O sistema penitenciário brasileiro e a possibilidade de ressocialização do cidadão infrator

May 25, 2017 | Autor: Érika Batista | Categoria: Criminal Law, Direito Penal, Execução Penal, Sistema Penitenciario
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Universidade do Vale do Itajaí Érika da Silveira Batista Jenifer Colzani

O sistema penitenciário brasileiro e a perspectiva de ressocialização do cidadão infrator

Itajaí 2011

Érika da Silveira Batista Jenifer Colzani

O sistema penitenciário brasileiro e a perspectiva de ressocialização do cidadão infrator

Trabalho solicitado à turma do 3º período matutino do curso de Direito pelo professor Manoel Roberto da Silva, como requisito de formação da média para aprovação na disciplina de Direito Penal.

Itajaí 2011

Introdução A presente pesquisa tem como corolário construir uma noção da forma de execução das penas no Brasil, com foco no que elas guardam de semelhante à previsão legal e no quanto se distanciam do que estabelece a lei, as ideias gerais sobre as finalidades da pena e a possibilidade de atingi-las – em especial, a ressocialização do cidadão infrator. Após uma breve síntese sobre a história das penas, passa-se à análise delas no contexto brasileiro, observando-se a legislação e o entendimento doutrinário. Em seguida, estudar-se-ão as condições das penitenciárias nacionais, tanto no que se refere à estrutura dos locais, quanto às relações sociais que ali se estabelecem. Neste ponto, proceder-se-á a um exame das práticas ressocializadoras vigentes no país, observando criticamente o seu poder regenerador e a sua difusão. Por fim, breves comentários serão tecidos a respeito da criminalidade – pois o crime atrai a pena – em sua relação com as estruturas sociais, e apresentadas sugestões para minorar os efeitos danosos do sistema penitenciário, como ele hoje se apresenta, na população que se encontra às margens da sociedade.

Sumário Introdução Sumário 1. A história da punição 2. Funções da pena 3. Tipos de pena previstas na legislação brasileira 4. A vida intramuros: prisonização e “sociedade dos cativos” 5. Problemas prisionais de domínio público 5.1 Superlotação 5.2 Todos no mesmo barco 5.3 Efetivo insuficiente 6. A recuperação do preso 6.1 A importância da progressão de regime 6.2 O trabalho 6.3 Educação 6.4 A família 6.5 Religião 7. Exclusão e criminalidade Conclusão Referências Anexos

O sistema penitenciário brasileiro e a perspectiva de ressocialização do cidadão infrator 1. A história da punição “Olho por olho, dente por dente”, é a famosa lei de Talião, constante do primeiro código de leis de que se tem notícia. As distinções entre direito civil e penal praticamente não existiam então, a justiça regia-se pelo critério da retribuição. Quem feriu, seja ferido. Quem auferiu ganho indevido, deve perder o mesmo tanto. Essa retribuição era um meio de apagar a ofensa cometida, ainda que figurativamente – o olho furado do agente não restaura a visão da vítima. Também, é importante destacar, essa radicalidade não era absoluta na interação entre classes sociais, e se o dente quebrado fosse de um escravo, uma indenização paga a seu amo resguardava a integridade do maxilar do agressor. Essa orientação de retribuição, de vingança mesmo, baseou a administração da Justiça durante toda a antiguidade, sendo que somente com o advento do Cristianismo, a sociedade ocidental começou a encarar o criminoso como alguém com problemas, precisando ser consertado, ao invés de simplesmente eliminado. Apenas que, o foco medieval, posto sobre a salvação da alma, não hesitava em sacrificar o corpo no caminho para tal objetivo – daí, os suplícios. Com o fim da Idade Média e a gana racionalizadora das gerações de intelectuais em combate contra o absolutismo, todos os setores da sociedade precisaram ser repensados. Assim também os suplícios foram classificados de irracionais, e atacados pelos reformadores. A força dissuasiva da punição, diziam eles, não está em sua intensidade, mas na infalibilidade de sua aplicação. Os reformadores do século XVIII foram também os responsáveis pelo princípio de se guardar uma proporção entre o delito e a pena. Encontramos esta ideia, inauguralmente, em Montesquieu: A experiência demonstrou que nos países em que as penas são suaves o espírito do cidadão é marcado por elas, como o é, em outros lugares, pelas grandes. Surge algum inconveniente num Estado: um governo violento quer imediatamente corrigi-lo e, em vez de pensar em mandar executar as antigas leis, estabelece uma pena cruel que acaba com o mal no instante. Mas os mecanismos do governo se desgastam: a imaginação acostuma-se com esta grande penalidade, assim como se tinha acostumado com a menor; e como se diminuiu o temor por esta, é-se forçado a estabelecer a outra para todos os casos. (...) Não se devem conduzir os homens pelas vias extremas: devem-se proteger os meios que a natureza nos dá para conduzi-los. Examinemos as causas de todos os relaxamentos e veremos que eles vêm da impunidade dos crimes, e não da

moderação das penas.

1

Tal proporção não se restringia à intensidade das punições. Logo, os juristas e teóricos penais da Europa da Idade Moderna estavam imaginando, como forma de prevenir os crimes, a formação, na mente do povo, de imagens que atassem a pena ao delito como se esta fosse uma consequência necessária daquele. Para isso, planejavam buscar no próprio gênero do crime a semelhança do castigo: pena de morte para assassinos, de confisco de bens para quem cometia crimes contra o patrimônio, trabalhos forçados para a “vadiagem”, entre outros. A pena privativa de liberdade era tão somente aplicada a sequestradores e pessoas cujos delitos restringiam a liberdade de outrem. De fato, a ideia de uma “prisão generalizada” parecia absurda aos reformadores: Melhor, a ideia de uma reclusão penal é explicitamente criticada por muitos reformadores. Porque é incapaz de responder à especificidade dos crimes. Porque é desprovida de efeito sobre o público. Porque é inútil à sociedade, até nociva; é cara, mantém os condenados na ociosidade, multiplica-lhes os vícios. Porque é difícil controlar o cumprimento de uma pena dessas e corre-se o risco de expor os detentos à arbitrariedade de seus guardiões. Porque o trabalho de privar um 2 homem de sua liberdade e vigiá-lo na prisão é um exercício de tirania.

Paralelamente, porém, a essas teorias, ocorriam no mundo fático experiências de reclusão, em estabelecimentos denominados “reformatórios”, na Holanda, na Inglaterra, na Pensilvânia. Na maior parte regidos por religiosos, tais estabelecimentos tinham como corolário a regeneração do preso por meio do trabalho, de horários e disciplina rígidos, de palestras moralizadoras e, em alguns casos, do isolamento, para que o preso pudesse meditar sobre sua vida, seus atos passados, as perspectivas de mudança do futuro. Foucault expressa espanto que tanto as velhas práticas dos suplícios quanto as ideias inovadoras dos juristas da segunda metade do século XVIII tenham sido suplantadas por esse sistema tão diferente de suas intenções3. No entanto, considerando que ambos os sistemas derrocados, o antigo e o idealizado, tinham o espetáculo público como parte integrante da pena, pois confiavam a prevenção dos crimes às marcas que a visão dos castigos deixaria na mente dos cidadãos; considerando também que a visão dos enjeitados pela sociedade é para ela desagradável, é fácil entender que a comunidade prefira o método custodial. Nas palavras de Antônio Luiz Paixão: Esse isolamento tem múltiplas funções, dentre as quais a mais óbvia – e, talvez por isso mesmo, menos enfatizada nos relatos convencionais – é a de retirar tais 4 indivíduos de circulação.

1 MONTESQUIEU, Charles Secondat de. O espírito das leis. Primeira Parte. Livro Sexto. Capítulo XII – Do poder das penas. p. 95. 2 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: o nascimento das prisões. Rio de Janeiro: Vozes, 2007. p. 110. 3 FOUCAULT, op. cit., p. 126-127. 4 PAIXÃO, Antônio Luiz. Recuperar ou punir? Como o Estado trata o criminoso. São Paulo: Cortez: Autores Associados, 1987. Coleção polêmicas do nosso tempo, v. 21. p. 20.

Penas alternativas surgiram, mas a prisão é, ainda hoje, a mais popular.

2. Funções da pena

Há, entre os doutrinadores, três teorias que regulam essa matéria:

1. Teoria retributiva: a pena é um mal justo para retribuir o mal injusto cometido pelo criminoso. 2. Teoria de prevenção: intenta prevenir a repetição do crime: a) Geral: pela intimidação dos demais cidadãos, para que sejam dissuadidos da ideia de cometer o crime, pois as vantagens que dele advém são menores que as desvantagens provenientes da pena. b) Especial: pela regeneração do preso. 3. Teoria mista: combina retribuição e prevenção. É a adotada pelo Código Penal brasileiro, que em seu artigo 59, caput, estipula: Art. 59. O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário o suficiente para reprovação e prevenção do crime. (grifo nosso)

Como se verá mais adiante, a adoção dessa posição de agente duplo – carrasco e terapeuta – pela legislação brasileira está na origem de diversos problemas de ordem prática com relação ao cumprimento da pena5.

3. Tipos de pena previstas na legislação brasileira A CRFB/1988, no seu art. 5°, XLVII, veda penas de morte, banimento, trabalhos forçados, de caráter perpétuo, ou que sejam cruéis ou degradantes. Assim, sobra como pena mais severa da legislação brasileira a privativa de liberdade, que se subdivide em reclusão e detenção, sendo a óbvia diferença entre elas a possibilidade de iniciar o cumprimento da pena em regime fechado para os condenados à reclusão, o que não ocorre no que concerne à detenção (art. 33, caput, do CP).

5 Tal consideração está na base da tese de Augusto Thompson, em seu livro “A questão penitenciária”, ao explicar o porquê de acreditar ser impossível ao sistema penitenciário recuperar alguém.

Ademais, num caráter substitutivo/ alternativo, temos as penas restritivas de direitos. Estas, se dividem em 5 (cinco) tipos, enumeradas nos incisos do art. 43 do código penal pátrio, conforme se segue: I – prestação pecuniária; II – perda de bens e valores; III – (vetado) IV – prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; V – interdição temporária de direitos; VI – limitação de fim de semana.

Elas estão disciplinadas nos artigos seguintes, sendo que o 44 estabelece os requisitos para possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por uma destas. Esta questão não será detalhada, esse entrará no mérito de sua eficácia, ao menos por ora, uma vez que o objetivo do presente trabalho está focado na pena de prisão. Além disso, tanto as penas restritivas de direitos quanto a de multa – terceira e última prevista no referido Código (art. 49 e ss) – são suplementares: o método de punição por excelência no Brasil, enquanto sociedade cuja ideologia coloca a liberdade em posição de destaque entre os seus valores, não pode ser outro que não a perda desta.

4. A vida intramuros: prisonização e “sociedade dos cativos”

Uma condenação. Os pesados ferrolhos do portão da penitenciária se fecham atrás do infrator. Muros virtualmente intransponíveis separam-no, agora, da sociedade que o rejeitou. Pelos próximos x anos, ele estará confinado ali, até que lhe cumpra sua pena. Como o pai que coloca de castigo no quarto o filho que aprontou, o Estado espera que o criminoso, pelo confinamento, aprenda a lição. Apenas que, no caso, já há gente habitando o “quarto”. Além do chavão “a cadeia é uma universidade do crime”, frequentemente repetido, a sociedade dá pouca importância às relações que se estabelecem dentro deste local, e que representam obstáculo, não só à regeneração do interno, como também à mudança da estrutura pervertida da própria instituição prisão, na qual, como se verá, está cristalizada uma inversão de poderes que desvirtua todos os esforços que possam ser feitos para alcançar as utópicas metas oficiais da pena. A sociedade em geral é composta por diversos microssistemas sociais, com suas regras, hierarquias e costumes; a escola, o ambiente de trabalho, o grupo de amigos, a entidade de classe. A cadeia também é um desses grupos, aquele que reúne as pessoas

que a sociedade livre rejeitou. Ao adentrar nesse grupo, o condenado precisa adaptar-se às regras da nova sociedade a que pertence, por uma questão de sobrevivência. Ocorre então o que Josiane R. P. Veronese6 chama prisionalização (ou prisionização), fenômeno que ela explica como a soma da desculturação, em que o indivíduo preso desaprende a viver na sociedade livre, e a simultânea aculturação, em que ele amolda-se à vida no presídio, recebendo dois tipos de educação: para ser criminoso, e para ser 'bom preso', isto é, um que respeite as normas formais e informais do estabelecimento prisional – estas, constantes de uma hierarquia de presos, existente e sólida, a que Paixão dá o nome de “sociedade dos cativos” 7. O sargento Luiz Fernando Antuarte da Silveira (45 anos) trabalha na Penitenciária Estadual de Jacuí (RS), de segurança média, sendo que de seus vinte e três anos de experiência na Brigada da Polícia Militar, três ele recentemente passou como custodiador. Em entrevista concedida por telefone, o sargento conta: Há um líder (chamado de “plantão”) em cada galeria de 200 pessoas, com cerca de 15 cupinchas, os cabeças-de-lata. É um preso influente, escolhido como líder, geralmente com dinheiro lá fora. Damos benefícios para o líder. Mais tempo de pátio, jogar bola. Concedemos também os pedidos que são feitos por ele para os outros presos. Ele cobra pedágio das visitas dos presos. Se der problema na galeria dele, ele é transferido, o que chamamos de 'mandar viajar'. Tem o objetivo de conter rebeliões. Dentro das celas quem manda são os apenados, e fora é a 8 brigada . O líder responde pela segurança dentro da galeria. (…) Os chefes das galerias têm que aceitar o preso novo na sua galeria. Tentar colocálo numa a força, é arriscar ser responsável pela morte dele. Eles fazem um questionário para os primários. Tem uma cela do “resto”. Estupradores não são 9 aceitos, homossexuais, e é necessário colocá-los nessa cela separada.

Tal relato dá uma ideia do tipo de valores que vigoram na sociedade dos cativos. E atesta também outra coisa: que, como considera Augusto Thompson, a prisonização acontece não só com os presos, mas com os guardas, diretores, terapeutas, e todos aqueles que têm seu dia a dia na prisão. Tal é muito danoso, uma vez que, para ele, Prisonização corresponde à assimilação dos padrões vigorantes na penitenciária, estabelecidos, precipuamente, pelos internos mais endurecidos, mais persistentes e menos propensos a melhorar. Adaptar-se à cadeia, destarte, significa, em regra, adquirir as qualificações e atitudes do criminoso habitual. Na prisão, pois, o interno mais desenvolverá a tendência criminosa que trouxe de fora do que anulará ou 10 suavizará.

6

VERONESE, Josiane Rose Petry. O sistema prisional: seus conflitos e paradoxos, in Novos Estudos Jurídicos, ano III, nº 5, set/1997. Itajaí: UNIVALI, 1997. p. 31-44. A autora retira este conceito de Alessandro Baratta, no livro Criminologia crítica y crítica del derecho penal: introducción a la sociología jurídico-penal, tradução de Álvaro Bunster, México: Siglo Veintiuno, 1991. 7 PAIXÃO, Antônio Luiz. Op. cit. 8 A polícia militar, que controla esta penitenciária. 9 Íntegra da entrevista no Anexo I. 10 THOMPSON, Augusto. A questão penitenciária. 5. ed., revista e atualizada. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 96.

Num esquema simples, as ideias de Thompson sobre a prisonização dos custodiadores se resumem assim: •

Diretores: são, em alguns estados, cargos de confiança, destinados a ficar pouco tempo na administração da penitenciária. Assim, possivelmente chegarão cheios de novas ideias para transformar o estabelecimento num modelo de recuperação, por motivos humanitários ou pela promoção política que lhes conferiria; mas, ao encontrar estruturas já cristalizadas, e uma resistência silenciosa às mudanças, tanto por parte dos guardas quanto dos internos, desistem.



Terapeutas, professores e outros profissionais da recuperação: além da frustração profissional de não terem conseguido trabalho a não ser numa penitenciária, não se sentem responsáveis pelos problemas de segurança, o que causa uma hostilidade dos guardas em relação a eles. Considerando que, para efeitos de segurança, é melhor que os presos fiquem confinados nas celas, os guardas tentam causar empecilhos à circulação dos presos para as salas desses profissionais, que, vendo-se sem condições de trabalhar, dão de ombros e acomodam-se.



Guardas: estão em número pequeno demais, com condições de trabalho desfavoráveis e benefícios totalmente insuficientes, para que queiram, ou mesmo possam mudar alguma coisa. São quem tem mais contato com os presos, hostilizados por eles. Além disso, pesa sobre eles a pressão de manter tudo sem incidentes, pois havendo escândalos visíveis à sociedade extramuros, como rebeliões, são os cargos deles que estão em risco, fora as suas próprias vidas e integridade física.

As razões que ele apresenta para que os representantes do Estado ali dentro admitam e cooperem com tal estrutura escandalosa também são dignas de nota: As metas sérias da prisão são evitar fugas e manter a ordem interna. As demais, sobretudo a referente à recuperação, ficam em plano inferior, ou abandonadas ou adiadas para quando aquelas forem definitivamente resolvidas (o que, na prática, 11 significa postergadas ad aeternum).

O autor se posiciona assim por entender, como Paixão12, que a sociedade é hipócrita ao não assumir o que realmente lhe importa com relação aos condenados: que fiquem em algum lugar fora de vista e não perturbem. Pois, embora os índices de

11 THOMPSON, Augusto. Op. cit., p. 38. 12 Ver nota 4.

reincidência sejam alarmantes, tornando patente a falha da penitenciária em suas funções de intimidação e recuperação (as quais visam impedir a repetição do crime), não há rebuliço na opinião pública por causa disso. Coisa muito diversa acontece no caso de uma fuga ou rebelião. “Se a penitenciária tem que atender às exigências de segurança e disciplina, deve ser encarada como uma instituição custodial, e não como uma instituição reformativa” 13, afirma.

5. Problemas prisionais de domínio público Aparte dessas questões de ordem sociológica, há problemas tão óbvios na própria estrutura do sistema penitenciário brasileiro que chamaram a atenção da sociedade livre, e, se por um lado provocam clamor – pois se tratam de ofensas à dignidade da pessoa humana, princípio constitucional e valor essencial de um Estado democrático de direito – por outro lado, há uma certeza íntima geral de que não podem ser resolvidos, o que torna tais clamores algo cerimoniais, mascarando um conformismo com o status quo. Não se pode ignorá-los; não se pode esquecê-los; é preciso mencionar. 5.1 Superlotação A primeira coisa que vem à mente do homem médio, ao ouvir a palavra prisão, é uma cena que nos acostumamos a ver nas reportagens de TV: um corredor cheio de celas, inúmeros pares de mãos saindo por entre as grades, fazendo sinal de “muito” com as mãos. Se a câmera se aproxima mais, observaremos dezenas de homens amontoados em espaços exíguos, redes penduradas, sobrepostas – e eles nos contam que, apesar delas, alguns presos têm que dormir de pé. Na maioria dos estabelecimentos prisionais do Brasil, o número de presos é pelo menos o dobro do número de vagas. A última inspeção do Mutirão Carcerário no Presídio Regional de Itajaí, datada de junho deste ano, nos diz que há 282 presos homens espremidos num local com capacidade para 162. Na ala feminina, a situação é ainda pior: 102 presas para 36 vagas. O recém-inaugurado Presídio Complexo Penitenciário do Vale do Itajaí (Canhanduba) já atingiu quase sua capacidade máxima, de 376 presos – na última inspeção, havia 339. Considerando que ele atende toda a região do vale, e a quantidade de crimes que ocorrem por aqui, é possível perceber que o fantasma da 13 THOMPSON, Augusto. Op. cit., p. 96.

superlotação já ronda o local. Ainda pelos dados do CNJ, Rondônia é o estado com maiores problemas nesse sentido. Numa série de reportagens, os números assombram: em Vilhena, 263 presos nas vagas de 66, sendo que o mesmo local já conteve 450 homens. Em uma cela, a inspeção flagrou 22 homens dividindo um cubículo com nove camas. Em um cubículo ligeiramente maior, moravam 35 homens no dia da inspeção. Como havia só 15 camas, alguns dormiam em redes e outros, em colchões que praticamente boiavam no chão alagado. “Aqui já ficaram 40”, contam 14 os detentos. (…)

O presídio Urso Branco, no mesmo estado, que hoje conta com 684 homens vivem em instalações com capacidade para 456, já conteve 1,3 mil em 360 vagas, entre 2002 e 2007. Nesta época, rebeliões vitimaram cerca de 100 presos. Há certo limite, portanto, a partir do qual eles param de suportar. Seja embora um problema, a superlotação é encarada como normal pelos agentes. Perguntamos ao Sgto. Antuarte quantos presos há na PEJ (RS), e ele nos informa a existência de cerca de 2.300 (2.313, pelo relatório do Mutirão Carcerário no Rio Grande do Sul). Perguntamos então, em quantas vagas – ele hesita, parece não saber a que nos referimos. Explicamos que a pergunta se refere ao número oficial de presos que caberiam no local, e ele diz, com naturalidade, “Mil e pouco” (1.372, segundo o relatório). Isto é, pouco mais que a metade. Não há o que se estranhar nessa atitude dos custodiadores: eles precisam dar conta de todos os presos que a Justiça larga em suas mãos, do modo que for possível. A preparação de novos estabelecimentos está nas mãos do poder executivo, mas o poder executivo está sempre sem dinheiro... Se eles não conseguem verba para pagar professores (como no caso de Santa Catarina), de onde tiraria para construir mais presídios. Fizesse isso, e a revolta (até certo ponto justificável) da população seria enorme, contra um governador que se importa mais com o bem-estar “dos vagabundos” do que das crianças. E se estabelece o círculo vicioso. 5.2 Todos no mesmo barco Caminhando de mãos dadas com a superlotação, pois frutos da mesma falta de verba para a construção de estabelecimentos adequados, está a promiscuidade, física e moral, dos detentos.

14 MONTENEGRO, Manuel Carlos. Crônica de um sistema prisional superlotado. Fonte: Agência CNJ de Notícias. Disponível em: www. cnj.jus.br – postado em 05/08/2011 – 00h00. Acesso em 08/2011.

A Lei de Execução Penal, do art. 82 ao 104, regulamenta os diversos tipos de estabelecimentos penais, e prevê departamentos diferentes para mulheres, maiores de 60 (sessenta) anos, primários, reincidentes e presos provisórios. De todas essas separações, aquela que efetivamente recebe alguma atenção é a separação entre homens e mulheres, que, na casa de detenção de Pimenta Bueno (RO), também é transgredida, uma vez que homens e mulheres ficam juntos no pátio durante o banho de sol15. A mesma lei separa penitenciária, como local para presos condenados cumprirem pena; colônia agrícola, industrial ou similar, para cumprimento do regime semiaberto; casa do albergado, para cumprimento do regime aberto; o hospital psiquiátrico, para aplicação de medida de segurança; e a cadeia pública, destinada somente aos presos provisórios. Mais uma vez, estão todos misturados – presos provisórios em penitenciárias, gente cumprindo pena na cadeia pública, as casas do albergado são quase inexistentes, e há, na PEJ (RS), até um psicopata, que trabalha como bibliotecário lá. Em Rondônia, na mesma cidade de Pimenta Bueno, Os 30 presos que cumprem medida de segurança são mantidos soltos durante o dia. Circulam livremente dentro da área do presídio com outros presos que realizam trabalhos internos. No dia da inspeção, 12 de maio, foram trancados em uma cela. A direção diz que só são colocados na cela caso se tornem agressivos. E, um, condenado por roubo, diz que foi transferido do pavilhão do regime fechado para a cela dos internos que cumprem medidas de segurança. “Mas eu não sou 16 perturbado”, garante.

São pessoas com formações diferentes, com crimes de circunstâncias distintas, e personalidades diferentes, todas reunidas no mesmo lugar. É isso que possibilita a formação de uma “lei da selva” que regula o local, e que a sociedade dos cativos nivele todos pelos piores. Presos primários logo reincidem, não só porque “aprenderam a ser criminosos” lá dentro, mas porque, ao serem colocados sob as unhas dos bandidos calejados e perigosos, torna-se mais difícil fugir do crime, mesmo que queiram. Os presos ficam em dívida para os grandões que os protegeram durante a cadeia. Quando saem, devem um “favor” aos líderes lá de dentro. Têm que servir de * “mula” , assaltar... Se não pagar, ameaçam matar o preso ou alguém da família 17 dele. Tem que deixar pra trás tudo que tem de valor para pagar os grandões.

Também da promiscuidade decorrem os abusos sexuais, a falta de higiene, e as consequentes doenças, que tornam as prisões lugares tão indesejáveis como o próprio inferno. O preso R. O. A. alega que contraiu sífilis durante os 12 dias que passou no “tampão” do Presídio de Vilhena, completamente nu. O interno, preso há três anos 15 MONTENEGRO, Manuel Carlos. Juntos no banho de sol, in Trabalho compra comida e papel higiênico. Fonte: Agência CNJ de Notícias. Disponível em: www. cnj.jus.br – postado em 04/08/2011 – 19h14. Acesso em 08/2011. 16 Idem. * Servir de mula é carregar droga ou algum objeto ilícito para outra pessoa. 17 Entrevista com o Sgto. Antuarte.

por roubo, conta que a doença venérea foi diagnosticada quando foi a Porto Velho, escoltado por causa da emergência médica. “Estou nervoso, não estou conseguindo dormir por causa do problema”. Segundo o detento, quando pede ajuda aos agentes, ouve a sugestão de “bater bigorna”. O recurso de bater com objetos nas grades da cela provoca barulho. Não raro, também gera tumulto na ala 18 inteira, o que é punido com dias, semanas no “tampão”.

Há gente que diga que é melhor para um preso estar na cadeia, uma vez que, muitas vezes, do lado de fora, estava desempregado, com dificuldade de arranjar o que comer, e agora têm casa e comida de graça, sustentado pelo Estado – enquanto que o homem livre, dizem, este sofre, tem que pagar tributo para sustentar tais parasitas. Sugira -se humildemente a uma pessoa dessas que cometa um crimezinho pequeno e vá morar na cadeia, já que é tão bom – então se ouvirá sua verdadeira opinião, possivelmente, de uma forma não muito educada. 5.3 Efetivo insuficiente

Penitenciária

Presos Agentes

Presídio Regional de Itajaí – SC

282

35

Presídio Complexo Penitenciário do Vale do Itajaí – SC 339

80

Penitenciária de São Pedro de Alcântara – SC

1243

148

Penitenciária Estadual de Jacuí – RS

2313

De serviço, em geral, 30 a 19 35

Tais dados, a respeito de estabelecimentos prisionais de dois dos estados mais ricos do Brasil, dispensam quaisquer outros comentários. É simplesmente impossível que tal número de agentes tente impor a tamanha quantidade de presos o modo de vida da sociedade extramuros. Assim, a sociedade dos cativos somente se fortalece, e a regeneração do cidadão infrator afigura-se como um mito.

6. A recuperação do preso À luz do que foi visto até agora, a recuperação do cidadão infrator aparece como uma falácia com finalidade de lenitivo para a consciência coletiva. E isso ela é, no que concerne à absoluta maioria dos apenados. No entanto, como toda regra tem exceção, há

18 MONTENEGRO, Manuel Carlos. Tampão, o inferno amazônico. Fonte: Agência CNJ de Notícias. Disponível em: www. cnj.jus.br – postado em 04/08/2011 – 18h55. Acesso em 08/2011. 19 Esta informação foi retirada da entrevista com o Sgto. Antuarte. As demais são todas provenientes do Portal do CNJ, especialmente do recurso interativo “Geopresídios”.

os que se regeneram. Os fatores que auxiliam nessa mudança serão estudados a seguir. 6.1 A importância da progressão de regime Ao trancar-se uma pessoa na prisão, como dito acima, ela rompe o contato com a sociedade exterior, uma vez que lá dentro estão agora seus companheiros de dia a dia. É muito mais provável que ela, com o correr do tempo, adapte-se à “sociedade dos cativos”, do que vê-la restaurar os valores da sociedade extramuros – especialmente considerando-se que os direitos políticos do apenado são suspensos, e o que quer que aconteça de importante do lado de fora não lhes pede a opinião. “O dilema da sedução (e da pressão) de duas sociedades sobre o interno é experimentado mais fortemente pelo preso primário, que deve cumprir estágio para ter acesso aos benefícios do regime” 20, afirma Paixão. O autor se refere à progressão de regimes, que é de vital importância para evitar o choque de ambientes que em geral acontece ao se “soltar” um indivíduo que esteve confinado por longo tempo, no meio de uma sociedade que era, talvez, bastante diferente quando este indivíduo a deixou, especialmente considerando as mudanças rápidas a que o progresso tecnológico (e seus derivados) expõe as práticas sociais. A importância que os penalistas conferem a este instituto se evidencia nas críticas que a Lei dos Crimes Hediondos recebia quando o proibia. No entanto, a opinião pública, incitada pela mídia, por vezes se revolta com essas regalias dos presos; afirmam que os homens ali não fazem por merecê-lo; especialmente quando, ao sair para visitas (geralmente em ocasiões especiais, como Natal, Dia das Mães), os internos não retornam à penitenciária e, na qualidade de foragidos, cometem crimes do lado de fora (assaltos, estupros). Mas Ainda que o regime progressivo estimule a fuga e não impeça a reincidência, ele se apresenta ao interno como recurso de manutenção de laços significativos com a sociedade civil, que lhe permite opção entre a sociedade ‘lá fora’ e a ‘dos 21 cativos’.

Há três tipos22 de regime de cumprimento de pena previstos na legislação brasileira

20 PAIXÃO, Antônio Luiz. Op. cit., p.48. 21 PAIXÃO, Antônio Luiz. Op. cit., p. 52. 22 O art. 37 do CP faz referência a “regime especial”, mas este consiste apenas no fato de as mulheres, em tese, cumprirem pena em estabelecimento especial. Bem assim, o RDD (Regime Disciplinar Diferenciado) é nada mais que uma modalidade mais severa do regime fechado, reservada para determinados casos, em que o preso é de alta periculosidade, e necessita ser mantido em isolamento. É preciso levar em conta, quanto aos regimes, que é raro que sejam cumpridos da mesma forma que a lei determina, considerando-se que não há estabelecimentos próprios para tal e nem efetivo para fiscalização. Assim, na Comarca de Itajaí, ao invés de dormirem numa prisão albergue (que não existe aqui), os apenados em regime aberto

que são, em grau decrescente de severidade: •

Fechado: o interno fica confinado aos limites do presídio dia e noite. É regulado pelo art. 34 do CP.



Semiaberto: tem como marca a possibilidade de saídas temporárias. O trabalho e o estudo externo são permitidos, (art. 35 do CP) assim como visitas à família.



Aberto: o apenado permanece em prisão albergue apenas à noite e nos dias de folga (art. 36 do CP).

As condições legais para que o apenado passe de um desses regimes a outro menos severo são:

1/6 da pena cumprida, se condenado por crime comum Bom comportamento carcerário, comprovado pelo

(art. 112, da LEP) 2/5 da pena cumprida, sendo réu primário condenado por crime hediondo ou equiparado (art. 2º, §2º da Lei nº 8.072/90)

diretor do presídio 3/5 da pena cumprida, sendo reincidente, condenado

+

crime hediondo ou equiparado (art. 2º, §2º da Lei nº 8.072/90) 23

Se o apenado tiver sido condenado por crimes contra a administração pública, a progressão de regime fica condicionada, ainda, à devolução do produto do crime ou reparação do dano que causou (art. 33, §4º, do CP). O §1º do art. 112 da LEP estabelece que seja ouvido o Ministério Público e o defensor do preso, após o que, o juiz concederá ou negará, motivadamente, o pedido. É interessante anotar que o tempo de prisão preventiva, se tiver havido, será detraído do total da pena, e também contará para compor a fração necessária para pedir a progressão de regime. Passar direto do regime fechado para o aberto, se já tiver cumprido tempo suficiente da pena, sem ter pedido a progressão para o semiaberto

comparecem ao Fórum uma vez por mês para assinar um documento de controle do cumprimento da pena. 23 O artigo em questão não deixa claro se a reincidência a que se refere é simplesmente uma segunda condenação, ou uma condenação em crime do mesmo tipo (isto é, hediondo ou equiparado). A anotação acima está em conformidade com o constante na Cartilha do Reeducando, p. 10, item 3.16, que também só faz menção à reincidência. Esta publicação pode ser encontrada no portal do CNJ (www.cnj.jus.br), órgão que a edita. A Cartilha também menciona que, ocorrida a condenação antes de 29/03/2007, o tempo para pedir progressão de regime é o mesmo para condenados por crime hediondo ou comum.

(progressão por saltos), em regra, não é possível. As mesmas frações do quadro acima devem ser cumpridas, para que o apenado possa pedir uma segunda progressão, mas, nesse caso, a fração se calcula sobre o saldo de pena a cumprir. Explicando: uma pessoa é condenada a seis anos, regime inicial fechado. Cumprindo 01 (um) ano, progride para o regime fechado. Para progredir para o regime aberto, terá agora de cumprir 10 meses (1/6 de cinco anos, que é o total que lhe falta). Assim como é possível progredir de regime por bom comportamento, é possível regredir, se o apenado cometer alguma falta grave (tentativa de fuga, incitação de motim – observe-se a meta da segurança aqui – porte de celular, de arma, superveniência de outra condenação, etc.). Não há limite para progressões e regressões, mas, naturalmente, fica mais difícil para um condenado que regrediu pedir a progressão novamente, pois seu histórico despertará suspeitas no juiz. O mais importante nesse assunto é que O regime progressivo impôs obstáculos à plena cristalização da ‘sociedade dos cativos’ como à esfera monopolizadora da sociabilidade, da participação e da lealdade dos presos. Saídas regulares, por exemplo, possibilitam a muitos dos internos manterem laços familiares. O trabalho extramuros torna possível o estabelecimento de redes de interação com membros da sociedade ‘lá fora’ e a remuneração, mesmo que pareça insignificante ou irrisória em relação aos padrões externos, torna o preso menos dependente da ‘sociedade dos cativos’ 24 para sua sobrevivência.

6.2 O trabalho Desde as primeiras experiências penitenciárias no século XVIII, o trabalho tem sido enfatizado como elemento principal de ressocialização, o que é compreensível, uma vez que na sociedade ocidental capitalista, ele é altamente valorizado como gerador de lucro. Trabalhar é a ocupação por excelência do homem livre, e então, embora contestável a afirmação de que “o trabalho dignifica o homem”, sem dúvida o preso que trabalha pode ver-se como mais semelhante ao cidadão livre do que o que não o faz. No Brasil, também se procura estimular o trabalho. Somente ele, primeiramente, permitia a remição, na proporção de 03 (três) dias trabalhados para 01 (um) dia de pena. O trabalho interno é obrigatório para o condenado, na medida de suas aptidões e capacidade (art. 31, caput, da LEP); estas limitações são colocadas porque, caso contrário,

a

pena

se

desvirtuaria

para

trabalhos

constitucionalmente (art. 5º, XLVII, c, da CRFB/1988).

24 PAIXÃO, Antônio Luiz. Op. cit., p. 42.

forçados,

que

é

vedada

O Conselho Nacional de Justiça cria campanhas para estimular as empresas a dar empregos a presidiários e egressos. Com esta finalidade, eles editaram uma cartilha que explica todos os detalhes referentes à admissão de funcionários presos. O projeto Começar de Novo25, de iniciativa do governo do Espírito Santo, visa incrementar a participação da iniciativa privada no fornecimento de vagas de trabalho para presos e egressos no referido estado, pois o poder público não dá conta de criá-las: o aproveitamento de presos para trabalho em obras públicas, por exemplo, é limitado a 10% do total de empregados da obra (art. 36, §1º, da LEP). Aqui em Santa Catarina, na Penitenciária Estadual de São Pedro de Alcântara, as estimativas são de que 60% dos presos estejam atualmente trabalhando. Mas, a mesma notícia que nos informa este fato, esclarece tratar-se de uma exceção26. Na prática, o trabalho do preso consiste mormente na realização de tarefas para a manutenção e funcionamento do estabelecimento prisional. A participação nas oficinas é mais limitada. O Sgto. Antuarte nos conta, sobre o trabalho dos presos na PEJ (RS): Fazem artesanato, marcenaria, alfaiate, bibliotecário, sapateiro... Oficinas. Fazem coisas que já sabiam fazer antes de serem presos. Saem da cela de manhã e voltam às 4 da tarde. Poucos trabalham. Existe uma galeria só de trabalhadores, que trabalham na manutenção do presídio.

Embora a lei tenha tentado limitar isso (art. 32, §1º, da LEP), o tipo de trabalho que está mais disponível ao preso é o artesanato: confecção de redes, souvenires. Tenha embora um fim econômico em cidades turísticas, o próprio nome “artesanato” denota que ele não deve ser considerado como um TRABALHO, na plena expressão da palavra – está associado, no imaginário popular, a senhoras idosas, e, mesmo que se possa atribuir a ele, até certo ponto, caráter educativo e produtivo (art. 28, caput, da LEP), dificilmente renderá ao preso bastante para proporcionar-lhe subsistência, quando este estiver fora da prisão. O trabalho era 'inventado', apenas para que os detentos tivessem o que fazer; sabiam eles muito bem disso. Tal classe de trabalho, empreendiam eles sempre com má vontade e nenhuma disposição, coisa muito diferente sucedendo sempre que alguma tarefa tinha uma utilidade notória, um fim implícito que os distraía deveras durante longas horas. (…) É que, então, entrava em jogo o amor-próprio. Certa vez estive a pensar: para se aniquilar um ser humano livre, castigá-lo sem nexo, ou, em vez dum homem livre, se se quisesse fazer um facínora virar um covarde com a só ideia de trabalhar, bastaria que àquele e a este se dessem 27 trabalho do caráter mais absurdo e inútil possível.

25 Disponível no portal do CNJ: www.cnj.jus.br 26 MONTENEGRO, Manuel Carlos. Trabalho ocupa seis de cada 10 detentos de presídio catarinense. Fonte: Agência CNJ de Notícias. Disponível em: www. cnj.jus.br – postado em 14/06/2011, às 15:56. Acesso em 08/2011. 27 DOSTOIEVSKI, Fiódor. Recordações da casa dos mortos. Traduzido por José Geraldo Vieira. São Paulo: Martin Claret, 2006. ps. 97 e 34, respectivamente.

As informações do Sgto. Antuarte são confirmadas pelo relatório geral do Mutirão Carcerário do Estado do Rio Grande do Sul: “Constatou-se a existência na unidade de somente 600 vagas de trabalho e 597 presos trabalhando. Desta forma, concluiu-se que somente 26% dos presos desenvolvem atividade laboral.” 28 Este déficit nas possibilidades de trabalho está, em parte, vinculado à dificuldade de convencer as companhias a dar empregos a ladrões, estelionatários, dependentes químicos, “vagabundos” – pois assim são vistos os infratores. De fato, se muitas empresas fizessem isso, provocariam revoltas na opinião pública, que diria que elas estavam prejudicando cidadãos bons, honestos e trabalhadores (palavras que andam sempre juntas) ao dar seus empregos a delinquentes. Na verdade, a reclamação da sociedade livre teria algum fundamento, pois dificilmente os empresários que utilizam mão-de-obra presa fazem isso por puro e simples humanitarismo: o trabalho do preso será sempre remunerado (art. 39 do CP), mas existe a possibilidade de pagar a eles apenas ¾ do salário mínimo (art. 29 da LEP); além disso, ele não está sujeito ao regime da CLT (art. 28, §1º, da LEP). E mais: os bens ou produtos resultantes do trabalho prisional serão adquiridos pela administração pública direta ou indireta, sempre que não for possível ou recomendável vendê-los a particulares, e o produto da venda, revertidos em favor da fundação/empresa que estiver gerindo este trabalho (art. 35 da LEP) – ou seja, retorno garantido, e gorda margem de lucro. Mas daí a pensar que o preso fará fortuna na cadeia – o que parece ser a ideia de algumas pessoas – há uma grande distância. Ainda que o apenado perceba uma remuneração justa, esta deverá atender: a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios; b) à assistência à família; c) a pequenas despesas pessoais; d) ao ressarcimento do Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas 29 letras anteriores.

O que sobrar disso tudo, aí sim, poderá ser colocado numa caderneta de poupança, para formar um pecúlio, entregue ao condenado quando ele sair. Claro que a lei não conta com outros gastos, que decorrem da organização 28 Relatório Geral do Mutirão Carcerário do Estado do Rio Grande do Sul, março/abril de 2011, p. 27, item 3.1.7.2. Disponível no site do CNJ (www.cnj.jus.br). O Mutirão Carcerário é um projeto bastante positivo (e recente) do Conselho Nacional de Justiça que visa fiscalizar o funcionamento da execução penal em todo o país, tanto na parte processual quanto por visitas aos estabelecimentos prisionais, para reunir dados que permitam solucionar os problemas. Os objetivos detalhados do Mutirão Carcerário podem ser vistos no Anexo II. 29 Art. 29, §1º, alíneas a, b, c e d, da Lei de Execução Penal.

informal do presídio, daquilo que, oficialmente, não existe: drogas, bebida, pagamento de taxas aos presos influentes. No fim das contas, é possível que o preso saia dali não com algum dinheiro, mas com várias dívidas. É esta quantidade enorme de obstáculos e "poréns" que impede que o trabalho prisional desenvolva plenamente a capacidade regeneradora que pode ter. Não obstante, ele é ainda válido, especialmente se externo, por proporcionar ao detento possibilidade de sair do ambiente vicioso da prisão, o que é muito saudável para ele, tanto física quanto mental e moralmente.

6.3 Educação

Aqueles que, do poder judiciário ou não, desejam a recuperação do infrator por vezes se referem a ele como “reeducando”. De fato, a educação seria ponto fundamental num sistema que realmente visasse à reconstrução da personalidade do “marginal” (enquanto pessoa que, presa ou não, se encontra à margem da sociedade). Isso porque, para mudar o modo que uma pessoa vive, é necessário abrir pra ela novos modos de ver a realidade, possibilidades que, sem estudo, é muito difícil visualizar. No entanto, a educação não está colocada no mesmo patamar do trabalho, pela Lei de Execução Penal. Enquanto o trabalho ganha um capítulo só para si, a educação é espremida entre as assistências, regulada superficialmente. Por recente mudança na LEP, introduzida pela Lei 12.433/11 de 29 de junho deste ano, é possível que o tempo de estudo também conte para pedir a remição, na proporção de 12 horas de estudo para 01 (um) dia de pena, mesmo para detentos em regime aberto ou livramento condicional (diferentemente do trabalho). Talvez, este estímulo faça aumentar o número de presos que estudam, que – a despeito de casos esparsos de gente que se forma em curso superior, enquanto está na prisão – não é muito grande no nosso país.30

6.4 A família

30 O Sgto. Antuarte nos informa que este número, na PEJ (RS), é de aproximadamente 2 ou 3 presos por galeria de 200. Tal informação é complementada pelo Relatório Geral do Mutirão Carcerário neste estado, que considera a prestação de assistência educacional “quase inexistente” na referida penitenciária, considerando que a unidade dispõe de apenas 80 vagas para estudo, sendo que só 60 estão ocupadas.

De repente, Sônia surgiu ao lado dele. Ela aproximara-se sem ruído e sentou-se ao seu lado. (…) Quando chegou junto do prisioneiro, sorriu amável e alegremente, mas, segundo seu costume, estendeu-lhe timidamente a mão. (…) Ele parecia sempre estar contrariado em apertar-lhe a mão, mostrando-se aborrecido quando a moça chegava, e algumas vezes não lhe dizia uma única palavra durante todo o tempo da visita. Nesses dias ela tremia diante dele e retirava-se profundamente aflita. Mas dessa vez as suas mãos não se separaram (…). Uma felicidade imensa se lia nos seus olhos radiantes; já não podia duvidar que ele a amava (…) Pensava nela. Lembrava-se dos desgostos que lhe tinha dado continuamente, de como lhe destroçara o coração; revia em espírito o seu pequeno rosto magro e pálido. Mas agora essas lembranças quase não o torturavam mais; sabia que por um amor enorme, eterno, sem limites, ia recompensar todos os sofrimentos dela. De resto, o que importavam todas as misérias do passado? (…) Sete anos, somente sete anos! Nas primeiras horas da sua felicidade, pouco faltou para que ambos considerassem esses sete anos como sete dias. Ele nem mesmo sabia que a nova vida não lhe seria de graça, que tinha de adquiri-la a custo de longos e dolorosos esforços, que teria de pagar por ela com uma grande realização no futuro. Mas aqui começa uma outra história, a da gradual renovação de um homem, da sua regeneração paulatina, da sua passagem progressiva de um mundo para o outro, do seu conhecimento de uma realidade nova, inteiramente ignorada até aquele momento. Poderia ser a matéria 31 de uma nova narrativa – mas esta que vínhamos narrando termina aqui.

Esta é a cena final de um livro de ficção, e como tal, mais poética que a realidade. No entanto, ela traduz um princípio muito importante para a regeneração do infrator: ligações afetivas do lado de fora. Mãe, mulher, filhos – um homem que não se importava com o que seria deles, quando estava solto, ao ver-se preso, a família adquire vultosa importância para ele. São eles que trazem os recursos que, mesmo que indispensáveis, às vezes não são fornecidos aos presos; preocupam-se, estimulam o bom comportamento do apenado – para que ele possa conseguir os benefícios previstos – e fazem com que o preso se sinta gente, ao perceber que alguém ainda se importa com ele. A lei garante ao preso visitas do cônjuge, companheira, parentes e amigos em dias determinados (art. 41, X, da LEP); no entanto tal direito pode ser suspenso ou restringido (parágrafo único do mesmo artigo), por não serem infrequentes os casos em que a família traz para o preso (ou para um dos líderes lá de dentro, em casos de ameaça) algumas das coisas que são proibidas na prisão. Também há previsão legal no sentido de, quando possível, o preso ficar num estabelecimento próximo à família, até para que essas visitas se tornem possíveis. No entanto, se necessário por questões de segurança, isso não será considerado. Por aí podemos ver novamente, no confronto ressocialização x segurança, qual delas recebe maior atenção.

31

DOSTOIEVSKI, Fiódor. Crime e castigo. Traduzido por Ivan Petrovitch e Irina Wisnik Ribeiro. São Paulo, Martin Claret, 2006. p. 551-553.

6.5 Religião

Nas primeiras prisões, ela fazia parte do plano principal da recuperação do preso, ao lado de trabalho e disciplina. Hoje, o Estado não lhe dá tanta importância, mas os religiosos (em especial, os evangélicos) dirigem, por conta própria, silenciosos esforços de ressocialização, e atingem sucesso. Na Penitenciária Estadual de Jacuí Tem uma galeria só de crentes. O pastor, que é o líder da galeria deles, aceita presos que ele acha que vão se recuperar, ele dá uma chance. Se o pastor acha que o preso não vai se recuperar, manda ele para o “brete”, coloca todas as coisas * dele no “brete” , e o preso sabe que está expulso da galeria. Trabalham na cozinha geral. Geralmente os presos se recuperam nessa galeria. Toda instrução é voltada para o bem, há muitas regras, a pessoa não pode assistir televisão, tem 32 que “rezar” bastante, etc.

Encontramos esta informação confirmada em uma notícia de um site evangélico: O dia 18 de dezembro de 2009 ficou marcado na vida de mais 69 detentos que cumprem pena na Penitenciaria Estadual do Jacuí, a PEJ. Foram cenas que comoveram a equipe do Departamento de Missões, familiares e amigos de detentos que ali estavam às margens do rio Jacuí para batizarem os 69 detentos que aceitaram Cristo como seu Salvador e tiveram suas vidas transformadas pelo poder da palavra de Deus. Primeiro participamos de um grande culto na galeria denominada “Estrela do Cárcere” onde estão reunidos todos que se convertem a Cristo. Ali encontramos homens que outrora causaram sérios problemas a sociedade e hoje estão cumprindo pena que chegam a somar 15, 40, 70 e até mais de 100 anos de condenação. (…) Cerca de 10 dias antes do batismo o dirigente da congregação, que também cumpre pena, sentiu o 33 desejo de iniciarem uma campanha de oração (...) (grifo nosso).

Para os cristãos, este trabalho tem apelo muito forte, considerando a passagem no Evangelho de Mateus34, em que Jesus diz aos discípulos que aquele que, entre outras coisas, visitar os cativos na prisão, é como se estivesse visitando o próprio Jesus. No Evangelho de Lucas, também encontramos o caso do condenado que, reconhecendo sua culpa, recebe perdão na hora da morte – assim, cristãos que leem a Bíblia e nela creem terão receio de taxar de “irrecuperáveis” os que a sociedade condenou, sem fazer esforços no sentido contrário, isto é, para regenerá-los. Ademais, na base de sua doutrina está a transformação do homem pela fé. Esta transformação não é somente uma moralização, uma adequação às normas sociais – a

*

Espaço estreito do corredor, do lado de fora das celas. Literalmente, no Rio Grande do Sul, é um cubículo estreito no curral onde se colocam os animais para dar vacina, ou fazer outras coisas que requerem que o animal esteja imobilizado em um espaço exíguo. 32 Extraído da entrevista com o Sgto. Antuarte. Íntegra no Anexo I. 33 MENDES, Euclides. Batismo na PEJ. Somente pela fé, Rio Grande do Sul, postado em: terça-feira, 19 de Janeiro de 2010, 20:52. Disponível em: . Acesso em: 05 de setembro de 2011. 34 Evangelho de Mateus, cap. 25, vers. 31-46. A passagem referida adiante é Evangelho de Lucas, cap. 23, vers. 39-43.

religião cristã busca transformar o homem, e não simplesmente o preso. Diferentemente do tratamento psicológico, que encara o criminoso como alguém de certa forma doente, com uma deficiência moral inata, as investidas cristãs apresentam o preso a seus próprios olhos como um homem (ou mulher) responsável por seus atos e que, por isso mesmo, tem a capacidade de mudá-los, desde que com o devido auxílio divino – e Deus, diferentemente do Estado, não falha em ajudar. Outro pilar da doutrina cristã é o amor ao próximo. Não é todo religioso que leva isto a sério, mas certamente, aqueles que se dispõem a visitar presídios têm que levar, pois, para que se disponham a entrar nas penitenciárias, devem fechar os ouvidos às vozes que clamam que aqueles lugares encerram tão-somente a escória da sociedade. Assim, se adentram esses locais com tal doutrina em mente, tratarão os presidiários com o respeito que se deve a um ser humano, e isto é o primeiro estímulo para que eles (ou, pelo menos alguns deles) renunciam ao estado de natureza que se perpetua nesses locais. Este trabalho, tão útil, poderia ser muito mais amplo, não houvesse também preconceitos dentro das próprias igrejas35 – como cada denominação, e mesmo cada igreja de bairro, tem divergências doutrinárias, algumas abraçam o pensamento da sociedade civil sobre os infratores das leis, e negligenciam tal missão. Como a atuação nesse sentido é voluntária, sua ampliação não é algo que possa ser resolvido, a não ser pelas próprias igrejas. Por fim, vale destacar que as igrejas também têm trabalhos que ajudam a prevenir o crime, em que os fiéis visitam favelas e outros focos de surgimento da criminalidade.

7. Exclusão e criminalidade Não se pode estudar a pena e ignorar o crime, do qual ela deriva. A quantidade de infratores dará origem, com uma pequena margem de erro (das pessoas que não chegam a serem detidas), à quantidade de presos, provisórios ou condenados. Assim, enquanto a quantidade de crimes cometidos for volumosa, como é atualmente, o problema da superlotação não terá solução, não importa quantos presídios e penitenciárias sejam construídos. Tampouco a questão do pequeno efetivo de agentes carcerários será solucionada com alguns concursos públicos e aumentos de salário. O

35 Possível ler sobre isso na reportagem “O céu dentro do inferno”, disponível em . Acesso em 05/09/2011.

número deles é insuficiente, e sempre será, enquanto a sociedade mantiver essa política de remediar, ao invés de precaver-se contra eles – política já criticada por Beccaria: É melhor prevenir os delitos do que puni-los. É este o escopo principal de toda boa legislação (…) Proibir uma grande quantidade de ações diferentes não é prevenir os delitos que delas possam nascer, mas criar outros novos (…) Para cada motivo que impele os homens a cometer um verdadeiro delito, há mil outros que os impelem a cometer aquelas ações indiferentes que as más leis chamam delitos (…) Quereis prevenir os delitos? Fazei com que as leis sejam claras, simples (…) Fazei com que as leis favoreçam menos as classes dos homens do que os 36 próprios homens. (sem grifo no original).

Seria recomendável ao Estado, que se dispusesse a educar adequadamente todos os seus cidadãos; desta maneira, não haveria necessidade de reeduca-los. E não para por aí. Basta olhar ao redor para que se veja o retrato de uma sociedade pronta pra formar um criminoso: se sobrevém uma catástrofe, as casas da população carente são as primeiras a serem afetadas, muitas vezes indo por água abaixo. Mas há pouca atenção do Estado quanto a isso; as pessoas são atulhadas em abrigos (indefinidamente) com seus filhos, e acusadas de terem invadido áreas que elas sabiam que eram de risco – como se tivessem tido uma larga gama de opções para escolher onde morar. E quando as crianças dessas famílias vão para a escola, encontram tudo parado – uma greve dos professores (quando há profissionais), pois o governo não lhes paga salário digno (e muitas vezes eles devolvem com uma educação indigna). Um indivíduo que cresce observando o Estado tomar uma posição tão negligente quanto à sua pessoa, dificilmente respeitará o Estado quando adulto. Todas as políticas de segurança pública poderiam muito bem ser esquecidas, enquanto o Estado não lembrar também das outras coisas públicas pra que deve atentar: saúde, educação, moradia. Raul Cervini pondera uma coisa que deveria ter sido olhada de pronto: Como e para que ressocializar alguém que por razões conjunturais de desemprego, grave crise econômica e etc., comete um delito conta a propriedade, enquanto tais razões de desocupação e crise econômica continuam existindo? Como ressocializar para o respeito à vida um delinquente violento, sem criticar ao mesmo tempo uma sociedade que continuamente reproduz a violência através dos meios de comunicação e desencadeia uma agressão brutal (guerras, violação de direitos humanos) contra grupos mais fracos ou marginais, entre os quais 37 provavelmente se encontra o delinquente?

Será que tudo que está atualmente tipificado como crime é realmente um crime? Será que não atende a interesses de classes específicas, tendo pouca importância com

36 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução de Lucia Guidicini e Alessandro Berti Contessa. São Paulo: Martins Fontes, 1998. p. 130/131. Capítulo XLI – Como prevenir os delitos. 37 CERVINI, Raul. Os processos de descriminalização, p. 36, apud VERONESE, Josiane Rose Petry, op. cit., p. 34.

relação ao bem comum? Deveriam as penas ser tão duras? É necessário considerar que, no nosso país, tem-se o princípio do Direito Penal mínimo, pugnando pela intervenção do Direito Penal somente naqueles casos que não se podem resolver por outro modo, e para tutelar bens jurídicos fundamentais – ainda, não de forma absoluta, mas somente de agressões graves. Este princípio não corresponde à prática legislativa das últimas décadas. Assim, é preciso dar início a três processos, referidos por Cervini, que desinchariam nosso Direito Penal e as cadeias: •

Descriminalização: a retirada de algumas ações ilícitas da alçada do Direito Penal.



Despenalização: diminuir as penas sem retirar a ilicitude penal.



Diversificação: os procedimentos criminais são suspensos e a resolução de conflitos passa a ser da competência de órgãos extrapenais ou das próprias vítimas.

Por todo o exposto nos capítulos anteriores, ficou patente que a prisão não é lugar adequado para aqueles que já apresentaram uma tendência ao crime – tendência essa que poderia, porventura, ser corrigida – mas nunca num ambiente em que o crime domina, submete tudo, mais poderoso na proporção de sua própria vileza; nunca num ambiente em que o crime é a única realidade possível, e cometê-lo é questão de sobrevivência. Porque o homem sempre se adapta; o homem tem que sobreviver. Não resta dúvida de que o tão gabado regime de penitenciária oferece resultados falsos, meramente aparentes. Esgota a capacidade humana, desfibra a alma, avilta, caleja e só oficiosamente faz do detento 'remido' um modelo de sistemas regeneradores. Na verdade esse 'reajustado' não é senão um ex-vivente, um despojo, um casulo murcho e inibido. Está-se a ver que o delinquente exacerba cada vez mais sua rebeldia, que se organiza em potencial rancor. Para ele a sociedade errou e ele quis castigá-la. Ou, quando não, o castigo que ele, sim, teve, uma vez cumprido é automaticamente uma absolvição, antes mesmo do termo, já se considerando ele de contas feitas com a sociedade. Isso de prisão requer força física tanto quanto moral; do contrário, como suportar 38 vida tão excomungada? E eu tinha de sobreviver a ela...

38 DOSTOIEVSKI, Fiódor. Recordações da casa dos mortos. p. 28 e 238.

Conclusão Este trabalho é resultado de um estudo minucioso que exigiu, no decorrer do mesmo, muita análise, síntese e reflexão, pois este tema é complexo e necessita de toda atenção. Uma das vantagens oferecidas, e que consideramos a mais importante, é o conhecimento que foi obtido a respeito da teoria e da prática da execução penal. De cada tema abordado, procurou-se citar exemplos de casos concretos. Abriu-se, por assim dizer, um leque de situações e conexões insuspeitadas à visão das pesquisadoras que, esperase, também trarão aos leitores motivos de meditação. Foi uma pesquisa realmente muito interessante e instrutiva, e também instigante. Ficou patente, aos olhos das autoras, que a execução penal no Brasil toma a lei mais como um referencial do que como regras, e que isso, devido às estruturas sociais cristalizadas e sua correspondente ideologia repressiva, está longe de mudar. Que os exemplos escassos de recuperação são acidentes neste sistema, e não a regra; que são frutos de esforços solitários; que as finalidades da pena são enunciadas de maneira hipócrita; que, limitado pela vigilância da própria sociedade, o Estado pouco pode fazer a respeito; mas que existem jeitos, e o primeiro passo na direção da correção dos erros é que os juristas, os quais estão diretamente envolvidos neste fiasco, reconheçam as falácias do sistema penitenciário e se disponham a criar e aplicar alternativas. Aqui há duas convertidas a este modo de pensar. Esperamos que este trabalho auxilie na conversão de outros.

Referências BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução de Lucia Guidicini e Alessandro Berti Contessa. São Paulo: Martins Fontes, 1998. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida. Edição de 1995, revista e corrigida, com as palavras de Jesus em vermelho e ajuda ao leitor. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2007. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, in Vade Mecum Compacto Saraiva. 5. ed., atualizada e ampliada. São Paulo: Saraiva, 2011. ________. Código Penal, in Vade Mecum Compacto Saraiva. 5. ed., atualizada e ampliada. São Paulo: Saraiva, 2011. ________. Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84), in Vade Mecum Compacto Saraiva. 5. ed., atualizada e ampliada. São Paulo: Saraiva, 2011. ________. Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/90), in Vade Mecum Compacto Saraiva. 5. ed., atualizada e ampliada. São Paulo: Saraiva, 2011. ________. Lei nº 12.433/11, de 29 de junho de 2011. Lex: Altera a Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), para dispor sobre a remição de parte do tempo de execução da pena por estudo ou por trabalho. Disponível em: . Acesso em 06/09/2011. CÉU dentro do inferno, O. In: site Revista Igreja. Rio de Janeiro. Disponível em: . Acesso em 05/09/2011. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Cartilha do reeducando. Brasília: 2011. Disponível no formato PDF em: < http://www.susepe.go.gov.br/cartilha_reeducando.pdf >. Acesso em 08/2011. ________. Geopresídios. Recurso interativo com estatísticas dos presídios de todo o país – fase experimental. Disponível em: . Acesso em 08/2011. ________. Juiz Marcelo Mairon; Juiz Douglas de Melo Martins (Coord.). Relatório geral do mutirão carcerário do estado do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: 2011. Disponível no formato PDF em: < http://www.cnj.jus.br/programas-de-a-a-z/detentos-e-ex-detentos/pjmutirao-carcerario/objetivos-detalhados >. Acesso em 08/2011. DOSTOIEVSKI, Fiódor. Crime e castigo. Traduzido por Ivan Petrovitch e Irina Wisnik Ribeiro. São Paulo, Martin Claret, 2006. ________. Recordações da casa dos mortos. Traduzido por José Geraldo Vieira. São

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Anexos Anexo I – Transcrição aproximada da entrevista concedida por telefone pelo Sgto. Antuarte, da PM (RS), no dia 01/09/2011, entre as 20:00 e 22:00h. Nome: Luiz Fernando Antuarte da Silveira Idade: 45 anos Profissão: Sargento da Policia Militar do Rio Grande do Sul Local de trabalho: Penitenciária Estadual de Jacuí – Charqueadas (RS). De responsabilidade da brigada militar, na parte externa. Rodízio. Tempo de experiência: 23 anos de polícia, três anos dentro do presídio com as pessoas. Agora trabalha treinando os cachorros da penitenciária. 1. Quais são as dificuldades da profissão? Tem brigadas que chegam lá, vão até o fundo do presídio e pedem pra sair, porque não aguentam a barra, muita coisa pesada pra ver lá dentro. Medo. Quando há ameaça de rebelião, e é necessário ferir, é perigoso. Há muita tensão, também. Quando eles estão no pátio, há ambiente de suspeita. (…) O comandante ali é muito rígido. Ameaçam mandar embora a qualquer hora. O diretor é militar, um major. Este está há pouco tempo, uns 4 meses. Cada diretor fica 2 anos lá, sempre um major. 2. Quais são as condições físicas da prisão onde você trabalha? O lugar é um lixo. Tem preso que dorme até no chão. Porque os colchões que chegam ficam com os líderes lá de dentro. Tudo dentro da cadeia se torna dinheiro, mesmo um chinelo de dedo. Tem preso que se prostitui por crack. (...) Dentro das celas eles são organizados. Tem uma regra, um preso não pode olhar para a cela do outro. Não podem entrar sem camisa. Há um líder (chamado de “plantão”) em cada galeria de 200 pessoas, com cerca de 15 cupinchas, os cabeças-de-lata. É um preso influente, escolhido como líder, geralmente com dinheiro lá fora. Damos benefícios para o líder. Mais tempo de pátio, jogar bola. Concedemos também os pedidos que são feitos por ele para os outros presos. Ele cobra pedágio das visitas dos presos. Se der problema na galeria dele, ele é transferido, o que chamamos de 'mandar viajar'. Tem o objetivo de conter rebeliões. Dentro das celas quem manda são os apenados, e fora é a brigada. O líder responde pela segurança dentro da galeria. 3. O estabelecimento é de segurança baixa, média ou máxima? Segurança média. Seis a quatro pessoas por cela. No de segurança máxima, há um preso por cela, câmeras nas celas. É do outro lado da faixa (da rua), há a PASC – Penitenciária de Alta Segurança Charqueadas, de segurança máxima – só agentes, não têm a brigada. Acaba que segurança máxima mesmo é o nosso, lá há mais problemas. Os presos têm medo aqui porque a brigada é mais organizada, vigia 24 horas. O Presídio Estadual de Charqueadas é o semiaberto, são todos na mesma quadra. 4. Quantos presos? 2300 aproximadamente 5. Quantas vagas? (Hesitação) Vagas? (Explicamos que nos referimos ao número oficial de presos que a penitenciária pode conter). Ah, 1000 e pouco. 6. Quantos agentes? De serviço, em geral, 20 no fim de semana e noite. De segunda a sexta – 30 a 35. 7. Há terapeutas, professores, ou algum profissional que possa auxiliar na recuperação do preso? Em dia de semana. Psicólogos (cerca de seis), dentista (um – da SUSEPE), enfermaria (atendida pela polícia). Se o preso está muito mal, ele é transferido para um hospital penitenciário. Certos dias há médicos da SUSEPE lá para atender presos mais urgentes. Recebem tratamento, remédio. Há professores contratados pelo estado. 8. Há muita reincidência? De cada dez pessoas que saem da cadeia, quantas voltam,

aproximadamente? Geralmente voltam, 90% volta. Os presos ficam em dívida para os grandões que os protegeram durante a cadeia. Quando saem, devem um “favor” aos líderes lá de dentro. Têm que servir de “mula”, assaltar... Se não pagar, ameaçam matar o preso ou alguém da família dele. Tem que deixar pra trás tudo que tem de valor para pagar os grandões. 9. Já houve alguma fuga ou rebelião nessa prisão? Se sim, foi um caso excepcional, e as coisas costumam ser calmas, ou incidentes desse tipo são comuns? Já houve. Brigas de líderes que querem tomar o poder na galeria dos outros. Muitas mortes, e a polícia tem que interferir. Brigam de arma feita, “estoque”. De vez em quando acontece. Uma ou duas por ano. Falta água, coisa assim, eles começam a bater porta; quando tem um doente, de madrugada – fazem “bateção”. São muito organizados. Lá há uma escala de presos, os que fazem faxina, os que cozinham, os que recebem visita, os que ficam de vigia para a brigada não entrar dentro da cadeia. Fuga é mais raro. Eles estão muito cercados. 10. Há alguma espécie de separação entre primários e reincidentes dentro da prisão, alas diferentes, talvez? Todos na mesma área. Os chefes das galerias têm que aceitar o preso na sua galeria. Tentar colocá-lo numa a força, é arriscar ser responsável pela morte dele. Eles fazem um questionário para os primários. Tem uma cela do “resto”. Estupradores não são aceitos, homossexuais, e é necessário colocá-los nessa cela separada. 11. Com que frequência se fazem revistas? E com que frequência se apreende celulares, drogas, coisas assim? Os cachorros servem para a revista. Tiramos a roupa dos presos para procurar droga, celular. Fazemos revista rotineira 2 vezes por semana. Fazemos revista onde suspeitamos que tem túnel. Há presos que dão informações – os que querem regalias, os dedo-duros. Se a galeria está muito agitada, se há denúncia, colocamos toda a galeria no pátio, revistamos minuciosamente um por um, entra um grupo de choque (para escolta, trabalhos mais arriscados), e eles fazem as revistas nas celas. Acham sempre alguma coisa – celulares, armas, estoques. Tem uma lei que impede fazer revista íntima nas visitas, com raridade se faz. O que é apreendido é mandado para o Fórum, e não há como saber de quem veio, na verdade. 12. Que sanções disciplinares são aplicadas quando vocês apreendem isso? Não há sanções, só é feito o registro. 13. O que os presos ficam fazendo na maioria do tempo? Ficam jogando bola – 2 horas de pátio. Fazem exercícios, andam. A maioria não faz nada. 14. Muitos presos estudam? Dois ou três por galeria, aproximadamente. 15. Quais são as oportunidades de trabalho na cadeia? Fazem artesanato, marcenaria, alfaiate, bibliotecário, sapateiro... Oficinas. Fazem coisas que já sabiam fazer antes de serem presos. Saem da cela de manhã e voltam às 4 da tarde. Poucos trabalham. Existe uma galeria só de trabalhadores, que trabalham na manutenção do presídio. (...) Tem um que fica numa sala separada, tem uma máquina de escrever, pegou 30 anos, já publicou dois livros, * trabalha na biblioteca, trabalha e estuda. Félix, o Monstro do Partenon . Teve uma decepção amorosa, passou a assaltar, estuprando e matando as mulheres em frente ao marido delas. Ele nunca passa no exame com a psicóloga, porque é psicopata. (...) Tem uma galeria só de crentes. O pastor, que é o líder da galeria deles, aceita presos que ele acha que vão se recuperar, ele dá uma chance. Se o pastor acha que o preso não vai se recuperar, manda ele para o brete, coloca todas as coisas dele no “brete”*, e o preso sabe que está expulso da galeria. Trabalham na cozinha geral. Geralmente os presos se recuperam nessa galeria. Toda instrução é voltada para o bem, há muitas regras, a pessoa não pode assistir televisão, tem que “rezar” bastante, etc. 16. E quando eles saem, qual, você acha, é a chance de alguém contratá-los? Descriminados na sociedade, é difícil arranjarem empregos. Não são considerados profissionais. É difícil recuperar. *

Parque público de Porto Alegre, no bairro de mesmo nome.

Anexo II – Objetivos detalhados do Mutirão Carcerário 1. Reexaminar todos os inquéritos e processos de presos provisórios – decidir quanto à manutenção ou não da prisão; 2. Reexaminar todos os processos de presos condenados – decidir quanto à possibilidade de concessão de benefícios da LEP, inclusive quanto à conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos; 3. Encaminhar ao preso o atestado de pena a cumprir ou extrato de liquidação de pena, devendo uma cópia ser encaminhada ao prontuário do preso; 4. Monitorar as ações do Projeto Começar de Novo, estabelecendo novas parcerias e adotando ações que visem à reinserção social e proteção social às famílias dos presos, inclusive com emissão de documentos pessoais; 5. Estabelecer acordo com a Secretaria de Segurança Pública e outros órgãos públicos, para realização de mutirão de expedição de documentos de identidade; 6. Criar equipe multidisciplinar para o contato com a família dos presos e facilitar as ações do Projeto Começar de Novo, especialmente em relação à localização dos documentos pessoais dos presos; 7. Reexaminar todos os processos de cumpridores de medidas de segurança – decidir quanto à manutenção da medida e outros encaminhamentos, para tanto os pacientes deverão ser previamente examinados pela equipe multidisciplinar para fim de expedição de laudo de cessação de periculosidade; 8. Reexaminar todos os processos de cumpridores de medidas restritivas de liberdade, provisórias e definitivas, aplicadas pela Vara da Infância e da Juventude – decidir quanto à possibilidade de concessão de liberdade e de qualquer outro benefício; 9. Verificar os processos de condenados, definitivos ou não, nas varas criminais e nas de execução penal, quanto à expedição de guias de recolhimento para execução e quanto à unificação/soma de penas; 10. Inspecionar estabelecimentos penais e delegacias de polícia que mantêm presos; 11. Atualizar rotinas cartorárias das varas de execução penal e dar cumprimento às decisões proferidas no mutirão; 12. Levantar as vagas existentes no Sistema Penitenciário em todo o Estado, para a imediata remoção dos presos condenados e custodiados em delegacias de polícia, à medida das vagas apuradas; 13. Remover presos dentro do Estado, para adequação das vagas existentes e para atender estratégias de segurança, nos termos da solicitação conjunta que será feita pelas Secretarias de Estado de Segurança e de Justiça, que assumirão a obrigação de conduzir o preso ao juízo, sempre que requisitado; 14. Adotar as providências necessárias ao recambiamento de presos, nos termos do projeto coordenado pelo CNJ e Ministério da Justiça; 15. Examinar, no curso dos trabalhos, a necessidade de extensão dos trabalhos aos processos de segundo grau, devendo ser comunicado aos coordenadores do CNJ e CNMP, para ampliação do escopo do projeto; 16. Verificar, dentre as práticas premiadas pelo Instituto Innovare, quais podem ser aplicadas durante e após o mutirão carcerário. Fonte: http://www.cnj.jus.br/programas-de-a-a-z/detentos-e-ex-detentos/pj-mutirao-carcerario/objetivos-detalhados

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