O Tráfico de Seres Humanos para exploração Sexual. Estudo sobre Discursos Mediáticos e Representações Sociais

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ABRIL DE 2016

O TRÁFICO DE SERES HUMANOS PARA EXPLORAÇÃO SEXUAL ESTUDO SOBRE DISCURSOS MEDIÁTICOS E REPRESENTAÇÕES SOCIAIS JÚLIA TOMÁS

Júlia Tomás

O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

Índice Siglas .............................................................................................................................................. 2 Introdução ..................................................................................................................................... 3 1. Sobre o tráfico de seres humanos........................................................................................... 10 1.1 A polémica sobre o tráfico de escravas brancas (de 1880 a 1949) ............................. 11 1.2 A evolução dos mecanismos jurídicos após a Segunda Guerra Mundial.................... 29 1.3 Tráfico de pessoas e auxílio à imigração ilegal ............................................................ 38 1.4 O Código Penal Português e o Observatório do Tráfico de Seres Humanos .............. 42 1.5 O tráfico de seres humanos para exploração sexual no mundo ................................. 47 1.6 O tráfico de seres humanos em Portugal .................................................................... 55 2. Imaginários coletivos e representações sociais ...................................................................... 61 2.1 Sociologia do Imaginário: o monstruoso ..................................................................... 62 2.2 Representações sociais e rumores ............................................................................... 68 2.3 O mito cultural da escravatura branca ........................................................................ 76 2.4 Moral sexual e prostituição.......................................................................................... 86 2.5 Estigma e preconceito: o imigrante ............................................................................. 96 3. Discursos mediáticos portugueses ........................................................................................ 108 3.1 Plataforma de trabalho e métodos de investigação ................................................. 110 3.2 Análise da imprensa (tráfico de seres humanos) ...................................................... 112 3.3 Análise da imprensa (tráfico de seres humanos para exploração sexual) ............... 123 3.4 Resultados e conclusões ............................................................................................. 137 4. Comunicação social e ética jornalística ................................................................................. 139 4.1 Ética jornalística .......................................................................................................... 140 4.2 A responsabilidade social dos média ......................................................................... 148 4.3 Recomendações e boas práticas ................................................................................ 152 Conclusão .................................................................................................................................. 157 APÊNDICES ................................................................................................................................ 159 Apêndice I: Cronologia dos tratados internacionais relativos ao TSH ............................ 160 Apêndice II – Grelha de análise ........................................................................................ 162 Apêndice III: Lista das peças jornalísticas analisadas ...................................................... 163 Apêndice IV: Lista de algumas ONG portuguesas............................................................ 178 Lista das figuras, tabelas e gráficos ........................................................................................... 181 Referências bibliográficas ......................................................................................................... 185

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Siglas APF – Associação para o Planeamento da Família CAP – Centro de Apoio e Proteção das Vítimas do Tráfico e seus Menores DIAP – Departamento de Investigação e Ação Penal EUROPOL – Serviço Europeu de Polícia GNR – Guarda Nacional Republicana GRETA – Grupo de Peritos sobre a Luta contra o Tráfico de Seres Humanos do Conselho da Europa ISS – Instituto de Segurança Social FRA – Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia MAI – Ministério da Administração Interna OI – Observatório da Imigração (em Portugal) OIM – Organização Internacional para as Migrações OIT – Organização Internacional do Trabalho ONG – Organização Não-Governamental OPS – Observatório Permanente de Segurança OSCE – Organização para a Segurança e Cooperação na Europa OTSH – Observatório do Tráfico de Seres Humanos PJ – Polícia Judiciária PSP – Polícia de Segurança Pública RAPVT – Rede de Apoio e Proteção à Vítima de Tráfico SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras SSI – Sistema de Segurança Interna UE – União Europeia UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância UNODC – Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime UN.GIFT – Iniciativa Global das Nações Unidas para lutar contra o Tráfico de Seres Humanos

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Introdução

O tráfico de seres humanos (TSH) é analisado em Portugal, desde 2007, através de um sistema de monitorização criado pelo Observatório Permanente de Segurança. Este roteiro é ainda novo mas os procedimentos metodológicos para referenciar o TSH são válidos e sem dúvida contribuem para uma melhor compreensão desta realidade social. O reconhecimento cívico-político das vítimas é progressivo mas a discriminação ainda se faz sentir. As vítimas são geralmente consideradas como imigrantes clandestinas antes de serem vítimas, o que conduz à exclusão social. Este problema põe em evidência estereótipos racistas e pânicos morais infundados que devem ser combatidos através da difusão do conhecimento científico social. Segundo o Relatório global sobre o tráfico de pessoas do Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC), a luta contra o tráfico é dificultada por uma falta de dados e por uma verdadeira negligência da parte dos governos (UNODC, 2009, pp. 6-7). Os Estados-Membros da União Europeia (UE) estão especialmente preocupados com o transporte clandestino facilitado pela abertura das fronteiras. Com efeito, a globalização do mercado económico facilita o fluxo migratório ilegal. Os protocolos da luta contra o tráfico põem em evidência a guerra contra o crime organizado através da punição e do controle da imigração. Ao enfatizar a atividade criminosa, a política internacional eclipsa a atenção dada ao trabalho forçado, tendo como consequência social direta uma carência de leis e projetos de apoio às vítimas da migração forçada. Ou seja, as violações dos Direitos Humanos não diminuíram com a legislação contra o TSH. O TSH tem vindo a aumentar devido a realidades associadas à migração populacional, à pobreza, à discriminação de género e de gerações, aos reduzidos níveis de escolaridade, à corrupção ou aos conflitos armados. O TSH reveste diversas formas de exploração tais como a exploração sexual e laboral, o tráfico de órgãos, a mendicidade por coerção, os casamentos de conveniência, as adoções ilícitas e o trabalho doméstico ilegal.

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Na época atual, a investigação científica na área do TSH revela-se um desafio merecedor de destaque nas agendas, política e social, a nível nacional e internacional. A vasta divulgação de informação é um imperativo para promover o progresso das políticas relativas à liberdade, à dignidade e à justiça. Porém, muitas informações são infundadas e sensacionalistas, resultando numa confusão conceitual, facilitando, por conseguinte, a discriminação relativa às vítimas. O aumento do número de notícias revela o crescente interesse pelo fenómeno, atingindo hoje (em 2015) uma grande visibilidade. No entanto, este protagonismo não traz consequências positivas para os imigrantes nem para os trabalhadores do sexo. Assim sendo, cingir-me-ei a expor uma análise crítica dos discursos mediáticos para salientar certas ideias, preconceitos e estereótipos relativos ao TSH para exploração sexual presentes na consciência coletiva. O objetivo do estudo é analisar as imagens veiculadas pela imprensa portuguesa relacionadas à sexualidade, ao género e à migração no contexto do TSH. Este trabalho defende o argumento de que o discurso mediático sobre o TSH para exploração sexual inclui um número relevante de “histórias moralísticas”1 que em pouco contribuem para o conhecimento público do fenómeno. Além disso, a cobertura jornalística apresenta traços discriminadores que perpetuam estereótipos e, por isso, desprezam o conceito mesmo de igualdade. Uma análise crítica dos discursos mediáticos é fundamental para obter uma imagem da recetividade da sociedade face ao TSH. A questão do tráfico de mulheres para exploração sexual tem as suas origens no século XIX. Emergiu, nessa época, o mito cultural do tráfico de escravas brancas que se tornou num pânico moral de dimensões vastas. É geralmente aceite, hoje em dia, que na realidade este o fenómeno não passou de uma série de rumores sobre o aprisionamento de mulheres brancas para serem vendidas no Norte de África e na América do Sul. O tema da virgem inocente forçadamente iniciada à sexualidade que depois se torna insaciável nos seus apetites

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As histórias moralísticas, como veremos no segundo capítulo, agitam a opinião púbica sobre um crime que, empiricamente, tem uma importância limitada e encorajam-nos a ver certos comportamentos como aberrantes e perigosos. Importa realçar que na história moralística não é o comportamento do agressor que está em causa, mas o comportamento da vítima e da vítima potencial. As histórias moralísticas são advertências às vítimas prováveis – normalmente mulheres - para terem uma atenção especial (Moore, 2014). 4

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sexuais tornou-se num assunto predileto na literatura erótica vitoriana. Ao analisar os discursos mediáticos atuais, constata-se a permanência de fantasias eróticas ligadas à submissão da mulher, bem como as narrativas sobre a “inquietante estranheza”. A presente investigação considera os meios de comunicação como elementos da cultura e da sociedade. De facto, o discurso mediático exprime certas construções da realidade e da identidade. O discurso permite também naturalizar ideias construídas, dando-as por adquiridas, fazendo o público esquecer que os média transformam informação bruta em histórias culturalmente e socialmente aceitáveis para a maioria. Como outrora, no contexto do TSH, desvendam-se manifestações de receios sociais relativos à imigração, especialmente à imigração no feminino e implementam-se medidas legais internacionais cujos dispositivos penais têm similaridades inquietantes com os do início do século XX, tornando-se instrumentos de controlo da mobilidade dos migrantes. O número crescente de crimes conexos ao TSH está intimamente ligado ao fenómeno mais amplo da migração. Os tempos modernos registam acrescidas deslocações populacionais. Por vezes a migração é voluntária, mas outras vezes é forçada devido, entre outros, aos conflitos armados, à violência generalizada, às catástrofes naturais e humanas. Neste sentido, a globalização abre portas ao crime organizado transnacional. Podemos, portanto, compreender a razão pela qual existem cada vez mais pessoas vulneráveis ao TSH, daí a importância da comunicação social para a divulgação de reportagens e notícias de caráter informativo. O presente estudo é influenciado pela técnica historiográfica de Michel Foucault, utilizada em Surveiller et punir (1975). Esta técnica tem duas fases. Primeiro, Foucault analisa as raízes históricas de um discurso particular (a disciplina e a punição) para encontrar momentos socio-históricos importantes que resultam numa evolução do discurso. Em seguida, o filósofo analisa os documentos desses momentos-chave. Foucault demonstra, deste modo, que os discursos participam na construção social da realidade. Da mesma forma, numa primeira fase exponho a história jurídica do TSH (a não confundir com a escravatura dos africanos no Novo Mundo) a partir do escândalo do tráfico de brancas no século XIX até à época atual. Numa segunda fase, analiso os

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documentos do século XIX com a imprensa portuguesa atual. Estas duas fases estão divididas em quatro capítulos. O primeiro capítulo tem por objetivo analisar as definições do conceito de TSH baseadas na historiografia dos termos utilizados (tráfico de brancas, tráfico de mulheres e tráfico de seres humanos). São expostos mitos, escândalos, diversos instrumentos legais nacionais, mecanismos jurídicos internacionais e, por fim, um panorama resumido da indústria do sexo no contexto internacional. É dada especial atenção à legislação portuguesa bem como aos casos assinalados em território nacional até ao final do ano de 2013. O segundo capítulo é um estudo das estruturas profundas da consciência coletiva sobre as quais se edifica o imaginário social do TSH para exploração sexual. Para tal exponho, num primeiro momento, conceitos teóricos e ferramentas metodológicas como as representações socias, os rumores, os pânicos morais e as histórias moralísticas, tendo como pano de fundo a sociologia do imaginário. Em seguida, analiso e comparo o pânico moral da escravatura branca e as históricas moralísticas atuais relativas ao TSH. Veremos que o discurso do TSH para exploração sexual serve certos objetivos políticos como a denúncia do capitalismo neoliberal pela esquerda, a denúncia da perda dos valores morais e religiosos pelos religiosos/moralistas, a denúncia do patriarquismo pelas feministas, a denúncia dos judeus pelos antissemitas ou ainda a denúncia do estrangeiro pelos xenófobos. Para ilustrar este argumento são analisados dois imaginários sociais relativos ao imigrante e à prostituta através de relatos, imagens, símbolos e retratos sociais. O terceiro capítulo examina os discursos mediáticos da imprensa portuguesa sobre o TSH nos anos de 2012 e de 2013. Aqui, as operações inerentes à investigação sociológica são a análise de informação, a categorização dos fenómenos observados e a quantificação. É também apresentada uma análise dos discursos e da fabricação dos discursos, utilizando a técnica qualitativa. A estrutura discursiva sobre este tópico demonstra uma continuidade nos temas abordados, incluindo elementos constitutivos invariáveis como a passividade das vítimas (sobretudo das vítimas femininas), os perigos da liberdade e da libertinagem (sobretudo para a mulher) e a demonização do

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estrangeiro. Ou seja, e de acordo com Foucault, observa-se claramente o poder do discurso dominante. A comunicação social tem um papel central na sensibilização e na mudança de mentalidades. O tema do TSH vende porque as vítimas são verdadeiras manchetes atrativas. Todavia, como constato no terceiro capítulo, o fenómeno gera ainda uma certa indiferença. Existem várias razões para tal: a inexistência de jornalismo de investigação nesta área, o facto de o cidadão comum considerar este fenómeno como algo de distante da sua realidade quotidiana ou ainda a não focagem na vítima por parte dos média. A passividade dos jornalistas é um facto. A quantidade de notícias é, de modo geral, reduzida, pontual e superficial. A cobertura mediática depende de fenómenos irregulares, da publicação de relatórios ou da publicidade do dia da luta contra o TSH. Esta falta de atenção jornalística não se limita ao TSH mas, infelizmente, a todas as matérias relacionadas com os Direitos Humanos, consideradas como temas de segundo plano. A questão do respeito e da proteção dos Direitos Humanos conduziu-me ao pensamento ético na comunicação social. Por conseguinte, apresento uma análise no quarto capítulo, da responsabilidade jornalística descrita nos diversos códigos deontológicos bem como no Estatuto do Jornalista contemplado na Constituição da República Portuguesa. São realçados, neste contexto, vários princípios éticos como a verdade, a objetividade ou a imparcialidade. A diminuta investigação jornalística sobre o TSH está na linha de dois temas considerados secundários no senso comum: a prostituição e a imigração. Ora, tendo em conta que a comunicação social é uma emanação da sociedade em que vivemos, é fácil constatar que, face às prostitutas e face aos imigrantes, o público exprime indiferença ou defesa pessoal. A indiferença é devida ao bem-estar relativo das sociedades civilizadas. A defesa transforma-se em ataque por razões de sobrevivência. Daí o interesse em estudar estes dois grupos no contexto dos imaginários sociais para observar a sedimentação de julgamentos prematuros ligados ao conceito do TSH para exploração sexual.

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O jornalismo é obrigatoriamente subjetivo porque é uma representação simbólica da realidade. O facto de o público compreender esta subjetividade confirma a existência de uma intersubjetividade dialógica. Falamos, portanto, de um senso comum – por isso partilhado – entre os jornalistas e o público. Ao aplicar esta teoria aos temas de eleição da presente investigação comprovo que as ideias, mensagens e imagens mediáticas subtilmente discriminatórias são aceites pelo público dominante porque são dados adquiridos pela consciência coletiva. Encontramo-nos, pois, num círculo vicioso. É por isso que é mais difícil atingir o respeito pleno dos Direitos Humanos do Outro a nível das mentalidades do que a nível jurídico. Assim, faz todo o sentido questionar o mito idealista do jornalismo objetivo. Merece especial destaque o facto de a presente investigação não ter por objetivo analisar o TSH, mas sim a construção dos discursos sobre o fenómeno. Não estão em causa as realidades atrozes associadas a esta atividade criminosa, mas os discursos dos média e as consequências – nefastas – para os migrantes ilegais e para as prostitutas. O último capítulo apela, precisamente, ao papel central dos meios de comunicação no combate às representações sociais discriminadoras, pois são estas que produzem as vulnerabilidades sociais que afetam as minorias e os marginais. Com efeito, é a discriminação, o racismo e o xenofobismo que normalizam a exploração laboral e sexual. A abordagem desta investigação é transdisciplinar, aliando a Sociologia aos Estudos Culturais, à Sociopsicologia, às Ciências da Comunicação e à Criminologia. A transdisciplinaridade aplica-se também aos paradigmas sobre os quais se edifica este estudo. Articulam-se, desta forma, várias componentes sociológicas como as normas e os valores sustentados pelo holismo durkheimiano, o individualismo metodológico weberiano orientado para compreender e interpretar a ação social, o interacionismo simbólico da Escola de Chicago relativo aos comportamentos sociais desviantes e ao estigma, representado, nomeadamente, por Becker (2009) e Goffman (1988), o imaginário social (Durand, 1992, 1998 e Taylor, 2004) e a sociopsicologia (Moscovici, 1976 e Jodelet, 1989). A diferenciação entre o Eu e o Outro reflete-se de diversas formas. No caso do trabalho do sexo evidenciam-se as representações sociais relativas à transgressão dos

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códigos morais e sexuais dominantes. Em relação ao imigrante – especialmente o imigrante pobre – a discussão de fundo vem refletir-se na demonização do estrangeiro. Parece necessário, ainda na introdução, clarificar alguns conceitos. A prostituição é considerada como um serviço sexual com contrapartidas materiais e/ou monetárias e não como uma exploração do corpo da mulher. A prostituição é uma das várias atividades inscritas no trabalho sexual. O imigrante é lido como uma política e não como uma categoria social objetiva de descrição do real. Esta definição é baseada na obra de Bruno Peixe Dias e Nuno Dias (2012, pp. 15-16):

A categoria “imigrante” ou “imigrante ilegal” tomou, no espaço público, o lugar que antes estava reservado ao “trabalhador” ou ao “proletário”. Se pensarmos no modo como a palavra imigrante não é comummente usado para designar todo o indivíduo que vive fora do país, mas apenas aqueles de entre eles que pertencem às classes menos privilegiadas, nomeadamente os trabalhadores dos países nãoocidentais que ocupam as posições menos qualificadas no mercado do trabalho.

Em suma, parto do princípio de que a opinião, a atitude social e os estereótipos são estruturados por constelações de imagens ancestrais presentes na inconsciência coletiva. Os média têm um papel central na disseminação da opinião pública e na naturalização de certas representações sociais da maioria dominante. Portanto os organismos de comunicação têm uma responsabilidade perante as minorias no tocante ao respeito da diferença.

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1. Sobre o tráfico de seres humanos

O anjo caiu ferido, E se viu aos pés rendido Do tirano caçador. De asa morta e sem ‘splendor O triste, peregrinando Por estes vales de dor, Andou gemendo e chorando. Almeida Garrett, O Anjo Caído

O presente capítulo apresenta uma breve recapitulação histórica das evoluções legislativas a nível internacional e nacional sobre o TSH. Não pretendendo ser exaustiva, esta secção expõe um leque de mecanismos jurídicos, convenções e relatórios essenciais para o estudo do fenómeno, sobretudo numa perspetiva sócio-histórica. Por outras palavras, a legislação é associada a factos históricos e a fenómenos sociais com o intuito de evidenciar uma perdurante presença de certas ideias – sobretudo moralistas – face à prostituição e à imigração. As implicações destas reflexões, baseadas em factos reais mas também em exagerados escândalos mediáticos, foram, e são, devastadoras relativamente à não proteção dos Direitos Humanos universais e dos direitos fundamentais, à política de acolhimento, à migração ilegal, ou ainda, à segurança interna. Pretende-se também desenhar um paralelo entre os mecanismos jurídicos internacionais e nacionais num contexto histórico predominantemente europeu. A investigação segue uma trajetória temporal linear, tendo por início a questão da escravatura branca (exploração laboral) dos Açores para o Brasil no início do século XIX (Silva, 2012, pp. 36-71) e a polémica do tráfico de escravas brancas (exploração sexual) iniciada em Inglaterra e na Bélgica a partir da segunda metade do século XIX (BillingtonGreig, 1913; Chaumont, 2008, 2009 e 2011; Corbin, 1978; Doezema, 2000). Em seguida, é relatada a evolução da legislação internacional promulgada pelas Nações Unidas e pela

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União Europeia assim como a trajetória da legislação portuguesa. É também analisada a diferença entre o TSH e o contrabando de migrantes (imigração ilegal). As instituições internacionais criaram instrumentos de força (convenções, tratados, acordos de cooperação judicial) que permitem verificar uma coordenação estratégica. Portugal, pelo seu posicionamento geográfico estratégico na periferia, é um lugar particularmente interessante para o crime transnacional e para a entrada ilegal no espaço Schengen. Ciente deste facto, o país acompanha os desenvolvimentos internacionais – sobretudo europeus – em matéria de segurança territorial. A consagração penal do TSH no artigo 217º do Código Penal de 19822 definiu concretamente esta atividade e tem vindo, desde então, a sofrer alterações sucessivas, criando novas incriminações e desenvolvendo melhores condições de apoio às vítimas. É apresentado, em seguida, um panorama da economia internacional da indústria do sexo, realçando alguns fatores que permitem o desenvolvimento de redes de TSH, nomeadamente o turismo sexual e a migração no feminino. Por fim, a última secção descreve a situação atual do TSH em Portugal que contradiz as tendências europeias na evolução do crime: segundo a Europol a maioria das vítimas traficadas na Europa são do sexo feminino e são traficadas para exploração sexual (Europol, 2011) e neste país a maioria das vítimas identificadas são do sexo masculino e são traficadas para exploração laboral (SSI, 2013).

1.1 A polémica sobre o tráfico de escravas brancas (de 1880 a 1949) É legítimo fazer referência, desde já, à emigração açoriana para o Brasil, na primeira metade do século XIX, cujas condições desumanas e ilegalidade deram início à questão da escravatura branca em terras lusófonas. Este fenómeno foi bastante divulgado pela imprensa açoriana e brasileira, tornando-se indissociável da emigração clandestina. A expressão “escravatura branca” fora utilizada, em 1838, por Almeida Garrett, então deputado da Assembleia Constituinte, aquando das denúncias das

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Atualmente, o TSH está consagrado no artigo 160º do Código Penal. 11

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condições de emigração dos portugueses (Silva, 2012, p. 42). Garrett fazia referência às precárias condições de transporte para o Brasil, assim como a dureza do trabalho e da vida naquele país. Muitos contratos de trabalho eram ilegais, dissimulando condições de exploração. Os pagamentos das viagens podiam tornar-se dívidas, propiciando situações abusivas. Os emigrantes incautos e ingénuos, a maioria iletrada, eram presas fáceis. Em 1849, também Sá da Bandeira alertava a Câmara dos Pares, para a miséria e maltratos que sofriam os emigrantes (Silva, 2012, p. 44). A imprensa, nomeadamente o Açoriano Oriental, contribuiu para a sensibilização e informação sobre este fenómeno. Apesar disso, ao explorar o debate, o periódico demonstra uma estrutura típica de preconceitos que, como veremos, se repetem ao longo do tempo e em lugares diversos. Segundo a historiadora Susana Serpa Silva, o dito jornal, na década de 1850, repete certos termos chave: a monstruosidade do traficante/engajador (diabolização desta figura), o infortúnio, a vulnerabilidade e passividade das vítimas, a quantidade exorbitante de escravos e a emigração ilegal3. Não posso deixar de realçar uma pequena peça de teatro de Francisco Joaquim da Costa Braga, de 1859, intitulada Paulo e Maria, ou a escravatura branca, que relata de maneira pertinente o tráfico de portugueses para o Brasil, ou, mais precisamente, do que se dizia sobre o fenómeno nos bares de Alfama:

Mathias: Mas como demónio vocês lá os fazem escravos… gente branca! Gonçalo: E os pretos não são homens!... estes dão mais que fazer… eu lhe conto: eu ganho 30 mil reais em cada um que arranjo, contando que sejão bons e sãos comos os peros. Metto-me de gorra com elles… lábia para aqui, cantiga para acolá… Brasil a contas… e depois dá-lhe a gente meia dúzia de cartas para pessoas que lá não existem. Ora o capitão do navio leva-os a título de lá lhe ser paga a viagem fazendo aqui uma obrigação… O capitão é cá da coisa… comprehende? Chegam lá, 3

A emigração ilegal oitocentista açoriana foi caracterizada pelo elevado número de camponeses que se dirigiu para as plantações de café e açúcar do Brasil e do Havai, pela calada da noite, sem documentos e com a liberdade pessoal hipotecada aos engajadores que tinham pago a viagem de barco. A expressão numérica deste movimento populacional era de tal maneira significativa que a ação de emigrar clandestinamente assumiu a expressão idiomática açoriana de “embarcar de calhau” (Riley, 2003, pp. 149-150). 12

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e nem vintém, o capitão apoquenta-os… ameaça-os com prisão… depois aparece um sujeito que os arranja nas roças afim de pagar ao capitão… passando tempo o colono quer saffar-se mas deve o dinheiro do sustento… o fatto… e por fim está lá toda a vida sempre a pagar e sempre a dever!... Comprehende? Mathias: Mas isso é mal feito! É uma… Gonçalo: Sim é… Custa-me escravizar gente branca, mas os tempos estão tão alcançados… o pão está tão caro… (Braga, 1859, pp. 14-15)

Se a questão portuguesa sobre a escravatura branca tratava unicamente dos emigrantes pobres escravizados no Brasil, a polémica internacional (europeia e americana) sobre a escravatura branca trata apenas do tráfico de mulheres e meninas para exploração sexual. O mito do tráfico de brancas também teve a sua origem no século XIX, na época da regulamentação da prostituição4. Na Europa, a Industrialização, a alteração dos sistemas de transportes e a rápida urbanização levaram a um aumento dos fluxos migratórios nacionais (do campo para a cidade) e transnacionais (de países intermédios para países industrializados). Estes tempos foram também os de uma amplificação da pobreza urbana com um crescente número de operários que viviam na miséria. Ora, a migração causada pelo infortúnio abre espaço para as mais variadas formas de exploração humana. O número de prostíbulos aumentou e a prostituição expandiu-se, seguida por uma acrescida propagação de doenças venéreas (Azevedo, 1864; Corbin, 1978; Bartley, 1999). A ordem moral e social parecia perturbada e legislações reguladoras vieram à luz em vários países europeus ocidentais5. A regulamentação da prostituição deu lugar a outros dilemas como, por exemplo, a legitimidade do comércio de mulheres. A Europa assistiu, então,

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A partir do século XIX, são instituídos sistemas de tolerância e de controlo em vários países da Europa ocidental devido ao número crescente de casos de sífilis. A prostituição era então vista como um “mal necessário” que devia ser regulado através de registos de identificação de prostitutas, visitas médicas obrigatórias, internamentos forçados em hospitais quando estivessem infetadas e delimitação das zonas de prostíbulos (geralmente nos bairros mais pobres e nos bairro portuários). 5 Em França, por exemplo, estabeleceram-se registos das prostitutas parisienses, controlos sanitários e casas de alterne em certos bairros (Corbin, 1978). Em Inglaterra foram implementadas as Contagious Desease Acts de 1864, obrigando as prostitutas a submeterem-se a exames médicos e, caso estivessem infetadas, a serem internadas em hospitais especiais (Bartley, 1999). Em Portugal, a primeira regulamentação estadual surgiu em 1853 com o Regulamento Sanitário das Meretrizes do Porto (Azevedo, 1864). 13

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a um movimento instigado pelas feministas contra o regulamentarismo. Foi neste contexto que surgiu a expressão “tráfico de escravas brancas” (white slave traffic ou la traite des blanches), tornando-se num dos argumentos prediletos dos abolicionistas6. A expressão faz referência, desde os finais do século XIX, ao tráfico de mulheres e meninas que eram raptadas, drogadas e forçadas à prostituição em cidades estrangeiras. O tráfico de brancas foi confundido com o comércio de mulheres. Escravas sexuais e prostitutas tornaram-se num só fenómeno, pilar do mito cultural da white slavery que marcou a imaginação europeia e fomentou preconceitos sociais ainda hoje notáveis. A expressão “escravatura branca” era já usada pelas feministas abolicionistas antes de 1880 para denunciar a prostituição. Porém, o fenómeno tornou-se num escândalo de grande magnitude quando, em 1881, foram publicados extratos de correspondência entre fornecedores ingleses e proxenetas belgas. Nestes documentos constatavam a idade, a descrição física e os atributos profissionais das “encomendas”. Segundo a House of Lords, entre 1878 e 1880, trinta e quatro jovens inglesas, incluindo três virgens, teriam sido exportadas de Londres para Bruxelas (Corbin, 1978, p. 407). Vários processos foram instaurados entre 1880 e 1881 na capital belga, resultando na demissão do comandante da polícia bruxelense e do chefe da brigada de costumes (Chaumont, 2009, p. 25). É de notar, contudo, que se em Bruxelas o escândalo residiu na descoberta da corrupção policial7, em Londres o alvoroço era devido a notícias sobre a prostituição forçada. No entanto, segundo os relatórios da polícia belga (Chaumont, 2009, p. 28), apenas uma jovem tinha sido realmente coagida. Nos outros oito casos identificados elas tinham migrado voluntariamente e eram já prostitutas nas ruas londrinas. O pânico moral instalou-se a nível internacional. O número de denúncias oficiais aumentou, abrangendo cada vez mais países (Corbin, 1978, pp. 408-409). Na Hungria, um decreto governamental de 1864 (Appleton, 1903, citado em Corbin, 1978, p. 408) 6

O vocábulo “abolicionista” é relativo, na presente investigação, ao desejo de abolir a prostituição de forma definitiva. 7 O comandante da polícia detinha o monopólio da venda de bebidas alcoólicas na maioria dos prostíbulos regularizados e o chefe da brigada de costumes tinha uma relação com uma prostituta (Chaumont, 2009, p. 25). 14

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chama à atenção para a venda de jovens mulheres húngaras com destino aos Estados Unidos. Dez anos mais tarde, em 1874, os deputados austríacos apelam a uma conferência internacional sobre a escravatura branca. Em 1889, a Federação Britânica, Continental e Geral para a Supressão da Prostituição Regularizada reúne-se em Genebra e denuncia a existência da escravatura branca. Em 1895, o francês Paul Robiquet também apela a um congresso internacional sobre o tráfico de brancas para desenhar os contornos de um mecanismo de controlo internacional8. Em 1897, o Reich alemão toma disposições concretas contra o TSH e vários acordos de extradição são assinados com os países vizinhos. Mas o que provocou a campanha transnacional da luta contra o tráfico de escravas brancas foi uma iniciativa privada, a saber, a fundação da National Vigilance Association9, em 1885, pelo jornalista inglês William Thomas Stead. O mito do tráfico de escravas brancas amplifica-se precisamente nesse ano com a publicação de uma série de artigos sensacionalistas intitulados “The maiden tribute of modern Babylon”10 por W. Stead. Este jornalista teria feito uma investigação no mundo oculto e dantesco da prostituição londrina, entrevistando “madames”11, proxenetas, meretrizes e médicos para chegar à conclusão que todos os anos milhares de meninas inocentes e virgens eram raptadas e levadas para bordéis onde eram violadas, tornandose em seguida numas miseráveis, dependentes do comércio do sexo para sobreviverem, até morrerem prematuramente com doenças venéreas ou devido ao alcoolismo. A informação chocante, o vocabulário propagandista e o estilo literário de Stead (uma simbiose entre o melodrama e a pornografia vitoriana) acenderam a chama da indignação pública. O seguinte extrato demonstra claramente este tipo de sensacionalismo jornalístico: 8“

Propomos criar ferramentas internacionais, com código telegráfico, para investigar todos os indivíduos suspeitos que fazem o comércio de escravas brancas e organizar, na fronteira e nos portos marítimos, comissões locais assistidas por gabinetes de informação.” (Robiquet, 1907, p. 180). Tradução da autora. 9 A National Vigilance Association foi fundada com o objetivo de “reforçar e melhorar as leis para a repressão do vício e da imoralidade pública”. Todas as organizações com os mesmos objetivos seriam associados a esta nova organização. Um dos primeiros membros foi a feminista Josephine Butler. A informação sobre a administração desta associação, bem como os relatórios e outras publicações encontram-se na Women’s Library da Universidade Metropolitana de Londres. 10 O tributo virginal na Babilónia moderna. Tradução da autora. 11 A “madame”, em linguagem vulgar, designa a dona da casa de alterne que ganha uma comissão por cada cliente das meretrizes que trabalham nessa casa. 15

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A primeira coisa que fizeram depois de a criança ser sequestrada foi assegurar o certificado de virgindade. (...) O exame foi muito breve e completamente satisfatório. E nem a juventude, nem a inocência da menina causaram piedade no coração endurecido do médico. ‘Coitadinha,’ exclamou a madame. ‘É tão pequenina, a dor será intensa.’ (...) Para acalmar a madame, o representante do cliente perguntou se ela poderia fornecer qualquer coisa para aliviar a dor. A madame tirou um pequeno frasco de clorofórmio do bolso. (...) Daqui, a menina inocente foi levada para uma casa de má fama, nº_ da Rua _, onde, não obstante a tenra idade, foi admitida sem questões. A menina foi levada para o primeiro andar, despida e colocada na cama. Estava um pouco agitada, mas em breve adormeceu sob a influência do clorofórmio. Em seguida, as mulheres retiraram-se. O ambiente estava calmo e tranquilo. Poucos momentos depois a porta abriu-se, o cliente entrou no quarto e trancou a porta. Houve um breve silêncio. E então ouviu-se um grito selvagem e queixoso – não um grito alto, mas um gritar desamparado e assustado como o balido de um cordeiro com medo. E ouviu-se a voz marcada pelo terror da menina, ‘Está um homem no meu quarto! Quero ir para casa; Ah, levemme para casa!’ E, mais uma vez, ficou tudo calmo e silencioso.12 (Stead, 1885)

A emoção geral da opinião pública e as manifestações no Hyde Park em Londres acabaram por forçar o parlamento inglês a votar o Criminal Law Amendement Act, 188513 no qual, entre outros, a idade sexual adulta passa a ser de dezasseis anos (ao invés de treze), a prostituição de menores é penalizada e a homossexualidade é criminalizada. Em paralelo, emergem várias associações caritativas dedicadas à proteção das jovens meninas. Em 1899, é fundado o International Bureau for the Suppression of Traffic in Persons14 e, nesse mesmo ano, a National Vigilange Association organiza a primeira conferência internacional na qual estiveram presentes

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Tradução da autora. (1885). Criminal Law Amendment Act. Acedido em https://archive.org/details/criminallawamen00bodkgoog. 14 O International Bureau for the Suppression of Traffic in Persons organizou a primeira reunião em 1900. A constituição incluía um comité nacional por Estado membro com dois representantes. O International Bureau trabalhou, depois da Primeira Grande Guerra em conjunto com as agências da Sociedade das Nações responsáveis pela luta contra o TSH e tornou-se, depois da Segunda Grande Guerra, numa ONG com estatuto consultivo na ONU até 1971, data da sua dissolução. 13

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representantes de doze nacionalidades. Os relatórios elaborados nesta ocasião permitem-nos desenhar uma geografia comercial do tráfico de mulheres assaz simplista (Corbin, 1978, pp. 419-424). Segundo estes documentos, a Europa exportava mais mulheres do que importava (daí a expressão “tráfico de escravas brancas”). Os principais mercados continentais situar-se-iam em Viena e Budapeste. Vindas da Hungria, da Boémia ou da Galiza, as raparigas – sobretudo judias – seriam dirigidas para Trieste para serem vendidas para todos os portos do mundo. O Império Russo15 constituiria um outro grande mercado de aprovisionamento com, nomeadamente, judias, circassianas16 e raparigas de Varsóvia e de Kiev. No sul de Itália, o tráfico seria controlado pela Camorra napolitana ou pela Máfia siciliana. Todas as nações europeias forneceriam meninas e mulheres, menos a Suécia (país considerado puro e com firmes tradições familiares e morais). Um número elevado de francesas seriam exportadas para a Holanda, para a Bélgica, para o Império Russo ou ainda para a Argentina. A procura por parte dos Estados Unidos teria diminuído devido ao acrescido controlo da imigração17. No entanto, Nova Iorque continuava a ser o principal entreposto das “mercadorias”. Os principais países importadores seriam sulamericanos e asiáticos. O outro grande eixo seria o Oriente, onde as mulheres seriam vendidas aos haréns do império otomano e aos sultões do Norte de África. Como Alain Corbin nota, os países que supostamente exportavam mais raparigas eram precisamente aqueles que forneciam mais emigrantes. Não é de todo inútil realçar que, no vasto movimento de migração que ocorreu nesta época, uma grande parte da população europeia partiu para todos os continentes. Ora a emergência do mito coincide, precisamente, com estes fluxos migratórios. A razão é clara: a maioria dos migrantes eram homens jovens, pobres e sem qualificações. Com a acrescida mobilidade e o consequente anonimato – longe dos familiares e dos amigos

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O Império Russo dos finais do século XIX abrangia vastos territórios da Europa Oriental, incluindo os Estados bálticos, a Finlândia, o Cáucaso, a Ucrânia, e Bielorrússia, a Moldávia e uma parte da Polónia, bem como quase toda a Ásia Central. 16 Os circassianos são um grupo étnico do norte do Cáucaso. 17 A Immigration Act of 1903 adicionou às prévias leis sobre a imigração quatro classes não admissíveis no território nacional: anarquistas, pessoas com epilepsia, mendigos e importadores de prostitutas. Diploma disponível em http://www-rohan.sdsu.edu/dept/polsciwb/brianl/docs/1903ImmigrationAct.pdf. 17

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– as virtudes morais vitorianas iam-se fragilizando. Os intermediários viram o comércio de mulheres para prostituição ou para casamentos fraudulentos tornar-se rentável com o aumento da procura por parte dos jovens europeus em terras remotas. Uma outra razão para a internacionalização do comércio do sexo deve-se à mutação profunda na sensibilidade sexual e moral na Europa dos finais do século XIX. Como a opinião pública contribuía para a diminuição da tolerância à prostituição, não só proxenetas mas também prostitutas procuraram o mercado em lugares mais propícios. Finalmente, em 1902, decorreu em Paris o congresso internacional há muito desejado pelos representantes das organizações contra o tráfico de brancas. Dezasseis países participaram oficialmente: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, França, Grã-Bretanha, Hungria, Itália, Noruega, Países Baixos, Portugal, Rússia, Suécia e Suíça. O objetivo principal era incitar os governos a tomarem medidas administrativas e jurídicas relativas ao controlo e à repressão do tráfico, bem como ao repatriamento das vítimas. O tráfico de brancas foi definido como o comércio por coação de menores de idade e de adultas. O congresso eliminou, por isso, as barreiras morais daqueles que se opunham também ao tráfico de prostitutas voluntárias. Em síntese, as mulheres consideradas puras e inocentes não podiam ser traficadas, mas as prostitutas podiam. No fundo, a conferência contribuiu para a amplificação de uma campanha a favor da moralização da juventude feminina. Um primeiro acordo para a supressão do tráfico (Arrangement international en vue d’assurer une protection efficace contre le trafic criminel connu sous le nom de “Traite des Blanches”) é assinado em Paris, a 18 de maio de 1904, por chefes europeus “preocupados em garantir a segurança das mulheres maiores de idade que sofreram abuso ou coerção, bem como de mulheres e raparigas menores, contra o tráfico criminal conhecido por tráfico de escravas brancas.”18 O congresso de 1902 e o resultante acordo foram bastante divulgados pela imprensa francesa e alguns jornais continuaram a veicular falsas informações sobre a extensão do TSH: o tráfico seria metodicamente organizado por uma associação 18

O Acordo internacional para assegurar uma proteção eficaz contra o “tráfico de escravas brancas” de 1904 foi alterado pela Convenção para a supressão do tráfico de pessoas e da exploração da prostituição de outrem, assinado em Lake Success, Nova Iorque. 18

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internacional com agentes regulares em todos os países do mundo. Esta organização teria mesmo os seus banqueiros e a sua tesouraria, caso os afiliados fossem apanhados pela justiça.19 Na realidade, como o Ministério do Interior francês constata (Corbin, 1978, p. 416), entre 1902 e 1906, o tráfico transnacional era exceção. Geralmente as mulheres vinham voluntariamente do campo para a cidade. É ainda de notar que os jornais sublinhavam, invariavelmente, a responsabilidade dos estrangeiros neste comércio. O tema tem uma atração evidente na aurora dos eventos históricos que conduziram à Primeira Grande Guerra. Os jornais permitiam a disseminação de ideias racistas, antissemitas e também a hostilidade contra a Alemanha. O poder emotivo é forte em relação às mulheres, numa altura em que as sufragistas lutavam pelo direito ao voto e à emancipação. A moral sexual e social é posta em evidência ao descrever a metamorfose da rapariga virtuosa e honesta (e branca) na mulher (suja e desviante) dos bordéis longínquos e exóticos. O contexto psicológico explica o sucesso da mensagem no seio de uma opinião pública atraída, mas angustiada. A distorção entre os factos e o quadro desenhado revela um projeto vasto:

Persuadir a jovem rapariga de que é quotidianamente ameaçada pela sedução e, ao mesmo tempo, pela violência; de que para ela a juventude é uma verdadeira provação, é o momento de todos os perigos, e no qual ela tem de saber preservar-se para poder aceder ao porto de salvação que é o casamento. (Corbin, 1978, p. 436)

Em 1910, é assinada em Paris a International Convention for the Suppression of the White Slave Traffic20. Se o acordo de 1904 estabelece medidas internacionais mínimas para a repressão do TSH21 e para a defesa das vítimas, incluindo a expatriação22, a

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Alain Corbin (1978, p. 414) cita o exemplo do jornal Le Matin de 21 de abril de 1902 que, relativamente a esta organização cuja sede seria em Andrésy, constata o seguinte: “o grupo inclui proxenetas, batedores, inspetores, viajantes; existem também contabilistas e um tesoureiro aos quais é ainda necessário adicionar os comissários oriundos dos quatro cantos do mundo”. 20 Esta Convenção foi também emendada pela já referida Convenção de 1949. 21 Artigo 1º e artigo 2º do Acordo de 1904. Merece especial destaque o aspeto vago do controlo policial requerido cujo leque de ações repressivas se pode estender a todos os viajantes. 22 Artigos 3º e 4º do Acordo de 1904. 19

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convenção de 1910 declara que será punido quem “alicie, atraia ou desvie com vista à prostituição outra pessoa, mesmo com o acordo desta”23. Claramente coexistem duas preocupações constantes: abolir a prostituição e proteger o território nacional da entrada de mulheres estrangeiras isoladas, especialmente as prostitutas. Em 1912, a Criminal Law Amendment (White Slavery Traffic) Bill é votada pela House of Commons em Londres. A opinião abolicionista feminista do início do século XX começa, depois de vários anos de lutas infrutuosas, a ter peso na opinião pública. Para as sufragistas, o direito ao voto feminino e a luta contra a escravatura branca, porque alimentada pela prostituição e pela dominação masculina, constituem o mesmo combate pelos direitos da mulher24. Apesar de tudo, algumas feministas iniciam uma polémica sobre a legitimidade das informações jornalísticas que conduziram à Criminal Law Amendment, como é o caso de Rebecca West (citada em Chaumont, 2008):

Aqueles que entre nós têm um ideal de Parlamento como sendo um laboratório de pesquisa em que questões sociais são ponderadas, analisadas e finalmente compreendidas, sentir-se-ão indignados pelo facto de a Câmara dos Comuns ter começado a legislar sobre esta matéria sem ter a menor prova real daquilo que estava a legislar.25

Também a sufragista Teresa Billington-Greig põe em causa a veracidade dos factos relatados pela imprensa, não obstante o facto de acreditar na existência do fenómeno. Decide, por isso, fazer um inquérito com questionários e entrevistas aos departamentos de polícia, deputados e membros de várias associações para encontrar provas concretas das centenas de raptos amplamente descritas pelos jornais. Os resultados foram publicados, em 1912, num artigo intitulado “The truth about white slavery” (Billington-

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Artigo 1º da Convenção de 1910. O itálico é da autoria da investigadora. É importante realçar que a escravatura branca tinha uma definição bastante ampla para a feministas dos finais do século XIX e não se limitava apenas à prostituição, mas a todo o tipo de exploração da mulher. Por exemplo, Annie Besant, uma ativista inglesa, publicou, em 1888, um artigo intitulado “White slavery in London”, no qual expõe as condições de vida e de trabalho precárias e os baixíssimos salários das operárias da fábrica Bryant and May (Besant, 1888). A escravatura branca ganhou, assim, um novo significado: a exploração – tout cour – da mulher pelo homem. 25 Tradução da autora. 24

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Greig, 1913), demonstrando que nenhum membro da Central Authority in England for the Repression of the White Slave Traffic confirmava ter conhecimento de qualquer caso nos últimos dez anos e nenhum chefe de polícia confirmava ter conhecimento deste tipo de crime organizado. Não encontrando uma única prova, a sua conclusão foi que o Parlamento, os jornalistas e os agentes públicos veiculavam uma “emoção irracional” (Billington-Greig, 1913, p. 428). Numa análise incrivelmente inovadora, Billington-Greig deduz uma série de caraterísticas típicas do boato: a quantidade inacreditável de histórias e incidentes de raparigas raptadas, o aspeto extraordinário (no sentido literal) destas narrações e a repetição dos mesmos incidentes excecionais mas em lugares diferentes: a presença dos lenços com clorofórmio, dos doces e das flores para burlar as raparigas. Mais, não existiam nenhumas declarações assinadas pelas testemunhas. Para ela, todas estas variações criavam a impressão de que as famílias rurais inglesas estavam a ser dizimadas (Billington-Greig, 1913, p. 430). Este pânico moral resultou numa vertente radical do feminismo que acreditava que a vasta maioria dos homens ia a lugares secretos de devassidão onde meninas de tenra idade sofriam até morrer às mãos dos clientes. Mas, como Billington-Greig realça, se o homem parecia, por definição, depravado, a mulher demonstrava ser, constantemente, impotente e incapaz de resistir. Finalmente, para ela é evidente que, no que respeita a prostituição coerciva, o Criminal Law Amendment Bill não atingiu nenhum objetivo, relegando visivelmente para segundo plano a proteção das prostitutas. Portanto, para alguns observadores era já claro que a campanha repressiva contra o tráfico de brancas levava a medidas opressivas contra as prostitutas em vez de as proteger. Estas mesmas pessoas defendiam a importância da educação ao invés da repressão. A verdadeira evolução deveria ser feita a nível social e económico. O aspeto inédito da investigação de Billington-Greig deve-se ao facto de ter sido uma das primeiras pessoas a porem em causa os rumores sobre a escravatura branca, opondo o sentimentalismo dos legisladores e dos militantes ao pensamento racional e

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mobilizando o seu espírito crítico a favor de um novo feminismo. Neste contexto, Emma Goldman afirma as suas tendências anarco-feministas:

Qual é realmente a causa do tráfico de mulheres? Não apenas de mulheres brancas, mas também de mulheres amarelas e pretas. A exploração, claro: o capitalismo cruel que engorda através do trabalho mal pago, obrigando milhares de mulheres e meninas a prostituírem-se.26 (Goldman, 1910)

Os Estados Unidos também foram rapidamente contagiados pelo pânico moral face a um impressionante tráfico de meninas. O White Slave Trade Act, mais conhecido por Mann Act foi votado em 1910. Esta lei proibia o transporte de mulheres para “fins imorais” entre os Estados americanos. Ou seja, a lei proibiu claramente a deslocação de prostitutas. O objetivo era, como na Europa, combater a prostituição, mas serviu também para criminalizar atos sexuais consentidos entre adultos.27 Nesta década são publicados dois relatórios americanos sobre o fenómeno: Commercialized prostitution in New York City (Kneeland, 1913) e Prostitution in Europe (Flexner, 1914). O primeiro relatório, como o título indica, é sobre a prostituição e não sobre o TSH, o que não impede o autor de concluir que “as casas de prostituição não podem existir sem o tráfico de mulheres” (Kneeland, 1913, p. 99) e que “a maioria dos exploradores é de origem estrangeira” (Kneeland, 1913, p. 79). Para o autor a repressão não se deve limitar ao TSH mas sim englobar todo o comércio sexual. O segundo relatório também trata da prostituição e não do tráfico de mulheres para exploração sexual. Flexner reconhece que as situações de prostituição coerciva e tráfico são raras, mas constata que tal apenas acontece na Europa (Flexner, 1914, p. 93). Segundo o autor, tendo em conta a boa vontade das forças da polícia e a diminuição dos prostíbulos, os traficantes começavam a dirigir as suas vítimas para a América do Sul (Flexner, 1914, p. 184). Durante a Primeira Guerra Mundial a atividade militante nesta área parou. No final da Guerra, as potências vencedoras fundaram a Sociedade das Nações, com o objetivo 26 27

Tradução da autora. Esta lei foi alterada em 1978 e depois em 1986. 22

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de criar mecanismos jurídicos internacionais para promover a paz, a segurança e o desenvolvimento a nível mundial. Em 1921, a Assembleia da Sociedade das Nações convocou uma conferência sobre a questão do TSH. No título da conferência, a expressão “tráfico de brancas” foi substituída por “tráfico de mulheres e crianças”. A Convenção adotada no final desta conferência, intitulada Convenção internacional para a repressão do tráfico de mulheres e crianças, deu origem à criação de uma comissão consultiva, a Comissão sobre o Tráfico de Mulheres e Crianças, para coordenar os relatórios anuais dos Estados assim como os trabalhos de investigação de organizações privadas. Neste contexto, a Fundação Rockfeller propôs a criação de uma comissão especial de peritos, totalmente independente da comissão consultiva da Sociedade das Nações. Esta comissão de peritos teve por objetivo fazer uma investigação quantitativa a nível internacional sobre o TSH. A pesquisa durou três anos, de 1924 a 1927, e foi composta por duas investigações ditas empíricas: um questionário a preencher pelos governos e uma pesquisa no terreno28. O objetivo era responder a três questões: 1) Existe um tráfico internacional de mulheres e crianças para prostituição? 2) Quais são os países envolvidos e quais são os métodos de recrutamento e transporte? 3) Qual é a eficácia das medidas internacionais no combate contra o TSH? Os resultados foram elucidativos. A existência do TSH em proporções consideráveis foi confirmada. Os fatores seriam primeiro, a regulamentação da prostituição (as meninas e mulheres eram vendidas em países onde o comércio sexual era tolerado); segundo, a venda livre de álcool; terceiro, o comércio de material pornográfico; quarto, os salários femininos baixos. As rotas seriam, geralmente, da Europa para a América do Sul, da Europa para o Egito a para a África do Norte, da Europa para o Oriente, nomeadamente para a Índia, e no seio Europa. O transporte dependeria do preço da viagem, da resistência da mulher e das autoridades presentes. Normalmente seria durante a viagem que a mulher teria conhecimento do que a esperava e que, no caso de se opor, era “educada”. A utilização de documentos falsos

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O Report of the special body of experts on traffic in women and children é analisado por Chaumont, 2009. 23

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seria o usual. Segundo o relatório, existiriam quatro tipos de traficantes: o “grande” traficante (como um mastermind, um génio organizador), as “madames”, os proxenetas e os angariadores. Existiriam também quatro tipos de mulheres objeto de tráfico: as mulheres e meninas inocentes e sem defesa (os casos mais trágicos), as prostitutas (enganadas com promessas de melhor rendimento), as semiprofissionais ou “mulheres fáceis” (geralmente provenientes do meio rural ou de cidades pequenas) e as artistas e dançarinas (facilmente aliciadas com a quimera do sucesso). Relativamente aos métodos de aliciamento, o mais fácil seria a promessa de casamento, em seguida a oferta de trabalho com contratos falsos ou, já no país de destino, as dívidas da viagem e o pagamento das contas a preços exorbitantes.29 Em suma, o relatório, publicado em 1927, oferece conclusões claramente abolicionistas e inclui recomendações como a vigilância tenaz das digressões artísticas, dos salões de dança e do consumo de álcool. O sucesso da publicação foi imediato. Os factos descritos foram tidos como reais (embora a pesquisa no terreno fosse problemática por se tratar de investigação criminal) e a ideia de que o tráfico seria favorecido pela existência de casas de alterne foi aceite pela opinião pública. A regulamentação da prostituição foi posta em causa de uma vez por todas. Certos autores, como Teresa Billington-Greig na década de 1910, contestaram veementemente algumas conclusões do relatório. Por exemplo, Albert Londres, um jornalista que fez a sua própria investigação sobre o TSH em Buenos Aires, constatou que a maioria das mulheres que viajava para a capital da Argentina estava perfeitamente ciente do que ia fazer. Contudo, a ideia de poder prover às necessidades vitais quotidianas e de poder sustentar as famílias era mais importante do que qualquer ideologia moralista. Numa perspetiva bem mais humanista – e realista – do que a da comissão de peritos, o escritor analisa, in loco, as relações humanas complexas entre proxenetas e prostitutas ou ainda as diferenças entre os proxenetas franceses e os polacos (os primeiros falavam diretamente com as prostitutas mais miseráveis e mais

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É de notar que a categorização simplista dos atores envolvidos e das ações criminosas revelam uma óbvia inadequação a uma realidade cuja complexidade e opacidade impedem qualquer análise categorial. 24

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bonitas que encontravam na rua, os segundos faziam negócio com as famílias das jovens mulheres). Albert Londres define os contornos de um quadro no qual o leitor atento pode observar as condições de vida das prostitutas, a pobreza que leva as mulheres a partirem para destinos incertos, a exploração da mulher ou ainda a corrupção da polícia, dos estados, dos consulados e dos padres. O último capítulo do seu livro, intitulado Le chemin de Buenos Aires (1927, pp. 255-263), resume perfeitamente as suas opiniões das quais extraio uma série de citações dada a objetividade e precocidade da sua crítica.

A Sociedade das Nações está há três anos a realizar em segredo um vasto inquérito sobre o tráfico de brancas. Foram enviados comissários para o Extremo-Oriente, para o Canadá, para a América do Sul, para o Oriente. Estes comissários andaram a passear. Engoliram pó, o pó da estrada e o pó dos processos. Procuraram a verdade nos processos! (…) Os comissários da Sociedade das Nações querem organizar a virtude sobre a terra. (…) Que os países de mentalidade primitiva, como os Estados Unidos da América, limpem a fachada e escondam a imundice no interior, que instalem a intolerância pensando suprimir a tolerância; tanto melhor se só precisam de aparência. (…) Os virtuosos do planeta agem como se a mulher fosse uma planta. Trabalham para a supressão da cultura do sexo feminino! É uma caça não às causas que fazem uma mulher infeliz, mas à mulher em si mesma. (…) O romance. O romance da jovem mulher enganada. É uma bela história para fazer as mães chorar. É só uma história. A mulher forçada sabe onde se dirigir. Vejamos mais profundamente. Não é um romance que então encontramos, é um drama. O drama das polacas. O drama das francesas. Essas baixam a cabeça. Elas sabem o caminho que estão a levar. Seguem o proxeneta como o doente segue o cirurgião. Elas sabem que vai doer, mas talvez sejam salvas. O drama da miséria da mulher. O rufião não a cria: explora o que encontra. Se ele não encontrasse esta mercadoria, não a venderia. Mas ele sabe quem a fabrica. Ele conhece a fábrica de onde sai esta matéria-prima, a grande fábrica: a Miséria.

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(…) A miséria é como o estado. Só a conhece quem lá vive. Os outros nem sequer pensam sobre ela. E quando, por vezes, falam dela, fazem-no como de um país que nunca visitaram, ou seja, só dizem disparates. (…) Os missionários da Sociedade das Nações que foram passear em nome do tráfico de brancas vão concluir em nome da moral. Vão falar do que se deve fazer, do que não se deve fazer, do mal e do bem. Vão falar do que se vê. O mais escandaloso, prestem bem atenção, não é que o problema exista, é que o vemos. (…) Enquanto houver desemprego. Enquanto as meninas tiverem frio, tiverem fome. Enquanto elas não tiverem onde dormir. Enquanto a mulher não ganhar o suficiente para se dar ao luxo de ficar doente. Para se dar ao luxo, vejam bem até onde vai a pretensão, de comprar um casaco de inverno. De alimentar a sua família, a sua criança. Enquanto deixarmos o rufião substituir-nos para lhe oferecer um prato de sopa. Queimem as casas de alterne, excomunguem as suas cinzas. Só terão feito um fogo e grandes gestos. A responsabilidade é nossa. Não nos iludamos.30

Outro problema relativo ao relatório de 1927 foi a sua contribuição para a legitimação do discurso antissemita porque, segundo os peritos, um número elevado de prostitutas e de traficantes seria de origem judia. Estes resultados não passaram despercebidos na Alemanha onde, em 1929, a extrema-direita e o antissemitismo estavam já ancorados no palco político. Não é de todo inútil realçar que um dos resultados particularmente nefastos do relatório da Sociedade das Nações foi a internacionalização da equação entre o tráfico de mulheres e o judaísmo, o que parece contraditório à luz do principal objetivo da Sociedade que era promover a paz. Erich Fromm, sociólogo e psicanalista da Escola de Francoforte, interessou-se pelas razões psicológicas que podiam explicar a diferença entre a opinião dos 30

Tradução da autora. 26

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especialistas que negavam a existência de uma organização internacional única – com um elevado número de judeus – responsável pelo TSH, e a opinião política e pública que continuava a acreditar na existência de tal organização. Segundo o sociólogo, o fenómeno real era marginal comparativamente ao interesse mediático. Fromm chamou a este fenómeno uma “contradição bizarra” (Fromm, 1929, p. 295). Numa análise das estruturas psicológicas profundas do mito da escravatura branca, Fromm realça o facto de a vida ser marcada por sonhos e fantasias infantis nos quais o pai encarna a figura pérfida. As histórias das raparigas vendidas refletem este imaginário: a malvada figura paterna. No contexto alemão, cujo traficante primordial é o judeu, a figura paterna é central. O povo judeu é considerado o mais antigo, o pai dos jovens povos cristãos. Neste sentido, o ódio ao pai é justificado através do ódio dos cristãos ao pai judeu. Fromm pensa também que este fator psicológico é uma das razões para uma mulher se tornar prostituta: o desejo de se vingar da figura paterna. O aspeto particularmente interessante – e original – deste artigo é o facto de Fromm se interessar não no TSH em si mesmo, mas nas razões psicológicas para a veiculação mediática maciça deste fenómeno. É exposta, no segundo capítulo, a análise do rumor de Orleães de Edgar Morin (1969) que demonstra que o rumor dos traficantes judeus não foi característico apenas dos anos 1930, nem apenas da Alemanha. A análise dos ensaios, relatórios, artigos e livros apontam para a ideia de que o combate ao tráfico de escravas brancas foi, pelo menos até ao fim da Segunda Guerra Mundial, uma luta contra a prostituição. No fundo, numa sociedade cuja moralidade vitoriana prevalecia, eram os comportamentos sexuais desviantes que estavam em causa. A influência incessante das opiniões abolicionistas é ainda evidente no preâmbulo da Convenção da Organização das Nações Unidas em 1949:

Considerando que a prostituição e o mal que a acompanha, a saber, o tráfico de pessoas com vista à prostituição, são incompatíveis com a dignidade e o valor da pessoa humana e põem em perigo o bem-estar do indivíduo, da família e da comunidade.31 (ONU, 1949)

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Itálico da autora. 27

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Esta perspetiva é ainda hoje defendida. Segundo Malka Marcovich, representante europeia da Coalition Against Trafficking in Women, “em 1927 e 1932, a Sociedade das Nações conduziu duas grandes investigações que estabeleceram que a existência de bordéis e a regulamentação da prostituição favorecem o tráfico nacional e internacional” (Marcovich & Hazan, 2002, p. 40). Resumindo, o mito do tráfico de escravas brancas foi explorado pela imprensa sensacionalista europeia ao ponto de chamar a atenção dos governos que acabaram por promulgar leis restritivas em relação à prostituição e à mobilidade de mulheres isoladas, não obstante as investigações e publicações de alguns observadores que constatavam não existirem provas suficientes que confirmassem a amplitude do fenómeno. Quando o relatório de 1927 da Sociedade das Nações foi publicado, o que eram ideias e opiniões, enfim rumores e boatos, tornaram-se numa realidade indiscutível pois tinham sido cientificamente provados. De acordo com Chaumont,

Neste processo a peritagem não está em jogo, mas tem sem dúvida um papel definitivo. É através dela que se materializa a metamorfose filosófica de uma crença ideológica numa verdade científica e politicamente instrumentalizável. Torna-se assim clara a importância das ciências humanas em geral, e da sociologia em particular, na maneira como a elite e o senso comum interpretam a realidade.32 (Chaumont, 2008).

A denúncia do TSH serviu sempre vários e diferentes interesses: interesses morais (a cruzada contra a prostituição e contra a libertinagem); interesses ideológicos (a denúncia do patriarquismo e a denúncia da perda dos valores morais e religiosos); interesses pragmáticos (o reforço da repressão da imigração ilegal). Paralelamente, os discursos divergem segundo os interesses que defendem: as feministas sublinham o papel dos atores masculinos; os socialistas relevam a importância do liberalismo mundial; na sua vertente religiosa, os discursos realçam a perda dos ideais morais e espirituais. Uma das consequências diretas desta polifonia é a falta de uma política cujos objetivos sejam dar dignidade e reconhecer o estatuto profissional a nível jurídico das 32

Tradução da autora. 28

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O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

prostitutas e, mais precisamente, das prostitutas estrangeiras em território nacional. Outra consequência, a nível da opinião pública, é o desprezo social e moral face à “mais velha profissão do mundo”.

1.2 A evolução dos mecanismos jurídicos após a Segunda Guerra Mundial Como já foi referido, no início do século XX o Direito Internacional demonstrava um crescente interesse pelo tráfico de escravas brancas. Os primeiros instrumentos legais denotam contudo um certo racismo (escravas brancas33), direcionam-se exclusivamente a meninas e mulheres e mencionam apenas a exploração sexual. O primeiro instrumento legal relativo ao fenómeno surge com o Arrangement international en vue d’assurer une protection efficace contre le trafic criminel connu sous le nom de “Traite des Blanches” em 1904 e tem por objetivo combater o recrutamento de meninas e mulheres para fins imorais no estrangeiro. A Convenção de 1910 desenvolve em seguida a ideia de punição dos proxenetas. Porém a punição limita-se a situações nas quais é utilizada a violência e a fraude. O tratado não é suscetível de ser adotado à exploração sexual no interior país, o que seria considerado assunto da legislação nacional. No caso de tráfico de menores – mesmo consentido – há sempre o resgate do menor. Este último detalhe realça um discurso de controlo da sexualidade das jovens pois, por exemplo, se uma jovem de vinte anos fugisse de casa e fosse encontrada com um amante, ela seria enviada para casa dos pais (ou para um centro de acolhimento) e ele poderia ser acusado de sequestrador. A autonomia e a sexualidade femininas tornam-se uma preocupação moral subjacente ao fenómeno. A primeira convenção da Sociedade das Nações, em 1921, cria uma Comissão

33

Depois da Revolução Francesa, em 1789, evoluíram pensamentos humanistas e humanitários. Nos países industrializados a escravatura africana foi abolida, no decorrer do século XIX e defendiam-se ideais que se tornariam, eventualmente, o corpus dos Direitos Humanos. Estava em curso, nas sociedades ocidentais, uma profunda transformação a nível das mentalidades e da esperança no progresso humano. Neste contexto, parecia inverosímil que ainda existisse escravatura, especialmente porque, estando numa época marcada pelo imperialismo, pelo colonialismo e o resultante racismo, as “escravas” pertenciam à dita “raça superior”. 29

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Consultiva para o Tráfico de Mulheres e Crianças, aumentando o raio de ação legislativo ao incluir especificamente, a palavra “crianças” e ao excluir a palavra “brancas”. Depois da Segunda Grande Guerra, a recém-fundada ONU criou um instrumento legal contra o tráfico de pessoas que permanecerá quase intacto até 2000, a Convenção para a repressão do tráfico de seres humanos e exploração da prostituição de outrem34. Este tratado é uma verdadeira vitória para os adversários da prostituição, sendo punido quem:

Artigo 1º 1) Alicie, atraia ou desvie com vista à prostituição uma outra pessoa, mesmo com o acordo desta; 2) Explore a prostituição de uma outra pessoa, mesmo com o seu consentimento. Artigo 2º 1) Detenha, dirija ou conscientemente financie ou contribua para o financiamento de uma casa de prostituição; 2) Dê ou tome conscientemente em locação, no todo ou em parte, um imóvel ou um outro local com a finalidade de prostituição de outrem. (ONU, 1949)

Por outras palavras, a referida Convenção foi uma condenação geral da prostituição, resultando na não adesão de vários países que tinham assinado as convenções anteriores. A crítica realça a estigmatização presente na confluência das duas práticas. E a velha questão permanece: dever-se-á criminalizar a prostituição? A perspetiva abolicionista prevalece até aos anos 1990 quando o assunto volta a aparecer na agenda internacional. Em 2000, a Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade transnacional35, (ONU, 2000) foi assinada por oitenta países. A Convenção pretende prevenir e combater a criminalidade organizada transnacional de forma mais efetiva. Para tal são reguladas, entre outros: a cooperação internacional para combater o branqueamento de capitais

34

Entrou em vigor na ordem jurídica internacional em 25 de julho de 1951 e em Portugal em 30 de setembro de 1992. 35 Entrou em vigor na ordem jurídica internacional em 29 setembro 2003 e em Portugal em 9 de junho de 2004. 30

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ilegais (artigos 6º e 7º), a criminalização da corrupção (artigos 8º e 9º), a extradição de criminosos (artigo 16º), o apoio judiciário entre países (artigo 18º), a partilha de técnicas de investigação no âmbito da cooperação internacional (artigos 19º e 20º), a proteção das testemunhas (artigo 24º) e a assistência às vítimas (artigo 25º). Um dos protocolos da Convenção é o Protocolo adicional à Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade organizada transnacional relativo à prevenção, à repressão e à punição do tráfico de pessoas, em especial de mulheres e crianças (2000)36 e, como o título indica, trata exclusivamente do TSH, instituindo as seguintes definições de jure no artigo 3º:

a) Por “tráfico de pessoas” entende-se o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou ao uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou de uma situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tem autoridade sobre outra, para fins de exploração. A exploração deverá incluir, pelo menos, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, a escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a extração de órgãos; b) O consentimento dado pela vítima de tráfico de pessoas tendo em vista qualquer tipo de exploração descrito na alínea a) do presente artigo deverá ser considerado irrelevante se tiver sido utilizado qualquer dos meios referidos na alínea a); c) O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de uma criança para fins de exploração deverão ser considerados “tráfico de pessoas” mesmo que não envolvam nenhum dos meios referidos na alínea a) do presente artigo; d) Por “criança” entende-se qualquer pessoa com idade inferior a 18 anos.

A convenção e os protocolos da ONU são os mecanismos jurídicos universais relativos ao fenómeno do TSH. Estes instrumentos contêm uma definição geral mais abrangente e universalmente aplicável da expressão “tráfico de seres humanos” e 36

Este diploma, também conhecido por Protocolo de Palermo foi adotado em Palermo (Itália) e ratificado em Portugal pelo Decreto do Presidente da República nº 19/2004 de 2 de abril. 31

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estabelecem os padrões mínimos para prevenir e combater o TSH, prestando uma especial atenção às mulheres e às crianças; para proteger as vítimas, respeitando os seus direitos fundamentais; e para promover a cooperação entre os Estados Partes (artigo 2º do Protocolo de Palermo). Todavia, o Protocolo aplica-se apenas quando as infrações são de natureza transnacional e quando são cometidas por grupos criminosos organizados (artigo 5º). No que diz respeito à proteção das vítimas (artigo 6º), cada Estado Parte tem a obrigação de proteger a identidade e a privacidade da vítima; de a informar e assistir nos processos judiciais e administrativos; de facultar alojamento, aconselhamento, assistência médica, psicológica e material, e de possibilitar oportunidades de emprego, educação e formação. Os Estados Partes devem considerar a possibilidade de adotar medidas legislativas que permitam às vítimas do TSH permanecerem em território nacional de forma temporária ou permanente (artigo 7º). No que toca ao repatriamento (artigo 8º), os Estados Partes devem assegurar que esta medida tenha em conta a segurança da pessoa. Se a vítima não possui documentos legais, o Estado Parte do qual a vítima é nacional ou no qual esta tenha direito de residência deve emitir os documentos de viagem necessários e o Estado Parte de acolhimento deve facilitar sem demora o seu regresso. O Protocolo de Palermo aborda ainda a prevenção do TSH (artigo 9º) através de medidas tais como pesquisas, campanhas de sensibilização e cooperação com ONG. As medidas culturais e sociais são também encorajadas. Os Estados Partes responsabilizamse igualmente pela formação dos funcionários dos serviços competentes (de imigração, fronteiriços ou outros). A formação deve incidir sobre os métodos utilizados para prevenir o TSH, para perseguir judicialmente os traficantes e para proteger e respeitar os direitos das vítimas (artigo 10º). Para além dos referidos diplomas da ONU, existem diversos instrumentos regionais dos quais o mais importante a nível europeu é a Convenção do Conselho da Europa relativa à luta contra o tráfico de seres humanos (2005)37. O aspeto inovador

37

Entrou em vigor na ordem jurídica internacional em 1 de fevereiro de 2008 e em Portugal em 1 de junho de 2008. 32

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desta Convenção é a inserção de três componentes-chave: o país de origem, os países de trânsito e o país de destino. Essa abordagem concebe uma harmonização e colaboração ao nível das instituições públicas relevantes e das organizações da sociedade civil de cada Estado Parte (nomeadamente em recursos humanos, formação, informação sobre os países de origem, controlos de implementação e proteção das vítimas). Foi também constituído o Grupo de Peritos sobre a Luta contra o Tráfico de Seres Humanos do Conselho da Europa, GRETA38, que se edifica sobre três pilares através da revisão da legislação comunitária: a prevenção das atividades de tráfico, a proteção e o apoio às vítimas e a detenção eficaz dos traficantes. Além da Convenção de 2005, o Conselho da Europa adotou mais duas convenções numa tentativa destinada a criar instrumentos jurídicos fundamentais que fixariam as normas mínimas de proteção a nível europeu. A Convenção do Conselho da Europa para a proteção das crianças contra a exploração sexual e os abusos sexuais (2007)39 e a Convenção do Conselho da Europa para a prevenção e o combate à violência contra as mulheres e a violência doméstica (2011)40. O combate ao TSH é também abrangido pela Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE). Em 2003, foi criado um Gabinete assim como um Representante Especial e Coordenador para Combater o Tráfico de Seres Humanos. O Representante Especial visita regularmente os Estados da OSCE e produz relatórios sobre as políticas nacionais referentes ao fenómeno, assim como recomendações dirigidas aos Estados. A OSCE criou ainda a Alliance against Trafficking in Persons, um fórum internacional que inclui ONG e organizações intergovernamentais, para promover a cooperação e coordenação entre os diversos intervenientes. Na linha da Convenção de Palermo e da Convenção do Conselho da Europa, a União Europeia (UE) adotou, em 2002, a Decisão-Quadro 2002/629/JAI do Conselho de

38

O GRETA é composto por quinze peritos escolhidos pela experiência e competência no domínio dos Direitos Humanos, da proteção da vítima do TSH. O objetivo do GRETA é avaliar a implementação da Convenção do Conselho da Europa pelas partes signatárias. A primeira avaliação decorreu de 2010 a 2013. 39 Início de vigência em Portugal em 1 de dezembro de 2012. 40 A entrada em vigor na ordem jurídica portuguesa estava prevista até 31 de janeiro de 2014, estando pendente da entrada em vigor na ordem internacional. 33

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19 de julho de 2002 relativo à luta contra o tráfico de seres humanos 41, bem como um plano sobre melhores práticas, normas e procedimentos para combater o tráfico. Embora não seja considerado um tratado no sentido usual, a adoção de uma decisãoquadro impôs obrigações específicas aos Estados-Membros da UE e também a países candidatos, para garantir que suas leis e práticas estejam em conformidade com as suas disposições substantivas. A Decisão-Quadro 2002/629/JAI do Conselho foi substituída pela Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 201142, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas. Este instrumento jurídico caracteriza-se por oferecer um regime centrado na defesa dos Direitos Humanos, implementando mecanismos de proteção e assistência às vítimas. É seguida uma abordagem dos “Três P” (Prevenção do crime, Proteção das vítimas e Perseguição penal dos infratores) inspirada na Convenção do Conselho da Europa a que se soma uma ordem jurídica mais vinculativa, como é a da UE. Ainda em relação à proteção das vítimas, a UE adotou a Diretiva 2012/29/EU, de 25 de outubro de 201243, estabelecendo os níveis mínimos dos direitos, assistência e proteção das vítimas. É também de mencionar que a Comissão Europeia adotou, em 2012, a “Estratégia da União Europeia para a erradicação do tráfico de seres humanos (2012-2016)”44. Esta estratégia é um conjunto de medidas concretas que incluem o estabelecimento de unidades nacionais responsáveis pela aplicação da lei no domínio do TSH, a criação de equipas de investigação conjunta a nível europeu com o objetivo de julgar e condenar os casos transfronteiriços, a prestação de informações claras às vítimas sobre os seus direitos ao abrigo da legislação da UE e a criação de um sistema de monitorização único. A nomeação de um coordenador europeu representa um marco importante, dado que a sua missão é de melhorar a coordenação entre as diversas instituições e agências da UE.

41

Publicada no Jornal Oficial da União Europeia JO L 203 de 1.8.2002, 1-4. Publicada no Jornal Oficial da União Europeia JO L 101 de 15.4.2011, 1-11. 43 Publicada no Jornal Oficial da União Europeia JO L 315 de 14.11.2012, 57-73. 44 http://ec.europa.eu/home-affairs/doc_centre/crime/docs/trafficking_in_human_beings_eradication2012_2016_fr.pdf. 42

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Os princípios europeus no domínio da privacidade e confidencialidade das vítimas em processos criminais e da compensação às vítimas de crime promovem a colaboração destas pessoas e ajudam a ação judicial apelando à proteção, nomeadamente através do secretismo das suas identidades. Apesar disso, os instrumentos jurídicos internacionais revelam alguns problemas e contradições a nível nacional. Por exemplo, se uma vítima do TSH renuncia à identificação dos infratores, pode tornar-se num trabalhador imigrante em situação irregular, sujeitando-se ao risco de expulsão45. Veremos, em pormenor, as dificuldades legais portuguesas relativas à concessão de autorização de residência na secção subsequente do presente capítulo. No que se refere à identificação da vítima, os Estados-Membros desenvolvem, atualmente, mecanismos nacionais de monitorização. Porém, onde estes existem, permanecem hierarquias morais da parte das autoridades, sendo destas que depende a sinalização de uma vítima. No fundo, tudo depende da forma como o agente policial vai encarar uma vítima como merecendo mais ajuda, merecendo uma atenção relativa ou não merecendo qualquer tipo de apoio. É ainda de realçar que as organizações internacionais não têm autoridade nem capacidade para exercer as funções estatais de proteção. Os instrumentos jurídicos internacionais apenas reconciliam os interesses do Estado com questões de proteção da vítima. O facto de os instrumentos internacionais oferecerem uma definição da vítima ainda muito ligada ao tipo paradigmático de tráfico violento associado ao crime organizado, torna a identificação das vítimas mais difícil, escapando as situações menos óbvias. Por exemplo, no tocante ao trabalho sexual, a linha que separa a prostituição da exploração sexual é ténue. Neste contexto, o parágrafo 84 do Relatório explicativo sobre a Convenção do Conselho da Europa relativa à luta contra o tráfico de seres humanos realça o seguinte:

Os meios [para avaliar a situação de vulnerabilidade] considerados são vários: pode tratar-se de rapto de mulheres para exploração sexual, de sedução de crianças para

45

A Diretiva 2004/81/CE obriga os Estados-Membros a introduzir normas em matéria de autorizações de residência concedidas às vítimas do TSH se estas cooperarem com as autoridades na identificação das redes criminosas. 35

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as utilizar em redes pedófilas ou de prostituição, de violências cometidas pelos proxenetas para manter as prostitutas sob controlo, de abusos da vulnerabilidade de um adolescente ou de uma pessoas adulta vítima de violências sexuais, ou de abuso da precariedade e da pobreza de uma pessoa adulta que deseja uma situação melhor para ela ou para a família. Mas estes casos diferentes constituem mais as diferenças de nível do que da natureza de um fenómeno que pode ser sempre qualificado de tráfico e que consiste em utilizar estes métodos. (Conselho da Europa, 2005)

No caso específico do TSH para exploração sexual é também necessário analisar a as legislações nacionais relativas à prostituição: se na maioria dos países ocidentais a prostituição não é ilegal46, nos países muçulmanos é um crime punível com pena de morte. Neste sentido, o combate ao TSH não pode estar dependente de uma convenção universal e tem de se adaptar à cultura das zonas de ação. Dada esta realidade, desenvolveram-se soluções regionais além da ratificação dos instrumentos internacionais acima descritos. O desenvolvimento de tais soluções implica uma reflexão de realidades específicas e, por conseguinte, uma resposta mais adequada perante características particulares e contextos culturais e sociais de cada região. De natureza pragmática, as soluções regionais implicam uma coordenação e cooperação de um conjunto de Estados que partilham as mesmas necessidades e problemas. Os sistemas regionais identificam-se com os continentes. Por exemplo, no continente africano existem, especificamente, o Constitutive Act of the African Union (2000); African Charter on human and peoples’ rights (1981) e o Protocol relating to the rights of women (2002); African Charter on the rights and welfare of the child (1990) e a African common position on children (Declaration and plan of action (2001). Outros exemplos regionais são a Convention on preventing and combating trafficking in women and children for prostitution (Convenção SAARC), concluída em 2002 pelos Estados membros da South Asian Association for Regional Cooperation, ou ainda a Inter-American Convention on international traffic in minors, desenvolvida sob os auspícios da Organização dos Estados Americanos (OEA), que entrou em vigor em 1997. 46

Os países da UE onde a prostituição é formalmente interdita são a Lituânia e a Roménia. 36

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No que diz respeito às crianças, além da Convenção sobre os direitos da criança47, existe outro instrumento jurídico universal, o Protocolo facultativo à Convenção sobre os direitos da criança relativo à venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil48. A Convenção sobre os direitos da criança é um tratado dos Direitos Humanos que expõe os direitos cívicos, políticos, económicos, sociais, culturais e em matéria de saúde das crianças. O artigo 34º da Convenção apela aos Estados Partes a tomarem todas as medidas necessárias para proteger a criança contra todas as formas de exploração sexual, nomeadamente contra a prostituição e a participação em qualquer produção de caráter pornográfico. O Protocolo facultativo à Convenção realça a vulnerabilidade especial das meninas à exploração sexual ao constatar que representam uma grande parte das vítimas deste tipo de exploração. Para lutar contra a exploração sexual das crianças, o Protocolo estabelece a necessidade de reduzir a procura por parte dos consumidores de prostituição e pornografia infantil. A nível europeu, o Conselho da Europa adotou a Convenção do Conselho da Europa para a proteção das crianças contra a exploração sexual e os abusos sexuais49 na linha da Decisão-Quadro do Conselho da União Europeia relativa à luta contra a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil (2004/68/JAI)50. Também a Organização Internacional do Trabalho (OIT) adotou uma série de Convenções relativas ao trabalho forçado51 e à eliminação do trabalho infantil52.

47

Adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1989 e ratificada por Portugal em 21 de setembro de 1990. 48 Adotada em 2000 pela Assembleia Geral das Nações Unidas (entrada em vigor em Portugal em 16 de junho de 2003). 49 Entrou em vigor na ordem internacional em 1 de julho de 2010 e ratificada em Portugal em 28 de maio de 2012. 50 Publicada no Jornal Oficial da União Europeia JO L 13 20.1.2004, 44-48. 51 Ver, a título de exemplo, a Convenção 29 relativa ao trabalho forçado ou obrigatório, entrada em vigor na ordem internacional em 1 de maio de 1932 e na ordem nacional em 26 de junho de 1957; a Convenção 105 relativa à abolição do trabalho forçado, entrada em vigor na ordem internacional em 17 de janeiro de 1959 e na ordem nacional em 23 de novembro de 1960; e a Convenção 143 relativa às imigrações efetuadas em condições abusivas e sobre a promoção de igualdade de oportunidades e de tratamento dos trabalhadores imigrantes, entrada em vigor na ordem jurídica internacional em 9 de dezembro de 1978 e na ordem jurídica portuguesa em 12 de dezembro de 1979. 52 Ver, a este propósito, a Convenção 182 relativa à interdição das piores formas de trabalho das crianças e à ação imediata com vista à sua eliminação, entrada em vigor na ordem internacional em 18 de novembro de 2000 e na ordem nacional em 15 de junho de 2001. 37

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Por fim, lembremos que o dia 18 de outubro foi designado pela Comissão Europeia como o Dia Europeu contra o Tráfico de Seres Humanos.

1.3 Tráfico de pessoas e auxílio à imigração ilegal Existe uma distinção legal entre TSH e auxílio à imigração ilegal. No direito internacional, como foi dito anteriormente, o TSH é definido como o recrutamento, transporte, transferência, acolhimento ou receção de pessoas com recurso a ameaças ou ao uso da força, ou outras formas de coerção ou fraude, para fins de exploração. De acordo com esta definição, o TSH é independente do consentimento da vítima e constitui uma violação dos Direitos Humanos. Pelo contrário, o conceito de auxílio à imigração ilegal refere-se a transações consentidas nas quais o facilitador e o imigrante concordam em iludir os controlos de imigração. Em suma, o TSH é um crime contra a liberdade pessoal e o auxílio à imigração ilegal é um crime contra a soberania e a segurança do Estado. Assim, a incriminação do TSH implica a esfera da defesa dos Direitos Humanos que não existe na incriminação do auxílio à imigração ilegal. Segundo o glossário da Organização Internacional para a Migração (OIM), a expressão “contrabando de pessoas” (people smuggling) tem a seguinte definição:

Com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, um benefício financeiro ou outro benefício material, e facilitar da entrada ilegal de uma pessoa num Estado do qual a pessoa não é nacional ou residente permanente (alínea a do artigo 3º do Protocolo da ONU contra o contrabando de migrantes por terra, mar e ar, que complementa a Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade organizada transnacional, de 2000). O contrabando, diferentemente do tráfico, não exige um elemento de exploração, coação ou violação dos Direitos Humanos. (OIM, 2009, p. 15)

Além do Protocolo das Nações Unidas contra o contrabando de migrantes por terra, mar e ar, que complementa a Convenção das Nações Unidas contra a

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criminalidade organizada transnacional (ONU, 2000), também a UE impôs uma distinção entre o TSH e o auxílio à imigração ilegal de acordo com a Diretiva 2002/90/CE53. A nível nacional, a Lei de Estrangeiros54 inclui, no artigo 183º a definição do crime de auxílio à imigração ilegal55. Podem todavia existir convergências entre o contrabando de migrantes e o TSH e, por conseguinte, uma distinção clara entre os dois fenómenos não é possível em todos os casos. O estatuto de um migrante isolado e o grau de exploração a que foi sujeito varia no decurso de uma viagem. Por exemplo, uma pessoa pode ter entrado de forma legal e de livre vontade num país mas à chegada serem-lhe confiscados os documentos e imposto condições de servidão. Outra expressão usada recorrentemente é “migração irregular”, definida da seguinte maneira:

Movimento que ocorre fora do âmbito das normas reguladoras dos países de envio, de trânsito e de acolhimento. Não existe uma definição clara ou universalmente aceite para migração irregular. Da perspetiva dos países de destino a entrada, a permanência e o trabalho num país é ilegal, sempre que o migrante não tenha a necessária autorização ou os documentos exigidos pelos regulamentos de imigração relativos à entrada, permanência ou trabalho de um dado país. Da perspetiva do país de envio a irregularidade é vista em casos em que, por exemplo, uma pessoa atravessa a fronteira internacional sem um passaporte válido ou documentos de viagem ou não preenche os requisitos administrativos para deixar o país. (OIM, 2009, p. 42)

O migrante clandestino, ao infringir as normas de admissão, não tem estatuto legal no país de acolhimento. E é precisamente neste ponto, nos vazios da legislação, que se revelam os problemas da identificação da vítima do TSH. Por exemplo, na legislação portuguesa, se a vítima não exprime vontade de colaborar enquanto testemunha ou se a colaboração se revela desinteressante para as investigações, não recebe uma

53

Publicada no Jornal Oficial da União Europeia JO L 328, 5.12.2002, 1-3. Lei nº 23/2007, de 4 de julho alterada pela Lei nº 29/2012 de 9 de agosto, República Portuguesa. 55 Nº 1 do Artigo 183º: “Quem favorecer ou facilitar, por qualquer forma, a entrada ou o trânsito ilegais de cidadãos estrangeiros em território nacional é punido com pena de prisão até três anos”. 54

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autorização de residência temporária.56 Ora, tendo em conta o perigo que tais declarações envolvem não só para a vítima como para os seus familiares, os interessados preferem, muitas vezes, renunciar aos seus direitos como vítimas. Nestes casos, a vítima torna-se num mero imigrante ilegal e fica sujeita ao risco de expulsão.57 De facto, é o consentimento das vítimas que está em causa no tocante à distinção entre TSH e auxílio à imigração ilegal. E é esta distinção que dificulta uma quantificação objetiva. A fronteira entre o consentimento e o engano é obscura, existindo vários tipos de vitimização. Por exemplo (Sousa, Gomes & Duarte, 2010, pp. 89-113), em relação ao TSH para exploração sexual, o primeiro nível corresponde à total coerção. Aqui o consentimento é nulo. O segundo nível concerne as vítimas que foram logradas com promessas de emprego. O terceiro nível diz respeito às vítimas que sabem que vão trabalhar na indústria do sexo, mas não na prostituição. O quarto nível refere-se àquelas pessoas que sabiam que iam trabalhar na prostituição mas ignoravam o nível de exploração ao qual estariam submetidas. O mesmo se passa em relação à migração ilegal. Muitas vítimas partiram de livre vontade mas não são libertadas à chegada (Europol, 2011). Contudo, de acordo com diversos estudos (Machado et al., 2010; Kempadoo & Doezema, 1998), a maioria dos imigrantes irregulares não acaba em situação de escravatura. Assim que a dívida ao facilitador tenha sido paga, o imigrante fica livre para prosseguir o próprio trabalho. Em todos os casos, quer no auxílio à imigração ilegal quer no TSH, há sempre uma terceira categoria de atores que se interpõe entre os migrantes e os controladores fronteiriços: os traficantes/facilitadores. Estes agentes e a extensão geográfica do seu poder são pouco conhecidos devido à natureza furtiva destas atividades. O que se sabe

56

É de notar que o nº 1 do artigo 109º da Lei de Estrangeiros da legislação portuguesa prevê a concessão de “autorização de residência ao cidadão estrangeiro que seja ou tenha sido vítima de infrações penais ligadas ao tráfico de pessoas ou ao auxílio à imigração ilegal, mesmo que tenha entrado ilegalmente no país ou não preencha as condições de concessão de autorização de residência”. Contudo, o nº 2 do referido artigo esclarece que a dita autorização de residência é concedida desde que: “a) Seja necessário prorrogar a permanência do interessado em território nacional, tendo em conta o interesse que a sua presença representa para as investigações e procedimentos judiciais; b) O interessado mostre vontade clara em colaborar com as autoridades na investigação e repressão do tráfico de pessoas ou do auxílio à imigração ilegal; e c) O interessado tenha rompido as relações que tinha com os presumíveis autores das infrações referidas no número anterior”. 57 Artigo 145º da Lei de Estrangeiros. 40

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é que a entrada clandestina pode ser efetuada por organizações de crime organizado ou por um grupo ou pessoa isolada. Segundo a Europol, poucos grupos de crime organizado têm a capacidade de gerir todas as etapas da travessia do país de origem ao país de destino. Ao longo da viagem os migrantes ilegais são alojados em casas controladas por pequenos grupos criminosos que facilitam a passagem para a próxima etapa. Muitas vezes a duração destas estadias temporárias é longa e durante a espera os migrantes podem ser explorados em trabalho ilícito (Europol, 2011). Ainda segundo o relatório da Europol, os grupos de crime organizado que facilitam a migração ilegal são de origem chinesa, turca, albanesa, indiana, iraquiana e russa. As redes criminosas que controlam os migrantes desde a origem até ao destino são de origem chinesa, vietnamita, indiana, paquistanesa e provenientes da África ocidental. A Europol constata também que as redes brasileiras estão em crescimento. Já em relação ao TSH as redes criminosas mais perigosas são chinesas, nigerianas e romenas (de etnia cigana). As vítimas chinesas são, geralmente, exploradas na indústria dos têxteis (sweatshops), os europeus de Leste na agricultura, os sul-americanos e asiáticos na indústria do sexo, os ciganos no roubo e na mendicidade. (…) As empregadas domésticas angolanas são exploradas por compatriotas ricos em Portugal. (Europol, 2011: 20)

As formas de entrar ilegalmente nos países são múltiplas (por via terrestre, marítima ou aérea) e os meios utilizados diferem em cada situação (a pé, de comboio, autocarro, carro, camião, navio ou ferry, barco ou barco de borracha). A rota seguida e os meios utilizados determinam a segurança da viagem. Geralmente “são as organizações criminais que estudam os riscos dos percursos, ao passo que o migrante, na maior parte dos casos, não tem consciência dos mesmos” (Chiuri, Conglio & Ferri, 2010, p. 97). Em termos do registo de criminalidade associada à imigração ilegal, destacam-se os crimes de uso de documento falso/falsificado ou documento alheio, casamento de conveniência, auxílio à imigração ilegal e falsificação/contrafação de documentos. Em 41

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relação ao TSH, os delitos mais frequentemente envolvidos neste crime são o casamento de conveniência, o auxílio à imigração ilegal, o lenocínio, a angariação de mão-de-obra ilegal, a servidão por dívidas, o aborto forçado, extorsão, tortura, tratamento cruel, desumano ou degradante, violação, abuso sexual, ofensa à integridade física, homicídio, rapto, detenção dos documentos de identidade, lavagem de dinheiro, corrupção. Devido à linha ténue que diferencia estas infrações, a aplicação do Direito pode deixar dúvidas quanto à qualificação jurídica dos factos, resultando no perigo de a dimensão humana do TSH ser posta em segundo plano face às preocupações políticas em matéria de questões de segurança nacional. No entendimento de Paulo de Sousa Mendes:

Esse perigo é o seguinte: que o tipo legal de tráfico de pessoas se transforme, na prática, numa incriminação simbólica, como se fosse uma nobre bandeira dos Direitos Humanos que se desfralda na lei para efeitos de pura propaganda, ao mesmo tempo que o tipo legal de auxílio à imigração clandestina, cujos elementos são de prova menos exigente, acabaria cobrindo todas as situações descobertas de exploração sexual ou de exploração laboral de imigrantes. (Mendes, 2007, p. 8)

1.4 O Código Penal Português e o Observatório do Tráfico de Seres Humanos A consagração penal do THS no artigo 217º do Código Penal de 198258 definiu concretamente esta atividade e tem vindo, desde então, a sofrer alterações sucessivas, criando novas incriminações e desenvolvendo melhores condições de apoio às vítimas. Como já foi referido, o Protocolo de Palermo entrou em vigor em Portugal em 2004 e a Convenção do Conselho da Europa em 2008. O Código Penal, nomeadamente o artigo 160º da Lei 59/2007 de 4 de setembro59, a Secção V da Lei 23/2007 de 4 de julho60 e o

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Relembro que atualmente, o TSH está consagrado no artigo 160º do Código Penal. O artigo 160º do Código Penal intitula-se “Tráfico de Pessoas” e reproduz a definição do TSH do Protocolo de Palermo e da Convenção do Conselho da Europa. 60 A Lei nº 23/2007 de 4 de julho foi alterada pela Lei nº 29/2012 de 9 de agosto e intitula-se “Autorização de residência a vítimas do tráfico de pessoas ou de ação de auxílio à imigração ilegal”. Este diploma implementa, a nível nacional, o Regulamento (CE) nº 810/2009, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho, que estabelece o Código Comunitário de Vistos. 59

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Decreto-Lei nº 368/2007 de 5 de novembro61, demostram uma adaptação aos instrumentos jurídicos internacionais. O conceito de TSH foi reformulado para incluir outras atividades além da exploração sexual como a exploração laboral e a extração de órgãos (nº 1 do artigo 160º). Foram também associados outros crimes como a adoção ilegal (nº 4 do artigo 160º da lei 59/2007) e a retenção, ocultação, danificação ou destruição dos documentos de viagem e de identificação (nº 6 do artigo 160º da lei 59/2007). A pena de prisão é de três a dez anos (no caso de exploração de menores a pena poderá ir até doze anos mediante determinados critérios). A última evolução legislativa foi a Lei nº 60/2013 de agosto de 2013, que procede à 30ª alteração ao Código Penal e que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2011/36/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas. Esta lei abrange mais formas de exploração como a mendicidade por coerção, a escravidão e a exploração de outras atividades criminosas (nº 1 do artigo 160º). Acresce que as penas previstas são agravadas de um terço se a conduta neles referida “tiver colocado em perigo a vida da vítima; tiver sido cometida com especial violência; tiver sido cometida por um funcionário no exercício das suas funções; tiver sido cometida no quadro de uma associação criminosa; ou tiver como resultado o suicídio da vítima” (nº 4 do artigo 160º). As instituições portuguesas envolvidas na luta contra o TSH são a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG)62; o Observatório do Tráfico de Seres Humanos

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O Decreto-Lei nº 368/2007, de 5 de novembro, “Regime especial de concessão de autorização de residência a vítimas do tráfico de pessoas” abrange os direitos das vítimas de TSH. As pessoas sinalizadas como vítimas têm direito a um prazo de reflexão de 30 a 60 dias. Durante esse período é garantido o seu acolhimento, a sua subsistência, o acesso a tratamento médico, a assistência psicológica, a assistência de tradução e interpretação, bem como a assistência jurídica. Uma vítima de TSH tem direito a uma autorização de residência com a duração de um ano o qual pode ser renovada. Durante essa autorização de residência tem acesso a programas oficiais no sentido de promover a sua reinserção. 62 A CIG é organismo nacional responsável pela promoção e defesa do princípio da igualdade de género e garante a execução das políticas públicas neste domínio. A CIG é também responsável pela coordenação do Plano Nacional de Prevenção e Combate ao TSH. 43

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(OTSH); as forças policiais63; o Serviço dos Estrangeiros e Fronteiras (SEF)64; o Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP)65; o Instituto de Segurança Social (ISS)66 e a Comissão Técnica. Esta comissão inclui a CIG, a presidência do Conselho de Ministros (representado pelo Alto Comissariado para as Migrações, o Ministério da Administração Interna (representado pelo SEF e pelo OTSH), o Ministério de Justiça (representado pela PJ), o Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Ministério da Solidariedade e da Segurança Social e o Ministério da Saúde. O TSH é analisado em Portugal, desde 2007, através de um sistema de monitorização de georreferenciação. Este centro de recursos e de informação é complementado por mais dois dispositivos: a Sinalização, Identificação e Integração (serviço especificamente orientado para vítimas do TSH e para o seu acolhimento) e o Kit de Apoio à Formação (um manual dirigido aos agentes envolvidos na luta contra o TSH). O reforço da estratégia nacional nesta área é constituído nos planos nacionais contra o tráfico, existentes desde 2007 com duração trianual. As quatro áreas de estratégia são: 1) “Conhecer, sensibilizar e prevenir”; 2) “Educar e formar”; 3) “Proteger e assistir”; 4) “Investigar criminalmente e cooperar”. São também publicados relatórios anuais pelo OTSH e pelo Ministério da Administração Interna (MAI). No tocante à proteção da vítima, o Centro de Acolhimento e Proteção (CAP) a mulheres e jovens do sexo feminino e seus filhos menores foi criado a 2 de julho de 2008 através de um protocolo envolvendo a Presidência do Conselho de Ministros, o MAI e a Associação para o Planeamento da Família (APF). O centro assegura o acolhimento temporário das vítimas e dos seus filhos em condições de proteção e segurança e propõe apoio psicológico e social. Em junho de 2013 foi ainda formalizada a Rede de Apoio e

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A Polícia Judiciária (PJ) dá uma atenção particular ao crime violento e organizado. A Polícia de Segurança Pública (PSP) e a Guarda Nacional Republicana (GNR) estão presentes a nível local e são responsáveis pelos primeiros passos relativos à proteção da vítima. 64 O SEF é responsável pelas autorizações de residência, pelo controlo fronteiriço, pela monitorização dos estrangeiros em Portugal e pela coordenação e implementação de medidas relativas aos fluxos migratórios. 65 O DIAP é responsável pela direção da investigação e prevenção do crime organizado, incluindo o TSH, e é constituído por procuradores-gerais nas cidades de Lisboa, Porto, Coimbra e Évora. 66 O ISS foi criado em 2001 e tem por objetivo instituir um novo modelo de organização administrativa. Este instituto público assegura a aplicação dos acordos internacionais no âmbito do sistema da Segurança Social. 44

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Proteção às Vítimas do Tráfico (RAPVT). Abriu, também em 2013, um centro de acolhimento exclusivo para homens vítimas do TSH gerido pela ONG Saúde em Português. A implementação do OTSH, em 2008, permitiu um maior conhecimento sobre o fenómeno do TSH, contribuindo de forma assinalável para o despertar da opinião pública e do poder político. O OTSH desenvolve também o combate aos estereótipos numa perspetiva de género com objetivo de consolidar a consciencialização com vista à prevenção. A este respeito destaca-se a assinatura, no Dia Europeu contra o Tráfico de Seres Humanos em 18 de outubro de 2012, de um Memorando de Entendimento com 10 entidades (governamentais e não-governamentais) e de um Protocolo (ProcuradoriaGeral da República) com vista à formalização de procedimentos entre as Partes para a recolha e partilha de dados. O OTSH assinou, ainda, um Protocolo de cooperação com o Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa – Instituto Universitário, através do Centro de Investigação e Estudos em Sociologia com vista à prossecução de atividades conjuntas, nomeadamente ao nível da investigação. No domínio da recolha, produção, tratamento e análise de dados, o OTSH em conjunto com a DGAI/MAI, assinou, em 2012, um contrato com a Comissão Europeia para a coordenação do projeto europeu “Towards a pan-European monitoring system of trafficking in human beings” (2013-1014). O objetivo central deste projeto é a criação e implementação de um sistema de monitorização de TSH harmonizado (com plataforma de referenciação territorial associada) para a recolha e troca de informação entre os beneficiários do projeto. No âmbito da formação e sensibilização, e mais concretamente ao nível do reforço de competências profissionais de grupos específicos para a prevenção, identificação de vítimas e combate ao crime de TSH, o OTSH sobressai pela sua grande atividade em parceria com várias associações. Algumas das ONG que trabalham diretamente nesta área são a Associação de Apoio à Vítima (APAV)67; a União de Mulheres Alternativa e

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http://apav.pt. 45

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Resposta (UMAR)68; o Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS)69; o Movimento Democrático das Mulheres (MDM)70; Oikos71 e Saúde em Português72. Notemos, porém, que não existe nenhuma ONG que trabalhe somente com vítimas do tráfico. A maioria das associações trabalha na área da violência doméstica ou da violência generalizada contra as mulheres, mas alargaram as atividades para incluir vítimas de TSH. De um modo geral, Portugal demonstra uma atitude proactiva no domínio da luta contra o TSH. No entanto, como constata o GRETA (2013b), mais podia ser feito a vários níveis. Por exemplo, as autoridades portuguesas deviam adotar uma política contra o TSH que desse especial atenção à exploração laboral e às vítimas masculinas e menores (GRETA, 2013, p. 18).73 Outro problema reside na identificação da vítima cuja responsabilidade cabe somente às forças policiais. O GRETA observou também uma certa relutância da parte dos atores da sociedade civil para denunciar casos de tráfico devido ao medo de serem expatriados como imigrantes irregulares. O grupo de peritos convida, por isso, as autoridades portuguesas a trabalharem em cooperação com as ONG74. Outra recomendação de relevância assinalável refere-se às concessões de autorização de residência. Segundo as estatísticas nacionais, foram concedidas quinze autorizações a vítimas do tráfico em 2008, duas em 2009 e dez em 2010 (GRETA, 2013, p. 35). Em todos os casos, a autorização de residência foi concedida devido à cooperação da vítima com as autoridades. O GRETA não tem conhecimento de qualquer caso em que a autorização de residência fosse dado pela situação pessoal da vítima, nem de qualquer caso em que o Relator Nacional tenha usado os seus poderes para garantir este auxílio às vítimas (GRETA, 2013, p. 35). O grupo põe ainda em evidência o facto de

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http://www.umarfeminismos.org http://www.jrsportugal.pt 70 http://www.mdm.org.pt 71 http://www.oikos.pt 72 http://www.saudeportugues.org 73 É de notar que Portugal tem vindo a desenvolver este aspeto através de, por exemplo, a criação de um centro de acolhimento para vítimas do sexo masculino, como foi referido anteriormente. 74 Na realidade, no ano de 2013, assistiu-se a uma acrescida cooperação entre o Estado e ONG, como Saúde em Português ou a Oikos, através de subsídios para diversas atividades de divulgação. 69

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nenhuma vítima ter sido compensada ao abrigo do artigo 93º do Código das Custas Judiciais relativo à testemunha (GRETA, 2013, p. 36). É ainda de realçar que, segundo a Lei da Proteção de Testemunhas 75, a testemunha e os seus familiares podem beneficiar de um programa especial de segurança se estiverem reunidas cumulativamente as seguintes condições: se o depoimento disser respeito ao tráfico de pessoas; se existir um grave perigo para a vida da testemunha; e se “o depoimento ou as declarações constituírem um contributo que se presuma ou que se tenha revelado essencial para a descoberta da verdade.”76 O GRETA condena este tipo de legislação e recomenda que a autorização de residência seja concedida às vítimas incapazes de cooperar com as forças da autoridade (GRETA, 2013, p. 35). A este propósito, importa sublinhar que o III Plano Nacional de Prevenção e Combate ao Tráfico de Seres Humanos 2014-2017 pretende incorporar as recomendações dirigidas aos Estado português no âmbito do referido relatório do Conselho da Europa. O III Plano Nacional tem também em vista a adaptação da resposta nacional aos novos desafios, nomeadamente às novas formas de TSH e de recrutamento.

1.5 O tráfico de seres humanos para exploração sexual no mundo Segundo o Relatório global sobre o tráfico de pessoas da UNODC (2012), 75% das vítimas traficadas são mulheres e meninas. O tráfico de pessoas para exploração sexual é mais comum na Europa, na Ásia Central e na América e representa 58% dos casos assinalados. Contudo, estes dados são subjetivos porque, ainda segundo o relatório, são estas regiões que mantêm uma maior vigilância. Noutras regiões, não existem estatísticas sobre tráfico para exploração sexual nem sobre prostituição. Outro dado de

75 76

Lei nº 93/99, de 14 de julho, alterada pela Lei n.º 42/2010, de 3 de setembro, República Portuguesa. Artigo 21º da Lei n.º 93/99, de 14 de julho, República Portuguesa. 47

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relevo assinalável é o aumento do número de mulheres envolvidas no tráfico, principalmente no tráfico de meninas na Europa de Leste e na Ásia Central. O TSH tem vindo a aumentar desde os finais dos anos 1990 em relação direta com, entre outros, o aumento do fluxo migratório, a liberalização económica globalizada e a pobreza. O tráfico para exploração sexual, em particular, aumentou em paralelo com a diversificação das indústrias sexuais e com a reificação da sexualidade. O acréscimo da oferta e da procura em geral, observado desde a década de setenta do século XX, deu asas a novos desejos e novas necessidades. Por conseguinte, a procura de serviços sexuais aumentou juntamente com a dos carros, dos aparelhos elétricos, dos aparelhos eletrónicos e dos produtos de luxo. O desenvolvimento da indústria do sexo permitiu uma ramificação nas mais variadas especialidades, expandindo-se através de complexas redes económicas. A indústria do sexo inclui a prostituição, a pornografia, o turismo sexual, os espetáculos eróticos, os salões de massagem, as sex shops, os serviços de acompanhamento (as escort girls), o sexo por telefone ou por internet. Existem agências, anúncios, managers, sindicatos e associações. Todas as especialidades têm vários níveis económicos do mais pobre ao mais chique. O turismo sexual é um excelente exemplo da globalização da indústria sexual. O turismo tem vindo a aumentar para ser, hoje em dia, um dos mercados mais rentáveis, especialmente para os países mais pobres. Segundo o barómetro da Organização Mundial do Turismo (OMT), as chegadas turísticas chegaram a um bilião no ano de 2012 (UNWTO, 2013, p. 2). O turismo sexual e, particularmente o turismo sexual envolvendo crianças, é o componente sombrio do turismo em geral. A expressão “turismo sexual” é definida pelo desenvolvimento e expansão dos serviços sexuais para turistas e/ou viajar com o objetivo de participar no comércio do sexo. Historicamente, o turismo sexual desenvolveu-se maciçamente na Ásia durante as guerras da Coreia (1950-53) e do Vietnam (1955-75). As bases norte americanas estiveram na origem da criação de centros de prostituição e de casa de alterne. Depois da guerra, os militares foram gradualmente substituídos por turistas (Kempadoo, 2004 e Jeffreys, 2009).

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Para muitos viajantes os desejos incluem ter acesso barato a um parceiro sexual, ou vários, para a duração da estadia. Tal motivação é satisfeita em grande escala em países que já têm uma infraestrutura para fornecer serviços sexuais a um grande número de habitantes e ao pessoal militar estrangeiro. Estes países foram convertidos em destinos de férias onde o ócio e o prazer sexual são procurados pelo turista. Este tipo de turismo é, em parte, associado ao imaginário da viagem do homem ocidental (a busca do exótico, do autêntico, do erótico oriental e da transgressão). Mas é também devido à visão colonial que a imagem da mulher oriental se tornou sinónimo de beleza, submissão e passividade. A estes valores não ficam alheias as sociedades alicerçadas em valores patriarcais, as quais demonstram uma atitude castradora face à sexualidade feminina. É de constatar que o desenvolvimento do turismo sexual implica, atualmente, prostituição feminina, masculina e infantil. Existem diversas formas de turismo sexual. As viagens sexuais organizadas implicam agências de viagens especializadas no assunto. Basta procurar na internet o termo “sex tour agencies” para encontrar inúmeras ofertas. Por exemplo, a Cary Online77 propõe viagens para a Ucrânia com acompanhamento por escort girls. O cliente pode escolher o hotel e a mulher. Outro exemplo é a Pleasure Tours78 que oferece “experiências asiáticas totais” na Tailândia, no Camboja e nas Filipinas. Esta agência propõe serviços turísticos clássicos (bilhetes de avião, hotéis, paisagens sublimes, praias deslumbrantes, mergulho, visitas guiadas) e serviços sexuais. A agência oferece também marriage tours como segue: Neste momento há milhares de potenciais companheiras sinceras, atraentes, tradicionais (e não tão tradicionais) que sonham consigo. Para aqueles que estão frustrados com o namoro e com os serviços de encontros românticos, ou apenas com as mulheres americanas em geral, oferecemos a oportunidade de encontrarem uma companheira amorosa, bonita, fiel, que morre de desejos de viver consigo. Não deixe a sua menina de sonho à espera...79

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http://caryonline.com/tour. http://www.pleasuretours.com. 79 http://www.pleasuretours.com/lovesearchtours. Tradução da autora. 78

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Outra forma de turismo sexual é o turismo com uma acompanhante. Estas amantes temporárias seguem o turista que lhes paga o hotel, as festas, os bares, os restaurantes, em troca de serviços sexuais. Um país onde esta atividade tem especial sucesso é Cuba com as suas jineteras80. Se o continente asiático, nomeadamente a Tailândia, as Filipinas e o Sri Lanka, foi o primeiro destino de referência histórica, o turismo do sexo atual internacionalizou-se a nível mundial, especialmente nos países em vias de desenvolvimento: em África (Marrocos, Tunísia, Gâmbia e Quénia); na América Latina (Brasil, Costa Rica ou a Colômbia); nas Caraíbas (Cuba, São Domingos, República Dominicana, Jamaica); e na Europa de Leste (os países Balcãs, Ucrânia, Bulgária).81 O medo do SIDA/VIH por parte dos clientes faz com que a procura seja dirigida a pessoas cada vez mais jovens. Por conseguinte, o turismo sexual é geralmente associado à prostituição infantil e ao tráfico de crianças para exploração sexual. Segundo a Unicef82, as zonas mais afetadas pela prostituição infantil são o Extremo-Oriente e Pacífico, a Europa, a América Latina e as Caraíbas. Nos países africanos em conflito armado, muitas crianças são raptadas pelos grupos rebeldes: os rapazes tornam-se crianças-soldado e as raparigas são exploradas no trabalho doméstico e na prostituição. De acordo ainda com um relatório da Unicef (2012) Children in an urban world, as crianças com a menor probabilidade de irem à escola vivem nos bairros da lata do Gana, Quénia, Bangladesh e Índia. As zonas urbanas são as mais propícias à exploração sexual, o que justifica o crescente número de crianças que migram (à força ou não) do campo para a cidade. A Unicef revela que meninas dos nove aos dezassete anos, que são exploradas sexualmente na Tanzânia, foram traficadas das zonas rurais do interior. Na Índia, a maioria das crianças traficadas para prostituição é instalada nas cidades de Bombaim83, Deli e Calcutá. Nas cidades do Bangladesh, é observado um número crescente de meninas e meninos que são explorados nos mercados do sexo e nas casas

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Uma jinetera é uma acompanhante, uma prostituta ocasional. O termo é tipicamente cubano. http://geotourweb.com. 82 http://www.unicef.org/sowc06/profiles/trafficking.php. 83 Bombaim é conhecida pelas meninas enjauladas nos bordéis de Kamathipura, o maior red light district asiático. 81

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de alterne. Na Europa de Leste, os adolescentes dos treze aos dezoito anos são especialmente vulneráveis à exploração sexual. É de notar, contudo, que frequentemente as prioridades económicas são mais importantes do que o respeito pelos Direitos Humanos. Aliás, em muitas situações nem está em causa a solução da prostituição infantil. Por exemplo (Kempadoo & Doezema, 1998, pp. 139-150), existe uma aldeia na Tailândia onde as crianças prostitutas são livres, não estão dependentes de dívidas e vivem com os pais. Estas crianças vivem numa comunidade aberta ao comércio do sexo. Para eles a prostituição é um trabalho normal e as suas identidades não se limitam a esta atividade. Não é posto em dúvida a existência de crianças exploradas que vivem da prostituição, mas a essência desta exploração não é o comércio sexual mas a pobreza e a exclusão social84, o que conduz a outro fator para o aumento da indústria do sexo: a migração. A acrescida diferença entre os países em desenvolvimento e os países industrializados resulta no contínuo aumento dos fluxos migratórios. Os movimentos populacionais internacionais são um facto especialmente importante na Europa, América do Norte e Ásia. A OIM estima que atualmente o número de migrantes internacionais seja de 214 milhões, dos quais 49% são mulheres.85 O aumento da migração feminina, especialmente de mulheres isoladas, implica novos desafios na área dos Direitos Humanos. As migrações envolvem também o movimento populacional das zonas rurais para as zonas urbanas. O imaginário das cidades tem um papel incontornável no desejo de migrar. Todavia, o acesso a recursos nas áreas urbanas não é imparcial. Cada cidade tem seu próprio padrão de vulnerabilidade, decorrentes de preconceitos políticos e sociais. Os recém-chegados podem ser impelidos para as margens da sociedade urbana e podem ser-lhes negados os serviços públicos, a proteção social e os cuidados de saúde.

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O Comité para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres da ONU (CEDAW) reconhece, na sua Recomendação Geral nº 19 (sessão 11º, 1992), que a pobreza e o desemprego aumentam os riscos de TSH para as mulheres e obrigam inúmeras mulheres e crianças a prostituíremse (www.un.org/womenwatch/daw/cedaw/recommendations/recomm.htm#recom19). Também a Plataforma de Ação de Pequim, (1995) chama a atenção para o fenómeno da feminização da pobreza, que acentua a vulnerabilidade das mulheres e das meninas à exploração sexual (www.un.org/womenwatch/daw/beijing.pdf/BDPfA%20E.pdf). 85 http://www.iom.int/cms/en/sites/iom/home/about-migration/facts--figures-1.html. 51

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Mais uma vez, as mulheres e os menores são o grupo mais vulnerável. Devido à discriminação de género, as mulheres têm acesso a opções profissionais mais limitadas. E se nos países desenvolvidos o combate é pela igualdade de salários, nos países mais pobres a luta é pela sobrevivência, especialmente nas zonas em que a discriminação de género é cultural e a violência contra as mulheres é protegida por lei. Da mesma forma, a discriminação geracional põe as crianças e os jovens em situação de risco. Como os adultos, as crianças migram em resposta a uma combinação de fatores de atração e repulsão. Para muitos, a migração é uma tentativa de garantir uma vida melhor, quer em termos de oportunidades económicas ou educacionais, quer simplesmente para escapar da pobreza. Os menores isolados representam um grupo literalmente invisível pois não existem dados estatísticos. A única forma de nos apercebermos do fenómeno é através dos dados das forças policiais (quando existem) relativos à prostituição de menores, às violências cometidas contra menores isolados e à pornografia infantil que, segundo a Relatora especial da ONU sobre a venda de crianças, prostituição infantil e pedo-pornografia, revela uma acrescida violência contra crianças cada vez mais jovens (Najat Maalla M’jid, 2012). A atividade que está diretamente relacionada com o TSH, juntamente com a migração ilegal, é a migração forçada. A expressão “migração forçada” é a “expressão geral utilizada para caracterizar o movimento migratório em que existe um elemento de coerção, nomeadamente ameaças à vida ou à sobrevivência” (OIM, 2009, p. 41). Os fatores de atração e de repulsão são o conflito, os genocídios, a violência, a violação dos Direitos Humanos e as práticas discriminatórias, os desastres naturais, ambientais, nucleares ou causados pelo homem, as dificuldades económicas e a miséria, a fome ou os projetos de desenvolvimento (no caso de, por exemplo, serem construídas barragens, estradas ou outros sem a preocupação de reinstalação dos residentes daquela área). Existem vários tipos de migrantes forçados: os refugiados, as pessoas internamente deslocadas, os requerentes de asilo, os apátridas e as vítimas do TSH. A ONU estima que houve mais 4,7 milhões de refugiados em 2011 do que no ano anterior devido a conflitos na Costa do Marfim, Líbia, Somália, Sudão e Síria. Segundo as estatísticas do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (2012),

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existiam, em 2011, aproximadamente 25,9 milhões de refugiados sob a proteção da agência e 42,5 milhões de deslocados internos devido a conflitos e perseguição. As zonas mais atingidas pela migração forçada situam-se nos continentes asiático e africano.86 As pessoas deslocadas dentro do próprio país estão mais expostas ao TSH. Muitas vezes, estas pessoas não têm nem laços familiares ou comunitários, nem oportunidades económicas, o que as torna particularmente vulneráveis a promessas de uma situação melhor noutro sítio. Os conflitos têm tendência a catalisar formas diretas do TSH. Além disso, as pessoas traficadas são frequentemente submetidas a tratamento cruel, desumano e degradante, como o estupro ou outros tipos de violência física ou psicológica grave. Em casos extremos, quando cometidos como parte de um ataque generalizado ou sistemático contra uma população civil, a escravidão sexual e a prostituição forçada podem constituir um crime contra a humanidade ou crime de guerra, sob a jurisdição do Tribunal Penal Internacional. As violações em massa aumentaram nos conflitos recentes como na Serra Leoa, Libéria ou Paquistão. Mas o epicentro de violação sistemática situa-se na República Democrática do Congo, República Centro-Africana e Chade. A violação tornou-se o símbolo da mentalidade de ódio de uma violência absurda ao ponto de a ONU declarar, em 2008, que esta violência é uma “arma de guerra” (Resolução 1820/2008 das Nações Unidas). Em muitos países, a violação de uma mulher é uma vergonha para a honra da família. Muitas raparigas suicidam-se, outras são assassinadas, outras fogem. Certos investigadores (Kempadoo & Doezema, 1998, p. xvi) estimam que cerca de 2 milhões de mulheres e meninas desaparecem anualmente devido à discriminação de género. A migração amplifica a vulnerabilidade para exploração, extorsão e outras atividades criminosas devido à ignorância por parte do migrante sobre o novo contexto que o rodeia. No contexto da indústria sexual, esta fragilidade é acrescida pelo estatuto social e jurídico da atividade e pela condenação moral. Com efeito, os trabalhadores do sexo migrantes sofrem uma dupla censura: o facto de serem estrangeiros e o facto de trabalharem no mercado sexual.

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É de notar que a presente investigação terminou antes da crise dos refugiados provenientes maioritariamente da Síria no ano de 2015. 53

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Devido à estigmatização social, a marginalização desta atividade profissional resulta numa vulnerabilidade dos trabalhadores à exploração. A maioria dos trabalhadores não tem contratos de trabalho legais o que os impede de ter acesso à segurança e proteção sociais87, facilitando a economia subterrânea e abrindo portas ao mercado ilícito. Outro fator que contribui para o TSH para fins de exploração sexual é o facto de as prostitutas migrantes não conseguirem obter vistos de trabalho devido ao não reconhecimento legal do trabalho do sexo como uma atividade profissional. Ora, são a proibição e as restrições de viagem que atraem o crime organizado e que criam a possibilidade de ganhos lucrativos. Quando o comércio do sexo está ligado a atividades criminosas ou ilícitas, o observador tem de ter em conta a cartografia social do crime. Podemos assim entender que certos tipos de criminalidade ocorrem com mais frequência em certos contextos sociais e económicos. Nas comunidades mais permissivas à violação das regras sociais e que concedem menos valor aos Direitos Humanos, a indústria do sexo engloba, geralmente, atividades ilegais de alto risco. Em muitas zonas geográficas o dinheiro gerado pelo trabalho sexual serve para pagar diversos atores sociais de complexas redes relacionais como os maridos, os amantes, os guardas de segurança, as “madames” ou proxenetas, os condutores de táxi, os oficiais da polícia e da imigração e os homens políticos. Por exemplo, há casos documentados (Kahare, 2011) de refugiadas somalis que são traficadas para o Quénia para exploração sexual que confirmam que os traficantes são assistidos por políticos, agentes da polícia, oficiais da imigração e oficiais das linhas aéreas. Segundo um agente de uma ONG, “essas pessoas poderosas, incluindo ministros e diplomatas estrangeiros no Quénia, transformaram o acesso a vistos para estrangeiros numa indústria em crescimento, vendendo cada visto por 10,000$ ou 15,000$ aos líderes das redes” (Kahare, 2011). Na UE, os Estados-Membros estão especialmente preocupados pelos movimentos migratórios da Europa de Leste. Segundo a TAMPEP (Rede Europeia para a Prevenção 87

As organizações que militam a favor de uma prostituição livre defendem, por conseguinte, o princípio de um sistema de “cartões verdes” (como o sistema americano do “green card”) para os trabalhadores do sexo (Schulze, Canto, Mason & Skalin, 2014, p. 9). 54

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do VIH/IST e para a Promoção da Saúde dos Trabalhadores do Sexo Migrantes), 70% dos trabalhadores do sexo na Europa ocidental são migrantes (Brussa, 2009, p. 15). Tendo em conta a importância da mobilidade para esta atividade, uma parte significativa dos trabalhadores do sexo lançaram-se na prostituição em vários países, sendo ainda mais frequente nas zonas fronteiriças (Siegel, 2012). A abertura recente das fronteiras, juntamente com a situação económica precária dos países da Europa de Leste, teve um efeito direto sobre o fluxo de TSH no continente. O relatório do Eurostat de 2013, Trafficking in human beings, que analisa os dados adquiridos de 2009 a 2012, confirma que, efetivamente, 61% das vítimas sinalizadas e identificadas (mulheres, homens e crianças) são provenientes dos Estados-Membros, sendo a maioria de origem romena e búlgara. O Eurostat constata ainda que 15% das vítimas são crianças e a maioria das vítimas é do sexo feminino (80%). Cerca de 62% das vítimas são traficadas para fins de exploração sexual e 25% para fins de exploração laboral. A maioria das vítimas de exploração sexual é feminina (96% em 2010) e a maioria das vítimas de exploração laboral é masculina (77% em 2010). De acordo com algumas estimativas, até 120000 mulheres e crianças são introduzidas ilegalmente na Europa ocidental anualmente (Comissão Europeia, 2009). Segundo os dados das Nações Unidas, mais de 95 nacionalidades foram detetadas na população das vítimas femininas traficadas para a Europa. Os principais países de origem são o Brasil, Nigéria, China e Marrocos (UNODC, 2010, p. 40). Relativamente aos presumidos traficantes, 45% têm nacionalidade europeia. Os principais países de origem são a Bulgária, Roménia, Alemanha e França. A maioria dos presumidos traficantes não-europeus são asiáticos ou africanos e provêm maioritariamente da Nigéria, China e Turquia. Quanto ao género, 75% dos suspeitos são do sexo masculino (UNODC, 2010).

1.6 O tráfico de seres humanos em Portugal A limitada visibilidade do fenómeno contribui para uma dificuldade na quantificação. Outro fator que contribui para tal opacidade provém da própria definição 55

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dos termos. O Código Penal português obriga a uma série de requisitos para que os casos assinalados de TSH sejam confirmados. Na maioria das vezes, os requisitos não são preenchidos, resultando no baixo número de casos confirmados deste tráfico. O GRETA está também preocupado com o baixo número de vítimas identificadas que, para o grupo de peritos, revela uma falha no sistema de identificação das vítimas de TSH. Tendo presentes as dificuldades de investigação, é apresentada, nesta secção, um resumo da situação em Portugal de 2009 a 2013. Segundo os Relatórios Anuais da Segurança Interna dos anos 2010, 2011, 2012, 2013 e 201488, foram sinalizadas, desde 2009, 668 potenciais vítimas, sendo confirmadas apenas 96.89

2009 2010 2011 2012

2013

Potenciais vítimas (sinalizações)

85

79

71

125

308

Vítimas confirmadas

7

21

23

0

45

Vítimas não-confirmadas

-

24

16

18

80

Casos pendentes

-

34

24

93

116

16

-

8

14

58

Registos remetidos por ONG

Tabela 1: Número de vítimas sinalizadas, confirmadas, não-confirmadas, casos pendentes e registos remetidos por ONG (2009-2013) Fonte: dados estatísticos do SSI.

Se em 2009 o tipo de tráfico mais observado foi para exploração sexual, a partir de 2010 o tipo de exploração mais presente nos casos confirmados é a exploração laboral (agricultura, coação para prática de furtos e de mendicidade e outros). Paralelamente, em 2009, as vítimas foram maioritariamente do sexo feminino ao invés dos quatro anos seguintes, nos quais se observou um acréscimo de vítimas de sexo masculino.

88

Para facilitar a leitura, os relatórios são designados posteriormente por SSI (Sistema de Segurança Interna). 89 Nota: os dados em falta são nulos ou protegidos por segredo estatístico. 56

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Também de forma analógica, em 2009 e 2010, as vítimas confirmadas eram maioritariamente estrangeiras de nacionalidade brasileira e romena. Em 2011, a cartografia altera-se para apresentar uma maioria de vítimas de nacionalidade portuguesa, tendo sido exploradas quer em Portugal quer no estrangeiro. Esta mudança é ainda confirmada em 2012 e 2013. Em Portugal, a distribuição espacial das vítimas confirmadas ocorre, principalmente, na região Norte, na região de Lisboa e Vale do Tejo e no Alentejo. De modo geral, a distribuição é feita perto da costa e perto da fronteira.

2009

2010

2011

2012

2013

Argelina (1)

Portuguesa (9)

Brasileira (4)

Nigeriana (6)

Brasileira (33)

Romena (7)

Romena (7)

Guineense (3)

Nacionalidade

Búlgara (3)

Angolana (1)

Outra (…)

Romena (74)

das vítimas

Italiana (2)

Brasileira (13)

Dados não

Brasileira (6)

Marroquina (2)

Iraniana (1)

divulgados

Portuguesa

Moçambicana (3)

Panamenha (1)

sinalizadas

(4)

Nigeriana (3)

Outra (…)

Portuguesa (18) Romena (12) Ucraniana (2)

Nacionalidade das vítimas confirmadas

Brasileira (3)

Portuguesa (7)

Portuguesa

Romena (45)

Moçambicana (1)

Romena (6)

(18)

0 casos

Portuguesa (2)

Brasileira (5)

Romena (3)

confirmados

Romena (1)

Nigeriana (1)

Senegalesa (1) Chinesa (1)

Tabela 2: Nacionalidade das vítimas sinalizadas e das vítimas confirmadas (2009-2013) Fonte: dados estatísticos do SSI

Em relação aos menores, no ano de 2012, foram sinalizados 36 menores em Portugal (casos pendentes/em investigação): 4 para exploração sexual e 31 para exploração laboral (SSI, 2013, pp. 126-127). Em 2013, 49 menores foram sinalizados, dos quais 4 não foram confirmados. Os 27 registos em fase de investigação referem-se a possíveis situações de TSH para exploração sexual (17), exploração da mendicidade (7)

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e adoção/venda de menores (3). Os 15 registos por ONG referem-se a possíveis vítimas de TSH para exploração sexual, laboral e prática de atividades criminosas. Um total de 3 sinalizações não foram consideradas posteriormente (SSI, 2014, pp. 98-99). Merecem particular destaque certos acontecimentos. Segundo o Relatório Anual de Segurança Interna (2012, p. 95), no âmbito da atividade de investigação criminal do SEF, foram identificadas e desmanteladas, em 2011, duas redes de auxílio à imigração ilegal e de TSH: uma rede romena de TSH e lenocínio, com angariação de mulheres jovens na Roménia, mediante falsas promessas de trabalho ou estabelecimento de relações amorosas; e um grupo de nacionalidade chinesa de angariação e tráfico de mulheres da mesma nacionalidade para exploração sexual em território nacional. No ano seguinte, em 2012 (SSI, 2013, pp. 130-131), o SEF identificou pela primeira vez em território nacional, um fenómeno associado à comunidade nigeriana relativo ao tráfico de menores – “miracle baby”. Esta prática é comum na Nigéria, existindo também relatos de casos idênticos ocorridos no Reino Unido, e é caracterizada por relevar, de forma acentuada, os poderes da magia africana, sendo que a prática criminal incide na criação de ilusão de gravidez (mulher ou casal) com o intuito de justificar o aparecimento de um bebé num contexto de uma família ou de uma comunidade. Em 2013, comparando com o ano anterior, verificou-se um forte acréscimo de sinalizações (+146%) em território nacional (SSI, 2014, p. 94). Este aumento está associado a 198 sinalizações de TSH para exploração laboral, na apanha da azeitona no Alentejo (tráfico de migrantes sazonais). A análise de dados sobre o tráfico de portugueses para o estrangeiro em 2011 demonstra que houve 18 casos confirmados em Espanha (12), na Holanda (5) e de modo menos significativo no Luxemburgo (OTSH, 2012b, p. 14).90 A maioria das vítimas foi traficada para fins de exploração laboral e era, predominantemente, de sexo masculino, com uma média de 31 anos. As formas de controlo utilizadas pelos exploradores foram a ameaça direta com controlo de movimentos, ofensas corporais e sonegação de documentos (OTSH, 2012, p. 17). Em 2012, foram sinalizados 44 casos de portugueses

90

Importa realçar que até 2012 os relatórios do Sistema de Segurança Interna não analisam o tráfico de portugueses para o estrangeiro. 58

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possivelmente traficados para o estrangeiro, sob suspeita de exploração laboral. Os países de destino foram a Alemanha (45) e Espanha (5), (SSI, 2013, p. 129). Em 2013, foram sinalizadas 9 vítimas, todas adultas, maioritariamente em Espanha (SSI, 2014, p. 102). Quanto ao TSH para exploração sexual, os casos sinalizados em Portugal desde 2009 revelam a presença, maioritariamente, do sexo feminino e de nacionalidade brasileira e romena, havendo igualmente a presença de portuguesas, chinesas e nigerianas, cuja idade varia entre os 18 e os 52 anos. As formas de recrutamento seriam de promessas de trabalho e de relacionamento (SSI, 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014). Segundo um estudo:

A maioria das fontes consultadas aponta para uma preponderância em Portugal das vítimas que deram o seu consentimento inicial para trabalhar na prostituição ou, pelo menos, na indústria do sexo e que, depois, se encontraram numa situação de exploração. Não deixámos, ainda assim, de encontrar vários casos, quer através de relatos dos entrevistados, quer pela análise dos processos judiciais, em que as mulheres não sabiam que o trabalho que as aguardava em Portugal era a prostituição. (Machado et al., 2010, p. 96)

As formas de controlo seriam maioritariamente, ameaças diretas e indiretas com controlo de movimentos, ofensas corporais (físicas e sexuais) e, ainda, sonegação de documentos, de rendimentos e o isolamento de familiares/amigos (SSI, 2013, p. 101). As nacionalidades mais observadas dos recrutadores foram em 2012 bósnia, nigerense, brasileira, romena e outros (desconhecida), (SSI, 2013). Já em 2013, as nacionalidades mais representadas estatisticamente foram portuguesa, espanhola, brasileira, bósnia e montenegrina (SSI, 2014). Em suma, ao analisar os relatórios, verifica-se um acréscimo da visibilidade do TSH. Pode-se, portanto, concluir que o fenómeno tem vindo a ganhar importância na agenda política nacional. Por exemplo, no que diz respeito à proteção e apoio à vítima, Portugal demonstrou uma adaptação rápida aos acontecimentos de 2013: todas as 45 vítimas confirmadas receberam auxílio. O apoio envolveu a ação coordenada de entidades 59

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governamentais (GNR, SEF e PJ) e não-governamentais (APF, Cruz Vermelha Portuguesa, Cáritas e CAP Homens/Saúde em Português). No entanto, foi concedida autorização de residência a apenas uma vítima do TSH no decorrer de 2013 (SSI, 2014, p. 104). Com efeito, o combate a este flagelo está ainda longe de ser efetivado, carecendo de formações de prevenção e de combate dirigidas a todos os protagonistas dos processos penais. O caminho da proteção dos Direitos Humanos é ainda longo e sinuoso.

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2. Imaginários coletivos e representações sociais

Se os homens definem situações como reais, elas são reais nas suas consequências. William Isaac Thomas

O estudo das representações sociais associadas ao TSH para exploração sexual é feito em torno de dois polos temáticos: a prostituição e a imigração. O presente capítulo analisa os discursos relativos a estes dois fenómenos sociais com o objetivo de realçar os estereótipos presentes no senso comum. Numa primeira fase, proponho uma análise bibliográfica sobre o conceito de representação social, tendo como pano de fundo a sociologia do imaginário, a sociologia do quotidiano e a socio-fenomenologia. É também dada especial atenção à construção dos rumores, dos pânicos morais e das histórias moralistas no contexto das Ciências da Comunicação. Em seguida, é exposta uma análise comparativa da estrutura discursiva das campanhas contra a escravatura branca nos finais do século XIX e da comunicação social atual sobre o tráfico de mulheres. O exemplo do rumor de Orleães, estudado pela equipa de Edgar Morin, revela-se apropriado para, por um lado, demonstrar a continuidade de certos estereótipos relativos ao estrangeiro e ao Outro e, por outro, expor a construção de rumores e o relativo impacto no imaginário social. Veremos que existe um paralelo entre estas duas temporalidades que demonstram a continuidade de certos preconceitos associados à vítima (inocente/passiva/invisível) e ao traficante (o vilão/o Outro/o estrangeiro), e ao contexto histórico dos fluxos de migração. Nas duas últimas secções é apresentada uma análise das representações da prostituição e do imaginário social relativo ao imigrante para ilustrar a importância da moralidade sexual e do racismo subtil atuantes na constituição de preconceitos presentes na consciência coletiva.

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2.1 Sociologia do Imaginário: o monstruoso A sociologia do imaginário tem por objeto de estudo o universo simbólico comum de valores e o processo de construção coletiva de significados. A imaginação organizadora é uma perfeição do pensamento porque permite acalmar o espírito humano, ordenando o cosmos metodicamente. Vários sistemas intelectuais foram imaginados pelo homem para compreender a abstração como, por exemplo, a linguagem, a religião ou o pensamento matemático. Neste sentido, a imaginação permite concetualizar simbolicamente o que nos ultrapassa: a angústia do tempo e da morte, a finitude da vida e do pensamento face ao cosmos infinito, o eterno laço entre o passado, o presente e o futuro. A sociologia do imaginário interessa-se, portanto, pela consciência coletiva (cujos pilares são a história e a memória), pelas representações sociais e pelas crenças, estudando, simultaneamente, os mecanismos de construção das imagens e a sua eficácia. Para compreender os mecanismos do imaginário, é necessário definir o signo, a imagem e o símbolo. O signo é a unidade de base de um sistema de significação. Segundo a linguística de Ferdinand de Saussure (Cours de linguistique générale, 1916), o signo combina um significado (o seu conteúdo semântico) e um significante (o lado percetível e material do signo). O signo, embora abstrato, depende de um código partilhado por uma comunidade que faz com que todos os membros do grupo compreendam a mensagem. Para Charles Sanders Peirce o signo envolve uma relação triádica entre o próprio signo, o objeto (do discurso) e o interpretante. O interpretante é o conjunto de conhecimentos provenientes da cultura e da experiência individual que permite construir uma interpretação, ou seja, é o conjunto de categorias de compreensão do senso comum (Peirce, 1991, pp. 141-142), Por exemplo, o som/signo “cão” remete para a imagem de um bicho peludo com quatro patas. Mas numa consciência individual, “cão” remete imediatamente para o cão particular que esse indivíduo teve no passado (malhado, com olhos azuis e pelo curto). Para outro indivíduo, “cão” pode significar a dor sentida quando um cão mordeu. Todavia, todos concordamos que “cão” é um mamífero peludo de quatro patas. Os signos têm uma intenção explícita: servem de índex às significações subjetivas, mas podem também afastar-se em relação à expressão imediata da 62

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subjetividade. A teoria do signo de Peirce foi concebida para se adaptar ao contexto particular da comunicação. A semiologia da comunicação expõe códigos estruturais rígidos dos quais os mais evidentes são o código da estrada ou os símbolos que figuram nas etiquetas do vestuário. Porém, é a linguagem o mais importante sistema de signos da sociedade humana. As objetivações comuns da vida quotidiana são mantidas, principalmente, pela significação linguística. A imagem, tal como a linguagem, é uma representação das coisas sem que elas estejam necessariamente presentes. A imagem é a primeira forma imaginativa do homem. Não é de todo inútil questionar o processo cognitivo quando se trata de conceitos abstratos como, por exemplo, “liberdade” ou “igualdade”. Tocamos aqui no domínio da linguagem simbólica cuja objetivação é feita através da experiência histórica e biográfica sobre as quais se edifica a “reserva social de conhecimento” do indivíduo (Berger e Luckmann, 2006). O símbolo pode ser uma imagem (plástica) ou uma palavra. O que difere o símbolo do signo é a carga semântica que transcende o significado e que se insere numa estrutura de significação imaginária. O símbolo exige uma interpretação e possui uma carga emocional. O símbolo é a “epifania de um mistério” (Durand, 1998, p. 13). A imaginação simbólica é, por isso, o processo que permite compreender, precisamente, os signos que se referem a um sentido e não a uma coisa sensível. A imaginação simbólica, de cariz inconsciente e social, fornece aos indivíduos conhecimentos e crenças comuns que solidificam os laços sociais. Neste sentido, a cultura é um conjunto de sistemas simbólicos nos quais cada signo faz sentido em relação a outro (o branco em relação ao preto; o bom em relação ao mau; o cidadão em relação ao estrangeiro). Carl Gustav Jung propõe a noção de “arquétipo” como um conjunto de símbolos aplicados nos contos e nos mitos que estruturam o “inconsciente coletivo” de cada cultura (Jung, 2002). Este inconsciente coletivo é, para o psicanalista, a base comum dos imaginários individuais ou, por outras palavras, um depósito de imagens e de símbolos partilhados por todos os membros de uma sociedade. Este saber não é adquirido mas herdado, sendo constituído por formas preexistentes, os arquétipos, que só se tornam conscientes secundariamente (Jung, 2002, p. 53). Na sequência desta reflexão, Gilbert

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Durand defende o argumento de que a repetição dos temas mitológicos (os “mitemas”) são estruturas fundamentais da psique humana que estão presentes em todo o tempo e em todo o lugar91. Na sua obra principal, Les structures anthropologiques de l’imaginaire (1992), Durand expõe uma série de estruturas fundamentais: os “esquemas” que organizam o simbolismo (por exemplo, a verticalidade, cuja grande categoria simbólica é a queda – um dos maiores medos do homem desde que é bípede); os “arquétipos”, conjuntos de imagens-chave (por exemplo, o dragão, a cruz, a lua, o sol, a água, a espada); e os “regimes do imaginário” que designam uma atitude geral do pensamento (o regime diurno é fundado na oposição binária e o regime noturno é um pensamento sintético que valoriza a fusão de imagens). Durand, depois de analisar uma vasta lista de estruturas imaginárias conclui que, de um ponto de vista antropológico, existem “constelações de imagens” edificadas sobre um certo “isomorfismo dos símbolos convergentes” (Durand, 1992, p. 40). Podemos, seguindo esta linha de pensamento, supor “a existência de certos protocolos normativos de representações imaginárias, bem definidas e relativamente estáveis” (Durand, 1992, p. 65). Daí encontrarmos continuamente certas figuras como, por exemplo, o salvamento da princesa pelo príncipe ou o monstro devorador derrotado pelo herói. É de apontar ainda a noção de Edgar Morin relativa à dinâmica “arquétipoestereótipo”. Na sua obra L’esprit du temps (1975), Morin apresenta a sua perspetiva da cultura de massa e das suas dinâmicas das quais interessa destacar a exploração dos arquétipos, mitemas e personagens míticas que fazem parte do processo de construção dos estereótipos de massa. Efetivamente, a cultura industrial, noção predileta da Escola de Francoforte, exige uma normalização de formas estereotipadas. Contudo estas são continuamente renovadas e inovadas. A cultura de massa demonstra uma aplicação inédita da imaginação humana, podendo esta declinar-se de várias maneiras nas mais diversas culturas, mas também de várias maneiras numa mesma cultura. A sociologia do imaginário pode, portanto, ser aplicada à sociedade contemporânea de maneira a observar símbolos culturais, emoções, crenças e 91

Carl G. Jung chamou-lhes arquétipos, mas como o psicanalista explica: a pesquisa mitológica denominaos “temas”. Para Lucien Lévy-Brühl, o conceito corresponde às “representações coletivas”. No campo da sociologia das religiões, o conceito é conhecido por “categorias da imaginação”, (Jung, 2002, p. 53). 64

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representações sociais. A metodologia revela-se especialmente pertinente para analisar o fundamento de certos fenómenos sociais, nomeadamente nos domínios da religião, arte, meios de comunicação audiovisuais e da vida quotidiana. Neste estudo parto do princípio de que todas as imagens têm uma função simbólica, ou seja, “as imagens têm uma história” (Legros, Monneyron, Renard & Tacussel, 2006, p. 14). Neste sentido, uma análise das imagens da prostituta aliadas às do imigrante permite desenredar as estruturas mentais coletivas que justificam certos comportamentos sociais através dos valores, símbolos e mensagens subjacentes. Uma característica comum a estes dois grupos sociais é, e sempre foi, a “inquietante estranheza” freudiana, ou seja, a demonização do Outro. A retórica da alteridade segue dois princípios: a inversão e a comparação. Efetivamente, a construção social da alteridade envolve um pensamento básico: o Outro é um não-Eu. Ou seja, voltando às oposições binárias, existe o cidadão e o estrangeiro; o normal e o desviante. O que nos remete para a obra emblemática de Erving Goffman sobre os estigmas sociais. Para este sociólogo existe um espaço vasto entre a “identidade social virtual” e a “identidade social real” (Goffman, 1988, p. 12). A identidade social virtual é a identidade que Eu concebo a partir das imagens coletivas do Outro; e a identidade social real é formada pelos atributos que o Outro prova possuir. Esta discrepância entre o que somos e como nos vêm pode estragar a identidade social de um indivíduo e pode resultar no afastamento e na marginalização de tal modo que a pessoa se torna desacreditada frente a um mundo não recetivo. Segundo Goffman, “um indivíduo que poderia ter sido facilmente recebido na relação social quotidiana possui um traço que pode impor-se à atenção e afastar aqueles que ele encontra, destruindo a possibilidade de atenção para outros atributos seus” (Goffman, 1988, p. 14). Por outras palavras, ao fazermos da imigração (sobretudo ilegal) e da prostituição um estigma, pomos em evidência características sociais pejorativas, ocultando todas as outras que restituem a dignidade à pessoa estigmatizada. Isto implica “que acreditamos que alguém com um estigma não seja completamente humano. Com base nisso, fazemos vários tipos de discriminação, através das quais efetivamente, e muitas vezes sem pensar, reduzimos as suas hipóteses de vida” (Goffman, 1988, p. 15).

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Muitas vezes o indivíduo emprega “categorizações inadequadas” (Goffman, 1988, p. 28) para definir o Outro. Estas categorizações contribuem para a discrepância entre a identidade real e a identidade virtual do indivíduo. Ora, as categorizações inadequadas tendem a favorecer a vampirização do Outro. O imaginário da monstruosidade tem, aqui, uma importância relevante. Os monstros são criados a partir dos medos e ansiedades humanas. Eles repulsam, espantam, aterrorizam mas também atraem e fascinam. O monstro é, por definição, o que sai da norma social. O olhar social, essencialmente, discrimina-o, segrega-o. No mundo social, quando um elemento estranho se insere numa comunidade, esta, geralmente, reage de forma conservadora, fechando-se e rejeitando a estranheza até ela ser integrada ou não. O monstro sofre sempre uma comparação e uma diferenciação. Daí o caráter contraditório do monstro: “nem pertence completamente ao imaginário nem completamente à realidade” (Legros et al., 2006, p. 202). Existem, por conseguinte, os monstros fantásticos (no sentido de seres sobrenaturais) e os monstros reais (o próprio ser humano). No imaginário dos contos, das lendas e dos mitos, os monstros são os seres que vivem em terras remotas e desconhecidas. São, por exemplo, os Ciclopes com um só olho, os Ciápodes com um só pé gigante, os gigantes e os anões, os antropófagos ou os vampiros. O monstro é um signo: demonstra (do latim monstrare). E como todos os signos, o monstro tem várias significações simbólicas que se adaptam ao Tempo e à História. Num primeiro momento, os monstros foram, no fundo, uma reflexão do desconhecido e da natureza incompreendida (Tomás, 2013). A partir do século XIX observa-se a emergência de um novo tipo de monstro: o ser terrífico criado pelas descobertas científicas do homem. Alguns dos exemplos mais famosos são Frankenstein de Mary Shelley (1830) ou O homem invisível de H. G. Wells (1897). Esta inovação imaginária encontra a sua tradução no mundo real na evolução científica onde o homem, muitas vezes, perde o controlo da sua própria criação. O século XX expôs à humanidade a apoteose do monstruoso com o aparecimento dos regimes totalitários que deram origem à Solução Final da questão judaica em 1942, à Fome Ucraniana de 1932-1933 ou aos goulags. Não é por acaso que J.R.R. Tolkien escreveu a sua obra

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emblemática O senhor dos anéis (originais publicados entre 1954 e 1955), uma aventura épica do bem contra o mal, na qual a monstruosidade das armadas imensas e dos reis e magos malvados é finalmente vencida a custo de muitas vidas. Hoje, sabemos, o pior monstro é o próprio Homem. No que diz respeito aos meios de comunicação, o monstruoso está presente em particular nos faits divers, nos quais os protagonistas de homicídios, violações e incestos são apresentados como figuras da perversão. A cultura está, hoje em dia, em contínuo diálogo com o monstruoso, sendo as figuras mais hediondas aquelas que cometem crimes contra a humanidade. Efetivamente, o monstruoso é um fenómeno humano. A destruição do meio-ambiente é monstruosa, o fanatismo é monstruoso, o racismo é monstruoso. Talvez, como defende Goldschmidt, “o monstruoso não seja mais do que a recusa – sendo a última forma de recusa o homicídio” (Goldschmidt, 2004, p. 12). O monstro instala o vazio onde precedentemente existia uma pessoa. O monstro simboliza a desgraça. No caso particular do trabalho do sexo, a prostituta assemelha-se à imagem da femme fatale, um pouco como as sereias monstruosas, que escondem, por trás de uma beleza espantosa, um destino terrível para aqueles que ouvem o seu canto. O imaginário da prostituição revela uma relação interessante entre o monstro fascinante mas simultaneamente repulsivo, como adiante veremos. Em suma, a sociologia do imaginário permite unir as imagens contemporâneas da alteridade a imagens míticas ligadas à “inquietante estranheza” e à monstruosidade. Este paradigma prova, de acordo com Jean-Bruno Renard, que “os modelos míticos impõem uma estrutura narrativa e temática que são, frequentemente imemoriais” (Renard, 1994, p. 109). Ora, estas imagens antropológicas revelam-se ser centrais na construção das representações sociais. Aliás, a ideia de imagens e categorias primitivas partilhadas culturalmente e transmitidas pela memória coletiva remete para o conceito de “themata” elaborado por Moscovici e Vignaux (1994), para quem tais conjuntos de imagens ancestrais dicotómicas estão na base das representações sociais e, portanto, na origem mesmo do pensar coletivo e social.

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2.2 Representações sociais e rumores A psicologia social concerne à comunicação social, à génese, à evolução e ao funcionamento do pensar social, bem como às relações entre os pensamentos e os rituais do dia-a-dia. Aqui, a representação social é a noção-chave. As representações sociais formam-se e evoluem em contextos socioculturais e históricos. São transmitidos de geração em geração, ao longo do tempo, através das mais diversas vias comunicacionais como a socialização, as interações quotidianas, a memória coletiva ou a comunicação simbólica. Existem também vias comunicacionais institucionais que perpetuam as representações sociais como a linguagem, a comunicação social, os sistemas legais, a educação. As representações sociais dão sentido ao pensamento e à comunicação (Markova, 1999), ou seja, edificam o senso comum. O processo de formação das representações permite observar a sua estrutura. Se para Serge Moscovici (1976) o processo se faz em duas fases, a objetivação e a ancoragem, para Denise Jodelet este processo faz-se em três momentos: a construção seletiva, a esquematização estruturante e a naturalização (Jodelet, 1989, p. 73). A naturalização torna a representação numa realidade concreta através da ancoragem – ou seja, da sua incorporação – num sistema de significados pré-existentes. Assim, as situações novas que requerem um pensar constituinte remetem para o pensar constituído para situar a novidade nas estruturas do conhecido. Por isso, como Moscovici constata, as representações sociais são elementos simbólicos do mundo social, são as ideias que o homem partilha sobre uma coisa independentemente dela própria (Moscovici, 1989, p. 87). A representação coletiva durkheimiana funciona como um constrangimento para o indivíduo na medida em que aquela prepara os indivíduos a pensar e a agir de maneira uniforme. No entanto, o sociólogo francês já encarava as representações como elementos dinâmicos: “seria necessário investigar através da comparação dos temas míticos, das lendas e das tradições populares, das línguas, a maneira como as representações sociais se atraem e se excluem, fusionam umas com as outras, ou se distinguem” (Durkheim, 1937, p. XIX).

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Compreendemos, portanto, o pensamento de Moscovici ao evidenciar o caráter moderno das representações, porque estas “substituem os mitos, as lendas, as formas mentais usuais nas sociedades tradicionais” (Moscovici, 1989, p. 100). Parece-me desde já necessário dedicar algumas palavras ao conceito de senso comum. O senso comum engloba representações coletivamente engendradas e socialmente partilhadas que são dadas por adquiridas. São as representações sociais que formam o que Durkheim chamou de “consciência coletiva” (o conjunto de crenças, conhecimentos, pressupostos, valores e normas partilhadas por um grupo social)92. Para Alfred Schütz, os processos de racionalização do mundo quotidiano – ou seja do senso comum – são “processos de tipificações progressivas” baseados em relação ao anonimato e à intimidade no espaço e no tempo (ou seja, centradas no Eu, aqui, agora). Na compreensão do mundo social, o indivíduo tem recurso à sua “reserva de experiências” alimentadas pelas tipificações progressivas segundo “a herança, a educação, a tradição, os hábitos e a sua própria reflexão prévia” (Schütz, 1998, p. 33). Por outras palavras, a coerência do senso comum (lido como um sistema de conhecimento) “não remete para as leis naturais, mas para as sequências e relações típicas” (Schütz, 1998, p. 34). As tipificações progressivas são um modo de organização das representações sociais. Além disso, o senso comum manifesta-se pela sua tipicidade. Assim, as pessoas partilham estruturas culturais típicas nas representações de outrem, no conhecimento de acontecimentos, nos comportamentos quotidianos e nas interações do dia-a-dia. A tipicidade implica, então, que as novas experiências são interpretadas a partir das experiências precedentes que constituem a “reserva de conhecimentos disponíveis”. Segundo o sociólogo, “a tipicidade e o caráter objetivo das nossas experiências e crenças não questionadas são inerentes à exequibilidade das ações humanas no domínio das coisas dadas por adquiridas” (Schütz, 1998, pp. 62-63). Por isso, Berger e Luckmann (2006) defendem que a realidade do quotidiano – a realidade do senso comum – é socialmente construída. As representações sociais são

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Para Durkheim, a consciência coletiva é exterior aos indivíduos e estes interiorizam os elementos desta consciência nos processos de socialização; a consciência coletiva é, essencialmente, constrangedora; o indivíduo deve moldar-se às maneiras de pensar e de agir da comunidade à qual pertence; a consciência coletiva dá às sociedades os seus traços culturais particulares, (Durkheim, 1893). 69

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uma forma de classificação dos grupos na qual as tipificações do Outro sofrem a influência da interferência do sujeito que vê (e, por isso, pensa) o Outro. A relação do sujeito com o Outro vai, portanto, depender do grau de intimidade. A família e os amigos situam-se na esfera do íntimo, mas os contemporâneos, os predecessores e os sucessores situam-se na esfera do anonimato. Aqui a tipificação está totalmente dependente dos themata. As tipificações são, assim, uma forma de objetivação através da qual o sujeito pode interpretar acontecimentos e reconstruir os conteúdos das representações sociais. Neste sentido, as representações sociais vão além da simples descrição: elas fixam uma referência, tendo uma carga simbólica, reconhecida intersubjetivamente pelos sujeitos no seio de uma comunidade. A falta de informação e a incerteza vão favorecer a emergência de crenças arcaicas através das representações. Estes saberes arcaicos são reativados num contexto social particular. Assim, as representações sociais são uma forma de conhecimento socialmente partilhado e participam na construção de uma realidade comum a uma comunidade. São, por isso, sistemas de interpretação que organizam as relações de um indivíduo com o mundo que o rodeia e que orientam os comportamentos e a comunicação social (Jodelet, 1989). A representação social simboliza e interpreta o objeto, confere-lhe significados, permitindo a fabricação do conhecimento popular. O papel da comunicação é fundamental pois a classificação das coisas, para integrar o senso comum, tem de ser partilhada pelos membros do grupo. Na sua análise emblemática sobre a comunicação social relativa à psicanálise, Moscovici desvenda três tipos de expressão escrita relativos a três tipos de comunicação: a difusão, a propagação e a propaganda. A difusão (de massa) é a transmissão do conhecimento científico com o objetivo de criar um senso comum que se adapte aos interesses do público (por exemplo, a imprensa nacional). A propagação é a apropriação do conhecimento científico por um discurso particular de modo a acomodar este saber (Moscovici, 1976). O exemplo de Moscovici é a imprensa católica que adaptou os novos conhecimentos da psicanálise ao espiritualismo cristão. A propaganda é uma forma de comunicação que se inscreve nas relações conflituosas e que impõe uma “verdade” relativa a algo manifestamente “falso” (por exemplo, as

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ideias sobre a psicanálise veiculadas pela imprensa comunista). Estes modos de produção do senso comum permitem analisar, respetivamente, as opiniões, as atitudes e os estereótipos. É de notar que, nesta perspetiva, as representações sociais não são só pensadas em termos de consenso, mas também em termos de conflito. Podemos então falar de “interações conflituais constituintes” (Windish, 1989, p. 194). Segundo Moscovici, “a informação que nos chega do mundo exterior é talhada não pela realidade neutra, mas através de teorias e preconceções implícitas e são estas, por sua vez, que talham o mundo para nós” (Moscovici, 1976, p. 52). De facto, as notícias envolvem um mundo de significados que são dados como garantidos. A descodificação da notícia é garantida pelo senso comum, mas também pelo registo em que se opera a transmissão das informações. Por exemplo, o facto de as notícias sobre os imigrantes serem, na sua esmagadora maioria, enquadradas num registo policial (Guia, 2008 e 2012) facilita a associação da imigração à criminalidade. Estamos, pois, perante uma linguagem simbólica da exclusão, constituída por estereótipos que, infelizmente, constituem um sistema de saber comum, ou, sob a pluma de Moscovici “um recurso tradicional de uma cultura” (Moscovici, 1999, p. 102).

Se as pessoas tomassem consciência das suas ilusões, poriam de lado preconceitos e estereótipos. Não esqueçamos, contudo, que se trata de representações partilhadas pelas pessoas que nelas acreditam. E como dizia o meu mestre Alexandre Koyré, estas representações são mais reais do que a realidade. (Moscovici, 1999, p. 92)

Baseado num estudo do epistemólogo Jean Piaget, Willem Doise chega à conclusão que o patriotismo é uma representação social que não parte necessariamente de conhecimentos científicos mas de comportamentos primários entre o Eu e o Outro (Doise, 1989). Por exemplo, um estudo de Tajfel de 1981 demonstra como as crianças consideram os seus compatriotas mais simpáticos do que as pessoas oriundas de outros países (citado em Doise, 1989, p. 371). Ora estas crianças, sobretudo as mais jovens, ainda não têm conhecimentos sobre os países onde encontram os habitantes mais simpáticos. Pode-se então assumir que as representações sociais são um “meta71

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sistema” que engloba vários esquemas organizadores pré-existentes (Doise, 1989, p. 375). Estes esquemas vão-se atualizando ao longo da vida segundo as experiências individuais e as regras sociais. A produção e a difusão de representações são, portanto, inerentes ao mundo social. Tais representações são uma forma de conhecimento partilhado cuja função é a construção de uma realidade comum. De entre as representações destacam-se os estereótipos, processos de simplificação e categorização da complexidade social. Os estereótipos, além de moldarem a realidade, revelam-se instrumentos úteis para a cristalização estética da informação. Numa perspetiva estruturalista, as notícias são também uma construção da realidade no sentido em que entram em contexto diversos fatores “exteriores” ao facto relatado como o constrangimento e condicionalismo editorial e de produção. Ou seja, as notícias não refletem a realidade, mas sim uma visão da realidade. Podemos então afirmar que a relação entre o real e a realidade relatada pelos média situa-se na ordem da representação. O exemplo mais claro deste processo representacional é o rumor. A capacidade heurística do fenómeno rumor está intimamente ligado à História e à psicologia social. Françoise Reumaux (1998 e 1999) compara metaforicamente o tecido social, que dá nascença ao rumor, à alomorfia de um inseto em três estados: o estado larvar (equivalente ao suporte simbólico do rumor), o estado de pupa (que equivale ao suporte estrutural) e o estado de eclosão (o suporte conjuntural ou a fase audível). O estado larvar traduz-se pela memória coletiva que guarda o rasto de eventos e experiências passadas. A mitologia e a história inspiram manifestamente a consciência coletiva que abre a possibilidade de “contaminação de uma representação” (Reumaux, 1999, p. 14). No estado de pupa – o momento da formação da crisálida, ou fase intermediária entre a larva e o adulto – a consciência individual é “incubada”, ou seja, a realidade torna-se numa construção social baseada em factos passados. Com a comunicação, labirinto de múltiplas redes, esta realidade individual torna-se numa realidade coletiva, resultando na emergência de conflitos entre grupos sociais. O estado de eclosão é o estado de “explosão” do rumor. O imaginário, ao aliar a realidade social

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à memória coletiva, permite a formação das representações sociais. Reumaux propõe a seguinte grelha de leitura:

Estado larvar

Estado de pupa

Estado de eclosão

Mitologia

Realidade

Imaginário

Memória social

Memória individual

Representações

Contaminação

Incubação

Explosão

Tabela 4: Grelha de leitura dos rumores Fonte: Reumaux, 1998: 15

Esta grelha de leitura permite também a identificação do tipo ideal do rumor que, para a socióloga, apresenta cinco características: “o bode expiatório”, “a conspiração”, “o segredo”, “a inquietante estranheza” e “despossessão”, no sentido em que um rumor se solta de quem o iniciou para ser veiculado por outras pessoas, (Reumaux, 1999, p. 8). Importa também realçar que a repetição inerente ao rumor demonstra o caráter dinâmico do fenómeno, podendo mesmo criar laços sociais na medida em que existe uma convergência de perspetivas. Por isso, o rumor depende da intersubjetividade social, condição sine qua non das interações sociais. Pascal Froissart propõe uma exploração da capacidade comunicativa dos rumores através da psicossociologia e da adequação entre o imaginário e o real. O sociólogo concebe o rumor como uma informação não-verificada, “um evento sem data, repetido no pensamento social” (Froissart, 1995), um fenómeno que pretende ser real e atual e que denuncia um problema comum a um grupo social. Michel-Louis Rouquette insiste ainda mais sobre o aspeto de atualidade ao constatar que “é o rumor em si mesmo que cria a atualidade: o que não existe no discurso de um grupo, não existe efetivamente para o grupo e a atualidade define-se como o que é ‘atualizado’ pela palavra social” (Rouquette, 1975, p. 19). 73

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É necessário, por conseguinte, não considerar os rumores como simples traduções de um mal-estar social, mas como uma forma folclórica de comunicação, que se traduz por uma realidade social (ou pela perceção que temos dessa mesma realidade). Como fenómeno coletivo, os rumores “confirmam o que sabemos, o que gostaríamos de acreditar, ou o que gostaríamos de fazer acreditar” (Rouquette, 1975, p. 107). Veremos, posteriormente, a importância da construção de rumores para a criação e perpetuação de certas representações sociais relativas ao TSH. Em suma, para estudar as representações sociais de um fenómeno específico devemos adotar o paradigma holista em termos de redes e de interdependências dos significados e dos símbolos. As representações sociais do TSH estão claramente associados a outras redes de representações – ou, nos termos de Schütz, a outros universos simbólicos – nomeadamente ao universo simbólico da imoralidade sexual (a mitologia da prostituição) e ao universo simbólico da migração humana. Assim, não é minha intenção estudar em detalhe cada um destes fenómenos mas sim salientar a interdependência e os centros comuns entre as diferentes representações. É, desta forma, possível discernir os elementos relativamente estáveis como, por exemplo, a “imoralidade” da sexualidade desviante ou a desconfiança face ao Outro. A este propósito importa ainda definir dois conceitos-chave: os pânicos morais e as histórias moralísticas. O conceito de moral panic foi introduzido nas Ciências da Comunicação por Marshall McLuhan (1964), referindo a pânicos produzidos pelos média. Mas foi Stanley Cohen (1987) que definiu concretamente o conceito de pânico moral. Para ele, distinguem-se cinco aspetos centrais: o exagero e a distorção, os títulos enganadores, as duplas reportagens (a mesma história é relatada várias vezes, criando a impressão que são duas histórias diferentes), os incidentes relatados incorretamente e a demonização do Outro. Cohen defende também a ideia de que os pânicos morais incluem não só os meios de comunicação, mas também uma série de instituições públicas. Uma das contribuições mais importantes do sociólogo é o argumento de que os pânicos morais são produtos de condições sócio-históricas particulares. Por sua vez, Stuart Hall e o seu grupo de investigadores da Universidade de Birmingham definem os pânicos morais em termos de poder e de controlo social. O

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pânico moral é um fenómeno social no qual a natureza e a escala da ameaça é ampliada pelos meios de comunicação numa “espiral dos significados”93 (Hall, Critcher, Jefferson, Clarke & Roberts, 2013, p. 19). Ou seja, o pânico é iniciado por um acontecimento considerado um problema sério que rapidamente se torna num problema gravíssimo, necessitando uma resposta firme. É de notar que os pânicos morais estão particularmente associados à imprensa. Com o advento da Internet, o público tem acesso a mais informação e a perspetivas diferentes. É, segundo alguns investigadores, um conceito interessante para as Ciências da Comunicação, mas perde um pouco relevância na época pós-moderna (Moore, 2014). Aliás, Stuart Waiton defende mesmo que as sociedades modernas avançadas vivem num estado de pânico constante. Tratase, porém, de um “pânico amoral” que realça mais o cuidado especial que as possíveis vítimas têm de ter do que marginaliza certos atores sociais. Tal facto é devido, para Waiton, às evoluções ideológicas das atitudes conservadoras para as atitudes liberais face às minorias (Waiton, 2008). Precisamente, as histórias moralísticas94 desenvolvem um discurso onde é enfatizado o que pode acontecer e sobre as precauções que as pessoas têm de tomar. Estas histórias têm especial relevância no contexto do crime, em geral, e do crime sexual, em particular. Segundo Sarah Moore, este conceito implica certas características como a prescrição do comportamento correto, a atribuição da responsabilidade à vítima (normalmente feminina), a marginalização da conduta da vítima ou da vítima potencial, a ênfase na necessidade do autocontrolo e o discurso moralístico do perigo e da precaução (Moore, 2014, p. 125). Para a investigadora, as histórias moralísticas estão especialmente associadas à vitimização sexual das mulheres (Moore, 2014, p. 127). Como os pânicos morais, também as histórias moralísticas se inserem em determinados contextos socio-históricos. Também à semelhança dos pânicos morais, as histórias moralísticas recebem um apoio significativo dos grupos ativistas. Por fim, a autora salienta o facto de as histórias moralísticas demonstrarem a preocupação geral em relação à liberdade da mulher (Moore, 2014, p. 130). As mensagens preventivas

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Tradução da investigadora. “Cautionary tales”: expressão introduzida por Sarah Moore (2009), traduzida pela autora. 75

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incluem não aceitar bebidas de estranhos, não dar o número de telefone a desconhecidos, não viajar sozinha, não se deslocar sozinha pela calada da noite, não aceitar propostas de trabalho no estrangeiro. Todas estas mensagens limitam a liberdade feminina. Moore nota ainda que as histórias moralísticas são divulgadas em massa em períodos históricos em que aumentaram a liberdade feminina e o seu envolvimento na vida pública. Tendo em vista a importância da memória mitológica e do passado histórico para a construção e reconstrução das representações sociais, é analisado, na secção seguinte, o mito cultural da escravatura branca, salientando o processo de difusão dos rumores e do pânico moral. Em seguida, passo a analisar a importância da moral sexual para a representação da prostituta. Por fim, é exposto um resumo de estudos e sondagens sobre as representações sociais do imigrante.

2.3 O mito cultural da escravatura branca Nesta secção defende-se que os conceitos de escravatura branca e tráfico de mulheres funcionam como mitos culturais, construindo ou mantendo representações do fenómeno da migração feminina na indústria do sexo. Notemos que o mito não é necessariamente falso. Considero aqui a definição de mito segundo Grittner (1990, p. 7) como uma crença coletiva que simplifica a realidade. O mito ajuda a explicar o mundo e a justificar ações e instituições. O mito cultural é um discurso com um conteúdo moral (e moralizador) e com uma carga ideológica significante. Como foi referido no capítulo precedente, o mito da escravatura branca nasceu num contexto de regularização da prostituição e foi indicativo de medos profundos e incertezas relativas à identidade nacional, ao desejo de emancipação por parte das mulheres e aos estrangeiros. Relembremos a série de artigos de W. T. Stead que acenderam a chama da indignação internacional ao afirmarem que milhares de meninas inocentes eram traficadas. Para além dos relatórios, da legislação e dos artigos de jornais daquela época, o tema da escravatura branca originou uma vasta produção literária e cinematográfica da qual é significativo expor alguns exemplos. 76

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Em relação à sétima arte, são de realçar Traffic in souls (1913) de George Loane Tucker, Inside of the white slave traffic (1913) de Frank Bleak, Smashing the vice trust (1914) de John Melville, House of bondage (1914) de Pierce Kingsley e Raymond B. West. Estes filmes, do início do século XX, dramatizam os métodos de recruta das jovens mulheres, inconscientes do destino que as espera.

Figura 1: Cartaz do filme Inside of the white slave traffic (1913) Fonte: www.imdb.com

Por sua vez, na arte literária convém atardarmo-nos um pouco no livro de Ernest Albert Bell, Fighting the traffic in young girls; or, war on the white slave trade, de 1910. Bell era o secretário da Illinois Vigilance Association, uma das filiações do National Vigilance Association (portanto em relação direta com William T. Stead). Este livro é uma compilação de ensaios escritos por juízes, militantes e professores universitários e é 77

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dedicado ao “Exército dos trabalhadores leais que, em nome de Deus e da Humanidade, se alistaram nesta Guerra Santa para a defesa e pureza das mulheres” (Bell, 1910).

Figura 2: “My God, if only I could get out of here” Fonte: Bell, 1910

As ilustrações que seguem, extraídas desta obra, permitem uma clara visualização de representações sociais conservadoras numa época em que a emancipação da mulher era vista como uma violação séria da tradição vitoriana. O simples facto de uma mulher beber um café com um homem desconhecido ou de frequentar os salões de dança facilitaria o tráfico de escravas sexuais.

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Figura 3: “The first step” Fonte: Bell, 1910

Figura 4: “Dangerous amusements” Fonte: Bell, 1910 79

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Apresento a seguir uma seleção de excertos:

Paris, capital de grandes reis e terra de grande devassidão, tornou-se na fonte e epicentro do comércio mundial de escravas brancas do tempo atual. (...) De forma alguma são todos os traficantes franceses. Muitos são judeus, muitos são italianos e sicilianos, alguns são austríacos, alemães, ingleses, americanos, gregos. Mas é Paris, que transforma o vício em arte e faz de o comércio de escravas brancas um negócio sistematizado. 95 (Bell, 1910, pp. 25-26)

O exame recente de mais de duzentas escravas brancas pelo Gabinete do Procurador-Geral dos Estados Unidos em Chicago confirmou, literalmente, o facto de que milhares de meninas inocentes do país são aprisionadas todos os anos numa vida de escravidão sem esperança. 96 (Bell, 1910, p. 48)

Importa referir que a crença de que Paris era o epicentro do tráfico de brancas se deve ao facto de a legislação desse país ser, nessa altura, regularizadora em matéria de prostituição. A regularização da atividade era vista como essencial, tendo em conta que a prostituição é um “infortúnio necessário”.97 Esta atitude face à prostituição era criticada pelos países abolicionistas como a Inglaterra ou os Estados Unidos. Outro livro de destaque é The great war on white slavery de Clifford Grifith Roe (1910). De forma similar, o livro é supostamente um testemunho honesto das atrocidades do tráfico de meninas. Diversas confissões são feitas por proxenetas, angariadores e traficantes. A obra descreve as condições de vida e o tratamento cruel dado às vítimas inocentes. Como no livro de Bell, o texto é acompanhado por ilustrações dos esquemas utilizados para enganar as jovens.

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Tradução da autora. Tradução da autora. 97 Como foi referido anteriormente, nos países reguladores, ao invés dos abolicionistas, as prostitutas eram controladas e reunidas em casas de passe. Desta forma a polícia podia ter acesso às identificações e os médicos podiam controlar os problemas sanitários. O problema da legislação regularizadora é que, no século XIX e inícios do século XX, o poder estava inteiramente nas mãos dos agentes que podiam internar as prostitutas em hospitais ou nas prisões sem nenhum processo judiciário. 96

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Figura 5: Os passos para atrair as jovens mulheres Fonte: Roe, 1910 81

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From dance-hall to white slavery de John Dillon e H. W. Lytle (1912) é também um livro de relevo. Segundo estes autores, os salões de dança eram lugares propícios para atrair jovens mulheres. Num estilo melodramático, as histórias relatadas nesta obra refletem uma propaganda moralista: as mulheres que frequentam tais lugares são consideradas decadentes. O limite entre a vítima do tráfico e a prostitua desaparece virtualmente. O verdadeiro enfoque aqui é a questão da moralidade social (o consumo de bebidas alcoólicas torna-se num passo para a prostituição) e sexual (as meninas são sempre inocentes até frequentarem os salões de dança). O pânico moral associado aos salões de dança está ligado ao aparecimento, na década de 1910, dos salões de taxidance, locais onde as mulheres eram pagas para dançar com os homens.

Figura 6: “If I had only known” Fonte: Dillon & Lytle, 1912

O tema do tráfico de escravas brancas evoca inevitavelmente o tema da submissão feminina. As características deste tipo de literatura repetem-se de forma constante: a associação entre a sexualidade e a violência, o rapto de virgens inocentes, vendidas em seguida por homens estrangeiros, a mulher como objeto de desejo sexual, a agressividade masculina e a passividade feminina. O aspeto melodramático dos relatos 82

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permite a solidificação do sentimento de empatia em relação à vítima/heroína. Os cenários são eróticos e sádicos. O facto de existirem testemunhas evoca o voyeurismo. Todas estas características refletem não só as preocupações sociais de uma época, mas também os desejos mais íntimos – e interditos – resultando numa profunda ambiguidade existencial entre repulsão moral e atração sexual.

Figura 7: Ernest Normand, 1894, The white slave Fonte: Wikipedia

As campanhas de luta contra o tráfico do século XIX foram, essencialmente, combates contra a prostituição e contra a libertinagem numa época de boémia. Os discursos dividiam-se entre os “reguladores” e os “abolicionistas”. Os primeiros defendiam a regulamentação das casas de alterne, incluindo exames médicos obrigatórios e limitada mobilidade. Os últimos defendiam a abolição total da prostituição através da criminalização e penalização das prostitutas, proxenetas e

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clientes. Na Europa vitoriana do final do século XIX, as prostitutas eram consideradas vítimas, necessitando reabilitação e salvação. Um dos objetivos essenciais da campanha abolicionista foi criar uma certa simpatia pelas prostitutas, vitimizando-as. Neste contexto, a inocência das vítimas foi estabelecida através de táticas retóricas que sublinhavam a juventude e a virgindade. A inocência da vítima também serviu para evidenciar a impiedade do traficante. A dicotomia inocência (feminina) /maldade (masculina) resultou numa simplificação da realidade da prostituição e da migração feminina, transformando estes fenómenos numa fórmula melodramática da vítima e do vilão (Corbin, 1982). A idade das vítimas era igualmente central. As jovens meninas tornavam-se “mártires da virgindade” (Corbin, 1982, p. 277). Os livros e as imagens apresentadas previamente atestam o fascínio por esta inocência e pureza, fazendo subtilmente referência ao sacrifício das virgens no mito do Minotauro. Outro tema relacionado com o sacrifício era o da doença (em particular a sífilis) e a morte, cuja ênfase contribuía para a ideia de vítima inocente. As consequências das campanhas abolicionistas (que, na realidade, partiram do desejo de emancipação) foram devastadoras. No Reino Unido, a White Slave Act de 1921 foi usada contra as prostitutas e contra as mulheres proletárias (Doezema, 2000). Nos Estados Unidos, a Mann Act de 1910 foi usada pela polícia para prender prostitutas e homens de cor (Grittner, 1990). Em Portugal, observou-se um aumento da repressão policial (Pais, 1983). Os historiadores contemporâneos afirmam, quase unanimemente, que o número real de casos de escravatura branca era muito inferior ao dos diversos relatos e estudos. Daí que o conceito esteja associado à ideia de mito. 98 Hoje em dia considera-se um mito cultural devido à sua persistência ao longo do tempo. O exemplo do rumor de Orleães demonstra que os estereótipos (relativos sobretudo ao tráfico de brancas e aos judeus) ainda estavam presentes na França dos anos 1960. O rumor de Orleães, analisado por Edgar Morin, faz alusão a uma série de meninas que supostamente desapareceram naquela cidade, no ano de 1969, em seis lojas de 98

O mito da escravatura branca pode ser observado como um pânico moral, verificando-se todas as características inerentes ao conceito: exagero e distorção nos relatos, títulos enganadores, incidentes relatados incorretamente e a demonização do estrangeiro (infra, secção 2.2). 84

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vestuário pertencentes a judeus. Na realidade, nenhuma rapariga foi declarada desaparecida pela polícia. Todavia, as notícias correm e correm depressa. Num ápice, este rumor transformou-se num “pânico medieval” a nível nacional. Morin demonstra então a presença de um rumor arcaico (o antissemitismo) na constituição de crenças modernas e a rápida disseminação de falsas informações, típica – pela sua rapidez – do mundo pós-moderno das comunicações de massa. A equipa de Morin atesta a estrutura de formação do rumor, não sem lembrar o processo de formação das representações sociais acima descritas. Num primeiro momento, observa-se a fase de “incubação”, durante o período de Maio 68, no qual as jovens alunas transmitem entre si rumores sobre desaparecimentos nas lojas de vestuário. Numa segunda fase, a da propagação, o rumor começa a transbordar para o mundo adulto: da aluna para a professora, da aluna para os pais, de colega para colega. “O rumor espalha-se nos grupos de jovens, nas famílias, nos escritórios, nas oficinas, nas fábricas” (Morin, 1969, p. 34). A terceira fase é a metástase, na qual o rumor prolifera, alimentando-se de todas as informações, mesmo sendo estas pequenas gracinhas. Uma vez observado o processo de evolução do rumor, Morin passa às estruturas implícitas do mito. Assim, segundo o sociólogo, o tráfico de brancas assume um novo look (Morin, 1969, p. 52) no mundo contemporâneo. O mito da escravatura branca põe em evidência certos temas latentes. “O tema une um imaginário masculino, levado para a violência, o rapto e a posse de mulheres ao imaginário feminino, atormentado pela violação, as tomadas de assalto e a prostituição” (Morin, 1969, p. 53). Alguns elementos constitutivos do rumor, como os bombons ou os lenços com clorofórmio, adaptam-se ao mundo moderno na imagem das lojas de roupa e, mais precisamente, das cabines de prova. Outros elementos permanecem, designadamente a demonização do Outro através da figura do judeu. Edgar Morin resume da seguinte forma:

De todas as maneiras, trata-se sempre de um alarido cujo núcleo originário é feminino e, particularmente, adolescente e juvenil. De todas as formas, aquele que é visado, é aquele ou aquela que apresenta uma singularidade em relação à comunidade, é o Outro (a mulher não acompanhada, o estrangeiro na cidade, o 85

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comerciante que fez rapidamente – por isso estranhamente – fortuna. O que se integra perfeitamente no nosso sistema explicativo: o judeu é o Outro ideal, mas não é o único a incarnar um papel inquietante e simbólico. (Morin, 1969, pp. 1112)

Atualmente estas representações são ainda utilizadas em certos meios de comunicação. Por exemplo, ao preparar uma comunicação em Barcelona sobre o jornalismo ético e o TSH para exploração sexual, constatei que, ao inserir a palavrachave “tráfico de pessoas” na ferramenta de investigação do website do jornal El país, outros temas, diretamente ligados a este, eram, por ordem: “tráfico de brancas”, “escravatura”, “tráfico de imigrantes”, “detenções” e “delitos”.99 De forma semelhante, ao investigar artigos da voxeurop.eu que utilizaram o termo “tráfico de pessoas”, encontrei um artigo no qual o termo “escravas brancas” é utilizado três vezes100. Estamos, assim, perante claros exemplos da persistência centenária do mito cultural da escravatura branca.

2.4 Moral sexual e prostituição O estigma da prostituição é construído pelo olhar social, existindo um clara distância entre a identidade real da trabalhadora do sexo (que pode incluir outras identidades sociais como ser mãe, ou ser estudante) e a sua identidade virtual (que o mundo social classifica, geralmente, como desviante ou mesmo patológica). A dupla definição vítima/culpada da figura da prostituta é evidente na consciência coletiva. Outra dicotomia relativa ao trabalho do sexo é a separação entre a prostituta da rua (pobre, suja e obscura) e a acompanhante de luxo (bonita, chique e luminosa). Estes dois tipos de prostituição na representação da prostituta no senso comum acompanham outras dicotomias: a vida e a morte, a juventude e a velhice, o luxo e a pobreza. 99

Esta pesquisa foi feita durante o mês de novembro de 2013. A página web é a seguinte: http://elpais.com/tag/trafico_personas/a/. 100 (18 de outubro de 2011). Tráfico de seres humanos lucra com a crise. Sega Sofia. Acedido em http://www.voxeurop.eu/pt/content/article/1070631-trafico-de-seres-humanos-lucra-com-crise. 86

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A literatura ocidental do século XIX relativa à prostituição revela construções moralistas do mundo ideal da sociedade burguesa vitoriana. Estas visões do mundo vitorianas entravam em choque direto com as condições de vida de grande parte das populações. O modelo ideal baseava-se, então, na família, na ordem e na sobriedade101, confrontando-se com o ócio e a boémia, considerados como uma patologia social. Neste universo marginal cruzavam-se prostitutas, criminosos, larápios, operários, jovens burgueses desviantes, fadistas e outros artistas. A sociedade burguesa não podia deixar de vincar a diferença entre o mundo da Ordem e o abismo da Desordem. No pensamento dualista – e simplista – as oposições eram evidentes. À família burguesa respeitável com filhos honestos opunham-se as famílias irregulares com lares desfeitos e crianças abandonadas. Às profissões produtoras de riqueza e de prestígio opunham as ocupações duvidosas e criminosas. Mesmo a nível do espaço urbano lisboeta, ao Rossio e ao Chiado opunham-se a Alfama e a Mouraria. Em França, a Belle Époque assistiu a uma intensa produção literária na qual a cortesã ocupa um espaço de eleição. Algumas das obras mais famosas são Boule suif de Guy de Maupassant (1875), La fille Élisa de Edmond de Goncourt (1877) ou Nana de Émile Zola (1879). Em Portugal, a tendência era uma escrita de estilo cronista. O primeiro autor deste género foi Francisco Ignácio dos Santos Cruz com a sua obra Da prostituição na cidade de Lisboa (1841). Tratava-se de um eco da abordagem do médico higienista francês Alexandre Parent-Duchâtelet, que analisa a prostituição a partir de considerações históricas, higiénicas e administrativas, propondo também medidas regulamentares necessárias para a manutenção da saúde pública. Seguiu, posteriormente, um número significativo de publicações de contorno sociológico das quais se destaca a História da prostituição e polícia sanitária do Porto de Francisco Pereira de Azevedo, para quem “o mais deplorável e mais vergonhoso estudo na sociedade é incontestavelmente a perversão da moral do género humano, é o abandono de si mesmo, é, enfim, a prostituição” (Azevedo, 1864, p. 23). Este estudo,

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A moral vitoriana é entendida como um conjunto de valores burgueses, imperialistas e conservadores edificado sobre as virtudes da família patriarcal, do trabalho e da Igreja. Este fenómeno social, típico do século XIX, está associado a uma moral estrita e autoritária, condenando qualquer ato sexual, desviante ou de libertinagem. 87

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explica o autor, é uma descrição dos usos e costumes da época “apesar de repugnantes” (Azevedo, 1864, p. 7). Nesse mesmo ano, é também publicado o Cancioneiro do Bairro Alto (1864), “colecção de chistosas poesias de um author patusco, oferecido a certas meninas que fazem certas coisas”. Mas talvez a obra mais conhecida na altura tenha sido a História da prostituição em todos os povos do mundo desde a mais remota antiguidade até aos nossos dias, em cinco volumes, de Pedro Dufour para quem a prostituição é “todo o tráfico obsceno do corpo humano” (Dufour, 1885, p. VI). Dufour apresenta uma visão claramente abolicionista:

A prostituição é uma das chagas mais vergonhosas da pobre humanidade, mas este mal, tão antigo como o mundo, tem logrado encontrar abrigo e proteção no próprio lar doméstico, no recinto dos templos pagãos, e sob o véu protetor da tolerância jurídica. […] Não nos é dado esperar pelo seu completo desaparecimento, visto que os instintos viciosos, a que corresponde, são desgraçadamente inatos na espécie humana; no entanto, podemos prever com toda a certeza que chegará um dia em que a prostituição terá de ocultar-se no fundo das sentinas públicas, para assim não ofender mais os olhares das pessoas honestas. (Dufour, 1885, p. VI)

Figura 8: História da prostituição em Portugal Fonte: Pessoa, 1887 88

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Outro livro de relevância assinalável é A história da prostituição em Portugal de Alfredo Amorim Pessoa (1887)102, na qual é possível observar a aplicação direta da teoria do estigma de Goffman acima descrita:

Moléstias congeniais – Encontram-se na cidade de Lisboa prostitutas que, apesar de as tornarem muito defeituosas, elas não deixam de ser procuradas e exercer o seu vil ofício; há algumas cegas de um olho: mesmo assim são procuradas; uma conheço eu, do olho direito, que, apesar de ter esta feição um tanto defeituosa, tem uma forma elegante e é muito procurada; há uma outra idiota e estúpida quase de nascença, que também exerce o ofício. Além das moléstias congeniais, há outras prostitutas que, pela cor da sua pele, parece que deviam repelir a aproximação de um europeu; apesar disso elas são procuradas… (Pessoa, 1887, p. 203)

É de notar que ainda hoje se aplicam características do monstruoso às prostitutas como atesta Alexandra Oliveira, “a visão estereotipada que a sociedade dominante tem sobre as pessoas que se prostituem é desumanizada. Ou melhor dito, desumaniza-as” (Oliveira, 2008, p. 233). Também no século XIX, as prostitutas foram alvo de estudo nas áreas da fisiologia, da antropologia e da psicologia. Assim, foram procuradas características fisiológicas comuns ao grupo, como se fosse um clã peculiar.

A antropologia (e o seu ramo posteriormente desacreditado de frenologia, o estudo do crânio como determinante das características mentais) interessava-se pelos seres humanos diferentes do padrão e, por isso, para além dos povos exóticos, os pobres, os criminosos e as prostitutas da sociedade ocidental foram objeto de estudo privilegiado. (Schouten, 2010, p. 90)

Já a fadista, embora incluída nos grupos da devassidão, se diferenciava da rameira pois, a sua vida sexual – geralmente bastante ativa segundo os cronistas – não exigia

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A história da prostituição em Portugal de Alfredo Amorim Pessoa (1887) está compilada no livro Os bons velhos tempos da prostituição, anotada por Manuel João Gomes (1976). 89

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contrapartidas materiais. Apesar disso, estas mulheres eram consideradas como umas vendidas devido à vida que levavam e aos comportamentos libertinos. A visão misógina do século XIX é clara: a imperfeição moral e a animalidade são características das mulheres que usufruem da sensualidade dos seus corpos. À castidade (normalidade) opõe-se a libertinagem (monstruosidade).

Figura 9: José Malhoa, Fado Fonte: Wikipedia

Ultrapassados os estereótipos do século XIX provados “cientificamente”, restam os estereótipos de cariz moral. A moralidade da prostituição implica a priori um primeiro pensamento de ordem dicotómica: a prostituição é imoral (perspetiva abolicionista e proibicionista) ou é moralmente admissível (na ótica da regulamentação). O século XX abriu caminho para novas reflexões e para a possibilidade de uma vasta diversidade de teorias. Por exemplo, o feminismo inicial encarava a prostituição como a forma extrema de opressão masculina – as mulheres eram passivas e submissas. A Revolução Industrial, ao ditar novas conceções do trabalho e, por conseguinte, do mundo social, resultou numa divisão sociopolítica: o feminismo radical (absoluta exclusão dos homens) e o feminismo marxista-socialista (igualdade de direitos). O século XX assiste, portanto, a uma multiplicação de feminismos e relativas perspetivas sobre a prostituição. Hoje em dia, os estudos sociológicos, sobretudo os de cariz interacionista, sobre a atividade 90

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concordam em estabelecer um terceiro ponto de vista, o da liberdade individual e da livre escolha, ou seja, “nem culpadas, nem vítimas”103. Se as primeiras definições da prostituição eram de cariz moralista, a tendência atual é explorar os mais diversos mundos e grupos sociais inseridos na área do trabalho sexual. Permanece, contudo, a velha questão da moralidade em geral e da moral sexual em particular. O século XX assistiu, sobretudo a partir dos anos sessenta, a uma desmitificação da sexualidade cujo passado é totalmente imerso em códigos de honra. A mudança de mentalidades e costumes permitiu uma valorização da sexualidade até então considerada como algo desviante. Porém a objetivação da sexualidade continua ainda presente no capitalismo tardio, especialmente nos países verberados pela religião dominante. De facto, se na época vitoriana a sexualidade era considerada anticivilizacional, nos tempos atuais assiste-se ainda a uma domesticação da sexualidade, esquecendo que esta, além de ser um atributo biológico, é também um produto social. O pensamento foucaultiano é essencial no que se refere à sexualidade como uma área social onde vários poderes institucionais – a família, a educação, a Igreja – exercem um controlo discreto mas assaz eficaz (Foucault, 1976, p. 24). O sistema de comportamentos prescrito por estas instituições promove uma “moralidade de homens” que Foucault descreve como uma “moralidade de homens: uma moral pensada, escrita e ensinada por homens e destinada aos homens. Moral viril, portanto, onde as mulheres só aparecem como objetos ou, no máximo, como parceiras que convém formar, educar e controlar” (Foucault, 1984, p. 33). Na sequência desta reflexão, Bourdieu defende que o mais importante campo de poderes é o da dominação masculina num contexto social de “violência simbólica” (Bourdieu, 1998). Para o sociólogo, esta violência simbólica reside em imperativos comportamentais ainda hoje observáveis como baixar os olhos ou aceitar interrupções. Ou seja, o corpo feminino continua subordinado à perspetiva masculina. O mais

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Slogans utilizado, desde 2003, pelas ONG e indivíduos que lutam pelos direitos dos trabalhadores de sexo em França (Tomás, 2009). 91

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interessante, de um ponto de vista simbólico, diz-nos Bourdieu, é que esta violência é consentida pelas mulheres.

Esta relação social [a violência simbólica] extraordinariamente comum oferece, assim, uma ocasião privilegiada de compreender a lógica da dominação exercida em nome de um princípio simbólico, conhecido e reconhecido ambos pelo dominante e pelo dominado. (Bourdieu, 1998: 12)

Para além da violência simbólica da dominação masculina, é também observável uma mesma violência na ética cristã, profundamente ancorada na moral das sociedades modernas ocidentais. Por exemplo, a tradição cristã associa o prazer sexual à morte e ao mal. Aliás, em algumas interpretações da Bíblia, Lilith, a primeira mulher de Adão, estava rendida ao desejo e à luxúria porque tinha sido criada a partir de lama e imundície. Lilith era estéril e os seus órgãos sexuais tinham ocupado o seu cérebro. Deus criou, então Eva, e para evitar outro fiasco fê-la nascer de uma costela de Adão. Lilith, símbolo do vício e da perversão, tornou-se num demónio (Morel, 2005, p. 545). É de notar que, por fim, ambos, Adão e Eva, são expulsos do paraíso, demonstrando a Deus que, decididamente, o homem é devasso e facilmente tentado. Ora, tendo em conta esta “corrupção natural” – o homem nunca será um anjo – foi necessário a religião regular todos os comportamentos “patológicos”. Émile Durkheim é claro a este respeito: “sob todas as suas formas, ela [a vida religiosa] tem por objetivo elevar o homem acima de si mesmo e de lhe proporcionar uma vida superior à que ele teria se obedecesse unicamente às suas espontaneidades individuais”, (Durkheim, 1912, p. 592). Numa sociedade conservadora e católica, como a portuguesa, as representações da feminilidade expõem ainda “os arquétipos clássicos (‘mulher-serpente’) e estereótipos (‘mulher-puta’), até à figura virtuosa de ‘esposa’ e protetora (‘mãe’), paradoxalmente assexuada e sublimada como fonte de vida (a procriação, o leite materno) ” (Silva, 2010, p. 39). Em suma, cai-se inevitavelmente no debate sobre a sexualidade, o que conduz, por sua vez, à sexualidade feminina como um espaço de controlo e vigilância que envolve uma luta de poderes. Perduram, por isso, os estereótipos mais profundamente 92

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enraizados na consciência coletiva. Assim, a prostituição é, ainda hoje, considerada como crime, patologia ou desvio porque implica comportamentos sexuais minoritários. A comercialização do sexo continua a transgredir os valores sociais hegemónicos e os cânones morais. Daí que a prostituição continue a sofrer uma permanente rotulagem e desqualificação. As consequências mais nefastas desta reação social são a discriminação a vários níveis societais e a violência nas suas mais diversas formas (psicológica, física, simbólica, institucional). Na sua investigação no terreno sobre a prostituição de rua, Alexandra Oliveira dá conta, na primeira pessoa, da estigmatização geral, atuante em 2008:

Os homens supunham-me puta e agiam como tal. E como é esse agir? É o agir de quem trata o outro como diferente; de quem olha aquela mulher como uma mulher diferente das outras, designadamente considerando que ela está disponível e recetiva às suas investidas sexuais, mesmo quando vai à farmácia comprar medicamentos ou à papelaria comprar material de escritório. (Oliveira, 2008, p. 218)

O estigma resulta no não-reconhecimento da atividade como profissão, o que implica, por sua vez, uma discriminação institucional.

O trabalho sexual não é reconhecido como um trabalho e os trabalhadores do sexo não têm voz própria, não estão associados, nem têm um sindicato que os represente, estão excluídos da segurança social e do sistema fiscal, não têm acesso garantido ao crédito bancário e estão ainda, com frequência, privados do seu direito à justiça. A marginalização é, então, sintoma de injustiça social. (Oliveira, 2008, p. 222)

As violências a que os trabalhadores do sexo – especialmente as prostitutas de rua – estão sujeitos variam desde comportamentos desagradáveis e ofensivos até ao rapto e ao homicídio. A violência “subtil” traduz-se por expressões faciais reprovadoras, injúrias e desprezo ostensivo.

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Elas [as senhoras que passam na rua] sabem que estão a olhar para putas, portanto, fazem-no com altivez. Olham por cima: por cima do seu altar de moralidade (o que é da esfera do simbólico) ou por cima do ombro (o que é da esfera do observável). (Oliveira, 2008, pp. 229-230)

Outra forma de agressão é a violência institucional nas áreas da segurança social, da saúde e da justiça. Por exemplo, o direito das prostitutas à maternidade é posto em causa (Oliveira, 2008, p. 234); no caso de um trabalhador do sexo ser agredido fisicamente ou ser violado pode sofrer uma “vitimização secundária” quando se dirige a um hospital e a polícia é negligente quando se trata de queixas de trabalhadores do sexo (Oliveira, 2008, p. 236).104 Como Alexandra Oliveira e Bernardo Coelho constatam, é interessante realçar, por fim, a diferença entre a palavra “prostituta” e a palavra “puta”. Se a primeira implica uma interação mercantil, a segunda pode ser aplicada a qualquer mulher quando esta é representada como devassa, vil, imoral e perigosa. Estamos, pois, perante a ideia de que “o estigma paira sobre todas as mulheres de forma igual, que não é apenas pela atividade prostitucional que a mulher fica sujeita ao estigma. A única condição para a vinculação desvalorizadora é ser-se mulher” (Coelho & Oliveira, 2010, p. 209). O que sobressai sobre as representações sociais do trabalho do sexo em geral, e da prostituição em particular, é que a moral sexual é uma themata, no sentido em que é um conjunto de categorias opostas (normal/desviante; puro/impuro; homem/mulher) que, num tempo histórico preciso (mais precisamente a partir do século XIX), se tornaram numa fonte de tensão e de conflito. No tocante à migração laboral feminina, as situações são muito complexas e resistem a explicações simplistas. A persistência do mito tira precisamente a sua força desta complexidade ao reduzir o fenómeno à dicotomia vítima/vilão. Ora, neste movimento, o mito cria limites no debate público e no espaço de ação. De facto, as intenções humanistas do Estado legitimam as ações policiais contra os trabalhadores do

104

Também o relatório de E. Schulze et al. (2014) constata não só as relações problemáticas entre as forças policiais e os trabalhadores do sexo, mas também a falta de investigações a nível europeu sobre as violências policiais cometidas neste contexto. 94

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sexo sem autorização de residência. Por isso, a luta contra o TSH confunde-se facilmente com a luta contra a imigração clandestina. A sociedade foucaultiana está, deste ponto de vista, em plena ação: o controlo dos comportamentos sexuais desviantes e o controlo da imigração.

No discurso das autoridades, a luta é contra o tráfico: nas práticas policiais e judiciais perseguem-se imigrantes, independentemente de elas terem sido traficadas e estarem contra a sua vontade ou, se, pelo contrário, vieram de livre vontade e estão por sua escolha no trabalho sexual. (Oliveira, 2008, p. 238)

O trabalho na indústria do sexo é, na sua vasta maioria, informal e oculta, suscitando críticas e conflitos de ideias. A recusa de ver e de reconhecer as atividades de tal indústria dificulta as ações de luta contra o TSH. Além disso, tais atitudes contribuem para que todas as pessoas envolvidas na indústria do sexo sejam postas no mesmo

“saco”,

resultando

no

não-reconhecimento

daqueles

que

fazem,

voluntariamente, da prostituição o ganha-pão. De acordo com Manuel Carlos Silva, “a prostituta presta serviços sexuais mas não vende a sua pessoa nem sequer o seu corpo, fenómeno, esse sim, presente em contexto de formas de produção esclavagista” (Silva, 2010, p. 18). Numa palavra, existe uma diferença evidente entre trabalho do sexo e exploração sexual. De igual forma, a complexidade dos processos migratórios torna a identificação de redes de TSH mais difícil. Françoise Guillemaut dá o exemplo dos movimentos migratórios de mulheres africanas para França (Guillemaut, 2008). A sua investigação permitiu estruturar certos modos de imigração que podem ser confundidos com o TSH. No primeiro modo, o circuito migratório é organizado por mulheres africanas residentes em França. A mulher que deseja vir para a Europa contacta uma destas residentes. Esta facilita-lhe a viagem, mas a um preço exorbitante. A dívida é geralmente paga nos anos seguintes, mas implica o acolhimento durante este tempo. No segundo modo, as mulheres que querem imigrar contactam um facilitador local que as faz chegar à Europa, também a preços exorbitantes. No terceiro tipo de dispositivo migratório, as mulheres vêm pelos seus próprios meios, sendo este modo o mais perigoso pois muitas são 95

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frequentemente violadas ou obrigadas a trocar serviços sexuais por serviços fronteiriços (por exemplo, vistos). Como constata Guillemaut, em todos estes modos existe o consentimento da imigrante. O que estas mulheres exprimem é a vontade de ganhar dinheiro para permanecerem independentes e a vontade de não serem expulsas do espaço Schengen. A ideia de que estas mulheres ignoravam o que as esperava e que são analfabetas vindas de aldeias longínquas afigura-se falsa. Guillemaut constata, ao invés, que as mulheres por ela entrevistadas são geralmente escolarizadas (algumas têm cursos superiores) e vêm de livre vontade. Embora algumas sintam uma certa repugnância em trabalhar na indústria do sexo, prima a vontade de migrar.

2.5 Estigma e preconceito: o imigrante A imigração e o mercado de trabalho são um espaço de análise crítica fundamental para compreendermos a essência fenomenológica das representações sociais que cristalizam os arquétipos do imaginário do estrangeiro105. Como veremos nesta secção, encaixam no tema da imigração vários subtemas como, por exemplo, a alteridade, a etnicidade, o género, a criminalidade, a ameaça, o estigma, tendo como pano de fundo o processo histórico da globalização económica, cultural e identitária. Os fluxos migratórios têm vindo a crescer nestas últimas décadas. Na Europa, devido a sucessivos acontecimentos históricos, o fenómeno ganhou uma visibilidade distinta. Com a adesão de Portugal à UE, a situação económica neste país melhorou, tornando-o num destino atrativo para os imigrantes. Todavia, para compreender melhor os fluxos migratórios para Portugal e as consequentes emergências de diferentes minorias, devemos regressar à época pós-revolução e à queda do aparelho colonial, aquando da chegada dos retornados das ex-colónias. Deu-se, nessa altura, uma primeira transformação profunda do quadro demográfico e das realidades urbanas,

105

O estrangeiro lida sempre com regimes restritivos. O estrangeiro beneficia, em Portugal, de quase todos os mesmos direitos civis, económicos e sociais que os nacionais, existindo, contudo, algumas exceções como, por exemplo, o acesso à função pública. No entanto, a privação dos direitos políticos é regra. 96

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nomeadamente nas periferias de Lisboa. Seguiu-se em seguida, no início da década de 1990, um fluxo de quadros de empresa e de profissionais qualificados oriundos do Brasil. Por outras palavras, ao mapear as diferentes nacionalidades até esta altura, constata-se uma presença particularmente importante de imigrantes provenientes dos PALOP (Países africanos de língua oficial portuguesa) e do Brasil. Dois fatores vieram alterar o panorama demográfico da imigração em Portugal: a adesão à então chamada CEE (Comunidade Económica Europeia) em 1986 e a entrada em vigor do Acordo de Schengen em 1995. Com a entrada na CEE, Portugal teve acesso a fundos estruturais que propiciaram o investimento em obras públicas de grande dimensão. O setor da construção cresceu juntamente com a empregabilidade. No entanto, a subcontratação foi a estratégia preferida, criando o círculo vicioso neoliberal: mais trabalho, mais empresas, mais subcontratação e mais precariedade (Peixe Dias & Dias, 2012). O Acordo de Schengen permitiu, por sua vez, uma maior liberdade de circulação de pessoas, facilitando a chegada dos imigrantes provenientes da Europa de Leste. Assim, a partir de 2000, as nacionalidades mais representadas passaram a ser provenientes da Ex-União Soviética, Bulgária e Roménia. Constatou-se também um crescente número de imigrantes oriundos da Índia, da China e de alguns países não pertencentes aos PALOP (Guia, 2008). Em suma, o aumento do fluxo migratório em Portugal foi notável nestas últimas décadas: se em 1980 o total da população estrangeira residente era de 50,750, em 2010 o total aumentou para 445,262 imigrantes residentes (Peixe Dias & Dias, 2012, p. 34). As populações mais representadas são oriundas do Brasil, Ucrânia e Cabo Verde. Ao analisar o fenómeno através da frieza das estatísticas podemos compreender a construção social da falsa imagem da “invasão de imigrantes”, encaixando “nos quadros de concetualização neocoloniais da alteridade” (Peixe Dias & Dias, 2012, p. 35). Ao aprofundarmos a questão, facilmente se constata que Portugal necessitava deste tipo de mão-de-obra, ou seja, do trabalho desqualificado que os portugueses não querem. Os setores que têm vindo a sofrer mais transformações são a construção, os serviços domésticos e prestação de cuidados, a hotelaria e a restauração. A construção (para os homens) e os serviços domésticos (para as mulheres) constituem as principais

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vias de acesso ao mercado do trabalho português para a mão-de-obra estrangeira. Efetivamente, o trabalho não qualificado é o nicho privilegiado da mão-de-obra imigrante que, cada vez mais, corresponde a categorias étnicas e de género. Em suma, os sociólogos estão de acordo ao afirmarem que a grande maioria dos imigrantes se insere nas áreas mais desfavorecidas do mercado de trabalho (Baganha, Marques & Góis, 2004; Cunha & Santos, 2006; Costa, 2008; Guia, 2008). A par desta precariedade laboral, muitos imigrantes vivem também a precariedade económica e social. De acordo com Maria João Guia: Os imigrantes apresentam habilitações literárias superiores à média dos cidadãos nacionais, exercendo funções maioritariamente na construção civil e na restauração, ocupando postos de trabalho subalterno. No que concerne às horas de trabalho, despendem mais horas que os portugueses, residindo em habitações maioritariamente pequenas e com poucas condições. (Guia, 2008, p. 272)

Num ambiente de profunda crise económica e financeira, instabilidade laboral e de desvalorização do nível de vida, os imigrantes são vistos como uma ameaça e não como um grupo particularmente vulnerável à crise. A acompanhar o aumento do fluxo migratório, verifica-se também um aumento do número de imigrantes clandestinos e, por conseguinte, das atividades ilegais, resultando na adoção por parte do Estado de medidas severas de controlo. Aliás, tais medidas de segurança são adotadas por todos os Estados-Membros da UE. O próprio Acordo de Schengen estipula uma política de acolhimento assaz rígida para todos os imigrantes oriundos de países terceiros. O espaço Schengen é composto, em 2014, por vinte e seis países da Europa geográfica.106 Para os cidadãos dos países signatários o Tratado constitui a garantia da livre circulação sem fronteiras107. Para os outros cidadãos do mundo, obriga-os a obter um visto Schengen. Existe, por isso, um

106

Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Eslováquia, Eslovénia, Espanha, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Islândia, Itália, Letónia, Liechtenstein, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Noruega, Países Baixos, Polónia, Portugal, República Checa, Suécia e Suíça. 107 O Reino Unido e a Irlanda beneficiam de um estatuto especial na medida em que apenas participam num número de disposições do Acordo Schengen. 98

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sistema informatizado de controlo de entradas e de registo de dados. O Acordo obriga também à existência de Centros de Acolhimento Temporário para os imigrantes ilegais. À medida que as fronteiras do mundo ocidental se fecham e que as medidas de segurança nacional aumentam, surgem novas figuras associadas à migração: os imigrantes residentes, os temporários, os sazonais, os ilegais, os clandestinos, os refugiados e os apátridas. Esta nova categorização ganha visibilidade através dos meios de comunicação social e, por isso, na consciência coletiva, contribuindo para novas cristalizações de antigas representações sociais. Numa perspetiva positiva, estes grupos sociais contribuem para novas formas de sociabilidade, não só nos países de acolhimento, mas também entre estes e os países de origem. Foi neste contexto que nasceu a ajuda ao desenvolvimento e à cooperação transnacional. Ao mesmo tempo, as políticas de integração vão evoluindo, abarcando medidas comunitárias direcionadas aos vários agentes responsáveis pela integração dos imigrantes (incluindo aos operadores e profissionais dos média que visam a consciencialização dos meios de comunicação social de massas para uma realidade multicultural e inclusiva).108 Numa perspetiva negativa, o facto de os fluxos migratórios serem merecedores de uma forte política securitária, sendo constantemente associados ao crime, implica que os imigrantes sejam sentidos no espaço público como uma ameaça. Observa-se, pois, uma criminalização da imigração. A imigração ilegal é inerente ao processo migratório, na medida em que nenhum país advoga a abertura total das fronteiras. Por conseguinte, os imigrantes que não conseguem entrar legalmente num país fazem-no ilegalmente. O processo de controlo das fronteiras torna-se ainda mais complexo face ao papel preponderante das redes de TSH e de auxílio à imigração ilegal. Surgiram, assim, novos tipos de crime associados ao fluxo migratório para os quais o país não estava preparado. Não obstante os obstáculos, Portugal demonstrou uma rápida adaptação às novas realidades demográficas e criminosas com a adoção de diversas leis enquadradas pelo Direito Internacional e pelas 108

Ver, a título de exemplo, as recomendações do Conselho da Europa: Recomendação 1768 (2006) sobre as imagens dos asilados, dos migrantes e dos refugiados veiculados pelos média e a Recomendação 1277 (1995) sobre os migrantes, as minorias étnicas e os média. 99

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diretivas europeias. Padecem, contudo, as associações relativas à integração social e ao bem-estar (Guia, 2008). A associação entre a criminalidade e a imigração é também justificada pelo aumento do número de reclusos pertencentes a minorias étnicas. É de realçar, porém, que a criminalidade não está associada às minorias em particular (ou seja, ao facto de serem oriundas de certos países), mas sim a fatores como a existência de comunidades desorganizadas de imigrantes, a influência do mercado de trabalho, o estigma do estrangeiro ou as omissões do apoio estatal. A imprensa nacional, especialmente atraída pala realidade criminal, começou, desde os anos 1990, a divulgar notícias de crimes relacionados com a imigração, instalando a associação “imigrante-criminalidade” e pondo de lado a clara desigualdade entre os portugueses e os estrangeiros (Cunha, Policarpo, Monteiro & Figueiras, 2002; Cádima & Figueiredo, 2003; Cunha, Santos, Silveirinha & Peixinho, 2004; Cunha & Santos, 2006; Guia, 2008). Ao realçar a equação imigrante-crime, os jornalistas e editores disseminaram ideias erradas e discriminadoras, esquecendo que a criminalidade não tem uma componente étnica. Esquecendo também que, se não forem contabilizados os crimes de falsificação de documentos (comuns à imigração ilegal), a maioria dos imigrantes ilegais procura inserir-se o mais rapidamente possível nas sociedades de acolhimento, tentando legalizar a sua situação, trabalhando afincadamente e participando nos descontos estatais (Guia, 2008). Nas palavras da equipa de investigação de Isabel Ferin Cunha: Os temas relacionados com a imigração entraram definitivamente nas rotinas de produção da imprensa e da televisão. Ainda assim, continua a verificar-se que são os temas negativos que dominam nas peças acerca da população imigrante (e.g. crime, incidentes, máfias, prostituição, etc.). Como a equipa de investigação conclui, continua a subsistir uma lacuna de peças acerca dos contributos positivos e/ou inovadores dos imigrante para a sociedade portuguesa. Há, pois, muito a trabalhar nesse sentido. (Cunha et al., 2004, p. 11)

Em relação à imigração feminina, as desigualdades de poder que caracterizam as relações de género em geral e as relações desiguais no mercado de trabalho refletem100

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se também no processo de imigração. Ou seja, as condições dos imigrantes masculinos diferem das condições das imigrantes femininas. Ora, se a imigração é um tema de segundo plano, a imigração vivida no feminino é praticamente invisível (Cunha et al., 2004). Quando visível nos média, o tema da imigração feminina está maioritariamente associada à prostituição, à clandestinidade e ao crime (Santos, 2007). Como tantos sociólogos, o estudo de Clara Almeida Santos (2007), confirma que a representação social do Outro, particularmente na imprensa portuguesa, se constrói na conjuntura entre estrangeiro e crime. Na abordagem do imaginário do estrangeiro importa referir ainda o estudo da imagem do imigrante aos olhos dos portugueses, coordenado por João António e Verónica Policarpo (2011). Esta sondagem, ao invés dos inquéritos precedentes que têm por objetivo analisar a imagem dos imigrantes veiculados pelos meios de comunicação portugueses, permite desenhar um retrato das atitudes e das perceções dos portugueses, comparando tais imagens às que são transmitidas pelos média. Segundo esta equipa de investigação, existem grupos distintos de imigrantes na perspetiva geral dos grandes meios de comunicação: os oriundos dos PALOP, os brasileiros, os provenientes da Europa de Leste, os asiáticos e os ocidentais. Os três primeiros grupos são frequentemente associados ao crime. Da mesma forma, aos olhos dos portugueses existe uma hierarquia dos grupos respeitante a certas características. Por exemplo, a sondagem permitiu observar que, segundo a perceção dos inquiridos, os portugueses, seguidos dos imigrantes provenientes da Europa de Leste são mais sérios e honestos do que os africanos e os brasileiros. Os portugueses vêm-se também mais competentes do que qualquer dos outros grupos de imigrantes. No tocante à ética hedonista, os portugueses acham que os brasileiros são os mais alegres e bem-dispostos (António & Policarpo, 2011, p. 59). Segundo esta equipa, em média há maiores níveis de preconceito em relação aos imigrantes da Europa de Leste, em seguida em relação aos imigrantes africanos e, por fim, aos imigrantes brasileiros. Trata-se aqui de um racismo subtil. Quanto ao racismo flagrante,

Entre 31% e 36% dos inquiridos manifestaram a sua indisponibilidade para ter como chefe um imigrante, independentemente da sua origem nacional. (…) Uma 101

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percentagem dos inquiridos, variando entre 28% e 33% consoante a nacionalidade do imigrante, indicou não estar disponível para colocar os seus filhos numa escola onde a maioria dos alunos fossem filhos de imigrantes. (António & Policarpo, 2011, p. 62)

No tocante às mulheres imigrantes, a sondagem indica que o contacto entre portugueses e as imigrantes femininas é fraco, o que leva os sociólogos a concluir que a construção das representações sobre este grupo social se faz indiretamente, através das imagens veiculadas pelos meios de comunicação ou através de comentários de conhecidos influentes (António & Policarpo, 2011, p. 138). Além disso, cerca de 80% dos inquiridos consideram que as mulheres imigrantes são mais vulneráveis ao TSH e 32% consideram que a vinda destas mulheres para Portugal está relacionada com a sua inserção em redes de TSH (António & Policarpo, 2011, p. 142). Esta opinião põe em evidência estereótipos negativos “clássicos” associados à mulher: frágil, vulnerável e passiva. Em suma, as representações do senso comum apontam para uma maior sensibilidade para o crescente protagonismo feminino nos processos migratórios, mas perpetuam certos preconceitos associados aos imigrantes, nomeadamente a criminalidade. Tal constelação de imagens generalizadas permite desenhar um retrato sociológico do senso comum português que realça um estigma quase impercetível, mas bem presente, relativo à alteridade. Ainda segundo esta sondagem, a perceção dos portugueses está de acordo com as imagens veiculadas pelos meios de comunicação: a “saliência temática nos públicos aponta para a criminalidade e o trabalho masculino; e para a prostituição e criminalidade no feminino” (António & Policarpo, 2011, p. 159). Estes dados sugerem a existência de efeitos cognitivos dos média pela exposição repetida de determinadas imagens da imigração. A prostituição, em Portugal, tem frequentemente uma nacionalidade: a brasileira. A associação da mulher imigrante à prostituição realça o estereótipo do erotismo exótico ligado à mulher estrangeira. Numa sondagem sobre a imagem da mulher imigrante na imprensa portuguesa de 2003, Clara Almeida Santos chega à conclusão que a imagem que passa das imigrantes brasileiras é a de imigrante ilegal implicada em redes 102

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de prostituição. Segundo a socióloga, “apesar de ser altamente improvável que a maioria das cidadãs brasileiras imigradas em Portugal se dedique à prática da prostituição, este universo é mais apelativo e, portanto, suscetível de chegar às páginas dos jornais” (Santos, 2007, p. 108). A constituição da alteridade é um processo histórico e cultural, tendo uma dimensão coletiva e intersubjetiva: Nós (o povo) e o Outro (o estrangeiro). Mas a alteridade não é uma objetivação simbólica estática. Pelo contrário, evolui com o contexto histórico e as derivadas narrativas. As representações sociais vão, desta forma, sofrendo transformações para se adaptarem à realidade. Atualmente a conjuntura entre o acréscimo do fluxo migratório e a crise financeira resultam na emergência de preconceitos dirigidos ao Outro. De facto, assistimos a uma reconstrução da imagem do Outro que, no fundo, perpetua preconceitos já existentes na construção da identidade. A questão da identidade é fundamental: analisar o Outro permite analisar a nossa própria identidade através da nossa perceção. O discurso sobre a identidade alicerça-se nas características exteriores visíveis. Aliás, “são exemplos comuns nos meios de comunicação social a identificação de autores do crime através da referência à sua nacionalidade ou às suas características fenotípicas” (Santos, 2007, p. 50). Em tais casos, o valor da notícia decorre do facto de o crime ter sido cometido pelo Outro. O imigrante representa, por excelência, a figura do excluído. O Estado-Nação gere identidades e propõe um espaço de pertença que é, simultaneamente, um espaço de exclusão. A constituição da alteridade é, hoje em dia, relacionada com o multiculturalismo. Numa perspetiva teórico-crítica, o paradigma ocidental do multiculturalismo é uma “codificação hegemónica de uma hierarquização entre culturas” (Peixe Dias & Dias, 2012, p. 68). Isto pressupõe a existência de culturas dominantes e outras subordinadas. O discurso político chamar-lhe-ia a construção de uma identidade positiva do sujeito subordinado. O fundamento da consciência coletiva é espelhado, precisamente, nesta ideia de hierarquização cultural. Neste sentido, o imigrante é, não só aquele que vive fora do país, mas também – e sobretudo – aquele que pertence às classes menos privilegiadas. Não é de todo inútil realçar os estudos de Axel Honneth sobre o reconhecimento social.

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Honneth coloca a questão do reconhecimento intersubjetivo109 no centro do processo da construção da identidade. Ou seja, o reconhecimento recíproco é essencial para a socialização do individuo e para a sua inserção como membro na sociedade. O reconhecimento social tem de ser recíproco porque não basta o sujeito reconhecer o Outro, tem também de ser reconhecido pelo Outro. Só assim pode o sujeito garantir o valor social da sua identidade. Neste contexto, podemos constatar que ao ignorarmos ou desprezarmos o Outro, tornamo-lo invisível ou pouco visível, sobretudo, não reconhecemos as dificuldades vividas e sofridas pelo Outro, criando uma alteridade invisível, desprezada. O desprezo constitui, para Honneth, Um golpe que ameaça destruir a identidade de pessoa. (…) Os conceitos negativos deste género caracterizam um comportamento que é injusto porque, antes mesmo de ferir os sujeitos na sua liberdade de ação ou de lhes causar um prejuízo material, fere-os na ideia positiva que eles adquiriram através do contacto intersubjetivo. (Honneth, 2002, p. 161)

O facto de as imagens veiculadas pelos média, assim como as imagens presentes na consciência coletiva, associarem o imigrante à criminalidade provoca nos grupos em questão o sentimento de serem alvo de discriminação. Aliás, tal facto é comprovado noutro estudo sobre a imigração do Leste Europeu: A comparação dos dados deste inquérito com os do inquérito realizado em 2002 permite notar que, à exceção da esfera laboral, as atitudes discriminatórias experimentadas pelos imigrantes sofreram um aumento superior a 170% nos dois restantes espaços sociais [nas lojas, cafés e transportes públicos e na rua]. (Baganha, Marques & Góis, 2004, p. 107)

No contexto da comunicação social, a identidade e a diferença, veiculadas pela produção mediática, mantêm a ordem simbólica dominante que estabelece o limite

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Merece aqui particular destaque a definição do reconhecimento por Edgar Morin (2004, p. 128) como “a exclusão da exclusão” e a definição da intersubjetividade por Jürgen Habermas (1999, p. 46) como “consenso racionalmente motivado”. 104

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entre o normal e o desviante, entre a identidade comum e o Outro. O paradigma semiótico é inserido na estrutura social. A perceção (ou compreensão) de um significado não é natural mas condicionada, embora o ator social assuma que é um significado dado por adquirido. O recetor da mensagem é, por isso, condicionado pelas “estruturas complexas dominantes” (Hall, 1999, p. 508) que consolidam a consciência coletiva. “Os meios de comunicação definem pela maioria da população quais eventos são significantes mas, também, oferecem interpretações de como compreender esses eventos”, (Hall et al., 2013, p. 60). Além disso, a produção mediática responde a certas “obrigações” profissionais que giram à volta da ideia de “valores-notícia” dos quais se destaca o “being newsworthy”. Uma notícia merecedora de destaque terá uma grande audiência. Ou seja, a opinião pública é incontornável na construção da notícia. As representações sociais das estruturas dominantes são, portanto, as representações convencionais e institucionais. Trata-se da “intervenção ativa das ideologias no e sobre o discurso” (Hall, 1999, p. 512). Encontramos, assim, certos fragmentos ideológicos presentes nas representações sociais que aparecem como “naturais”. Neste sentido, a imigração consiste numa das realidades sociais problemáticas que atrai os sentimentos “naturais” de medo, uma certa repulsa e uma definitiva preocupação. Podemos, pois, assumir que a hermenêutica do fenómeno imigratório é associada a estereótipos socioculturais, comprovando que a subjetividade dominante desenha mapas mentais a partir de factos objetivos isolados. A problematização do Outro e do seu papel no pensamento do indivíduo revela uma assimetria simbólica na produção de significados caracterizados pela alteridade. Numa nota conclusiva relembremos, contudo, que a “ordem cultural dominante” é permanentemente posta em questão e que existe espaço para diversas capacidades subjetivas e diferentes níveis de intersubjetividade para se poderem conjugar espíritos críticos. Com efeito, dos discursos das ou sobre as minorias emergem certas perspetivas que incluem as experiências da marginalidade social. Estes pontos de vista forçam-nos a confrontar a ideia de que a produção de significados e de valores é incompleta e desequilibrada. A história da migração humana pode então desfazer-se da sua

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linearidade historicista ocidental para abrir portas a novas histórias culturais e, neste processo, à transformação cultural. O pensamento crítico pós-colonialista vai, precisamente, abrir a possibilidade de uma forma simbólica de identificação que não repudia a alteridade. O imigrante torna-se num agente histórico da transformação ao invés de ser sujeito à/da cultura ocidental. Emerge, portanto, um indeterminismo cultural que requer uma reconstrução de significados. A redefinição de conceitos como “comunidade”, “cidadania” ou “nacionalidade” irão diretamente influenciar as representações sociais ligadas ao Outro. Isto implica que devemos questionar a linguagem dos direitos e obrigações ao observar o estatuto legal, cultural e social dos imigrantes porque, inevitavelmente, estes encontram-se na fronteira invisível entre culturas e nações e, muitas das vezes, também se encontram no outro lado da Lei (Bhabha, 1999, p. 193). A produção de novos significados cria diferentes subjetividades que transformam, por sua vez, o imaginário social. Só a diversidade cultural e as existências pluralistas permitirão abalar o edifício prometeico da ética liberal de tolerância. Faz todo o sentido terminar este capítulo numa pequena reflexão sobre os desafios da “cultura da diferença”: As características distintas da nova política cultural da diferença abalam o monolítico e a homogeneidade em nome da diversidade, da multiplicidade e da heterogeneidade; rejeitam o abstrato, o geral e o universal, realçando o concreto, o específico e o particular; e historizam, contextualizam e pluralizam, pondo em evidência o contingente, o provisório, o variável e a transformação. (West, 1999, p. 257)

A cultura da diferença implica três grandes desafios: o intelectual, o existencial e o político. O desafio intelectual é um desenvolvimento da consciência crítica que denuncia o falso universalismo e desmistifica as dinâmicas institucionais e os seus objetivos políticos e morais implícitos. O desafio existencial reside no acesso aos recursos e ao “capital cultural” (Pierre Bourdieu). Ou seja, é necessário “autoconfiança, disciplina e perseverança sem a quase obrigatória aceitação ao convencional” (West, 106

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1999, p. 256). É de notar que isto é especialmente difícil para as minorias pois estas estão mentalmente sujeitas ao olhar normativo da maioria. Por fim, o desafio político é a verdadeira democracia na qual será necessário redefinir conceitos como a alteridade, a diferença e a margem.

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3. Discursos mediáticos portugueses Tout journal est (…) une boutique où l’on vend au public des paroles de la couleur dont il les veut. Balzac

Depois de a realidade estatística do TSH ter sido exposta e de terem sido analisadas as estruturas ideológicas sobre as quais se edificam as imagens da prostituta e do imigrante, passo a examinar o tratamento jornalístico efetuado pela imprensa portuguesa sobre o tema do TSH nos anos de 2012 e de 2013 com o intuito de demonstrar a presença de estereótipos e thematas relativos aos dois grupos em questão. O método de investigação utilizado é a análise de discurso (qualitativa e quantitativa). A análise do discurso tem por objetivo estudar o sentido das mensagens através da semântica discursiva, do estruturalismo e da hermenêutica. De facto, este método está intimamente associado ao enunciado e à sua estrutura linguística, às condições históricas e políticas de produção, às interações subjetivas e aos pressupostos que constrangem os sentidos. A análise de discurso implica obrigatoriamente a subjetividade do investigador porque dele depende a escolha das formas a analisar, a configuração dos enunciados arquivados e a escolha dos textos de referência sobre os quais é edificado o quadro teórico. A análise de discurso implica também a sensibilidade do investigador em relação ao momento histórico e à mobilização de uma série de hipóteses em relação aos conhecimentos anteriores e aos objetivos da investigação. Como método de observação, a análise de discurso remete à interpretação e compreensão do objeto do discurso, o que por sua vez conduz a um estudo da estrutura hermenêutica das mensagens mediatizadas. A compreensão é um conceito-chave para a hermenêutica, não só a compreensão da língua, mas também da linguagem. Aliás, a hermenêutica, como teoria da interpretação, analisa precisamente o que as palavras dizem, mas 108

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também o que querem dizer. Numa investigação anterior (Tomás, 2009), defendi que a hermenêutica é essencial para desenvolver o conhecimento histórico fundamental para qualquer investigador das Ciências Sociais pois é este conhecimento que serve de pano de fundo para a compreensão de factos e fenómenos sociais. A este propósito importa referir a obra de Hans-Georg Gadamer, Verdade e método (edição original em alemão, 1960). Para ele, a hermenêutica é universal devido ao verbum interioris, o verbo interior presente em todos nós e em todas as línguas. A linguagem é o processo e o objeto da compreensão. Gadamer defende que a linguagem, “como acesso ao mundo” (Gadamer, 2005, p. 43) é o que permite conhecer o ser das coisas. No entanto, o “conhecimento histórico”, baseado na linguagem, é subjetivo110. O filósofo realça a inevitável subjetividade da linguagem e, desta forma, cria uma verdadeira filosofia da interpretação, salientando as relações históricas e existenciais. O que inspira o seu pensamento “é que a linguagem é um centro onde o Eu e o mundo fusionam” (Gadamer, 1976, p. 500). Gadamer conclui que “se partirmos da constituição ontológica fundamental que a experiência hermenêutica do ser nos revelou, e segundo a qual o ser é linguagem, (…), chegamos à conclusão que toda a compreensão inclui o caráter do advir” (Gadamer, 1976, p. 512). Partindo da estrutura da antecipação do compreender heideggeriano que defende o postulado segundo o qual a projeção do sentido é um elemento essencial de toda a compreensão, e partindo da ideia de que não existe interpretação sem “précompreensão”111 da parte do intérprete, Gadamer propõe que os preconceitos (no sentido etimológico estrito) são, no fundo, as condições do compreender. Segundo o filósofo, “a compreensão implica sempre uma pré-compreensão que, por seu lado é

110

Na sua primeira obra, Gadamer explica que a consciência histórica é “saber que temos a nossa própria historicidade” (Gadamer, 1976, p. 518). O filósofo apresentará, numa publicação posterior, uma definição mais ampla e poética: “Entendemos por consciência histórica o privilégio do homem moderno de ter plena consciência da historicidade de todo o presente e da contingência de toda a opinião.” (Gadamer, 1996, p. 23). 111 Gadamer tinha definido anteriormente a pré-compreensão como “a primeira de todas as condições hermenêuticas […] que surge do ter de se haver com a coisa em questão.” (Gadamer, 1976: 316). No entanto, mais tarde Habermas definirá mais claramente o termo como “a compreensão prévia não explícita” (Habermas, 2005, p. 23). 109

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prefigurada pela tradição determinada, na qual vive o intérprete e a qual molda os seus preconceitos” (Gadamer, 1996, p. 19). Em suma, a compreensão implica a sua historicidade constitutiva e, por conseguinte, a interpretação é um esforço de renovamento constante. Gadamer demonstra como a consciência histórica faz passar o novo pela mediação do antigo, constituindo desta forma um processo de comunicação no qual a estrutura corresponde ao modelo do diálogo ou da dialética interativa. A compreensão, ou a mediação entre o passado e o presente, torna-se numa “fusão destes horizontes” (Gadamer, 1976, p. 328). Porém, mesmo sendo esta fusão indispensável, não podemos esquecer que esta projeção do horizonte histórico é apenas uma fase do ato de compreender. A compreensão é, neste sentido, uma “aplicação” (Gadamer, 1976, p. 329) de um sentido ao presente. A intenção hermenêutica de compreender um sentido adquire um estatuto metodológico primordial ao assimilar um significado relativo à vida quotidiana objetivada nas obras, nos acontecimentos ou nos comportamentos. De facto, a historicidade (passado) por trás das narrativas (presentes) demonstram que os resultados da análise se inserem no mundo social atual. Por isso, a consciência histórica da investigadora é algo a ter em consideração aquando do esforço para atingir a neutralidade axiológica necessária a toda a investigação nas áreas das Ciências Sociais. A passagem de um corpus edificado pelos conhecimentos prévios da investigadora a um corpus construído pela análise de discurso subsequente abre espaço para a descoberta – o advir do conhecimento – através de um trajeto temático: o TSH.

3.1 Plataforma de trabalho e métodos de investigação Foram analisadas as peças jornalísticas relativas ao TSH nos anos de 2012 e 2013, publicadas em quatro jornais diários (Público, Diário de Notícias, Correio da Manhã e Jornal de Notícias). A recolha das peças fez-se através da consulta aos websites dos quatro jornais em questão, utilizando dois termos-chave: “tráfico de seres humanos” e “tráfico de pessoas”. A adoção desta metodologia comporta algumas limitações das

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quais se destaca o facto de não ter acesso físico ao suporte papel. O tratamento dos dados recolhidos deu origem a uma base de dados em Excel (Microsoft Office 2013). As peças foram analisadas com base em três perspetivas diferentes: a forma, o conteúdo e o discurso.112 Para cada peça analisada foi preenchida uma grelha de análise que inclui estas três perspetivas (Apêndice II). A análise da forma levou a conhecer o número e o tipo de peças (notícia, breve, reportagem, opinião, editorial e entrevista), a data da publicação, bem como a fonte de cada artigo. A análise de conteúdo permitiu mapear a tematização através dos temas privilegiados subjacentes ao tema geral do TSH. Foram escolhidas as seguintes variáveis: a localização da ação descrita; o tipo de TSH mais representado; a nacionalidade dos suspeitos, a nacionalidade das vítimas; e os temas (justiça, campanhas públicas, estatísticas, máfia, escravatura, prostituição, segurança, legislação, o caso Maddie113, imigração irregular, tráfico de menores, discriminação de género e proteção das vítimas). Por fim, a análise do discurso incluiu três variáveis: o enquadramento (informativo, dramático, épico, moral e policial); a argumentação (económica, legal, judiciária, demográfica, securitária e social); e as vozes (autoridades policiais, autoridades políticas, SEF, OTSH, ONG, vítimas, ONU, GRETA, OSCE, União Europeia, investigadores científicos, organizações internacionais e agências noticiosas). A investigação traduz-se por uma análise das narrativas que põe em evidência o aspeto cultural objetivo (os dados exatos) e subjetivo (a opinião) com o objetivo de expor a historicidade por trás do discurso. É proposto, desta forma, um trajeto inspirado pela grelha de análise de Jean-Bruno Renard que se divide em seis etapas: a recolha das peças; o estudo do contexto de difusão e da sua implantação social; o grau de veracidade; o estudo do “paratexto”114; a análise da estrutura narrativa; e o trabalho hermenêutico (Renard, 1999, pp. 68-98). A análise das narrativas permitiu detetar as histórias dominantes e observar os preconceitos e ideologias por trás das representações mediáticas. O estudo apresentado 112

Esta metodologia tem na sua origem dois inquéritos: Cunha et al. (2004) e Cunha & Santos (2006). O “caso Maddie” trata do desaparecimento de uma menina inglesa, Madeleine McCann, no Algarve em 2007 que recebeu uma atenção extraordinária dos meios de comunicação a nível global. 114 No pensamento de Jean-Bruno Renard, o “paratexto” é constituído pelos elementos que o narrador utiliza para divulgar informações ou exprimir opiniões (Renard, 1999). 113

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neste capítulo tem duas fases. Primeiro, analiso as peças relativas ao TSH em geral. Em seguida analiso as peças que dizem respeito apenas ao TSH para exploração sexual. O objetivo é demonstrar que as narrativas mediáticas põem em evidência questões que ilustram as angústias e os medos relativos à imigração e à prostituição. As limitações da metodologia acima descrita residem no facto de, primeiro, a investigação se limitar a Portugal. Uma análise de jornais de vários países, ou, pelo menos, da Península Ibérica, permitiria uma análise comparativa. Um segundo limite deve-se às restrições das licenças dos jornais em questão que limitaram a investigação às edições on-line e consequentemente a buscas através de palavras-chave.

3.2 Análise da imprensa (tráfico de seres humanos) No total foram analisadas 172 peças, sendo a maioria – 52 – provenientes do Diário de Notícias. O ano de 2013 revela, na sua totalidade, um aumento de peças relativas ao TSH. 2012

2013

TOTAL

JN

14

26

40

DN

26

26

52

CM

25

13

38

Público 11

31

42

TOTAL

96

172

76

Tabela 4: Peças por jornal analisadas por ano (2012 e 2013)

Este aumento de atenção mediática é paralelo ao acréscimo do número total de vítimas sinalizadas em Portugal em 2013 que, segundo o OTSH, aumentou 146% comparando com 2012 (OTSH, 2014, p. 3). Outro fator que explica esta acrescida visibilidade mediática prende-se com o caráter excecional de acontecimentos marcantes durante os meses de outubro, novembro e dezembro do ano de 2013. 112

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Distribuição mensal das peças analisadas (2012/2013) 25 20 15 10 5

JN

DN

CM

Dezembro

Novembro

Outubro

Setembro

Julho

Agosto

Junho

Abril

Maio

Março

Fevereiro

Janeiro

Dezembro

Novembro

Outubro

Setembro

Julho

Agosto

Junho

Abril

Maio

Março

Fevereiro

Janeiro

0

Público

Gráfico 1: Distribuição mensal das peças analisadas (2012/2013)

De facto, em menos de um mês (outubro de 2013) foram divulgadas três operações policiais relacionadas com o TSH para exploração laboral (na apanha da azeitona) no Alentejo. A estas operações estão associadas 45 vítimas confirmadas, todas de nacionalidade romena (OTSH, 2014, p. 13). Segundo o OTSH, as principais formas de coação foram a sonegação de documentos, a retenção de pagamento, servidão por dívidas, controlo de movimento e ofensas corporais. Todas as vítimas viajaram acompanhadas até Portugal por via terrestre e foram recrutadas com promessas de trabalho. Um artigo do Público resume esta situação: Nos últimos anos, e sempre que decorrem trabalhos sazonais nas vindimas e na apanha da azeitona, indivíduos do leste europeu, na sua maioria romenos, procedem à contratação dos trabalhadores nos seus países, que depois transportam para o Alentejo. As pessoas engajadas são por vezes albergadas em instalações degradadas, sem água, rede de esgotos ou energia elétrica e são sujeitas a ritmos de trabalho violento.115

115

Dias, C. (2013, 16 de novembro). Suspeitos de tráfico de pessoas detidos no Alentejo. Público. Acedido em http://www.publico.pt/local/noticia/suspeitos-de-trafico-de-pessoas-detidos-no-alentejo-1612695 113

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Outros acontecimentos marcantes de um ponto de vista mediático (e estes revelam um certo sensacionalismo) foram, primeiro, a descoberta pelas forças policiais gregas, em outubro de 2013, de uma menina loura de olhos verdes numa comunidade cigana na Grécia: o caso Maria. Este fait divers chamou a atenção dos meios de comunicação pelo facto de a menina não ser filha dos adultos que a guardavam. Os pais, supostamente búlgaros, teriam “dado” a criança por não terem dinheiro. A história teve sucesso e durante umas semanas foi alvo de uma atenção mediática quase eufórica. Mas rapidamente entrou no esquecimento. Um segundo acontecimento que também resultou na divulgação de informações sobre o TSH foi a descoberta, em novembro de 2013, de três mulheres alegadamente mantidas em cativeiro durante trinta anos no Reino Unido. Um terceiro, que deu asas a notícias sobre o TSH para exploração sexual em Angola, está ligado às relações internacionais entre este país e Portugal. Durante o mês de outubro de 2013, os meios de comunicação portugueses revelaram um certo antagonismo entre o Ministro dos Negócios Estrangeiros e Angola. Ora, foi precisamente nesta altura que surgiram notícias sobre uma rede internacional de TSH para exploração sexual envolvendo dirigentes, entre os quais, o sobrinho do presidente da República de Angola. Relativamente a 2012, os meses de setembro e outubro revelam também um número de peças acima do expetável devido a três casos. O primeiro trata de uma prostituta brasileira, supostamente traficante, “julgada por extorquir com a ajuda da polícia”116. O segundo caso é relativo a trabalho escravo em Valongo, no qual “um clã, composto por sogra, genro e um capataz, é acusado de escravizar seis desgraçados com muito trabalho de borla. E espancamentos.”117 O terceiro caso é referente a uma rede de “máfia bósnia” de TSH para mendicidade forçada, desmantelada em Lisboa em outubro de 2012.

116

(2012, 18 de setembro). Prostituta julgada por extorquir com ajuda de polícia. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2776671&page=-1 117 Merece particular destaque o vocabulário sensacionalista empregado na citação. É de notar, porém, que nas peças publicadas em outubro de 2012 o vocabulário torna-se mais objetivo, sem emissão de valores, precisamente no momento em que o casal é absolvido. Maia, N. M. (2012, 16 de janeiro). Família de Valongo tinha seis escravos e recebia rendimento mínimo. Jornal de Notícias. Acedido em http://www.jn.pt/PaginaInicial/Seguranca/Interior.aspx?content_id=2242371. 114

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Para cada período dentro de cada ano existe ainda outro contexto explicativo: o Dia Europeu da Luta contra o Tráfico de Seres Humanos que decorre, como já foi referido, no dia 18 de outubro. Durante os dois anos analisados, verifica-se um predomínio geral de breves e de notícias que, em conjunto, perfazem 93,5% da amostra. Destes resultados há ainda a reter o baixo número dos tipos de peças mais argumentativos ou opinativos: reportagem, opinião, editorial e entrevista. Somados os seus valores, obtemos um total de 6,2%.

Frequência

Percentagem

Breve

69

40,1

Notícia

92

53,4

Reportagem 3

1,7

Opinião

5

2,9

Editorial

1

0,5

Entrevista

2

1,1

172

100,0 (99,7)

TOTAL

Tabela 5: Tipos de peças (2012/2013)

Na tabela seguinte pode observar-se a frequência dos tipos de TSH relatados nas peças analisadas. De acordo com a minha hipótese inicial, a exploração sexual é a atividade mais relatada nestes anos. No entanto, é de notar que a maioria das peças refere-se ao TSH em geral, sem especificar que tipo de atividades estão ligadas à atividade criminosa. Encontram-se, nesta situação, as peças que, por exemplo, apresentam relatórios, tratam da imigração ilegal ou noticiam as operações de fiscalização nas fronteiras. Merece particular destaque o facto de o TSH para exploração laboral ser relatado em apenas 14% das peças jornalísticas, não obstante os casos altamente mediáticos antes referidos, que dizem respeito à exploração no Alentejo na apanha da azeitona. A pouca representatividade deste tipo de TSH não corresponde à

115

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realidade estatística na qual se verifica uma clara representatividade do TSH para fins de exploração laboral nos casos sinalizados em Portugal em 2013 (OTSH, 2014, p. 8).

FREQUÊNCIA DO TIPO DE TSH RELATADO (2012/2013) Geral

Exploração laboral

Exploração sexual

Mendicidade

Sequestros

Venda de crianças

3% 4% 4%

Extração de orgãos

6%

45% 24%

14%

Gráfico 2: Frequência dos tipos de TSH relatados (2012/2013)

Passando a analisar como variáveis independentes as que se agrupam na dimensão do conteúdo, é apresentada, na seguinte tabela, a distribuição geográfica das ações descritas. O TSH é apresentado como um fenómeno claramente presente em território nacional, com a maior fatia (51,6% das peças analisadas) a corresponder a Portugal, incluindo o Alentejo e o Norte. É, contudo, dado especial relevo ao fenómeno a nível mundial (19,1%) e a nível europeu (12,2%). De realçar ainda que as peças relativas ao TSH na China tratam, geralmente, de tráfico de órgãos, que as peças relativas ao Brasil tratam de exploração sexual e que as peças relativas à Grécia tratam do caso “Maria” (possível sequestro).118

118

Seria interessante analisar, em futuras investigações, os estereótipos ligados à imagem da “brasileira” (a sexualidade exótica) e os rumores e lendas urbanas relativas à imagem do “chinês” (ligado ao tráfico de órgãos ou a mitos urbanos sobre a carne de cão ou gato servidos nos restaurantes chineses em Portugal.) 116

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Frequência

Percentagem

Portugal

67

38,9

Alentejo

13

7,5

Norte

9

5,2

Espanha

14

8,1

Grécia

5

2,9

Brasil

5

2,9

China

5

2,9

UE

21

12,2

Mundo

33

19,1

TOTAL

172

100 (99,7)

Tabela 6: Distribuição geográfica das ações descritas (2012/2013)

Quanto à nacionalidade dos suspeitos verifica-se, de acordo com a tabela subsequente, que a esmagadora maioria das peças não faz qualquer tipo de referência a esta característica. As peças que não fazem referência à nacionalidade tratam do TSH na sua generalidade (estatísticas e dados publicados em relatórios). A modalidade “estrangeiros” refere-se a esta palavra quando empresada pelos meios de comunicação analisados.

Frequência Portuguesa

5

Espanhola

2

Romena

10

Brasileira

3

Chinesa

5

Angolana

4

Nigeriana

5

Etnia cigana

7 117

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O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

Leste europeu

2

Outros119

13

Estrangeiros

9

Sem referência Várias nacionalidades120 TOTAL

103 4 172

Tabela 7: Frequência da nacionalidade dos suspeitos

Ao subtrairmos as modalidades “outros”, “estrangeiros”, “sem referência” e “várias nacionalidades”, constata-se uma predominância da nacionalidade romena e da etnia cigana. A este propósito importa realçar que a “etnia cigana” tem uma representatividade significativa nas representações mediáticas, não obstante o facto de não ser uma categoria social relevante para a realidade estatística apresentada pelo Sistema de Segurança Interna e pelo OTSH.

Frequência da nacionalidade dos suspeitos (2012/2013) 12 10 8 6 4 2 0

Gráfico 3: Frequência das nacionalidades dos suspeitos (2012/2013)

119

A modalidade “outros” é relativa às nacionalidades que aparecem em apenas uma ou duas peças e inclui as seguintes nacionalidades: alemã, bengalesa, bósnia, gambiana, grega, guineense, mexicana, moçambicana, nepalesa, paquistanesa, saudita sérvia e somali. Estas nacionalidades foram reagrupadas para facilitar a leitura da variável “nacionalidade dos suspeitos”. 120 A modalidade “várias nacionalidades” engloba as peças em que são referidas expressamente diferentes nacionalidades. 118

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No que diz respeito às nacionalidades das vítimas mais representadas na imprensa portuguesa nos anos analisados, verifica-se a mesma tendência relativa à representação mediática da nacionalidade dos suspeitos: maioria das peças não faz referência a esta característica.

Frequência Portuguesa

3

Romena

16

Brasileira

7

Chinesa

6

Nigeriana

3

Europeia

2

Búlgara

2

Angolana

2

Outros121

9

Estrangeiros

8

Sem referência Várias

108 6

nacionalidades TOTAL

172

Tabela 8: Frequência da nacionalidade das vítimas (2012/2013)

Ao subtrairmos as modalidades “outros”, “estrangeiros”, “sem referência” e “várias nacionalidades” constata-se que as nacionalidades mais representadas são a romena e a brasileira, correspondendo à realidade estatística.

121

A modalidade “outros” inclui as seguintes nacionalidades: bengalesa, espanhola, guineense, inglesa, líbia, mexicana, moçambicana, nepalesa, nicaraguana, queniana e zona subsariana. 119

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Frequência da nacionalidade das vítimas (2012/2013) 18 16 14 12 10 8 6 4 2 0

Gráfico 4: Frequência da nacionalidade das vítimas (2012/2013)

No gráfico seguinte é analisada a frequência dos temas mais explorados. Os temas mais frequentes são “justiça”, “mafia” e “estatísticas”. O tema “justiça” remete às peças que divulgam informações sobre casos judiciais específicos. O tema “máfia” engloba todas as peças que realçam o aspeto do crime organizado internacional. O tema “estatísticas” inclui as peças que divulgam informações baseadas em relatórios.

Frequência dos temas (2012/2013) 40 35 30 25 20 15 10 5 0

Gráfico 5: Frequências dos temas (2012/2013)

120

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A este propósito importa sublinhar certos aspetos importantes para a presente investigação. Em primeiro lugar, podemos constatar que, ao contrário das primeiras hipóteses formuladas, o tema da prostituição não é o mais frequente aquando a divulgação de informações sobre o TSH (embora, como já foi referido, a exploração sexual seja o tipo de exploração que mais foi coberto pelos média durante o período analisado). É de notar também que o tema do tráfico de menores pode incluir outros temas subjacentes como, por exemplo, a prostituição forçada ou a mendicidade por coerção. Em segundo lugar, o tema da proteção das vítimas ter pouca importância a nível de representatividade, embora seja um tema predominante nas agendas políticas europeia122 e portuguesa123. No tocante às variáveis de discurso (enquadramento, argumentação e vozes), destacam-se claramente certas tendências gerais. Por exemplo, a tabela seguinte demonstra que a maioria das peças apresenta uma narrativa policial (48,2 %), seguida pela narrativa informativa (42,4%). O enquadramento policial é entendido como a informação proveniente de casos judiciais. O enquadramento informativo refere-se à narrativa factual baseada na realidade estatística.

Frequência

Percentagem

Informativo

73

42,4

Dramático

9

5,2

Épico

1

0,5

Moral

6

3,4

Policial

83

48,2

TOTAL

172

100 (99,7)

Tabela 9: Enquadramento (2012-2013)

122

Ver, a este propósito, a Diretiva Europeia 2011/36/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas. 123 Lei nº 60/2013, de 23 de agosto de 2013, República Portuguesa, que procede à 30ª alteração ao Código Penal e que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho. 121

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Observando a argumentação, verifica-se que a modalidade “judiciária” se destaca em relação às restantes, correspondendo a cerca de 40% da totalidade das peças analisadas (ou seja, 69 peças). Esta observação enquadra-se totalmente nas análises precedentes que demonstram que a maioria das peças relatam casos judiciais, empregando uma terminologia policial.

Argumentação (2012/2013) 80 70 60 50 40 30 20 10 0 Económica

Legal

Judiciária

Demográfica

Securitária

Social

Gráfico 6: Argumentação (2012-2013)

Tendo em consideração as vozes, salienta-se, no seguimento lógico dos dados precedentes, uma predominância das “autoridades policiais” (22,4%) e das “autoridades políticas” (22,4%). Importa realçar alguns aspetos da tabela seguinte. Primeiro, observase um baixo número de referências às instituições internacionais principais na luta contra o TSH (ONU, GRETA, OSCE e UE). Do mesmo modo, verifica-se um baixo número de referências ao OTSH e aos investigadores científicos. Em segundo lugar, as vozes das vítimas têm também pouca representatividade nas peças analisadas. Por fim, é ainda de destacar o facto de um número relativamente significativo de peças provir de agências noticiosas, indicando um interesse limitado pelo tema e, por conseguinte, de peças resultantes do jornalismo de investigação.124

124

É de notar, porém, que o Público apresenta uma evolução evidente entre 2012 e 2013 ao propor um número crescente de reportagens feitas por investigadores jornalistas e não pela agência Lusa. 122

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Vozes (2012/2013) 60 50 40 30 20 10 0

Gráfico 7: Vozes (2012/2013)

3.3 Análise da imprensa (tráfico de seres humanos para exploração sexual) Em relação ao TSH para exploração sexual, foram analisadas as peças que tratam unicamente deste fenómeno durante os anos de 2012 e de 2013, ou seja 42 peças, sendo a maioria proveniente do Jornal de Notícias e do Correio da Manhã.

Frequência

Percentagem

JN

14

33,3

DN

10

23,8

CM

13

30,9

Público

5

11,9

TOTAL

42

100 (99,9)

Tabela 10: TSH para exploração sexual: peças por jornal (2012/2013)

Os tipos de peças mais frequentes são, de acordo com a tabela seguinte, os breves e as notícias. Importa realçar o facto de o tema do TSH para exploração sexual não merecer importância suficiente para que sejam feitas reportagens ou entrevistas. Este 123

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facto contribui para a invisibilidade do fenómeno aos olhos não só do público, mas também das agendas políticas.

Frequência

Percentagem

Breve

18

42,8

Notícia

23

54,7

Reportagem

0

-

Opinião

1

2,3

Editorial

0

-

Entrevista

0

-

Total

42

100 (99,8)

Tabela 11: TSH para exploração sexual: tipo de peça (2012/2013).

Analisando o conteúdo, a maioria das ações descritas decorrem em Portugal (40,4%) e em Espanha (26,1%). Ao adicionarmos as peças relativas a Angola com as peças relativas a Angola e Brasil, observa-se uma representatividade importante destes países (9,4%).

Frequência

Percentagem

Portugal

17

40,4

Espanha

11

26,1

Angola

2

4,7

Brasil e Angola

2

4,7

Europa125

3

7,1

Mundo126

7

16,6

TOTAL

42

100 (99,6)

Tabela 12: TSH para exploração sexual: distribuição geográfica das ações descritas (2012/2013) 125 126

A modalidade “Europa” inclui a Alemanha, o Reino Unido e a Suécia. A modalidade “Mundo” inclui o Brasil, os Estados Unidos, o Nepal, a Tailândia e o termo geral “mundo”. 124

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No que se refere à frequência das nacionalidades dos suspeitos, constata-se que 48% das peças não fazem qualquer tipo de referência a esta característica. Porém, ao somar o total das peças que fazem referência à nacionalidade, verifica-se que a maioria dos suspeitos relatados mediaticamente é estrangeira. Esta representação mediática não corresponde à realidade estatística onde se constata que a única nacionalidade confirmada dos suspeitos no âmbito do TSH para exploração sexual é a portuguesa (SSI, 2014, p. 101).

Frequência Sem referência

20

Romena

2

Portuguesa

3

Angolana

4

Nigeriana

4

Romena, portuguesa e

3

brasileira Leste europeu

1

Romena, turca e portuguesa

1

Mexicana

1

Estrangeiros

1

Paquistanesa

1

Nepalesa

1

TOTAL

42

Tabela 13: TSH para exploração sexual: nacionalidade dos suspeitos (2012/2013)

125

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TSH PARA EXPLORAÇÃO SEXUAL: FREQUÊCIA DA NACIONALIDADE DOS SUSPEITOS (2012/2013) Sem referência

Portugueses

Estrangeiros

Vários (incluindo portugueses)

9%

48% 36%

7%

Gráfico 8: TSH para exploração sexual: frequência da nacionalidade dos suspeitos (2012/2013)

Em contrapartida, as nacionalidades das vítimas mais representadas na imprensa são a brasileira e a romena, confirmado pela realidade estatística. A este propósito, importa ainda referir que não foram encontradas peças relativas ao TSH para exploração sexual cujas vítimas sejam de nacionalidade portuguesa.

Frequência Sem referência

25

Romena

6

Brasileira

7

Nigeriana

2

Várias

1

Nepalesa

1

TOTAL

42

Tabela 14: TSH para exploração sexual: frequência da nacionalidade das vítimas (2012/2013)

Em relação aos temas, observa-se uma predominância dos temas “máfia”, “prostituição” e “justiça”. Ou seja, a maioria das peças que cobriram o TSH para

126

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exploração sexual nos anos de 2012 e de 2013 realçam os grupos criminosos internacionais e a prostituição ou descrevem casos pontuais.

TSH para exploração sexual: frequência dos temas (2012/2013) 16 14 12 10 8 6 4 2 0

Gráfico 9: TSH para exploração sexual: frequência dos temas (2012/2013)

No que toca ao enquadramento, observa-se uma clara representatividade da modalidade “policial” (54,7%). Tal facto está relacionado com a elevada frequência dos temas “máfia” e “justiça” (ver tabela precedente). Merece especial destaque a frequência da argumentação moralística, dramática e épica (18,9% das peças analisadas). A peça de teor épico corresponde ao tema “telenovela” e trata da telenovela brasileira “A Guerreira” sobre o TSH para a prostituição forçada.

Frequência

Percentagem

Policial

23

54,7

Informativo

11

26,1

Dramático

3

7,1

Moral

4

9,5

Épico

1

2,3

TOTAL

42

100 (99,7)

Tabela 15: TSH para exploração sexual: enquadramento (2012/2013) 127

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No que diz respeito à argumentação, verifica-se uma clara maioria da modalidade “judiciária”, seguida pela argumentação social.

TSH para exploração sexual: argumentação (2012/2013) 30 25 20 15 10 5 0 Judiciária

Proteção da vítima

Social

Securitária

Legal

Gráfico 10: TSH para exploração sexual: argumentação (2012/2013)

A respeito das vozes, a esmagadora maioria provém das autoridades policiais, o que se enquadra nas análises precedentes.

TSH para exploração sexual: vozes 30 25 20 15 10 5 0

Gráfico 11: TSH para exploração sexual: vozes (2012/2013)

128

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Numa análise de discurso de tipo qualitativo, foram observadas certas tendências que merecem a atenção do investigador. Em primeiro lugar, verifica-se um certo sensacionalismo presente em títulos como, por exemplo, “Polícia liberta criança presa para obrigar a mãe a prostituir-se”; “Escrava sexual viveu dez anos numa masmorra”; “Nepal: Apanha 170 anos de prisão por vender adolescentes”; ou ainda “Virgem será processada”. Da mesma maneira, verifica-se a utilização de termos apelativos numa perspetiva de marketing mediático como “tráfico sexual”, “escravas sexuais” ou “tráfico de mulheres”. A este propósito importa ainda sublinhar a utilização, relativamente frequente, de vocabulário chocante e violento: Contou também que, quando ficou grávida, o chulo a pontapeou na barriga até começar a sangrar e ser levada para uma clínica, onde abortou. (…) A mesma testemunha disse que lhe contaram que Ion Clamparu [um cidadão romeno] matou e esquartejou três mulheres; uma quarta foi amarrada para ser atacada e morta por cães.127

A vítima, órfã e levada por um casal do Paquistão para Salford, Grande Manchester, era trancada na masmorra, e, à noite, dormia num chão de cimento. Durante o dia era sujeita a trabalhos forçados e sexualmente abusada.128

De salientar ainda que as informações estatísticas são, por vezes, baseadas em fontes inverificáveis, apresentando figuras altamente questionáveis e mesmo (ver segunda citação) contraditórias:

127

Mariano, F. (2012, 1 de fevereiro). “Cabeça de Porco” julgado em Madrid por tráfico de seres humanos. Jornal de Notícias. Acedido em http://www.jn.pt/PaginaInicial/Mundo/interior.aspx?content_id=2277869&page=-1 Merece particular destaque o jargão utilizado (“chulo”) e o facto de a maior violência relatada ser proveniente de uma testemunha em terceiro grau (a testemunha disse que lhe contaram). Estes dados são indicativos da circulação de rumores, talvez mesmo do início de uma lenda urbana (Renard, 1999; Reumaux 1998). 128 Madeira, P. (2012, 9 de fevereiro). Escrava sexual viveu dez anos numa masmorra. Correio da Manhã. Acedido em http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/internacional/mundo/escrava-sexual-viveudez-anos-numa-masmorra 129

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O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

A nível nacional, 7% dos inquiridos numa sondagem confirmaram ter tido um contacto direto com uma vítima de tráfico de seres humanos. (…) Só na Grande Lisboa, o estudo refere que mais de 15% já conheceu uma vítima de tráfico.129

Segundo informou a polícia em comunicado, dezenas de mulheres eram traficadas para fins sexuais (…). Durante a operação, foram libertadas cinco mulheres que estavam a ser exploradas para prostituição.130

Para além desta deficiência mediática, as estatísticas divulgadas revelam-se particularmente cruéis, contribuindo para a associação entre imigrante e criminalidade e esquecendo que a maioria dos imigrantes ilegais não acaba em situação de escravatura. Além da prostituição e indústria do sexo, há que ter em conta os pedidos de asilo e os números relacionados com a imigração. Desde o início do ano, Portugal registou 130 pedidos de asilo, quase tantos como os 139 verificados em 2009. No que diz respeito à imigração, no ano passado terão entrado em Portugal cerca de 550 mil pessoas, das quais 100 mil de forma irregular.131

A reconstrução da inocência parece também evidente ao relatar que a vítima não tem conhecimento do seu destino: Desde a rapariga a quem prometeram emprego num bar da Tailândia e acabou a vender o corpo; a outra que foi enganada pelo namorado; outra ainda por um amigo da família.132

129

Pereira, A. (2013, 26 de setembro). Portugal tem 28 mil prostitutas. Correio da Manhã. Acedido em http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/portugal/portugal-tem-28-mil-prostitutas 130 (2013, 10 de novembro). Desmantelada rede de tráfico de pessoas em Espanha. Jornal de Notícias. Acedido em http://www.jn.pt/PaginaInicial/Mundo/interior.aspx?content_id=3525340&page=-1 131 Pereira, A. (2013, 26 de setembro). 132 Barreiros, P. (2013, 10 de fevereiro). Educar contra a prostituição. Público. Acedido em http://www.publico.pt/dar-a-cara/jornal/educar-contra-a-prostituicao-25996048 130

Júlia Tomás

O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

Uma delas contou à polícia que foi espancada à chegada a Espanha, onde entrou com um passaporte falso arranjado pela rede, com uma falsa promessa de emprego de que iria ganhar 10 mil euros em três meses.133

De acordo com a acusação, o grupo promoveu a imigração das romenas, com a promessa de as empregar na restauração, mas, uma vez chegadas, as mulheres eram forçadas a prostituir-se.134

Joaquim Méndez Hernández terá conspirado com pelo menos mais três cúmplices para trazer para os Estado Unidos mulheres de México, Nicarágua, entre outros, com falsas promessas para concretizar o “sonho americano”.135

A inocência da vítima é ainda realçada quando se menciona a idade das jovens: Os agentes das Brigada de Estrangeiros e Fronteiras do comissariado da província de Cáceres localizaram uma jovem romena de 24 anos.136

Os suspeitos, naturais de um país do leste europeu, terão aliciado a vítima, de 18 anos, prometendo-lhe melhores condições de vida (…).137

A distinção entre criança e adulto é igualmente confusa, encorajando o público a associar a vítima à inocência. Ela e outras jovens romenas (…).138

133

Mariano, F. (2012, 1 de fevereiro). (2012, 19 de abril). Alteração não substancial dos factos adia leitura do acórdão. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2430281&seccao=Norte&page=-1 135 (2013, 18 de janeiro). EUA resgatam 11 vítimas de tráfico sexual. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3000238&seccao=EUA%20e%20Am%C3%A 9ricas 136 (2013, 14 de dezembro). Português envolvido em tráfico de seres humanos para fins sexuais detido em Madrid. Público. Acedido em http://www.publico.pt/sociedade/noticia/portugues-envolvido-emtrafico-de-seres-humanos-para-fins-sexuais-detido-em-madrid-1616337 137 (2012, 16 de março). PJ deteve suspeitos de sequestro e tráfico de pessoas. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2366756&seccao=Centro&page=-1 138 Mariano, F. (2012, 1 de fevereiro). 134

131

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O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

Agredidas, drogadas e obrigadas a ‘venderem’ o corpo nas bermas da EN125. As cerca de 30 mulheres, com idades entre os 17 e os 20 anos, estavam sujeitas às ordens de uma rede internacional de exploração sexual.139

Ao inocentar a vítima (pobre, raptada e drogada), os média dão a possibilidade ao público de mentalmente separar as prostitutas “boas” (as forçadas) das outras. Esta diferenciação demonstra que o senso comum veiculado por certos órgãos de comunicação considera a prostituição como uma atividade “problemática”, pondo de lado o que verdadeiramente está em causa no que toca ao TSH: a séria violação da dignidade humana. O contexto da difusão de um número importante de peças está relacionado com algumas histórias predominantes das quais se destacam o escândalo ligado ao familiar do presidente angolano em 2013 (acima referido), supostamente cabecilha de uma rede internacional de tráfico de mulheres. Na realidade, não se seguiram quaisquer acusações por não existirem provas. Aliás, segundo vários artigos apenas existem provas de trabalho sexual – voluntário – de luxo (escort girls) a nível internacional:

As mulheres eram aliciadas em casas de diversão noturna de São Paulo e da região sul do Brasil pelos membros da rede, que ofereciam a partir de 10 mil dólares (7,290 euros) para que elas se prostituíssem durante uma semana. (…) Ainda segundo a assessoria da Polícia Federal brasileira, as investigações encontraram provas de que brasileiras “do meio artístico”140 receberam até 100 mil dólares (72,900 mil euros) para se relacionarem sexualmente com um rico empresário e ex-parlamentar de Angola.141

139

Gomes, R. P. & Griff, T. Rede de prostituição da EN125 em tribunal. Correio da Manhã. Acedido em http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/portugal/rede-de-prostituicao-da-en125-emtribunal 140 É de notar que o emprego da expressão “brasileiras do meio artístico” lembra um pouco o relatório da Liga das Nações de 1927 (referido no primeiro capítulo) que constata que um dos quatro grupos de vítimas do TSH é constituído por artistas e dançarinas. 141 (2013, 25 de outubro). Rede de tráfico de mulheres brasileiras atuava também em Portugal. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=3498021&page=-1. (2013, 25 de outubro). General angolano acusado de financiar tráfico de mulheres. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3498462&seccao=CPLP&page=-1. 132

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O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

Outra história notável trata de uma mulher (jovem e brasileira) que vendeu, em 2012, a virgindade em leilão por 780,000 dólares no âmbito de um reality show autraliano, “Virgins Wanted”. Esta “notícia” foi publicada, primeiro, pelo tabloide inglês, Daily Telegraph, e, em seguida, divulgado pelo Jornal de Notícias e pelo Correio da Manhã. As peças relacionadas com este fait divers foram escolhidas para serem analisadas, pois relatam o acontecimento como se escondesse uma situação de TSH142. O certo é que as duas peças jornalísticas que tratam desta história, e que se inserem na contabilidade das notícias e das imagens relativas ao TSH para exploração sexual, incluem fotografias da mulher em questão e em nada contribuem para uma divulgação ética do fenómeno criminoso.

Figura 10: “Catarina leiloou virgindade por 600 mil euros” Fonte: Jornal de Notícias

Figura 11: “A jovem de 23 anos vendeu virgindade por 600 mil euros” Fonte: Correio da Manhã

142

(2012, 30 de outubro). Jovem que leiloou virgindade suspeita de prostituição. Jornal de Notícias. Acedido em http://www.jn.pt/PaginaInicial/Mundo/interior.aspx?content_id=2854775&page=-1; Serrinha, D. G. (2012, 31 de outubro). Virgem será processada. Correio da Manhã. Acedido em http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/internacional/mundo/virgem-sera-processada 133

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O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

O texto e a imagem são complementares na cobertura jornalística. Na imprensa, é a imagem que muitas vezes determina a leitura de uma matéria. Além disso, a imagem tem o poder subliminar de influenciar a nossa leitura do mundo. Na continuação desta observação e para terminar a análise do discurso mediático relativo ao TSH para exploração sexual, foram analisadas as imagens presentes em 21 peças (do total de 42). Verificou-se uma representatividade importante de fotografias das “autoridades” (6 fotografias) e das “prostitutas” (5 fotografias). As imagens das prostitutas-vítimas são as seguintes:

Figura 12: Associações querem que seja criada a categoria profissional de trabalhador do sexo Fonte: Jornal de Notícias143

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(2012, 17 de dezembro). Associações defendem que trabalho sexual deve ter enquadramento legal. Jornal de Notícias. Acedido em http://www.jn.pt/PaginaInicial/Sociedade/interior.aspx?content_id=2952049&page=-1 134

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Figura 13: “Criminosos detidos em Espanha colocavam mulheres em redes de prostituição que operavam em vários países da Europa” Fonte: Correio da Manhã144

Figura 14: “Uma jovem romena denuncia a situação” Fonte: Correio da Manhã145

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(2013, 10 de novembro). Desmantelada rede criminosa que traficava mulheres. Correio da Manhã. Acedido em http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/internacional/mundo/desmantelada-redecriminosa-que-traficava-mulheres 145 (2013, 14 de dezembro). Português detido em Madrid por tráfico de seres humanos. Correio da Manhã. Acedido em http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/portugal/portugues-detido-emmadrid-por-trafico-de-seres-humanos 135

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Figura 15: “Jovens romenas eram obrigadas a ‘vender’ o corpo na EN125” Fonte: Correio da Manhã146

Figura 16: “A exploração sexual é o principal destino das mulheres vítimas de tráfico de seres humanos” Fonte: Correio da Manhã147

Estas fotografias demonstram uma tipicidade constante – uma repetição de temas mitológicos (mitemas). As mulheres são apresentadas com poucas roupas, vestimentas sensuais da cor preta e sapatos de salto alto. Estas imagens remetem para as Estruturas antropológicas do imaginário de Gilbert Durand (1992) em relação à mulher fatal e à união entre Eros e Tanatos. A imagem da feminilidade noturna ilustra o isomorfismo dos

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Gomes, R. P. & Griff, T. (2012, 19 de março). Pereira, A. (2013, 26 de setembro). 136

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símbolos da lua, da morte e do feminino, realçando o aspeto nefasto e perigoso. Esta constelação de imagens insere-se num sistema de significados preexistentes, os quais alimentam um imaginário coletivo discriminador e, sem contribuir para a luta contra o TSH, contribuem para a invisibilidade do grupo social em questão. As fotografias encaixam na teoria acima descrita sobre as histórias moralísticas nas quais não é o comportamento dos agressores que está em causa, mas o comportamento das vítimas e das potenciais vítimas. Ao apresentar clichés da prostituição, a imprensa reforça preconceitos e estereótipos que, no fundo, só ocultam o problema do TSH.

3.4 Resultados e conclusões Os resultados desta investigação estão em total acordo com os resultados de estudos anteriores. Por exemplo, Jeff Gulati (2010), na sua análise das representações mediáticas do TSH nos Estados Unidos, Reino Unido e Canadá, conclui que os meios de comunicação tendem a generalizar o TSH sob o tema da exploração sexual e não apresentam perspetivas diferentes, dependendo quase exclusivamente das fontes oficiais governamentais, nomeadamente das autoridades policiais. De igual forma, o presente estudo demonstra que a maioria dos enquadramentos é policial, utilizando uma argumentação judiciária e recorrendo às vozes das autoridades policiais. De acordo com Jo Doezema (2000), que analisou as evoluções linguísticas a nível das representações sociais desde o mito da escravatura branca no século XIX, prevalecem certos temas dos quais se destacam: a inocência da vítima (o facto de ela nunca saber o que a espera); a mulher não-emancipada (retratada como pobre, naïve e desapoderada); e o traficante (imagem da máfia estrangeira). A presente investigação também deteta a forte presença destes temas. Confirma-se, assim, a teoria de Nils Christie (1986) sobre a “vítima ideal”, ou seja, aquela que não conhecia o transgressor, que foi enganada/violentada e que não estava ligada a outro tipo de atividade ilícita. Já o facto de a maioria dos suspeitos serem estrangeiros nas representações mediáticas sobre o TSH, confirma que a inquietante estranheza é um valor noticioso. Comparando este facto com o estudo de Sarah Moore (2014) relativo ao discurso 137

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mediático sobre a violação, encontram-se certas semelhanças. Moore constata uma predominância dos violadores estranhos (desconhecidos da vítima) nas notícias. Porém, a realidade estatística indica que a maioria das violações é cometida pelos parceiros ou por conhecidos. Para a socióloga, “o público vê o crime como geralmente violento e vê o crime violento como geralmente cometido por estranhos” (Moore, 2014, p. 66). Da mesma forma, o presente estudo indica um certo gosto pelos crimes violentos cometidos por estrangeiros. Segundo os relatórios do Grupo de Trabalho Human Trafficking do Departamento de Direito da Universidade de Queensland148, a maioria das peças jornalísticas são breves (hard news), publicando simplesmente os factos, os dados estatísticos e citações. Por conseguinte o público não tem acesso a análises aprofundadas neste tópico. Do mesmo modo, a presente investigação demonstra que os breves e as notícias são os tipos de peça mais representativos. Nos anos de 2012 e de 2013, apenas 3 publicações podem ser classificadas como jornalismo de investigação. Foram também publicadas apenas 5 opiniões. O acima citado Grupo de Trabalho verifica ainda que 45% dos artigos australianos examinados giram em torno de casos policiais e processos judiciais. A razão para tal, segundo a equipa de investigação, é que “a produção de relatórios judiciais não é nem complicada, nem cara, tornando-os numa opção atraente do ponto de vista financeiro”.149 Também a presente análise dos discursos mediáticos revelou que a maioria das peças está relacionada com casos judiciais pontuais. Um dos resultados diretos é o realce do aspeto criminoso do TSH em detrimento das causas sociais que têm raízes no fenómeno.

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http://www.law.uq.edu.au/human-trafficking-in-the-media http://www.law.uq.edu.au/human-trafficking-in-the-media 138

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4. Comunicação social e ética jornalística

O espírito deve permanecer vigilante na luta permanente contra as simplificações. Os riscos de simplificação amplificam-se nos períodos de histeria coletiva, de crise e de guerra. Nós vivemos em tal período, o que aumenta a necessidade de pensamento e de ética complexos. Edgar Morin

A comunicação pode ser uma das armas mais mortíferas. No contexto institucional, a comunicação pode ser utilizada com objetivos corruptos, tirânicos e opressivos. Historicamente, a comunicação tem sido instrumental para justificar injustiças, conflitos armados, violência e mesmo genocídios. No entanto, a arte da comunicação pode verificar-se essencial na busca da justiça, da verdade, do conhecimento e da paz. Estes poderes antinómicos são os elos entre comunicação e ética. O debate sobre a ética comunicativa é essencial porque existem várias e diversas formas de os órgãos de comunicação ofenderem: distorções, mentiras, favoritismos, sensacionalismos, racismos, sexismos. Por isso, o juízo ético do jornalismo é um padrão de qualidade. E esta virtude jornalística está em causa quando se trata de temas relativos ao TSH. Atualmente assiste-se a uma amálgama de géneros no campo jornalístico: reportagens com forte componente publicitária, o espetáculo, o lúdico, o drama. Mesmo os jornalistas são sucessivamente repórteres, apresentadores, escritores ou consultores. A este facto não é alheia a situação económica, que muitas vezes obriga o jornalista a assumir responsabilidades em domínios que pouco têm a ver com os valores jornalísticos, como, por exemplo, a publicidade, a promoção de eventos ou relações públicas. Efetivamente, assistimos à aplicação nos média do star system cinemático. Por 139

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conseguinte, o jornalismo transformou-se numa atividade comunicacional com um simples objetivo: atrair o maior número possível de auditores. Ora a informaçãoespetáculo resulta claramente numa deficiência em termos de rigor jornalístico, valorizando a hipérbole, o exagero, as generalizações e as simplificações. O jornalista torna-se, assim, num mero comunicador e perde, neste processo, a sua legitimidade como representante do cidadão. Este capítulo expõe brevemente, num primeiro momento, diversas teorias respeitantes à ética em geral e à ética na comunicação. Passo, num segundo momento, à reflexão sobre a responsabilidade social dos meios de comunicação, para terminar, na terceira secção, com um leque de recomendações.

4.1 Ética jornalística Importa clarificar, desde já, os conceitos de ética, moral e deontologia. Com o intuito de simplificar a leitura, propõem-se os seguintes significados do Dicionário da Língua Portuguesa (2013) da Porto Editora: Ética: disciplina que procura determinar a finalidade da vida humana e os meios de a alcançar, preconizando juízos de valor que permitem distinguir entre o bem e o mal.

Moral: conjunto de normas de conduta consideradas mais ou menos absoluta e universalmente válidas.

Deontologia: estudo dos deveres especiais de uma situação, particularmente dos deveres das diversas profissões.

Aproveito uma definição proposta por Edgar Morin que me parece ser concisa e clara:

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A ética manifesta-se de forma imperativa, como uma exigência moral. O imperativo nasce de uma fonte interior ao indivíduo, que sente no seu espírito a imposição a um dever. O imperativo provém também de uma fonte exterior: a cultura, as crenças, as normas de uma comunidade. Existe igualmente, sem dúvida, uma fonte anterior, proveniente da organização viva, transmitida geneticamente. (Morin, 2004, p. 15),

A ética é um conceito introduzido, na sociedade ocidental, por Aristóteles para definir a parte da filosofia que estuda o comportamento humano. Mas esta filosofia não se limita a descrever os comportamentos morais e os valores que os guiam, também propõe indicações sobre os critérios e os valores que devem ser respeitados para encontrar a felicidade, bem soberano. Aristóteles defende, em Ética a Nicómaco (2009 [350 a.C.]), que o único meio de chegar à felicidade perfeita, consequência do desenvolvimento máximo de nós mesmos, é a virtude. A virtude resulta, para o filósofo, de três fatores: a natureza e a sua tendência espontânea para o bem, a razão que dirige esta tendência e a prática que gera o hábito. Trata-se aqui de um “eudemonismo racional” porque a felicidade não se reduz ao prazer mais ou menos passageiro e superficial, mas consiste na satisfação profunda proveniente da conformidade da vida com a razão. A maneira de alcançar a felicidade seria de praticar as virtudes no sentido de procurar um justo equilíbrio entre o excesso e a deficiência. A virtude requer, por isso, a consciência do indivíduo relativamente ao seu próprio comportamento moral. Assim, a ética aristotélica é fundada na natureza mas também na harmonia com as tradições e leis existentes na polis. Contudo esta reflexão tornou-se algo abstrata face ao nascimento dos impérios, nomeadamente o de Alexandre o Grande e o império romano. Por conseguinte, as referências à comunidade política desaparecem na ética estoica para a qual a ordem natural se torna no ponto de referência decisivo, perdendo-se todas as referências aos costumes. Segundo os estoicos, o soberano bem – o bem absoluto – é a própria virtude, ganhando, desta forma, um aspeto universal (no sentido de totalidade orgânica) (Schuhl, 1962). Esta abordagem influenciará diretamente a ética moderna relativa ao conceito de indivíduo. Neste sentido, a frase de Santo Agostinho “ama e faz o que 141

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quiseres”150 é emblemática de um pensamento no qual a ética já não é um sistema de regras de bom comportamento mas de um comportamento interior. A ética cristã vai, desta forma, concentrar-se nas condições subjetivas da ação moral e do dever. No mundo laico, a questão da ética permanece dividida entre a ordem natural e a ordem social. Se a ética cristã constitui uma legitimação da moralidade em relação a uma totalidade na qual o homem se insere, a ética moderna emerge de uma maneira nova de ver o indivíduo. Certos acontecimentos históricos, como a cisão da Europa cristã, o nascimento de novos Estados nacionais ou a descoberta de novos mundos, inspiraram novos paradigmas, nomeadamente a relação entre as leis naturais151 e as leis positivas152 elaboradas pela doutrina do direito por natureza. A dicotomia entre os direitos naturais e os direitos positivos será comum a toda a tradição ética moderna. Por exemplo, David Hume, no seu Tratado da natureza humana (1740), desenha uma “meta-ética” ao analisar os conceitos fundamentais e os seus significados efetivos (justo, bom.) na linguagem da sociedade. A partir deste questionamento, surge a ideia de que o comportamento humano não é só marcado pelas impulsões primárias e agressivas, mas é também constituído pela propensão inata à sociabilidade e à necessidade da bondade de outrem. Mais tarde, Rousseau continuará a realçar o elo incontornável entre o Estado social e as normas éticas: o direito político torna-se uma mediação necessária entre a natureza do homem e a humanidade, entre a antropologia e a moral. Na sua obra Du contrat social (publicado originalmente em 1762), o filósofo expõe a sua teoria ético-política, situando a responsabilidade, não no homem individual, mas na sociedade humana, e associando intrinsecamente o sentimento ao senso do dever. Também a reflexão ética de Emmanuel Kant, na sua Fundamentação da metafísica dos costumes (1785), está centrada na noção do dever, sendo a intenção o elemento único da moralidade. O princípio do dever é a razão e define-se como a necessidade de obedecer à Lei pelo respeito à Lei. Por outras palavras, a humanidade – compreendida 150

Comentário de Santo Agostinho à primeira carta de São João, capítulo 4. As leis naturais são um conjunto objetivo de normas éticas que guiam as ações humanas em qualquer tempo ou lugar, são bens humanos evidentes em si mesmo como, por exemplo, o direito à vida. O direito natural não é coercivo, porque parte de uma moralidade. 152 As leis positivas são um conjunto de regras que regem a vida social de um determinado povo numa determinada época, são as leis impostas pelo Estado. O direito positivo pressupõe que o Estado aja através de serviços sociais e educativos. 151

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como dignidade humana – é um valor intrínseco aos seres humanos porque estes são “agentes racionais”, guiando a sua conduta pela razão. Como James Rachel explica, uma vez que a lei moral é a lei da razão, os seres racionais são a encarnação da lei moral em si mesma (Rachel, 2004). Numa perspetiva utilitarista, a ética está vinculada às consequências de um determinado comportamento. O mais importante é o resultado da ação e não a ação em si mesma. Este paradigma realça a necessidade de assegurar uma conduta responsável. Tal abordagem é explorada primeiro por Jeremy Bentham e aprofundada em seguida por John Stuart Mill (1859) que realça a questão da racionalidade dos comportamentos guiados pelos sentimentos de unidade e solidariedade. Também Auguste Comte (1851) partilha a abordagem da ética utilitarista numa perspetiva positivista: a moralidade, cujo alicerce é o altruísmo, é uma finalidade do positivismo. O sociólogo francês adiciona, desta forma, uma certa orientação orgânica ao defender que o conceito de ética tem por fundamento a pertença do indivíduo a estruturas históricas e, em particular, à sociedade industrial. A ordem individual, preocupada com uma moralidade abstrata, está subordinada à ordem social. Ou seja, o mundo social “sistematiza definitivamente a moral universal” (Comte, 1851, p. 91). No prosseguimento deste pensamento, Engels e Marx defendem que a ética é uma doutrina dos “bens” históricos e não uma doutrina de imperativos. Acrescentam ainda que o caráter ideológico da ética é dado pelo Estado. Emerge, através da noção marxista da ideologia, uma desmistificação geral da moral pois os sistemas de valores dos indivíduos perdem a sua validade absoluta. No fundo, a ética, na perspetiva marxista, é uma forma de ideologia geralmente intuída como um sistema de valores. Na sociedade capitalista, um dos valores dominantes é o individualismo burguês. Engels e Marx criticam moralmente a burguesia por ter convertido a dignidade pessoal num valor de troca (Engels & Marx, 1848). Por seu lado, Max Weber, na sua obra A ética protestante e o espírito do capitalismo (1905), defende que a difusão da ética calvinista modificou a relação dos homens com o dinheiro e com o trabalho, levando à emergência do capitalismo moderno. A ideia do trabalho árduo como um dever é um atributo típico do homem no

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mundo industrial moderno. O desejo de trabalhar torna-se, neste contexto, um virtude e uma fonte de satisfação pessoal. Acresce que a poupança e o seu corolário, o investimento, é outro valor central do capitalismo. Surgem, paralelamente ao desenvolvimento do pensamento socioeconómico, novas teorias que destacam o aspeto social. Nesta perspetiva, os nossos deveres em relação ao Outro são considerados mais importantes do que os nossos direitos individuais. Esta ética, de cariz dialógico, insiste na importância central dos laços sociais presentes numa comunidade. Jürgen Habermas (1999) defende, neste sentido, que a moral se situa nas práticas discursivas de uma comunidade (a ética discursiva). Os atores sociais devem participar num discurso que esclarece os pontos de vista de cada um. Só assim podemos concordar, coletivamente, sobre as normas morais que guiam uma sociedade. A ética que Habermas propõe, reflete o processo contínuo de transformação, infletindo a “moralidade social” e fazendo-a evoluir num movimento de moralização das relações sociais. Se Kant apresenta um pensamento monológico ao defender que cada um de nós deve ser empático e ter em consideração, individualmente, as perspetivas que serão afetadas por uma determinada ação moral, Habermas reformula o imperativo categórico kantiano ao propor a ética discursiva como uma ação moral coletiva. Ao implicar a coletividade, Habermas remodela também a ideia do espaço público aliado às regras democráticas de participação popular. Para ele, o “agir comunicativo” é validado pelo reconhecimento intersubjetivo. Tocamos aqui no imperativo do diálogo: a ética como intuição moral do senso comum. Assim, o princípio subjetivo que norteia a intuição moral aponta para o princípio da universalização como uma regra da argumentação que nos ajuda a atingir um consenso (Habermas, 1999, p. 120). Os jornalistas, guiados pela ética dialógica (ou social) procuram “abrir o espaço público ao diálogo, aceitando que todos podem exprimir opiniões, articular as suas necessidades e propor possíveis soluções” (Christians, 2011, p. 192). A condição da liberdade humana, da autonomia do espírito, implica que a ética esteja intimamente ligada à noção de responsabilidade (de consciência moral): responsabilidade pela nossa vida (amor-próprio) e responsabilidade em relação a

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outrem (solidariedade). Percebemos, portanto, quando Habermas afirma que “toda a ética repousa sobre uma autodisciplina, ou seja, sobre a oposição ao egoísmo que existe em mim mesmo” (Habermas, 1987, p. 293). O problema ético contemporâneo reside, segundo Edgar Morin (2004, p. 221), no facto de tudo, na nossa civilização ocidental favorecer a logística egocêntrica em detrimento da logística altruísta e comunitária. Historicamente, a ética na comunicação levou à elaboração de diversos códigos de conduta profissionais. Em Portugal, o Código Deontológico do Jornalista foi aprovado em 4 de maio de 1993 e o Estatuto do Jornalista consagrado na Lei 1/99 de 1 de janeiro, alterada pela Lei 64/2007 de 6 de novembro da Constituição da República Portuguesa (artigo 14º). Segundo este Estatuto são deveres dos jornalistas: a) Proteger a confidencialidade das fontes de informação na medida do exigível em cada situação, tendo em conta o disposto no artigo 11.º, exceto se os tentarem usar para obter benefícios ilegítimos ou para veicular informações falsas; b) Proceder à retificação das incorreções ou imprecisões que lhes sejam imputáveis; c) Abster-se de formular acusações sem provas e respeitar a presunção de inocência; d) Abster-se de recolher declarações ou imagens que atinjam a dignidade das pessoas através da exploração da sua vulnerabilidade psicológica, emocional ou física; e) Não tratar discriminatoriamente as pessoas, designadamente em razão da ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual; f) Não recolher imagens e sons com o recurso a meios não autorizados a não ser que se verifique um estado de necessidade para a segurança das pessoas envolvidas e o interesse público o justifique; g) Não identificar, direta ou indiretamente, as vítimas de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, contra a honra ou contra a reserva da vida privada até à audiência de julgamento, e para além dela, se o ofendido for menor de 16 anos,

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bem como os menores que tiverem sido objeto de medidas tutelares sancionatórias; h) Preservar, salvo razões de incontestável interesse público, a reserva da intimidade, bem como respeitar a privacidade de acordo com a natureza do caso e a condição das pessoas; i) Identificar-se, salvo razões de manifesto interesse público, como jornalista e não encenar ou falsificar situações com o intuito de abusar da boa-fé do público; j) Não utilizar ou apresentar como sua qualquer criação ou prestação alheia; l) Abster-se de participar no tratamento ou apresentação de materiais lúdicos, designadamente concursos ou passatempos, e de televotos.

Os pilares normativos da ética jornalística são a verdade, o rigor, a equidade, a imparcialidade e o interesse público (Bernier, 2003). A verdade tem uma dimensão filosófica cuja importância nos importa aqui realçar. A verdade nunca é total e definitiva, senão seria um dogma. A pluralidade da verdade reside no facto de existirem perspetivas diferentes. No contexto do jornalismo, a verdade requer que a apresentação de uma notícia seja um resumo adequado do fragmento da realidade do qual se trata. O jornalista tem a obrigação de saber se a informação é verídica e não baseada em rumores. O jornalista tem ainda a responsabilidade de não apresentar meias verdades que induzem ao erro. Quando o princípio da verdade se molda às exigências não só da consciência histórica mas também, num aspeto mais prático, às exigências da produção quotidiana e aos imperativos organizacionais, o jornalismo perde a sua dimensão mais importante. O segundo pilar da ética jornalística, segundo Marc-François Bernier, é o rigor – condição necessária à verdade. O rigor é um pensamento metódico na interpretação de dados, acontecimentos e fenómenos. O rigor e a exatidão implicam que a verdade esteja conforme à realidade em questão. O rigor na investigação jornalística implica pesquisa, entrevistas, estudo de arquivos históricos mas, sobretudo, requer uma verificação constante dos fenómenos relatados. Outra exigência ética é a equidade que consiste em tratar as pessoas com respeito, justiça e dignidade. A ética na comunicação social implica que todos sejam iguais e que 146

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ninguém seja prejudicado por discriminação ou preconceitos. De acordo com Bernier existem três dimensões relativas à equidade jornalística (Bernier, 2003, p. 11): a equidade nos processos, a equidade no tratamento das informações e o dever de seguimento. A equidade nos processos refere-se aos métodos de recolha de informação, que devem ser sempre transparentes. A equidade no tratamento de informações impõe-se na fase de seleção das informações que farão notícia. Esta dimensão opõe-se ao sensacionalismo pois esta característica mediática é sempre injusta em relação a pessoas, a acontecimentos ou a instituições através da ampliação de elementos dramáticos. O dever do seguimento consiste no trabalho depois da difusão ou publicação, no qual o jornalista tem a possibilidade de emendar erros ou adicionar informações relevantes. O princípio da imparcialidade está intimamente ligado ao da equidade. Este princípio exige que os jornalistas sejam neutros nos seus trabalhos sem exprimirem uma opinião. No entanto, existem certas formas de jornalismo, nomeadamente no jornalismo militante, nos quais a imparcialidade é utópica. A imparcialidade jornalística é um valor incontornável quando os média pretendem informar o público e não convencê-lo ou persuadi-lo. O facto de o jornal Expresso ter adotado o mote “nós fazemos opinião” realça a sua relação instrumental com a verdade e uma tendência implícita próxima da propaganda. Por fim, o interesse público traduz-se pela utilidade da informação para as pessoas: saber como e por quem o país é governado, ter acesso a informações relativas à saúde, ao emprego, à economia nacional. A informação de interesse público favorece a participação na sociedade democrática. Mas o interesse público não deve ser confundido com a curiosidade do público. A ética na comunicação não trata só de códigos de conduta (com sanções e restrições). A ética jornalística refere-se também aos princípios relativos ao comportamento humano, princípios estes que, tendo várias bases teóricas, podem – e devem – ser aplicados objetiva e imparcialmente. Em suma, as questões éticas e deontológicas são essenciais na legitimação do trabalho jornalístico. O impacto social do

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jornalismo implica necessariamente uma transparência e uma responsabilidade da parte dos órgãos de comunicação de massa.

4.2 A responsabilidade social dos média Os média, no sentido de circulação de informação, são essenciais para uma sociedade democrática. E uma democracia saudável depende da qualidade da informação. A liberdade de expressão e a liberdade de imprensa têm um papel central na consolidação dos regimes democráticos. Os dois percursores do direito à liberdade de expressão são a Constituição norte-americana de 1789 e a Declaração dos Direitos Humanos e do Cidadão, resultante da Revolução Francesa, também no ano de 1789. A liberdade de expressão através dos meios de comunicação terá acolhimento, depois, na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (artigo 19º), na Convenção Europeia dos Direitos Humanos de 1950 (artigo 10º), no Pacto Internacional sobre os Direitos Cívicos e Políticos de 1966 (artigo 19º) e na Constituição da República Portuguesa (artigo 38º). A liberdade de expressão é uma garantia da diversidade de opiniões pois combate as pressões sistémicas de pensamento único. Ao aceitar a tensão dialética, os meios de comunicação promovem a valorização da diversidade e do pluralismo e protegem as visões dissidentes e as ideias novas. Em suma, a liberdade de expressão permite a prevenção da estagnação normativa. Porém, surgem invariavelmente questões relativas aos princípios morais e códigos éticos que levam a restrições legislativas. Por exemplo, em certos países, nos quais a liberdade de expressão é um direito fundamental reconhecido a nível constitucional, proíbem-se manifestações fascistas. Este exemplo ilustra os limites éticos de certos direitos fundamentais. De igual forma, a intenção denunciatória (naming and shaming) é particularmente bem-vinda nas sociedades democráticas quando tal intenção se dirige aos grupos dominantes e desde que sejam apoiados numa base factual satisfatória e na proteção de interesses públicos relevantes. Contudo, quando os juízos de valor negativo se dirigem a minorias e às classes dominadas, o direito da liberdade de expressão perde todo o seu sentido, pondo-se em causa a responsabilidade social dos jornalistas. As 148

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ideologias políticas dominantes têm, portanto, uma importância central para os sistemas de valores comuns veiculados pelos média. Segundo Correia, “a insistência na agradabilidade, a preocupação evidenciada pelo estilo jornalístico em tornar as narrativas facilmente compreensivas e reconhecíveis aos cidadãos típicos, implica que o jornalista reflita as tipificações e relevâncias consideradas dominantes” (Correia, 200, p. 135). A verdade, como foi constatado anteriormente, nunca é absoluta, o que implica que existem vários critérios de seleção dos quais o mais importante para os meios de comunicação de massa é, sem dúvida, o capitalismo liberal. Efetivamente, o valornotícia de uma história depende, sobretudo, do seu valor económico. A liberdade de imprensa e a restrição implícita dos poderes estaduais na disseminação da informação exige, como condição da liberdade, que os meios de comunicação sigam a lógica do mercado livre capitalista e, por conseguinte, dos programas políticos e ideológicos adjacentes. Neste contexto, para sobreviver, os média têm de satisfazer as preferências da maioria. Este imperativo revela-se contudo uma limitação à função democrática do jornalismo porque só os princípios da maioria dominante são veiculados, resultando numa pálida representação das minorias. As secções da população com menor poder de compra têm, paralelamente, pouco poder de influência. Ou seja, a imprensa não reflete a diversidade da população. Assim sendo, o mercado livre molda as notícias, resultando numa simplificação dos eventos. Tais reduções originam apresentações parciais e resultam na construção de falsas ideias no espaço público. Nas palavras de John O’Neil, “o mercado livre da imprensa tende a trabalhar contra o ideal de uma cidadania informada e crítica. Raramente confronta os seus consumidores com informações, crenças e conhecimentos que não sejam conformes com às preferências pré-existentes do público” (O’Neil, 1992, p. 18). A pressão económica também está presente na fase de recolha de informação e, por isso, a imprensa, sob tal pressão, aceita mais facilmente as notícias pré-concebidas (“ready-made news”) dos fornecedores potenciais (por exemplo, a agência Lusa). O mercado livre implica igualmente uma competição feroz com menos empregos a tempo inteiro e, por conseguinte, menos tempo (e dinheiro) para investir em formações e no

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jornalismo de investigação. Assistimos, assim, ao fenómeno da informação-espetáculo cujos campos de ação são muitas vezes incompatíveis com os valores do jornalismo. A esfera pública habermasiana sofreu, como consequência direta do capitalismo avançado, uma profunda diversificação resultante do crescimento dos meios de comunicação de massa. Hoje em dia não existe uma esfera pública, mas várias. Existe também uma diversidade (e adversidade) de identidades culturais, criando um espaço entre iguais e de consenso mas também, simultaneamente, de dissensão e de conflito. Os média têm uma responsabilidade social perante o cidadão, sendo este nacional ou estrangeiro. Os meios de comunicação social produzem um campo simbólico que institucionaliza normas, valores e comportamentos. Constituem, por isso, um sistema de representação. A retórica da representatividade tem, por conseguinte, um papel central na legitimação do trabalho jornalístico. Mas “o facto é que os média raramente assumem com a clareza e rigor desejáveis essa sua responsabilidade” (Cádima & Figueiredo, 2003, p. 5). O acontecimento em si mesmo tem tendência a apagar-se nessa erosão provocada pelo mega-discurso. Ou seja, a mediatização das representações não é uma interpretação transparente do real. Pelo contrário, a notícia, que se pretende a reificação do acontecimento, comporta uma inscrição simbólica que se insere no contexto sócio-histórico. No entendimento de Jónatas Machado: Não obstante a ideia de que os jornalistas se limitam as noticiar factos de forma inteiramente racional, objetiva, fria e cerebral, em termos supostamente cartesianos, há muito que foi afastada por ser considerada não apenas impossível como indesejável. Os factos não falam por si. Os jornalistas é que falam pelos factos. (Machado, 2013, p. 180)

Os meios de comunicação distanciam-nos do real, ultrapassando a sua função de meros veículos do real para se tornarem máquinas produtoras do artefacto. A atualidade transforma-se, desta forma, num objeto construído. O discurso jornalístico tem adotado assim uma visão do mundo mais enquadrada pela produção de consensos do que pela crítica, um discurso de certo modo vazio 150

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de sentido, refratário à representação e à experiência da sociedade – e da virtude – civil. (Cádima & Figueiredo, 2003, p. 15)

Embora a Recomendação 1277 (1995) do Conselho da Europa sobre os migrantes, as minorias étnicas e os média e a Recomendação 1768 (2006) do Conselho da Europa sobre as imagens dos asilados, dos migrantes e dos refugiados veiculados pelos média sejam esclarecedores quanto à posição europeia sobre a responsabilidade social dos média na desvalorização da imagem das populações imigrantes e das minorias étnicas, a imprensa continua ancorada a velhas ideias populistas que defendem que os “imigrantes e os estrangeiros” são um perigo e um problema. Os meios de comunicação evidenciam a conjuntura imigração e crime, em vez de explicarem ao público a necessidade da imigração para uma Europa envelhecida e com falta de mão-de-obra. A integração [dos migrantes, requerentes de asilo e refugiados] constitui um desafio, tanto para os indivíduos em questão como para a sociedade como um todo. Um dos obstáculos a essa integração é a hostilidade e a xenofobia prevalente em certas partes da sociedade, decorrentes de medos alimentados por crenças populistas de que a Europa é esmagada pelos migrantes, requerentes de asilo e refugiados. Outros medos comuns consistem na crença de que os imigrantes roubam os trabalhos dos nacionais, e contribuem para o aumento da criminalidade e para uma ameaça terrorista. Outro obstáculo para a integração é a falta de informação sobre o processo de integração dos migrantes, requerentes de asilo e refugiados. (Resolução 1768 (2006) do Conselho da Europa)

Relativamente ao “problema” da prostituição, a falta de responsabilidade social dos média é demonstrada ao exibirem imagens e representações sexistas em vez de serem explicadas as causas sociais que justificam o trabalho do sexo. A Resolução 1751 (2010) do Conselho da Europa sobre o combate aos estereótipos é clara a este sujeito:

Os estereótipos sexistas são frequentemente banalizados e tolerados sob a bandeira da liberdade de expressão. Além disso, estes estereótipos são muitas vezes sutilmente veiculados pelos meios de comunicação que reproduzem as 151

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atitudes e opiniões, vistos como a norma nas sociedades onde a igualdade entre os sexos está longe da realidade. (Resolução 1751 (2010) do Conselho da Europa)

O princípio da não-discriminação está descrito e contemplado nos vários códigos de conduta e de deontologia jornalística. Este princípio deveria adquirir mais substância, sobretudo nas sociedades pluralistas em que nós vivemos. A responsabilidade social está enraizada na prática profissional e é fundamentada pelos deveres – e não pelos direitos – dos jornalistas. A responsabilidade dos média engloba vários princípios dos quais se destacam, no contexto desta investigação, a justiça social e a promoção dos Direitos Humanos.

4.3 Recomendações e boas práticas Esta secção não pretende expor uma lista exaustiva de boas práticas no jornalismo. Tão pouco é pretendido esgotar as inúmeras táticas que podem ser utilizadas no trabalho quotidiano das redações. Aliás, não tenho qualquer experiência profissional como jornalista nem pretendo que as minhas ideias funcionem como bofetadas à profissão. As recomendações que aqui refiro são inspiradas, por um lado, por textos de Direito Internacional e, por outro, por diversos textos e manuais para jornalistas. Estas ideias são também fruto dos resultados da investigação sobre a imprensa portuguesa do precedente capítulo. É de notar ainda que não são incluídas referências a entrevistas às vítimas devido à falta de experiência no terreno. O que é apresentado é um esboço de um quadro complexo de desafios. As recomendações do Conselho da Europa acima referidas encorajam os órgãos da comunicação social a assumir um discurso intercultural tolerante como, por exemplo, a promoção do diálogo e da igualdade153; a imparcialidade e aplicação dos princípios 153

“Os organismos dos meios de comunicação devem ser encorajados a adotar medidas de autorregulação, códigos internos de conduta/ética e supervisão interna, bem como a desenvolver normas a nível da cobertura mediática a fim de promover a igualdade de género, a fim de promover uma política interna consistente e condições de trabalho tendo em vista uma imagem nãoestereotipada, o papel e a visibilidade das mulheres e dos homens, e evitem toda a publicidade sexista, linguagem e conteúdo suscetíveis de levar à discriminação de género, ao ódio e à violência com base 152

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éticos fundamentais do jornalismo ao relatar crimes, imigração e relações comunitárias (porque estes temas causam ansiedade pública)154; a eliminação do preconceito na indústria mediática, o recrutamento de pessoas pertencentes a minorias155; e a promoção da compreensão onde existe divisão intercultural. No contexto particular do TSH, as imagens veiculadas pelos meios de comunicação das massas, ao não reconhecerem a complexidade do fenómeno, simplificam-no, permitindo a condensação de informações e, por conseguinte perpetuando a conjuntura entre imigração e criminalidade ou, no contexto do TSH para exploração sexual, entre prostituição e criminalidade. O tratamento do tema do TSH pode também criar, como foi referido, o sentimento de medo, fomentando uma opinião pública desfavorável à imigração especialmente dirigida às nacionalidades mais relatadas, nomeadamente romena, búlgara e brasileira. O facto de associar uma nacionalidade em particular a um certo tipo de crime, contribui para o crescente sentimento discriminatório dirigido a essas populações156. A exploração sexual não deve se confundida com o trabalho do sexo. O facto de apresentar potenciais vítimas do TSH como dançarinas de strip-tease felizes e sorridentes ou como prostitutas, contribui para a confusão entre estas duas atividades, esquecendo que as vítimas do TSH não oferecem serviços sexuais voluntariamente. Além disso, a apresentação de vítimas potenciais do TSH e trabalhadoras do sexo com roupas provocadoras resulta numa simplificação de ambas as condições de vida. Idealmente, dever-se-ia evitar o uso de imagens inadequadas com a possível exposição no género.” Recomendação CM/Rec (2013) do Conselho da Europa. Acedido em https://wcd.coe.int/ViewDoc.jsp?id=2087343 154 “A Assembleia convida os meios de comunicação a estabelecer códigos de conduta, elaborando diretrizes para responder a desafios específicos dos média tais como evitar os estereótipos dos migrantes, dos requerentes de asilo e dos refugiados, e evitar o antissemitismo, o anticristianismo, a islamofobia, a discriminação contra os ciganos e outras formas de intolerância.” Recomendação 1768 (2006) do Conselho da Europa. Acedido em http://assembly.coe.int/main.asp?Link=/documents/adoptedtext/ta06/erec1768.htm 155 “A Assembleia convida os Estados membros a estabelecer, em colaboração com o setor dos média, programas de ensino e formação destinados a pessoas de origem estrangeira ou pertencentes a minorias étnicas, de modo a dar-lhes uma verdadeira oportunidade de fazerem carreira nos diversos setores dos média.” Recomendação 1277 (1995) do Conselho da Europa. Acedido em http://assembly.coe.int/Main.asp?link=/Documents/AdoptedText/ta95/EREC1277.htm 156 “A Assembleia convida os meios de comunicação a absterem-se de revelar a origem étnica ou a nacionalidade de migrantes, requerentes de asilo ou refugiados quando presos ou condenados por crimes, se tal informação for irrelevante.” Recomendação 1768 (2006) do Conselho da Europa. 153

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das vítimas. É imperativo desenvolver um discurso compreensivo e abrangente, evidenciando o facto de que as vítimas não incluem apenas estrangeiros, imigrantes ilegais e pobres. O TSH não afeta só pessoas de uma certa cor, nem de uma só nacionalidade. Além disso, o TSH não implica necessariamente atravessar fronteiras internacionais. Quanto aos traficantes, os média deveriam contextualizar as informações referentes ao perfil do criminoso assim como aos sinais de exploração. Seria igualmente interessante realçar que muitos traficantes pertencem ao mesmo meio social da vítima. Este aspeto é particularmente importante para as vítimas potenciais porque as ajuda a identificar situações que podem levar à exploração. A ignorância relativa ao estatuto da vítima do TSH contribui para a persistência do fenómeno. As vítimas não têm acesso a informação adequada através dos média sobre os seus direitos nem a quem se podem dirigir. Os meios de comunicação devem ter um papel central na divulgação de informações práticas dirigidas às vítimas potenciais e aos grupos mais vulneráveis à exploração. O medo de expulsão do território nacional pode contribuir para o silêncio das vítimas. Por conseguinte, os média deveriam oferecer informações claras relativas à legislação. Os média podem também divulgar informações sobre as condições de vida e de trabalho a que os imigrantes ilegais são sujeitos em Portugal e na Europa e, simultaneamente, informar sobre como obter documentos legais (título de residência, contratos de trabalho.) Outro aspeto de destaque é que as ONG e o OTSH não têm uma representatividade significativa na cobertura jornalística. Porém, os estudos feitos por estas organizações revelam dados essenciais para a compreensão do fenómeno. Portanto, uma das recomendações é de aumentar a cooperação entre os meios de comunicação e as ONG. Tal cooperação é mutuamente vantajosa. Por um lado, os média podem apresentar dados estatísticos provenientes de estudos de qualidade e ter acesso à informação através de especialistas na questão. Por outro, as peças jornalísticas podem servir para divulgar os trabalhos das ONG e, assim, informarem os grupos mais vulneráveis sem, no entanto, caírem na estrutura discursiva das histórias moralísticas. Quando os jornalistas se limitam às fontes de informação provenientes das autoridades,

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tornam-se em simples porta-vozes da polícia. Incluir as ONG nas listas das fontes de informação diversifica as perspetivas e, portanto, contribui para uma construção contextualizada de reportagens. Ao analisar os países de origem e demonstrar as desigualdades económicas e sociais, os média podem contribuir para o conhecimento público sobre as causas do TSH, realçando a séria violação de vários Direitos Humanos fundamentais. No contexto particular do TSH para exploração sexual, deveria ser realçada a discriminação (local ou global) contra as mulheres, enfatizando as noções sociais da sexualidade e, assim, contribuir para a eliminação da erotização da vítima. Quando a cobertura jornalística situa o crime no campo da lei, deveria mapear e debater a legislação. Divulgar a legislação nacional permite informar o público sobre as evoluções jurídicas nesta área. Permite também destacar as boas práticas no campo jurídico que levam à condenação do delito, demonstrando que é possível combater o TSH. Por fim, deve ser dada uma atenção especial à terminologia: uma vítima de TSH não é um imigrante ilegal, é uma vítima; o TSH não deve ser confundido com auxílio à imigração ilegal; a exploração sexual difere do trabalho do sexo. Conhecer e diferenciar as diversas características que definem o fenómeno é um largo passo no processo de mobilização e de consciencialização. Segundo o guia do ANDI – Comunicação e Direitos, Para que essa questão seja enfrentada sob uma perspetiva integrada, é preciso, entre outras coisas, construir pontes entre o mundo jurídico e o mundo social e político – especialmente no que diz respeito aos conceitos. Muitas das expressões de uso consagrado pela sociedade não se traduzem adequadamente na terminologia utilizada por juristas ou pelas instituições policiais. (ANDI, 2013, p. 14)

De forma semelhante, os jornalistas devem evitar títulos e expressões sensacionalistas como “escravatura branca” ou “escravas sexuais”. As reportagens investigativas deviam denunciar os aliciadores, apontar redes de exploração e revelar formas de aliciamento de maneira a educar o público a detetar sinais de TSH. O seguimento das histórias é também importante para o público. Este passo inclui o 155

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encaminhamento jurídico, o apoio à vítima e a situação dos exploradores. O acompanhamento do caso, incluindo as ações necessárias para a recuperação do trauma, serve igualmente para monitorizar as medidas das autoridades responsáveis (ANDI, 2013, p. 32). Os meios de comunicação de massa e os jornalistas deveriam observar e analisar o fenómeno sistematicamente. Só assim poderão evitar apresentações deficientes e problemáticas que, além de não contribuírem para o conhecimento geral, participam na reprodução de estereótipos. A ética na comunicação implica empatia e atenção às necessidades dos outros. O reconhecimento do Outro – não só a nível social, jurídico e profissional, mas também, mediático – é uma questão de consciência moral individual e coletiva. Os média deveriam desenvolver discursos e imagens de reconhecimento social que permitissem aprofundar o conceito de cidadania multicultural e promover os Direitos Humanos.

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Conclusão

O crescimento acentuado no campo do TSH é permanentemente salientado nos relatórios oficiais. A experiência portuguesa, à semelhança de outros países, era ainda há poucos anos fraca quer em matéria de conhecimentos quer no domínio jurídico. Em boa hora, desenvolveu-se em Portugal uma estratégia com estruturas e instrumentos úteis para uma captação adequada do problema. Não há dúvida de que a imprensa portuguesa tem vindo a integrar o tema do TSH no espaço público. E apesar de ainda apresentar abordagens sensacionalistas, esta tendência tem vindo a alterar-se nestes últimos anos. Há também sinais concretos, por parte de alguns órgãos de comunicação social, de um interesse pelas vítimas, respeitando a ética no jornalismo (por exemplo, as reportagens de dezembro de 2013 do Público), deixando claro que a imprensa pode contribuir de forma positiva para um debate público informado. A disseminação sensibilizadora e formativa deve ser baseada numa compreensão aberta e suscetível de acomodar as múltiplas dimensões do TSH. Contrariando as impressões, é possível consolidar uma atenção mais informada e contribuir para o ajustamento das políticas e dos instrumentos de combate ao TSH e de proteção à vítima. Contudo, o facto de o assunto ganhar mais espaço nas agendas mediáticas não significa que a cobertura jornalística não apresente limites. O frequente recurso às vozes policiais e o enfoque no ato violento limitam o conhecimento público sobre o fenómeno e, sobretudo, impede uma mudança de valores e de atitudes. A análise da construção mediática dos fenómenos sociais é essencial para observar os temas subjacentes às mensagens veiculadas, nomeadamente a prostituição e a imigração. Foi precisamente este o objetivo do presente estudo. Este trabalho partiu de uma análise histórico-legislativa do conceito de TSH, que teve origem no mito cultural da escravatura branca do século XIX, para expor a evolução no campo jurídico nesta área. Esta primeira análise inclui uma descrição do panorama atual do comércio do sexo a nível mundial, realçando algumas causas do TSH como a imigração no feminino, a pobreza, ou ainda o turismo sexual. Foi ainda exposto um 157

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resumo dos relatórios do Sistema de Segurança Interna e do OTSH para descrever o TSH em Portugal na época atual. Uma vez adquiridos os conhecimentos essenciais nesta matéria, passei a analisar as representações sociais e mediáticas da prostituição e da imigração para demonstrar a continuidade de certos preconceitos, enfatizando o facto de estes estereótipos serem o resultado de mitemas, ou constelações de imagens, profundamente enraizados no senso comum. A terceira fase do trabalho residiu na análise de discurso da imprensa portuguesa nos anos de 2012 e de 2013. Os resultados demonstram, precisamente, a presença – ainda forte – de estereótipos resultantes da discriminação – ainda que subtil – contra as mulheres e contra as minorias. Esta análise levou, portanto, a um questionamento sobre a ética na comunicação social. O quarto e derradeiro capítulo do livro reflete sobre a responsabilidade social dos média e propõe uma série de desafios para uma cobertura mediática justa e factual. Na realidade, seria interessante, partindo destas ideias, escrever um guia prático relativo à cobertura noticiosa do TSH para os jornalistas. A análise deste fenómeno permite expor uma realidade escondida no lado invisível – insensível – da sociedade. A opacidade do problema tem consequências graves no reconhecimento cívico-político das vítimas. O projeto de divulgação de informação, ao iluminar esta área, contribui para a sensibilização do público. Este projeto não é certamente o único, o que me leva a pensar, para terminar numa nota positiva, que a visibilidade social do fenómeno é progressiva, suscitando iniciativas importantes.

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APÊNDICES

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Apêndice I: Cronologia dos tratados internacionais relativos ao TSH

1904 – Acordo internacional para a supressão do tráfico de brancas, Paris. 1910 – Convenção internacional para a supressão do tráfico de brancas, Paris. 1921 – Convenção internacional para a supressão do tráfico de mulheres e crianças, Sociedade das Nações, Genebra. Entrada em vigor em Portugal em 1923. 1926 – Convenção relativa à escravatura, Genebra. Entrada em vigor em Portugal em 1927. 1930 – Convenção 29 da Organização Internacional do Trabalho, sobre o trabalho forçado ou obrigatório, OIT, Genebra. Entrada em vigor em Portugal em 1957. 1933 – Convenção internacional relativa à repressão do tráfico de mulheres adultas, Sociedade das Nações, Genebra. 1947 – Protocolo de emenda à Convenção para a supressão do tráfico de mulheres e crianças e à Convenção para a supressão do tráfico de mulheres maiores, ONU, Nova Iorque. 1948 – Declaração universal dos Direitos Humanos, ONU. 1949 – Convenção para a repressão do tráfico pessoas e da exploração da prostituição de outrem, ONU, Nova Iorque. Entrada em vigor em Portugal em 1992. 1953 – Protocolo de emenda à Convenção relativa à escravatura, assinada em Genebra a 25 de setembro de 1926, ONU. 1956 – Convenção suplementar relativa à abolição da escravatura, do tráfico de escravos e das instituições e práticas análogas à escravatura, ONU, Genebra. Entrada em vigor em Portugal em 1956. 1957 – Convenção 105 da Organização Internacional do Trabalho, sobre a abolição do trabalho forçado, OIT, Genebra. Entrada em vigor em Portugal em 1960. 1989 – Convenção sobre os direitos da criança, UNICEF. Entrada em vigor em Portugal em 1999. 2000 – Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade organizada transnacional, ONU, Palermo. Entrada em vigor em Portugal em 2004.

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2000 – Protocolo adicional à Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade organizada transnacional relativo à prevenção, à repressão e à punição do tráfico de pessoas, em especial de mulheres e crianças, ONU. Entrada em vigor em Portugal em 2004. 2000 – Protocolo contra o tráfico ilícito de migrantes por via terrestre, marítima e aérea adicional à Convenção das Nações Unidas contra a criminalidade organizada transnacional, ONU, Nova Iorque. Entrada em vigor em Portugal em 2004. 2000 – Protocolo facultativo à Convenção sobre os direitos da criança relativo à venda de crianças, prostituição infantil e pornografia infantil, ONU. Entrada em vigor em Portugal em 2003. 2002 – Decisão-quadro do Conselho da União Europeia relativa à luta contra o tráfico de seres humanos, UE, Bruxelas, 2002. 2005 – Convenção do Conselho da Europa relativa à luta contra o tráfico de seres humanos, UE, Varsóvia. Entrada em vigor em Portugal em 2008. 2011 – Diretiva n.º 2011/36/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas. Entrada em vigor em Portugal em 2013.

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Apêndice II – Grelha de análise

FORMA Jornal Título Data Tipo de peça

Notícia – Breve – Reportagem – Opinião – Editorial – Entrevista

Fonte

CONTEÚDO

Localização da ação descrita Tipo de tráfico Nacionalidade do(s) criminoso(s) Nacionalidade da(s) vítima(s) Temas

Justiça – Campanhas públicas – Estatísticas – Máfia – Escravatura – Prostituição – Segurança – Legislação – Caso Maddie – Imigração irregular – Tráfico de menores – Discriminação de género – Proteção das vítimas

DISCURSO

Enquadramento Informativo – Dramático – Épico – Moral – Policial Argumentação

Económica – Legal – Judiciária – Demográfica – Securitária – Social

Vozes

Autoridades policiais – Autoridades políticas – SEF – OTSH – ONG – Vítimas – ONU – GRETA – OSCE – UE – Investigadores – Organizações internacionais – Agências noticiosas

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Apêndice III: Lista das peças jornalísticas analisadas A lista das peças analisadas são apresentadas por jornal e por data de publicação, do mais recente para o mais antigo.

Diário de Notícias (2013, 18 de dezembro). UE critica tratamento de imigrantes em Lampedusa. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3594319&seccao=Euro pa&page=-1 Marcelino, V. (2013, 17 de dezembro). Acordo que justifica nomeação não prevê cargo em Paris. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=3591373 A.C.M. (2013, 16 de dezembro). Governo sueco quer pôr clientes de prostitutas na prisão. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3590893&seccao=Euro pa Santos L. (2013, 2 de dezembro de 2013). Tráfico de bebés chega a Portugal. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/especiais/interior.aspx?content_id=3564429&especial=Revist as+de+Imprensa&seccao=TV+e+MEDIA (2013, 22 de novembro). “Escravas domésticas” agredidas e com “algemas invisíveis”. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3548384&seccao=Euro pa&page=-1 (2013, 10 de novembro). Polícia espanhola desmantela rede de tráfico de pessoas. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3525372&seccao=Euro pa&page=-1 (2013, 5 de novembro). APAV diz que protocolo com SEF é de extrema importância. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=3515385 (2013, 31 de outubro). Desmantelada organização que raptava crianças em Itália. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3508988&seccao=Euro pa (2013, 30 de outubro). Polícia sem informação sobre tráfico de mulheres. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3506003&seccao=CPLP &page=-1 (2013, 25 de outubro). Reabertura do caso Maddie comprova ação da PJ. Diário de Notícias. Acedido em 163

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http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=3498319&page=-1 (2013, 25 de outubro). Rede de tráfico de mulheres brasileiras atuava também em Portugal. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=3498021&page=-1 (2013, 25 de outubro). General angolano acusado de financiar tráfico de mulheres. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3498462&seccao=CPLP &page=-1 (2013, 25 de outubro). Sobrinho do líder angolano acusado de traficar mulheres. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3497985&seccao=CPLP &page=-1 (2013, 20 de outubro). Milhares de chamadas sobre menina encontrada na Grécia. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3487157&seccao=Euro pa&page=-1 Fonseca, S. (2013, 19 de outubro). Advogados dizem que não houve rapto, roubo ou tráfico. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3486374&seccao=Euro pa Frazão, F. (2013, 17 de outubro). Tráfico humano simbolizado com pauzinhos japoneses. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=3483213 (2013, 21 de setembro). Princesa livra-se de acusações de tráfico de pessoas. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3433051&seccao=EUA %20e%20Am%C3%A9ricas&page=-1 (2013, 10 de agosto). Detidas 75 pessoas por tráfico de imigrantes chineses. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3366338&seccao=Euro pa (2013, 12 de julho). Desmantelada rede de prostituição. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3319496&seccao=Euro pa (2013, 13 de maio). Há mulheres a ser vendidas por 35 mil euros em Portugal. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/especiais/interior.aspx?content_id=3235008&especial=Revist as%20de%20Imprensa&seccao=TV%20e%20MEDIA (2013, 15 de maio). Autoridades encontram segunda “fábrica de bebés”. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3221064&seccao=%C3 %81frica&page=-1 Malström, C. (2013, 19 de abril). Tráfico de seres humanos na UE: momento de agir. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=3174585&page=-1 164

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Ferreira, A. (2013, 12 de fevereiro). Falta de condenações em Portugal preocupa Europa. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=3048559 (2013, 11 de fevereiro). “Verdes” propõem “rede pública de casas-abrigo”. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/Inicio/interior.aspx?content_id=3047510 (2013, 18 de janeiro). EUA resgatam 11 vítimas de tráfico sexual. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=3000238&seccao=EUA %20e%20Am%C3%A9ricas (2012, 24 de dezembro). Polícia chinesa salva 89 crianças e prende 355 pessoas. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=2963307&seccao=%C3 %81sia&page=-1 (2012, 7 de dezembro). Marido de Ágata suspeito de traficar jogadores menores. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/especiais/interior.aspx?content_id=2932982&especial=Revist as%20de%20Imprensa&seccao=TV%20e%20MDIA (2012, 7 de dezembro). Oito estrangeiros detidos no Baixo Alentejo. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2933588 (2012, 4 de dezembro). 59 Polícias presos por alegado envolvimento no tráfico. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=2926645&seccao=CPLP &page=-1 (2012, 29 de novembro). Sete detidos no caso do adolescente que vendeu rim. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/globo/interior.aspx?content_id=2917719&seccao=%C3 %81sia&page=-1 A.T. (2012, 24 de outubro). Casal acusado de tráfico de pessoas e escravidão absolvido. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2844387&seccao=N orte (2012, 23 de outubro). Decisão amanhã no caso do trabalho escravo. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2841435&seccao=N orte&page=-1 (2012, 16 de outubro). Detidos 16 estrangeiros suspeitos de tráfico de pessoas. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2832757&page=-1 Marcelino, V. (2012, 15 de outubro). Prisão preventiva para suspeitos de associação criminosa. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2831284 (2012, 12 de outubro). Trinta menores entregues a IPPS. Diário de Notícias. Acedido em http://www.dn.pt/inicio/portugal/interior.aspx?content_id=2826046&page=-1 165

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(2012, 18 de março). Rede de tráfico de mulheres começa a ser julgada segunda-feira no Algarve. Público. Acedido em http://www.publico.pt/sociedade/noticia/redede-trafico-de-mulheres-comeca-a-ser-julgada-segundafeira-no-algarve-1538394 Gomes, C. (2012, 22 de fevereiro). Emigrante português na Bélgica despejado numa ruela deserta até morrer. Público. Acedido em http://www.publico.pt/sociedade/noticia/emigrante-portugues-despejadonuma-ruela-deserta-ate-morrer-1534903#/0

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Apêndice IV: Lista de algumas ONG portuguesas

Associação para o Planeamento da Família (APF) A APF tem por objetivos fundamentais a promoção da Saúde, Educação e Direitos nas áreas da sexualidade e planeamento familiar para, e de acordo com os seus Estatutos, “ajudar as pessoas a fazerem escolhas livres e responsáveis na sua vida sexual e reprodutiva.” Rua Eça de Queiroz, 13, 1º 1050-095 Lisboa Telefone: 21 385 39 93 Fax: 21 388 73 79 http://www.apf.pt/apf.php?area=300

Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) é uma instituição particular de solidariedade social, pessoa coletiva de utilidade pública, que tem como objetivo estatutário promover e contribuir para a informação, proteção e apoio aos cidadãos vítimas de infrações penais. Serviços centrais de Sede Rua José Estêvão, 135 A, Pisos ½ 1150-201 Lisboa Telefone: 21 358 79 00 Fax: 21 887 63 51 Email: [email protected] http://apav.pt

Saúde em Português Saúde em Português é uma organização não-governamental para o Desenvolvimento e IPSS com sede internacional em Coimbra e tem por objetivo a promoção, a integração social e comunitária, a saúde, a igualdade de género, o desenvolvimento sustentável e os Direitos Humanos. Avenida Elísio de Moura, 417, 1ºE 3030-183 Coimbra Telefone: 23 970 27 23 Telemóvel: 96 009 29 89 Fax: 23 970 51 86 Email: [email protected] http://www.saudeportugues.org

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Oikos – Cooperação e Desenvolvimento Fundada em 23 de fevereiro de 1988, em Portugal, a Oikos – Cooperação e Desenvolvimento é uma associação sem fins lucrativos, reconhecida internacionalmente como Organização Não-Governamental para o Desenvolvimento (ONGD/INGO). A atividade encontra-se estruturada nas áreas da emergência/ação humanitária, desenvolvimento/vida sustentável e mobilização/cidadania global. Rua Visconde Moreira de Rey, 37 2790-447 Linda-a-Pastora Oeiras – Portugal Telefone: 21 882 36 30 Fax: 21 882 36 35 E-mail: [email protected] http://www.oikos.pt

Associação de Mulheres Contra a Violência (AMCV) A associação de Mulheres Contra a Violência é uma organização não-governamental, de utilidade pública, independente, laica e sem fins lucrativos, cujo objeto é a promoção dos Direitos das Mulheres, Jovens e Crianças, e o combate contra todas as formas de violência e discriminação. Telefone: 21 380 21 60 Fax: 21 380 21 38 Email.: [email protected] http://www.amcv.org.pt

UMAR – União de Mulheres Alternativa e Resposta A UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta - é uma associação de mulheres constituída em 12 de Setembro de 1976. Como Organização Não Governamental está representada no Conselho Consultivo da CIDM (Comissão para a Igualdade e Direitos das Mulheres) desde 1977. A UMAR é hoje uma associação que se reclama de um feminismo comprometido socialmente, empenhada em despertar a consciência feminista na sociedade portuguesa. Rua da Cozinha Económica, Bloco D, Espaços M e N, 1300-149 Lisboa Tel.: 00 351 218 873 005 Fax: 00 351 218 884 086 Email: [email protected] http://www.umarfeminismos.org

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Serviço Jesuíta aos Refugiados O Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS – Jesuit Refugee Service) é uma organização internacional da Igreja Católica, fundada em 1980, sob responsabilidade da Companhia de Jesus. O JRS tem como missão “Acompanhar, Servir e Defender” os refugiados, deslocados à força e todos os migrantes em situação de particular vulnerabilidade. Rua 8 ao Alto do Lumiar, Lote 59 1750-342 Lisboa Telefone: 21 7552790 Telemóvel: 93 7541620 http://www.jrsportugal.pt

Associação Nacional para a Acão Familiar (ANJAF) A ANJAF tem como objetivos de intervenção a realização de atividades que contribuam para promover a integração socioprofissional e o desenvolvimento sociocultural dos jovens em particular, e de todos os grupos expostos ou em situação de exclusão, com vista à promoção de coesão do tecido social. Rua do Salitre, 185, 1º Esq. 1250-199 Lisboa Telefone: 21 384 56 90 Fax: 21 386 77 75 E-mail: [email protected] http://www.anjaf.pt

Contactos apoio à vítima de Tráfico de Seres Humanos: 144 - Linha Nacional de Emergência Nacional 808 257 257 – Linha SOS Imigrante 964 608 288 – Centro de Acolhimento e Proteção a Vítimas de Tráfico do sexo feminino (24 h) – [email protected] 961 674 745 – Centro de Acolhimento e Proteção a Vítimas de Tráfico do sexo masculino (24 h) – [email protected]

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Lista das figuras, tabelas e gráficos

Figura 1

Cartaz do filme Inside of the white slave traffic (1913) Fonte: http://www.imdb.com/media/rm3541611776/tt0003016?ref_=tt_ov_i

Figura 2

“My God, if only I could get out of here” Fonte: Bell, 1910

Figura 3

“The first step” Fonte: Bell, 1910

Figura 4

“Dangerous amusements” Fonte: Bell, 1910

Figura 5

Os passos para atrair as jovens mulheres Fonte: Roe, 1910

Figura 6

From dance hall to white slavery Dillon & Lytle, 1912

Figura 7

Ernest Normand,1894, The white slave Fonte: http://www.maant.it/rimini/img_antiquari/phidias.jpg

Figura 8

História da prostituição em Portugal Fonte: Pessoa, 1887

Figura 9

José Malhoa, 1958, Fado Fonte: http://fadocravo.blogspot.pt/2011/04/fado-malhoaflorencia.html

Figura 10

(2012, 30 de outubro). Jovem que leiloou virgindade suspeita de prostituição. Jornal de Notícias. Fonte: http://www.jn.pt/PaginaInicial/Mundo/interior.aspx?content_id=2854 775&page=-1

Figura 11

(2012, 31 de outubro). Serrinha, D. G. Virgem será processada. Correio da Manhã. Fonte: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/internacional/mundo/virg em-sera-processada

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O Tráfico de Seres Humanos para Exploração Sexual

Figura 12

(2012, 17 de dezembro). Associações defendem que trabalho sexual deve ter enquadramento legal. Jornal de Notícias. Fonte: http://www.jn.pt/PaginaInicial/Sociedade/interior.aspx?content_id=29 52049&page=-1

Figura 13

(2013, 10 de novembro). Desmantelada rede criminosa que traficava mulheres. Correio da Manhã. Fonte: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/internacional/mundo/des mantelada-rede-criminosa-que-traficava-mulheres

Figura 14

(2013, 14 de dezembro). Português detido em Madrid por tráfico de seres humanos. Correio da Manhã. Fonte: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/portugal/portugu es-detido-em-madrid-por-trafico-de-seres-humanos

Figura 15

Gomes, R. P. & Griff, T. (2012, 19 de março). Rede de prostituição da EN125 em tribunal. Correio da Manhã. Fonte: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/portugal/redede-prostituicao-da-en125-em-tribunal

Figura 16

Pereira, A. (2013, 26 de setembro). Portugal tem 28 mil prostitutas”, Correio da Manhã. Fonte: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/portugal/portuga l-tem-28-mil-prostitutas

Tabela 1

Número de vítimas sinalizadas, confirmadas, não-confirmadas, casos pendentes e registos remetidos por ONG (2009-2013) Fonte: Dados estatísticos do SSI

Tabela 2

Nacionalidade das vítimas sinalizadas e das vítimas confirmadas (2009-2013) Fonte: Dados estatísticos do SSI.

Tabela 3

Grelha de leitura dos rumores Fonte: Reumaux, 1998, p. 15

Tabela 4

Peças por jornal analisadas por ano (2012 e 2013)

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Tabela 5

Tipo de peças (2012/2013)

Tabela 6

Distribuição geográfica das ações descritas (2012/2013)

Tabela 7

Frequência da nacionalidade dos suspeitos (2012/2013)

Tabela 8

Frequência da nacionalidade das vítimas (2012/2013)

Tabela 9

Enquadramento (2012/2013)

Tabela 10

TSH para exploração sexual: peças por jornal (2012/2013)

Tabela 11

TSH para exploração sexual: tipo de peças (2012/2013)

Tabela 12

TSH para exploração sexual: distribuição geográfica das ações descritas (2012/2013)

Tabela 13

TSH para exploração sexual: frequência da nacionalidade dos suspeitos (2012/2013)

Tabela 14

TSH para exploração sexual: frequência da nacionalidade das vítimas (2012/2013)

Tabela 15

TSH para exploração sexual: enquadramento (2012/2013)

Gráfico 1

Distribuição mensal das peças analisadas (2012/2013)

Gráfico 2

Frequência dos tipos de TSH relatados (2012/2013)

Gráfico 3

Frequência da nacionalidade dos suspeitos (2012/2013)

Gráfico 4

Frequência da nacionalidade das vítimas (2012/2013)

Gráfico 5

Frequência dos temas (2012/2013)

Gráfico 6

Argumentação (2012/2013)

Gráfico 7

Vozes (2012/213)

Gráfico 8

TSH para exploração sexual: frequência da nacionalidade dos suspeitos (2012/213)

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Gráfico 9

TSH para exploração sexual: frequência dos temas (2012/2013)

Gráfico 10

TSH para exploração sexual: argumentação (2012/2013)

Gráfico 11

TSH para exploração sexual: Vozes (2012/2013)

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