi uma forma de combate medieval em que seus antagonistas – cristãos e muçulmanos – não se consideravam com as mesmas qualidades, com os mesmos direitos humanos.” (COSTA, 1998, p. 41)

_______________ 22

A cavalaria pode ser entendida, neste sentido como uma instituição, implicando, em sentido abstrato, dignidade, ordem, posição e qualidade de cavaleiro, ou, em sentido feudal, vassalagem através da prestação de serviço e da boa subordinação pessoal, com todo o sistema pertinente de códigos e costumes religiosos, morais e sociais.

44

Tais processos de transformações não ficaram restritos apenas no século XIII. Estenderam-se até o final do século XIV, porque segundo José Mattoso, o ideal de cavalaria “impôs-se muito lentamente ao conjunto da classe nobre, decerto porque se considerava sobretudo como função profissional própria de uma categoria inferior da nobreza.” (MATTOSO, 1993, p. 184) Sendo esta época uma fase de mutações na composição, mentalidade, recursos materiais e a força política da nobreza, Adriana Mocelim nos fala que: Esse novo ideal de nobreza, que a considerava tanto como categoria moral como social, vinha ao encontro daquela nobreza que com o final das operações de Reconquista não tinha mais uma justificação prática. Foi em função disso que a alta nobreza dedicou-se ao estudo de suas próprias características enquanto cavalaria, pode-se comprovar isso com as publicações do príncipe castelhano Juan Manuel e do Conde Pedro de Barcelos em Portugal, durante o século XIV. (MOCELIM, 2004. p. 36.)

Percebe-se ainda, que a relação desta nobreza para com o rei é de afirmação da própria como essencial tanto para o rei e suas atribuições como também para o reino em si, para a sociedade portuguesa como um todo. Em contrapartida, o rei também deve ter em mente que sem este apoio da nobreza não se sustentará sozinho no trono. A esse respeito, Fátima Fernandes enfatiza que: no entanto, devemos ainda considerar que um rei medieval não pode governar apenas sustentado pelas suas elites de poder. O equilíbrio interno das forças sócio-políticas é vital para a sobrevivência da monarquia. Assim, desde os inícios da monarquia portuguesa, os reis fomentam o fortalecimento da base municipal, com isto, além de estabelecer as bases patrimoniais do reino criam apoios políticos de equilíbrio frente às constantes pressões nobiliárquicas. Logo, entendemos que o funcionamento da sociedade política medieval implica na manutenção de um equilíbrio entre o rei e as suas bases de poder, um pacto que não pode ser rompido unilateralmente sob risco de deposição régia ou perseguição justificada. (FERNANDES, 2005. p. 171)

Outro episódio interessante para ser analisado neste contexto de relações entre o rei e a nobreza, é a Guerra Civil de 1319-132423. Neste sentido, a guerra representou uma revolta desta fidalguia, - representados pela nobreza de corte, ou a uma segunda ou terceira nobreza (MOCELIM, 2004. p. 9)- contra a centralização régia de D. Dinis (1279-1325), mediante o trabalho cada vez mais incidente dos inquiridores reais, e mesmo sob diversos protestos, elas continuaram a existir. Assim, “os abusos das jurisdições senhoriais continuavam a ser combatidos, _______________ 23

Esta Guerra Civil já foi evidenciada no primeiro capítulo. Cf. p. 21-27.

45

enquanto a postura da nobreza começava a se modificar. Passa da passividade à intriga, e desta à violência após garantir o apoio do infante D. Afonso.” (CARVALHO, 2008. p 18) Todavia, isto não significa que o conjunto desta nobreza aderiu à causa, porque de acordo com Carvalho: Ao longo do reinado anterior, de D. Afonso III, o monarca reuniu ao seu redor, um corpo de nobres menos ligados à exploração fundiária e mais próximo da corte, e que de certa forma esteve em posição antagônica à da nobreza tipicamente senhorial. Esta, desprovida de alguns de seus privilégios, compôs a base da oposição a D. Dinis liderada pelo infante. Apesar de haver a possibilidade de recuperação dos laços de parentesco e das relações mais próximas, ou parte destas “duas nobrezas”, a tenção entre os dois grupos era latente. (CARVALHO, 2008. p. 19)

A oposição à autoridade central foi marcada por uma grande diferença no reinado de D. Dinis em relação aos de seus antecessores. Neste momento surgiram algumas lideranças entre a nobreza. A maioria das queixas era contra seu desejo de controlar o regimento da justiça em Portugal. Ora, se os nobres aliados do infante conseguissem uma administração judicial menos rigorosa, ou uma autoridade mais maleável ante seus interesses, seria assim um benefício. Tal benefício era no intuito de restaurar parte da jurisdição que a própria nobreza perdeu ante a ampliação de atribuições jurídicas da monarquia. Com efeito, a guerra civil foi provocada pela reação à implementação de uma autoridade monárquica mais rígida em relação ao poder da nobreza senhorial, que buscava suprimir suas prerrogativas ao poder régio. (CARVALHO, 2008, p. 19). Basicamente, é essa a tônica que vigora no reino português durante o final do século XIII e a primeira metade do século XIV. Em determinados momentos, o rei busca com maior voracidade a centralização do poder régio, e em outros, é a própria nobreza que irá demonstrar suas intenções de também se afirmar como detentora de certo poder e apta a exercer maior influencia no reino. Assim, percebe-se que na figura de Afonso III, foi iniciada a centralização do poder na mão do rei, promovendo inquirições mais detalhadas e frequentes, visando garantir com maior efetividade os direitos que detinha a autoridade régia. Além disso, desenvolveu então, uma intensa e importante atividade normativa, o que gerou forte resistência à suas ações, embora, sem causar movimento revoltoso consistente. Foi também neste nuance que seus sucessores, D. Dinis e D. Afonso IV governaram: fortalecendo cada vez mais a política de centralização régia e exercendo forte habilidade política para lidar com a nobreza no jogo do poder.

46

4 A RECONQUISTA No capitulo anterior fizemos um panorama referente à aristocracia de forma geral, discutindo o conceito e quais os elementos que a compunham. Na sequência foi observado de forma mais atenciosa, como estava organizado o grupo pertencente a esta aristocracia em Portugal: a nobreza medieval entre os séculos XIII e XIV, tomando como ponto de partida uma breve vistoria acerca desta nobreza nos séculos anteriores. No entanto, devemos ressaltar que conforme dito no capítulo anterior, a nobreza medieval portuguesa estava inserida no contexto do processo de Reconquista. Assim, é a partir deste conceito que iremos dar continuidade nesta terceira parte do estudo. Em um primeiro momento devemos ressaltar que a palavra “Reconquista”, segundo Ricardo da Costa (1998, p.77), é um “termo que abrange, tradicionalmente, o período que vai do ano de 718, ano da revolta de Pelágio 24, ao ano de 1492, quando da conquista do reino de Granada. Este processo foi em decorrência do fato que “em 711, tropas muçulmanas vindas da África do Norte invadiram praticamente toda a Península Ibérica, pondo fim ao Reino Visigótico. Apenas pequenos reinos cristãos subsistiram” (DEMURGER, 2002. p. 41). Assim, trata-se de um lento processo de expulsão dos muçulmanos da Península Ibérica pelos cristãos que se iniciou no reino das Astúrias – norte da península – e rumou em direção ao sul até chegar ao reino de Granada, último local de resistência Muçulmana. Além disso, José Mattoso ressalta que o processo de reconquista foi “um movimento contínuo, uniforme, de caráter simultaneamente religioso, ético e político” (MATTOSO, 1997, p. 424). Em 1212, a vitória cristã de Navas de Tolosa (coligação dos reis de Portugal, Castela, Navarra e Aragão) e a conquista do vale do Guadalquivir 25 marcaram o

_______________ 24

Pelágio foi filho do duque de Córdoba chamado Fávila. Foi capturado pelas tropas do governador árabe muçulmano Muniza, no ano 716, após a queda do reino visigodo e ocupação da Península Ibérica pelos mouros. Escapou do cativeiro no ano 718 e iniciou a resistência ao invasor, tornando-se o primeiro rei das Astúrias, cuja corte foi fixada na cidade de Cangas de Onis. Venceu o governador mouro Muniza durante a Batalha de Covadonga no ano 722, e faleceu em Cangas de Onis, no ano de 737. Disponível em . Acesso em: 6 mai. 2015. 25 O vale do Guadalquivir é atravessado de leste a oeste pelo rio que lhe dá nome. Esse vale é fechado, no sul, pelas montanhas do sistema Bético, que descem rapidamente para o Mediterrâneo e configuram uma costa de modo geral abrupta, entre o estreito de Gibraltar e o cabo da Nau.

47

início da última fase de expansão dos reinos cristãos peninsulares. No Garb-AlAndaluz26, durante a primeira metade do século XIII, os cavaleiros da Ordem de Santiago, comandados por D. Paio Peres Correia, juntamente com os exércitos de Portugal, Leão e Castela, conquistaram, de forma progressiva e significativa, varias cidades e castelos. Como referido, este processo foi lento, pois somente teve seu fim em 1492 com a conquista de Granada quando Boabdil, último rei de Granada, entregou as chaves da cidade aos Reis Católicos (Isabel de Castela e Fernando de Aragão), marcando assim o fim do domínio muçulmano na Península: Sob o ponto de vista estritamente político, todos os reis peninsulares se consideravam herdeiros legítimos e descendentes dos antigos monarcas visigodos. Consequentemente haviam por sua toda a terra que pudessem ganhar ao infiel. Assim surgiu a palavra Reconquista, plena de significado. A guerra permanente tinha-se por justa, até que fosse alcançado o objetivo último. Mais do que um conflito religioso, a Reconquista surgia a todos, na Europa cristã, como uma questão de herança. (MARQUES, 1996, P. 72-73)

Desta forma referimos o caráter político da Reconquista, que serviu aos monarcas ibéricos como de meio de afirmação e engrandecimento. Aliás, logo em 718, quando se inicia, a Reconquista foi uma questão de sobrevivência política para o pequeno reino das Astúrias. Posteriormente, do século X em diante, os reis ibéricos passaram a se considerar como os legítimos descendentes dos antigos monarcas visigóticos, cujo reino os invasores muçulmanos tinham usurpado em 711. Portanto, toda a terra que ganhavam não era vista por eles mais do que simplesmente a recuperação de algo que legitimamente lhes pertencia. Este pensamento viria a ser comum já entre os primeiros reis de Portugal, como veremos logo adiante. Conforme explica Ricardo da Costa (1998, p.79): “assim, num sentido estrito, entendemos como Reconquista um processo de expansão territorial ibero-cristã de clara motivação religiosa – propulsor ideológico do alargamento das fronteiras da cristandade ocidental”. Tal motivação religiosa é um reflexo de caráter cruzadístico, pois: Disponível em: acesso em: 05 mai. 2015. 26 O Gharb Al-Andalus, ou Ocidente do Al-Andalus, é o nome do território da Península Ibérica durante o período Árabe, “grosso modo” correspondente à antiga província da Lusitânia Romana. Inclui o atual Sul de Portugal, limitado a Norte de forma inconstante pelos diferentes traçados que a linha de fronteira com os Reinos Cristãos apresentou, e parte das atuais Andaluzia, Extremadura, Castilla e Leon Espanholas. Disponível em https://historiasdeportugalemarrocos.wordpress.com/2014/03/30/cronologia-do-gharb-alandalus/#more-1494 Acesso em: 5 mai. 2015.

48

A formação e consolidação geográfica do reino de Portugal foram frutos diretos da guerra, tanto contra castelhanos como contra mouros. As vitórias militares de Afonso I permitiram-lhe usar o título de rei, consolidando sua autoridade e assegurando-lhe um amplo território com várias províncias. Por outro lado, na primeira metade do século XIV, a nobreza portuguesa associava a glória passada da realeza borgonhesa à sua presença em campo de batalha contra os muçulmanos. (DA COSTA, 1998, p. 117)

Segundo Adeline Rucquoi a guerra de reconquista não era exclusiva dos nobres, pelo contrário, participava dela a população em geral da península, seja “fisicamente, com ou sem cavalo, financeiramente pela concessão de contribuições ao rei, servicios castelhanos, ayudas navarras” (RUCQUOI, 1995, p. 217), então todos que ali viviam participavam desta empreitada. Ainda sobre a questão de política administrativa durante a Reconquista no reino português, “os reis da casa de Borgonha sempre levaram em conta as necessidades administrativas que se faziam prementes após cada vitória militar” (DA COSTA, 1998, p. 119). Não podemos esquecer que obviamente havia motivações dos reis e principalmente da nobreza, de manter asseguradas suas terras, assim como também ressaltar que esta nobreza servia-se também da função guerreira, pois conforme já explanado no capítulo anterior, sua identificação e importância estava, dentre outros fatores, principalmente na situação de guerra em que se encontrava a Península Ibérica. Em um segundo aspecto, mesmo com tais questões político-administrativas, não se descaracteriza o fator principal da Reconquista portuguesa ser calcada no: espírito cruzado presente na Península. Na visão historiográfica do século XIV, Afonso I possuía forte ligação ideológica com a perspectiva cruzadística. A Crónica Geral de Espanha de 1344 atribui suas vitórias frente aos mouros graças à sua devoção nas orações de São Bernardo, abade de Clairvaux, monge cisterciense e pregador cruzadístico, uma das grandes personalidades do século XII na Europa e intimamente ligado à Ordem do Templo. (DA COSTA, 1998, p. 119)

Desde finais do século XI, os aspectos religiosos adquirem um caráter vinculado na luta que opôs os cristãos aos muçulmanos. A relativa tolerância, que havia e que era fruto de um convívio de quatro séculos, diminuía com o passar do tempo, perante a forte presença do fator religioso por parte dos almorávidas e dos almôadas, o qual fomenta, por sua vez, a mesma postura por parte dos cristãos. A Reconquista assume, então, contornos de guerra santa, merecedora de tanta consideração como as Cruzadas à Terra Santa. Com efeito, a designação de Cruzadas do Ocidente para a Reconquista peninsular confirma este fato:

49

o papa Pascoal II confirmou-o solenemente em 1102 -, uma cruzada, uma guerra justa e santa, no decorrer da qual aquele que encontrava a morte tinha o paraíso assegurado. Essa guerra, conduzida em nome da cristandade, era a tarefa de todos os Espanhóis – Castelhanos, Portugueses, Aragoneses, Navarreses -, do rei e dos seus nobres até o ultimo peón das milícias urbanas. (RUCQUOI, 1995. p. 290)

Foi assim que os reis peninsulares usufruíram de várias bulas papais, que exortavam à expulsão dos muçulmanos da Península Ibérica, concedendo indulgências aos que participavam na luta. Podemos destacar especialmente “a pregação da 2ª Cruzada por Eugénio III e Bernardo de Claraval a partir de 1146 abre a possibilidade de confluência entre a cruzada oriental e a ibérica” (MONTE, 2008, p. 05). Por várias vezes, os reis de Portugal puderam mesmo contar com a ajuda dos cruzados que passavam pela região ibérica a caminho da Terra Santa: em 1147, para a conquista de Lisboa; em 1189, para a conquista de Alvor e Silves; em 1197, para nova tentativa de conquistar Silves; em 1217, na conquista definitiva de Alcácer do Sal (DA COSTA, 1998. p. 120-121). Assim, para o fortalecimento do ideal de cruzada muito contribuíram também, as ordens militares e religiosas introduzidas na Península no século XII: os Templários em 1128, os Hospitalários por volta de 1150; os monges de Calatrava e de Santiago, também por volta de 1170. Todos eles se revelaram auxiliares preciosos na conquista de terras. De modo geral, desde a Reconquista, os reis ibéricos passaram a ser chamados de “cruzados permanentes”. Como tais, possuíam as mesmas prerrogativas conferidas aos cruzados que lutaram na Terra Santa (RUCQUOI, 1992, p. 69). É certo que essa característica assumida pelos monarcas peninsulares, especialmente os de Castela, Portugal e Aragão, trouxe-lhes tais prerrogativas; todavia, não podemos dizer que isso os tenha tornado independentes em relação ao clero. Não obstante o papado necessitar do rei e da nobreza para recuperar os territórios reclamados pelos cristãos, essa autonomia dos reis não deixou de trazer tensões para com o clero, como no caso do conflito entre D. Afonso IV de Portugal e

50

Álvaro Pais, bispo da diocese de Silves durante a guerra entre Portugal e Castela 27. Desta maneira, no decurso de uma transformação do poder político tardo-medieval peninsular, é possível destacar certo apelo à legitimação do poder régio e de propaganda dos atributos de rei no universo laico, produzindo imagens régias ligadas à religião – tais como rei ungido, cristão, virtuoso, fiel. Conforme foi apresentada a contextualização do reino de Portugal no primeiro capítulo deste estudo - e não ignorando, mas por hora deixando de lado o avanço que o reino conquistou - convém destacar que: Entre 1325 e 1411 foi marcada por uma sucessão de casamentos, de ingerências mútuas, de ajudas, de escaramuças e de guerras com a Castela vizinha, tendo como fundo a rivalidade pelo controlo do Estreito de Gibraltar que comandava o comércio entre o Mediterrâneo e o Atlântico, e que levaram à dissociação definitiva dos dois reinos. (RUCQUOI, 1995, p. 197)

Desta maneira, como nos mostrou Adeline Rucquoi, percebe-se que havia certa instabilidade política na Península Ibérica, pois frequentemente ocorriam desavenças entre os reinos cristãos, tal como já exemplificado quando discutida a contenda entre Portugal e Castela. Ainda no mesmo ano de 1339 e pouco tempo depois do estabelecimento de paz entre os reinos, novamente a Península Ibérica tornou-se palco do conflito entre cristãos e muçulmanos, o que culminou na Batalha do Salado no ano seguinte, em 1340. Portanto, verificado o conceito do termo Reconquista e o que representou para o período tardo-medieval e de forma mais especifica ao reino de Portugal, observa-se a conjuntura em que está inserida a Batalha do Salado. Sendo assim, passaremos em seguida ao próximo e principal tópico deste estudo, que é justamente a Batalha do Salado

_______________ 27

Durante a guerra com Castela (que durou de 1336 a 1339 - a qual já foi descrita no primeiro capítulo deste estudo p. 25), o bispo D. Álvaro Pais indispôs-se com o rei D. Afonso IV advertindo-o para não fazer guerra a outrem, tirando para isso, proveito dos bens das igrejas e dos pobres. Reclamava ainda numa mensagem destinada ao monarca, que este havia sobretaxado o seu bispado, o que não fizera com outras dioceses, e que, por causa da transgressão às imunidades eclesiásticas, não poderia cumprir as suas obrigações como despenseiro daqueles bens. (COSTA, 1996, apud SOUZA, Armenia Maria. “A realeza cristã ibérica no Espelho dos reis de frei Álvaro Pais (séc. XIV)”, In: Revista Dimensões, Espírito Santo, n. 27, 2011. P.189-215. Disponível em < http://www.periodicos.ufes.br/dimensoes/article/view/2590/2086> Acesso em: 14 mai. 2015.

51

5 A BATALHA DO SALADO Conforme visualizado o panorama contextual do reino português durante o período dos reis D. Dinis e D. Afonso IV, em um primeiro momento ele refere-se à organização política interna e externa, mais especificamente nas relações com o reino de Castela. Posteriormente, verificamos quem era esta nobreza portuguesa no período e a forma como tal estava organizada. Por último, foi apontado o que foi o processo de Reconquista e quais eram seus aspectos. A partir deste momento, o foco deste estudo será voltado para a batalha em si, ao passo que paralelamente será feita a análise da mesma mediante as fontes que possuímos. Assim, é importante ressaltar que passaremos a fazer uso da crônica do rei D. Afonso IV. Será também utilizada como fonte a narrativa da batalha, contida no título vinte e um do Livro de Linhagens do Conde Pedro de Barcelos28. Além disso, sobre esta narrativa, a mesma será também analisada em um segundo momento. Não obstante, destacamos que tomaremos como ponto de partida os antecedentes que motivaram e culminaram no derradeiro momento da Batalha do Salado, que foi entre os dias 28 e 30 de outubro de 1340. Portanto, conforme dito acima, o momento específico da batalha presente na narrativa terá atenção especial. 5.1 ANTECEDENTES DA BATALHA Alguns anos antes de ocorrer a querela entre Portugal e Castela entre os anos de 1336 e 1339, o rei Afonso XI de Castela promoveu uma ofensiva cristã contra os muçulmanos, fazendo com que o sultão Muhammad IV de Granada apelasse para o Marrocos. Na região do Marrocos, a dinastia que controlava era a dos merínidas29, a qual vinha anexando outros reinos berberes menores do norte da África30. Esta dinastia tinha como líder o sultão Abû-l-Hasan’ Ali31 (1331-1351). _______________ 28

Trata-se do segundo filho bastardo do rei D. Dinis com Gracia Frois. Nasceu na cidade de Torres Vedras por volta de 1280. Conforme dito no primeiro capítulo deste estudo, foi o terceiro conde de Barcelos. Atribui-se a ele a autoria do Livro de Linhagens por volta de 1340, e também a Crónica Geral de Espanha de 1344. 29 Merínidas (ou marínidas) era uma dinastia berbere de Fez que reinou no Marrocos de 1196 a 1464, substituindo o poder Almôada. 30 (...) caso dos de Tlemcen ou Tremecem, nas mãos dos Abd AL-Wadides a partir de 1236(...) e o de Tunis, chefiado pelos Hafsidas (...), daí resultando a reunificação política de grande parte da Berberia e o reconhecimento islâmico do poder detido pelo sultão de Fez, bem patente na homenagem que lhe

52

Assim, Enquanto os reis de Portugal e Castela guerreavam entre si, os muçulmanos avançavam novamente sobre a Península Ibérica. Então, em 1333, Abû-l-Hasan’ Ali retomou Gibraltar para o mundo muçulmano. No ano seguinte, embora o papa João XXII garantir uma nova pregação de cruzada, Afonso XI de Castela estabelece uma trégua com Yusuf I, emir de Granada; que embora muçulmana e como reino independente, prestava laços de vassalagem com Castela. (HOUSLEY, Norman apud DA COSTA, Ricardo. 1998 p. 235) Devido às contendas internas e a heterogeneidade dos territórios sob a Coroa castelhana e a privilegiada situação geográfica, os granadinos conseguiram manter sob controle muçulmano os portos de Algeciras e Gibraltar, almejando também tomar a cidade de Tarifa, o que viabilizaria uma invasão muçulmano-marroquina na Península. Tais invasões em grande peso, contudo, demoraram a ocorrer devido a disputas internas em Granada e no sultanato benimerine. Assim, com o fim do pacto firmado entre Afonso XI e Yusuf I, as hostilidades reiniciaram. Em 1339, Abu Malik, filho de Moḥammad IV, sultão de Granada, ocasionou um combate contra o exército de Afonso XI, quando tentou apoderar-se do território da região de Gibraltar, porém esta investida fracassou: “após ter tomado Gibraltar e efectuado importantes razias na zona circunvizinha, é morto por tropas castelhanas” (LALANDA, 1989. p. 121). Desejando vingança, Abû-l-Hasan’ Ali invade o sul da Península mediante uma aliança formada com o emir de Granada. Assim, ao longo de meses, mais de uma centena de navios carregados de tropas cruza o estreito e, diante

de

Gibraltar,

conseguem

derrotar

a

frota

defensiva

castelhana.

Posteriormente, “uma segunda armada, constituída também por embarcações de Aragão e Gênova, cuja ajuda é pedida por Afonso XI, e por algumas portuguesas, é destroçada por um temporal” (LALANDA, 1989. p. 121). Diante deste cenário em que o rei Afonso XI percebe que as forças muçulmanas estão avançando em direção aos reinos cristãos, o mesmo não hesita em buscar apoio junto aos reis ibéricos. Assim, ordena para que sua esposa, a rainha D. Maria viaje para Portugal para implorar auxílio ao pai contra o inimigo comum: fizeram, após a conquista de Tlemcen em 1337, os monarcas do Sudão e os do Egito mameluco. KRUS, Luis apud DA COSTA, Ricardo. Op. Cit, p. 235. 31 Sultão de Marrocos entre 1331 e 1348. Na crônica do Rei Afonso IV, assim como no Livro de Linhagens do Conde Pedro de Barcelos, é chamado de Almafacem, Albofacem, Alibohacem ou Albohacem.

53

& assi com arrepresentaçam destas necessidades em sua pessoa aproueitaria nellas muyito, & e a Raynha outrogado na vinda de Portugal, & aparelhada pêra isso com a trigança, que a tal necesidade requeria, vindo em romaria primeiro a Terena, dahi se veyo loguo á Cidade de Evora em Portugal onde elRey, & a Raynha Dona Beariz seus Padre, & Madre, sabendo que vinha a vieram esperar e receberam com myuta honra & com sinais de grande amor, & logo sem mais trespasso a Raynha co grande humildade, & muytas lagrimas, disse a elRey o fundamento, esperança & necessidade, com que vinha que era pedirlhe com grande efficacia que em sua pessoa, & com as gentes darmas, & frotas, & tizouros de seus Reynos, quizese em taõ evidente periguo hir ajudar elRey Dom Affonso seu marido, contra os Mouros inimigos de Fee & e da Cruz, porque em sua ajuda, & esforço de sua real pessoa elRey tinha tal confiança q se o visse cõ siguo, afirmava que nam temeria dar batalha a todo o mundo, que lhe fosse contrario quãto mais aos Reys de Marroquos, & Grada, de quem com graça de Deos esperava aver loguo certa, & desejada victoria. (PINA, 1936. p.151152)

Após D. Afonso IV ter recebido sua filha e ouvir dela a solicitação feita pelo seu genro o rei de Castela e ficar a par da gravidade da situação, prontamente ele respondeu que atenderia ao pedido de ajuda. No entanto, D. Afonso IV “pera fazer cõ prudência, & bom resguardo como devia, tendo sobre isso conselho com os principais de sua Corte” (PINA, 1936, p. 153), foi aconselhado por alguns membros que a sua ida era apressada, e que necessitaria certo tempo para reunir contingente. Também fizeram pouco caso da situação: sua hida tam apressada devia porentam escusar em sua pessoa, assim pelas muytas gentes que lhe loguo compriam, & nom eram prestes como por outros grãdes percebimentos de armas, cavallos, que todos heram necessários, que loguo assim nam teriam, & que este hera hum forçado inconveniente, pois que de necessidade o aviam de aver cõ tamanho poder de Mouros, & já tam exercitados na guerra. (PINA, 1936. p. 153)

O rei, após ouvir tais conselhos e opiniões, as quais lhe eram contrarias, prontamente repreendeu os membros desta corte e alegou que “overdadeiro & leal Portuges onde quer que estiuesse por obras, & bom coraçam o segueria indo contra os imigos da Fee, & por defensaõ da terra dos Christãos.” (PINA, 1936. p. 153) Com efeito, após a decisão de Afonso IV de prestar ajuda ao genro, prontamente reuniu um contingente e partiu para a cidade de Sevilha, onde encontrar-se-ia com o rei de Castela e seu exército, para enfim rumarem à cidade de Tarifa, que estava cercada. Posteriormente, já reunidos em Sevilha, Os Reis de Portugal e Castela decidem por enviar uma mensagem ao sultão Abû-l-Hasan’ Ali o avisando:

54

que co ajuda de Deos hiaõ pera socorrer, & descerquar Tarifa que elles [muçulmanos] tinham cerquada, que lhes rogavaõ que parase escuzar antre todos derramamento de tanto sangue, quato por sua cauza se aparelhaua, se quizessem alevantar da quelle cerquo & tornasse loguo para suas terras para que lhes dariaõ seguro, & e vivessem todos em paz, ou tregoa qual por melhor ouvessem, & que assi o naõ quizessem loguo fazer, que antre elles senaõ escuzava necessária, & perigosa conteda, na qual pois tinhaõ nomes de Reys tam grandes, & estauam tão riquos & poderosos que a elles seria vergonha. (PINA, 1936, p. 158)

Neste trecho percebe-se que mesmo os reis oferecendo a opção de desistência do cerco, e que garantiriam segurança para o retorno dos muçulmanos às suas terras, ainda assim demonstravam que não hesitariam em travar uma batalha contra os muçulmanos. Por outro lado, logo que o sultão recebeu a mensagem, este se reuniu então com um conselho formado pelos muçulmanos para discutir qual seria a decisão e que postura deveria ser tomada. Neste conselho, segundo Ruy de Pina (1936, p. 158-159) foi um muçulmano já idoso, experiente e que possuía certa autoridade, após dizer que os cristãos eram muito poderosos, bons guerreiros e que possuíam um grande contingente e estavam determinados a vencerem uma futura batalha; aconselhou a todos que seria prudente por hora levantar o cerco, pois estava na época de inverno e acreditava que os sitiados de Tarifa possuíam provisões em virtude do inverno, e que o cerco não seria tão vantajoso. Ao contrario, pensava ser mais prudente e efetivo retornar e fazer o cerco à cidade no verão. Além disso, ressaltava também que os cristãos não poderiam reunir tão numeroso contingente sempre. Com estas palavras, muitos ali concordavam com o que foi dito. Por outro lado, o emir de Granada, se posicionou contra este idoso conselheiro, e falando diretamente a Abû-l-Hasan’ Ali, lembrando-o de todos os feitos e conquistas que tiveram por África e principalmente sobre os motivos que os mesmos encontravamse ali, lembrou: porque ganhada contra elles esta Victoria, tua será Espanha, até Frãça, as quais por direito, & sucessam de nossos avos ainda He nosso patrimônio, & e quando a desauentura for tanta que sejas, & e sejamos contiguo vencidos, ainda entam naõ serà deshonra nossa ne vituperio, pois nobres Reys, & bons caualleyros nos vencem, & e por naõ cudarmos mais nas cousas de periguo que lembradas fazem mayor medo, vai tu Rey poderoso contra elRey de Castella, & eu contra elRey de Portugal, & Deos nos ajudará. (PINA, 1936. P. 159)

55

Mediante este discurso, teria Abû-l-Hasan’ Ali resolvido com o poder da palavra final no conselho, responder aos reis cristãos através de seu mensageiro uma carta dizendo: que elles por desprezo & e abatimento dos Christãos tinham cequado Tarifa, cujo cerquo naõ aviam de leyxar, até ser sua, & que outro tanto fariaõ loguo a Em xares, & e que em qualquer maneira viessem ali os achariaõ porque com seu medo se nam aviam de partir. (PINA, 1936. p. 161)

Assim, quando os reis de Portugal e Castela receberam a mensagem de resposta que lhes foi enviada, ficaram convictos de que não havia outra saída que não fosse por meio da batalha para conseguir socorrer a cidade de Tarifa. Então, após ter decidido o que fariam: com esta determinaçaõ partiram loguo os Reys de Sevilha, & e se foraõ alojar huma legoa ale de Alcala de Guadaira, & e ao outro dia foraõ a Vtreira, & de terminaram de fazer (como fizeraõ) suas jornadas muyto pequenas, por esperarm suas gentes, de que algus eram em caminho, (...) e dahi ás couas de Tojos, & e dahi loguo junto do rio do Salado, que he há legoa a travès de Emxere, & naõ faraõ pela villa, pela guardar, dos damnos, & e estragos da gente do Arrayal, & dali partiraõ os Reys, & foraõ alojarse alem de Gadalete, onde fazendo de necessidade algua demora chegaraõ a elRey de Portugal mutas gentes, & e bem cõcertadas de seus reynos, de que a Villa de Sanctarem era cabeça, cõ que Elrey foy muy alegre, & e assi os do Arrayal; & ali chegou a elRey de Castella, Dom Pedro de Moncada Almirante de elRey de Aragam,com certidam de Galles armadas que leixava já no Estreyto sobre Tarifa, & dali foraõ os Reys assentar seus exércitos (...) & Domingo vinte, & e sete dias do mês de Outubro chegarão a Pena do Servo, donde os espatozos Arrayais dos Moutros já pareciam sobre Tarifa. (PINA, 1936. P. 162-163).

Percebe-se que diante deste exposto, os cristãos foram reunindo seus exércitos por vários locais enquanto dirigiam-se a Tarifa, até chegarem às proximidades da cidade sitiada no dia vinte e sete de outubro de 1340, véspera da batalha. Na sequência da crônica, a partir do momento em que os mouros perceberam que os exércitos cristãos chegaram, o sultão de Marrocos e o emir de Granada resolvem levantar os arraiais com que haviam cercado Tarifa e destruir os engenhos e os aparatos que utilizavam como ferramentas de controle do sitio. Em seguida, o sultão de Marrocos ordenou para que armassem suas tendas em um lugar mais alto e afastado da cidade. Assim também o fez o emir de Granada, que ordenou aos seus que montassem acampamento próximo a serra que havia ali perto. Na manhã do dia seguinte, a crônica nos diz que:

56

loguo ante manham os Reys em suas tendas co grande contriçam, & e arrependimento de seus peccados, se confesaram a seus confessores que cõsiguo raziam, & assim com grade, devaçam, & e muyta humilidade, como fieis, & verdadeiros Christãos.ouviraõ Missa & receberão o Sancto Sacramento, & e se encomendaraõ a Deos, & e per geral mandado todo-los outros Christãos do exercito assim ofizeram. (PINA, 1936. p. 166)

Assim, logo após a celebração da missa, Dom Gil, arcebispo de Toledo, promoveu também um sermão de exortação a todos ali presentes, garantindo indulgencias e remissões dos pecados, por virtude da Santa Cruzada que tinha em mãos. (PINA, 1936. P. 166) Portanto, imbuídos desta motivação religiosa que remetia a um ideal de Cruzada, os cristãos estavam prontos para o combate, e assim partiram contra as hostes muçulmanas. 5.2 A BATALHA Concluído anteriormente a verificação dos antecedentes que fomentaram o derradeiro embate entre os cristãos e os muçulmanos, a partir deste momento passaremos a descrever e analisar a batalha segundo consta na narrativa que serve como fonte primária. No entanto, é necessário tratar algumas questões iniciais. Tais questões significam que primeiramente será apresentada a fonte, mediante a uma contextualização da mesma, e nela destacado alguns aspectos que são elementos chaves neste estudo. Posteriormente o foco será retomado para o tema central e seguirá de maneira fluida. Diante do exposto, a partir deste momento será utilizada a narrativa da batalha, cuja qual está contida no título vinte e um do Livro de Linhagens do Conde Pedro de Barcelos. Sobre a narrativa, é importante destacar que: A narrativa da batalha é resultado de uma extensa interpolação ao primitivo texto da obra. Esta e outras interpolações existentes e reconhecidas são resultado de refundições posteriores do livro e a descrição da luta apresenta-se na sequência da Linhagem dos Pereira, a qual, tanto Lindley Cintra quanto José Antonio Saraiva e José Mattoso confirma tratar-se de material apócrifo, acrescentado entre 1360 e 1383. (FERNANDES, 2011, P.77)

Todavia, conforme nos mostrou Fátima Fernandes, o trecho da narrativa foi acrescentado posteriormente. Assim, referente à data: é de presumir que esta seqüência de textos foi redigida depois da morte do Prior D. Álvaro, [...] O Prior faleceu em 1373; a narrativa do Salado e os outros textos do mesmo Autor foram escritos, portanto, entre esta data e

57

1383, ano da morte do Rei D. Fernando de Portugal. (SARAIVA, [19--], p. 14)

Outro fator importante que deve ser apontado refere-se à autoria: Deve tratar-se de um amigo ou criatura do Prior, como é óbvio, e também de uma personagem com suas ligações com a Ordem dos Hospitalarios. Com efeito, a narrativa da batalha do Salado tem indicações muito precisas sobre a ordem de batalha própria dos Hospitalarios, e explica essa técnica de combate pelas condições da guerra contra os Turcos, a quem a Ordem se dedicava. (SARAIVA, [19--], p. 13)

Não obstante, devemos salientar que é também nesta época em que Portugal enfrentava uma crise dinástica32. Todavia, além da figura do Prior do Crato Álvaro Gonçalves Pereira evocar a imagem de um nobre virtuoso; remete também à Reconquista e o ideal de Cruzada: Assim, esta fonte funcionaria como crônica particular de Álvaro Gonçalves Pereira e instrumento alçador da sua linhagem às vésperas da crise dinástica de Borgonha após o que outro expoente desta linhagem, seu filho natural, Condestável Nuno Álvares Pereira assumiria esta função já na dinastia de Avis. As ações do Prior da Ordem do Hospital representariam no Livro de Linhagens o ideal cruzadístico aplicado a um nobre idealizado lutando contra o infiel na Península Ibérica, o qual se sobrepõe ao ideal régio ainda que na narrativa interpolada de Álvaro Gonçalves Pereira destacam-se inúmeras ações de relevo que contribuem também na construção do perfil de fiel vassalo. (FERNANDES, 2011. p. 81)

Neste sentido, podemos observar também que a nobreza nesta época, estava passando por uma transformação, já mencionada no capítulo anterior, e que necessitava se reafirmar como grupo de relevo. Com efeito, esta narrativa detém certa influência de uma literatura cavaleiresca, oriunda das Ordens Militares que emanam seus valores, e que também possuem posição de destaque numa estratificação nobiliárquica. Tais prerrogativas justificam-se pelo serviço prestado à fé e também ao reino, de modo que estes monges guerreiros deveriam ser vistos no _______________ 32

Entre o fim do século XIV e o início do XV, Portugal sofreu uma grave crise dinástica após a morte do rei D. Fernando (1367-1383), o qual não havia gerado um varão legítimo e acabou deixando o poder nas mãos de sua rainha, Leonor Teles (1350-1386). O casal tivera somente uma herdeira, desposada com o rei de Castela Juan I (1379-1390). A ambição ao trono vizinho da parte do monarca castelhano e a instabilidade política gerada pelo governo estar nas mãos de uma mulher, colocou o território em guerra. Em meio a este quadro, uma improvável figura desponta como líder em defesa dos interesses portugueses: D. João, Mestre de Avis e irmão bastardo de D. Fernando. Após diversos embates, o ilegítimo filho do rei D. Pedro I (1357-1367) é eleito rei de Portugal nas Cortes de Coimbra de 1385. TREVISAN, Mariana Bonat. A dinastia de Avis e um novo começo para a História de Portugal no século XV: Fernão Lopes e a Sétima Idade. In: IX Simpósio de História: Fins e recomeços da História em religiões, mitos e ideologias, 2012, São Gonçalo. Anais do VI Simpósio de História: Revoluções, Repúblicas e Utopias, 2012. p. 123-130.

58

prisma tanto da narrativa do Salado quanto no Livro De Linhagens, como referência e modelo a todo o conjunto da sociedade tanto cavaleiresca quanto nobiliárquica. Portanto: O seu desempenho e a qualidade de suas ações na defesa do reino contra os inimigos da fé mostrariam a indispensabilidade destas Ordens e reveria os critérios classificatórios de hierarquização dos estratos privilegiados, relativizando defeitos de nascimento, sangue e patrimônio. A nobreza portuguesa e peninsular deveria espelhar-se nestes homens da fé e da espada a fim de recuperar sua auto-estima de grupo frente à crescente centralização régia e à crise de identidade que atravessava havia algumas décadas. (FERNANDES, 2011. p. 80)

Neste sentido, a Batalha do Salado representa uma oportunidade de demonstrar valores, adquirir glória e garantir status: Senhores, este é o nosso dia, em que havemos d’escrarecer, e este é o dia da vitória e da honra dos fidalgos. Este é o dia da salvaçom de nossas molheres e filhos e daqueles que de nós decenderem. E este é o dia em que havemos semelhar nossos avoos, que ganharom a Espanha. Este é o dia da salvaçom das nossas almas; nom se perca hoje per nossa fraqueza. Feiramo-los de toda crueldade (PEDRO, Conde D. Vol. I p.245).

Neste trecho citado, é possível visualizar a ênfase em equiparar-se com os antepassados nobres que participaram das campanhas da Reconquista. Igualmente, também demonstra valores como honra e pertencer ao grupo de fidalgos. Assim, “refletimos brevemente sobre a eficácia da construção e consolidação de uma imagem ideológica do poder nobiliárquico, ao mesmo tempo dependente e fortalecedor da própria monarquia.” (FERNANDES, 2008, P.04) Outro trecho presente e igualmente importante de ser referido neste âmbito, diz respeito à honra da cavalaria33: O esforço era mui grande em eles, e faziam tam bem e tam igual, que todo home que os viesse sofrer e ferir e matar em seus emmigos, [...] que os nom louvasse de todo prez e honra de cavalaria. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.245)

Desta maneira, é possível mais uma vez verificar a prerrogativa de honra para o grupo da cavalaria como pertencente à nobreza.

_______________ 33

O trecho se faz importante, pois dentro do recorte temporal e espacial trabalhado, quem compunha a cavalaria, eram os nobres. Para melhor esclarecimento da posição de cavalaria como segmento pertencente à nobreza, cf. p. 39 e seguintes. (há uma nota explicativa especialmete sobre a cavalria)

59

Resolvido tais questões iniciais sobre a fonte primária, voltemos o foco para a batalha conforme descrita na narrativa. Salientamos que adiante seguirá a descrição da batalha de maneira detalhada, sendo também destacadas algumas evidências – as quais farão parecer que a descrição seja um tanto extensa. No entanto, é a partir destas evidências que poderemos verificar a importância desta narrativa, assim como quais eram as intenções do cronista-refundidor ao retratar a mesma. Logo no início da narrativa e rompendo com a descrição da genealogia referente ao Rei Ramiro, têm seu início de forma abrupta: “a sua natura é defender por u vam” (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.242). Em seguida, continua: E aquel mouro Alcarac, polo que ja vira no ordinamento das lides que fariam que faziam os cavaleiros hospitaleres, que os cristãos fezessem este ordinamento da az do curral, ordinhou estas duas azes de coinha pera a fenderem. A az de curral é redonda como môo e a as natura é de defender os que Alá estam e pera saírem dela a lidar quando comprir.(PEDRO, Conde D. Vol. I. p.242)

Percebe-se que o comandante mouro Alcarac reconhece os cavaleiros hospitalários ali presentes se organizassem numa formação az34 de curral, assim, ordenou que suas hostes formassem um az de cunha. Na sequência, o cronista-refundidor então discorre sobre tais táticas de guerra: E é feita d’asperões chantados as hastas no campo, e teem os esperões ferros de tres quadras; estam os ferros contra os que querem entrar aquel corral, eo corral é abarrotado d’escudos quadrados. Este ordinamento fazem os cavaleiros do Espital naquela conquista que eles ham com os Mouros, porque eles levam galees e [va]-xees (?), e por se colherem i os cavaleiros que vam correr pela Turquia, se veerem com g[r]am aficamento que achem i defensom, ca sempre eles leixam em estes curraes gram parte de cavaleiros. E como se i todos juntam, os corredores e as algaras, saem todos juntamente deles em magotes, e deles em azes longas, e deles em azes de coinha e lidam com o poder dos Turcos. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.242)

Percebe-se também que esta organização dos cristãos também servia como defesa, pois as hostes muçulmanas atacariam com determinação. Demonstra também grande respeito pelo poder bélico da Ordem do Hospital, ressaltando que tais cavaleiros combatiam os turcos, ao mencionar que os mesmos eram os que tinham

_______________ 34

Na Idade Média, az era a unidade de combate. Correspondia aproximadamente a um conjunto de 700 a 1.000 lanças – 2.100 a 3.000 homens. MARQUES, A. H. de Oliveira. Apud DA COSTA, Ricardo. 1998. p.244.

60

costume de enfrentar os muçulmanos. Por sua vez, há também a organização táticomilitar nas hostes muçulmanas: E Alcarac por esto se moveo a fazer este ordinhamento destas azes. E vez a az do curral pera refrescar gentes aa lide e pera se colherem i os mal chagados e pera sairem todo a lidar juntamente, se comprisse, e os que perdessem cavalos pera cobrarem i outros. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.242)

Na sequência, o cronista-refundidor chama a atenção ao descrever uma grande quantidade de combatentes: “e assi estavam os campos e vales e montanhas cubertas deles, que os mais dos cristãos que i foram tiinham que tanta cavaleria que Mouros nom podia haver em todo Africa nem em Asia.” (PEDRO, Conde D. Vol. I.p.242) Todavia, ao relatar a enorme quantidade de combatentes ali presentes, o cronista-refundior aponta que muitos cavaleiros acreditavam que era um castigo divino, e que se tratava de uma oportunidade de fazer penitencia por seus pecados (DA COSTA, 1998, p. 240). No entanto, outros acreditavam que o número excessivo tinha uma origem mágica ou astrológica: por que os Mouros som grandes estrologos, que faziam parecença de fantasmas d’homees de cavalo, e nom eram tantos como pareciam. Estavam tam fremosamente ordinhados pera lidar que bem era de pensar que, posto que todos Espanhoes e Franceses e Alemaes e Igresses ali estevessem, que haveriam lides pera VIII dias. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.242-243)

Percebendo a superioridade numérica dos muçulmanos, os cristãos precisavam de uma estratégia de combate. Assim, os reis cristãos fizeram um acordo para dividir as hostes em duas partes: el rei de Castela pela riba do mar, el rei de Portugal per antre as montalhas e o campo. E ordinharom e defendrom que nem ûus nom se apartassem a pelejar nem jugassem geneta, e que todos fossem ferir nas maiores azes a mantenente. Os reis partirom-se ali, e ûu foi a destro e outro ao seestro (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.243).

Logo após as hostes se dividirem e tomarem cada qual o seu rumo, o narrador da batalha faz a apresentação do rei Afonso IV. Nesta apresentação, ele ressalta que este rei havia realizado grandes feitos anteriormente, e que esta batalha seria a oportunidade ideal para que o rei recebesse a absolvição de seus pecados perante Jesus Cristo: E el rei dom Afonso de Portugual era de grandes feitos, quanto mais olhava pólos Mouros, tanto lhi mais e mais crecia e esforçava o coraçom, como

61

home que era de grandes dias, e tiinha que Deus lhi fezera gram mercee em o chegar aquel tempo u podia fazer emmenda de seus pecados por salvaçom de sa alma e receber morte por Jhesu Christo.(PEDRO, Conde D. Vol. I. p.243)

Conforme já mencionado neste estudo, na primeira metade do século XIV, o ideal de cruzada ainda estava presente no imaginário cavaleiresco, pois havia em comum o fato de que o inimigo daquela época de cruzada era o mesmo: o muçulmano. Com efeito, podemos visualizar este ideal na exortação feita por Afonso IV logo após tomar posição com suas hostes: Meus naturales e meus va//ssalos, sabedes bem em como esta terra da Espanha foi perduda por rei Rodrigo e ganhada pelos Mouros, e em como outra vez entrou Almançor, e em como os vossos avoos, donde descendedes, por gram seu trabalho e por mortes e lazeiras, ganharom o reino de Portugual. Em como el rei dom Afonso Anrequiz, com que a eles guanharom, lhis deu honras e coutos e liberdades e contias por que vivessem honrados, e nom tam solamente fez esto a eles, mais por a sua honra dava os maravedis aos filhos que jaziam nos berços, e os padres serviam por eles; em como os reis, que depos el veeram, aguardarom esto. Eu, depois que viim a este logo, fiz aquelo que estes reis fezerom; e, se algûa cousa i ha pera emendar, eu o corregerei se me Deus daqui tira. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.243)

Neste trecho, podemos observar também um sentido nobiliárquico do cronista-refundidor, onde seu escrito possui um público certo: a nobreza, a qual deveria ser novamente unida através da fraternidade das armas. Outro fator importante é a terra – que servia como meio de ligação entre os nobres – também era seu patrimônio hereditário. Com efeito, percebemos que Afonso IV, ao fazer o discurso, relembrou o ideal de Reconquista. Assim, “a ideologia senhorial e o ideário dos cavaleiros resumidos neste discurso, dão continuidade ao ideal de Reconquista” (DA COSTA, 1998, p. 239). Não obstante, também nota-se a importância da ligação do vassalo com o soberano: “muitas das suas histórias tem por tema os dramas da lealdade que obriga o vassalo a incompatibilizar-se com o senhor por amor do senhor, a quem se deve a verdade” (SARAIVA, 1964-1973 p.15). Além disso, podemos perceber também que tal discurso serviria de motivação para não somente reforçar a confiança dos nobres ante ao rei, como também para a batalha ser enfrentada com maior entusiasmo: Olhade por estes Mouros que vos querem guanhar a Espanha, de que dizem que estam forçados, e hoje, este dia, a entendem de cobrar se nos nom formos vencedores. Poede em vossos corações de usardes do que usarom aqueles donde viides, como nom percades vossos molheres nem vossos filhos e o em que ham-de viver aqueles que depois vós veherem, os

62

que i morrerem e viverem seeram salvos e nomeados pera sempre>>> Os fidalgos portugueeses lhi responderom: El rei foi desto mui ledo. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.243-244)

Na sequência da narrativa, Afonso IV, após fazer o seu discurso, fala para o Prior Álvaro, que o mesmo ordene trazer o símbolo religioso da Cruz do Marmelar, que era guardada pela Ordem Dos Hospitalários em Portugal (DA COSTA, 1998, p. 250). Assim, o rei: Disse [a] dom Alvaro Gonçalvez de Pereira, prior da Ordem da cavalaria de Sam Joham no reino de Portugual, que fezesse mostrar a Vera Cruz do Marmelar que lhi el mandara trager. E o prior do Alvaro de Pereira mandou vestir ûu crerigo de missa em vestimentas alvas, e a Vera Cruz em ûa hasta grande, que a podessem veer de todas partes, e fez o crerigo cavalgar em ûu muu muito alvo, trouxe a Vera Cruz ant’el rei. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.244)

Então, quando o Prior apresentou a relíquia, pediu não só para o rei como todos os combatentes, que depositassem sua fé na mesma: e dixe-lhi o priol dom Alvaro: >. El rei e aqueles que com ele estavam forom mui ledos e esforçados destas palavras do priol dom Alavaro, e dixerom: . E fezerom sua oraçom a Vera Cruz mui homildossamente.”(PEDRO, Conde D. Vol. I. p.244)

Portanto, além da conotação religiosa do discurso, percebemos que no relato, é o Prior quem profetiza ao rei português que ao colocar a bandeira da Santa Cruz do Marmelar como intercessora junto a Jesus Cristo. Assim, os portugueses alcançariam a vitória antes mesmo dos castelhanos. O trecho seguinte da narrativa volta-se para a organização dos muçulmanos e suas hostes em decorrência dos movimentos feitos pelos cristãos: Alcarac, o Turco, vio como se partiam os cristãos. Mandou dizer Áli Albofacem que os cristãos eram partidos em duas partes, e a ûa queria entrar pela costa das montanhas pera darem na çaga, e que este saber que os cristãos faziam, que bem coitava ordinhar que fosse a seu dano deles. E que el fezesse sa lide com os que iam pela riba do mar, ca el em pequena hora venceria aqueles cristãos, e seeriam logo com el a ferir çaga daqueles que com el lidassem, mandou Alcarac reis e infantes e outros altos homees acometer os cristãos com a metade dos XXXII// mogotes dos genetes e arqueiros mui rijamente, os ûus na deanteira e os outros pelas costaneiras e os outros na çaga.” (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.244)

63

Podemos visualizar que assim como as hostes cristãs foram divididas em duas frentes (portuguesas e casatelhanas), o mesmo ocorre com as hostes muçulmanas. Logo após a narrativa descrever esta organização, segue o primeiro momento de combate direto, o qual a narrativa descreve como violento. Além disso, também aponta que os muçulmanos eram bons combatentes e esforçados: Ali se volveo a lide dos reis cristãos e dos Mouros mui danosa e mui crua e sem piedade. Os Mouros eram muito esforçados e feridores de todas partes. Aos ûus davam azagaiadas, ós outros de lançadas a mantenente, e ós outros a espadadas, e ós outros de frechadas d’arcos torquies, que eram tam espessas que tolhiam o Sol. [Ali caiam cavaleiros e cavalos mortos da ûa e da outra parte, ali [veeri] ades cavalos sem senhores andar soltos, e os cavaleiros que eram em terra filhavam-se pelos lazes das capelinas e dos bacinetes, e davam-se das brochas, que as poinham da outra parte.]”. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.245)

No trecho acima, além de demonstrar a violência do combate, também demonstra que o mesmo estava equilibrado. No entanto, em um segundo momento, a vantagem do combate aparenta ser dos muçulmanos, sendo reforçada no seguinte trecho: Os Mouros, nom se lhis olvidava aquelo por que ali veeram, ca eles refrescavam cada vez dos mogotes que estavam folgados, e feriam os Portugueses a destro e a seestro, assi que o aficamento era tamanho de todas partes que home nom poderia mostrar. Os Portugueeses forom ferir nas IIII azes dobradas, assi como lhis fora mandado pelos reis. Esto lhis foi grave de fazer pelo aficamento grande dos magotes. Ali se renovou a lide mui doorida de crueza e de sanha. Ali s’esmalhavam fortes lorigas e britavam a especeavam e talhavam escudos, capelinas, bacinetes, per os grandes e duros golpes que se davam.” (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.245)

Na sequência, o cronista-refundidor aponta que a hoste portuguesa passou a encarar um sofrimento, descrevendo com detalhes tal violência e dificuldade. Além disso, aponta também que os cristãos estavam em menor número, o que facilitava para as hostes muçulmanas: As chagas eram muitas, de que se vertia muita sangue. Os Portugueeses assi forom durando e sofrendo sa batalha em tal pressa e coita como ouvides, mais todo seu trabalho nom lhis valia rem, porque u tiinham matreitos os Mouros, refrescavam-se cada vez dos que estavam em tal batalha, ca e sa coita dos cristãos era tam grande, com o gram trabalho que haviam, que home nom o poderia contar.”( PEDRO, Conde D. Vol. I. p.246)

64

Diante deste cenário de dificuldade, os combatentes cristãos buscavam inspiração e ânimo, no intuito de adquirir forças para reverter a situação adversa. Assim, segundo a narrativa, diziam uns aos outros: .(PEDRO, Conde D. Vol. I. p.246)

O trecho acima revela que os combatentes cristãos estavam imbuídos da missão de defender a cristandade ante ao inimigo. É a partir desta premissa que buscavam ânimo: em caso de morte, a mesma seria gloriosa, pois estariam agindo de forma semelhante a Jesus Cristo, no sentido de morrer pela fé; já em caso de vitória, seriam recebidos em Portugal como heróis, louvados com honra por seus feitos à cristandade. Além disso, acreditavam que neste momento a sociedade depositava neles (cavalaria-nobreza) a confiança na vitória. Assim, novamente podemos inferir que esta nobreza buscava afirmar-se como necessária não somente ao rei, mas também para a sociedade como um todo. Embora os cristãos sentirem-se reanimados com as palavras de inspiração que diziam uns aos outros, era chegado o momento em que fisicamente pareciam estar esgotados; até mesmo a voz fraquejava em virtude de tal cansaço: Estando em este aficamento qual ouvides, os membros com que havim de ferir lhis enfraqueciam, assi que os nom podiam reger senom mui gravemente. As vozes deles eram baixas e tam mudandas, que se nom entendiam ûus a outros, como aqueles que começaram a lide a hora de prima e estavam passante meio dia. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.246)

Se para os cristãos a dificuldade era mais flagrante a cada momento, para os muçulmanos significava que era um bom momento, pois de acordo com o cronistarefundidor: Os Mouros refrescavam-se cada vez mais e mais dos que estavam folgados. E os gritos deles e das trombas e anafiis e d’altâncaros e atavaques e gaitas assi reteniam que parecia que as montanhas se arreigavam de todas partes. Esta hora foi aos cristãos d’escoridõe, d’amargura, de gimidos. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.246)

65

É importante destacar que até o presente momento, a narrativa demonstra que o ideal religioso fortemente presente se mostrava como fator motivador para os combatentes. Como vimos, em momentos de dificuldades servia como elemento positivo, mas a adversidade passou a ser tamanha, que os próprios cristãos começaram a fraquejar perante a sua fé – o que de certa forma é incoerente com o ideal da Idade Média, onde a religião está fortemente presente no imaginário e mentalidade da sociedade daquele período. Segundo o cronista-refundidor: diziam contra Jesu Christo: (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.246-247).

Neste momento em que muitos cristãos demonstravam-se desanimados e com sentimentos de fraqueza, questionando sua fé e Jesus Cristo, ocorre uma reviravolta: Estando os cristãos em esta pressa e coita e aventuira sem esperança, chegarom tres cavaleiros ao priol dom Alvaro de Pereira e disserom-lhi: (PEDRO, Conde D. Vol. I. p.247)

Em meio a esta dificuldade no combate e com poucas esperanças entre os cristãos, surgem três cavaleiros e relatam a situação ao Prior. Em seguida, e como ponto de viragem, perguntam ao Prior onde se encontrava a Cruz do Marmelar, onde acreditavam que por se tratar de um objeto sagrado, seria capaz de reverter a situação adversa, principalmente na questão psicológica de cada combatente. Ora, observamos que os cristãos primeiramente estavam seguros e motivados pela fé, e também por ideais cavaleirescos, assim como refletidos na exortação do rei Afonso IV; já em um segundo momento, quando a desvantagem estava ficando nítida, até mesmo a fé que possuíam fraquejara, além do sentimento de desanimo ser flagrante, é na Vera Cruz que surge a oportunidade de transformar novamente a batalha favorável cristãos:

66

O priol foi desto e mui coitado, polo que el dissera a el rei dom Afonso, que por a bem-aventurada Santa Vera Cruz havia de vencer primeiro. E disse a gram voz: > E os cavaleiros lhi disserom: . Disse el rei: >. (PEDRO, Conde D. Vol. I. p. 250)

Além do dialogo entre o comandante Alcarac e o sultão sobre a situação de suas hostes, em números por assim dizer, entre aqueles que foram deslocados para reforçarem locais mais enfraquecidos, e sobre tantos outros que restavam ali; percebemos também a questão mística, onde os poderes mágico-astrológicos de cristãos e muçulmanos estavam a serviço de seus credos. Assim, tais poderes serviam também de instrumento confirmador das ortodoxias em luta, pois “mesmo no momento da derrota muçulmana, a astrologia era posta a serviço das ações militares” (DA COSTA, 1998. p. 242). Nesse sentido, o sultão discorda do

71

comandante Alcarac e resolve tentar uma última investida, fazendo uma nova exortação: Em’esto entrou antre estes IX mil cavaleiros e tornou o rostro contra u viinham os cristãos, e disse a grandes vozes: >. E disse muito alta voz: Deu das esporas ao cavalo mui rijamente contra os cristãos que // iam por seu encalço, e disse: E indo a todo seu poder para ferir da espada, dom Alcarac, o Turco, e o infante Bazyane, seu filho d’el rei, encalçarom-no e filharom-no pela rédea do cavalo; disserom-lhi: (PEDRO, Conde D. Vol. I. p. 250-251)

Neste discurso feito pelo sultão, percebemos que há a intenção de renovar as forças e esperanças dos combatentes muçulmanos, usando como elemento principal a sua posição de soberano, ao elencar todas as suas conquistas e honras. O sultão alega também que a Espanha era pertencente aos muçulmanos e que havia sido perdida por seus antepassados. Salienta também que os cristãos ali presentes no combate não são tantos, e também afirma que já estão em uma condição física debilitada pelo desgaste do combate. Além disso, há também a presença da questão sagrada, ao trazer, por assim dizer, o profeta Maomé 36 para o “campo de batalha”. Em um segundo momento, exprime a ação tomada pelo sultão, que insistia na investida e desta vez sendo barrado por Alcarac, porque seus comandados estavam sendo derrotados e assim fugindo dos cristãos. Então, Alcarac além de impedir que o sultão Abû-l-Hasan’ Ali fosse em direção à morte, ainda tentou amparar aqueles que recuavam: “e colhia assi todolos Mouros que viinham desbaratados e enviava-os adeante a az do corral” (PEDRO, Conde D. Vol. I. p. 251). Na sequência, o cronista-refundidor descreve um dialogo entre Alcarac e Abûl-Hassan’ Ali. Tal diálogo revela a insistência do comandante para que o sultão _______________ 36

Dentro da narrativa da batalha, o profeta Maomé é chamado de Mafomede.

72

desista daquela batalha, evitando assim a sua morte. Sugere também que com a fuga, poderia então o sultão organizar uma futura vingança. No entanto, o próprio sultão rechaça tal ideia, alegando que já havia perdido praticamente todos seus combatentes que havia reunido ao longo de suas conquistas. Relembra também que já havia perdido seu filho Abu-Malik37, e punido aqueles que fugiram na tentativa de invasão no ano anterior: Acesso em 28 mai. 2013. COSTA, Rircado da. A Guerra na Idade Média: um estudo da mentalidade de cruzada na Península Ibérica. ______. A Cavalaria perfeita e as virtudes do bom cavaleiro no Livro da Ordem de Cavalaria (1275), de Ramon Llull. In: FIDORA, A. e HIGUERA, J. G. (Eds.). Ramon Llull caballero de la fe. Cuadernos de Anuário Filosófico - Série de Pensamiento Español. Pamplona: Universidad de Navarra, 2001, p. 13-40. Disponível em: Acesso em: 6 abr 2015 DEMURGER, Alain. Os Cavaleiros de Cristo: as ordens militares na idade média (sécs. XI-XVI).Rio de Janeiro. Jorge Zahar Ed., 2002. DUBY, G. As Três Ordens ou O Imaginário do Feudalismo. Lisboa: Estampa. 1982. FERNANDES, Fátima R. A nobreza, o rei e a fronteira no medievo peninsular. In: En la España Medieval, Madrid, n. 28, p.155-176, 2005. Disponivel em http://revistas.ucm.es/index.php/ELEM/article/view/ELEM0505110155A>. Acesso em: 13 ab. 2015. ________. Comentários à legislação medieval portuguesa de Afonso III. Curitiba: Jaruá, 2000. ___________. Discurso e poder na obra de Pedro Afonso, Conde de Barcelos. In: Anais do IV Encontro Internacional de Estudos Medievais, Belo Horizonte, PUCMG/ ABREM/ CNPq e FAPEMIG, 2003, p. 351-356. ________. O Poder do relato na Idade Média Portuguesa: a Batalha do Salado de 1340. In: Revista Mosaico. n. 4. Goiânia: PUC-GO, 2011, p. 75- 91. Disponível em Acesso em: 9 mai. 2015.

82

GIMENEZ, José Carlos. O Papel Político da Rainha Isabel de Portugal na Península Ibérica: 1280 – 1336. Curitiba, 2005. 201f. Tese (Doutorado). Universidade Federal do Paraná. Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, 2005. _________. Reinos em guerras, infantas aflitas: a mulher nas vicissitudes políticas das monarquias Ibéricas Medievais. In Revista Diálogos Mediterrânicos. Disponível em . Acesso em 24 mai. 2013 INSTITUTO PORTUGUÊS DE HERÁLDICA. Armas e troféus – 2013. Editora: Instituto Português de Heráldica, 2014. LACHI, Antonio Luiz. D. Dinis, o Pai da Pátria de Portugal e o Fortalecimento Do Poder Monárquico: O Papel dos Juristas. Revista Jurídica UNIGRAN, Dourados, v. 2, n. 4. p. 17-28, jul./dez. 2000. LALANDA, Maria Margarida. A política externa de D. Afonso IV (1325-1357). Arquipélago. História. Universidade dos Açores. v.11, p.107-151, 1989. MARQUES, António Henrique R. de Oliveira. Breve história de Portugal. Lisboa: Presença, 1996. MARTINEZ FERRANDO, Jesús Ernesto. A. D. Alfonso de Portugal. Cartas – reg. 250, f.19 In Jaime II de Aragón: su vida familiar. Barcelona: Consejo Superior de Investigaciones Científicas, 1948. v.3. p. 324-325. MARTINS, Adriana F. Morais. A Crítica social à nobreza medieval portuguesa através das “antigas de escárnio e de mal dizer”. Curitiba, 2003. 30f. Trabalho de Conclusão de Curso (História) - Universidade Federal do Paraná. Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes. 2003. MATTOSO, José. Org. e SOUZA, Armindo de. História de Portugal: a Monarquia Feudal (1096-1480), Lisboa: Editorial Estampa, 1997. _________. A Nobreza Medieval Portuguesa: A Família e o Poder. 4ª Ed. rev. Lisboa, Editorial Estampa, 1994. _________. Identificação de um País: ensaio sobre as origens de Portugal (1096-1325). Vol II. Lisboa: Estampa. 1988 _________.Ricos-Homens, infanções e cavaleiros. A nobreza medieval portuguesa nos séculos XI e XII. 2 ed., Lisboa: Guimarães, 1982. (Coleção História e Ensaios, n. 2). MOCELIM, Adriana. A Nobreza Medieval Portuguesa no Livro de Linhagens do Conde Pedro de Barcelos. Curitiba, 2004. 55f. Trabalho de Conclusão de Curso (História) - Universidade Federal do Paraná. Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes. 2004. _________. “Por meter amor e amizade entre os nobres fidalgos da Espanha”: O Livro de Linhagens do Conde Pedro Afonso no contexto tardo-medieval português. Curitiba, 2007. 242f. Dissertação (Mestrado em História). Universidade Federal do Paraná. Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes. 2007.

83

_________, “Segundo conta a estória...” A Crônica Geral de Espanha de 1344 como um retrato modelar da sociedade hispânica tardo medieval. Curitiba, 2013. 317f. Dissertação (Doutorado em História) Universidade Federal do Paraná. Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes. 2013. MONTE, Marcel Paiva. Cruzada e Reconquista: as duas faces da conquista de Lisboa em 1147. In Medievalista [Online], Lisboa, ano 4, n. 5, 2008. p. 01-09. Disponível em < http://www.fcsh.unl.pt/iem/medievalista/MEDIEVALISTA5/medievalista-paiva.htm>. Acesso em 19 mai. 2015. MONTEIRO, Nuno Gonçalo. Os nomes de família em Portugal: uma breve perspectiva histórica , In Etnográfica [Online], vol. 12 (1) | 2008. DOI: 10.4000/etnografica.1599. Acesso em 7 abr. 2015. PETERS, A.P. A história é uma arte com Georges Duby. Revista Mosaíco, v4, n1, p.10-20. jan./jun. 2011. PIZARRO, José Augusto. D. Dinis, Rio de Mouro: temas e debates. Círculo de leitores, 2008. RICOEUR, P. Interpretação e ideologias. Francisco Alves: Rio de Janeiro, 1983. RUCQUOI, Adeline. História Medieval da Península Ibérica. Lisboa, Estampa, 1995. SANTOS, Aida. Estratégias de encarecimento na narrativa da Batalha do Salado. In: Revista da Faculdade de Letras: Línguas e Literaturas. v. 2, n.10,1993, p. 63-92. Disponível em . Acesso em: 28 mai. 2015. SARAIVA, António J., LOPES, Oscar. História da Literatura Portuguesa. Porto: Porto Editora, [19--]. SERRÂO, Joaquim Veríssimo. História de Portugal. Vol. 1. Lisboa: Verbo, 1979. ________. História de Portugal: Estado, pátria e nação (1080-1415). 2 ed. rev. Póvoa de Varzim: Cacém: Verbo, 1978. SOUZA, Armenia Maria. “A realeza cristã ibérica no Espelho dos reis de frei Álvaro Pais (séc. XIV)”, In: Revista Dimensões, Espírito Santo, n. 27, 2011. P.189-215. Disponível em < http://www.periodicos.ufes.br/dimensoes/article/view/2590/2086> Acesso em: 14 mai. 2015. TREVISAN, Mariana Bonat. A dinastia de Avis e um novo começo para a História de Portugal no século XV: Fernão Lopes e a Sétima Idade. In: IX Simpósio de História: Fins e recomeços da História em religiões, mitos e ideologias, 2012, São Gonçalo. Anais do VI Simpósio de História: Revoluções, Repúblicas e Utopias, 2012. p. 123-130. VASCONCELOS E SOUSA, Bernardo. D. Afonso IV (1291-1357). Mem Martins: Temas e Debates, 2009.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.