O “SEGREDO” E A DIMENSÃO RELIGIOSA DA “FÉ”

September 9, 2017 | Autor: F. Paulo Baptista | Categoria: Teologia, Humanismo, Filosofía, Antropología, Filologia, Espiritualidade Ecuménica
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O “SEGREDO” E A DIMENSÃO RELIGIOSA DA “FÉ” (uma abordagem de base linguístico-filológica, simbólica e antropológica)

por Fernando Paulo Baptista

 

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FERNANDO PAULO BAPTISTA Inspector Jubilado do Ministério da Educação   e do Ensino Superior   Filólogo (Humanidades Clássicas) pela Universidade de Coimbra   Investigador convidado do Centro de Investigação em Educação   [CIEd] da Universidade do Minho   Investigador honorário da Associação Piaget Internacional [AsPI]   Consultor editorial da revista da Organização Mundial da Saúde   [«WHO – Bulletin»]   Membro honorário do Movimento Internacional   da Tele-medicina / Tele-saúde [Fórum Ibérico e   Associação Ibero-americana de Telessaúde e Telemedicina – AITT]   Membro do “Editorial Board” e colaborador   das seguintes revistas inter-universitárias norte-americanas:   – «Journal of the Indiana Academy of the Social   Sciences» do Estado de Indiana – USA   (cf.: www.iass1.org );   – «Interdisciplinary Journal of Portuguese Diaspora Studies»   (IJPDS] – envolvendo a Anderson University, USA,   a Brock University, Canada,   e a University of British Columbia, Canada   (cf.: http://portuguese-diaspora-studies.com)   Membro da Academia.edu:   http://ipiaget.academia.edu/FernandoPauloBaptista/Books   Criador e Promotor da Associação de Amizade e Apoio   à Língua Portuguesa no Mundo — CPLP e Diáspora (online)  

     

O “SEGREDO” E A DIMENSÃO RELIGIOSA DA “FÉ” (uma abordagem de base linguístico-filológica, simbólica e antropológica) (singela homenagem à senhora Dra. Carla Sophia Abreu Vaz, do Secretariado do Centenário das Aparições)

A questão do “segredo”, mesmo pensada no estrito contexto da dimensão religiosa da fé e sob um enfoque linguístico-filológico, simbólico e antropológico (tal foi a proposta do tão desafiante quanto honroso convite que me foi dirigido para colaborar neste número da revista Fátima XXI), não dispensa uma referência, ainda que sumária, à multiplicidade de áreas, instâncias e instituições da vida social e comunitária e respectivas práticas comunicacionais e relacionais em que o termo ‘segredo’ aparece como incontornável designador conceptual. Basta pensar, a título de exemplo, em lexias, colocações, frasemas ou quase-frasemas1 já tão consagrados como os seguintes: «segredo de Estado», «segredo militar», «serviços secretos» (Política, Defesa, Segurança), «segredo de justiça» (Direito), «segredo [sigilo] de confissão» (Religião Católica — Direito Canónico), «segredo científico» (Investigação e Experimentação Científicas), «segredo [sigilo] profissional» (Deontologia Profissional), «segredo [sigilo] bancário» (Economia / Finanças), «segredo das fontes» (Comunicação Social)2...

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Sobre estes conceitos, ver Álvaro Iriarte Sanromán: A Unidade Lexicográfica – Palavras, Colocações, Frasemas, Pragmatemas (dissertação de Doutoramento), Braga, Centro de Estudos Humanísticos, Universidade do Minho, 2001, pp. 138-149 e 169-204. 2 Cf., a título documentativo, a Lei n.º 6/94, de 7 de Abril; Luísa Maria Pinto Teixeira: Segredo de Justiça (dissertação de Mestrado em Direito Judiciário), Braga, Universidade do Minho, 2011, com a ampla e diversificada bibliografia que a suporta, do

 

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E se avançarmos no sentido da interpretação e da compreensão do conteúdo noético-noemático do conceito nomeado por este lexema, torna-se imprescindível postular (como sistemático, direccionante e activador pressuposto hermenêutico de uma sua sustentada e contextualizada inteligibilidade...) a interacção analítico-dialéctica e dialógico-articulatória com uma vasta rede sapiencial, nominalmente condensada e enciclopaideuticamente polarizada em configurações gnosiológicas tão complexas como as seguintes: universo, tempo, espaço, duração, matéria, natureza, evolução, vida, animalidade, hominização, homem (anthropos), corpo, mente, sensibilidade, (auto)consciência, imaginação, criatividade, alma, espírito, Deus, tudo, nada, relativo, absoluto, imanência, transcendência, finito, infinito, física, metafísica, natural, sobrenatural, indivíduo, identidade, diferença, ipseidade, alteridade, subjectividade, intersubjectividade, sociedade, comunidade, público, privado, sagrado, profano, necessidade, liberdade, alienação, angústia, niilismo, absurdo, racionalidade, irracionalidade, transracionalidade, superstição, ignorância, informação, conhecimento, cultura, civilização, valores, historicidade, tradição, modernidade, ciência, arte (poesia, música, arquitectura...), imperfeição, perfeição, pecado, santidade, dogma, problema, silêncio, sigilo, confidencialidade, enigma, mistério, milagre, crítica, agnosticismo, fé, religião, misticismo, catarse, soteriologia, escatologia, eternidade...3 Importa, pois, que essa “rede” poli-sófica esteja sempre presente, ainda que de modo implícito (como background sapiencial potenciador da delimitação e especificação semântico-semiósica do termo e conceito de “segredo”), na presente e condensada reflexão, naturalmente circunscrita, tanto quanto possível, aos limites sintagmáticos, estabelecidos em função do espaço editorial disponível... Todavia, em assumida consonância com o primigénio ensinamento “cosmo(texto)gónico” de que «no princípio está o verbo» (João: Ev.,1), a abordagem ao complexo conteúdo eidéticoconceptual do “SEGREDO ” não pode nem deve prescindir da consciência da profundidade genealógico-significante da palavra que o identifica, demarca e singulariza, na medida em que, em nosso entendimento, a palavra, pensada, por um lado, em sua estrita singularidade de «monema

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      ponto de vista da informação, fundamentação e argumentação; o Acórdão nº. 1560/08.3TBOAZ.P1.S1 do Supremo Tribunal de Justiça, 16 de Março de 2011; o Decreto-Lei nº. 278/2009, de 02 de Outubro de 2009; o artigo jornalístico de opinião, intitulado «Segredos e sigilo, fontes confidenciais e confidencialidade», subscrito por Óscar Mascarenhas no DN, de 1 de Dezembro de 2012; Carlos Mateus: Deontologia Profissional (I e II cursos de Estágio de Advogados), Lisboa, VerboJurídico, 2011; Carlos Mateus: Deontologia Forense — Limites ao exercício da profissão de advogado, Póvoa de Varzim, Carlos Mateus & Associados, VerboJurídico, 2011; cf. também António Leite: artigo «segredo [sigilo]», com suas especificações, na Enciclopédia Verbo LusoBrasileira de Cultura, Edição Século XXI, 2003, vol. 26, pp. 607-609. 3 Cf. Giuseppe Tanzella Nitti e Alberto Strumia (coords.): Dizionario Interdisciplinare di Scienza e Fede, Urbaniana University Press, Città del Vaticano, 2002, 2 vols, nos seguintes artigos, entre outros: Agnosticismo, Anima, Antropico (Principio), Ateismo, Bellezza, Biologia, Cielo, Cosmo (Osservazione), Creazione, Cultura, Cuore, Determinismo, Dialogo Scienze-Teologia, Dio, Epistemologia, Ermeneutica, Evoluzione, Etica del lavoro scientifico, Fideismo, Genetica, Gesù Cristo, Infinito, Informazione, Materia, Miracolo, Mistero, Mito, Panteismo, Positivismo, Preghiera, Progresso, Ragione, Resurrezione, Scienza, Scienze Naturali (utilizzo in Teologia), Simbolo, Spirito, Tempo, Unità del Sapere, Universo, Uomo (identità biologica e culturale), Vangeli, Verità; cf., igualmente, Mariano Moreno Villa (dir.): Diccionario de Pensamiento Contemporáneo, Madrid, San Pablo, 1997, nos seguintes artigos (com suas conexões e implicações dialógicas): Absoluto, Absurdo, Agnosticismo, Alma, Amor, Angustia, Antropología, Ateísmo, Axiología personalista, Belleza, Bien y bien común, Carácter, Carisma, Ciencia, Compasión, Compromiso, Comunicación, Comunidad, Confianza, Contemplación, Contingencia, Corazón, Creencia, Cristianismo, Cuerpo (corporeidad-corporalidad), Culpa e inocencia, Cultura, Deber, Derechos humanos, Deseo, Determinismo e indeterminismo, Diálogo, Dios, Donación, Encuentro, Esperanza, Espiritualidad, Estética, Ética, Existencia, Fe, Felicidad, Fidelidad, Finitud, Fraternidad, Hedonismo, Hermenéutica, Hombre (varón-mujer), Humanismo, Igualdad, Infinito, Interpersonalidad e intersubjetividad, Justicia, Lenguaje, Libertad, Mal, Materia, Metafisica, Misterio, Muerte, Mundo y cosmos, Nada y nihilismo, Naturaleza, Palabra, Persona, Política, Razón y racionalidad, Religión, Respeto, Responsabilidad, Revelación y epifanía del otro, Rostro, Sabiduría, Secularización y secularismo, Sentido de la vida, Sentimiento, Ser, Solidaridad, Sufrimiento, Sujeto, Teleología, Tener, Teología, Tolerancia, Totalidad, Trabajo, Trascendencia, Trinidad, Utopía, Valor, Verdad, Vida, Virtud, Vocación, Yo y tú; cf. também, nas entradas respectivas ou com elas correlacionáveis, a Enciclopédia Einaudi, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1984-2000, vols. 1, 5, 9, 10, 12, 14, 18, 22, 33, 34, 35, 36, 37, 39, 40, 41; a Enciclopédia Verbo LusoBrasileira de Cultura - Edição Século XXI, Lisboa / São Paulo, Editorial Verbo, 1998-2003, onde se encontram importantes artigos nas correspondentes entradas disseminadas pelos seus 29 volumes; a Catholic Encyclopedia (http://www.catholic.org/encyclopedia/), a Gran Enciclopedia Rialp [GER] http://www.canalsocial.net/GER/busquedaav.asp) e, ainda, Maryanne Cline Horowitz (ed.): New Dictionary of the History of Ideas, New York – London, Thomson Gale, 2005, 6 vols.

 

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lexical», não deixa de ser um búzio polifónico, espiral e verticalmente carregado de fundura histórica, de memória, de mistério e de potencial semiogénico4 e, mais holisticamente perspectivada, pelo outro, em sua universal dimensão antropológica e essência semiótico-linguística como «faculdade simbólico-comunicacional», é, para Heidegger, «a morada do Ser e o abrigo da essência do Homem»5 ou, no belo e incisivo encadeamento metafórico do inspirado poeta e ensaísta argentino Hugo Mujica6, «umbral y altar del ser y el deseo...». Por outro lado, depois da “lição” do consagrado linguista M.A.K. Halliday, não é convalidável a conjectura de que se possa engendrar, construir, constituir e organizar verbo-discursivamente (logofanicamente) o conhecimento de qualquer área do “real” ou do “ôntico” (seja ela antrópica ou metaantrópica, cósmica ou meta-cósmica, física ou meta-física, empírica ou ficcional...) que fenomenologicamente se nos coloque à consideração e à reflexão, sem o accionamento do «código lexical», sem o recurso aos «lexemas» de um dado «sistema linguístico»7. É assim que se nos impõe como preludial condição uma clarificadora “radicação” de natureza etimológico-filológica e linguístico-lexicológica acerca da origem e significado do termo ‘segredo’. Na verdade, se por um lado, e com Arnaldo de Pinho8, genericamente aceitarmos que «toda a linguagem é lírica e crítica» e que «a linguagem religiosa não constitui excepção à regra», e se, pelo outro, reconhecermos que uma abordagem séria à problemática do “segredo” e do “sagrado”, seja qual for o prisma da sua perspectivação, muito dificilmente poderá dispensar o inestimável contributo reflexivo da Teologia, «o discurso teológico (como adverte aquele nosso consagrado pensador desta profunda área sapiencial...), dissecado e cortado de suas raízes (que, importa sublinhá-lo bem, são “raízes” verbo-simbólicas e, à partida e substantemente, semântico-lexicais!...), arrisca-se a transformar-se num simples repertório lógico» e muito dificilmente será aquela “instância da linguagem” capaz de garantir a “função hermenêutica” de articular as enunciações simbólicas com as enunciações doutrinais, potenciar o confronto com os mitos9 e os símbolos10 da sagrada escritura e de

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Cf. o meu ensaio: «S.O.S pelas matrizes profundas da Língua Portuguesa...» (no prelo). «... das Haus des Seins und die Behausung des Menschenwesens» (cf. Martin Heidegger: Lettre sur l’humanisme [edição bilingue, com tradução de Roger Munier], Paris, Aubier, 1970, pp. 162-163). 6 Cf. Hugo Mujica: Flecha en la Niebla: Identidad, Palabra y Hendidura, Madrid, Editorial Trotta, 1997, p. 167. 7 Na verdade, e em consonância com Halliday, é na lexicogramática (e mais focadamente no léxico...) que reside «o coração da linguagem» («the heart of language» [Halliday: 2003, 194]) e «a fonte da sua energia semiótica» («the source of its semiotic energy» [Halliday: 2003, 276]), constituindo, assim, «a casa do poder semiogénico de uma língua» («the semogenic powerhouse of a language» [Halliday: 2003, 248]), poder que transforma o léxico no “centro nevrálgico” da construção de todas as significações e de todos os sentidos, numa palavra, de todo o conhecimento, uma vez que é ele o insubstituível codificador, ordenador, sistematizador e informante noético-noemático e semiósico e, assim, o imprescindível sustentáculo operatório da acção verbo-comunicativa interpretante e expressante... Cf. M.A.K. Halliday: On Language and Linguistics, London / New York, Continuum, 2003, nas páginas referenciadas; cf. também Fernando Paulo Baptista: Nesta nossa doce língua de Camões e de Aquilino, Sernancelhe, edição da CM de Sernancelhe, 2010, p. 59. 8 Cf. Arnaldo de Pinho: Teologia e Interpretação, vol. I, S. M. da Feira, Letras & Coisas, 2012, pp. 171, 398, 400-401 e passim. 9 Sobre o culturalmente tão importante conceito de “mito”, ver, entre outros, o iluminante artigo de Jean-Michel Maldamé apud Giuseppe Tanzella Nitti e Alberto Strumia (coords.): op. cit., na entrada respectiva (p. 1000 e ss), com especial enfoque para os seguintes andamentos discursivos: «Mito e scienza contemporanea» e «Mito, religione e fede»; para outros aprofundamentos complementares, além da entrada «Mito» nas enciclopédias referidas na nota 3 (ver supra), consultar, também, apud Maryanne Cline Horowitz (ed.): op. cit., os seguintes desenvolvimentos tópicos: Myth in Antiquity, Myth in Biblical Times, Myth in the Middle Ages and the Renaissance, Myth in English Literature: Seventeenth and Eighteenth Centuries, Myth in the Eighteenth and Early Nineteenth Centuries, Myth in the Nineteenth and Twentieth Centuries; considerar, também, a seguinte e muito clarificadora síntese apud Rafael Gil Colomer (dir.): Filosofía de la Educación Hoy — Diccionario filosófico-pedagógico, Madrid, Editorial Dykinson, 1997, entrada «Símbolo», pp. [513-514: «La antropología ha definido el mito como aquel relato que se refiere a acontecimientos sucedidos in principio, in illo tempore, en un primer instante, fuera del tiempo histórico. El mito se halla necesariamente fuera del tiempo, precisamente porque él es la causa fundamentadora del devenir histórico. El mito es el relato fundador. (…) El universo simbólico — mítico — juega un papel preponderante. La lógica del lenguaje científico no puede dar razón de toda la organización cultural de la que el ser humano anda necesitado. Las preguntas por el “después de la muerte”, por el origen del mundo y su orden, por el sufrimiento…, en definitiva: la cuestión suscitada por Kant en las «antinomias de la razón pura», solo resulta lúcida desde la óptica mítica. (…) El mito, a la luz de la antropología contemporánea, se concibe “arquetípicamente”. Jung define el “arquetipo” como formas o imagines de la naturaleza colectiva que se dan casi universalmente como constituyentes de los mitos y, al mismo tiempo, como productos individuales y autóctonos de origen inconsciente. Los arquetipos son universales e formales. El ser humano no se construye desde el vacío, al modo de una tabula rasa, sino desde unos universales. El arquetipo es a priori; pero además es “formal”, es una facultas praeformandi. No depende ni del individuo ni del mundo de la vida, sino todo lo contrario: irrumpe en la conciencia individual y determina la construcción del «ser-en-mundo», entendido éste no solamente como um “para-sí” sino fundamentalmente como un “para otro” (p. 514). 5

 

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outras metanarrativas religiosas, disponibilizar as formas e os meios de representação e comunicação semiótica «no interior das quais as questões mais profundas da vida profana podem ser reagrupadas, compreendidas e redimidas», bem como promover o desenvolvimento entre «o pensamento revelador e o pensamento expressivo». Tudo no pressuposto de que «a cultura é, em primeiro lugar, o horizonte onde a fé é vivida, com seu feixe de significações, de símbolos, de mitos e de conceitos»11. Comecemos, então, pela supra-anunciada e justificada “radicação” em torno da origem e significado do termo ‘segredo’. O nuclear, incindível e irredutível constituinte morfo-semiogénico do corpo estrutural da palavra ‘segredo’ é a raiz indo-europeia *[s]ker- / [s]kṛ- > [s]kar- / [s]kr-a- / [s]kr-e- / [s]kor-12,

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      10

Sobre o conceito de “símbolo”, dada a sua inquestionável relevância neste contexto, considerar o importante e denso ensaio de Umberto Eco (in Semiotics and the Philosophy of Language, Bloomington, Indiana University Press, 1986, capítulo 4, pp. 130163), dedicado ao conceito de «Símbolo» [Symbol], pedindo nos seja permitido fazer uma especial chamada de atenção para o seguinte passo das conclusões respeitantes ao «modo simbólico» [symbolic mode]: «The main characteristic of the symbolic mode is that the text, when this mode is not realized interpretatively, remains, endowed with the sense — at its literal or figurative level. In the mystical experience, the symbolic contents are in some way suggested by a preceding tradition, and the interpreter is convinced (he must be convinced) that they are not cultural unit but referents, aspects of an extrasubjective and extracultural reality» [p. 163] (nota: este estudo de U. Eco está traduzido em Português no vol. 31 da Enciclopédia Einaudi, Lisboa, IN-CM, 1994, pp. 138-176, na entrada respectiva «Símbolo»); ainda sobre este conceito, considerar o bem elaborado artigo de JeanMichel Maldamé apud Giuseppe Tanzella Nitti e Alberto Strumia (coords.): op. cit., na entrada «Simbolo» [pp. 1301-1308], artigo do qual destacamos as seguintes passagens: «Il simbolo è un segno che permette la conoscenza e che concettualizza l’esperienza vissuta in una comunità fatta di scambi di sapere, di relazioni.» (…) «In quanto segno, il simbolo serve ad interpretare i fenomeni studiati, constatati, misurati e legati ad una spiegazione generale. La funzione del simbolo, estesa in questo senso, si applica a tutto ciò che è oggetto dell’esperienza per esprimere le relazioni dell’uomo con se stesso, con gli altri e con il cosmo. Così, dal senso preciso del simbolismo matematico a quello più generale dell’attività umana sociale o religiosa, il simbolo è un mezzo privilegiato di comunicazione e di interpretazione della realtà», de «costruzione di un’immagine del mondo o della natura [p. 1303]» (…), de «articolare il singolare e l’universale», de mediatizar «la creatività dello spirito» e de dinamizar e transportar consigo «le forze della vita, permettendo all’essere umano di trasformare le proprie energie vitali», convocando em analógica sintonia «i simboli che i cristiani usano nei sacramenti e che suppongono una partecipazione attiva di tutti i fedeli [p. 1304]». «Nel linguaggio religioso si usa l’expressione «simbolo della fede» per indicare una serie di verità confessate da una comunità credente, verità che accomunano i suoi membri e stanno alla base della sua unità [p. 1301].» (…) Todos os símbolos, verbais e não verbais, constituem «il mezzo efficace attraverso il quale si realizza la comunicazione tra Dio e gli uomini, oltre ad essere un’espressione del contenuto della fede in un Dio salvatore. Il simbolo appare dunque come il linguaggio appropriato per dire il mistero, cioè la comunione con una vita divina alla quale l’uomo è invitato a partecipare [p. 1302]»; no mesmo sentido, concorre a seguinte síntese: o símbolo, além da sua “função representativa” («algo está em vez de algo»), encerra «un fondo metafísico que presupone secretas afinidades, casi una mística compenetración recíproca entre el mundo visible y lo divino invisible» (cf. Lamberto Boni [coord.]: Enciclopedia Garzanti de la Filosofía, Barcelona, Ediciones B, S.A., 1992, entrada «símbolo», p. 907. Os símbolos abrem a realidade e, em vez de a clausurar, revelam a dimensão oculta da vida e do mundo, em sua mais abissal fundura, fundura à qual não é possível aceder de outro modo (cf. Rafael Gil Colomer [dir.]: op. cit., p. 513; em suma: «Il simbolo è dunque come “il luogo della nascita” dell’umanità, in quanto è allo stesso tempo strumento della comunicazione umana» (Jean-Michel Maldamé: no seu já supracitado artigo «Simbolo», p. 1307). 11 Cf. Arnaldo de Pinho: op. cit., p. 398. 12 O lexema ‘segredo’ é um nome proveniente do substantivo neutro latino ‘secretum, -i’, da mesma família do verbo secerno, -is, -ere, secrevi, secretum (= cortar, separar, dividir, colocar à parte, retalhar separativamente com um instrumento cortante [acepção físico-anatómica] ou com a mente [acepção distintivo-discernente, intelectivo-cognitiva], de onde, o significado de «separar ou retirar algo do domínio público para o circunscrever à esfera recatada, sigilosa e íntima de pessoas ou instituções»...); o verbo secerno é, como se pode verificar através da sua análise ou decomposição morfémica (< sē + cer- + -no), um cognato prefixal formado a partir do verbo cerno, -is, -ere, crevi, cretum (= cortar, separar, distinguir, discernir, ajuizar, decidir...), em que o prefixo «se-» (também ele proveniente do indo-europeu *s(w)e-, base do inglês «self» e base, também, do nosso pronome pessoal reflexo «-se»: alegrar-se, alimentar-se, arrepender-se, cortar-se, lavar-se...) introduz uma função de retro-flexidade (de retrojectividade) do conteúdo semântico inseminado na raiz do verbo em direcção ao “sujeito da enunciação”: «secedere», «secernere», «secludere», «seducere», «segregare»...; por sua vez, o verbo cerno (< cer- + -no) apresenta no seu «tema temporal» de “presente” a variante da raiz indo-europeia cer- (< ker-) no «grau e», com a adjunção do sufixo verbal –no, típico de alguns presentes latinos e gregos (exs: dam-no, -as, -are; dãk-nv [dak-no]...), raiz com a qual se relacionam morfo-semanticamente lexemas latinos como carpere (= colher, cortar o fruto da árvore), certamen (= luta, combate), cerniculum (= julgamento, crivo), concernere (= juntar, misturar as sementes [ou as ideias] no crivo para as seleccionar), concretum, corium (= couro, pele que foi esfolada), coriaceus, corticeus, -a, -um (= relativo à casca do sobreiro; cortiça), cribrare, cribrum (ex.: «per cribrum cernere: passar pelo crivo, passar a pente fino), crimen, criminalis, curtare, curtus, decorticatio (= descascagem), decorticare (= descascar), discernere, discretio, discretum, discrimen, discriminator, discriminare, excorticare (= tirar a casca, descascar, esfolar a pele), secretarium (lat. medieval: sala de reuniões sigilosas, feitas à parte, em segredo, como é o caso da generalidade das reuniões dos júris...), secretarius (lat. medieval: = pessoa pressupostamente culta e competente, incumbida do cargo de elaborar e redigir documentos institucionais importantes e reservados e de tratar, de modo distintivo e criterioso e com a devida segurança e confidencialidade, assuntos de natureza sigilosa; secretário), secrete, secretim, secretio, secretiora, secreto, secretus, -a, -um (= separado, colocado à parte, fora do alcance da vista, escondido...), scribere (= fazer incisões [grafémicas], escrever), scriptor (= escritor), scriptura (= escritura), scrobis (= escavação, cova, fossa), scortum (= couro), scortea (= casacão de pele), scrutinium (=

 

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naturalmente modelada, em suas configurações concretas, por variações de natureza fono-mórfica e por ampliamentos sufixais... Esta importantíssima raiz, veiculadora do significado genealógico e fundacional de cortar13, separar, apartar, marcar limites ou fronteiras, em sentido próprio e em sentido figurado ou tropológico (este último, através do “código retórico-estilístico”, com destaque para as figuras da metáfora, do símbolo, da alegoria, da metonímia, da hipérbole...), está na base (com muito próxima isomorfia e afinidade lexical na generalidade das “línguas românicas”: espanhol, francês, italiano...) de um vasto conjunto de vocábulos da mesma família, de que fazem parte, entre outros, os seguintes: carne, carnificina, carnívoro, carpo, certame, certeza, certificar, certo, charcutaria, concernente, concertar, córtex, cortiça, couraça, couro, crise, critério, crítico, crivo, curto, decreto, descarnar, diacrítico, discernimento, discernir, encarnação, encarnar, encurtar, endócrino, escaramuça, escarpa, escassez, escoriação, escorpião, escrever, escritura, escrúpulo, escrupuloso, escrutinar, escrutínio, excremento, exócrino, hipocrisia, sarcasmo, sarcástico, secretaria, secretariado, secretário...14

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      escrutínio, exame cuidadoso e pormenorizado)... Com a consciência bem clara de que a ideia de “cortar” não deixa de implicar também consigo as ideias de ferir, esfolar, descascar, arrancar a pele ou o couro, magoar, fazer doer, causar dor e sofrimento..., cabendo, todavia, complementar toda esta carga semântica matricial com o valorador, humanizador e poiético entendimento de Hugo Mujica, segundo o qual, «el dolor es el don de la hondura», que «duele todo aquello que abre y que cava más hondo de onde uno ya llegó», que «por un lado, el dolor ahonda y, por otro, desde esa honhura el amor se expande» e que «(...) ésos son los dos movimientos, el flujo y el reflujo de la vida». (Hujo Mujica apud Gabriel Aranovich, Marta Rodríguez Santamaría, Marta Santamaría (orgs.): La Argentina pensada: diálogos para un país posible, Buenos Aires, Editorial Biblos, 1998, p. 196). 14 De sublinhar, numa perspectiva de comparação inter-linguística e inter-lexical, a presença desta fecundíssima raiz (para além, como vimos, da matricial língua latina...) no inventário lexical de várias outras línguas indo-europeias, transportando em si o sema genómico e transversal de «cortar» (tanto em sentido próprio, como em sentido figurado); assim e por exemplo: em grego: ke¤rv [keiro] (= cortar, podar), kermat€zv [kermatizo] (= cortar em pequenos pedaços), kormÒw [kormos] (= pequeno pedaço ou fatia que resulta de um corte), karpÒw [karpos] (= o que se corta ou retira da árvore para ser comido, fruto), kr€nv [krino] (= cortar, separar, fazer a triagem, escolher, distinguir o essencial do acessório, para poder ajuizar do que é verdadeiramente importante e, depois, decidir...), diakr€nv [diakrino] (= separar), kr¤ma [krima] (= julgamento, decisão), kr€siw [krisis] (= corte analítico de exigente aprofundamento e diagnóstico clarificador, de acurada destrinça mental para discernir com inteligência os fenómenos, sua étio-génese e expressão patológica, ajuizar com competência e rigor, tomar decisões ajustadas e equitativas (justas) e abrir caminhos alternativos para uma superação criativa, inovadora, transformadora e humanizadora, face a uma situação de rara complexidade problemática e aporética, com inusitadas e alarmantes consequências sociais, como é a situação que vivemos...), kritÆr [kriter] (= juiz, decisor), kritÆrion (= padrão de referência que ajuda a cortar mentalmente, a separar, a clarificar, a discernir, a distinguir e a diferenciar; princípio ou regra que permite distinguir entre bem e mal, entre verdadeiro e falso, entre justo e injusto, etc...); kritikÒw ([kritikos] (= preparado, qualificado para discernir, distinguir; crítico...), sarkãzv [sarkazo] (= esfacelar a carne), sarkasmÒw [sarcasmos] (= sarcasmo, figura de estilo que se caracteriza pela sua contundência e mordacidade), sãrj, -kÒw [sarx, -kos] (= carne), sarkÒfagow [sarcofagos] (= sarcófago), skãrifow [scariphos] (= estilete para escrever, para fazer as incisões grafémicas nas tabuinhas da escrita); em sânscrito: kar (= mover de um lado para o outro, destacar), kart (= cortar), krnati (= ferir), krtíh (= cutelo)…; em inglês: apocrine, carnage (= carnificina), certain, concern, concert, cork (= cortiça para fazer rolhas), crime, criminal, crisis, criterion, critic, decree, diacritic, discern, disconcert, eccrine, endocrine, epicritic, excrete, exocrine, hematocrit (= tipo de análise hematológica que tem por objectivo medir a percentagem do volume do sangue total que é composto pelas células vermelhas; esta medição depende do número destas células e do seu tamanho), hypocrisy, garble, incertitude, plowshare (= arado, alfaia agrícola que rasga, corta ou retalha a terra em pedaços, deixando sulcos), recriminate, scar (= cicatriz), share (= partir em pedaços), shear (= podar, tosquiar), shears (= tesouras), scabbard (= bainha da espada…), scrape (= raspar), secretary, shard (= fragmento de uma peça de cerâmica, caco), sharp (= afiar), short (= curto), skirmish (= escaramuça)…; em alemão: scheren (= podar), Schere (= tesoura), schreiben (= escrever), Schriften (= escritura), Schroten (= cortar, talhar), Schrot (= tronco), herbsten (= colher), Skrupel (= escrúpulo), Herbst (= Outono, estação das colheitas), Kork (= cortiça para fazer rolhas, ou seja, a casca cortada e extraída do tronco dos sobreiros), Scherbe (= fragmento de uma peça de cerâmica, caco), Scharf (= talhante), schröpfen (= cortar superficialmente; escarificar as sementes); em antigo norueguês: skarfr (= corte em diagonal), skyrta (= camisa de manga curta) skor (= talhar), skrapa (= desfazer em pedaços)... Cf., entre vários outros, nas entradas respeitantes à raiz em análise: Alfred Ernout / Antoine Meillet: Dictionnaire étymologique de la langue latine: histoire des mots, Paris, Klincksieck, 42001; Pierre Chantraine: Dictionnaire étymologique de la langue grecque: histoire des mots, Paris, Klincksieck, 1999; Joan Corominas e José A. Pascoal: Diccionario Crítico Etimológico Castellano e Hispánico, Madrid, Editorial Gredos, 1991-1997, 5 vols; Robert Grandsaignes d’Hauterive: Dictionnaire des racines des langues européennes, Paris, Larousse, 1994 (ed. facs.); Calvert Watkins: The American Heritage Dictionary of Indo-European Roots, Boston-New York, Hougton Mifflin Company, 22000; Edward Roberts e Barbara Pastor: Diccionario Etimológico Indoeuropeo de la Lengua Española, Madrid, Alianza Editorial, 2007; Santiago Segura Munguía: Nuevo diccionario etimológico Latín – Español y de las voces derivadas, Bilbao, Universidad de Deusto, 2001; Idem: Diccionario por Raíces del Latín y de las voces derivadas, 2006; Julius Pokorny: Indogermanisches Etymologisches Wörterbuch, 2 vols., Tübingen, Francke A. Verlag, 2005; Douglas Harper: Online Etymology Dictionary: http://www.etymonline.com/index.php. 13

 

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O conteúdo singularizante e significante do conceito de “segredo” institui-se efectivamente através de uma “linha de separação e de fronteira”, de “corte” discernente e distintivo entre público e privado, entre sagrado e profano, físico e metafísico, efémero e lábil e perene e eterno, de tal modo que a fundura onto-antropológica do ser humano se assume como a zona ou esfera reservada, sigilosa, protegida e inviolável do «tesouro» (thesaurus) que o «mistério» é15... E o mistério (que «é o “segredo” de Deus relativamente ao mundo»16), por mais que dele se tente dizer, por maior que seja o esforço de racionalidade interpretativo-compreensiva e explicativa (exegética e hermenêutica) que sobre ele se faça incidir, “resistirá” como uma inatacável “fortaleza” de silencioso, meditativo e tremendo “mutismo”17 encantatório que só a energia alumiante da fé consegue transformar na desveladora, veritativa e reveladora élÆyeia [alétheia]18 que se faz sentir, entender e viver em cada acto de amorável partilha com o Criador... Essa poderá ser a “lição” maior da “mística” e do “misticismo”, alicerçada numa forte base civilizacional e cultural, proporcionada pelo vastíssimo e fascinante universo do Saber, desde a modelação antropo-agógica, paidêutico-simbólica, onírico-ideativa, aistésico-poiética e arquitectante das Humanidades (Línguas e Literaturas, Antropologia, Psicologia, Sociologia, Direito, Filosofia, Teologia, etc...) e das Belas Artes (com especial destaque para a Grande Poesia, a Grande Arquitectura, a Grande Escultura e a Grande Pintura e sobretudo a Grande Música...) até à racionalidade paradigmática e nomológico-explicativa das Ciências Puras e à operatividade metrológica, tecnúrgica, instrumental, pragmática e mediadora das Ciências Aplicadas e das Tecnologias... Na construção desse universo educativo-formativo tem a Universidade uma insubstituível missão na ascensional, plenificante e perfectivante caminhada social e comunitária em direcção ao futuro, enquanto «Alma Mater» que alimenta e alumia a realização das nossas potencialidades e faculdades antrópicas mais poderosas: a imaginação criadora, a racionalidade crítica e judicativa, a sensibilidade poética e estética, a memória informante e identificante, a inteligência intuitiva, conjectural e teorética, a vontade resiliente e decisional... A partir dessa base cultural e sapiencialmente mais exigente e mais forte (mas de modo intersubjectivamente dialógico-dialéctico e epistemológica e metodologicamente aberto e plural, problematizador, indagante e interrogante...), a alma e o espírito do Homem ganham um especial e sempre renovado alento para a sua empenhada e apaixonante “náutica” em busca do “velo de ouro” de um sentido e de um horizonte sem limites para a Vida e para o seu voo anabático em direcção ao numinoso, ao santo, ao sagrado, ao divino ou último, numa dinâmica transcendente que

                                                                                                                15

Cf. Jean Chevalier | Alain Gheerbrant: Dictionnaire des Symboles, Paris, Éditions Robert Laffont, 1982, entrada «Trésor», p. 967: «Le Trésor caché» não só é «le symbole de l’ Essence divine non manifestée» (…), mas é também «le symbole de la vie intérieure (…)». «Le trésor n’est pas un don gratuit du ciel; il se découvre au terme de longues épreuves». De um modo geral, os tesouros «são símbolos do conhecimento, da imortalidade, dos depósitos espirituais, que só uma busca arriscada permite alcançar. (...) O tesouro está geralmente no fundo das cavernas ou enterrado em subterrâneos. Esta situação simboliza as dificuldades inerentes à sua procura, mas sobretudo a necessidade de um esforço humano. O tesouro não é um dom gratuito do céu; descobre-se no fim de longas provações» (cf. a tradução portuguesa deste mesmo Dicionário de Símbolos, Lisboa, Círculo de Leitores, 1997, pp. 643-644). 16 Cf. Danielle Fouilloux et aliae: Dicionário Cultural da Bíblia, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1996, entrada «Mistério», pp. 180-181. Mas, «ainda que oculto ao entendimento de muitos, o “segredo” de Deus revela-se: Deus ama o mundo e não quer que se perca; todos os homens foram chamados à salvação. A essência, o cerne do “mistério“ no NT, é a vida, a cruz (o sofrimento partilhado por Deus) e a ressurreição de Jesus, que antecipa a salvação final do universo. É por isso que, no vocabulário cristão, o “mistério” designa sobretudo a “Páscoa” de Jesus e a sua actualização na Eucaristia (...)» (ibidem). 17 Cabe lembrar que o lexema ‘mistério’ provém do nome latino ‘mysterium’ que tem a sua matriz genética na raiz — *meuǝ- / *mū- / muǝ- —, portadora do significado fundacional de «ficar em silêncio, permanecer mudo e de boca cerrada», postura típica dos ritos “iniciáticos” e práticas “mistéricas” (“secretas”) como acontecia, por exemplo, nos famosos Mistérios de Elêusis; esta raiz está igualmente presente no seu homólogo grego mustÆrion (= segredo) — do qual foi decalcado para latim — e que pertence à mesma família do verbo mÊv (= cerrar a boca, não dizer palavra), todos eles relacionados com o adjectivo latino mutus, -a, -tum, no qual radicam os lexemas ‘mudo’, ‘mudez’ e ‘mutismo”... 18 Considerar, a propósito, o conceito heideggeriano de “verdade” como élÆyeia [alétheia] (cf. Martin Heidegger: A Essência da Verdade; marcas do Caminho [tradução de Enio Paulo Giachini e Ernildo Stein], Petrópolis, Vozes, 2008, pp. 25 ss.); relembrar também, neste contexto, a carta encíclica de Bento XVI: Caritas in Veritate” apud: http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/encyclicals/documents/hf_ben-xvi_enc_20090629_caritas-in-veritate_lt.html

 

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simbolicamente se dirige ao céu, como «lugar» da divindade...19. Toda essa energética da “procura”, numa trans-popperiana «búsqueda sin término», tem o seu foco irradiante no “MISTÉRIO ” e na “FÉ”20. E, hoje, mais do que nunca, «é preciso acreditar» (Leonel Neves / Luiz Goes) que o homem só se humaniza em plenitude através da vivência dialógica com os «mistérios de Deus» — Ele que é o «Alfa» fundamentante (mas sem fundamentação) de todas as coisas e o «Ómega» alumiante da infinita e absoluta «finalidade» sem fronteiras nem limites... É assim que dos inenarráveis abismos das principialidades sem princípio e das ultimidades sem fim, de onde tudo afinal toma começo, irradia a «Luz» arquetípica e benfazeja do «Autor e Senhor da própria Luz»21: Autor e Senhor que «no es el ser máximo, sino el totalmente otro, el diferente, que rompe las características del universo físico» e que «sólo una comunicación divina, la revelación» poderia esclarecer quem era e como actuava... Para «explicar su presencia en un mundo totalmente diferente de él», procuraram os cristãos a «ponte» em Jesus de Nazaré, cujo exemplo e modo de vida o transformaram não só no «eixo da História» mas também em «paradigma» da dignidade e em «critério» da busca discernente, humanizadora e anti-niilista de um sentido global para o “mistério” de Deus, do Cosmos, da Natureza, da Vida e do Homem — busca essa, intentada pela reflexão filosófico-teológica dos pensadores mais antigos até à dos actuais, incluindo a dos cientistas22... Ora, o “segredo”, em sua acepção mais genuína, mais elevada e mais nobre (fora, portanto, da “fronteira” ou da “reserva” perversa, degradante e desumana do “secretismo” típico dos contextos ocultantes e intransparentes em que se movem, de modo antidemocrático, maquiavélico e politiqueiro, “os jogos e os negócios do(s) poder(es)”...), é esse misterioso e inesgotável “potencial”, guardado e blindado como o mais precioso e intransaccionável dos “tesouros” na “arca” humano-

                                                                                                                19

Cf. Juan Antonio Estrada: El sentido y el sinsentido de la vida — Preguntas a la filosofía y a la religión, Madrid, Editorial Trotta, 2010, p. 53.   20 Considere-se o seguinte passo do importante e bem informado artigo «Mistero» de Tanzella-Nitti, op. cit., p. 987: «La riflessione dello scienziato sulla sua attività di ricerca gli mostra il mondo come un mistero. Sono un mistero l’essere e l’esistenza dell’universo, la sua coerenza, la nostra vita intelligente in esso. L’esperienza con cui si percepisce la presenza di questo «mistero» è, in un certo senso, un’esperienza di stupore, di riverenza ma anche di rivelazione: è la natura stessa a mostrarsi, a svelarsi. Lo scienziato semplicemente ci si imbatte. Infine, la realtà profonda cui rimanda l’appello al mistero o al mistico non si esprime, non si formalizza, ma costituisce piuttosto una base che sostiene il mondo dei fatti, il mondo di ciò che si può esprimere o formalizzare. Così come in quella teologica, anche nella riflessione scientifica il termine «mistero» non può identificarsi con i concetti di chiusura, limite o preclusione, anche se ne contiene alcuni elementi. La percezione del mistero rappresenta piuttosto un’apertura che attraversa l’esperienza del limite, ma la supera; non con gli strumenti della conoscenza scientifica, ma mediante una conoscenza che la trascende, sostanzialmente di tipo estetico, contemplativo o mistico. Il mistero di cui parlano a volte gli scienziati pare assumere i caratteri di un’apertura dall’interno della scienza verso qualcosa che trascende la scienza stessa». Mas o que deveras nos espanta, «o que, efectivamente, constitui o carácter incompreensível da encarnação e da graça»... é que «o finito humano possa receber o infinito divino» (cf. Arnaldo de Pinho, artigo «mistério» in Enciclopédia Verbo Luso-Brasileira de Cultura - Edição Século XXI, op. cit., 2001, vol. 20, p. 53); importa, assim, ter também na devida conta que, na Teologia cristã, «el misterio se refiere a la doctrina revelada por Dios, esto es, a la revelación de los secretos de la vida íntima de Dios y de sus planes sobre el hombre y el universo, que el fiel debe creer y que, sin ser irracional, está situado más allá de lo que la pura razón especulativa solitaria puede probar, ya que nunca es alcanzado racionalmente por completo, por lo que a ese misterio solo se puede acceder gracias a la revelación que el mismo Dios hace de sí. Cuando Dios no se revela, el acceso a su conocimiento o bien está vedado al hombre o bien siempre es desmedidamente precario» (cf. Mariano Moreno Villa: artigo «Misterio» in Mariano Moreno Villa [dir.]: Diccionario de Pensamiento Contemporáneo, op. cit., p. 791). 21 Porque «la pregunta por el sentido de la vida es constitutiva del hombre» e «la religión (construção cultural e criação humana) está vinculada a la búsqueda de lo absoluto, lo inmutable y no contingente, que puede dar sentido y ofrecer salvación al hombre», tanto mais que «lo primario es la referencia a lo sagrado y misterico» (cf. Juan Antonio Estrada: op. cit., pp. 11 e 53; ver também Hugo Mujica: La Palabra Inicial, Madrid, Editorial Trotta, 2003, p. 31: «Sentido es el horizonte y no lo recortado sobre él, es aquello que sin aparecer hace que todo lo que aparece tenga profundidad, que todo lo que se manifiesta tenga hondura, que cada parte manifieste al todo y el todo se abra a cada parte. Es lo que otorgando espacio y dimension, valor y hierarquia a cada cosa, hace que cada cosa tenga su propio nombre»); sobre o modo de perspectivar «Alfa e Ómega» e a «Luz», ver Hans Küng: O Princípio de Todas as Coisas, Lisboa, Edições 70, 2011, pp. 139-140 e 168; por outro lado, de um ponto de vista estritamente etimológico, filológico e lexicológico, Deus, pela semântica deste Seu nome identificador, é também o «Eterno Dia»: efectivamente, os lexemas ‘Deus’, ‘dies’, ‘deváh’ (= divindade, em sânscrito), ‘daēva-’ (deus do mal, em avéstico), tal como ‘Zeus’, ‘Júpiter’ e ‘Dyaus’, têm como base constitutiva a mesma raiz genómica indo-europeia: *dyew- / diw- / dyu-/ deywo- (cf. Fernando Paulo Baptista: ensaio intitulado «Sob o signo da luz ou a «centelha» [scintilla] de Zeus na palavra “teoria” [yevr€a (theoria)]», págs. 6-7, notas 18 a 25, apud: http://www.academia.edu; cf. também o estudo de Rubens C. Romanelli «Os Nomes de Deus no Indo-Europeu e no Semítico»: http://www.rubensromanelli.net/nomesdeus.html). Mas esta «luz» que cria, alumia, faz crescer e maturar... nada tem que ver com o feérico brilho que encandeia, deslumbra, entontece e faz enceguecer... 22 CF. Juan Antonio Estrada: op. cit., pp. 61-103.

 

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divina da fundura abissalmente mais íntima do nosso corpo-alma (body-mind) peregrinante, indagativo, intuitivo, meditativo, crente e criador... Esse intransaccionável “potencial”, inseminado ao longo do Tempo e da História da Civilização e da Cultura na essência do “segredo” e do “mistério”, foi sendo, selectiva, criteriosa e electivamente “cortado”, “separado”, “descarnado”, “depurado”23 e, assim, “purificado”, entre fé, esperança e amor (de par com misticismo, ascese e sofrimento24...), do território das “banalidades” imediatistas de um imanentismo sem horizonte e sem sentido que povoam as rotinas do quotidiano: daí, a sua dimensão de transcendência, superadora da angústia da finitude e da morte e do sem-sentido do absurdo e do nada... É assim que, em consonância com Gianfranco Ravasi, não podemos deixar de alimentar a esperançosa e serenante perspectiva de que «a apetência do ser humano pela divindade não só é potenciada pelo fascínio que irrompe das funduras do mistério mas também pela interpelação numinosa e pelo respeito profundo motivado pela sublimidade da dimensão da transcendência»25, uma vez que, tal como sublinha Tanzella-Nitti26, «nonostante il peso insostenibile del divino, esso si presenta in modo affascinante, qualcosa che suscita “meraviglia”». Importa, todavia, ter sempre bem vivo na memória o impressionante e desolado testemunho de Stig Dagerman, quando escreve: «Faltame a fé e, portanto, nunca poderei ser um homem feliz, porque um homem feliz não pode ter o receio de que a sua vida seja apenas um caminhar insensato para uma morte certa...»27. É, pois, numa perspectiva de fé e de transcendência (e sempre no respeitoso e aberto pluralismo e ecumenismo de perspectivas, entendimentos, práticas, caminhos e horizontes, quanto à universalidade do amor de Deus e à sua acção salvífico-revelacional na História28...), que se coloca indistintamente a todos os homens (com nome... ou sem nome...), em seu agónico e escatológico paroxismo, a questão da Vida e da Morte, do Ser e do Nada e, no seu âmbito, a relação entre Tempo e Eternidade... Ora esta relação «foi captada diferentemente ao longo da tradição filosófica e teológica. Mais que identificar eternidade com o fundamento estático ou adveniente do tempo, é preciso repensá-la em termos de mistério. Não se trata com isso de impedir a especulação, mas de mostrar o seu limite. Com isso, reconhecemos que qualquer palavra sobre o fundamento faz parte do nosso esforço imperfeito e incompleto de compreensão e interpretação. Por outro lado, se falamos desde a perspectiva da teologia cristã, o mistério não é somente aquilo que está escondido, mas aquilo que se

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Tenha-se presente a semântica “genómico-genealógica” inseminada, como já vimos, na raiz indo-europeia — *[s]ker- / [s]kor/ [s]kṛ- > [s]kra- / [s]kar-, — do vocábulo seu nomeador... 24 “Cortar”... dói... e implica as capacidades de sofrer e de suportar: «... supporter, c’est se tenir soi-même, de gré ou de force, sous la puissance d’agir de l’autre»; (...) «supporter devient subir, lequel confine à souffrir. En ce point, la théorie de l’action s’étend des hommes agissants aux hommes souffrants. (...) «À vrai dire, toute action a ses agentes et ses patientes». Tudo isto tem que ver, afinal, com a questão do poder e da violência, tudo isto atinge o limiar da ideia de justiça enquanto regra que visa igualizar os pacientes e os agentes da acção (cf. Paul Ricoeur: Soi-même comme un autre, Paris, Seuil, 1990, p. 186). 25 Cf. Gianfranco Ravasi: O que é o Homem? — Sentimentos e Laços Humanos na Bíblia, Prior Velho, Paulinas Editora, 2012, p. 42. 26 Cf. Giuseppe Tanzella-Nitti: artigo «Mistero», op. cit., p. 979, sendo pertinente considerar também o seguinte complemento reflexivo: «Il «mistero» si colloca dunque al vertice di una delicata tensione fra nascondimento e rivelazione, fra chiusura ed apertura, fra desiderio di espansione e necessità imperiosa di tacere. Esso possiede una dinamica, quasi una traiettoria, che conduce dal silenzio alla comunicazione, dal segreto alla conoscenza, sebbene secondo modalità che ne rendono il messaggio indisponibile alla maggioranza degli uomini ed accessibile solo a coloro che vi si accostano con le dovute disposizioni religiose. Pare tuttavia riduttivo intendere il concetto di mistero, come fa il linguaggio comune ordinario, in termini di enigmaticità, incomprensibilità o perfino di irrazionalità». 27 Stig Dagerman: «A nossa necessidade de consolação», citado por Gianfranco Ravasi no seu interpelante e motivador ensaio «A Flor do Diálogo», apud: O Átrio dos Gentios, Prior Velho, Paulinas Editora, 2012, p. 15. 28 Sendo de sublinhar o decisivamente influente, inovador, arquitectante e propulsor contributo antropo-teológico, sistematicamente indagativo («Para mim mesmo e para o mundo, eu sou uma pergunta infinita…»), inclusor, ecuménico e «cristocêntrico» («toda a graça de Deus é gratia Christi»), de Karl Rahner (com a sua monumental e diversificada obra, elaborada ao longo de mais de 40 anos de estudo e de reflexão...), com particular repercussão no memorável Concílio Vaticano II; contributo, a ser naturalmente complementado com a crítica que lhe tem sido feita sobretudo quanto ao risco de «absolutização do testemunho cristão» relativamente à pluralidade de credos ou mesmo à ausência deles e a uma «cristologia trinitária» e «pneumológica» e quanto à fragilização do «direito à diferença» (cf. o bem elaborado ensaio-síntese da autoria do teólogo Faustino Teixeira, pósdoutorado em Teologia pela Pontifícia Universidade de Roma: «Karl Rhaner e as Religiões», com o diversificado e credenciado suporte bibliográfico em que se fundamenta; cf. também, para uma perspectiva mais abrangente, a importante obra deste mesmo teólogo brasileiro: Teologia e Pluralismo Religioso, São Bernardo do Campo, São Paulo, Nhanduti Editora. 2012).

 

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revela. Nesse sentido, falar de eternidade como fundamento do tempo, é falar do Deus que se dá a conhecer chamando do nada o ser, os entes e o tempo, através da criação, mas assumindo igualmente, através da encarnação do Filho na plenitude dos tempos, aquilo que é próprio do tempo, dos entes e do ser, ou seja, tornando-se ele mesmo aquilo que cria. Uma teologia do tempo deve, portanto, conduzir-nos a uma teologia da criação. Nas Escrituras judaico-cristãs, essa teologia recorre também à narração para dizer o indizível»29. Por outro lado, precisamente numa época marcada, como é a nossa, por tão rápidas e tão profundas transformações a todos os níveis e, consequentemente, por tão fortes e preocupantes desenraizamentos e por tão soturnas e perturbantes desorientações geradas a partir das polémicas controvérsias em torno da origem e formação do Universo, da Vida e do Homem, é ainda a fé que, muito embora não acrescente nada ao conhecimento disponível que a ciência tanto enriqueceu, nos proporciona um saber orientador. Efectivamente, ela permite que o homem descubra um sentido na existência e no processo evolutivo e lhe consagre uma escala de valores para a sua acção e uma derradeira segurança neste universo incomensuravelmente grande... Por isso, acreditar hoje em dia no criador do universo, tendo como horizonte a cosmologia científica, significa afirmar, com esclarecida confiança, que o universo e o homem jamais podem permanecer, lado a lado, como dois “ilustres desconhecidos” quanto à sua origem primigénia, que o universo e o homem não foram atirados absurdamente do nada para o nada, mas que ambos são valiosos e fazem sentido enquanto totalidade, que não são caos mas cosmos, porque têm em Deus o seu último fundamento, o seu autor e criador e uma primeira e última segurança30. Só que a éρχή [archê], o transfundo e sustentáculo de tudo quanto existe, ou seja, “o princípio dos princípios” e “o fundamento dos fundamentos”, lembra-no-lo Hans Küng31, «não pode ser fundamentado». «Mas para a tradição judaica, cristã e muçulmana, sublinha ainda este sábio, profundo e clarividente teólogo, uma coisa é certa: Deus não é um abismo das trevas — a escuridão não gera qualquer luz. Pelo contrário, só a Luz, em sua infinita plenitude, torna possível o «Fiat lux!» no cosmos. Em todas as religiões, a luz é uma extraordinária metáfora de uma antiga palavra imagética para a realidade suprema: Deus32. E a moderna investigação científica em torno do espantosamente tão maravilhoso como enigmático fenómeno da “luz” não deixa de contribuir também para uma compreensão mais aprofundada do significado simbólico-religioso deste fascinante fenómeno. É assim que, na ininterrupta e persistente continuação desse odisseico esforço investigativo por parte da Ciência, se afigura altamente relevante o contributo dado por Niels Bohr com o princípio dialéctico da «complementaridade» («a natureza da matéria e da energia é dual e os aspectos ondulatório e corpuscular não são contraditórios, mas inter-complementares, sendo ambos detectáveis separadamente, em consonância com o tipo de experiência levada a cabo (e.g.: a) o efeito electrónico-difractor da dupla fenda; b) o efeito foto-eléctrico»)33, a significar que «a essência da luz» continua a ser investigada e que talvez virá um dia em que se consiga decifrar o seu “segredo”... Uma verdade se apresenta, todavia, como incontornável e intranscendível, aos olhos de quem acredita: o “Mistério” de Deus, mesmo com a analógica adjuvância investigativa de uma

                                                                                                                29

Cf. Geraldo De Mori apud Élio Estanislau Gasda (org.): Sobre a Palavra de Deus – Hermenêutica Bíblica e Teologia Fundamental, Petrópolis, Editora Vozes, 2012, p. 222. 30 Cf. Hans Küng: O Princípio de todas as coisas, Lisboa, Edições 70, 2011, pp. 137-139, cuja reflexão aqui temos vindo a seguir de perto, com pontuais ajustamentos enunciativos, entre citação e paráfrase de nossa exclusiva responsabilidade. 31 Idem: ibidem, p. 139. 32 Ver supra a nota 21. 33 «… a dialética da complementaridade de Niels Bohr merece destaque porque através dela podem ser superados os conflitos dos paradoxos (…) entre a teoria corpuscular e a teoria ondulatória da luz.» (Cf. Claudiomir Selner: Método para análise de sistemas de conhecimento, inspirado no princípio da complementaridade de Niels Bohr (dissertação complementar de pósgraduação, para obtenção do grau de “Doutor em Engenharia de Produção”), Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina, 2006, p. 76; ver também: http://www.fis.ufba.br/dfg/pice/ff/ff-03.htm; http://sabedoriaquantica.blogspot.pt/2012/02/fisica-quantica-para-todos-4.html; ver ainda: http://www.ecientificocultural.com/ECC3/polar02_03.htm http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-24782008000100007&script=sci_arttext http://biosofia.net/2001/01/19/a-luz-perspectiva-esoterica-2/

 

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“complementaridade” foto-epistémica apoiada na mais avançada tecnologia, vai seguramente continuar a manter-se indecifrável... Ele permanecerá cada vez mais o Infinito, o Incomensurável e o Imperscrutável, oculto no alumiante e fecundador dinamismo energético-fotónico que atravessa magnanimamente, sem fronteiras e sem limites, toda a vastidão cósmica, até chegar a Deméter e encarnar transfigurado na “Pessoa” tão amorável, tão simples, tão pura e tão comovedoramente autêntica de Jesus de Nazaré, para se acolher soteriologicamente no afectuoso recôndito dos corações e das almas e aí nos segredar e revelar, persistentemente, no silêncio interior34 de todos os dias, que nos devemos amar uns aos outros como Ele nos amou e insuflar em todos os nossos actos a prístina bondade e a natalícia candura da criança que importa preservar integralmente dentro de nós35... Este é o “Mistério”, este é o “Segredo” que poderá e deverá levar-nos a enfrentar, entre outros, o combate derradeiro desta nossa transiente vida, com a esperançosa lucidez e serenidade de um Hans Küng, quando a Morte vier... Será seguramente «uma despedida para dentro», um emudecente e porventura lacrimoso “adeus” no «regresso ao lar do universo», mas jamais será ou terá que ser uma angustiante, desesperada e absurda redução ao Nada36!... Por isso, importa, em todas as circunstâncias e sazões da nossa existência efémera, reassumir poeticamente a nossa própria infância, convocando-a memorantemente com a inebriante mas respeitosa vitalidade genesíaca, plasmada no belo poema de Miguel Torga (Diário VIII):

Segredo

Sei um ninho. E o ninho tem um ovo. E o ovo, redondinho, Tem lá dentro um passarinho Novo. Mas escusam de me atentar: Nem o tiro, nem o ensino. Quero ser um bom menino E guardar Este segredo comigo. E ter depois um amigo Que faça o pino A voar...

São Paulo, 19 de Fevereiro de 2013.

                                                                                                                34

«Il silenzio è, segundo Gregório Magno, la casa del mistico e, per il mistico, Dio è il “Signore del silenzio”» (cf. Massimo Baldini, artigo «Mistica» apud Giuseppe Tanzella Nitti e Alberto Strumia [coords.]: op. cit., p. 995). 35 Porque, com Jesus de Nazaré, «il mistero... del Regno di Dio... è ora oggetto di rivelazione ai piccoli, ai semplici, ai quali non è richiesto un linguaggio da iniziati, ma un cuore puro» (cf. Tanzella-Nitti: op. cit., p. 981); depois, como “cristicamente” também no-lo recorda o nosso Fernando Pessoa, no seu poema “Liberdade”: «Grande é a poesia, a bondade e as danças... / Mas o melhor do mundo são as crianças»!... E os três pastorinhos “videntes”, da Fátima de 1917, eram crianças de coração simples e alma pura, consubstanciando plenamente, portanto, o famoso episódio evangélico narrado por Lucas (Lucas: 18, 15-17), segundo o qual, Jesus repreendeu os seus discípulos, dizendo-lhes: «Deixai vir a mim as criancinhas e não as impeçais de o fazerem, pois delas é o Reino de Deus. Em verdade vos digo: quem não receber o Reino de Deus como uma criança jamais entrará nele». (Ver também Mateus: 19, 13-15). Cf. Bíblia Sagrada, Lisboa, Difusora Bíblica (Franciscanos Capuchinhos), 41994, pp. 1173 e 1112, respectivamente. 36 Cf. Hans Küng: ibidem, pp. 217-218.

 

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Fernando Paulo Baptista Nota: Em consonância, por um lado, com as intrínsecas exigências inerentes a uma práxis investigativa, devidamente fundamentada, nos campos específicos da Lexicologia e da Filologia e, consequentemente, inerentes também ao desenvolvimento dos rigorosos procedimentos analítico-interpretativos nos processos de Exegética e de Hermenêutica dos textos escritos e em coerência ético-intelectual, pelo outro, com as conhecidas posições públicas por mim tomadas em vários debates académicos e em documentos escritos de reflexão (e.g.: http://ilcao.cedilha.net/?p=5334), centrados, entre outros aspectos, na supressão do primeiro dos grafemas das sequências «ct» / «pt», promovida pela Base IV, a pretexto da sua não «pronunciabilidade» (posições essas, que não foram até hoje por ninguém refutadas...), não posso nem devo, em consciência, respeitar o actual acordo ortográfico / 90, pelo que continuo a seguir o de 1945.

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