O sítio arqueológico do Castro de Ul, Oliveira de Azeméis: problemáticas da sua hipotética musealização e preparação turística

May 26, 2017 | Autor: Sara Almeida e Silva | Categoria: TURISMO ARQUEOLOGICO
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Centro Português de Geo-História e Pré-História

Curso de Turismo e musealização de sítios arqueológicos

Sara Filipa Bastos de Almeida e Silva

Oliveira de Azeméis/2016

O Sítio Arqueológico do Castro de Ul, Oliveira de Azeméis: Problemáticas da sua hipotética musealização e preparação turística Sara Filipa Bastos de Almeida e Silva

Resumo: O presente trabalho aborda o sítio arqueológico do Castro de Ul, Oliveira de Azeméis, Aveiro, Portugal, com propostas para a sua valorização e/ou musealização. Trata-se de um povoado com uma grande diacronia de ocupação, parcialmente escavado e que poderá ser preparado para o turismo arqueológico.

Palavras-chave: Castro de Ul, Turismo Arqueológico, Musealização.

Abstract: This paper is about the archaeological site of Castro de Ul, Oliveira de Azeméis, Aveiro, Portugal. This settlement had a wide occupation in time. It is partially excavated and it can be ready for archeological turism. In the following text we will adress the problematics of his musealization.

Key-Words: Castro de Ul, Archeological Turism, Musealization

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Índice

Introdução

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Metodologia

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I – Enquadramento

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1.1

– Enquadramento administrativo

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1.2

– Enquadramento geográfico, geológico e geomorfológico

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1.3

– Enquadramento turístico

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II – Enquadramento histórico-arqueológico

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III – Problemáticas da valorização e musealização do Castro de Ul para fins turísticos

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Conclusão

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Bibliografia

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ANEXOS

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Introdução Este trabalho surge no âmbito da formação em turismo e musealização de sítios arqueológicos, do Centro Português de Geo-História e Pré-História e nele serão apresentadas as problemáticas relacionadas com a musealização de um determinado sítio arqueológico, o Castro de Ul, Oliveira de Azeméis. Uma das questões que se coloca e à qual os arqueológos têm maior dificuldade em responder é a do destino a dar aos sítios depois da sua escavação, sendo que a manutenção visível das ruínas deve ser acompanhada da garantia da sua preservação, onde se inclui a musealização in situ. Essa musealização não implica a criação de um museu no local, podendo ser complementada também pelos museus mais próximos (RAPOSO, 2003, p. 164-165). A nossa opção pelo Castro de Ul advém, também, da actual preocupação com o sítio já que não estão actualmente garantidas as suas condições de preservação, embora a nossa investigação particular sobre local sítio tenha também condicionado a nossa escolha. A nossa proposta aborda em primeiro lugar, de forma sucinta, as questões científicas em torno do sítio. Segue-se o debate sobre se o Castro de Ul possui ou não a maioria das características para se tornar um destino turístico, considerando o plano social que a arqueologia deve ter. Finalmente, abordamos as várias fases do processo de valorização do sítio arqueológico, fornecendo algumas sugestões de actividades concretas a promover. Tivemos em conta as questões de como chegar, onde ficar e o que fazer, integrando também a nossa proposta de valorização do sítio, com outros locais de possível visita, alertados para a situação de que “uma oferta isolada tem pouca capacidade de sobrevivência num vasto e competitivo mercado de ofertas turísticas relacionadas com o património” (MORAIS, 2010, p. 9).

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Metodologia No presente trabalho desenvolvemos, em primeiro lugar, um conjunto de assuntos que nos pareceram relevantes para enquadrar o Castro de Ul na temática a debater. Assim sendo, para o primeiro capítulo, a metodologia usada passou pela recolha de informação bibliográfica. A informação foi organizada em diversas realidades (enquadramento administrativo; geográfico, geológico e geomorfológico; e enquadramento histórico-arqueológico), para que fosse possível a quem não conhece o local, obter o mínimo de informações sobre ele. Seguidamente tentamos abordar os critérios para a selecção de sítios que nem sempre são unânimes, pelo que optamos por compilar os critérios referidos por alguns autores e discuti-los em conjunto. Finalmente para o debate do programa de valorização ou das diferentes etapas a considerar para a execução do mesmo, seguimos os pontos elencados por Olga Matos (2008), complementados, em pormenores, por outra bibliografia. Na elaboração do presente trabalho não se aplicou o Acordo Ortográfico de 1990.

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I – Enquadramento 1.1 – Enquadramento administrativo O Castro de Ul situa-se no concelho de Oliveira de Azeméis (fig.1), na extinta freguesia de Ul e actual União das Freguesias de Oliveira de Azeméis, Santiago de RibaUl, Ul, Macinhata da Seixa e Madail. O território do município insere-se administrativamente no distrito de Aveiro, mas pertence à Área Metropolitana do Porto. Ul era tida como a freguesia com o nome mais pequeno do país, tendo pouco mais de 2000 habitantes. Encontra-se classificada, desde 20121, como Aldeia de Portugal, assunto a que voltaremos posteriormente. De notar que a zona onde se localiza o Castro é também, pela via dos cursos de água próximos, uma zona de limite de freguesias. A Sul do Castro encontra-se a freguesia de Travanca e a Oeste a freguesia de Loureiro.

1.2 – Enquadramento geográfico, geológico e geomorfológico O Castro de Ul situa-se, como já referimos, na aldeia de Ul, no lugar do Crasto (fig.2), com acesso relativamente simples tendo como referência a Igreja Matriz e o Largo do Souto. Entre estes dois elementos existe uma rua em paralelo, que dá acesso à Rua do Crasto. Aí existem dois caminhos distintos que levam às plataformas onde ocorreram as escavações dos anos 80. Actualmente, os acessos estão sinalizados (fig.3). O povoado localizado em terrenos particulares, tem na zona do seu acesso várias construções habitacionais, sendo que apenas as alterações realizadas nos anos noventa, tanto quanto sabemos, foram alvo de sondagens arqueológicas prévias2. O sítio implanta-se num pequeno esporão, na confluência dos rios Ul e Antuã, o que lhe confere algum destaque na paisagem, apesar da sua altitude máxima pouco exceder os 100 metros. Ao destaque na paisagem podemos também associar as excelentes condições defensivas que o local ofereceria à época da sua ocupação antiga 1

http://www.cmoaz.pt/noticias.6/turismo.23/ul_classificada_%25c2%25abaldeia_de_portugal%25c2%25bb.a2744.html (23/05/2016) 2 Estes trabalhos foram realizados pelo arqueólogo já falecido Fernando Silva.

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(fig.4). Note-se ainda que nas vertentes voltadas a Norte e Noroeste o Castro apresenta um declive considerável de 35° (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 8). No que concerne às questões geológicas, o local apresenta “granitos e granodioritos gnáissicos de grão médio, com duas micas, predominando a moscovite. No entanto, o terreno que o circunda é, maioritariamente, constituído por xistos argilosos, xistos grauvacóides e quartzitos cinzentos” (MARQUES, 1989, p. 66). Merecenos ainda nota a presença, nos territórios a Oeste do Castro, na freguesia de Loureiro, a presença de terraços marinhos de formação no Terciário (PEREIRA et al., 1980, p. 19), com cotas que variam entre os 120 e 130 metros, impedindo a visibilidade no Castro para a zona de costa (fig.5). Do ponto de vista dos recursos mineiros, embora haja referências a diversas extracções no concelho (CARVALHO, 1946, p. 315), Pinho Leal referiu a exploração antiga de cobre e chumbo, em Ul, recursos talvez importantes para os habitantes do povoado (1882, p. 9). A localização do povoado está intimamente ligada, como já referimos, aos rios Ul e Antuã, pelo que, do ponto de vista geomorfológico, devemos ter presente a temática da evolução da linha de costa e do aspecto da zona costeira, cujos estudos apontam para que, ainda no período romano, se verificassem alterações substanciais, comparativamente aos nossos dias (GRANJA, 2002, p. 96). Concretamente, as alterações que o curso do rio Antuã 3 foi sofrendo (SILVA e PEREIRA, 2010, p. 193; BASTOS et al., 2001, p. 183) poderiam ter tido uma influência diferente da actual no povoado. O clima apresenta-se temperado mediterrânico, com forte influência marítima (SILVA, 1995, p. 17), sendo frequentes, nas estações da Primavera e do Outono, os nevoeiros matinais. Não tendo havido até agora estudos paleoambientais no Castro de Ul, a única informação genérica de referência para o clima antigo relaciona-se com o arrefecimento da temperatura que terá ocorrido por volta do século VI a.C. (GRANJA, 2002, p. 97).

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Ainda durante o século XII, o rio Antuã desaguaria no oceano, ao invés de desaguar na laguna de Aveiro. Não cabe neste trabalho uma discussão mais alargada sobre o assunto, no entanto, o caudal do rio que seria maior e mais forte poderia contribuir para o isolamento do povoado de uma forma mais substancial do que o que se verifica actualmente. Foi levantada ainda a questão da eventual navegabilidade do Antuã, até zonas mais interiores, como o Castro de Ul ( SILVA e PEREIRA, 2010, p.

190; CASTRO,1987, p. 43). 6

Finalmente quanto ao coberto vegetal do povoado, actualmente apresenta vegetação rasteira (fetos e silvas) e algum arvoredo (eucalipto, pinheiro e carvalhos). À época da sua ocupação, poderemos depreender, de acordo com os achados arqueológicos relatados, a presença no local ou nas suas proximidades de Carvalhos ou Sobreiros, Castanheiros e plantações de trigo (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 9).

1.3 – Enquadramento turístico Como referimos no enquadramento administrativo, Ul foi classificada como Aldeia de Portugal, o que lhe confere alguma visibilidade em termos turísticos. No entanto, esta classificação advém já de uma série de pressupostos que se verificavam na freguesia, como as suas características rurais, a sua tradição de padeiras e moleiros, entre outras. Embora sejamos defensores de que o património arqueológico será um valor turístico por si só, não podemos negar que, na cultura local e regional, talvez um sítio arqueológico isolado não seja suficiente para mover massas. Por outro lado, o facto de se localizar, nas proximidades do Castro, um equipamento como o Parque Temático Molinológico (PTM) será, sem dúvida, um elemento facilitador em termos de infraestruturas, que não seriam possíveis de construir no próprio Castro ou que implicariam um investimento demasiado avultado. O PTM (fig.6), como o nome indica, é um espaço museológico destinado ao património dos moinhos, muito presente no concelho e em especial na freguesia. Relacionado com as actividades da moagem de cereais para a produção de farinhas, correlacionado também com a produção do típico pão de Ul e, por outro lado, destinado ao descasque do arroz, tendo derivado depois no surgimento de grandes empresas da área como a Saludães/Novarroz e a Caçarola Valente Marques, que ainda possuem unidades de produção na freguesia. Foi inaugurado em 2009 e é composto por uma série de moinhos, restaurados, onde é possível ver uma exposição sobre a moagem. Dispõe também de um espaço onde é confeccionado Pão de Ul e regueifa de Ul, dois produtos típicos do concelho. Possui um bar, casas-de-banho e uma sala destinada a reuniões ou outros eventos. Nas imediações do PTM encontra-se, há alguns anos, um Centro de Provas Gastronómico. Exceptuando a altura da sua 7

inauguração, não foi publicitado o seu uso, no entanto, será um equipamento a considerar. O PTM foi também responsável pela criação de dois percursos pedestres a Rota do Moleiro e a Rota do Crasto, sendo por isso que se encontra sinalizado o acesso ao Castro de Ul. Como referimos, o pão de Ul, um pão típico em que toda a produção é feita manualmente, e a regueifa de Ul (de limão e canela) são já uma marca da região e um atractivo da visita à freguesia. Nas festas da localidade, em Fevereiro, dedicadas a S. Brás e à Srª das Candeias, são o elemento mais consumido. A romaria acaba por atrair bastante gente às imediações da Igreja Matriz, bem próxima do Castro de Ul. A própria Igreja Matriz, CNS 4656, sofreu obras recentes, tendo sido descurado o seu acompanhamento arqueológico. Contudo, além do património religioso por si só, a Igreja possui um órgão de tubos que também foi alvo de intervenção, havendo ocasionalmente concertos no espaço. O elemento que mais nos interessa neste monumento, em correlação com o sítio arqueológico, é a existência na parede traseira, junto à sacristia, do Terminus Augustalis, inscrição do período romano que abordaremos adiante, assim como as referências à presença de outras inscrições nos seus alicerces. A iniciativa Há Festa na Aldeia, promovida pela ADRITEM 4, após a classificação de Ul como Aldeia de Portugal, tem vindo também a ser responsável por um enorme fluxo de pessoas freguesia, anualmente. Esta iniciativa fez também com que muitas pessoas visitassem, no seu primeiro ano, o Castro de Ul. Finalmente, porque também é relevante para desenvolvimento do restante trabalho, cabe-nos dar nota da inexistência de um Museu Municipal, na cidade de Oliveira de Azeméis. Assim, o único espaço museológico existente trata-se da CasaMuseu Regional de Oliveira de Azeméis, estando aí depositados materiais das escavações realizadas no Castro de Ul. Este espaço é da responsabilidade de uma associação sem fins lucrativos e dista do sítio arqueológico aproximadamente 5 km5.

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Associação de Desenvolvimento Regional Integrado das Terras de Santa Maria. A Casa-Museu Regional encontra-se a preparar a sua Sala de Arqueologia.

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II – Enquadramento histórico-arqueológico O Castro de Ul tem a sua primeira referência na documentação medieval, do século XIII (OLIVEIRA, 1943, p. 52-53; ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 39), mas é referido como sítio arqueológico a partir do século XIX (Leal, 1882, p. 9). Já no século XX são vários os autores que se dedicam ao sítio, uns apenas referindo a sua existência, mas outros debatendo questões mais profundas em torno da sua ocupação e achados (PEREIRA, 1907, p. 140; VV.AA., 1909, p. 348 -352; OLIVEIRA, 1943, p. 52-53; AREDE, 1951, p. 207-208; SOUSA, 1960, p. 74; GONÇALVES, 1981, p. 167; MARQUES, 1989; SILVA, 1994, p. 57; SILVA, 1995, p.32). Em 1948, Manuel Mentarfa publica uma obra exclusivamente dedicada ao Marco Miliário da Milha XII, aparecido nas imediações do Castro de Ul, uma compilação de textos que edita, numa década em que se dão as primeiras escavações no povoado. O facto de serem associadas ao sítio diversas inscrições, como adiante se referirá, e de ser frequente o aparecimento de materiais à superfície, devem ter desencadeado o interesse do pároco local, que promoveu assim a primeira intervenção no sítio arqueológico. O Reverendo Agostinho da Silva Gomes, entre alguns contratempos, promoveu os trabalhos e constituiu, na sacristia da Igreja Matriz, um pequeno museu onde colocou as peças e objectos exumados (AREDE, 1951, p. 208; SOUSA, 1960, p. 67-72). Destes breves trabalhos resultou inúmero espólio (objectos líticos, incluindo mós com restos de barro; cerâmica variada; escória de ferro e objectos metálicos, como um mascarão ou uma fíbula; fragmentos de vidro, incluindo contas de colar; e ainda porções de carvão e ossos (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 43-46). Em termos de estruturas é referida a descoberta de ruas e de um lajeado, várias paredes de casas, um troço de muralha e, ainda que mais incertas, existem referências ao surgimento de um balneário e de uma possível pedra formosa, assim como de um conjunto de eventuais sepulturas (SOUSA, 1960, p. 66-74). Apesar de toda a dinâmica à volta do sítio, Alberto Sousa refere que era habitual que se fosse buscar pedra ao Castro, daí o desaparecimento de algumas estruturas. As intervenções e o interesse pelo sítio acabaram por esmorecer, tendo se entretanto perdido a grande maioria do espólio, que integrou o museu da sacristia. O local nunca foi alvo de intervenções planeadas e apesar de ir sendo referido na 9

bibliografia, só voltou a ser alvo de intervenções científicas na década de oitenta (1984-1987, dirigidas por Maia Marques). Talvez durante essa fase de desinteresse pelo sítio se tenha dado a visita de Nogueira Gonçalves (1981, p. 167), que o descreve como sendo um sítio com pouco espólio e de pouca importância científica. Em 1984 dá-se então início aos trabalhos arqueológicos, envolvendo a Universidade Portucalense, mas que vieram a ter bastantes lacunas (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 48). O resultado desses mesmos trabalhos é publicado em 1989, numa pequena separata dando conta das estruturas, materiais e estratigrafia evidenciada com as escavações, bem como algumas conjecturas de interpretação cronológica do sítio (fig.7e 8). Os trabalhos arqueológicos incidiram em três zonas diferentes (MARQUES, 1986, p.8), apesar de na publicação apenas serem referidos dois, que são os actualmente identificados no povoado (MARQUES, 1989, p. 65-89). Num dos sectores foi identificada uma muralha, um muro de delimitação e uma estrutura tida como de fundição e no outro identificou-se um lajeado, parte de uma estrutura rectangular e um ângulo de uma outra, com planta similar, que foram interpretadas como estruturas habitacionais e ainda uma lareira, mais antiga, e já desaparecida (MARQUES, 1989, p. 68-70). No terceiro sector (fig.9) o autor dos trabalhos descreveu várias estruturas, nomeadamente dois muros, um piso de saibro, uma lareira e duas estruturas de pedras miúdas em semicírculo, mas que actualmente ainda não se identificaram (MARQUES, 1986, p.8). Grosso modo estaríamos perante estruturas que oscilavam entre a Idade do Bronze e a Época Romana, numa das zonas de carácter mais oficinal e noutras duas habitacional. Os materiais recolhidos atestavam esta cronologia e foram bastante abundantes entre líticos, como lâminas e lascas de sílex; cerâmica variada; metais, numismas e vidro. Alguns dos materiais, como um fragmento de cerâmica com pasta de vidro, mostraram-se bastante interessantes e levantaram problemáticas, neste caso concreto, da eventual produção de vidro no povoado (MARQUES, 1986, p.12). No entanto, parte dos materiais recolhidos foram levados para a Universidade Portucalense e outra parte colocados em depósito na Casa-Museu Regional de Oliveira de Azeméis. Mais uma vez, parte desse espólio perdeu-se e, a parte que se depositou

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na Casa-Museu teve também um percurso atribulado, sendo estudado apenas em 20136. Posteriormente, apenas na década de 90 se verificaram trabalhos de conservação/consolidação das estruturas a descoberto e de sondagens prévias para a construção de uma moradia. Ambos os trabalhos foram da responsabilidade do arqueólogo Fernando Silva, que colaborava com a autarquia oliveirense nesse momento. Na mesma altura, ao redigir um artigo como contributo para uma futura carta arqueológica, Fernando Silva (1995, p. 32) alerta para o futuro do Castro de Ul – “Porém há que sublinhar que começam a surgir indicadores alarmantes para a manutenção da estação”. Além destas intervenções há apenas a acrescentar a publicação do estudo feito ao conjunto de numismas depositados na Casa-Museu Regional de Oliveira de Azeméis, sendo que apenas 7 são do Castro de Ul (SILVA e TEIXEIRA, 1994). Entretanto, Oliveira de Azeméis alheou-se completamente do povoado (fig.10) e apenas em 2011 volta a haver algo digno de registo. O Castro de Ul é incluído no projecto de investigação Proto-história da Bacia do Antuã (PROBA), tendo em vista apenas a sua manutenção e a realização de trabalhos de prospecção geofísica. Desse modo, em 2011 e 2012 (fig.11 e 12), o sítio foi alvo de trabalhos de limpeza e corte de vegetação e, nesse último ano, também de uma prospecção incluída no mesmo projecto, no âmbito de um estágio curricular de arqueologia no Município de Oliveira de Azeméis. Já em 2013, a Câmara Municipal entendeu desenvolver trabalhos de geofísica cujos resultados não foram esclarecedores (SILVA et al., 2016, p.87). Durante o ano de 2013 o Castro de Ul voltou a ser tema de debate e de apresentação pública, em virtude da nossa investigação, que levou à produção da primeira dissertação de mestrado sobre o sítio. Uma vez que o trabalho desenvolvido passou por fazer todo o estudo de materiais em depósito na Casa-Museu Regional de Oliveira de Azeméis, tornou-se pertinente apresentar parcialmente esses dados e 6

Não sendo o tema principal deste trabalho, achamos relevante abordar esta questão da dispersão de materiais, pois também ela tem influência directa na nossa proposta de valorização do sítio. Neste caso concreto, os materiais uma vez na Casa-Museu foram colocados num primeiro andar, cujo piso era de madeira e acabou por ceder. Alguns dos materiais recuperados foram colocados numa arrecadação (bastante húmida) daquela instituição e apenas em 2012 foi possível conhecer a real dimensão do espólio ali armazenado. Em exposição encontravam-se apenas cerca de 100 fragmentos entre cerâmica, vidro, a fíbula e escória de fundição. Os materiais foram estudados entretanto no âmbito da nossa tese de mestrado apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto, em 2013.

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promover uma exposição com esses materiais. Esta iniciativa aconteceu no Dia Internacional dos Monumentos e Sítios7, tendo sido apresentada a conferência Análise de Materiais como Contributo para o Conhecimento da Ocupação Proto-Histórica e Romana no Território entre os rios Douro e Vouga - O Castro de Ul ainda em estudo. À mesma seguiu-se a inauguração da exposição Fragmentos do Castro de Ul (fig.13), que apresentou além dos materiais estudados, um conjunto de recolha de notícias, imagens e citações sobre o sítio arqueológico. Após o termo da exposição na CasaMuseu, entendeu-se ser pertinente levá-la até Ul, pois o feedback recebido apontava no sentido das pessoas estarem interessadas pelo tema, mas desconhecem totalmente ou na sua maioria a localização do sítio e a sua história. Sendo assim, a exposição instalou-se no PTM até aos inícios de 2014. Durante a mesma foi possível realizar visitas guiadas e actividades variadas8 (fig.14). Esta dinâmica acabou por desencadear a organização da iniciativa Caminhadas pelo Património – Castro de Ul9 e também, a inclusão de visitas guiadas ao Castro de Ul no âmbito do evento Há Festa na Aldeia10. Foi também realizada a iniciativa Conversa no Museu Regional de Cucujães, em que se apresentou conferência idêntica sobre o povoado de Ul. Nos finais de 2013, o município voltou a intervir no povoado, desta vez, para acções de conservação e restauro (fig.15). Ao contrário do inicialmente previsto, em 2014, ainda no âmbito do PROBA e, em 2015, no âmbito de um outro projecto de investigação, o Castro de Ul foi alvo de duas campanhas de escavação, envolvendo o técnico do município e Adriaan de Man, da Universidade Nova de Lisboa. Da campanha de 2015 nada foi dado a conhecer, todavia, no que respeita à de 2014, os seus resultados foram apresentados numa conferência11, mas ficaram aquém do esperado, com a ausência de estruturas, de estratigrafia preservada e uma quantidade pouco significativa de material (SILVA et al., 2016, p. 88) (fig.16 e 17).

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Seminário “Proto-História e Romanização: Divulgar o conhecimento arqueológico pode ajudar à mudança social?” 8 De salientar que as actividades tiveram públicos bastante diversos, desde alunos de um mestrado da Universidade de Coimbra, ao grupo de jovens locais para quem se realizou um peddy-paper. 9 Iniciativa organizada pela Associação Dona Urraca Moreira, com a nossa colaboração. 10 Neste âmbito foi organizado também um workshop sobre arqueologia e o Castro de Ul para os jovens da freguesia que iriam participar na iniciativa. 11 Castro de Ul: Balanço de 4 anos de intervenção.

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Por outro lado, a Casa-Museu Regional está a encetar esforços para a criação de uma Sala de Arqueologia (fig.18,19 e 20), em que seja possível visualizar os materiais do Castro de Ul, mas também de outras estações do concelho. Tendo referido, de forma cronológica, a sequência de acções, artigos ou intervenções no Castro de Ul, ou com ele relacionadas, cumpre-nos dar ainda nota do conjunto de epígrafes ligadas ao sítio, assim como duas gravuras rupestres de carácter problemático (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 65-67), mas que ajudam a destacar a importância do local, em termos arqueológicos. Os destaques vão claramente para o Terminus Augustalis, inscrição aparecida nas obras da Igreja Matriz e actualmente embutida na parede exterior da sacristia. A epígrafe tem datação entre Julho do ano 5 e o mesmo mês do ano 6 (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 67-70). Destaque também para o Marco Miliário da Milha XII, aparecido na mesma circunstância da inscrição anterior e com um percurso bastante atribulado (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 70-72), que actualmente se encontra próximo da Igreja Matriz de Oliveira de Azeméis. A sua datação é dos anos 23/24. Além destas duas inscrições mais conhecidas, foi possível elencar em 2013 (ALMEIDA E SILVA, p. 72-75) um conjunto de outras ligadas a Ul e/ou ao Castro, nomeadamente o Marco de Adães, que se encontra depositado na casa paroquial de UI; uma estela funerária ou ara votiva, actualmente em parte incerta; bem como a existência de uma inscrição indeterminada nos alicerces da Igreja; uma ara anepígrafa e ainda outra inscrição em parte indeterminada. Conjugando este conjunto de referências a inscrições, embora nem todas sejam conhecidas ou se encontrem localizadas; bem como ao conjunto de material exumado, não temos dúvidas que o Castro de Ul, sítio de ocupação diacrónica, possuiu vivacidade e poder suficientes no passado, para que actualmente se deva apostar no local, não só em termos de investigação, mas também em termos turísticos. Assim sendo, é notória a importância que o sítio foi tendo ao longo dos anos e das publicações, assim como a sua diacronia de ocupação (pelo menos da Idade do Bronze ao final do período romano/Alta Idade Média), a diversidade de materiais recolhidos e o facto de apontarem para a presença de diversas actividades no povoado (fabrico de cerâmica, tecelagem, fundição de metais e produção de vidro), a existência de diversas estruturas, dispersas por todo o povoado, além das que se concentram na 13

plataforma superior escavada, que se distinguem, grosso modo, numa zona mais habitacional e outra oficinal (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 64). Há ainda que realçar o recente interesse da autarquia pelo sítio, no entanto parece-nos que sem o planeamento e envolvimento da comunidade devido. É evidente que a escavação do sítio está numa fase muito preliminar e cremos claramente que haverá ainda muito a saber sobre a ocupação do Castro de Ul, no entanto, apesar do nosso optimismo quanto ao potencial, importância e possíveis descobertas, a destruição do sítio, o saque, o abandono, o plantio de árvores, a falta de sensibilização da população e, principalmente, dos proprietários e a grande dispersão do espólio dos trabalhos mais antigos, são obstáculos muito fortes para as propostas que avançaremos no capítulo seguinte.

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III – Problemáticas da valorização e musealização do Castro de Ul para fins turísticos Os critérios para a escolha dos sítios a valorizar estão longe de ser consensuais. No entanto, é pedido actualmente aos arqueólogos que proponham novas abordagens para a valorização dos sítios, tendo em vista o seu usufruto pelo público (MATOS, 2008, p. 31) Em todo o caso, Luís Raposo (2008, p. 159-160) refere que aos arqueólogos são apresentadas três grandes soluções, após o termo das escavações num local: conservar e musealizar estruturas e mobiliário in situ; musealizar as ruínas e retirar os bens móveis; ou ainda, encerrar as ruínas. Nessa circunstância a escolha será condicionada, como refere o autor, pelos programas políticos e opções técnicas relativas à valorização dos bens arqueológicos. Optando por uma das duas primeiras, surgem uma série de problemáticas nomeadamente “a natureza das medidas conservacionistas a adoptar, a amplitude e o objectivo final das operações de restauro a empreender, as medidas de monitorização a desenvolver, as modalidades e graus de reincorporação de bens mobiliários a promover, etc.” (RAPOSO, 2008, p. 160). Para este autor, quanto menores forem as acções de restauro e maiores forem os investimentos na criação de infra-estruturas e equipas permanentes (que conjuguem a arqueologia com a conservação preventiva) melhor sucedido será o projecto. Contudo, o plano ideal muito raramente consegue ser aplicado e na maioria dos casos o que se verifica são soluções ligadas ao “arranjo de acessos e criação de percursos, assim como à limpeza e restauro sumário das ruínas, porventura com o reposicionamento de uma ou outra peça ou com a edificação didáctica de um ou outro elemento arquitectónico.” (RAPOSO, 2008, p. 162). No caso concreto do Castro de Ul, parece-nos que esta proposta de Luís Raposo será a mais indicada, apesar de adaptada à realidade do sítio, não esquecendo que “o factor de valorização de um sítio arqueológico visa um alvo muito directo que é o seu potencial público, não desmerecendo, naturalmente, outros aspectos como o estudo, a própria conservação, salvaguarda e manutenção do sítio” (MATOS, 2008, p. 34), não

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obstante de dever residir na investigação científica o principal motor da actividade arqueológica. Segundo esta autora, são vários os critérios para seleccionar os sítios a valorizar, mas nem sempre consensuais. As grandes dimensões do sítio, a sua monumentalidade, especificidade, representatividade, singularidade e simbolismo; a existência de um vasto espólio que facilite uma exposição permanente; a existência de orçamento e de um quadro de pessoal especializado, dotando o sítio de condições humanas e financeiras; a possibilidade de apoio logístico ao visitante, bem como de alojamento nas proximidades; a perspectiva de captação de público durante todo o ano, bem como a sua importância turística e ainda o estado de conservação e a garantia de manutenção do sítio são factores a ter em conta para a escolha dos locais arqueológicos a musealizar. Morais (2010, p. 7) refere que os sítios devem possuir valor científico, estético, cultural e económico. Há ainda a considerar a necessidade de classificação do sítio arqueológico uma vez que a “classificação é a primeira garantia jurídica de protecção do local, criando as condições administrativas que legitimam a sua protecção e assumindo o reconhecimento do seu valor cultural” (MATOS, 2008, p. 35). É necessário ainda ter consciência de que a política de fruição do sítio terá que ter diferentes discursos canalizados para públicos gerais ou mais específicos.

Conforme ficou demonstrado no capítulo anterior, as questões científicas justificam o investimento para preparar o Castro de Ul para fins turísticos, mas não é apenas essa a justificação. Não existe qualquer sítio musealizado no concelho de Oliveira de Azeméis e, conjugando uma série de condições, o Castro de Ul será o mais indicado para iniciar a promoção turística do património arqueológico, considerando por exemplo sítios como o Castro de Ossela, também localizado no concelho, que apesar de ter importantes referências bibliográficas e estar até classificado, oferece maiores desafios quanto à sua localização e própria preservação12. Apenas na freguesia de Romariz, concelho vizinho de Santa Maria da Feira, é possível encontrar um povoado proto-histórico musealizado, estando em grande parte 12

No topo do sítio, escavado nos inícios do século XX pelo Museu Municipal do Porto, situa-se uma capela. Em 2013 a Comissão de Festas procedeu a abertura de valas, não autorizadas, para a construção de um palco e de sanitários. A obra acabou por ser suspensa, mas o sítio foi irremediavelmente afectado.

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escavado e restaurado. Neste caso, não existem infra-estruturas de apoio no local, encontrando-se exposto no Museu Convento dos Lóios a maior parte do espólio. Recentemente a Câmara Municipal de Albergaria-a-Velha apresentou a musealização das Mamoas do Taco, situadas na zona industrial daquele concelho. Os monumentos encontram-se acompanhados de painéis explicativos. No entanto, nenhum destes casos pode servir de justificação para que não se aposte na musealização de um sítio arqueológico em Oliveira de Azeméis. Não podemos portanto falar de uma concorrência de públicos e um povoado com ocupação diacrónica é uma vantagem para se poder contar uma boa parte da história de um concelho. A própria dinâmica da aldeia de Ul e o PTM, no qual se realizam diversas visitas de estudo, são factores para que o Castro de Ul seja, pelo menos, a primeira aposta, embora pudesse ser muito interessante uma rede de povoados, a longo prazo. Apesar

de

haver

inúmeros

povoados

castrejos

musealizados,

as

particularidades da ocupação na zona de transição entre Douro e Vouga seriam mais um argumento a pesar para a musealização do sítio. Não podemos dizer que um local como um Castro seja raro, mas certamente que o de Ul apresenta singularidades a considerar. Por outro lado, a nível concelhio, foi em 2013 publicado o Plano Municipal da Cultura (GTCMOA, 2013, p. 31), onde se assume que a área que recebeu mais contributos por parte da população foi a da Arqueologia, Museus e Património, evidenciando uma necessidade de divulgar, promover e salvaguardar o património. Desta forma, verifica-se que muito provavelmente a preparação turística do Castro de Ul seria recebida de forma muito positiva pela população local, podendo desta forma contribuir para a preservação, por via da instrução da população, desse sítio, mas também de outros identificados no concelho. O espólio já recolhido do sítio arqueológico é variado (ALMEIDA E SILVA, 2013), o seu estado de conservação é razoável, mas a sua manutenção tem sido descurada. O apoio logístico aos visitantes no local poderia servir-se das infra-estruturas do PTM e existem nas proximidades hipóteses de alojamento, estando salvaguardadas várias das condições que elencamos anteriormente. A classificação do sítio esteve já em cima da mesa, mas não chegou a avançar (ALMEIDA E SILVA, 2013, p. 50). Mais problemáticas 17

poderiam ser as questões de ordem financeira e de pessoal, mas que seriam contornadas com uma verdadeira aposta nesta área. No entanto, antes de partir para a musealização do sítio propriamente dita, importa reflectir sobre o que será necessário fazer previamente para que tal seja possível ou, como refere Olga Matos, estabelecer uma série de etapas necessárias à execução do projecto, nomeadamente “estudo do local, processos de classificação e protecção, limpeza e conservação in situ, políticas de intervenção e interpretação, gestão e manutenção, divulgação e técnicas de comunicação, condições de acolhimento e meios logísticos e, finalmente, sinalização e acessibilidades.” (MATOS, 2008, p. 36). Em primeiro lugar surge-nos o estudo do local. Actualmente, o sítio encontra-se parcialmente escavado e estudado o que não é suficiente para um projecto de musealização de larga escala, mas poderá ser aproveitado como motor de um projecto. Ficou demonstrado que duas ou três sondagens podem elucidar-nos sobre a ocupação do sítio, mas que uma descoberta ou estudo mais aprofundado de materiais pode alterar significativamente essa interpretação. Assim, a nossa proposta ia no sentido de prosseguir trabalhos arqueológicos, de forma mais continuada, com recurso aos meios da autarquia e à contratação de uma pequena equipa, à qual, num determinado período do ano, se poderiam associar as universidades e outros voluntários locais. Consequentemente, o estudo de materiais seria feito, com a missiva de preparação de conteúdos para um centro interpretativo. Quanto à classificação e protecção, uma vez que a classificação se trata de um processo burocrático, o mesmo deveria ter início a fim de juridicamente se proteger o sítio. No entanto, outras formas de protecção poderiam ser implementadas. O Castro encontra-se referenciado como sítio arqueológico no PDM de Oliveira de Azeméis (Nº11), cujo regulamento prevê que as intervenções em sítios e áreas de sensibilidade arqueológica estão sujeitas a parecer relativo ao acompanhamento pelos serviços municipais e ainda que, caso ocorram vestígios arqueológicos, todas as intervenções que impliquem revolvimento de solo serão suspensas (MOA, 2013, p. 26-27). No

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entanto, apenas este regulamento está disponível online13, já que a planta de ordenamento e de salvaguardas patrimoniais não está disponível, à data, no link indicado. Para consultar então remotamente as áreas de sensibilidade, resta aos cidadãos acederem ao Portal Geográfico do município, cujo software é ligeiramente complexo e problemático. Considerando que os interesses da protecção do sítio visam, em primeira instância, os proprietários, teria que ser melhorada a forma como se disponibiliza a informação. Apenas aquando da consulta pública do referido PDM foi disponibilizada uma listagem de sítios e áreas de sensibilidade arqueológica, que actualmente já não está disponível. Pelas situações vividas no concelho14 é evidente que a simples presença no PDM não basta para proteger um sítio arqueológico. A solução para esta questão e que ajudaria a proteger o povoado divide-se em duas linhas: a publicação de uma carta arqueológica e a identificação e notificação dos proprietários de terrenos onde se encontrem sítios e áreas de sensibilidade arqueológica. No que concerne à publicação de uma carta arqueológica, apesar de termos consciência que rapidamente poderiam surgir novos sítios, a publicação da mesma tornava a informação mais acessível já que a carta arqueológica é um mecanismo de inventário de bens móveis e imóveis, com a implantação rigorosa dos sítios, tendo em vista a sua salvaguarda, estudo e valorização e ainda visa “divulgar o património arqueológico e sensibilizar a comunidade para a sua importância” (SILVA, 2005, p. 89). Numa segunda dimensão, a notificação dos proprietários permitiria sensibilizá-los, sem alarmismo, para a importância dos terrenos que possuíam, mas, em última análise, também responsabilizá-los pela destruição de vestígios caso tal viesse a acontecer. Relativamente à limpeza do sítio e dos seus acessos, a situação actualmente vivida no local (fig.21 e 22) deixa bastante a desejar, pelo que deveria, mensalmente, proceder-se à limpeza de vegetação do sítio arqueológico e acessos necessários. Numa fase mais avançada do projecto de valorização do sítio, essa manutenção relacionada 13

http://www.cmoaz.pt/urbanismo.359/planos_municipais_de_ordenamento_do_territorio.532/plano_director_municip al_-_pdm.534/novo_pdm.a899.html (13/06/2016) 14 Relembramos a situação registada em 2013 no Castro de Ossela, mas também situações ocorridas no Castro de Recarei (S. Martinho da Gândara) e Castro Calbo (Cesar),onde o plantio de eucaliptos destruiu vestígios arqueológicos, tendo colocado à superfície inúmeras quantidades de materiais cerâmicos. Em ambos os casos, as plantações foram concluídas e não houve qualquer sanção aos proprietários, apesar do que se enuncia no regulamento do PDM.

19

com

o

crescimento

de

vegetação,

deveria

ocorrer

mais

frequentemente

(quinzenalmente). Estas limpezas teriam que considerar também as áreas que não apresentem estruturas e ter em conta que os proprietários dos terrenos, numa fase inicial, deveriam ser alertados para a situação. No campo da conservação in situ, defendemos que as estruturas que viessem a ser encontradas, além das que já estão a descoberto, fossem alvo de trabalhos de conservação (fig.15). Houve uma tentativa de o fazer recentemente, tendo havido substituição de argamassas. O resultado visual não foi do agrado da maioria dos visitantes do sítio, mas também se constatou que, do ponto de vista da eliminação de fungos, o objectivo não foi alcançado15 (fig.23). Neste campo seria necessário contactar uma empresa ou técnico especialista para avaliar o estado actual das ruínas e operar as acções necessárias. O mesmo técnico deveria ser contactado após a descoberta de novas estruturas se tal se justificasse. A forma de intervenção no sítio e a interpretação dada pelos arqueólogos é fundamental para o sucesso do projecto de valorização do sítio, uma vez que para o público geral são grandes “as dificuldades de compreensão e leitura das áreas arqueológicas” (MATOS, 2008, p. 36). É também esta dificuldade de compreensão que muitas vezes justifica o projecto de valorização, pois sem ele, para a maioria das pessoas, não é possível compreender o sítio arqueológico – “é esta ininteligibilidade da estrutura arqueológica que conduz a uma forte necessidade de interpretação e apresentação, transformando e descodificando significados que estão muito para além do conhecimento do público” (MATOS, 2008, p. 36). No caso do Castro de Ul, não se coloca a questão da reutilização dos espaços, como noutros locais, mas levantam-se as questões ligadas à intervenção e restauro a efectuar. Numa fase mais avançada do projecto, as reconstituições devem surgir, adoptando soluções sobretudo digitais. A acção que propomos sobre as ruínas é mínima, visando sobretudo a sua conservação e preservação, à semelhança dos Castros de Romariz ou da Citânia de Sanfins (excluindo para já a reconstituição do núcleo habitacional). Assim sendo, a nossa proposta inclui-a a representação do sítio num modelo 3D, estando colocado num painel dos que se encontrariam a acompanhar 15

Estas informações foram recolhidas numa conferência sobre o Castro de Ul, em 2014 e ainda por nós próprios em conversas com visitantes do sítio.

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o percurso da visita. A vantagem de optar por este método é sobretudo a da reversibilidade, embora apresentasse custos menos elevados do que a reconstituição física, esta opção pela reconstituição gráfica permitiria a alteração do modelo, se tal fosse necessário. As mesmas reconstituições deveriam constar no folheto de apoio à visita e no Centro Interpretativo, proposta que desenvolveremos adiante, sem, no entanto, promover grandes especulações. A presença de reconstituições de estruturas e de ambientes tenta reevocar a imagem original do sítio, das suas funções, significados e características (MATOS, 2008, p. 37). Os modelos propostos seriam trabalhados e discutidos no seio de uma equipa multidisciplinar, respeitando a autenticidade e integridade do sítio, mas garantindo a reversibilidade e a clara percepção do vestígio original vs reconstruído. A interpretação em si deve ser vista como “um processo de explicitação ao visitante do significado do sítio ou objecto, aumentando as vantagens da visita e facilitando a compreensão da herança cultural e ambiente, ao mesmo tempo que possibilita uma atitude receptiva relativamente à conservação” (MATOS, 2008, p. 38). No processo de construção das interpretações do sítio não pode ser ignorada a perspectiva educacional e didáctica que deve até norteá-lo. A interpretação dada, conjugada com as reconstituições, deve evocar as imagens e o significado do sítio arqueológico, apostando sobretudo na tecnologia disponível. Defendemos que seja criado um Centro Interpretativo do Castro de Ul, que poderia situar-se em dois locais: ou num moinho dos que existem nas proximidades, ou numa das casas, sitas à entrada do povoado, desabitadas. Qualquer um dos espaços deveria ser reabilitado e adaptado às necessidades do Centro Interpretativo. Deveria iniciar-se nele a visita ao povoado. Mediante a gestão que fosse adoptada, sempre com apoio municipal, mas que poderia ser integrada na associação que gere o PTM, na própria câmara municipal, ou ainda através da constituição de uma associação similar à que gere o PTM, deveriam ser procurados apoios financeiros, também, junto dos industriais do concelho, mas em particular, das indústrias que laboram em Ul. O local deveria ter um preço de acesso simbólico e estar-lhe associado um arqueólogo permanente. Outros serviços poderiam ser contratados ou, mediante o modelo de gestão adoptado, usar os recursos municipais, nomeadamente para limpezas de mato. O centro interpretativo deveria ter além da bilheteira, uma pequena loja para venda 21

de produtos locais e merchandising do sítio. Deveria ser criada uma marca para o povoado e serem produzidos alguns materiais como lápis/canetas, borrachas, blocos, t-shirts, etc. Além disso, deveria ser colocada à venda uma pequena monografia do sítio e outras publicações relacionáveis com ele ou com a região onde se insere o próprio sítio. Quanto aos conteúdos do centro interpretativo, deveria ser criada uma pequena exposição alusiva ao local sobretudo com recurso a uma maquete do povoado, alguns painéis informativos, apostando na informação gráfica como desenhos e modelos digitais. Uma das componentes do centro deveria ser um pequeno vídeo, como em muitos locais existe, que permitisse integrar o sítio na paisagem e levar os visitantes numa viagem no tempo. O discurso deste vídeo deveria estar adaptado ao público mais jovem, tornando-se assim transversal. O centro poderia ainda ter disponível um conjunto de equipamentos que permitissem aos visitantes um acompanhamento auditivo durante a visita ao povoado, pelo menos em português e inglês. A exposição devia ser ainda complementada com alguns materiais arqueológicos, que representassem as diferentes épocas de ocupação do sítio, remetendo depois os visitantes para a colecção da Casa-Museu Regional de Oliveira de Azeméis16. O centro deveria ter em conta as funções de auxílio à interpretação das ruínas e dos seus objectos, informar sobre eles e permitir uma leitura desses elementos a todo o tipo de públicos. A aposta passaria por um discurso de divulgação, havendo elementos (como folhetos e publicações), mais científicos para outros tipos de público, num centro sobretudo interactivo. O centro devia ter ainda um espaço para apoio aos trabalhos de escavação, com armazém para as ferramentas, reserva/depósito de materiais e ainda um local que permitisse o tratamento de materiais (lavagem e marcação dos mesmos). Um ponto importante seriam também os serviços educativos que poderiam desenvolver actividades de forma a atrair os visitantes, mesmo que já tenham visitado o sítio (recriações históricas, peças de teatro, arqueólogo por um dia, entre outras). A própria envolvência da comunidade nos trabalhos arqueológicos (voluntariado, dia aberto) seria uma boa forma de captar público futuro, sem esquecer que “existe um desconhecimento, praticamente integral,

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No âmbito do Plano Municipal da Cultura, que já referimos anteriormente, foi também mencionada a falta de um Museu Municipal. Caso o museu viesse a ser criado, os visitantes do Castro poderiam ser também reencaminhados para o local.

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por parte da comunidade local, do valor cultural dos bens arqueológicos descobertos e, para que a valorização destes bens possa acontecer, o estímulo à consciencialização deve começar pela própria comunidade local.” (GHOTTI, p. 1) Quanto às visitas ao sítio, partindo do centro interpretativo, podiam sugerir um percurso em circuito. Aos visitantes seria fornecido um folheto que permitiria a sua localização espacial, sendo o mesmo acompanhado por placas orientadoras e painéis informativos (ricos sobretudo em imagens). Se tal fosse possível, o percurso poderia tentar recriar os caminhos do antigo povoado. Deveria estar ainda disponível a orientação da visita por um guia, sendo essa sujeita a marcação, tendo em conta a gestão de pessoal que seria necessária. Numa fase mais avançada, estando o centro já implementado, o sítio deveria ser adaptado para eventos e visitas nocturnas, com recurso a iluminação artificial. Nas duas áreas escavadas, foram colocados dois painéis informativos (fig.24 e 25). Parece-nos que sobretudo que o discurso adoptado não corresponde ao de maior inteligibilidade para todas as pessoas. Os recursos gráficos usados também não ajudam à interpretação visual das ruínas. Já o suporte em que foram colocados os painéis, em madeira, apresenta já alguma degradação. Sendo assim, a implementação dos painéis teria que se feita noutro tipo de suportes ou, obviamente, fazê-lo de forma a que a sua manutenção vá sendo assegurada. Quanto ao tipo de informação a passar, como referimos, a actual não nos parece adequada na sua totalidade, pelo que o discurso teria que ser mais reduzido e simplificado, integrando também referências à localização do sítio no próprio itinerário, permitindo a orientação dos visitantes. Quanto às imagens, somos da opinião que deveriam permitir a leitura e interpretação das ruínas, apresentando também modelos de interpretação tridimensional. Já no que respeita à gestão e manutenção do sítio, há que ter em conta que é um conjunto de matérias de extrema importância para o sucesso do projecto de valorização. Por um lado, o sítio tem que ter a capacidade de atrair visitantes, mas também tem que ter a capacidade de os controlar. Não nos parece que se coloque, neste caso, um claro problema de “turismo de massas”, no entanto, em períodos de maior fluxo de visitantes, deve ser feito esse controlo por forma a evitar danos para o património arqueológico.

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Como propusemos anteriormente, a gestão do sítio poderia passar por um modelo autárquico ou pela integração do mesmo no PTM, pois equipamentos como casa de banho e bar estão já criados nesse espaço, não se justificando a duplicação dos mesmos. Caso tal não fosse possível, a gestão do sítio poderia assentar na criação de uma associação, o que no entanto aumentaria as despesas, em particular com pessoal. A equipa teria que ser composta por um arqueólogo e um técnico administrativo, articulando-se depois com o gabinete de arqueologia do município, mas também com o pessoal do ambiente, topografia, entre outros, pois a constituição de grupos interdisciplinares seria uma clara mais-valia para a gestão do local. Estando asseguradas as questões de segurança durante o dia, para complementar no período nocturno, o espaço deveria estar (as infra-estruturas e acessos) sob vigilância através de câmaras. Se, num determinado período do ano o responsável poderá estar mais centrado no seu trabalho de campo, alturas há em que poderá desenvolver actividades educativas e materiais de divulgação do sítio. O espaço deveria apresentar ainda um programa de avaliação/monitorização da satisfação do público. Como nos refere Matos (2008, p. 39), cabe efectivamente ao responsável assegurar a manutenção do sítio – “O combate à invasão de ervas e arbustos infestantes, a limpeza e recolha de lixos, a verificação do estado das próprias ruínas, dos painéis e placas interpretativas, a vedação, a sinalização, o estado dos caminhos e as orientações do percurso”. Estando o projecto cimentado, não se pode ignorar que necessitará de um programa que o torne dinâmico, pois vários projectos de valorização foram já implementados, sem garantir a divulgação e manutenção do sítio, sem uma equipa de trabalho e sem a integração do local num circuito de visita, sendo conduzidos ao insucesso (MATOS, 2008, p. 40). A divulgação e comunicação do sítio e sobre ele são também pontos-chave dum projecto de valorização e são determinantes para o sucesso ou insucesso do projecto. Há que primeiramente definir o público-alvo, ajustando depois a informação que deve ser expressa e o circuito de difusão da mesma. É fundamental que a comunicação do sítio permita estabelecer um diálogo com o visitante, despertando a sua curiosidade. Como já referimos, quando desenvolvemos a criação de um centro interpretativo, a linguagem deve ser sempre adequada ao público, sem nunca excluir um público mais jovem ou mais velho; mais erudito ou menos erudito. “Há que dar coerência a um 24

discurso comunicacional, (…), de forma a permitir as indicações precisas sobre as estruturas, datações e funcionalidades, deixando, eventualmente, como complemento, as designações técnicas e científicas e uma perspectiva, ainda que somente parcelar, dessas estruturas.” (MATOS, 2008, p. 41). Este objectivo alcança-se, por exemplo, com conteúdos (filmes, desdobráveis, publicações) adaptados aos determinados tipos de público (local, escolar, turista nacional/estrangeiro, investigadores). Nos conteúdos gerais deve aplicar-se uma “linguagem simples, clara, concisa, pouco técnica, e numa comunicação directa, pessoal e íntima, intuitiva e não verbalizável” (SOEIRO, 1998 apud MATOS, 2008, p. 41). Além da perspectiva de transmissão de conhecimento sobre o sítio, deve ser fornecida informação sobre os comportamentos dos visitantes que têm incidência na segurança e conservação das ruínas arqueológicas. Um dos aspectos também a considerar é o do papel do visitante na avaliação dos sítios arqueológicos. A distribuição de um inquérito de satisfação permite auscultar a opinião dos visitantes sobre o sítio e perceber também o que os levou até lá. Damos como exemplo o caso de Tróia, em que no final da visita era pedido ao visitante o preenchimento de um questionário, onde este indicava o seu grau de satisfação, mas também o que o tinha levado à visita ou até poderia deixar o seu contacto para estar sempre a par das actividades desenvolvidas nas ruínas. Parece-nos que esta é uma solução de grande validade, apostando em perguntas semi-abertas, dando margem a quem quisesse registar algumas sugestões, mas não obrigando a que fosse redigido qualquer texto. Este tipo de questionário permite saber ainda as motivações da visita e o tipo de público, mas também criar uma ponte com o visitante e mantê-lo actualizado no futuro. Periodicamente deveria existir uma reunião em que tais dados fossem discutidos, tendo em vista a melhoria dos serviços prestados. No entanto, a inclusão do Castro de Ul num programa como o HERITY (Sistema Global de Avaliação), seria uma mais-valia, não só para a avaliação do sítio, como para a sua divulgação. Este sistema assenta em quatro áreas: valor, conservação, informação e serviços. O sistema tem um mecanismo de avaliação que envolve os gestores do sítio, os avaliadores do HERITY e o próprio público (OOSTERBEEK, 2008, p. 142). Este autor reconhece ainda no sistema a utilidade para o visitante, pois fornece informação prévia; para os gestores, pois identifica as áreas a melhorar; e ainda para os agentes financiadores, pois ficam munidos de uma base rigorosa para canalizarem os seus 25

investimentos. O facto do programa ser reavaliado de três em três anos, obriga a que o sítio se mantenha dinâmico. O HERITY é pois um “mecanismo de acreditação, mas também uma forma de contribuir para a valorização e difusão do património” (OOSTERBEEK, 2008, p. 143). A divulgação é outro ponto-chave da valorização dos sítios arqueológicos – não se visita, nem se preserva, aquilo que não se conhece. A divulgação pode ocorrer em vários níveis. Um deles, já o sugerimos, com a criação de folhetos informativos, para os diferentes tipos de público, com linguagem adequada e clara e um visual apelativo, sem esquecer as informações sobre a localização do sítio e os contactos fundamentais. Além da sua distribuição no Castro de Ul, aos visitantes, estes folhetos deveriam ser distribuídos junto de unidades hoteleiras na região, de agências de viagem, bem como junto de outros equipamentos culturais e associações locais. A aposta na internet é fundamental, quer através da criação de um site, quer através das redes sociais. Estes espaços devem apresentar-se atractivos do ponto de vista da imagem, mas também com uma linguagem clara e pouco maçadora, onde seja fácil encontrar todo o tipo de informações, para os mais diversos tipos de público. Um site permite alojar os mais diferentes tipos de recursos, inclusivamente algo como uma viagem virtual pelo sítio, que pudesse despertar a curiosidade das pessoas. Os mecanismos de divulgação municipal deveriam também ser utilizados em prol da divulgação primária do projecto de valorização. É fundamental apostar em diversas formas de propaganda, de preferência utilizando conhecimentos específicos da publicidade e marketing, para alcançar o maior número de pessoas, sem esquecer os critérios de rigor e qualidade. Ao longo da nossa abordagem já nos referimos em parte a outro ponto importante dum projecto de valorização, as condições de acolhimento e meios logísticos disponíveis para os visitantes. Matos (2008, p. 42) refere que no caso da instalação de um centro interpretativo, é necessário existir sanitários, balcão de atendimento, venda de publicações e lembranças, bilheteira, bar e parque para viaturas. Conforme enunciamos antes, a musealização do Castro de Ul deveria ser acompanhada pela criação de um centro interpretativo para o qual fornecemos duas localizações. A localização escolhida condicionaria também a quantidade de outras infra-estruturas que seriam necessárias, uma vez que se se optasse pela localização do centro no complexo do PTM, o mesmo dispensava a construção de sanitários que já 26

existem, caso contrário, esta seria a única infra-estrutura a incluir no centro que descrevemos anteriormente. Pela distância ao bar do PTM não se justifica a duplicação do mesmo, embora pudesse ser considerada a colocação de uma máquina de venda automática, considerando os meses mais quentes e a necessidade de hidratação de todos os utilizadores do Castro de Ul. Quanto ao parque de estacionamento, existe um junto ao PTM e há vários lugares de estacionamento no largo do Souto, junto ao Castro de Ul, bastando apenas sinalizar os mesmos de forma conveniente. Todas as outras valências seriam concentradas num átrio do Centro Interpretativo. Para terminar, o último ponto a ter em conta para a execução do projecto de valorização do Castro de Ul prendia-se com a sinalização e acessibilidades. Quanto às acessibilidades, para chegar ao Castro não se verificam grandes problemas, mas apenas de transporte particular. O comboio não é uma alternativa, pois a estação da CP está desactivada e mesmo que não estivesse situa-se demasiado longe do Castro de Ul. No entanto, somos da opinião que nos meses de maior intensidade turística e, eventualmente, aos fins-de-semana, poderia ser efectuado um serviço de transporte de passageiros, pela empresa que gere os transportes urbanos da cidade, partindo do centro de Oliveira de Azeméis. Por outro lado, no que concerne à própria acessibilidade ao sítio, nos casos de locomoção reduzida, seria de criar pelo menos um acesso que garantisse essa possibilidade, apesar de ser necessário considerar que todos os acessos ao Castro, como e natural neste tipo de sítios, apresentam rampas com alguma inclinação. No que concerne à sinalização, deveria ser colocada maior número no centro da cidade, indicando Ul e não apenas o Castro de Ul, mas acompanhada da cor e simbologia representativa de ruínas. Já em Ul, às placas que indicam o PTM deveria ser acrescentado então o Castro de Ul. Ficariam

assim

salvaguardadas

as

diversas

fases

do

processo

de

valorização/musealização, sabendo que após este processo seria necessária uma clara aposta na manutenção do sítio, das infra-estruturas, das plataformas de divulgação e da própria sinalética.

Parece-nos que vale ainda a pena referir, de uma forma sucinta, uma série de actividades que podiam propiciar o interesse pelo sítio arqueológico em particular, antes da implementação do projecto de valorização, durante a sua implementação e 27

também depois de já se encontrar totalmente concluído. O conjunto de actividades que propomos teriam públicos-alvo diversos e podiam sensibilizar a comunidade local para a protecção deste e de outros sítios; cativar o público escolar para a importância da arqueologia e captar fluxos turísticos para o sítio. Apesar de ao longo do texto termos já referido algumas situações e actividades que seriam importantes desenvolver, outras há igualmente importantes, considerando que “cabe hoje a quem investiga um local, um território e uma comunidade, do ponto de vista museal, um papel pedagógico só possível de concretizar de portas abertas, fora e dentro dos limites físicos de cada instituição.” (PESSOA et al., 1999, p. 161-162). O projecto de valorização do Castro de Ul deveria ser acompanhado de um projecto paralelo de divulgação e sensibilização junto do público escolar. O “CUL vai à escola” seria, por exemplo, um projecto em que se dava a conhecer o sítio de uma forma divertida – o acrónimo CUL (Castro de Ul) permite um paralelismo com a palavra inglesa cool. Seria um projecto como o desenvolvido pelo IPHAN, no Brasil, de educação patrimonial, sob o nome Conhecer para preservar – Preservar para conhecer (CARVALHO et al., 2010, p. 76). A questão a que já nos referimos da criação de uma carta arqueológica e da notificação dos proprietários seria também outra via para a sensibilização da população. Uma outra forma de envolver a comunidade passaria por contactar os residentes no lugar do Crasto, a fim de recolher as suas memórias sobre os trabalhos antigos, as lendas e outras informações sobre o sítio, quer orais, quer materiais. A partir disso, seria possível criar um pequeno vídeo, fazendo com que as pessoas sintam o sítio como seu e não como um problema ou perturbação das suas vivências. Por outro lado, a criação de vários itinerários seria uma grande ajuda para quem quisesse visitar Ul, mas não só. Um deles deveria ser à escala local – Oliveira de Azeméis de ontem, hoje e amanhã. Neste itinerário deveríamos enquadrar pontos que representassem todos os períodos da história do concelho e dos diversos tipos de património. Ao Castro de Ul, seria associado o PTM, mas também equipamentos como o Berço Vidreiro e o Parque de La-Salette, a Casa-Museu Regional de Oliveira de Azeméis e a Casa-Museu Ferreira de Castro, entre outros sítios que poderiam ser apresentados como opção para o roteiro. 28

Numa escala regional, Oliveira de Azeméis deveria articular-se em duas linhas, quer com os municípios do Entre Douro e Vouga (EDV), quer com os municípios do Turismo do Porto e Norte de Portugal (TPNP). O roteiro do EDV deveria incluir a visita a sítios arqueológicos e museus com colecções de arqueologia ou de arqueologia da região. Já o roteiro do TPNP deveria ser mais específico, apresentando apenas outros Castros, por exemplo. Poderiam também ser criados programas interactivos entre os diversos sítios, nacionais ou internacionais, com a Galiza por exemplo, como a campanha “Todos os caminhos vão dar a Roma” (PESSOA et al., 1999, p. 165). A criação de uma dinâmica tipo “Peça do Mês” é também uma acção que se tem mostrado produtiva noutros locais. Quanto a actividades a realizar no sítio arqueológico, seria de considerar actividades de arqueologia experimental, que cada vez mais são um atractivo dos mais diversos tipos de público aos sítios arqueológicos. Numa outra escala, menos científica e mais popular, seria de considerar a realização de uma recriação história anual ou bianual. Em termos de reconstruções históricas, o Centro de Provas Gastronómico seria um auxílio para, por exemplo, se experimentarem receitas romanas ou castrejas. Outro tipo de eventos como espectáculos variados (cinema ao ar livre, teatro, comemorações de datas ligadas ao sítio) seriam também linhas de trabalho importantes. Algumas actividades ligadas ao ambiente ou à astronomia poderiam também captar públicos diferentes, mas não menos interessantes A abertura dos trabalhos arqueológicos à comunidade, através de um dia aberto, em que as pessoas vissem os arqueológos a trabalhar, mas também através da integração de voluntários nos trabalhos de campo, seriam questões a considerar. A visita ao próprio laboratório do Centro Interpretativo, em determinadas alturas do ano, poderia também potenciar o alargar de horizontes dos visitantes. Eventos como caminhadas (Caminhadas pelo Património) ou peddy-papers, já realizados, mostraram ser um sucesso, mesmo sem o sítio ter as ideais condições de visita. Sugerimos também a criação de uma marca para os produtos de venda do Castro, mas que também envolvesse outro tipo de produtos, nomeadamente 29

industrias como o arroz, ou empresas como a Caravela (Cafés) e os seus pacotes de açúcar, a própria Lactogal, entre outras empresas que laborem em Ul e possam efectuar parcerias com o sítio. Por outro lado, a envolvência da comunidade, por exemplo através da venda de artesanato com a marca do sítio, além de potenciar a economia, aumenta a relação da comunidade com o sítio arqueológico. As conferências destinadas à população local, para que se apresentem resultados dos trabalhos, mas também colóquios de âmbito mais alargado e que fomentem a discussão científica seriam também enriquecedores. Num outro campo há ainda a necessidade de publicar informação actualizada sobre o sítio, por exemplo com os resultados anuais das campanhas, ou com as actas de colóquios e conferências a realizar, mas também sem esquecer a edição de literatura infantil, para alcançar um nicho importante dos visitantes. Enfim, haverá um sem número de actividades a realizar, que envolvam a comunidade, captem público diversificado e traduzam em sucesso um projecto de valorização como o que aqui propusemos.

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Conclusão

No decorrer deste trabalho desenvolvemos as problemáticas relacionadas com a valorização/musealização e preparação turística do sítio arqueológico do Castro de Ul, Oliveira de Azeméis. Ficou demonstrado que os critérios estabelecidos para a escolha dos sítios a musealizar nem sempre é unanime, mas parece-nos que o Castro de Ul, de um modo geral e pelos argumentos que desenvolvemos, possui as características necessárias para esse efeito. Verificou-se ainda que este tipo de projectos necessita de um enorme planeamento, mas também de uma grande manutenção. O seu início passa sempre pelos trabalhos de investigação de que o sítio foi alvo, envolvendo uma equipa interdisciplinar. A comunicação é fundamental, quer para divulgar o sítio, quer pela inteligibilidade do mesmo junto dos seus visitantes. Debatemos ainda uma série de problemáticas das estruturas que consideramos necessárias para a execução do projecto, assim como para a gestão do próprio sítio, bem como sugerimos uma série de actividades a realizar para manter vivo e protegido o Castro de Ul.

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Bibliografia ALMEIDA E SILVA, S. (2013) – O Castro de Ul, Oliveira de Azeméis: Contributo para o conhecimento da ocupação proto-histórica entre os rios Douro e Vouga. Dissertação de Mestrado apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto. AREDE, J. (1951) – Santa Maria de Ul. Arquivo do Distrito de Aveiro. Vol. XVII; p. 193 – 234. BASTOS, M.; VIDAL, A. e DIAS, J. (2001) – Os Ambientes Costeiros e o Homem: novos dados sobre a constituição da laguna de Aveiro. Actas do I Congresso do Quaternário de Países de Línguas Ibéricas. Lisboa, p. 182-185. CARVALHO, G. (1946) – Estudo das Formações Geológicas do Distrito de Aveiro. Arquivo do Distrito de Aveiro. Vol. XII, nº48, p. 313 – 322. CARVALHO, S.; LUINDIA, L.; AGUIAR, L. (2010) – O desafio da educação patrimonial arqueológica como base para uma consciência cultural e turística. Revista Eletrônica Aboré. Manaus: Escola Superior de Artes e Turismo de Manaus. CASTRO, M. (1987) – Curiosas insculturas rupestres no Castro de Ul. Actas I Jornadas de História e Arqueologia do Concelho de Arouca (26-28 Setembro 1986). Arouca, p. 39 – 46. GHOTTI, N. (S/D). Turismo Arqueológico: Perspectivas para a preservação do Patrimônio cultural e para a valorização social. GONÇALVES, A. (1981) – Inventário Artístico de Portugal, Aveiro Norte. Lisboa: Academia Nacional de Belas Artes. GRANJA, H. (2002) – Reconstituição paleoambiental da zona costeira, a Norte da laguna de Aveiro, desde a Idade Média à actualidade. Actas do Seminário O litoral em perspectiva histórica (séc. XVI – XVIII). Porto: Instituto História Moderna, p. 93-109. Grupo de trabalho da cultura do Município de Oliveira de Azeméis (2013). Plano Municipal da Cultura Vol. 1. Oliveira de Azeméis: Município de Oliveira de Azeméis. LEAL, Pinho (1882) – Portugal Antigo e Moderno. Vol. X. Lisboa. MARQUES, J. (1989) – Escavações no Castro de Ul (Oliveira de Azeméis) Primeira Notícia. Separata do volume IV da Revista de Ciências Históricas. Porto: Universidade Portucalense Infante D. Henrique, p. 65-89.

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Webgrafia

http://www.cmoaz.pt/noticias.6/turismo.23/ul_classificada_%25c2%25abaldeia_de_portugal%25c2% 25bb.a2744.html (Visto em 23/05/2016) http://www.cmoaz.pt/urbanismo.359/planos_municipais_de_ordenamento_do_territorio.532/plano_ director_municipal_-_pdm.534/novo_pdm.a899.html (Visto em 13/06/2016)

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ANEXOS

Fig. 1 – Localização do concelho de Oliveira de Azeméis.

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Fig. 2 - Castro de Ul no Google Earth. Localização das áreas intervencionadas em escavação. (Fonte: ALMEIDA E SILVA, 2013, Est. II.)

Fig. 3 – Placas de sinalização dos acessos ao Castro de Ul. Junho de 2016.

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Fig. 4 – Modelo de implantação 3D, obtido através de arcscene, do esporão onde se localiza o Castro de Ul e respectiva área envolvente. (Fonte: ALMEIDA E SILVA, 2013, Est. V)

Fig. 5 – Bacia de visão do Castro de Ul. (Fonte: ALMEIDA E SILVA, 2013, Est. II)

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Fig. 6 – O PTM visto de uma das encostas do Castro de Ul. Dezembro de 2012.

Fig. 7 – Planta do sector nascente do Castro de Ul. (Fonte: MARQUES, 1989, p.76)

Fig. 8 – Planta do sector poente do Castro de Ul. (Fonte: MARQUES, 1989, p. 78) 38

Fig. 9 – Planta provisória do sector C. (Fonte: MARQUES, 1986)

Fig. 10 – Sector onde se implanta a muralha. Maio de 2008.

Fig. 11 – Sector onde se implanta a muralha. Dezembro de 2012.

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Fig. 12 – Sector onde se implanta o lajeado. Dezembro de 2012.

Fig. 13 – Convite da CasaMuseu Regional para a visita à exposição

Fragmentos

do

Castro de Ul que se adaptou

Fig. 14 – Peddy-Paper no Castro de Ul. Actividade destinada a Crianças e jovens de Ul. Fevereiro de 2014. (Foto: Daniel Ferreira)

para o evento Noite Branca. Setembro de 2013.

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Fig. 15 – Pormenor da estrutura habitacional após os trabalhos de conservação. Dezembro de 2013

Figs. 16 e 17 – Áreas escavadas em 2014 e 2015. Junho de 2016.

Figs. 18, 19 e 20 – Pormenores da Sala de arqueologia, em preparação na Casa-Museu Regional de Oliveira de Azeméis.

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Fig. 21 e 22 – Aspecto do sítio arqueológico e respectivos caminhos. Junho de 2016.

Fig. 23 – Pormenor da argamassa colocada no Castro de Ul, onde se pode ver o desenvolvimento de fungos. Junho de 2016.

Fig. 24 – Painel junto à zona da muralha, cujo suporte apresenta já algumas fragilidades. Junho de 2016. 42

Fig. 25 – Painel de apoio à Rota do Castro, colocado junto do sector do lajeado. Neste painel são reproduzidos desenhos de Maia Marques, um dos quais encontra-se incompleto, pois não é feito todo o levantamento decorativo da cerâmica, situação para a qual tínhamos alertado em 2013. Junho de 2016.

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