O Transbordamento do Conflito Interno Colombiano: a internacionalização da crise nas fronteiras com Venezuela e Brasil durante a gestão de Álvaro Uribe (2002 - 2010)

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM INTEGRAÇÃO DA AMÉRICA LATINA – PROLAM/USP

Tamiris Pereira dos Santos

O TRANSBORDAMENTO DO CONFLITO INTERNO COLOMBIANO: a internacionalização da crise nas fronteiras com Venezuela e Brasil durante a gestão de Álvaro Uribe (2002 – 2010)

São Paulo 2013

Tamiris Pereira dos Santos

O TRANSBORDAMENTO DO CONFLITO INTERNO COLOMBIANO: a internacionalização da crise nas fronteiras com Venezuela e Brasil durante a gestão de Álvaro Uribe (2002 – 2010)

Dissertação

apresentada

à

banca

examinadora como exigência parcial para obtenção do título de mestre pelo Programa de Pós-graduação em Integração

da

América

Latina



Prolam/USP.

Área de concentração: Práticas Políticas e Relações Internacionais

Orientador: Prof. Dr. Oliveira de Seixas

São Paulo 2013

Renato Bráz

- ESPAÇO RESERVADO PARA A FICHA CATALOGRÁFICA –

Tamiris Pereira dos Santos O TRANSBORDAMENTO DO CONFLITO INTERNO COLOMBIANO: a internacionalização da crise nas fronteiras com Venezuela e Brasil durante a gestão de Álvaro Uribe (2002 – 2010) Dissertação apresentada à banca examinadora como exigência parcial para obtenção do título de mestre pelo Programa de Pós-graduação em Integração da América Latina ― Prolam/USP. Área de concentração: Práticas Políticas e Relações Internacionais Orientador: Prof. Dr. Renato Bráz Oliveira de Seixas Aprovada em: _____/_____/______.

Banca Examinadora: Titulares:

_________________________________ Prof. Dr. Renato Bráz Oliveira de Seixas (PROLAM/USP) - orientador _________________________________ Prof. Dr. Pietro de Jesus Llora Alarcón (PUC/SP) _________________________________ Prof. Dr. Wanderley Messias da Costa (FFLCH/USP) Suplentes:

_____________________________ Prof. Dr. Wagner Tadeu Iglecias (PROLAM/USP) _____________________________ Prof. Dr. André Roberto Martin (FFLCH/USP) _______________________________ Prof. Dr. Rafael Antonio Duarte Villa (IRI/USP)

Agradecimentos

O presente trabalho foi fruto de muito empenho à revelia de diversos acontecimentos e obstáculos ocorridos em âmbito pessoal, alguns antes mesmo do início deste, mas que sem dúvidas tornaram esta jornada acadêmica em algo mais desafiador e gratificante. Gratificante, pois diversos momentos e pessoas tornaram a experiência ao longo do mestrado em uma etapa única e maravilhosa, e algumas delas, ademais de companheiras de jornada ou colegas, tenho o orgulho hoje de chamar de amigas. Portanto, gostaria de agradecer em primeiro lugar a Deus por me conferir a oportunidade de realizar mais coisas do que minha limitada imaginação poderia trazer aos meus pensamentos. Agradeço à Capes por financiar esta pesquisa, bem como os eventos para os quais fui em busca de aperfeiçoamento. À minha mãe, minha irmã Thaisa, à tia Lice e ao meu padrasto Marcos por toda a paciência, zelo e amor com o qual cuidaram e ainda cuidam de mim, fornecendo todo o suporte material e emocional para a superação das provações que se interpuseram em meu caminho. À Ninna e à Bijou pelo seu carinho incondicional. À amizade e à atenção dispensada pelo meu orientador e amigo prof. Dr. Renato Seixas, cuja paciência e dedicação se fizeram primordiais para a realização deste trabalho. Aos demais professores com os quais tive o prazer do convívio em aulas e frutíferas discussões, em especial ao prof. Dr. Wagner Tadeu Iglecias, prof. Dr. Wanderley Messias da Costa e prof. Dr. André Roberto Martin. A todos os amigos e companheiros de jornada que fiz no Prolam, no Departamento de Ciências Políticas, àqueles que me sequestraram para a área da Geopolítica no Departamento de Geografia e aos companheiros do Cenegri, em especial Vitor de Pieri, Charles Pennaforte, Fabiana Oliveira e Vinicius Teixeira. Aos meus amigos de faculdade, aos meus mestres, em especial ao prof. ms. Corival Carmo, ao prof. Dr. José Alexandre Hage, e às minhas sisters e pacientes revisoras textuais, Michele Mariano e Katiuscia Espósito. Às minhas “amigas – irmãs” Camila Andrade e Ianna Pedrazza (também à vó Nazaré e à Sandra Aguiar) pela gentil acolhida tanto em seus lares quanto em suas vidas, a todos os demais amigos pelas vibrações positivas e pelo apoio dispensado durante os momentos em que mais necessitei, em especial a Lilian Nagai, Alexandre Marques, e à gentil assessoria no âmbito emocional e de revisões textuais de Caio Pessôa – que apesar de ter ingressado há tão pouco tempo em minha vida, seguramente já tem feito toda a diferença.

Resumo

O presente trabalho de dissertação tem por objetivo demonstrar como o perdurar de litígios territoriais, institucionais, políticos e sociais formaram a base do conflito interno colombiano e seu transbordamento posteriormente, engendrando a regionalização desta problemática e de seus efeitos, e dando origem a instabilidades internacionais. Segmentado em ambientações, breves recorrências a aspectos históricos e análises comparativas e em perspectiva, este trabalho demonstra o transbordamento do conflito colombiano a partir de sua conformação fronteiriça – com foco para Venezuela e Brasil – e interventiva, mediante balanço da influência estadunidense na região, lançando luzes às raízes do conflito armado através de aportes provenientes dos estudos de Relações Internacionais, Geopolítica e Sociologia. Mediante este tripé metodológico, pretende-se promover uma visão interdisciplinar, primando por uma análise aproximada da questão em suas peculiaridades.

Palavras-chave: Conflito colombiano, Transbordamento, Venezuela, Brasil, Estudo interdisciplinar

Resumen

La presente tesis de maestria tiene por objetivo demostrar como la perduración de litígios territoriales, institucionales, políticos y sociales han formado las basis del conflicto interno colombiano y su desbordamiento posteriormente, engendrando la regionalización de esta problemática y de sus efectos, y dando orígen a instabilidades internacionales. Dividido en ambientaciones, breves recorrencias a aspectos históricos y análisis comparativas y en perspectiva, esta tesis demuestra el desbordamiento del conflicto colombiano de acuerdo con su conformación fronteiriza – centrándose en Venezuela y Brasil – y interventiva, por medio de un balanzo de la influencia ón los EEUU en la región, aclarando las raíces del conflicto armado a través de aportes de los estudios de Relaciones Internacionales, Geopolítica y Sociología. Por medio de este “trípode metodológico”, pretende-se promover una visión interdisciplinaria, tornando sobresaliente una análisis cercana a la cuestión en sus peculiaridades.

Palabras-clave: Conflicto colombiano, Desbordamiento, Venezuela, Brasil, Estudio interdisciplinario

Abstract

The present paper aims to demonstrate how the persistance of territorial, institutional, political and social disputes constituted the basis for Colombian internal conflict and its overflow after, engendering the regionalization from these issues and its effects, and also providing international instabilities. Sectioned in ambiances, brief recurrences to historical aspects as well as comparative and perspective analysis, this paper demonstrates colombian conflict overflow according to its borderer frame – focusing on Venezuela and Brazil – and interventive frame, by a balance of USA influence on region, clarifying the armed conflict roots through International Relations, Geopolitics and Sociology contributions. By this “metodological tripod”, this paper intends to promote an interdisciplinary view, highlightening a closer analysis on the referred issue peculiarities.

Keywords: Colombian conflict, Overflow, Venezuela, Brazil, Interdisciplinary Study

Lista de ilustrações

Figura 1 - Mapa Físico-Político da Colômbia...................................................................................... 22 Figura 2 - Mapa da densidade demográfica colombiana ..................................................................... 23 Figura 3 - Mapa da Distribuição da População Rural Colombiana ..................................................... 24 Figura 4 - Interdisciplinaridade: conceitos interseccionais de RI e Geopolítica ................................... 43 Figura 5 - Esboço esquemático acerca das providências tomadas durante a gestão Uribe quanto ao paralelismo estatal ............................................................................................................................. 101 Figura 6 - Territorialização da paraestatalidade ................................................................................ 116 Figura 7 - Interligação das dimensões do conflito colombiano .......................................................... 128

Lista de tabelas e quadros

Tabela 1- População total .................................................................................................................... 27 Tabela 2 - Estimativas de Desabrigados na Colômbia .......................................................................... 27 Tabela 3 - Produto Interno Bruto (em US$)......................................................................................... 28 Tabela 4 - Forças Militares Regulares ................................................................................................. 29 Tabela 5 - Percentual do PIB direcionado aos Gastos Militares* ........................................................ 29 Tabela 6 - COMPARAÇÃO PARADIGMÁTICA – Realismo, Liberalismo e Pós-internacionalismo ... 50 Tabela 7 - Ciclo de protestos e terrorismo: diferenças e aproximações com a insurgência ................... 82 Tabela 8 - Níveis de negociação dentro do conflito armado ................................................................. 90 Tabela 9 - Comparativo das estratégias governamentais adotadas quanto ao ambiente de negociação com a insurgência................................................................................................................................ 92 Tabela 10 - Assassinatos políticos anuais na Colômbia e percentual de autoria ................................ 112 Tabela 11 - Compreensão geral acerca do contexto da crise de 2008 – intervenção no Equador ....... 124 Tabela 12 - Principais aspectos observados como pano de fundo para o transbordamento do conflito colombiano no âmbito do marco interventivo .................................................................................... 130 Tabela 13 - Principais aspectos observados como pano de fundo para o transbordamento do conflito colombiano no âmbito do marco fronteiriço ...................................................................................... 131 Tabela 14 - Comparativo das Relações e Políticas adotadas por Brasil e Venezuela ante o conflito colombiano e a crise de 2008 ............................................................................................................. 147 Tabela 15 - Fatores que contribuíram para aumento ou diminuição dos efeitos do conflito colombiano .......................................................................................................................................................... 159 Tabela 16 - Balanço de assertividade quanto às práticas contrainsurgentes ...................................... 164 Tabela 17 - Desafios e considerações à Prosperidad Democrática do governo Santos ....................... 172

Anexos Anexo 1- LISTAGEM DE PRESIDENTES DA COLÔMBIA (1814 – 2011)* ................................... 193 Anexo 2 - OS CEM PONTOS DE URIBE – MANIFESTO DEMOCRÁTICO .................................. 197 Anexo 3 - Discurso de Posse da Presidência da República de Álvaro Uribe Vélez (07/08/2002) ......... 216 Anexo 4 - Discurso de Posse da Presidência da República de Juan Manuel Santos Calderón (07/08/2010)....................................................................................................................................... 222 Anexo 5 - Conteúdo selecionado do períodico opinativo "Un Pasquín", acerca das eleições de 2010 235 Anexo 6 Notícias da Agência de Imprensa do Governo colombiano .................................................. 238

Lista de abreviaturas e siglas

AFEAUR

Agrupación de Fuerzas Especiales Antiterroristas Urbanas

ANAPO

Alianza Nacional Popular

AUC

Autodefensas Unidas Colombia

BACRIM

Bandos criminales a servicio del narcotráfico

CDS/CSAD

Conselho de Defesa Sul Americano

COMBIFRON Comisión Binacional Fronteiriza COPIAF

Comisión Presidencial de Integración y Asuntos Fronteirizos ColomboVenezolanos

DAS

Departamento Administrativo de Seguridad

END

Estrategia Nacional de Defesa

ELN

Exército de Libertação Nacional

ELN - UC

Exército de Libertação Nacional – União Camilista

EPL

Exército Popular de Libertação

FARC

Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia

FARC – EP

Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército Popular

FFCS

Fragile, failed or collapsed states

IIIRSA

Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul Americana

LASO

Latin America Security Operation

M-19

Movimento 19 de abril

MAS

Muerte a Secuestradores

MAQL

Movimento Armado Quintín Lame

MERCOSUL

Mercado Comum do Sul

OEA

Organização dos Estados Americanos

ONG

Organização Não - Governamental

ONU

Organização das Nações Unidas

OTCA

Organização do Tratado de Cooperação Amazônica

PSDD

Política de Segurança e Defesa Democrática

RI

Relações Internacionais

SI

Sistema Internacional

SIVAM

Sistema de Vigilância da Amazônia

UNASUL

União das Nações Sul Americanas

Sumário INTRODUÇÃO

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AMBIENTAÇÕES 21 COLOMBIANIDADES – COLÔMBIA E SUAS PECULIARIDADES 22 MEIO SÉCULO DE CONFLITO - CONTEXTUALIZANDO O ESTADO COLOMBIANO E AS DIMENSÕES PARA A INSTAURAÇÃO DO CONFLITO 30 A DIMENSÃO FUNDIÁRIA: BREVES QUESTÕES SOBRE O CLIENTELISMO E AS DESIGUALDADES DESDE A OCUPAÇÃO ESPANHOLA 31 A DIMENSÃO GEOGRÁFICA: O FRACIONAMENTO DO TERRITÓRIO COLOMBIANO 33 A DIMENSÃO NORMATIVA: A SEGMENTAÇÃO SOCIAL E A RELATIVIZAÇÃO DAS NORMAS 34 A DIMENSÃO POLÍTICA: BIPARTIDARISMO, REPRESSÃO E A ALTERNATIVA INSURGENTE 35 DELIMITANDO O OLHAR SOBRE O CONFLITO: UMA AMBIENTAÇÃO TEÓRICOMETODOLÓGICA. 41 AS RI E A GEOPOLÍTICA: DETECTANDO AS INTERSECÇÕES CONCEITUAIS E PRIMANDO PELA INTERDISCIPLINARIDADE 41 APRESENTANDO OS CONCEITOS DE ESTADO MODERNO, SOBERANIA E TERRITÓRIO 43 AS APROXIMAÇÕES DE JAMES N. ROSENAU E JOHN AGNEW 48 BREVE CONSIDERAÇÃO SOBRE A QUESTÃO DA VIOLÊNCIA – O ASPECTO SOCIOLÓGICO 56 BREVE HISTÓRICO DA CONFIGURAÇÃO DO CONFLITO E DOS VETORES PARA A INTERNACIONALIZAÇÃO 58 BIPARTIDARISMO, REPRESSÃO E INSURGÊNCIA: COMO FOI DADO O ESPAÇO PARA O SURGIMENTO DE ALTERNATIVAS ÀS VIAS INSTITUCIONAIS COLOMBIANAS 58 OS GRUPOS GUERRILHEIROS, PARAMILITARES E OS ESPAÇOS VAZIOS: O PARALELISMO ESTATAL INSTAURADO NA COLÔMBIA 63 TERRORISMO OU INSURGÊNCIA? 78 VIOLÊNCIA, NARCOTRÁFICO E O CONFLITO COLOMBIANO 85 A ESCALADA DO CONFLITO COLOMBIANO E A ASCENSÃO DE ÁLVARO URIBE 88 NEGOCIAÇÃO, INSURGÊNCIA E O COMBATE ÀS DROGAS: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE GOVERNOS E CONTEXTOS QUE ANTECEDERAM A GESTÃO URIBE 89 ÁLVARO URIBE E O PROJETO DE CENTRALIZAÇÃO: INSTAURANDO A CRUZADA CONTRA O TERROR MEDIANTE A BELIGERÂNCIA DE ESTADO 98 A POLÍTICA DE SEGURIDAD Y DEFENSA DEMOCRÁTICA: ESFORÇOS PELA PAZ MEDIANTE A BELIGERÂNCIA 103 AS COMPONENTES DE BELIGERÂNCIA DA PSDD E O PLANO PATRIOTA: A DEMOCRACIA PELA VIA ARMADA 109 LEY DE JUSTICIA Y PAZ: REFLEXOS DE UMA POLÍTICA PAUTADA POR ASSIMETRIAS DE APLICAÇÃO 118 A INTERVENÇÃO NO EQUADOR COMO UM INDÍCIO PRONUNCIADO DO TRANSBORDAMENTO DO CONFLITO COLOMBIANO 123 BRASIL, VENEZUELA E A QUESTÃO COLOMBIANA – respostas políticas ao transbordamento do conflito e suas complexidades 129

UM DELINEAR METODOLÓGICO ACERCA DO TRANSBORDAMENTO DO CONFLITO COLOMBIANO: BREVES APROXIMAÇÕES SOBRE OS MARCOS INTERVENTIVO E FRONTEIRIÇO DO FENÔMENO 130 BRASIL E VENEZUELA: DUAS RESPOSTAS POLÍTICAS DIFERENCIADAS FACE AO TRANSBORDAMENTO DO CONFLITO COLOMBIANO 143 RUMO A RESOLUÇÕES DO CONFLITO COLOMBIANO E SEUS DESDOBRAMENTOS: CONSIDERAÇÕES E ALGUMAS REFLEXÕES 162 GOVERNO SANTOS – REMISSÃO DE EQUÍVOCOS ANTERIORES E NOVAS PERSPECTIVAS? 167 O ALVORECER DA CAPITULAÇÃO DA VIOLÊNCIA NA HISTÓRIA COLOMBIANA: considerações finais, perspectivas e desafios

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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INTRODUÇÃO

O estudo da temática a ser contextualizada ao longo da presente introdução torna-se pertinente por retratar uma questão contemporânea, a qual remonta a problemas institucionais e sociais dentro do território colombiano.Gestados desde antes da instituição da República da Colômbia e em expansão dentro do marco temporal de 2002 a 2010, tais problemas atingiram proporções internacionais, ampliando o escopo de seus efeitos. Neste sentido, o presente trabalho consistirá em um esforço analítico em torno do transbordamento do conflito colombiano para as regiões limítrofes com a Venezuela e o Brasil durante a gestão de Álvaro Uribe, ilustrando o viés doméstico quanto ao desenvolvimento do fenômeno, bem como seus efeitos e algumas perspectivas. Contextualizando, em meio século de conflito e ao menos sessenta anos de questões relativas à representatividade e reflexos das demandas sociais em políticas públicas, o Estado colombiano apresenta períodos de abertura e fechamento político, denotando diferentes orientações em relação à sociedade e suas demandas. A partir da década de 1980, apresentaram-se distinções nos ambientes de negociação com os grupos dissidentes constituídos por guerrilhas e grupos paramilitares – contextualmente relacionadas às políticas de segurança instauradas pelo Estado: ora aproximando, ora afastando a sociedade colombiana da paz na região. Dentro deste cenário pendular de aproximação e afastamento da paz, o suscitar de questionamentos oriundos da sociedade civil em conjunto com revoltas populares violentamente reprimidas atribuem um carábter tradicional ao conflito colombiano, dado que estas remontam período anterior ao surgimento dos grupos guerrilheiros – ou grupos insurgentes - e paramilitares, tidos como revolucionários esquerdistas no período pós Segunda Guerra Mundial. O atribuído caráter tradicional se dá ao passo que existem elementos imersos no conflito colombiano oriundos de longa data e persistentes na contemporaneidade; ou seja, conforme Velásquez (2011) a violência pode ser caracterizada como uma constante na história política colombiana desde as guerras civis do século XIX e atualmente é visualizada no conflito, composto pelas organizações armadas. Adicionalmente, conforme Cano (2000), nos últimos 150 anos houve um aumento da violência interna na Colômbia. Neste sentido, pretende-se analisar o aumento das dimensões da violência como componente tradicional não aludindo a priori os aumentos contingenciais (relativos aos atores). O aumento da violência interna no Estado colombiano habita, antes do âmbito empírico, o âmbito dimensional, visto que os efeitos veiculados pelo conflito armado foram estendidos a todas as

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esferas que participam deste cenário retratado historicamente – desde a sociedade em âmbito doméstico até atingir o envolvimento de esferas internacionais. Em suma, a dinâmica que se pretende ilustrar neste trabalho seria a internacionalização da crise colombiana através do transbordamento do conflito, o qual se dá tanto através dos atores armados e sua mobilidade transfronteiriça, quanto pela intervenção política proveniente dos EUA. Logo, para fins de melhor compreensão, foi feita uma divisão em dois marcos para o fenômeno do transbordamento: fronteiriço – cuja crise mais expressiva se deu numa escalada de conflito entre Colômbia e Venezuela a partir da intervenção no Equador dada em 2008 – e o intitulado de interventivo – dado através dos pacotes de auxílio financeiro e militar provenientes dos Estados Unidos1, promovendo expansão das táticas de combate ao narcoterrorismo2. Tendo em vista todas as questões apresentadas, a hipótese principal é que conjunção dos dois processos de transbordamento apresentados se traduz em entraves aos projetos de integração regional, ao mesmo passo que constitui catalisadores de outros processos como a instituição do Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS), o qual visa ao concerto regional no âmbito de defesa, segurança internacional e combate à intervenção. Antes de explicitar a seara das consequências do transbordamento nos marcos previamente apresentados, se faz necessária uma breve retrospectiva do conflito colombiano em nível doméstico. Considerando a questão da violência como elemento tradicional, a aparente falta de capacidade do Estado colombiano em gerir problemas domésticos emerge como elemento que transformou o conflito entre organizações insurgentes e Estado em um mecanismo substituto da política, caracterizando o pleito por mudanças sociais no armamentismo. Esta querela de natureza política consiste em um traço que persistiu na contemporaneidade, embora seus prenúncios datem da ocupação espanhola - período em que houve o lançamento das bases de desigualdade na estrutura fundiária dada aconcentração de propriedades por parte dos terratenientes3 – registrando ocorrência e persistência da falta de costura da malha territorial colombiana. Logo, observa-se abertura de possibilidades para a subsistência de problemáticas institucionais, culminando no conflito armado (HAGE, 2008). Ademais, com o aumento da insurgência 4, a fragilidade do Estado em afirmar sua soberania 1

Alusão ao Plano Colômbia. Associação dos termos narcotráfico e terrorismo utilizada para designar as atividades de grupos guerrilheiros, tidos como ameaças e alvos de erradicação nos termos da PSDD. 3 Remete aos proprietários de terras. 4 Convém elucidar que o referido termo, a ser discricionado ao longo do presente trabalho, refere-se explicitamente aos grupos guerrilheiros, visto que a contrainsurgência é representada tanto pelas Forças oficiais colombianas quanto pelas forças extra-oficiais (grupos paramilitares). A serem mais explicitados com o prosseguir do trabalho, os referidos grupos constituíram em mais um braço armado do estado a partir da estrutura de bandoleirismo social instaurada a partir da década de 1960. 2

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interna ficou em evidência, resultando nos fenômenos “subgrupismo ”5, abordado por Rosenau e Durfee (2000), e sobreposição de territorialidades6, abordado por Agnew e Oslender (2010) – ambas as dinâmicas representantes de fragmentações de ordem social, institucional e territorial, constituintes da base metodológica deste trabalho. Primando pela análise interdisciplinar e por instrumentos que permitam uma melhor ilustração do objeto de estudos no contexto das fragmentações apresentadas, pretende-se tecer análises e considerações que compreendam a intersecção conceitual existente entre os estudos de Relações Internacionais e Geopolítica - através dos conceitos de Estado, soberania e território – visando sistematizar a dinâmica expressa pelo conflito colombiano de forma inteligível. Em retorno à contextualização das problemáticas, quanto à esfera político-social, foram conquistados direitos trabalhistas dentro do contexto das reformas sociais concretizadas pelo governo, sob a gestão liberal entre 1930 e 1946 (CANO, 2002). A partir da derrota do Partido Liberal nas eleições de 1946, deu-se início à gestão do Partido Conservador, marcada pela repressão notadamente em 1948, no conflito denominado El Bogotazo7. Apesar da repressão e do revezamento dos Partidos Liberal e Conservador no poder, caracterizando a exclusão de alternativas de expressão nacional legais perante as disputas políticas, o Estado colombiano passou por um processo de acelerada urbanização e industrialização, embora o aumento de pressões por parte da sociedade ainda denunciavam demandas não atendidas a parcelas significativas desta. Repressões em um passado recente e episódios como o Bogotazo deixaram fortes marcas no Estado, cujos efeitos se traduzem no movimento das guerrilhas e nas práticas paramilitares contemporâneas. Desta forma, a permanência do estado de carestia social 8 e o insulamento do Estado a partir da ausência de mecanismos de representação das demandas sociais também constituíram ambiente próspero para o nascimento e fortalecimento de movimentos de insurgentes9, ampliando o escopo de desafios para o Estado colombiano gerir o conflito que

O fenômeno do “subgrupismo” é compreendido como uma decorrência das afinidades desenvolvidas pelos indivíduos sobre associações próximas, organizações e subculturas em que eles estejam conectados de maneira histórica, social, cultural, econômica ou política e, em que depositem suas prioridades (ROSpENAU, 2000). 6 Remete à intersecção de autoridades presentes dentro de um Estado, fenômeno a ser discutido mais amplamente de forma metodológica pelo geopolítico. 7 Revolta sociopolítica ocorrida em 1948, após o assassinato do líder populista Gaitán (HYLTON, 2009), a qual intensificou os conflitos e repressões do período conhecido como La violencia. 8 Equivalente a demandas sociais não atendidas, o termo é mais amplamente explorado por Estrada (2009), analisando a questão colombiana sob o prisma da psicologia social. 9 Tal como o termo empregado nos discursos governamentais, equiparando os movimentos insurgentes a terroristas, a definição precisa de ambos termos é norteada por imprecisões conceituais, as quais serão problematizadas no próximo capítulo. Para o momento, entenda-se que movimento insurgente visa a 5

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adquiria proporções ascendentes. O surgimento das guerrilhas colombianas na década de 1960 e a renovação das atividades destes grupos, em período próximo a 1980, constituíram em um extravasamento das disputas políticas para o âmbito armado, contando com estratégias de caráter mais ofensivo por parte das FARC-EP10 e da ELN-UC11 - as quais, desdobrando suas frentes e disseminando-se pelo território, diversificavam seus financiamentos e irrompiam em grandes centros urbanos a fim de criar condições propícias para uma insurreição popular (LAIR, 2001). Contextualizado o processo de substituição da política pelo conflito armado, o fracasso de ações políticas pelos dirigentes colombianos visando implementar ambientes de negociação com os grupos dissidentes torna-se evidente, imbuindo aos discursos governamentais tons acusatórios a apenas uma das partes envolvidas nesta complexa problemática: os grupos guerrilheiros - associados aos fenômenos do narcotráfico e do terrorismo mediante a escalada de beligerância da política de segurança colombiana. Os referidos grupos, antes de consistirem em um arranjo institucional alternativo ao Estado colombiano, constituem uma componente de instabilidade na governabilidade doméstica, na medida em que arrogam para si um símbolo de resistência, subordinando a insurgência aos movimentos de minifundiários e operários rurais na perpetuação das lutas agrárias do passado colombiano (HYLTON, 2009). Logo, a questão está calcada em grupos com carga reivindicatória e não o desmantelamento do Estado colombiano como ente institucional apesar das fragilidades previamente discutidas (RESTREPO, 1988). Equiparados a ameaças conforme a interpretação governamental, os grupos dissidentes colombianos em geral tiveram como legado a vilania, traduzida no binômio legitimidadeilegitimidade, com a compreensão tolhida para as dinâmicas empreendidas em regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos, isto é, espaços carentes da função estatal (ESTRADA, 2009). Instaura-se uma dinâmica de menor conhecimento específico do outro - o qual pode ser um cidadão da zona urbana, rural, ou membro de grupo insurgente – fomentando um predomínio de visões estereotipadas ou preconceituosas em um ambiente de desconfiança, temor e senso comum, faces que moldaram e ainda moldam a colombianidade. Dentro deste cenário de diversidades e adversidades, coexistem um arranjo institucional instável – o Estado colombiano – grupos dissidentes com carga simbólica reivindicatória e uma sociedade acuada pela dinâmica pendular de aproximações e retrocessos no processo de instauração da paz, modificação do status quo vigente ou de estruturas políticas, valendo-se do emprego da violência através das guerras de guerrilha, por exemplo (VISACRO, 2009). 10 Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia – Ejército del Pueblo. 11 Ejército de Libertación Nacional – Unión Camilista.

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dadas as intermitências políticas na segurança do Estado. Resgatadas as principais questões contextuais do Estado colombiano e da situação de conflito que adquiriu feições que transcenderam fronteiras, o objetivo deste trabalho é analisar o transbordamento do conflito colombiano de forma doméstica, perpassando por quatros dimensões históricas de fragmentação do Estado colombiano: geográfica, fundiária, política e normativa, a fim de tecer bases analíticas desde as origens do conflito. Mediante a aplicação da interdisciplinaridade, nos âmbitos previamente discutidos, e contando com visões da Colômbia partindo de si mesma - mediante contribuições de autores colombianos e documentos oficiais - pretende-se fornecer parâmetros de ambientação do contexto do conflito doméstico instaurado e da metodologia que permeará as análises. Para a viabilização do mencionado, serão apresentados primeiramente os componentes que caracterizam a colombianidade - algumas peculiaridades de um Estado-nação assolado pela violência de um duradouro conflito armado – elencados em um breve panorama do conflito e seus vetores. Centralizando aspectos do conflito colombiano e alguns de seus desdobramentos em cada dimensão apresentada, será analisado o pano de fundo para a internacionalização da crise colombiana, dada através do transbordamento nos marcos previamente apresentados. Vale ressaltar que as referidas dimensões se dão de forma progressiva, nos permitindo transmiti-las no formato de um breve histórico. Logo, ilustrando como o conflito colombiano progrediu de dimensões internas atingindo o transbordamento, foram relacionadas hipoteticamente que fragmentações internas de ordem geográfica, política, infraestrutural e normativa, refletidas em diversas espécies de assimetrias dentro do Estado, consistiram nos principais fatores que impulsionaram o fenômeno supracitado, perpassando primeiramente pela dimensão geográfica, a qual influenciou em parte a ocupação assimétrica do território colombiano conforme variações do relevo andino. Conduzindo das dimensões/fragmentações previamente mencionadas para o marco temporal específico do objeto de estudo (2002-2010), serão conduzidas observações acerca das consequências do transbordamento do conflito, através das alterações de políticas de segurança, ambientes e mecanismos de conversação com os grupos dissidentes. De modo especial, haverá maior atenção às políticas paradigmáticas adotadas a partir da ascensão de Uribe ao poder executivo colombiano – contextualizando brevemente a chegada de um membro de oligarquia não tradicional ao poder e as consequências internas desta “virada à direita”. Transformando o Estado colombiano em um reflexo das políticas estadunidenses a

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partir do Plano Colômbia 12, Uribe intensificou um processo de transformação nas fronteiras colombianas em palcos de conflitos armados, alterando significativamente a percepção dos países vizinhos mediante o transbordamento colombiano, evidenciando os dois marcos do fenômeno em diferentes desdobramentos a serem analisados. Por fim, o trabalho apresentará análises dos efeitos do transbordamento nas fronteiras brasileiras e venezuelanas a partir de 2008, buscando compreender as dinâmicas em voga a partir da escalada de tensões instaurada em suas complexidades que ultrapassaram a seara doméstica, bem como as posturas adotadas pelos Estados – divididas entre uma escalada da belicosidade por parte do Estado Venezuelano e posturas oscilantes entre o envolvimento direto e o distanciamento do conflito por parte do Estado Brasileiro - dentro do referido marco temporal. O encerramento das análises consistirá em breves considerações acerca do Estado colombiano em perspectiva, abarcando questões quanto a fatos recentes da gestão de Juan Manuel Santos e questões como integração regional e prospecção de paz desde o âmbito doméstico. Quanto ao marco temporal delimitado, o período entre 2002 e 2010, ademais de consistir em um novo paradigma para a segurança pública colombiana, abarcou questões clássicas presentes nos estudos de relações interestatais como soberania, divergência de interesses, intervenção e a questão da violência. A última, em especial, traz proposições bastante específicas e sua discussão se faz fundamental para fins de contextualização e análise qualitativa do conflito colombiano fora do âmbito dos “lugares comuns”. Além disso, quando observada mediante uma proposta interdisciplinar, a questão da violência amplia a gama de discussões em seu entorno. Em um período de aprofundamento de relações entre Estados vizinhos consolidadas mediante os projetos de integração regional em âmbito latinoamericano e sul-americano, ampliar a compreensão acerca de um dos mais tradicionais focos de tensão à vizinhança constitui um passo necessário para uma aproximação cada vez maior do ideal da estabilidade e da projeção meridional no escopo internacional.

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Plano de financiamento para erradicação do narcotráfico instaurado durante o governo de Andrés Pastrana (1998-2002) em conjunto com a iniciativa de criar zonas desmilitarizadas para negociações com os grupos guerrilheiros, intitulada Cambio para Construir la Paz (SANTOS, 2011).

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AMBIENTAÇÕES

À primeira vista, deparando-se com a questão do conflito colombiano, ainda em voga na atualidade, diversos conceitos ou mesmo rótulos são construídos e difundidos pelos mais diversos meios de comunicação, nos expondo, através de uma relação praticamente instantânea, algumas consequências do referido conflito e, em seguida, a emissão dos pareceres políticos acerca deste. Entretanto, trata-se de algo que ultrapassa a questão pontual, advogada pelos discursos dentro e fora da seara midiática. Consiste em um arranjo político geograficamente localizado que é palco de um duradouro conflito civil, cujas consequências convergem em uma sociedade que floresce em meio às armas, às mortes e ao medo. Esta é uma das faces fundamentais para que a análise da questão colombiana não seja conduzida pelas veredas dos lugares comuns. Neste sentido, partindo de ambientações preliminares para contemporizar as análises posteriores, a primeira parte deste capítulo se destina a contemplar os aspectos peculiares da Colômbia, tais como dados gerais sobre geografia física, demografia, economia, geografia política e, em principal, como estes elementos em conjunto com questões contextuais forjaram a identidade cultural colombiana, fornecendo uma visão panorâmica acerca dos referidos aspectos. A segunda parte tratará dos aspectos que fomentaram os 50 anos de conflito interno e que, posteriormente, delinearam os prenúncios para a internacionalização da crise colombiana. Por fim, o encerramento das ambientações compreenderá a justificativa metodológica, apresentando a abordagem interdisciplinar como instrumento das análises a serem desenvolvidas ao longo do trabalho, as quais tramitarão nas intersecções conceituais das Relações Internacionais e da Geopolítica.

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Colombianidades – Colômbia e suas peculiaridades Contando com um vasto território compreendido na porção nor-ocidental do subcontinente sul americano, a Colômbia está estrategicamente localizada por constar com uma longitude de aproximadamente 2.490 quilômetros no Oceano Atlântico e 2.394 quilômetros no Oceano Pacífico. Grande em extensão, o Estado colombiano enfrenta infortúnios na questão do litígio territorial – a “verdadeira Colômbia”, segundo Réclus (1893), consiste em apenas metade dos 1.250.000 quilômetros quadrados de extensão, desde o ponto de vista da geografia física, equivalendo às intermitências das cadeias andinas em conjunto com os vales intermediários, conforme a figura a seguir.

Figura 1 - Mapa Físico-Político da Colômbia13

13

Mapa Disponível em http://www.colombiaya.com/seccion-colombia/mapas.html

23

Em comparação com a Figura 1 e fazendo alusão ao mencionado acerca da “verdadeira Colômbia”, pode-se observar na figura a seguir uma ocupação humana não homogênea e pautada nos “ditames” do relevo andino, apresentando um expressivo vazio demográfico na porção da planície amazônica e maior concentração demográfica distribuída entre vales e médias altitudes, onde estão localizados os grandes centros urbanos.

Figura 2 - Mapa da densidade demográfica colombiana 14

Complementando o mapa anterior, apresentado na Figura 2, o mapa abaixo demonstra a distribuição da população rural no território colombiano, no qual se observa presença maior

14

Mapa Disponível em http://www.dnp.gov.co

24

em localidades de densidades populacionais médias e uma penetração maior nas áreas de planícies em comparação com o mapa apresentado anteriormente. Figura 3 - Mapa da Distribuição da População Rural Colombiana 15

Em comparação aos três mapas demonstrados, pode-se verificar que as possibilidades de ocupação do território já se viam tolhidas, seja pelas cadeias andinas em suas altitudes 15

Mapa Disponível em http://geoportal.igac.gov.co

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consideráveis, seja pela grande presença amazônica, legando ao Estado colombiano assimetrias demográficas desde a época colonial. Outra herança do período mencionado seria a estrutura de propriedade de terras ainda vigente, concentrando-as no entorno das cidades e nas mãos de uma população mestiça sem lugar definido na hierarquia social àquele tempo (GONZÁLEZ, 1999), dispersando um pouco mais a população camponesa pelas áreas de menor concentração demográfica.

Aliadas tais considerações, estão lançadas algumas bases

para as fragmentações que permeiam o Estado colombiano, a serem tratadas adiante. Para o momento, convém ressaltar que as referidas assimetrias reproduziram uma modalidade espacial e territorial diferenciada na Colômbia, posto que, segundo Vargas (2012), espaço é resultado das interações sociais e território, uma delimitação do espaço que permite a materialização das relações sociais contando com especificidades. Portanto, a fim de compreender as dinâmicas territoriais colombianas, é preciso se assimilar, primeiramente, as interações específicas e localizadas, engendrando um movimento convivência com as diferenças/peculiaridades, “abrindo portas” para a dinâmica da “reterritorialização”, mediante imposição de limites dentro do território do Estado-nação (AGNEW; OSLENDER, 2010). Outra questão que problematiza ao entendimento em torno destas dinâmicas é a própria alteração paradigmática do conceito de Estado ante o fenômeno da globalização, produzindo alterações na dinâmica identitária no que tangencia a sensação de pertencimento e cidadania. Conforme Castells (1999), o esvaziamento do conteúdo histórico de instituições como o Estado-nação suscita a primazia de uma identidade pessoal, individualista, debilitando o princípio da cidadania como processo que incide na sociedade a partir do Estado, conferindo novas variáveis na relação entre Estado e sociedade civil. Esta nova característica vai despontar tanto para a sensação de pertencimento em nível local, dada à falta de uma unidade nacional, quanto para questões mais complexas e peculiares ao próprio conflito como o recurso à violência, a ser tratado no próximo capítulo. O que convém ressaltar para o momento é justamente a alteração nas relações entre Estado e sociedade civil, donde o enfraquecimento do Estado-nação e da incidência da cidadania é observado devido à prioridade conferida pelo Estado aos novos fluxos que permeiam o Sistema Internacional (SI) (CASTELLS, 1999), propiciando tendências à fragmentação no âmbito doméstico e à reorientação de lealdades para o horizonte local - questão que também será tratada com mais afinco adiante. Após estes breves parênteses, retomando à questão da presença amazônica, bem como os vazios demográficos observados nas Figuras 2 e 3, convém ressaltar uma questão doméstica passível de problematizações: a “interdição” dos territórios de floresta ao Estado

26

colombiano, caracterizada pela ausência de projetos que integrassem estas regiões às demais e pela consequente ocupação destes territórios por comunidades indígenas e famílias camponesas que sobrevivem da economia tradicional, configurando uma querela territorial que ocorre paripassu aos embates do conflito armado. A exploração de petróleo no departamento de Arauca por empresas transnacionais, obrigando populações indígenas a migrações forçadas para o território venezuelano e aumentando as estatísticas quanto ao número de desabrigados (FLORES; RIVERA, 2011), consiste em uma das situações que ilustram a querela territorial mencionada. Outra faceta desta problemática surge na forma de resistência à “ocupação” destes territórios pelo Estado à revelia da população, traduzida em foros de discussão abertos, manifestações, entre outras formas possibilitadas pelos meios de comunicação, trazendo à baila os impactos e transformações compulsórias que megaprojetos mineiros causam no interior de comunidades de economia tradicional que habitam as regiões de Antioquia, Cauca, Chocó, Caldas, Nariño, Meta, Santander, Norte de Santander, Tolima, Boyacá,

Cesar,

Guajira,

Cundinamarca,

Valle

del

Cauca

(ENCUENTRO

LATINOAMERICANO MUJER Y MINERÍA, 2011), expressando rejeições à imposição do progresso à revelia do meio ambiente, das tradições e do direito à terra reivindicado por estas comunidades que também constituem a Colômbia, um Estado multicultural e com direitos à diversidade resguardados na Carta Constitucional de 1991. Esta não consiste na principal questão a ser abordada no presente trabalho, porém é fundamental para compreender até que ponto o Estado colombiano não perfaz suas funções em considerável parte do território, bem como demonstrar que há outras querelas da problemática colombiana que demandam atenção devido ao fato de partirem da mesma raiz que o próprio conflito armado, ou seja: a persistência de fragmentações que não foram superadas com projetos de infraestrutura, interligações e políticas com abrangência nacional. Logo, a dinâmica territorial colombiana e a carência de projetos infraestruturais com fins de interligação consistem em querelas advindas de longa data que se encontram no pano de fundo do conflito colombiano, mesmo que ocultadas pela projeção internacional e belicosa do conflito: A falta de políticas com poderes suficientes para costurar a malha territorial com obras de infraestrutura contribuiu para que alguns problemas de ordem institucional perdurassem por longo tempo, por exemplo, a ausência das funções estatais nas áreas mais afastadas dos grandes centros urbanos (HAGE, 2008, p.100-101)

Apresentadas algumas assimetrias e faces das querelas territoriais, convém demonstrar que alguns dados acerca de crescimento populacional, econômico entre outros que

27

necessariamente contextualizam o Estado colombiano como um objeto de análises peculiar, considerado o momento contemporâneo - permeado por perspectivas de integração econômica regional por exemplo. Neste sentido, seguem algumas tabelas ilustrando comparativamente alguns dos pontos mencionados.

Tabela 1- População total Países Argentina

2007 39.368.066

2008 39.714.298

2009 40.062.470

2010 40.412.376

2011 40.764.561

Bolívia

9.463.497

9.618.466

9.773.441

9.929.849

10.088.108

Brasil

189.798.070

191.543.237

193.246.610

194.946.470

196.655.014

Chile

16.633.254

16.795.593

16.955.737

17.113.688

17.269.525

Colômbia

44.352.327

45.005.782

45.654.044

46.294.841

46.927.125

El Salvador

13.849.721

14.056.740

14.261.566

14.464.739

14.666.055

Equador

6.100.868

6.129.628

6.160.423

6.192.993

6.227.491

Guatemala

13.358.842

13.690.846

14.033.623

14.388.929

14.757.316

Honduras

7.158.819

7.302.742

7.449.923

7.600.524

7.754.687

109.220.753

110.627.158

112.033.369

113.423.047

114.793.341

Nicarágua

5.563.654

5.635.577

5.710.230

5.788.163

5.869.859

Paraguai

6.119.295

6.230.242

6.341.892

6.454.548

6.568.290

Peru República Dominicana

28.166.078

28.463.338

28.765.162

29.076.512

29.399.817

9.531.954

9.664.948

9.796.852

9.927.320

10.056.181

Uruguai

3.323.906

3.334.052

3.344.938

3.356.584

3.368.595

Venezuela

27.483.000

27.935.000

28.384.000

28.834.000

29.278.000

541.974.280

548.204.583

554.443.965

México

529.492.104 535.747.647 Totais * Estimativa média, excluindo número de refugiados

Elaboração nossa, 2012. Fonte: The World Bank - http://data.worldbank.org/

Tabela 2 - Estimativas de Desabrigados na Colômbia 2003 Número de Desabrigados

2.900.000

2004 3.328.000

2005 3.662.842

2006 3.833.000

2007 4.000.000

2008 4.360.000

2009 4.900.000

2010 5.200.000

População Total 41.731.914 42.385.712 43.040.558 43.696.540 44.352.327 45.005.782 45.654.044 46.294.841 Percentual de Desabrigados* 6,95% 7,85% 8,51% 8,77% 9,02% 9,69% 10,73% 11,23% Percentual de crescimento populacional** 1,57% 1,54% 1,52% 1,50% 1,48% 1,45% 1,42% 1,38% * Comparando com a População Total. ** Comparando de 2003 em diante. Elaboração nossa, 2012. Fonte: The World Bank - http://data.worldbank.org/

28

Tabela 3 - Produto Interno Bruto (em US$) Países

2007

2008

2009

2010

2011

Brasil

1.365.982.651.542 1.652.817.559.097 1.621.661.507.655 2.143.035.333.258 2.476.652.189.880

México

1.035.929.522.496 1.094.480.339.422 882.354.745.911

1.035.870.880.242 1.155.316.052.667

Argentina

260.768.703.249

326.676.673.165

307.081.774.895

368.710.961.381

445.988.571.982

Colômbia

207.621.494.237

244.539.677.722

236.164.279.711

288.764.794.424

331.654.672.814

Venezuela

230.364.012.576

315.600.203.540

329.418.979.506

393.807.511.437

316.482.190.800

Chile

173.079.355.829

179.626.731.848

172.590.595.086

216.308.875.370

248.585.243.788

Peru

107.233.299.365

126.822.739.600

126.923.120.549

153.882.824.181

176.662.074.713

El Salvador

45.503.563.000

54.208.524.000

52.021.861.000

57.978.116.000

67.002.768.302

República Dominicana

41.314.666.869

45.805.370.532

46.788.255.295

51.576.212.063

55.611.245.616

Guatemala

34.113.106.486

39.136.286.496

37.733.791.089

41.340.507.361

46.900.000.257

Uruguai

23.410.536.955

30.366.148.248

30.497.048.979

39.411.996.710

46.709.797.684

Bolívia

13.120.517.443

16.675.015.771

17.339.992.191

19.649.724.656

24.426.829.466

Paraguai

12.222.355.341

16.886.549.387

14.295.003.243

18.331.385.476

23.877.089.240

Equador

20.104.900.000

21.431.000.000

20.661.000.000

21.427.900.000

23.054.100.000

Honduras

12.315.697.003

13.835.990.547

14.123.452.608

15.343.558.028

17.259.407.972

Nicarágua

5.662.053.826

6.372.245.366

6.213.677.483

6.590.593.827

7.297.481.501

Elaboração nossa, 2012. Fonte: The World Bank - http://data.worldbank.org/

29

Tabela 4 - Forças Militares Regulares Países

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

Argentina Bolívia

101.100 68.600

102.600 68.600

102.000 68.000

102.000 70.000

107.000 83.000

107.000 83.000

107.000 83.000

104.340 83.200

Brasil Chile

673.200 117.300

673.200 114.100

687.000 116.000

673.000 116.000

754.000 103.000

721.000 103.000

721.000 103.000

713.480 103.771

Colômbia El Salvador

262.600 59.800

304.600 59.800

336.000 46.270

336.000 47.270

398.000 57.400

411.000 58.400

411.000 58.400

441.828 58.983

Equador Guatemala Honduras México

28.800 50.400 14.300 203.800

27.500 50.400 18.000 203.800

15.000 48.000 20.000 203.000

16.000 48.000 20.000 204.000

28.000 35.000 20.000 280.000

33.000 35.000 20.000 286.000

33.000 35.000 20.000 305.000

32.500 34.212 20.000 331.750

Nicarágua Paraguai Peru República Dominicana Uruguai

14.000 33.400 187.000

14.000 33.400 177.000

14.000 24.000 157.000

14.000 25.000 157.000

14.000 26.000 198.000

14.000 26.000 198.000

12.000 26.000 191.000

12.000 25.450 192.000

39.500 24.800

39.500 24.900

39.000 24.920

40.000 65.000 24.920 *

65.000 25.900

40.000 25.900

39.500 25.439

82.000

82.000 *

115.000

115.000

115.000

Venezuela 105.300 105.300 * Sem dados disponíveis no período

Elaboração nossa, 2012. Fonte: The World Bank - http://data.worldbank.org/

Tabela 5 - Percentual do PIB direcionado aos Gastos Militares* Países Colômbia Brasil

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

18,91%

17,47%

15,54%

12,70%

13,79%

13,12%

17,88%

18,85%

20,32%

8,38%

6,09%

6,44%

6,01%

5,54%

5,60%

5,52%

6,04%

5,88%

* Excluídos gastos com defesa civil, benefícios a veteranos, desmobilizações, destruição de armamentos e expensas com forças não-oficiais. Elaboração nossa, 2012. Fonte: The World Bank - http://data.worldbank.org/

Observando os dados apresentados nas tabelas antecedentes, pode-se considerar, dentre outros aspectos, a preponderante militarização colombiana e o crescimento no número de desabrigados em uma razão de quase 1% ao ano como questões intrinsecamente ligadas ao conflito na seara das consequências. Como o segundo Estado latino americano em contingente de forças armadas oficiais e o que mais destina percentuais do PIB para orçamentos militares, a Colômbia configura em seu interior a expressão da concatenação dos esforços em prol da pacificação através da derrota militar imposta aos grupos insurgentes. Neste sentido, a agenda

30

do Estado detentor do 4° PIB latino americano no período retratado se organiza em prol da vitória militar nas ações contrainsurgentes e na guerra contra as drogas, preconizada no Plano Colômbia. Imergindo estas considerações no contexto histórico colombiano, permeado pela violência, depreende-se que além do conflito e suas consequências, como o temor e a desconfiança suscitada dentro da dinâmica expressa no embate Estado - grupos insurgentes, uma característica que permeia a colombianidade é a presença das assimetrias e como os colombianos conduzem o trato com estas. Com uma população sujeita a conviver em meio a embates entre elites que aspiravam exclusivamente a seus próprios interesses desde o século XIX, ademais de lutas por terra, redefinições da condição campesina e a fragilidade estrutural do governo (VISACRO, 2009), a Colômbia em suas peculiaridades pode ser descrita, resguardadas as devidas proporções, segundo a formulação de Vasil’ev – “O princípio do quarto excluído” (MORAES; ALVES, 2011) – donde haveria apenas três modalidades de colombianos: os “desabrigados”, os “enterrados” e os “aterrorizados”. Logo, a colombianidade é gestada nestas veredas: em meio a assimetrias e à reprodução histórica de violência em um conflito armado tão duradouro quanto os anseios pela paz.

Meio século de conflito - contextualizando o Estado colombiano e as dimensões para a instauração do conflito

Apresentadas as questões que permeiam e moldam a colombianidade, convém discutir as dimensões do conflito sistematizadas por querelas que transcendem a questão da belicosidade, a qual adquire maior projeção em detrimento das causas que sustentam o conflito armado. Dentre estas causas, encontram-se, em suma, diversas querelas não resolvidas que angariaram ao conflito e à violência uma capacidade de renovação, garantindo continuidade às problemáticas-raízes a serem retratadas. Constituído por um território com questões políticas e geográficas não solucionadas em sua totalidade, o Estado colombiano apresenta elementos tradicionais e modernos em seu sistema político. Tais elementos remetem ao fato de que a partir da independência, foram organizados modelos político-jurídicos pautados em constituições baseadas nas revoluções burguesas da França e dos EUA, as quais abrangiam questões como soberania popular, Estado centralizado e a democracia representativa (VÉLASQUEZ, 2011). Os referidos conceitos foram aplicados em um ambiente de sociedades agrárias tradicionais, organizadas no modelo

31

das haciendas, as quais seriam, conforme Fernando Guillén, um dos sistemas chave da estrutura do poder social16. Assimetrias oriundas da estrutura fundiária colombiana, fracionamentos territoriais, falta de “suturas infraestruturais” para interligação do território, insulamento do governo central ante as demandas sociais... Todas estas questões permeiam a gestação do conflito interno colombiano, constituindo diversas dimensões determinantes para o transbordamento contemporaneamente observado, em especial nas regiões limítrofes com os Estados vizinhos. Logo, a internacionalização da crise e da violência empregada tanto contra o Estado colombiano quanto pelo mesmo perpassa por uma gama de questões com diferentes naturezas, não se restringindo a um único fator gerador; portanto, para os fins de ambientação propostos, serão apresentadas sucintamente as várias faces do conflito na forma de dimensões condutoras.

A dimensão fundiária: breves questões sobre o clientelismo e as desigualdades desde a ocupação espanhola Como uma das dimensões que condiziram/conduzem ao conflito colombiano, a questão fundiária remete à desigualdade de distribuição da propriedade das terras e à ação das elites dirigentes no favorecimento de programas e políticas que correspondessem aos interesses latifundiários, resultando em embates entre estes e os camponeses com a extensão da disputa até espaços tidos como vazios outrora (ARIAS, 2011). Intensamente ligada à questão geográfica, a dispersão dos conflitos agrários possui origens nas diferentes etapas da ocupação territorial desde a época colonial. A ocupação espanhola, repartindo a população indígena e concedendo terras aos peninsulares, adotou como estratégia o povoamento denso do altiplano andino e das proximidades do rio Magdalena17, lançando bases para a desigualdade da posse da terra e de povoamento ao longo do território que posteriormente corresponderia ao Estado colombiano. Legando africanos, indígenas e espanhóis pobres à ocupação de regiões marginalizadas, as consequências da ocupação espanhola não se restringiram apenas ao lançar de bases para uma desigualdade na estrutura social e fundiária, senão à inestimável catástrofe demográfica mediante destruição das culturas indígenas, a formação das oligarquias agrárias a posteriori, bem como o acirramento das disputas pelos baldíos nacionales - territórios equivalentes às regiões 16 17

GUILLÉN apud VELÁSQUEZ, 2011, p.116 POSADA, A.R. La Violencia y el Problema Agrario en Colombia, 1987, n.p.

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marginalizadas referidas anteriormente, entregues como “prêmio” aos militares vencedores em detrimento da população local18. Ademais das listadas consequências, aos instituir o favorecimento mediante a distribuição desigual de terras, a ocupação espanhola semeou o desenvolvimento de uma cultura de resistência desde as margens, conferindo outra faceta ao conflito atualmente observado 19. Intrinsecamente ao favorecimento, observam-se as bases para a prática do clientelismo, fenômeno recebido combativamente com o emergir de outras classes políticas no Estado colombiano. Retornando à questão de arcaísmos políticos, o clientelismo consistia em uma prática imbricada ao sistema haciendatário colombiano, e era identificado como elemento tradicional e retardatário pela classe política modernizante que emergia na última década do século XX,. Por consistir em um mecanismo que corroborava com a manutenção das desigualdades, a prática do clientelismo propulsionou os alentos da democracia participativa da Constituição de 1991 (DE LA TORRE, 2001). Outra questão presente no “discurso anti clientelismo”, proferido pela referida classe política, foi a abertura econômica colombiana em 1990, a qual produziu uma crise agrária em partes do país e a migração entre zonas rurais (THOUMI, 2009). Entretanto, a Constituição expedida pela Assembleia Nacional Constituinte de 1991, não estabeleceu mecanismos suficientes para o financiamento dos direitos que deveriam ser garantidos a todos os cidadãos, principalmente ao não construir, em paralelo com a transferência de fundos às instâncias locais, capacidade administrativa ou mesmo sistemas de responsabilidade, deixando áreas já isoladas dos grandes centros urbanos e administrativos à mercê de grupos guerrilheiros e paramilitares (THOUMI, 2009) - questão a ser discutida em momento posterior. Em encerramento, as insuficiências da Constituição de 1991, além de não atenderem aos objetivos originais de maneira equânime, aprofundaram as relações pessoais assimétricas de bens e serviços entre patrões e clientes em prol de atender interesses ou angariar lealdade, rotundando na prática clientelista (DE LA TORRE, 2001). Logo, apesar dos esforços por instituir determinadas mudanças no concernente à instituição do poder político colombiano, o sistema de dominação clientelista, ao constituir em um mecanismo de ascensão social mediante “troca de favores”, não pôde ser superado e consiste em elemento remanescente da colonização, fomentando a referida coexistência de elementos modernos e tradicionais no sistema político colombiano.

18 19

POSADA, A.R. La Violencia y el Problema Agrario en Colombia, 1987, n.p. Ibidem.

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A dimensão geográfica: o fracionamento do território colombiano

Como o sexto maior Estado em dimensões territoriais da América Latina (1,1 milhão de km²), a Colômbia, que viria a ser formalmente constituída em 1831, abrigava desde a colonização a principal fortaleza militar de defesa ao sul do Caribe em Cartagena (CANO, 2000). Ademais de dificuldades advindas da integração terrestre, à qual será conferida maior atenção adiante, a integração geoeconômica do Estado colombiano enfrentou e ainda enfrenta obstáculos como as diferenças no tecido social e econômico (CANO, 2000). Explicitando a questão, de um lado está o Estado colombiano, em uma tentativa de superar elementos que denotem “atraso” 20, construindo a devida costura institucional e territorial, e de outro estão populações isoladas com relativa autonomia frente ao governo central. Portanto, conforme Thoumi (2009), são gestados problemas de raízes culturais e sociais, tendo por fator chave a questão geográfica e, por consequência, as dificuldades em estabelecer a aplicação uniforme das Leis ao longo do território. Nos referidos âmbitos, uma das questões mais complicadas foi o estabelecimento de vínculos dos camponeses à terra, visto que boa parte do território colombiano em áreas mais isoladas não foi colonizado e estas ofereciam a oportunidade de subsistência de forma paralela ao Estado. Tal problemática, para limitando-se a um único exemplo, concernente aos terratenientes, teve como resultante a migração de camponeses e escravos fugitivos para estas porções territoriais, formando sociedades marginalizadas de todos os mecanismos de controle provenientes de suas localidades originais (THOUMI, 2009) e promovendo a regionalização da Colômbia. Este fenômeno, conceituado como fracionamento territorial aliado a elementos políticos e institucionais, possibilitou a emergência do dilema de autonomias e do movimento insurgente. Posta esta situação, outra faceta do conflito colombiano é construída, dado que a referida parcela da população - antes dominada e subalterna - consegue construir, nos interstícios dos domínios centrais, espaço e dinâmicas próprias, protagonizando um movimento livre dos olhares vigilantes dos “senhores”

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(CECEÑA, 2008), e a posteriori, rival das ações

centralizadoras do Estado colombiano, através da insurgência. Convém incluir, em retomada, que o primeiro fracionamento territorial correspondeu 20

Conforme mencionado, a Colômbia abriga elementos modernos e tradicionais, sendo que alguns destes elementos denotam o referido atraso. A questão da estrutura fundiária, do clientelismo e da desigualdade infraestrutural são alguns exemplos. 21 Termo utilizado por Ceceña (2008), aludindo à autonomia angariada pelas parcelas que a reivindicam em um paralelo com a questão da escravidão e do senhorio.

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ao desmembramento da Grã-Colômbia, originando três Estados independentes – Colômbia, Venezuela e Equador – por motivos de diferenças de natureza política, econômica e social, traduzidas nos recentes conflitos fronteiriços (HAGE, 2008). Já apresentava também o geógrafo francês Élisée Réclus (2010, p.17) que a obra unificadora de Bolívar não foi levada adiante por ninguém, mesmo com sua declaração de que “a obra projetada da união era um fato cuja importância nunca fora igualada desde a queda do império romano”. Possibilitando a manutenção dos fracionamentos, convém retomar o fato que a escassez de ligações promovidas no território colombiano aliada à falta de políticas com suficiente capacidade de suturá-lo contribuiu para que problemáticas de ordem institucional remanescessem, conduzindo novamente à questão da autonomia criada pelas áreas marginalizadas frente aos grandes centros urbanos, mas sob uma ótica espacial. Estas áreas constituem espaços vazios de função estatal, e ilustram a carestia infraestrutural oriunda das políticas de integração (ou falta delas),constituindo em um contrapontoàcentralização do poder político expresso ao longo da gestão de Álvaro Uribe, na tentativa de solucionar esta questão histórica, advinda de outras administrações (HAGE, 2008). Reunindo as concepções desta faceta do conflito, é possível depreender que a complexidade do território, tradução do encontro de elementos como história, cultura, geografia e vida, origina embates pela reivindicação de autonomia e em última instância pelo poder, perpassando tanto pela questão do monopólio de recursos estratégicos, como pelo controle e submissão de populações desestruturadas no âmbito infraestrutural (CECEÑA, 2008). Abrangendo a organização social autônoma desde as margens em contraposição ao movimento centralizador do Estado, uma prerrogativa clássica a ser detalhada ao longo da ambientação metodológica22, a dimensão geográfica do conflito doméstico colombiano ilustra como o território é um elemento crucial para a projeção de poder, retomando considerações caras aos estudos de geopolítica.

A dimensão normativa: a segmentação social e a relativização das normas Até este ponto, foi apresentado brevemente que o conflito colombiano consiste em um fenômeno gestado, oriundo de problemáticas de natureza geográfica, infraestrutural e institucional. Além destas, é possível incluir a problemática normativa, donde a existência de

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Adiantando a questão, refere-se ao “monopólio da coerção”, tratado pelo autor ao conceituar o Estado moderno e suas prerrogativas (WEBER, 1919). O tema será tratado na parte metodológica do trabalho, capítulo 2.

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brechas entre as normas existentes e sua aplicação se traduz em obstáculos para instituir o “império da Lei” na Colômbia. As referidas brechas normativas são encontradas na segmentação social, a qual seria um produto das faltas de conexão entre a margem e o centro político do Estado colombiano. A tendência à segmentação aumenta consideravelmente em face de mudanças tecnológicas, desenvolvimento desigual de infraestrutura e aumento do número de desabrigados. Com este aumento, as normas sociais se aplicam de forma diferenciada dada sua informalidade, possuindo validade variável de um grupo para outro. Neste contexto, se o Estado possui pouca capacidade para aplicar as normas de maneira uniforme ao longo de seu território, o controle sobre os indivíduos destas regiões segmentadas diminui, abrindo margem para o desenvolvimento da informalidade normativa, de atividades paralelas ao poder estatal, crime organizado, entre outros. O ponto para a eliminação de mais este entrave propulsor do conflito colombiano seria o estabelecimento de um governo forte frente a uma sociedade civil que coopere com a aplicação da lei de forma não segmentada (THOUMI, 2009). Somada à dificuldade de aplicação normativa referida, a questão da “Captura do Estado23” constitui em um elemento de debilidade institucional que enfraquece também a estrutura econômica do Estado colombiano ao distorcer a formulação de leis, normas, decretos, regras e regulações (SALAMANCA et al., 2008). O baixo nível de transparência da tomada de decisões, bem como o controle das instâncias regulatórias por atores tidos como subversivos ou pelas próprias diligências políticas colombianas constituem um amálgama responsável por distorções culturais, sociais e econômicas de grande magnitude, ocasionando a segmentação da sociedade conforme apresentado (SALAMANCA et al., 2008). Logo, as questões normativas apresentadas estão ligadas principalmente à questão política, dado que esta consiste em outra faceta da debilidade do aparato institucional do Estado colombiano, a serem ilustrados a seguir.

A dimensão política: bipartidarismo, repressão e a alternativa insurgente

A dimensão política consiste em um vetor que sintetiza as demais dimensões e acompanha todas as etapas do conflito colombiano, desde a gestação até o transbordamento,

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Conceito referente ao manejo do aparato estatal, dada sua prerrogativa regulatória, segundo interesses particulares de determinados grupos, sejam estes empresas, partidos políticos, grupos de interesses ou organizações ilegais (ALBARÁN et al., 2008).

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ocasionando desde as migrações forçadas até violações de soberania - um dos exemplos mais representativos da internacionalização da crise colombiana para as regiões de fronteira. Neste sentido, ressalta-se que esta será a faceta mais extensamente tratada ao longo deste trabalho, dada sua contribuição crucial e complexa para a ambientação do referido conflito. O primeiro aspecto que se faz necessário explicitar seria a existência do bipartidarismo. Apesar de não constituir um traço peculiar ao Estado colombiano, o bipartidarismo em conjunto com a ausência formal de ditadura por meio de golpes militares na Colômbia consiste em um fator importante para o entendimento a dinâmica dos revezamentos dos partidos Liberal e Conservador neste Estado. Os partidos Liberal e Conservador desempenhavam um rol que antes de representar os interesses específicos da sociedade, pareciam expressar projetos políticos em voga desde outros momentos históricos em meio a processos políticos pouco participativos, um fomento para revoltas populares. Nestes termos, o bipartidarismo observado na Colômbia conta com fluidez, ausência de polarização definida, pouca inclinação ao estímulo de participação popular, moldando as políticas públicas segundo diretrizes de caráter particular (VELÁSQUEZ, 2011). Como múltiplas opiniões e forças provenientes da sociedade colombiana não eram contempladas, a recepção do Estado por estas parcelas da sociedade tornou-se, em longo prazo, algo traumático (VELÁSQUEZ, 2011), dado que o espaço representativo dos partidos vigentes já se via preenchidos pelos interesses de grupos prédeterminados. A conjunção entre demandas sociais não atendidas e respostas coercitivas a quaisquer contestações de teor reivindicatório consistiram em uma dinâmica substituta à ditadura formal observada em outros Estados sul-americanos, conferindo maior amplitude ao insulamento dos canais de comunicação entre Estado e sociedade, afetando o princípio básico da governabilidade, isto é, a capacidade das instituições estatais de canalizarem as demandas da sociedade civil (GONZÁLEZ; BAHAMON, 2006). Entretanto, aliado à ausência de movimentos classificados como populistas, o clientelismo também afetou a governabilidade ao passo que suscitou de determinada maneira a fixação das estruturas bases do período oligárquico. Retornando ao clientelismo, este consistiu em uma forma de desenvolvimento político que incorporava tanto as classes altas quanto as baixas à arena política, promovendo o menor número de alterações possível na organização e no discurso do referido período (GONZÁLEZ, 2003), promovendo uma situação análoga a um engessamento estrutural. Neste sentido, configura-se a primeira faceta da dimensão política que conduz ao conflito colombiano: a crise de governabilidade dado o afastamento entre governo e sociedade.

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Apesar da citada problemática, a contribuição do bipartidarismo à Colômbia foi a de intermediar os níveis nacional, regional e local, dado o fracionamento do poder em nível doméstico. As disputas oligárquicas, os diversos projetos de unidade nacional, as rivalidades entre regiões e a contraposição de interesses regionais e locais incumbiram ao bipartidarismo duas funções: refletir a ordem hierárquica vigente e forjar um projeto de ordem nacional, visando à inserção do Estado na dinâmica internacional (GONZÁLEZ, 2003). A explicação quanto à existência de duas frações partidárias habita justamente pelo fato de que nenhum projeto nacional concatenava em sua totalidade as classes dirigentes e seus subordinados, configurando uma espécie de diarquia oligárquica por mais de 150 anos (HYLTON, 2009). Logo, mensurar o referido fenômeno apenas através das aproximações e distanciamentos com o papel de representação das demandas sociais seria algo reducionista face ao seu contexto de inserção ao longo da história. Durante a intitulada “Era do Capital”24 (1848 – 1875) na Colômbia, uma conjunção de pactos políticos firmados pelas elites, grupos subordinados que reivindicavam igualdade de direitos, aumentos dos capitais provenientes da exportação do café, bem como a delimitação das fronteiras agrícolas da referida commodity, constituía o cenário do domínio do Partido Conservador, o qual financiou a versão autoritária do clientelismo, anulando ondas de mobilizações. Contudo, apesar do autoritarismo vigente mesmo por cinquenta anos após 1880, o centralismo de governo não pôde ser observado, mantendo-se a concentração de poder nos dois polos partidários, a fragmentação colombiana e a supremacia nos níveis regional e local (HYLTON, 2009). Tangenciando os embates entre latifundiários e camponeses, os governos colombianos ora refletiam os interesses dos grandes terratenientes, ora demonstrava algumas aproximações com a sociedade colombiana, a partir de reformas sociais como a secularização do ensino, o direito à greve, a instituição do salário mínimo e o pagamento de férias e feriados (CANO, 2002) – reformas observadas durante a gestão Liberal, no período de 1930-1946. A amenização da violência desprendida pelos conflitos calcados na desigualdade de oportunidades constituiu em um ponto positivo da instituição de tais conquistas sociais, cuja finalidade última era a inserção do Estado colombiano no mercado mundial, dada a prosperidade econômica observada nas referidas décadas. Como a perenidade não consistiu na marca deste período, apesar de hasteada a bandeira progressista, crescentes dificuldades e obstáculos de natureza econômica permearam a continuidade do processo de industrialização, 24

Termo empregado por Hylton (2009) para fins de contextualização da prosperidade econômica colombiana entre 1848 e 1875.

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aumentando as proporções do movimento contestatório latino-americano ao mesmo tempo em que, em algumas localidades, incluindo o caso colombiano, parte deste movimento foi lançada na clandestinidade e na luta de guerrilhas devido à ação de forças repressoras (CANO, 2002). Dadas as dificuldades em implementar a continuidade do progresso industrializante em conjunto as dissidências do partido Liberal, as eleições de 1946 foram ganhas pelo partido Conservador. O acontecimento que gerou a mácula da repressão social se deu em 1948, quando foi assassinado o líder liberal de esquerda Jorge Eliécer Gaitán - um advogado que simpatizava com setores marginalizados socialmente e, consequentemente, possuía antipatias com os setores oligárquicos – o qual tinha consideráveis possibilidades de ser eleito em 1950. O assassinato desencadeou um levante popular conhecido como el Bogotazo,

resultando a

partir da repressão em 1500 mortes e 20 mil feridos (CANO, 2002). Este episódio sangrento, ademais de demonstrar a intensidade repressora das respostas aos levantes, deixou marcas profundas na Colômbia e, ao passo que as disputas entre os partidos foram se intensificando, em 1960 deu-se início ao período conhecido como la Violencia, no qual os dois partidos, Liberal e Conservador, extravasando os mecanismos de disputa política, se voltaram às armas, declarando uma guerra civil através dos grupos guerrilheiros (VELÁSQUEZ, 2011). O extravasamento das disputas partidárias do âmbito político consistiu em uma espécie de divisor de águas, uma das primeiras desembocaduras da dimensão política para a instauração do conflito em suas conformações atuais, dada a recorrência ao mecanismo da violência aplicado tanto por parte do Estado colombiano em suas reprimendas aos movimentos de contestação popular, quanto nas táticas empreendidas pelos grupos guerrilheiros. Desta forma, os paramilitares surgem como reação aos grupos guerrilheiros nos anos 80, intensificando as disputas territoriais e configurando outro elemento na bipolarização forças armadas oficiais – guerrilhas (LAIR, 2001). Com o surgimento desta “ameaça contrainsurgente”, a renovação das atividades dos grupos guerrilheiros foi dada após as conferências de 1982 e 1983, caracterizadas pela adoção de estratégias de caráter mais ofensivo por parte das FARC-EP e do ELN, desdobrando suas frentes, disseminando-se pelo território colombiano, diversificando seus financiamentos e irrompendo nas cidades para fins de estabelecer condições propícias para uma insurreição popular (LAIR, 2001). Neste contexto, depreende-se que as atividades destes grupos não estão mais pautadas na defesa de interesses dos partidos, adquiriram um papel político diferenciado, o qual se encontra inserido na seara do protagonismo do conflito e não mais na mera representação das partes envolvidas. Dada à referida mudança, uma estrutura denominada por Velásquez (2011) de “bandoleirismo social”, a qual compreende os diversos grupos guerrilheiros, obteve seu

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espaço no cenário das falhas institucionais do Estado colombiano em prover atendimento às demandas sociais e coesão do território, retomando a uma problemática previamente referida: a ausência das funções estatais nas regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos e a fragmentação da malha territorial. Desta forma, emerge novamente o conceito de “espaços vazios de função estatal”, em associação com o insulamento do Estado colombiano e o decréscimo da legitimidade de suas ações perante a sociedade, dando origem diversos processos, como a “reorientação de lealdades”, a “realocação de autoridade”, “subgrupismo” 25 e, conforme determinados autores, a suposta “falência do Estado” 26; estão dadas as bases para o agravamento do conflito até o grau correspondente ao período pesquisado. Tais fenômenos serão tratados adiante, entretanto para o momento, convém explicitar que em decorrência da ausência do Estado em áreas mais marginais aos grandes centros urbanos, a incorporação de camponeses aos grupos guerrilheiros, dado o “assalariamento” (CANO, 2002), revela a fragilidade social da sociedade rural. Desprovidas de assistência e vítimas da desigualdade de oportunidades, juntarem-se às guerrilhas ou aos paramilitares torna-se algo além de uma carreira: ademais de constituir uma fonte de renda e meios de vida, provém um meio de acesso a um status social maior, expressado simbolicamente através de uniformes e armas das organizações mencionadas. Acima de tudo, integrar às fileiras, sejam estas da parte insurgente ou contrainsurgente, possibilita ao indivíduo o pertencimento a um grupo, a uma unidade em que este se sinta representado ou contemplado. O deslocamento das estruturas familiares e a ruptura social tornam o ato de pertencer a estes grupos algo atrativo dado o código de disciplina instituído nestes (PÉCAUT, 1999). As FARC-EP, por exemplo, além de concretizarem os anseios de lei e ordem, protegiam os interesses dos agricultores, em certa proporção compensando-os pelas ausências de estruturas estatais efetivas. Isto foi realizado mediante a imposição de um código próprio, definindo condições de acesso à terra, garantindo partes desta para o cultivo de alimentos, monopolizando o comércio com os representantes do tráfico de drogas e provendo proteção contra as incursões militares. Entretanto, assim como foi possível observar a reorientação de lealdades do Estado para estes subgrupos especificamente, o mesmo processo ocorre em algumas regiões de domínio paramilitar, não implicando em afinidade ideológica automática necessariamente (PÉCAUT, 1999). 25

São três conceitos empregados por Rosenau (2000), no âmbito do paradigma do pós-internacionalismo. Questões a serem explicitadas adiante, à ambientação metodológica. 26 Alguns autores que empregam o conceito de falência do Estado a ser ilustrado adinate conforme Pureza (2007).

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Apresentadas tais considerações acerca da dimensão política, seus atores e alguns preâmbulos do conflito, ressalta-se que tanto guerrilheiros quanto paramilitares, não constituem bandidos armados inseridos meramente no contexto maniqueísta do terrorismo (LAIR, 2001) difundido recorrentemente em discursos de governo, seja o de Álvaro Uribe ou mesmo o de anteriores. Tais grupos constituem defensores de argumentos políticos diversos e inseri-los na referida dinâmica maniqueísta, ademais de promover um esvaziamento de seus contextos, é cometer reducionismo analítico pautado pelo senso comum. O que se pretende apresentar é que não apenas a instituição do Estado sofre descrédito pela sociedade. Apesar de as guerrilhas colombianas não constituírem um arranjo político alternativo ao governo e se tratarem de uma componente de instabilidade no contexto de governabilidade doméstica, com a finalidade de ressaltar problemas de ordem organizacional no âmbito da democracia (RESTREPO, 1988), estas também sofreram descrédito devido a suas táticas (ou sua visão de realizar política por outros mecanismos). A questão do descrédito remete ao reducionismo dual legitimidade-ilegitimidade mencionado anteriormente, instaurando um ambiente de menor conhecimento específico do outro, visões estereotipadas, e, por fim, maior complexidade no dualismo Estado colombiano – grupos insurgentes. Portanto, adiantando e a considerando o referido contexto, um último elemento que caracteriza o transbordamento do conflito colombiano seria a legitimação das políticas propostas por Álvaro Uribe no concernente à violência por parte da sociedade colombiana, aplicando a violência nos combates aos movimentos insurgentes de forma instrumentalizada, através da Política de Segurança e Defesa Democrática (PSDD) – a ser discutida nos próximos capítulos. Para o momento, encerra-se este contato inicial com as dimensões do conflito e seu transbordamento com a reflexão de que vários vetores de complexidade permeiam os referidos fenômenos, principalmente em âmbito de políticas e aplicações e quiçá esta seja a razão, entre outras, para o perdurar desta situação de instabilidades em âmbito doméstico.

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DELIMITANDO O OLHAR SOBRE O CONFLITO: uma ambientação teóricometodológica.

Conforme apresentado anteriormente, o conflito colombiano, enquanto processo que emprega a violência, é dado através de diversas dimensões, das quais se pretende enfatizar a política e a geográfica para fins de delimitação e convergência com os aportes teóricos a serem desenvolvidos. Portanto, em continuidade com o processo de ambientação ao objeto de estudo proposto, o olhar sobre o conflito colombiano será delimitado mediante dois campos de estudos a priori Relações Internacionais (RI) e Geopolítica e, secundariamente para fins de compreensão da dinâmica da violência, a Sociologia. Logo, primando pela especificidade, serão apresentados ao longo deste segmento:  Alguns conceitos caros às RI e à Geopolítica, inserindo o transbordamento do conflito colombiano às mudanças paradigmáticas do SI;  As formulações de Rosenau e Agnew em complementariedade, a fim de explicitar a dinâmica dos atores em âmbito doméstico e internacional;  O emprego da violência no contexto insurgente e das coletividades – através de um diálogo sociológico entre Donatella della Porta, Mário Diani e Daniel Pécaut.

As RI e a Geopolítica: detectando as intersecções conceituais e primando pela interdisciplinaridade Antes de quaisquer contextualizações ou ambientações, se faz necessária uma apresentação dos campos de estudos com os quais as análises serão alinhadas. Neste sentido, seguem algumas considerações acerca dos estudos de RI e de Geopolítica. As RI constituem um dos ramos mais jovens das Ciências Sociais, provavelmente devido a este fato este campo de estudos possui tantos debates teóricos internos (SODUPE, 1992), os quais constituem tanto um passo rumo à diversidade de olhares quanto ao distanciamento da consolidação de suas cadeias internas. Logo, existe a demanda pela incorporação da diplomacia de suas componentes disciplinares em prol de sua progressão como ciência. Multidisciplinares por natureza, as RI se propõem a estudar o Sistema Internacional e suas dinâmicas a longo da História. E ao analisar as mudanças de Ordem

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Mundial, suscitam os referidos debates teóricos internos, os quais ganham ou perdem 'fôlego' com os movimentos históricos. Apesar da inegável importância das contribuições dos pensadores políticos clássicos como Maquiavel, Hobbes, Locke, Rousseau, Kant e tantos outros que forneceram as bases para os estudos políticos - os primórdios das RI foram marcados por autores oriundos do período das Grandes Guerras Mundiais, os quais sistematizaram os estudos mediantedebates teóricos contextualizados historicamente. Conforme Guimarães (2001), a preocupação de muitos autores neste período era a identificação das causas da guerra e a busca pelos caminhos da paz, enquanto outros autores mantinham foco na diplomacia, nos problemas de segurança e desarmamento, na análise do imperialismo e suas consequências, na balança de poder e mesmo na geopolítica. Portanto, para que sejam compreendidos os estudos de RI, se faz necessário ter em mente as múltiplas contribuições advindas de outros ramos das ciências sociais, e, para a consolidação dos referidos estudos, exercitar a diplomacia da interdisciplinaridade. Quanto à Geopolítica, apesar desta não enfrentar debates internos como os das RI, enfrenta dificuldades de consolidação dada à desconfiança instaurada pela associação desta às tendências expansionistas empregadas pelo Nazismo. Tal associação pauta-se no reducionismo ao enaltecer as consequências perversas da aplicação dos estudos geopolíticos conduzidos em detrimento da motivação e da importância estratégica destes estudos como um ramo da Geografia Humana. Neste sentido, não se trata de uma sistematização de estudos para satisfações pessoais na busca pelo poder; “a geopolítica é o produto da evolução da observação gradual da ação do homem na exploração do meio natural” (MATTOS, 2002, p. 17). Apesar de apresentar alguns instrumentos que propiciam estas conjecturas teóricas contendo previsões sobre possibilidades de conflitos e mudanças de ordem - o intuito da Geopolítica é, ao concatenar três ramos do conhecimento, analisar as políticas compreendidas em um território, posto que Mattos (2002, p. 29) conceitua-a como “a aplicação da política aos espaços geográficos sob inspiração da História”. Por compartilharem conceitos e alguns pensadores, existe espaço para a interdisciplinaridade entre os estudos de RI e de Geopolítica, e este consiste em um exercício positivo para a produção de conhecimento dentro da área de ciências humanas. Conforme Morin (2003), paradoxalmente, são as ciências humanas que, no momento atual, oferecem a mais fraca contribuição ao estudo da condição humana, precisamente porque estão desligadas, fragmentadas e compartimentadas. Neste sentido, identifica-se que a disciplinarização e a libertação das ciências humanas, em relação a referendar um conhecimento hegemônico

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(ALVES; BRASILEIRO; BRITO, 2004), permite que o questionamento participe no processo de produção do conhecimento, bem como da relativização do mesmo. À luz da agregação conceitual como mecanismo de compreensão do objeto de estudo da presente pesquisa, optouse por exercer a interdisciplinaridade, utilizando conceitos que habitem a intersecção dos dois saberes referidos previamente, conforme a Figura 5.

Figura 4 - Interdisciplinaridade: conceitos interseccionais de RI e Geopolítica Ciências Humanas Relações Internacionais

Geopolítica

Estado Soberania Território

Elaboração Nossa, 2012.

Apresentando os conceitos de Estado Moderno, Soberania e Território Levando adiante a estratégia de “conceituação interseccional” 27, serão apresentados os conceitos-chave para a compreensão e análise do conflito colombiano através da associação RI/Geopolítica, pontuando a seguir conceitos caros a ambas as ciências. O conceito de Estado é contemplado tanto pelas RI quanto pela Geopolítica, dado que exprime a dinâmica do território delimitado física e politicamente com a prerrogativa de relacionar-se com os demais atores no âmbito do SI. Entre os autores que representam as Ciências Humanas em sua diversidade, há várias interpretações acerca do que seria a referida abstração e como podia-se defini-la. Desde antes do cunhar do conceito Estado Moderno pelo 27

Termo empregado tendo por base a estratégia de conceituar termos caros tanto às RI quanto à Geopolítica, conforme ilustrado pela Figura 2.

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sociólogo alemão Max Weber, já existia denotada preocupação acerca do Estado tanto como organismo político, quanto como lócus de poder político, expressa em autores como Maquiavel, Hobbes e Locke por exemplo. Entretanto, para fins de síntese quanto à questão da origem do conceito, considera-se que as origens do Estado moderno em sua conformação básica atual habitem “nos séculos XV e XVI, no contexto da dissolução dos impérios e do poder temporal da Igreja, então acossados pela emergência do poder dos príncipes” (COSTA, 2010, p. 256). Como organismo político, o Estado se vê traduzido por sua forma de governo, seja esta principado ou república, aludindo à contribuição do pensador florentino Maquiavel 28. Apesar de não apresentar claramente a distinção entre Estado e governo, as prerrogativas atribuídas ao Estado a posteriori já se viam esboçadas nas obras do referido autor. Exemplificando, no primeiro capítulo de “O príncipe”, a seguinte afirmação já detém atenções: “Todos os Estados, todos os domínios que exerceram e exercem poder sobre os homens, foram e são ou repúblicas ou principados”

29

. Outras afirmações, constantes em

“Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio” também referendam a reflexão mencionada, quais sejam: “As repúblicas e os príncipes não devem demorar a assistir o povo em suas necessidades” (MAQUIAVEL, 1994, p. 107) e “Os Estados devem lançar mão de todos os recursos possíveis antes de se decidirem a receber auxiliares estrangeiros encarregados da sua defesa” (MAQUIAVEL, 1994, p.258). Neste sentido, observam-se os prenúncios dos conceitos de segurança nacional/territorial, modalidade governamental e bem estar social, concatenados com o objetivo de atingir o ordenamento em nível doméstico, preocupação resgatada por Max Weber ao início do século XX. Antes de explicitar a contribuição weberiana, na qual o Estado é equiparado a lócus de poder político, convém incluir um autor contemporâneo do referido sociólogo e um dos precursores de um pensamento alternativo à “vilania” do Estado representada na teoria marxista. Trata-se da contribuição de Herman Heller. Heller (1947) define o Estado como unidade jurídica e de poder que advém da monarquia absoluta no cenário europeu. No Império Alemão, a expropriação política dos poderes feudais e estamentais e sua consequente subordinação ao poder unitário ocorre através dos denominados Estados territoriais, que são entes quase independentes após a Guerra dos Trinta Anos. Esta circunstância é anterior ao Tratado de Westphalia (1648), considerado como um marco para o nascimento do Estado Moderno. 28 29

Referência proveniente de material digital em domínio público, sem especificação de ano ou edição. Op. cit., p.58.

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Apesar de centralizar o poder, de acordo com Heller (1947), o Estado moderno não pode ser considerado como instrumento de opressão da classe dominante. Autor da expressão “Estado Social de Direito”, o jurista alemão, apesar de afeito ao Socialismo apregoado nos escritos de Marx e Engels, não dispensa a existência do Estado para a concretização da prosperidade econômica, senão justamente o contrário: Heller, conforme interpretação de Bercovici (2004), defende a expansão do poder do Estado à seara econômica, declarando que a expansão da democracia política ao campo econômico e social é de caráter fundamental. Neste sentido, a problemática da luta de classes não é proveniente da existência do Estado, constatação que abriria precedente para uma das contribuições mais recorrentes dentro dos estudos de RI: a weberiana. No contexto da expulsão da ameaça comunista e em direção à almejada socialdemocracia alemã na República de Weimar, Weber foi o responsável por instituir o conceito do Estado Moderno segundo o paradigma do ordenamento doméstico, tendo em vista sistematizar o exercício da política e da plena capacidade do Estado. A concretização destes objetivos de Weber servia para afastar os riscos de um contágio revolucionário, dado que eclodia a Revolução Russa (1917) e existia o temor de seu adentramento na Alemanha através dos espartaquistas30. A este ponto, emerge o conceito a ser utilizado ao longo do trabalho: Estado Moderno, o qual consiste em uma associação de dominação institucionalizada, a qual conseguiu monopolizar territorialmente a coerção legítima, reunindo os meios materiais nas mãos de seus dirigentes e substituindo funcionários estáveis por suas próprias categorias de hierarquia (WEBER, 1919). No âmbito da referida definição de Estado Moderno, pode-se observar preenchidos certos“requisitos” a fim de que o autor possa ser contemplado tanto nos estudos de Geopolítica quanto nos de RI, mediante os termos institucionalização, território e coerção, caros a ambas as ciências. Ademais, é retomada a questão do ordenamento, a qual já consistia em uma das diretrizes maquiavelianas e constitui tanto um vínculo extemporâneo entre os autores quanto algo passível de correlacionar com as RI e a Geopolítica. Abrindo um parêntese para explicitações, Maquiavel defende uma ordenação inicial desde que esta não constituía uma estrutura tão rígida a ponto de impedir o movimento do processo histórico. Logo, o pensador florentino distingue duas formas de ordenação: “a da república que está ordenada para a expansão e a da que está ordenada para manutenção do território, e relaciona 30

Termo adaptado à língua portuguesa, do original spartakistas. Refere-se ao movimento de esquerda com inspiração comunista que tomava lugar na Alemanha sob liderança de Rosa de Luxemburgo, ameaçando a instauração do governo organizado nos cânones weberianos com uma visão alternativa da democracia – auto organizada pelas classes subalternas (VITULLO, 2010).

46

o primeiro caso a Roma e o segundo a Esparta e Veneza” (ARANOVICH, 2009, p. 102). Já Weber tece a construção do ordenamento não na distinção de governos e suas respectivas orientações tal qual Maquiavel, contudo, através da sistematização de instituições, refletida no conceito da burocracia, e na centralização do poder sob a forma de coerção como prerrogativa de reordenamento institucional legada ao Estado moderno 31. Desta forma, o ordenamento como fator de convergência entre os referidos pensadores é dado no plano dos objetivos: há que se existir ordem para a consolidação de um governo que represente o povo e integre a Florença de Maquiavel, bem como para que a penumbra do socialismo se afaste e ceda lugar a um Estado consolidado institucionalmente como na Alemanha de Weber. Encerrando o parêntese mediante esta breve apresentação do conceito de Estado Moderno, pode-se inferir que o conceito de Estado Moderno possui mais aproximações com os estudos de RI que com os de Geopolítica propriamente, dado que tal conceito se desenvolve de forma mais prática na última, removendo as discussões teóricas de sua natureza. Tal desenvolvimento foi identificado por Costa (2010, p. 20) como “coisificação” 32

, garantindo o foco na territorialidade. A concentração dos atuais estudos geopolíticos sobre

a dinâmica do poder sublinham tal processo (COSTA, 2010), indicando que é provável que a visão teórica tradicionalmente difundida acerca do unitarismo 33 estatal necessite de revisões. Arrogando tal desafio para si desde meados da década de 1980, o debate construtivista apresenta uma espécie de revisão conceitual, tendo como um dos preconizadores James N. Rosenau e, de forma mais sofisticada e contemporânea, John Agnew, corroborando com a referida questão da interdisciplinaridade apregoada ao início. Entretanto, apesar da apresentação de novos debates, paradigmas e revisões de conceitos acerca do Estado Moderno e de suas prerrogativas, ao transpor este conceito para o âmbito do SI, composto principalmente por Estados, a preocupação com a segurança e a manutenção do território retornam, dado que tal sistema possui uma estrutura anárquica 34. Nesse sentido, observam-se reflexos da articulação entre RI e Geopolítica no trato com as questões da soberania - conceito fonte de análises teóricas e estratégicas a partir da enumeração de ameaças. Tal como ocorre com o conceito de Estado, há uma polissemia interpretativa acerca do conceito de soberania. Enquanto juristas como Jean Bodin compreendem o conceito através 31

Weber, Max. Ensaios de Sociologia, 1982. Termo empregado pelo próprio autor. 33 Referente ao conceito de Estado unitário, o que indica teoricamente, que não há entes intermediários ou compartilhem o poder ou prerrogativas do Estado em nível doméstico ou internacional. 34 Bull, Hedley. A Sociedade Anárquica, 2002. 32

47

do viés jurídico, atribuindo a este a prerrogativa de criação e revogação das Leis, pensadores políticos como Thomas Hobbes identificam a prerrogativa do poder de coação a fim de estabelecer a obediência e a unificação da sociedade no entorno do “monstro belicoso” descrito em Leviatã (MATTEUCCI, 1998). Independentemente das cisões interpretativas peculiares aos processos de disciplinarização, cabe ter em mente que o conceito de soberania surge concomitante ao Estado Moderno, correspondendo, sucintamente, ao poder de mando, em última instância, do Estado, em sua plenitude de sujeito único e exclusivo da política (MATTEUCCI, 1998) - remetendo ao conceito de unitarismo referido anteriormente. A soberania constitui um conceito bifacetado, pois comporta aplicação no âmbito doméstico para fins de ordenamento do Estado e aplicação no âmbito do SI, constituindo em um princípio que caminha pari passu ao princípio da anarquia. A este ponto, convém retomar alguns pontos acerca do conceito weberiano de Estado Moderno: “associação de dominação institucionalizada, a qual conseguiu monopolizar territorialmente35 a coerção legítima” (WEBER, 1919, n.p). Logo, o conceito de território é algo chave tanto para a compreensão de Estado Moderno, alguns casos que engendram violações de soberania, e, no âmbito do conflito colombiano, consiste em questão fundamental para a compreensão dos embates pelo controle de áreas estratégicas, elencando Estado e grupos insurgentes. Conforme John Agnew (2009), em muitos idiomas a palavra território se refere tipicamente a unidade de espaço contíguo utilizada, organizada e gerenciada por um grupo social, indivíduo ou instituição para fins de restrição e controle de acesso à circulação de pessoas e locais. O uso predominante do conceito de território sempre foi através de conotações políticas, no sentido de envolver a limitação de acessos a determinados locais e regiões, ou através de conotações relativas a comportamento, no sentido de dominação exercida sobre um dado espaço com determinadas espécies ou indivíduos. Nesta perspectiva, a territorialidade consiste no uso do território para atingir metas organizacionais, incluindo outros atores ademais do Estado, consistindo em uma das diversas formas de organizar o espaço social e politicamente. Logo, o autor indica que território é um conceito associado particularmente à espacialidade do Estado Moderno com a prerrogativa deste do controle absoluto sobre a população dentro de fronteiras externas cuidadosamente definidas (AGNEW, 2009). Contudo, existem certas ponderações acerca do emprego deste conceito seu

35

Grifo nosso.

48

significado de restrição do poder dentro de um determinado espaço, as quais Agnew e Corbridge denominam como “armadilha territorial”. Os autores explicitam a existência de dois aspectos face ao conceito de Estado, sendo que um envolve o exercício do poder através das instituições políticas e o outro, a demarcação espacial do território dentro da qual o Estado exerce seu poder. Nas teorias de RI, este segundo aspecto possui denotada primazia, implicando uma ênfase nas relações entre Estados territoriais em contradição aos processos em andamento nas fronteiras destes Estados. Assim, a aplicação da “armadilha territorial” se dá ao passo que Estado e sociedade estão relacionados com as fronteiras, mas qualquer coisa fora destes limites está relacionada apenas aos outros Estados (AGNEW; CORBRIDGE, 1995). - aplicações práticas destes conceitos serão apresentadas ao longo do trabalho. Adiantadas algumas concepções de Agnew a fim de delimitar a relação dos conceitos de território e Estado, bem como explicitados os conceitos-chave na “zona de intersecção”

36

entre as RI e a Geopolítica, convém registrar que esta apresentação conceitual sucinta será basilar para o norteamento desde as dimensões do conflito colombiano até o patamar do transbordamento. Portanto, segue um detalhamento dos aportes teóricos que servirão de interlocutores para as análises deste trabalho.

As aproximações de James N. Rosenau e John Agnew Dando um passo adiante no processo de ambientação metodológica, serão apresentados os aportes teóricos de James N. Rosenau e John Agnew e tecendo os norteamentos pelos quais os processos relativos ao conflito colombiano e suas resultantes serão analisados. Após a Segunda Guerra Mundial, com a instauração da Ordem Mundial pautada na bipolaridade, as produções teóricas eram marcadas por menor complexidade, haja vista a fronteira ideológica que demarcava o mundo em duas frações. Com a queda do muro de Berlim, a derrocada do sistema socialista e o consequente desmembramento da União Soviética em 1991, o grande desafio que surgia era a produção de um novo paradigma para os estudos de RI, dada a emergência de uma Nova Ordem Mundial (CERVO, 2007). Cientista político e estudioso de questões internacionais, James N. Rosenau consistiu em um dos pensadores que trouxe à baila dos estudos internacionais a referida mudança paradigmática -

36

Termo referente aos conceitos caros às R.I e à Geopolítica, ilustrados na Figura 5.

49

fora da égide do debate neorrealismo – neoliberalismo – por detectar alterações conceituais dentro do âmbito da globalização. Rosenau e Durfee (2000) propuseram uma maneira alternativa de observar o SI e suas dinâmicas, propondo a visualização deste em três parâmetros de transição global. O primeiro parâmetro, o qual corresponde a um micro parâmetro, indica que os indivíduos tornaram-se mais analíticos e habilidosos nos âmbitos da imaginação e da emoção. O segundo, que corresponde a um parâmetro intermediário entre os planos macro e micro, indica uma crise nas estruturas de autoridade envolvendo como critério para se atribuir legitimidade o desempenho e o cumprimento às diretrizes do macro parâmetro. Este, por fim, representa um dos maiores diferenciais presentes no aporte teórico do autor, indicando a bifurcação do sistema anárquico em dois subsistemas ou esferas, quais sejam a esfera estatocêntrica e a esfera multicêntrica. Neste sentido, algumas palavras-chave que auxiliam a compreender as proposições do autor seriam: “fragmentação”, “mudança” e “complexidade”. Por que estas palavras-chave? Justamente por constarem ao longo das explicitações do autor sobre o paradigma que ele próprio propõe. O paradigma da turbulência, representado pelo “pós-internacionalismo”37, emerge da premissa de que a acelerada mudança e o aumento das complexidades consistem em macro tendências mundiais em voga , resultando em múltiplas dinâmicas contraditórias, as quais contabilizam variadas formas de comportamento e graus de conflito e cooperação entre diversos atores (ROSENAU; DURFEE, 2000). Ao detectar a presença de tais dinâmicas contraditórias, incluídas em fenômenos discutidos contemporaneamente como a globalização e a regionalização, o autor preconizou as bases para os desafios da construção da Nova Ordem global vigente. Em relação a estes desafios, Cervo (2007) aponta a necessidade de adaptação do Estado nacional para o maior grau de interdependência, instaurado na dimensão universal, simultaneamente à necessidade de sincronia entre objetivos nacionais e objetivos de um dado bloco econômico no âmbito regional. Partindo mais especificamente para as contribuições de Rosenau em comparação com os demais aportes teóricos vigentes, convém adiantar que o autor atribuía relevância a outros atores no cenário internacional, ademais dos Estados e se centrava nas mudanças em voga. Abaixo, segue um quadro comparativo entre os modelos realista, liberal e o pósinternacionalismo proposto pelo autor a fim de melhor ilustrar a transição conceitual proposta em sua formulação teórica.

37

Tradução nossa. Termo original: postinternationalism (ROSENAU; DURFEE, 2000, p.47).

50

Tabela 6 - COMPARAÇÃO PARADIGMÁTICA – Realismo, Liberalismo e Pósinternacionalismo Realismo

Liberalismo

Soberania e

Sistema Interestatal

Diversidade de

Estado

Anárquico

Instituições

Atores unitários

Pluralismo

Fragmentação

Dilema da Segurança

Dilema da Autoridade

Dilema da Autonomia

Ganhos relativos

Ganhos absolutos

Ganhos absolutos

Firmes

Porosas

Porosas

Estruturas societárias Preocupações de natureza coletiva Orientação em relação a ganhos Fronteiras

Pós-internacionalismo Bifurcação entre mundo “multicêntrico” e “estatocêntrico”

Elaboração Nossa (2012), com base em ROSENAU, James N. Thinking Theory Thoroughly: coherent approaches to an incoherent world, 2000.

A partir do quadro apresentado, visualizam-se brevemente algumas divergências do pós-internacionalismo em relação aos modelos clássicos que se apresentavam nos estudos de RI. Organizando os atores internacionais em duas esferas autônomas, mas interdependentes, Rosenau e Durfee (2000) observam a porosidade fronteiriça decorrente da fragmentação das estruturas sociais e da realocação de autoridades face ao fenômeno do subgrupismo, elencando estas questões no dilema da autonomia. Como consequência da crise da autoridade em voga, o autor assume que Estados e governos tornaram-se menos efetivos em confrontar desafios e implementar políticas em comparação com o passado. Apesar de estes manterem ordem pública mediante o poder de política, sua habilidade em endereçar e resolver problemas está declinando ao passo que os indivíduos percebem falhas em seus desempenhos e questionam a autoridade dos referidos entes, redefinindo as bases de legitimidade e cooperação. Este fenômeno se manifesta também em outros níveis, representados pelas jurisdições subnacionais, organizações internacionais e entidades transnacionais não governamentais (ROSENAU; DURFEE, 2000). Neste sentido, Rosenau e Durfee (2000) depreendem, através do paradigma do pósinternacionalismo, que a esfera estatocêntrica não é mais predominante, devido à conscientização do papel do indivíduo, da difusão da crise de autoridade em escala mundial e de outras fontes de turbulência, as quais aprofundaram o processo de bifurcação das duas esferas autônomas anteriormente tratadas. Desta forma, um mundo complexo e multicêntrico

51

emergiu, abrangendo diversos atores, estruturas, processos e normas decisórias particulares, de forma paralela ao tradicional mundo dos Estados . Os Sovereignty –Free Actors (SFAs) – atores não pautados na soberania – pertencentes à esfera multicêntrica incluem corporações multinacionais, minorias étnicas, governos e burocracias subnacionais, sociedades profissionais, partidos políticos, organizações tradicionais e assim por diante. Individualmente ou cooperativamente, estes atores competem, cooperam, entram em conflito; interagem de diversas formas com os Estados, intitulados de Sovereignty-Bound Actors (SBAs) – atores pautados pela soberania – pertencentes à esfera estatocêntrica. Ilustrando a dinâmica destas duas esferas no contexto das mudanças em curso, o autor dispõe que

[…] while nation-states continue to function as central political actors and, as such, maintain structures that have evolved across history as people and organizations went about their daily tasks and sought to realize their particular goals, the globalizing and localizing dynamics are sufficiently powerful to encourage imagining supranational, transnational, or subnational communities that can serve needs and wants better than do the unwieldy and paralyzed states to which history is heir. (ROSENAU, 1997, p.129).

À consideração, indivíduos e organizações podem moldar os termos de transferência de lealdade e legitimidade, culminando no fenômeno do subgrupismo, previamente citado. Tal fenômeno consiste na emergência de profundas afinidades desenvolvidas por pessoas, associações, organizações e subculturas com as quais estas estão historicamente, profissionalmente, economicamente, socialmente ou politicamente ligadas e nas quais repousam as mais altas prioridades (ROSENAU; DURFEE, 2000). Imbuída à questão da transferência de legitimidade, encontra-se a questão do declínio da soberania. Neste cenário conjectural, as concepções de territorialidade estão em fluxo e a noção de “maior lealdade”

38

por parte dos indíviduos declinaria e abriria espaço para uma

multiplicidade de lealdades e para a compreensão de que afiliações locais, nacionais e transnacionais não prescindiriam de exclusividade. Ademais, conforme o autor, os governos não apenas perdem o controle modal e a soberania relativos à sua autonomia doméstica, mas também no escopo das severas clivagens sociais geradas pela realocação das organizações produtivas (ROSENAU, 1997, passim), remotando às assimetrias previamente representadas: dualidade grandes centros urbanos e periferias e à fragmentação das estruturas societárias.

38

Termo empregado para qualificar a questão de horizonte de prioridades dos indivíduos na dinâmica de reorientação de lealdades conforme Rosenau e Durfee (2000).

52

Esta proposição se contrapõe a ação unitária do Estado classicamente evocada por diversos autores como Max Weber por exemplo. Considerando a atuação dos indivíduos, a fragmentação e o declínio da soberania, bem como da preponderância do Estado como ator no SI, Rosenau (1997) ainda inclui a questão da porosidade fronteiriça, explicitando que o território não equivale necessariamente ao espaço circundado pelas fronteiras nacionais: 1) parcialmente devido à migração de pessoas escapando de perseguição política ou buscando oportunidade de ascensão socioeconômica, emitindo como mensagem que os laços que as atam a suas terras podem ser cortados; 2) parcialmente devido à expansão de habilidades analíticas dos indivíduos, dissociando a noção valorativa do território como espaço de controle histórico dos Estados; 3) parcialmente devido à diminuição da capacidade de controle efetivo dos Estados sobre seus territórios, tornando variáveis as anexações territoriais. Neste contexto, o autor apresenta como as fronteiras seriam focos de tensão:

[…] Rather the Frontier must be approached as an inherent source of tension among national governments intent upon preserving their boundaries and other types of actors who seek to expand, by-pass, ignore or otherwise transgress the boundaries. These tensions take many forms, including most notably those among national governments, those that stem from efforts of nongovernmental organizations to affect people, organizations, institutions, or governments across the Frontier, and those that arise out on unintended boundary-spanning consequences precipitated by strictly domestic activities (what have been called ‘cross-border spill-overs’) on the part of either governmental or nongovernmental actors (ROSENAU, 1997, p.148149).

Em suma, as principais contribuições de Rosenau se deram no sentido de apresentar a mudança do contexto global em voga e a consequente erosão de determinados conceitos a partir do declínio da preponderância da atuação dos Estados no SI, do declínio da soberania e da atuação de outros atores redefinindo as bases de legitimidade e autoridade a partir da reivindicação de autonomia. Nesta dinâmica, emergem subgrupos, clivagens sociais alémfronteiras e atividades que interagem com a atuação dos Estados, revelando a complexidade do referido paradigma a partir das variáveis apresentadas. Enquanto o “mérito” do cientista político foi enxergar as fímbrias do SI em meio aos fenômenos correntes e enumerar as problemáticas advindas disto, as quais resultariam em transições em diversos níveis, considerando o nível de adaptações e resoluções possíveis, não é possível localizar com clareza alguma proposição consolidada no pós-internacionalismo

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proposto por Rosenau, pertencendo este último “mérito” ao geopolítico britânico John Agnew. Educado tanto na Inglaterra quanto nos EUA, o geopolítico atualmente ministra aulas na Universidade da Califórnia e sua principal contribuição foi resgatar a importância do estudo de geopolítica através de novos olhares sobre conceitos chave para a compreensão das dinâmicas contemporâneas do cenário internacional. Neste sentido, a preocupação central de Agnew era compreender a política internacional geopoliticamente, tendo em vista que o espaço da política internacional possui dimensão variável e abarca a dinâmica da influência e do confronto de interesses (AGNEW, 2003). Acatando de forma paradigmática o conceito de geopolítica – termo refutado entre os geógrafos das escolas norte americana e francesa que preferem o termo “geografia política” – o autor se desvencilha dos esquemas clássicos e preocupa-se em refletir a complexidade do cenário global contemporâneo, tecendo, a partir de análises conjunturais, novos conceitos atribuídos à globalização e à soberania, escapando à sinonímia da redução da primeira à homogeneização. Conforme o autor,

[…] In other words, effective sovereignty is not necessarily predicated on and defined by the strict and fixed territorial boundaries of individual states. The negotiation and redefinition of power and authority in geographically complex ways suggest the need to change the terms of debate about sovereignty” (AGNEW, 2009, p.9)

Em um processo de desmistificação sobre compreensões difundidas em torno dos conceitos de soberania, Estados territoriais e territorialidade, o autor assume que o poder político se manifesta em diversas espacialidades, não apenas através da territorialidade, questão adiantada. Desta forma, a soberania se desenvolve em diversas modalidades espaciais:

territorial,

espacial-interacional

e

baseada

em

localidade 39,

divergindo,

consequentemente, da ideia altamente difundida que a organização espacial baseada na territorialidade seria uma prerrogativa exclusiva do Estado 40. Dentro deste raciocínio, o autor invariavelmente diverge da concepção de Estado Moderno e legitimidade conforme Weber, explicitando que a soberania dentro da perspectiva do sociólogo repousa em primeira e última instâncias na aplicação original e contínua da força dentro de uma jurisdição territorial em vez de constituir um consenso. Desta forma, a violência aplicada pelo Estado é endossada por um caráter equivalente ao sagrado, atribuída à

39 40

AGNEW, 2009. Ibid.

54

proteção que este teoricamente provê à população nacional 41. Segundo Agnew (2009), uma vez estabelecidos os Estados não consistem em organizações com a prerrogativa da coerção, visto que estes possuem a prerrogativa de elaborar várias outras funções para e por sua população, não se reduzindo à ameaça. Logo, a legitimidade dos Estados não consiste em uma máscara sob a qual estes ocultam sua inclinação à violência; este conceito implica em um mínimo de consenso. Afirmar que a soberania do Estado repousa no monopólio da violência interna contribui para enfatizar o aspecto da territorialidade. As ameaças externas, utilizadas como justificativa às expensas militares e rendas revertidas a estas, claramente continuam a auxiliar na definição da soberania como inerentemente territorial. Mas a ideia de que a soberania prima pelo manejo da obediência não contempla as complexidades dos efeitos deste conceito, recaindo na confusão conceitual entre os pares soberania e obediência, Estado e violência, liberalismo e ausência de Estado. Além de divergir da concepção clássica de Estado, legitimidade, soberania e da territorialização como forma exclusiva de organização espacial, Agnew assume a coexistência da soberania do Estado como ente territorial com outras forças emanadas por outros atores sem implicar a erosão ou fragmentação do conceito de Estado, divergindo da formulação teórica de Rosenau. Para aquele,

[…] state territorial sovereignty has always co-existed, if often uneasily, with the border-busting powers of other states, all manner of private agents, and of non-state public entities, such as churches and other religious organizations, and has itself never been simply territorialized in the way the three myths suggest. Consequently, talk about the ‘‘erosion’’ and ‘‘relinquishing’’ of sovereignty in the face of globalization, when sovereignty is actually only being redefined in terms of the balance between different agents and their geographical scope, strangely accepts the prior efficacy of the sovereignty myths as much as does that of those who see only a changeless state sovereignty constantly re-creating itself (AGNEW, 2009, p. 90-91).

Enquanto o principal conceito-chave para a compreensão de Rosenau seria fragmentação, a fim de compreender Agnew é necessário observar a “transição”, a “reconstrução conceitual”42. Logo, a globalização e seus desafios não moldam a efetividade da soberania, visto que a última possui a prerrogativa da recontextualização, não adentrando a erosão conceitual conforme proposto por Rosenau.Explicitando, não há modelo único ou binário que contemple a dinâmica dos Estados atemporalmente, não reduzindo a questão ao embate entre 41

Ibid. Termos atribuído para a compreensão do aporte teórico de Agnew (2009), o qual propõe outros tipos de incidências acerca de conceitos cristalizados pela compreensão clássica. Conceitos como globalização e soberania possuem outras propostas na ótica do autor. 42

55

os paradigmas clássicos e imperialistas ou clássicos e globalistas. No cenário mundial, donde migrações de autoridade e controle estão em voga, compreender soberania parte do pressuposto do pluralismo em vez de um modelo único para o mundo inteiro. Infelizmente, esta não é a tendência, devido à relativa ênfase conferida aos impactos da globalização (AGNEW, 2009). Dentro do contexto da reconstrução conceitual, retoma-se a temática do território através do conceito de “territorialidades sobrepostas”, o qual contempla uma visão diferenciada acerca da aplicação da soberania e da territorialidade. Trata-se da delimitação espacial devido às diferentes lógicas sociais, fugindo à lógica do unitarismo, fomentando o dilema de autoridades em nível doméstico e, consequentemente, a impugnação da soberania como legado exclusivo do Estado (AGNEW; OSLENDER, 2010). Voltando o olhar aos fenômenos que ocorrem em nível doméstico, o conceito de territorialidades sobrepostas indica um processo de reterritorialização decorrente da globalização, visto que

[...] mais do que demonstrar a expansão progressiva do cosmopolitismo, portanto, a globalização representa por sua vez a desterritorialização das identidades e os interesses existentes e uma reterritorialização sobre a base de identidades culturais e interesses econômicos localizados” (AGNEW; OSLENDER, 2010, p.197) 43.

Materializando os diferentes níveis de territorialidades e de soberania, considera-se que apesar de o fenômeno da globalização empreender a diminuição de distâncias para maior valorização dos fluxos de capital, informações, tecnologias e indivíduos, quanto mais próximo do nível doméstico estiver o referencial de análise, mais evidente ficam as fímbrias desagregadoras do ideal homogeneizador, nas quais é possível enxergar diferenças e conflitos. Analisar as interações em nível internacional no contexto contemporâneo significa assumir a existência de vetores agregadores e desagregadores, os quais Agnew e Oslender (2010) identificaram no âmbito das territorialidades sobrepostas. Observar e analisar de maneira inteligível estas dinâmicas invisíveis no véu da globalização consiste no exercício da visão estratégica, consequentemente remetendo à análise geopolítica. Imbuir ao Estado poderes quase míticos e negligenciar o que ocorre entre as fímbrias do SI é uma prática reiterada, assim como a difusão dos “mitos” 44 anteriormente apresentados

43

Tradução nossa. Excerto original: “Más que señalar la expansión progresiva del cosmopolitismo, por lo tanto, la globalización representa a la vez una desterritorialización de las identidades y los intereses existentes y una reterritorialización sobre la base de identidades culturales e intereses económicos localizados”. 44 Termo utilizado por Agnew (2009) para indicar conceitos cristalizados e equivocados acerca de globalização, soberania e território conforme sua interpretação.

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pelo autor (AGNEW; OSLENDER, 2010) Portanto, a contribuição de John Agnew consiste em um lembrete para um afastamento das explicações que se pretendem universais, escapando de formulações teóricas binárias ou proposições vazias de complexidade analítica.

A

sistematização de novos conceitos e apresentação de outras matrizes para percepção da complexidade do mundo contemporâneo não significa legar o obituário acadêmico às contribuições anteriores. Apresentadas brevemente as concepções de Rosenau e Agnew, reitera-se que ambos os autores constituirão a base argumentativa ao longo das análises deste trabalho; independentemente de não ser possível depreender com clareza resoluções no escopo da formulação teórica de Rosenau, as inovações sob a ótica do pós-internacionalismo consistem em um formidável ponto de partida analítico. Enquanto as concepções de Agnew consistem em um condutor em meio às constantes mudanças no cenário internacional que, unidas às breves questões sociológicas que seguem, permitirão uma análise mais aprofundada acerca do objeto de estudo proposto.

Breve consideração sobre a questão da violência – o aspecto sociológico A violência na Colômbia consiste em um componente presente em considerável parte da história, seja como ferramental político ou mesmo como mecanismo de resposta a estruturas repressoras as quais não contemplavam parcelas da sociedade em momentos posteriores. Conforme Pécaut (1999), a violência política corresponde minoritariamente ao total de homicídios registrados no Estado colombiano, indicando que existe uma tipologia de violência que transcende o aspecto meramente político. Dentro deste registro, pode-se depreender que a tipologia de violência na qual o Estado colombiano é passível de ser enquadrado deve respeitar determinadas peculiaridades das ações violentas registradas em seu território, provenientes de diversos atores armados, não exclusivamente a serviço do Estado. Neste sentido, segundo estudos sobre a violência na América Latina realizados pelo Centro Internacional de Investigação e Informação para a Paz da Universidade para a Paz das Nações Unidas (2002) a violência estrutural não configura um produto de mera ação violenta empreendida de um indivíduo sobre outro, mas é proveniente de um sistema social pautado na desigualdade de oportunidades para seus membros, remetendo ao quadro encontrado em meio às diversas assimetrias encontradas no Estado colombiano. A fim de não incorrer no reducionismo ao ponto de desconsiderar a desigualdade como um elemento existente em todas as sociedades - equiparando a questão da violência na Colômbia a algum tipo ideal

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divergente do que o contexto visualizado - há que se considerar a existência de gradações na questão da desigualdade de oportunidades sociais quanto à garantia de um mínimo de realização das potencialidades do indivíduo ou grupo. Logo, pretende-se apresentar, com o apoio das análises sociológicas, a dinâmica da violência enquanto mecanismo apropriado por grupos insurgentes, incorrendo no contexto do conflito colombiano. Justificada como uma recusa simbólica à opressão sistêmica, o uso da violência pelos referidos grupos, apesar de suas limitações, tem como objetivo demonstrar contraposição em protestos, vencer batalhas específicas ou mesmo atrair atenção midiática, angariando projeção a uma causa específica de uma determinada coletividade (DELLA PORTA; DIANI, 2006). Esta última questão se relaciona em grande medida com dois fenômenos já tratados: a dinâmica territorial e a fragmentação em nível social e normativo, contribuindo para uma revisão da aplicação da soberania. Influenciando a formação de coletividades (atores coletivos) através da dinâmica territorial via políticas, bem como através de outras dinâmicas ao alocar recursos públicos em diversas áreas, o Estado se encontra em um contexto de redefinições dos termos de exercício da soberania ao passo que entes subnacionais estão sujeitos a um maior grau de autonomia, e, quando este cenário se entrecruza com a queda de representatividade devido à baixa correspondência entre Estado e sociedade concretizada em políticas (DELLA PORTA; DIANI, 2006), estão dados os componentes para a insurgência tal qual visualizado na Colômbia. Portanto, assim como as demais dimensões que conduziram o conflito colombiano ao transbordamento, a violência como recurso apropriado tanto por parte dos grupos insurgentes quanto pelo Estado, materializada em políticas contra insurgentes, constitui um vetor de caráter estrutural que não pode ser dissociado dos demais a fim de explicitar o fenômeno previamente mencionado. Diferenças entre os conceitos de insurgência e terrorismo, como o primeiro se expressa no Estado colombiano e sofre equiparações ao segundo conforme se alteram os discursos políticos e o ambiente de negociações, são questões que serão abordadas com mais afinco adiante dentro do contexto descrito. Para o momento, e à guisa de encerrar os contatos iniciais mediante este segmento de ambientações, ressalta-se novamente a questão da interdisciplinaridade como instrumento analítico-metodológico. Pretende-se tecer análises acerca da referida questão paralelamente às demais, a fim de prover um panorama mais complexo e que contemple a colombianidade, a qual confere diferentes matizes ao conflito colombiano e sua dinâmica duradoura.

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BREVE HISTÓRICO DA CONFIGURAÇÃO DO CONFLITO E DOS VETORES PARA A INTERNACIONALIZAÇÃO

Conforme apresentado anteriormente, existem dimensões históricas que permeiam o conflito armado e suas consequências em um dos aspectos que moldam a colombianidade, conferindo um maior grau de complexidade para o objeto de estudos proposto neste trabalho. Neste sentido, o presente capítulo tem por objetivo demonstrar, através de um breve histórico, como foi dada a dinâmica das referidas dimensões no processo de agravo do conflito armado, indicando os vetores para a internacionalização da crise desde o âmbito político, fundiário e oligárquico. Enquadrado em um histórico político de repressão e de insulamento governamental, o Estado colombiano assistiu a um processo de captura do Estado por oligarquias que ampliavam a concentração de terras e defendiam seus interesses à revelia das demandas da sociedade, conforme adiantado, transformando a insurgência em alternativa formidável às vias institucionais. Este cenário, marcado por descompassos entre sociedade e governo nos termos da representatividade, agravou-se com a questão do narcotráfico e das disputas por áreas de influência entre os grupos que eram financiados através da referida atividade, incluindo mais uma componente na geração de instabilidades dentro do Estado colombiano. Portanto, seguem considerações acerca da configuração do cenário mencionado, resgatando a questão do bipartidarismo, do surgimento dos grupos guerrilheiros e paramilitares, dos domínios oligárquicos e como estas componentes convergiram para um vetor de internacionalização da crise colombiana.

Bipartidarismo, repressão e insurgência: como foi dado o espaço para o surgimento de alternativas às vias institucionais colombianas

Conforme adiantado, subsistem desde a origem do Estado colombiano elementos tradicionais e modernos no sistema político, os quais remetem ao fato de que a partir da independência, foram organizados modelos político-jurídicos pautados em constituições, abrangendo questões como soberania popular, Estado centralizado e a democracia representativa (VELÁSQUEZ, 2011). Tais conceitos eram aplicados em um ambiente de sociedades agrárias tradicionais, organizadas no modelo das haciendas, as quais seriam um

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dos sistemas integradores chave da estrutura do poder social . Convém acrescentar que o poder social referido era restrito às elites dirigentes de localidades específicas do Estado colombiano, as quais posteriormente integraram os históricos partidos políticos Liberal e Conservador. Ora, ditas assimetrias possuem origem territorial conforme anteriormente. Há que se considerar que antes da formação da Grã-Colômbia, preconizada por Simón Bolívar, havia três províncias que reivindicariam por autonomia se as necessidades diplomáticas e militares não prevalecessem; são elas: o Vice-reinado de Nova Granada, a Capitania Geral da Venezuela e a Audiência de Quito. Entretanto, após a morte de Bolívar, evidenciou-se a ausência de laços econômicos consolidados entre as referidas províncias, transparecendo também as diferenças identitárias entre as elites e grandes parcelas da população (BETHELL, 1991). Mesmo depois de perfazerem a separação em três Estados independentes – Colômbia, Venezuela e Equador respectivamente – a economia destas ex- províncias não adquiriu grande desenvoltura, a ponto de um padre colombiano, Federico C. Aguilar, constatar no ano de 1884 que a debilidade colombiana era evidente devido a diversos fatores como: pouca importação e exportação per capita, resultando em baixos retornos financeiros para o governo, poucas milhas de ferrovias construídas devido aos altos preços, pouco movimento nos portos, poucas escolas (BETHELL, 1991). O quadro de assimetrias entre as elites e grandes parcelas da população, mesmo com a cisão territorial, foi transplantado para o Estado colombiano, traduzindo-se em uma querela de natureza fundiária – atendendo aos interesses das elites haciendatárias aplicado no modelo do bipartidarismo e sujeitando a sociedade colombiana a conviver com as heranças da estrutura fundiária desigual desde a ocupação espanhola (ARIAS, 2011). Neste sentido, Cano (2002) indica que a integração geoeconômica do espaço nacional colombiano sempre consistiu em um processo dificultoso devido à heterogeneidade social e econômica, ademais dos acidentes geográficos impingindo desafios na comunicação terrestre entre leste e oeste. Em retomada às várias fragmentações às quais o Estado colombiano encontra-se sujeito, observa-se um amálgama que se desdobra em questões de ordem política, normativa, institucional e social, conferindo um maior grau de complexidade pelo fato dos fracionamentos compreenderem diversas instâncias. No âmbito da política, a fragmentação se deu entre sociedade e governo, conduzindo ao fenômeno de reorientação de lealdades preconizado por Rosenau e Durfee (2000). Calcado 45

GUILLÉN apud VELÁSQUEZ, 2011, p.116

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no dilema da autonomia, o fenômeno de reorientação de lealdades parte do âmbito das coletividades, haja vista a leitura fragmentária de Estado e múltiplas fontes de poder propostas no paradigma do pós internacionalismo. Esta bifurcação e multiplidade de fontes de poder determina relações baseadas em competição, conflito ou cooperação enquanto possibilidades de interação entre as esferas estatocêntrica e multicêntrica, contextualizando a lógica fragmentária e a busca pela autonomia de uma instância mediante outra(s). Transportando esta lógica para a questão das fragmentações colombianas, observa-se uma dinâmica concorrencial na busca pela autonomia envolvendo governo central, mandos locais e a sociedade, transferindo a base de legitimação do governo central aos mandos locais, culminando por fim em querelas de ordem política e normativa. Este contexto fragmentário remete à aplicação do modelo bipartidário colombiano – representado pelos partidos Liberal e Conservador - reproduzindo na sociedade denotado afastamento do espaço político, gerando como resultantes revoltas, repressões, movimentos dissidentes e disputas pelos mandos locais. A este ponto, convém rememorar a constatação de Velásquez (2011), na qual os partidos Liberal e Conservador desempenhavam um rol que antes de representar os interesses específicos da sociedade, pareciam expressar projetos políticos em voga desde outros momentos históricos; desta forma, os partidos mencionados aparentemente formularam seus projetos com primazia no Estado, configurando maior legitimação de processos políticos do que representação social, insulando os canais de comunicação entre Estado e sociedade. Apesar de amalgamados dentro do espectro de efeitos gerados na sociedade colombiana, a base ideológica dos partidos Liberal e Conservador era originalmente dotada de racionalidade:

[...] Os liberais eram membros da elite de latifundiários e comerciantes com uma mentalidade laica, seguidores de Santander e hostis ao que se entendia como os compromissos militaristas e clericais do último período da carreira de Bolívar como Libertador. Os conservadores, que tinham vínculos mais próximos com a aristocracia colonial ou com os círculos oficiais, identificavam-se com a ordem centralizada e com a disciplina social da religião (HYLTON, 2009, p.47).

No entanto, uma divisão sistemática entre os partidos não era estabelecida no Estado colombiano, tanto que ao final do século XIX nenhum destes possuía capacidade para instituir uma hegemonia nacional ou mesmo regional (HYLTON, 2009). Também durante o mesmo período, a fragmentação de setores da população que compunham a sociedade colombiana, sem a devida inclusão destes na órbita dos processos políticos, já se colocava como um obstáculo para a instituição da governabilidade e, a posteriori, transformou-se em uma

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querela de natureza territorial, conforme mencionado a partir da situação da planície amazônica e dos projetos infraestruturais com base na mineração. Conceitualmente, a governabilidade consiste em uma condição estrutural para o efetivo exercício de um governo, baseada em um critério normativo que define o grau de eficiência deste governo através da satisfação do nível de cidadania (GUTIÉRREZ, 2011), objetivo o qual pode ser atingido mediante políticas públicas que contemplem as demandas sociais. As querelas políticas colombianas, ao se pautarem na tomada do poder negligenciando os interesses provenientes de setores da sociedade extra-oligárquica, abriram precedentes tanto para a mobilização das camadas não contempladas pelas ações governamentais quanto para a queda vertiginosa dos níveis de governabilidade, fragilizando o Estado colombiano a ponto de alguns estudiosos o considerarem um Estado em vias de falência46. Como ocorreram tais precedentes e quais os mecanismos que eram empregados para as tentativas concorrenciais de tomada do poder são questões que norteiam tanto a escalada de violência política quanto a ascensão do clientelismo como instrumento de cooptação eleitoral, construindo um cenário que inviabiliza a governabilidade e impede a agregação de conteúdo substantivo à democracia e ao exercício da cidadania. Inaugurado um período intitulado Regeneração, o mando conservador tentou incluir, ao início do século XX, direitos de propriedade para populações fronteiriças a fim de incluí-las na dinâmica clientelista bipartidária, lançando bases para um controle político nestas regiões. Entretanto, a conjuntura instaurada após uma revolta socialista camponesa em Tolima, em 1929, junto à promessa não cumprida de melhores condições salariais e posse de terras, constituíram na dinamite para o modelo conservador católico, ao mesmo tempo em que uma emblemática figura política adquiria projeção e ojeriza simultaneamente: Jorge Eliécer Gaitán, o primeiro político populista a angariar projeção dentro do partido Liberal47. Neste sentido, em um espaço hermeticamente fechado pela tradição oligárquica, dividida entre os que tinham o apoio da Igreja católica (conservadores) e os que promulgaram a Constituição Liberal instituindo o Estado laico (liberais), a missão de democratizar a democracia no Estado colombiano se colocava distante. Em ocasião da depressão de 1929, resultando na fuga de capitais e a crise cafeeira (CANO, 2002), o cenário não estava favorável para tais implementações, 46

Conforme Pureza et al. (2007), Estados em vias de falência são aqueles que não possuem mais a capacidade de salvaguardar condições mínimas para a população civil - como segurança doméstica, justiça, ordem e bom governo – devido ao fato de perder o monopólio do uso legítimo da força – prerrogativa weberiana para o conceito de Estado moderno conforme previamente discutido. 47 HYLTON, 2009, passim.

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considerando que as prerrogativas da cidadania como extensão de direitos políticos e civis (NEIRA, 2010). Contudo, outro vigor econômico e político era inaugurado a partir do período intitulado Pausa Liberal. Houve uma transição pacífica para a gestão liberal em 1930, dada a partir de eleições, entretanto a herança da crise internacional de 1929 afetou o PIB colombiano nos dois anos subsequentes, acarretando moratórias por parte de governos locais que contraíram dívidas no exterior. Contudo, durante o período de 1930 a 1946, o clima de prosperidade econômica conferiu conquistas de natureza trabalhista e reformas sociais como a secularização do ensino, o direito à greve, a instituição do salário mínimo e o pagamento de férias e feriados 48. Apesar destas conquistas sociais, a perenidade não consistiu na marca deste período; progressismo à parte, crescentes dificuldades e obstáculos de natureza econômica permearam a continuidade do processo de industrialização na América Latina e inclusive na Colômbia em seu modelo agroexportador, aumentando as proporções do movimento contestatório latino-americano, tendo este por contrapartida o legado da clandestinidade devido à ação de forças repressoras, as quais visavam findar a luta de guerrilhas. Antes de discutir esta questão, convém retornar à figura de Gaitán, a qual se tornou símbolo de um dos eventos de repressão que mais macularam a história colombiana. Aliando as dificuldades em implementar a continuidade do progresso industrializante mencionado com as dissidências do partido Liberal, as eleições de 1946 foram ganhas pelo partido Conservador. O acontecimento que constituiu no arauto da repressão social se deu em 1948, quando foi assassinado o líder liberal de esquerda Jorge Eliécer Gaitán - um advogado que simpatizava com setores marginalizados socialmente e, consequentemente, angariou antipatias com os setores oligárquicos – o qual tinha consideráveis possibilidades de ser eleito em 1950. El Bogotazo, mobilização discutida previamente, teve como resultado 1500 mortes e 20 mil feridos49, demonstrando a intensidade repressora das respostas aos levantes, principalmente após a retirada do Partido Liberal das eleições de 1950. Logo, deu-se início ao período de radicalização conhecido como la Violencia, no qual os dois partidos, Liberal e Conservador, extravasando os mecanismos de disputa política, se voltaram às armas, declarando uma guerra civil por intermédio dos grupos guerrilheiros, descentralizando a violência e tornando-a em uma variável ascendente (VELÁSQUEZ, 2011; HYLTON, 2009; CANO, 2002).

48 49

CANO, 2002, passim. CANO, 2002, passim.

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Em suma, no final da década de 1950, com a instituição da Frente Nacional - pacto que consolidaria o fechamento político e a desvinculação da Igreja católica com o partido Conservador – pode-se depreender que se trata do ápice de uma dinâmica política de ditadura não formal, contando com um bipartidarismo dotado de fluidez, de ausência de polarização definida, pouco inclinado à estimulação de participação popular, ainda mais se for considerada a coexistência das representações partidárias com os consertos setoriais corporativos e de grupos de interesses. Logo, a heterogeneidade e a multiplicidade de opiniões e forças provenientes da sociedade colombiana não se viam suficientemente representadas, pois o espaço representativo dos partidos vigentes já se via preenchido pelos interesses de grupos pré-determinados, transformando em longo prazo a recepção do Estado como algo traumático, haja vistas às respostas coercitivas a quaisquer contestações de teor reivindicatório (VELÁSQUEZ, 2011; HYLTON, 2009). Entre outras consequências deste período político colombiano, está o paralelismo estatal.

El Frente Nacional, en el período de dieciséis años de permanencia y de ejercicio constitucional, cimentó en el Estado y en el sistema político, el monopolio político, la estabilización de la economía dominante y la ausencia de proyección democrática; además de la falta de representatividad de numerosos sectores surgidos en la diversificación social, producto de la modernización económica y las nuevas masas proletarias. El resultado no fue más que un desbalance que dio al traste con la necesaria fortaleza política que requería el Estado en estas circunstancias, por lo tanto, el perfil de modernización originó el Estado capitalista con fuertes características burocráticas. Y, de manera paralela, emergió un denominado sector paraestatal o de organismos descentralizados, según el nuevo orden administrativo y político que se le había dado al Estado dividido por departamentos y municípios (JIMÉNEZ, 2006, p.40)

Neste sentido estão dispostos os ingredientes para a disseminação da insurgência como alternativa às vias institucionais e como mecanismo de resistência aos interesses oligárquicos, transformando os títeres de disputas extra-políticas em porta-vozes dos conteúdos reivindicatórios, os quais suscitaram ações violentas a partir da década de 1960.

Os grupos guerrilheiros, paramilitares e os espaços vazios: o paralelismo estatal instaurado na Colômbia

Mediante contextualização anterior, foi possível depreender que a estrutura do bipartidarismo na Colômbia, ademais de caracterizar uma negligência às necessidades e demandas sociais, dado o distanciamento formado entre Estado e sociedade não fornecia

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alternativas para o conflito armado que se instaurava na região. Logo, o conflito armado surgiu como uma substituição da política, uma vez que o fracasso das ações políticas culminou no advento de ações denominadas terroristas (RESTREPO, 1988), reforçando a tese de uma cultura de violência na Colômbia 50, instaurada em diversas modalidades. Quanto à violência, ademais de constituir por definição em um elemento de desagregação social - representando um empecilho para a construção da paz – trata-se de uma componente impeditiva para a instituição de melhores padrões de vida ao se desdobrar tanto pelo meio bélico quanto pelo estado de carestia social, desigualdades estruturais entre outros. Neste sentido, mais do que um recurso durante as situações de conflito, a violência consiste em um fenômeno que se desdobra de diversas maneiras, sendo que no Estado colombiano podem ser observadas as variantes estrutural, societal e política, resultando em incrementos da militarização51 conforme os indicados previamente na Tabela 04 e Tabela 05. As assimetrias de diversas naturezas presentes dentro do Estado colombiano, adiantadas no primeiro capítulo, instituíram um ambiente propício para a desigualdade de oportunidades para os cidadãos, que em conjunto com o insulamento governamental, fomentaram conflitos dentro e fora da arena política, mediados por ações coletivas provenientes da insurgência. Neste sistema onde carestia social e desigualdade de oportunidades são reflexos escassez de comunicação entre sociedade e governo, instaurou-se o palco para o desgaste do Estado, advindo da batalha travada entre organizações insurgentes – leia-se FARC - EP e ELN-UC - e forças armadas, gerando, por fim, a sobreposição da campanha de intimidação e aniquilação sistemática de atores democráticos, haja vistas ao estabelecimento de uma democracia pluralista

na

Colômbia

(RESTREPO,

1988;

CENTRO

INTERNACIONAL

DE

INVESTIGAÇÃO E INFORMAÇÃO PARA A PAZ, 2002). O objetivo não é iniciar uma discussão qualitativa acerca da aplicação do conceito de democracia ou analisar sua efetividade dentro do Estado colombiano, sob a pena de desviar o foco da discussão que seria o suscitar da violência ao longo de meio século de conflito armado. Contudo, a propagação da paz encontra-se historicamente imbuída aos valores democráticos, bem como a seus atores, e neste contexto, seguindo a concepção de Galtung, “a paz se define em termos de ausência de violência. A definição, assim como a construção da paz, implicam um movimento contrário a qualquer tipo de violência” 52. Neste sentido, antes de propor uma discussão acerca do sistema 50

Termo a ser explicitado adiante cf. WALDMANN (2007). CENTRO INTERNACIONAL DE INVESTIGAÇÃO E INFORMAÇÃO PARA A PAZ, 2002, passim. 52 GALTUNG apud CENTRO INTERNACIONAL DE ESTUDOS DE INVESTIGAÇÃO E INFORMAÇÃO PARA A PAZ, 2002, p.23. 51

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democrático, visa-se sistematizar, compreender as motivações que levaram um mecanismo de desagregação social oposto à proposta pacífica a ser concebido como instrumento de transformação e, paradoxalmente, integração social, posto que os mecanismos políticos revelavam insuficiências neste aspecto. Antes de dispor considerações acerca da instrumentalização da violência, convém rememorar que o referido conceito consiste em um vetor complexo a ser discutido, principalmente retomado o conceito weberiano de Estado, calcado no monopólio da legitimação da violência por este ator. Logo, o conceito de violência perpassa tanto no âmbito da situação – conforme mencionado anteriormente, tratando-se de um componente de desagregação social e cenário oposto à paz – quanto no âmbito instrumental – mecanismo eleito por organizações para atingir seus fins, o prevalecimento de seus interesses, o que coincide com o meio pelo qual o Estado nas definições de Weber (1919) centraliza o poder em sua figura. Considerando o Estado na dimensão política doméstica sob o escopo dos governos, Tilly (1985) explicita, no âmbito da autoridade, que os governos organizam e monopolizam a violência, pouco importando se este último conceito se aplica em sentido estrito, referindo-se à indivíduos e objetos, ou em sentido geral, remetendo à violação de interesses de um povo por exemplo; à diferença de outras organizações, os governos possuem a prerrogativa de concentrar os meios de violência, legando a questão da legitimidade e da ilegitimidade ao plano secundário. Com isso, lança-se luz a um aspecto fundamental que está em curso dentro do Estado colombiano e consiste em um dos elementos que sustentam a dimensão política do conflito: o dilema de autoridades. Delimitadas brevemente no capítulo anterior as dimensões para o desenvolvimento do conflito colombiano e como este consiste em um registro profundo na colombianidade, convém rememorar que dentre os desdobramentos no escopo da dimensão política encontra-se a questão do dilema de autoridades, favorecido pela dinâmica territorial e originando a partir desta, o mencionado fenômeno da sobreposição de territorialidades. Em retomada ao contexto internacional recuperado no paradigma apresentado por Rosenau (1997; 2000), há que se pautar as análises mediante a instabilidade, a múltipla gama de atores com a prerrogativa da atuação internacional, a porosidade fronteiriça e as múltiplas procedências do poder, o qual segundo o autor não advém apenas das capacidades militares, classicamente alocadas nos estudos internacionais como hard power53. Logo, pressupondo as complexas interações entre as esferas estatocêntrica e multicêntrica dentre de um contexto marcado por fragmentação e

53

Vide NYE Jr., J. S. Soft Power – The Means to success in World Politics, 2004.

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erosão de centralismo de autoridade, tem-se que o lócus da crise corresponda às ações coletivas de cidadãos ou governos, dada à capacidade de mobilização cidadã, o extenso subgrupismo e o consequente enfraquecimento da autoridade governamental conforme o referido paradigma (ROSENAU, 2000). Postas tais considerações, pode-se observar um cenário que possibilita uma concorrência por autoridade ante a fragmentação e a erosão de centralidade governamental, introduzindo o Estado colombiano a um embate doméstico elencando governo central – mediante forças armadas oficiais – e grupos insurgentes – guerrilhas – trazendo à baila a disputa por legitimidade e a reorientação de lealdades como componentes do conflito estabelecido. Na referida dinâmica, donde o subgrupismo apregoado por Rosenau (2000) compreende grupos insurgentes, paramilitares, movimentos sociais entre outros atores que se mobilizam coletivamente desafiando a ordem tradicional através da não conformidade reunindo recursos materiais e não materiais sob a égide ideológica (DELLA PORTA; DIANI, 2006), pode-se compreender que a busca por legitimidade não se restringe apenas em colher os louros da vitória de uma disputa histórica no interior da Colômbia, mas trata-se de um elemento determinante no sentido de prover proteção, assistência à sensação de desamparo em meio à violência e às demandas sociais não atendidas localizadas principalmente às margens do território. Neste sentido,

Legitimacy is the probability that other authorities will act to confirm the decisions of a given authority. Other authorities, I would add, are much more likely to confirm the decisions of a challenged authority that controls substantial force; not only fear of retaliation, but also desire to maintain a stable environment recommend that general rule. The rule underscores the importance of the authority's monopoly of force. A tendency to monopolies the means of violence makes a government's claim to provide protection, in either the comforting or the ominous sense of the word, more credible and more difficult to resist (TILLY, 1985, p.171-172).

Compreendida a questão da legitimidade nestes termos e resgatando as consequências sociais legadas ao Estado colombiano no período da Frente Nacional e a posteriori, é possível compreender a dinâmica que originou e fortaleceu a insurgência na Colômbia por intermédio dos grupos guerrilheiros. À luz de compreender a territorialização desta dinâmica, a aplicação do conceito de sobreposição de territorialidades, proposto por Agnew e Oslender (2010), constitui uma ação necessária. A sobreposição de territorialidades pode ser entendida como um fenômeno proveniente das fragmentações existentes no Estado colombiano, as quais constituem tanto dimensões do conflito conforme apresentado brevemente no capítulo anterior, quanto

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derivações da fragmentação territorial adquirindo outras feições. Não seria suficiente analisar apenas fragmentação territorial no Estado colombiano e sim fragmentações com diversas origens e implicações que se imbricaram até a complexa formação do conflito armado contemporâneo, graças à ação combinada do tempo, da dinâmica política e social. Neste sentido, convém reforçar que apesar da leitura de Réclus mencionada ao início, donde a geografia física de um país não altera o poderio de sua Nação, é possível interpretar que as várias fragmentações ocorridas na Colômbia, derivadas da ocupação concentrada, da falta de ligação entre as margens e os grandes centros urbanos, entre outros fatores gerados previamente discutidos, constituíram veios para a instituição de esferas de poder alternativas ao Estado, traduzidas pelos grupos dissidentes e na consequente batalha pela legitimidade nos termos mencionados. Logo, a fim de explicitar como o Estado colombiano constitui, ademais de um formidável exemplo de sobreposição de territorialidades, é necessário partir do aspecto político novamente para o aspecto geográfico, considerando a variedade de atores que limitam e desafiam a exclusividade territorial do Estado, protagonizando uma luta por espaço (AGNEW; OSLENDER, 2010). A organização do espaço constitui o território e sua dinâmica – territorialidade - e a este ponto, vale abrir um “parêntese” e rememorar, que segundo Agnew (2009), que a territorialidade consiste no uso do território para atingir metas organizacionais, incluindo outros atores ademais do Estado, consistindo em uma das diversas formas de organizar o espaço social e politicamente. Território é um conceito associado particularmente à espacialidade do Estado Moderno com a prerrogativa deste do controle absoluto sobre a população dentro de fronteiras externas cuidadosamente definidas (AGNEW, 2009, passim). Agnew (2009) se afasta, entretanto, da concepção clássica de Estado Moderno, cunhada por Weber (1919), ao passo que para aquele, os Estados não consistem em organizações com a prerrogativa da coerção, visto que estes possuem a prerrogativa de elaborar várias outras funções para e por sua população, não se reduzindo à ameaça. Logo, a legitimidade dos Estados não consiste em uma máscara sob a qual estes ocultam sua inclinação à violência; este conceito implica em um mínimo de consenso. E no espectro do consenso, diversos atores estão incluídos, direcionando a questão para o âmbito social, ou seja, a legitimidade do Estado perpassa pelos diversos atores que o compõem. É por estas veredas que estão entrelaçadas as querelas com o pano de fundo político e territorial elencadas no Estado colombiano: trata-se tanto de uma disputa por espaço quanto de uma busca por legitimidade nos termos discutidos conforme Tilly (1985), angariando maior complexidade à questão que se desenvolve sob a forma de conflito armado.

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Em vias de fechar este breve “parêntese” do âmbito territorial/geográfico e explicitar a respeito da insurgência no Estado colombiano, um pequeno salto temporal de duas décadas na história política há de possibilitar a observação do fenômeno da sobreposição de territorialidades – motivação para a recolocação da dimensão territorial a este ponto. Contrariando as expectativas do senso comum quanto às fragmentações enumeradas brevemente, em meados dos anos 80, mesmo período em que os grupos guerrilheiros se reorganizavam, o Estado colombiano pôs em marcha um programa de descentralização do aparato estatal com a finalidade de solucionar questões da fragmentação institucional, levando as funções estatais através de instâncias estatais e municipais visto que o fechamento do sistema bipartidarista colombiano excluía muitos setores da participação política – questão da fragmentação política via insulamento do governo. Contudo, partindo deste princípio, o Estado colombiano abriu a territorialidade estatal a atores não estatais (AGNEW; OSLENDER, 2010), culminando no fenômeno das territorialidades sobrepostas. Explicitando, trata-se de um processo de reterritorialização decorrente da globalização, realocando a base de identidades culturais e interesses econômicos nas conformidades mencionadas à ambientação metodológica. É neste processo de reterritorialização sobre interesses localizados que se desenvolvem diversas querelas dentro do Estado colombiano, nos marcos da legitimidade, reorientação de lealdades, paralelismo estatal mediante insurgência e centralização do Estado mediante escalada bélica. Logo, caracterizado o cenário e o processo que permitiram a emergência e o fortalecimento da insurgência por intermédio dos grupos guerrilheiros, convém apresentar como estes últimos emergiram e ao atuarem, tornaram o conflito observado em algo mais complexo e peculiar devido às origens e motivações a serem discutidas. O movimento guerrilheiro na Colômbia teve suas origens no período de La Violencia, a partir da guerra civil em 1960, no entanto em questão de “inspiração”, estas foram calcadas a partir do triunfo da revolução cubana. Como forma de protesto social, a militarização do movimento se deu devido às frequentes respostas repressivas por parte dos partidos tradicionais que permaneciam no governo sob a Frente Nacional (RESTREPO, 1988). Neste sentido, tem-se que o conflito que pertencia eminentemente aos campos político e, guardadas as devidas proporções, ideológico, configurou-se em questão armada, refletindo a ausência de mecanismos de participação política e o encerramento da política em interesses escusos à sociedade mediante o bipartidarismo tácito:

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“la"guerra sucia" dirigida por el establecimiento contra la Unión Patriótica y otros movimientos sociales ajenos al bipartidismo, produce resultados contrarios a los que pretende: eliminando alternativas políticas, trabaja en favor de la insurgencia armada. A la vez,- el protagonismo ejercido por el movimiento guerrillero durante la administración Turbay, al copar el espacio político de numerosos embriones de izquierda legal contribuyó a su desarticulación final.”(RESTREPO, 1988, p.11)

No entanto, apesar da configuração de protestos com pano de fundo político, as guerrilhas colombianas não constituem um arranjo alternativo ao governo. Tratam-se mais de uma componente de instabilidade no contexto de governabilidade doméstica, servindo para ressaltar problemas de ordem organizacional no âmbito da democracia instaurada (RESTREPO, 1988). El Bogotazo, levante popular mencionado anteriormente, reuniu estudantes e profissionais gaitanistas54 que assumiram uma escalada de radicalização do movimento, difundindo rebeliões e protestos radicais para demais províncias, caracterizandose pela intensidade e pela generalização da revolta, que adquiriu grandes proporções com seu conteúdo revolucionário. Com a queda do apoio proveniente da capital Bogotá e a falta de coesão, o conjunto de insurreições de sob inspiração gaitanista não teve sucesso em concretizar seus objetivos revolucionários, sendo violentamente reprimido durante o período de la Violencia55. Neste sentido, depreende-se que apesar das inspirações revolucionárias, presentes tanto no movimento guerrilheiro quanto em um dos maiores levantes populares da história colombiana, não existe a proposta de derrubada de um sistema e instituição de um arranjo alternativo equiparável à estrutura do Estado moderno nos cânones weberianos, apesar de a luta armada e a disputa política no marco bipartidário adquirirem feições diferenciadas, revelando continuidade:

[...] No presente, eles têm tido presença permanente no movimento da luta das guerrilhas, com a sociedade aterrorizada diante das ações da FARC e do ELN, nas repressões da força oficial, nos crimes hediondos praticados pelas forças paramilitares de direita e nas ações do narcotráfico (que crescem a partir de meados da década de 1070). Com a chegada da crise nos anos 80, esses problemas crescem, intensificandose também a repressão militar”. (CANO, 2000, p.356)

Logo, os grupos guerrilheiros colombianos advém de dois fundamentos, entrecruzados nas dinâmicas políticas, territoriais e sociais conforme mencionado anteriormente. Para efeito de explicitação, tratou-se da conjunção da violência política com a reorganização social.

54 55

Referente a Jorge Eliécer Gaitán, político populista cujo assassinato desencadeou o referido levante popular. HYLTON, 2009, passim.

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Transformada em ação de caráter revolucionário a partir da decisão de fomentar a construção de uma força militar de combate à opressão proveniente do Estado, a violência política empregada visava à preponderância sobre a sociedade e adquiriu um viés de suplantação do Estado onde este não perfazia suas funções sociais. Quanto à reorganização social, esta constituiu uma manifestação direcionada à defesa do território, eminentemente camponês, constituindo uma resposta militar à ação do Estado sob o espectro da violência política e comunitária. Na conjunção destes dois processos, existe a distinção entre o que se denomina grupos guerrilheiros de primeira e segunda geração, destacando entre os principais grupos ELN-UC, EPL e FARC na primeira e M-19, Quintín Lame, entre outros como segunda geração (CADAVID, 2011a). Esta última denominação é alvo de críticas ao passo que existem maiores complexidades que permeiam a composição dos grupos guerrilheiros, ultrapassando a tipologia simplificadora das gerações mediante critérios que podem ser dispostos em cinco eixos definidos originalmente por Pizarro Leongómez (1996):

[...] El primer eje lo define 'el origen histórico del grupo'; el segundo está configurado por el carácter del proyecto revolucionario del grupo junto con 'la relación social y el papel de lo militar'; el tercero destaca la 'definición del enemigo y objetivos finales'; el cuarto se centra en las 'modalidades de legitimación frente a sus bases inmediatas', y finalmente, el quinto se fija en la 'relación con el territorio: construcción de aparatos de poder y legalidad alternativa'. Así, de esta descomposición y combinación de aspectos militares, políticos y sociales, se definen el tipo militar (el ELN), el tipo partisano (las FARC) y el llamado societal (el MAQL56) (BENÍTEZ, 2006, p.167) .

No entanto, a crítica a estes eixos parte do princípio que a violência instrumentalizada pelos referidos grupos guerrilheiros não é passível de ser dividida em níveis ou categorias principalmente se analisadas as atuações a partir da década de 1970, quando a violência adquire feições peculiares da guerrilha e torna-se uma prática associada aos impactos do narcotráfico e da obtenção de benesses por parte dos referidos grupos, tornando tal segmentação algo que não reflete a complexidade do ocorrido no Estado colombiano (BENÍTEZ, 2006). Quanto à questão de origens de alguns movimentos guerrilheiros, alguns seguem ligados à influências ideológicas de revoluções concretizadas, como o caso da Revolução Cubana, e outros por sua vez, se caracterizam por representarem uma resposta às assimetrias de origem fundiária, concentrando em torno de si a instrumentalização da luta pela terra. Trata-se dos casos do ELN-UC e das FARC-EP respectivamente. 56

MAQL: Movimento Armado Quintín Lame.

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A origem do primeiro conecta-se principalmente no entorno da juventude universitária e de classe média, articulando-se também com as lutas nacionalistas, dos trabalhadores do petróleo, de resistência armada e das guerrilhas liberais das regiões do Magdalena Medio e dos Llanos orientais, constituindo uma espécie de “nova esquerda”, que visava concatenar o descontentamento com a ação armada. Por se tratar de um mecanismo que contempla os trabalhadores do petróleo e apresentar um histórico de atuações em oleodutos, o temor venezuelano da atuação deste grupo como mecanismo de pressão foi respondido através de militarização, algo a ser discutido no próximo capítulo com maior atenção (CADAVID, 2011a; URIGÜEN, 2008). Quanto ao segundo grupo, surgiram das lutas rurais que tiveram lugar às primeiras décadas do século XX, possuindo como antecedentes os conflitos agrários de Sumapaz e Tequendama na cidade de Bogotá. A posteriori, com a luta das elites políticas do bipartidarismo entre as décadas de 1930 e 1940 em conjunto com o contexto da crise mundial, os camponeses se viram forçados a fortalecer laços de lealdades pessoais, familiares e sociais por intermédio de ódio e ressentimento, face à rede de lealdades hereditárias, compadrios e gamonalismo 57 inerentes à permanência das oligarquias do sistema haciendatario colombiano. Uma vez iniciadas as lutas com teor reivindicatório, empreendidas entre camponeses e promovidas por altos níveis de liderança política e ligados à Igreja católica nas regiões de Tolima, Santander e nos Llanos Orientais, o desabrigamento camponês em massa era instaurado até finais da década de 1950. Lançando bases a um novo processo de “colonização” nas regiões de Ariari e Pato, constituem-se os antecedentes das FARC-EP, as quais possuíam uma orientação defensiva em seus primórdios58. Contextualizações à parte, em todos os movimentos guerrilheiros coexistiam duas dinâmicas: a do discurso político e a ação armada, que variava conforme as diferentes táticas empregadas. A concatenação destas dinâmicas com o anonimato no cenário nacional, mantido da década de 1950 até meados da década de 1980 contribuiu para que os grupos guerrilheiros formassem trincheiras em zonas rurais, especialmente em áreas de colonização e naquelas em direção a zonas urbanas, donde não eram tidos como ameaças consideráveis. À base de movimentos de expansão, os grupos guerrilheiros se revelaram hábeis ao se aproveitarem da ausência institucional do Estado e do gamonalismo nas áreas rurais 59, norteando ao porquê desta ausência não se pautar unicamente nas assimetrias sociais, traduzidas nas oligarquias e 57

Fenômeno análogo ao coronelismo, associado às práticas do paternalismo e do clientelismo para angariar influência política. Ver BERNAL, L.H. “Elecciones: entre Gamonalismo y Civilismo. El caso Tumaco en la Costa Pacífica”, 2000. Disponível em: http://redalyc.uaemex.mx/pdf/357/35700403.pdf 58 CADAVID, 2011a, passim. 59 Ibid.

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na concentração fundiária. Apesar de as terras e sua dinâmica constituírem um dos principais veios do conflito ao fornecer base de atuação e determinada legitimidade aos pleitos representados pelos grupos guerrilheiros, um elemento que potencializou as diretrizes políticas voltadas para os centros em detrimento das margens foi o discurso dos espacios baldios, o qual precisa ser inserido em um novo conceito específico espacialidade e projeção de poder. Retornando a Agnew (2003), existem três facetas da visão convencional de poder e dos Estados que foram cruciais na limitação do entendimento da espacialidade ou da organização geográfica do poder como componente restrita aos Estados. A primeira seria a de que a definição de poder implícita no imaginário geopolítico moderno seria a capacidade de coagir demais entes presentes em um dado território a agir conforme sua vontade. Isto leva à noção de poder como o monopólio do controle exercido igualmente sobre todas as localidades de um dado território ou área geográfica por uma elite ou grupo dominante. Contudo, esta conceituação deixa à margem a questão da contingência e da fragilidade do poder infraestrutural (o qual remete à capacidade do Estado em prover bens públicos, serviços, entre outros) a qual seria a base para a legitimidade. Neste sentido, a concepção do exercício de poder por parte do Estado deve ser considerada como algo que está aquém da conformação territorial, visto que: [...] The sociologist Michael Mann (1984) has pointed out in some detail the critical role of infrastructural power in distinguishing modern territorial states (both bureaucratic and authoritarian) from both feudal and classic imperial types of rule (Table 4.1). With the ability to provide centrally and territorially organized services that other organizations cannot, the territorial state is no longer entirely the creature of state elites (and their despotic power). It has an autonomous source of power in its coordinating and directing roles. But this relative autonomy depends upon states delivering a set of services that cannot be provided in some other way. This, of course, opens up to challenge both the regime (current institutions) and the state if the state cannot be depended on to deliver the goods (AGNEW, 2003, p.55).

Neste sentido, uma concepção de espaço mais próxima de uma virtualidade se faz necessária para compreender a dinâmica que sustentou a insurgência dentro do Estado colombiano, não se tratando apenas a reivindicação do monopólio da coerção na conformação clássica60. Tratase de um “novo espaço”:

[...] El nuevo espacio es un espacio-velocidad que vuelve toda acción instantánea, y por ende virtualmente imposible de prevenir, así como potencialmente improbable de castigar. La imagen especular que devuelve esa impunidad de la acción es la “vulnerabilidad de los objetos”, altamente ilimitada e irremediable..., pero es una 60

Conformação weberiana.

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vulnerabilidad que debe ser ocultada a toda costa; porque en efecto, pone en entredicho la capacidad del Estado para cumplir con las labores que el contrato con la nación le exige. Queda así develada la verdad del don que relacionaba al Estado con los ciudadanos, y bien se sabe que enunciar las reglas del intercambio equivale a disolverlo. El Estado queda entonces expuesto a una competencia por producir la imagen (virtual), más creíble de lo que debería ser real (SANABRÍA, 2009, p.38).

Nesta concepção espacial, a ação insurgente enquadra-se como dinâmica rápida e de difícil repreensão, caracterizando-se como uma vulnerabilidade do Estado colombiano, ou mesmo uma resposta dela face às deficiências do exercício do poder na conformação infraestrutural. Logo, a fim de não suscitar questionamentos quanto à capacidade centralizadora do Estado e de suas incumbências com as demandas em nível nacional, em primeiro lugar houve o comportamento de ignorar a organização da insurgência conforme mencionado anteriormente, justificando a ausência das funções estatais via projetos de infraestrutura nas áreas referidas com o discurso dos “espacios baldios”. De início, a insurgência consituía um fenômeno que iniciou atividades timidamente, organizou-se em trincheiras e se demonstrou mais hábil ao suscitar ideologicamente a mobilização social em prol de suas próprias causas, difundindo uma imagem de vilania do Estado e de autodefensas ao território camponês. Apesar da insurgência sob a forma de autodefensas campesinas possuir bases na ausência da função estatal em determinados territórios, pode-se interpretar que o estopim para que a referida dinâmica ganhasse vigor foram os assassinatos promovidos contra membros desmobilizados, aumentando as hostilidades e o grau de violência ao inserir mais um ator no cenário - grupos armados irregulares promovidos pelo exército e norteados por antigos guerrilheiros.

[...] Con la caída de la dictadura militar y la conformación del Frente Nacional, esto es, el acuerdo político entre liberales y conservadores para alternarse el poder cada cuatro años, por un período de dieciséis años, vinieron los planesde rehabilitación y los decretos de reincorporación de los armadosa la vida civil. Los guerrilleros de Sumapaz suspendieron las actividades militares, sin hacer entrega de las armas, conservaron sus estructuras y se organizaron en comités de autodefensa. Pese a querer conservar el carácter pacifista, los asesinatos selectivos por parte del Estado empiezan a provocar a la guerrilla. En1960, son asesinados Silvestre Bermúdez, “mediavida”, hormógenes Vargas, “Vencedor” y Jacobo Prías Alape, “Charro negro”, este último lo asesinó un exguerrillero amnistiado y puesto al servicio de los latifundistas, José María Oviedo, “Mariachi” (JIMÉNEZ, 2006, p. 108)

O verdadeiro fator impulsionador das hostilidades foi o episódio conhecido como Operação Marquetalia, no ano de 1964, o qual sob o governo de Guillermo León Valencia consistia em uma tentativa de extirpar o comunismo agrupado em núcleos na região norte de

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Tolima. Tratava-se de uma ação sob o espectro político ideológico, entretanto estava orientada a Tirofijo e seu grupo, o qual viria a ser intitulado posteriormente de FARC-EP. O resultado da operação, cujos números de envolvidos de ambos os lados revelam imprecisão, foi a tomada de Marquetalia e a reorganização das autodefensas campesinas em guerrilhas móveis, dando início ao que se denomina “guerra de guerrilhas” e a um dos planos de segurança sob a égide norte americana, o LASO (Latin America Security Operation) (VÉLEZ, 2001; JIMÉNEZ, 2006). Dentro deste contexto de geração de insurgência e repreensão a esta, mediante diversas motivações, pode-se observar que houve um continuísmo da dinâmica repressora e do movimento contestatório dentro do Estado colombiano, os quais adquiriram proporções maiores e mais delineadas. Com o passar do tempo, as ações das guerrilhas e da reação a estes grupos - os paramilitares - cresceram na passagem dos anos de 1980 para os anos 1990. A marca dos anos de 90 foi o crescimento da crise, da inflação, da violência tida como comum, do narcotráfico e das ações de guerrilhas e paramilitares na disputa por territórios, ademais do descrédito pelas instituições (CANO, 2000; LAIR, 2001). Logo, observa-se que o Estado colombiano teve que delegar, desde o ponto de vista da coerção, os pilares de sua fundação a indivíduos ou organizações alheios a sua estrutura, situação na qual os próprios cidadãos tiveram que se encarregar de sua própria segurança em uma dinâmica de violência com matizes próprios. Competindo com entes abrangidos pela peculiaridade dos mecanismos violentos e de relativa hegemonia econômica, o Estado colombiano terminou por delegar, mesmo que não intencionalmente, a administração e a violência a setores em que este não foi capaz de abranger mediante a institucionalidade, incorrendo nas arbitrariedades e excessos observados de ambos os lados e, invariavelmente, conferindo “fôlego” ao conflito (SANABRÍA, 2009). Como componente de reação à insurgência representada pelos grupos guerrilheiros, os paramilitares encontram sua origem e raio de atuação desde Los Pájaros - os quais atuavam desde a década de 1950 – intensificando suas ações de direita na região do Magdalena Medio mediante a formação do grupo MAS (Muerte a Secuestradores) na década de 1980. Intensamente imbricados com a rentabilidade da exportação de cocaína e aproveitando de suas benesses de forma superior à da guerrilha, os grupos paramilitares antes regionalizados, se expandiram pelo território colombiano, difundindo a limpeza política e reunindo a prática violenta com a impunidade (HYLTON, 2009). Conforme o mentor das AUC (Autodefensas Unidas Colombia) - o maior grupo organizado de paramilitares do território colombiano Carlos Castaño, o grupo surgiu de divergências políticas, sociais e culturais presentes no

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Estado, visando proteger a princípio a classe média, abandonada à própria sorte (JÍMENEZ, 2006). Neste sentido, pode-se depreender que o fenômeno paramilitar tem relações tanto com a indústria cocaleira quanto com as debilidades do Estado em controlar efetivamente seu território, questão já discutida por outros prismas anteriormente. Contudo, uma determinada cumplicidade por parte do Estado, mediante ações de governo, denota o fortalecimento do paramilitarismo, o qual angariou preponderância na década de 1990.

[...] Não é por acaso que o embrião dos grupos paramilitares esteja relacionado a atos governamentais que legitimaram a existência de grupos de autodefesa. Mergulhado na lógica da Guerra Fria e convivendo com o aumento dos conflitos sociais, principalmente após a criação das FARC, em 1964, e do ELN, em 1965, o governo colombiano publicou o Decreto 3398, de 1965, permitindo a criação de organizações de defesa civil, e a Lei 48, de 1968, possibilitando à sociedade a formação de exércitos privados para sua defesa e proteção contra a violência das guerrilhas (SANTOS, 2011, p.34).

Portanto, ressalta-se a dinâmica territorial do conflito ocultada pela violência e pela belicosidade do conflito. Mais um reflexo desta característica, mencionada anteriormente através de explicitações do fenômeno da sobreposição de territorialidades, seria a tática empregada pelos paramilitares – e posteriormente pelos próprios grupos guerrilheiros - nas áreas rurais: o desabrigamento, acompanhado dos elementos que caracterizam a ação violenta como ameaças, desaparecimentos e assassinatos no exercício do controle nas áreas urbanas periféricas (SANFORD, 2003). Inserida a componente paramilitar neste cenário de busca por territórios, influência, legitimidade e controle das atividades ilícitas baseadas no narcotráfico – cuja temática será tratada no capítulo adiante, em conjunto com as dinâmicas de contrainsurgência aplicadas até o governo Uribe – abre-se espaço para que questões como a suposta falência do Estado colombiano entrem em voga, baseadas na existência de áreas não governadas e no “delegar” involuntário de funções básicas como a segurança de territórios por exemplo. A mencionada conivência do Estado ao propiciar o fortalecimento das autodefesas e da atividade paramilitar através dos mecanismos legislativos – dado o equívoco do discurso dos espacios baldios – pode dar abertura a esta interpretação em um primeiro momento, principalmente se forem consideradas as diversas assimetrias e fragmentações às quais o Estado colombiano encontrase sujeito. Contudo, é possível que o Estado detentor do 4º PIB da América Latina 61 e de um dos exércitos melhor treinados do mundo, ademais de altos repasses orçamentários para a Defesa, pode ser considerado um Estado falido? As delegações de atividades e, a posteriori, 61

Vide Tabela 03.

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os veios de intervenção seriam suficiente justificativa para esta consideração? A fim de tecer considerações acerca destas questões, há elementos fundamentais que regem esta dinâmica: os interesses em nível local e em nível internacional. A título de esclarecimento, o estágio de carestia social, bem como outras “afecções sociais”, não consiste em uma componente compartilhada por todo o território colombiano e sequer pode ser considerada de maneira uniformizada. Trata-se da reprodução em assimetrias previamente discutidas, beneficiando apenas aos burgueses. Prosseguindo para se discutir o conceito de Estados frágeis, falidos, ou colapsados (fragile, failed and collapsed state – FFCS) há que ilustrar algumas categorias de hierarquia, nas quais os Estados bem sucedidos são aqueles que garantem a grande maioria dos serviços públicos – ordem, segurança, justiça, infraestrutura, saúde, moradia, entre outros - e qualidade nestes serviços a seus cidadãos; os frágeis seriam aqueles que carecem no provimento destes serviços ou os ofertam com menor qualidade que os Estados bem sucedidos; e, por fim, os Estados falidos ou colapsados são aqueles incapazes de garantir qualquer serviço público essencial aos seus cidadãos (PUREZA et al., 2006). Ao observar a presente hierarquização, um dos primeiros questionamentos passíveis de surgir seria qual o elemento norteador para o estabelecimento destes conceitos que visam enquadrar os Estados em níveis de bem estar aos cidadãos. O provimento destes serviços garante a inexistência de uma estrutura que impulsione conflitos como o observado no Estado colombiano? Além de se tratar de uma projeção de poder através do cunhar conceitual, a presente hierarquização, na tentativa de estabelecer qual seria o modelo de um Estado bem sucedido e seu oposto, seria um reflexo de polarização ideológica sob a forma de abstrações que não contemplam as fímbrias e complexidades do plano real:

[...] This vision must be submitted to a twofold critical approach. On one side, the concept itself of failed state is both descriptive and prescriptive. It describes a long lasting situation of crisis of horizontal and vertical legitimacy. But it also insinuates the imperative of a fixed standard of state capacities and instruments. This prescriptive strategy tends to ignore two things: first, the turbulence caused by the imposition of western modernity and its social and political imperatives in postcolonial societies; and second, the cumulative effects of different (and often opposed) strategies, from colonial times until the neoliberal global market, on local societies and governance structures (PUREZA et al., 2007, p.1).

Logo, considerando as limitações da classificação mencionada e visando compreender a dinâmica recorrente do conflito colombiano, contemplando os vetores que desenvolveram e sustentam o conflito até os dias atuais, convém considerar um prisma que possibilite observar

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de forma mais próxima as complexidades brevemente mencionadas acerca de como a insurgência se tornou uma alternativa à institucionalidade e uma das componentes do conflito armado e de como a contrainsurgência também angariou altos custos sociais. É neste sentido que a pesquisa de Sanford (2004) discorda da premissa de falência estatal aplicada ao caso colombiano:

Rather, it is a state in which the actions of the elected government, bureaucratic agencies, and legal apparatus are, in large part, determined by the reconstitution of the state and its infrastructure at its margins through the army’s use of surveillance and state-sanctioned violence, including the use of proxy paramilitary forces. Moreover, many who argue that Colombia is a failed state also favor strengthening the Colombian army, which indicates a more than implicit recognition of the army as integral to state power. At the same time, this argument contradicts the failedstate thesis (SANFORD, 2004, p.256).

Conforme observado, trata-se antes de uma dinâmica de combate ao mecanismo violento empreendido pelos grupos guerrilheiros através da violência sancionada pelo Estado através das forças oficiais e do paramilitarismo, alterando a reconstituição do Estado em suas margens conforme se altera o governo eleito. Neste contexto, são criadas margens de gradação para o conflito armado mediante presença ou ausência de espaços para negociação com os grupos insurgentes, ações de política de segurança com maior ou menor componente bélica, entre outras questões a serem tratadas adiante. Para o momento e para fins de explicitação dos questionamentos propostos, ressalta-se que a dinâmica do conflito colombiano possui, conforme apresentado anteriormente, um viés territorial, social, político e normativo, expressos ora nas assimetrias observadas no Estado, ora nas disputas por centralização do poder político e instituição de arranjos em paralelo ao governo central. A complexidade deste cenário não se trata de um fator determinante para equiparar o Estado colombiano à categoria dos referidos FFCS sob a pena de minimizar as colombianidades e utilizar-se do reducionismo de um panorama rico em problemáticas e perspectivas. Dentro do panorama do poder paralelo instaurado nos espaços vazios de função estatal, pode-se observar que as revoltas populares que tiveram lugar antes do estabelecimento das autodefesas camponesas - a posteriori, as táticas empregadas pelos grupos guerrilheiros constituíram instrumentos de difusão de diversos interesses, os quais permaneciam ocultos pelo manejo estatal restrito às oligarquias tradicionais. Entretanto o emprego da violência como recurso para levar estas questões adiante, em conjunto com um desvirtuamento do intuito de defesa de demandas sociais para um controle territorial do rentável narcotráfico, se fizeram valiosos elementos na tentativa de remover o conteúdo norteador da insurgência

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colombiana, equiparando-a ao terrorismo mediante discursos governamentais e veículos midiáticos. Neste âmbito, ademais da componente bélica, um elemento que não pode ser negligenciado e consiste em um fomento ao conflito colombiano seriam os discursos - armas justificadoras para o emprego das diversas táticas de recentralização adotadas ao longo do câmbio dos governos centrais. Por se tratar de uma questão de discursos norteados por interesses, convém desmistificar algumas fímbrias entre os conceitos de insurgência e terrorismo antes de adentrar a um comparativo das políticas adotadas no âmbito da contrainsurgência ou combate ao terror, que tomaram lugar preponderantemente a partir de 2002.

Terrorismo ou Insurgência? Existem diversas definições e pouco consenso no que tange ao conceito de terrorismo, visto que

What is now called terrorism took very different forms. It is worth noting, for instance, that the term “terrorism” started to be used by media and public opinion only in the second half of the 1970’s. The political violence of the first half of the decade was instead called by different names: extremism, subversism, squadrismo and stragismo” (DELLA PORTA, 1995, p.106)62

Dentro do escopo de atuação dos grupos mencionados anteriormente, existem aproximações e distanciamentos com o fenômeno mencionado que requerem especial observação, em principal se forem associados à conveniência dos discursos proferidos ora pelo governo, ora pela seara internacional, os quais não se encontram à margem da defesa de seus respectivos interesses. Portanto, convém elucidar alguns aspectos concernentes a estas diferenças antes de se adentrar a uma discussão acerca do aumento da beligerância observado no Estado colombiano em período recente. Considerando os grupos terroristas como forma de organização política clandestina, o terrorismo pode ser definido como a atividade destes grupos a partir de atuações ilícitas visando à transformação profunda de instituições estatais quando a evolução de atuações 62

Tradução nossa: “O que agora é denominado terrorismo adquiriu formas diferentes. Vale observar, por exemplo, que o termo “terrorismo” começou a ser utilizado pela mídia e pela opinião pública apenas na segunda metade da década de 1970. A violência política da primeira metade da década, por sua vez, teve outras denominações: extremismo, subversão, squadrismo e stragismo”.

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coletivas traduzidas nos protestos não constituiu em um mecanismo satisfatório para atingir o referido fim (DELLA PORTA, 1995). Trata-se de um fenômeno recente tanto em nomenclatura quanto em aplicação se considerado o paradigma do pós-internacionalismo, no qual a prerrogativa de mobilização das coletividades, subgrupos e entes não estatais em geral consiste em algo relativamente recente, posto o fenômeno da globalização e seus respectivos fluxos, alterando a dinâmica das relações entre os diversos atores no cenário internacional (ROSENAU; DURFEE, 2000). Entretanto, caso tenha-se em mente que a mobilização de uma coletividade sob a forma de movimento social se forma a partir da generalização de insatisfações e da insuficiência dos aparatos institucionais para sanar esta questão, dentro de um contexto em que as normas tradicionais não correspondem mais à expectativa dos indivíduos (DELLA PORTA; DIANI, 2006), como distinguir o terrorismo de uma mobilização social, mediante parâmetros que o diferenciem da insurgência? Apesar de não constituir o foco das discussões propostas, a referida questão tangencia as políticas adotadas e as consequências do transbordamento do conflito colombiano, consistindo em um vetor cuja explicitação se faz necessária – em principal para fins de compreensão da política de segurança colombiana ao longo do período Uribe. Neste sentido, convém explicitar em primeiro lugar, as dinâmicas das ações coletivas traduzidas no ciclo de protestos e como o último, por sua vez, pode desembocar nas ações denominadas terroristas mediante opções de atuação e o recurso à violência. Primeiramente, convém elucidar que as ações coletivas são consideradas no escopo do advento da globalização e da pluralidade de atores com a prerrogativa de atuar doméstica e internacionalmente, características descritas por Rosenau e Durfee (2000) na conformação da esfera multicêntrica. Portanto, para se compreender o dilema de autonomias e a questão dos alinhamentos dentro da dinâmica da legitimidade, se faz necessário deixar como segunda instância a questão do dilema da segurança, preponderante em diversos debates dos estudos das Relações Internacionais, e ter como órbita a autonomia de atuação como “prêmio” dentro das dinâmicas de centralização – descentralização, estatocentrismo – multicentrismo (ROSENAU; DURFEE, 2000). Neste sentido, a compreensão do papel do Estado e o contexto em que ele está inserido ante a convivência com os demais atores transcende a questão de segurança em ocasião da natureza humana, conforme os termos de Hobbes (2003) ou de defesa da propriedade privada nos termos de Locke (2006). Trata-se de termos análogos aos apresentados às referencias de Estado bem sucedido conforme a teoria do FFCS, respondendo progressivamente pela economia no decorrer do século XX e pelo bem estar, situação que trouxe consigo as desigualdades sociais. Portanto, segundo Della Porta e Diani (2006), a

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influência do Estado na formação dos atores coletivos não se dá apenas na definição de fronteiras de caráter territorial à ação política, mas no controle dos meios de sobrevivência e na alocação dos recursos públicos a áreas significantes para a ação coletiva enquanto satisfação de necessidades básicas, como moradia e transporte por exemplo. A significância destes aspectos se amplia principalmente nas regiões em que há carestia deles, se aproximando do cenário colombiano retratado nas discussões anteriores. Entretanto este fator não exclui a existência das disputas por territórios, influência e controle de matérias estratégicas nas mais diversas regiões do Estado colombiano, sejam áreas que provêm produção rural, como cultivo de café, sejam áreas de mineração. Pécaut (2000) enumera o aumento do emprego da violência em regiões auríferas mediante a cobrança de impostos por parte da guerrilha – zona do Baixo Cauca, Antioquía, e o sul de Bolívar – além das áreas produtoras de carvão e dos polos de criação de animais no Magdalena Medio, rota estratégica na órbita paramilitar desde a década de 1980. Neste sentido, o autor suscita sua discordância com a associação da violência em áreas mais pobres, descrevendo que a questão parte mais da desorganização social e das desigualdades:

Es decir que la hipótesis simplista según la cual la violencia echa raíces en la miseria es menos aceptable que nunca. La hipótesis inversa, formulada por algunos economistas, según la cual estaría directamente asociada a la rapidez de las transformaciones económicas, "claramente correlacionada con la expansión económica" y las zonas de salario rural elevado, y todavía más, según la cual existiría una «correlación cuasi inversa entre el desarrollo económico departamental y el grado relativo de violencia », no nos parece uma simplificación menos considerable. Ciertamente, ella vuelve a tomar nota de la concentración de la violencia alrededor de los polos de riqueza. Pero el "grado de desarrollo" no es sino un indicador bastante vago. Pues esas zonas "prósperas" presentan otras tres características. Ellas atraen a numerosos migrantes y la distribución de los ingresos es allí singularmente desigual. La brutalidad de los booms locales conduce a inversiones anárquicas. Como otras zonas pioneras, ellas escapan ampliamente a las instituciones estatales y padecen a menudo de infraestructuras insuficientes. Más que la "riqueza", la desorganización social que resulta de estos tres rasgos explica la intensidad de la violencia. Las organizaciones armadas pueden, ciertamente, tomar allí el aspecto de autoridades de sustitución. Pero es raro que logren evitar la expansión de la violencia desorganizada (PÉCAUT, 2000, n.p.).

Conforme discutido quanto às origens dos grupos guerrilheiros e dos paramilitares, entes do paralelismo estatal, ambos expandiram sua atuação mediante as assimetrias compreendidas no Estado colombiano, as quais foram discutidas antes de adentrar as veredas históricas da questão colombiana e seus atores. Neste sentido, a consideração de Pécaut de dissociar a violência das regiões economicamente desfavorecidas é aparentemente generalista, visto que apesar de os grupos paralelos deterem e disputarem por território, influências e matérias

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estratégicas para seu financiamento e lucro, foi apresentado que estes angariaram maior atuação justamente às margens do território colombiano, preenchendo os vazios de atuação estatal previamente discutidos e gerando o fenômeno do dilema de autonomia e legitimidade. A questão da desorganização social isolada do contexto de regionalização - e conformações espaciais diferenciadas no Estado colombiano - aparentemente não se vê capaz de explicar a violência como instrumento aplicado ao longo do conflito armado colombiano, tão pouco como o próprio Estado em sua atuação assimétrica desempenhou papel fundamental para a emergência do paralelismo estatal como mecanismo de ação coletiva. A validação desta consideração está no que Pécaut (2000) considerou como elemento potencializador da violência: a fragmentação do Estado colombiano. O autor versa que:

Con una sociedad dividida y fragmentada, con un Estado sin autoridad, la unidad simbólica de la Nación apenas si tenía la oportunidad de ser reconocida. El pluralismo de los partidos y de sus facciones haciendo las veces de democracia, no bastaba para suscitar un sentido de una ciudadanía común y menos todavía el de un espacio común de arreglo de los conflictos. Tantos elementos que conducen a la complementaridad del orden y de la violencia. Las instituciones y la vida económica testimonian una asombrosa estabilidad. Pero las disputas entre facciones partidistas comportan su dosis de violencia potencial o real. La precariedad del Estado lo condujo a que funcione de la misma manera en el caso de los enfrentamientos sociales, aquellos de las zonas centrales, pero todavía más aquellos de las inmensas zonas periféricas colonizadas a partir de 1950 por abundantes migraciones sobre las cuales el Estado no tenía ningún control, ni en su punto de partida, ni sobre todo en su punto de destino, con el riesgo, en este último caso, de dejar establecer situaciones de desorden y de violencia que llevaran a los colonos a aceptar la tutela de poderes de facto (...). En fin, la fragilidad de la unidad simbólica de la Nación contribuyó a que las delimitaciones entre lo legal y lo ilegal sigan siendo inciertas y a que el horizonte local siga siendo más concreto que el horizonte nacional. Este contexto no implica que Colombia haya sido permanentemente el teatro de una violencia efectiva (PÉCAUT, 2000, n.p.).

Portanto, convém enaltecer a conjunção de fatores como base analítica a nortear os presentes processos de compreensão acerca da colombianidade. Mais um elemento que se faz necessário explicitar dentro do contexto da violência, da paraestatalidade e das ações coletivas é a questão do ciclo de protestos. Conforme Della Porta (1995), o referido ciclo é constituído por uma série de decisões individuais e coletivas que partem para uma ação coletiva conflituosa na parte dos atores do movimento e externos a este, além das respostas destas ações por parte das elites bem como de outros atores. Trata-se, ademais, de uma dinâmica que se estende a diferentes setores sociais e áreas geográficas. Neste sentido, o aumento da violência destes grupos seria influenciado por características inerentes à estrutura de oportunidade política em diferentes fases do protesto. Isto equivale

82

inferir que a estrutura política encerrada nas elites políticas colombianas, alinhadas ao partido liberal ou conservador, aliada à situação de carestia social fomentou tanto os protestos que foram violentamente reprimidos à época de La Violencia e da Frente Nacional quanto a formação do paralelismo estatal a posteriori, visto quefoi mantida uma mesma estrutura de oportunidade política, produzindo diferentes resultados/efeitos na organização de movimentos sociais (DELLA PORTA, 1995). Considerando os movimentos dissidentes representados pelos grupos guerrilheiros nesta qualidade, pode-se inferir o porquê destes possuírem diferentes objetivos, representando diferentes vozes em seu clamor pelo atendimento de demandas. Entretanto, no mesmo diapasão do ciclo de protestos relativos à movimentos sociais e ações coletivas adquirindo formato e proporção, se encontra o terrorismo, ao final do ciclo mencionado (DELLA PORTA, 1995), imbuindo maiores dificuldades no processo de dissociação dos conceitos de terrorismo e insurgência. Em verdade, as aproximações são diversas seguindo as análises de Della Porta (1995) e conforme explícito na tabela a seguir.

Tabela 7 - Ciclo de protestos e terrorismo: diferenças e aproximações com a insurgência Interesses não intermediados Repertórios

não

Repertórios violentos

violentos Ex:

Movimentos

Influências de Ideologias Radicais

sociais, mobilizações, etc. Criam uma rede de indivíduos socializados na forma de ação violenta

Grupos

que

Grupos que utilizam a violência regularmente

utilizam a violência de forma irregular Não criação

Criação de estruturas ilegais

de estruturas ilegais Estratégias diferentes clandestinidade Insurgência

Clandestinidade da

como

Estratégia

adotada Terrorismo

Elaboração Nossa (2012), com base em DELLA PORTA, M. Left Wing Terrorism in Italy, in: CRENSHAW, M. (org). Terrorism in Context, 1995.

83

Conforme tabela anterior, há diferenças sutis acerca da insurgência e do terrorismo principalmente pelo fato de estes fenômenos compartilharem origens, o recurso à violência de forma regular e pertencerem a estruturas ilegais. A sutileza se encontra na opção pela clandestinidade como estratégia, mas a grande dificuldade de classificação habita em conceituar o que vem a ser o terrorismo e o que se decide intitular de terrorismo. Outra questão abordada por Visacro (2009) seria que os elementos constitutivos do terrorismo incluem, ademais da clandestinidade, a questão da publicidade e da meta psicológica, visto que sem um alcance midiático e consequências comportamentais derivadas de um impacto na memória social e no psicológico dos indivíduos, o ataque terrorista torna-se imbuído de inocuidade. Estes elementos específicos não fazem parte constitutiva da insurgência em sua conformação original na ideologia política, conforme apresentado anteriormente, contudo tornam-se elementos incidentais ou reflexos do emprego da violência e dos discursos construídos. Ainda conforme Visacro (2009), terrorismo remete ao pragmatismo das militâncias organizadas, as quais se valem da violência como recurso a fim de resultados práticos e quanto ao que se intitula terrorismo, trata-se de um enquadramento jurídico de tipificação criminosa angariando utilidade política. Posto isto, configura-se uma das querelas mais complexas ao tipificar fenômenos domésticos ou internacionais como terroristas ou não à revelia de um padrão conceitual universal. Transportando tais constatações para as dimensões do conflito colombiano apresentadas anteriormente, é possível identificar os elementos que são passíveis de gerar a insurgência mediante a adoção do recurso à violência ou a mobilização social por intermédio de grupos e movimentos pacíficos. Ambas as situações são motivadas por questões do insulamento governamental, encerramento político em si mesmo e demandas sociais não atendidas – conforme explicitado em breve histórico previamente mencionado. Os movimentos e protestos reprimidos, o Bogotazo, as lutas camponesas que geraram as autodefesas, a formação dos grupos paramilitares, entre outros consistem em indícios da insurgência, no caso de a tabela 07 ser utilizada como base analítica.

Entretanto, o

questionamento remanescente seria quanto à terminologia terrorismo, visto que o fato de esta existir e difundir-se cumpre algum propósito. Esta questão permanecerá para o próximo capítulo, donde se discutirá a exportação midiática para o cenário internacional da referida terminologia, bem como a mudança de paradigma na contrainsurgência colombiana. Portanto, pode-se inferir que ambos os processos – insurgência e terrorismo – ocorrem no Estado colombiano, haja vistas às diferentes interpretações conferidas aos desdobramentos

84

da violência em forma de conflito armado. A importância terminológica se dá de forma mais expressiva na análise do conflito e suas implicações em nível internacional. No entanto, enquanto questão doméstica e independentemente da terminologia adotada, é conveniente ressaltar a mácula histórica deixada pelo período de La Violencia, contribuindo para que o recurso à violência seja banalizado a ponto de parecer “normal”, difundindo-se pelo território em su consequências observadas apenas quando adquirem grandes proporções. A falta de um conhecimento específico sobre o outro, suscitando estigmas (ESTRADA, 2009) é uma questão que dificulta decifrar o âmbito político além dos termos amigo-inimigo, impedindo um alinhamento massivo (PÉCAUT, 2000). Quanto aos efeitos na população colombiana,

El traumatismo anterior está demasiado vivo para que la población se comprometa sin inquietarse en un conflicto general. Esta población también sabe demasiado bien que la violencia no conduce necesariamente al quebrantamiento de las estructuras de dorninación, que rápidamente se convierte en un modo de funcionamiento paralelo, con sus ganadores y sus perdedores, que tienden a ser "siempre los mismos", que está destinada a fragmentarse, dando nacimiento a fenómenos locales heterogéneos que no pueden desembocaren ninguna ruptura política. Se lo verá más lejos: en ocasiones en que la opinión pública se manifiesta, lo hace rechazando toda perspectiva de enfrentamiento de conjunto. Los recuerdos de La Violencia no son lo único que está en juego. Desde la Independencia, los colombianos no saben que orden y violencia están unidos, como el revés y el derecho de la misma realidad, a falta de un principio de unidad nacional (PÉCAUT, 2000, n.p.).

Apesar do aparente fatalismo da consideração anterior, a falta de um princípio integrador como a unidade nacional, desenvolvido em conjunto com a colombianidade de maneira a conduzir à sensação de pertencimento, consiste em um pilar para a sustentação do conflito em suas conformações previamente discutidas. As outras dimensões mencionadas instituem o desenvolvimento do fenômeno. Neste contexto de retornos, a maculada memória histórica de violência na Colômbia em conjunto com o contexto político se insere em círculo vicioso em que a violência se torna catalisador de si mesma.

85

Violência, narcotráfico e o conflito colombiano

Apresentar questões acerca do conflito colombiano sem considerar a peculiaridade da economia ilícita pautada no narcotráfico desenvolvida naquela região é ocultar uma face que também molda tanto a colombianidade quanto a dinâmica do conflito armado. Apesar de não constituir o foco dos esforços analíticos aqui presentes, o narcotráfico e seus efeitos possuem centralidade na vida colombiana e compreender a vinculação desta atividade com a difusão da violência recorrente é um esforço que se faz necessário, por mais sucinta que seja sua construção a seguir. O narcotráfico na Colômbia adquiriu maior expressão a partir da década de 1970, aliado a dois pilares que fizeram esta questão adquirir grandes proporções: a economia ilegal e a violência. A estratégica localização geográfica colombiana auxilia neste sentido, tornandoa quase como uma passagem obrigatória para as trocas de mercadorias legais e ilegais – em virtude da conexão com o Panamá e o acesso bioceânico (RESTREPO, 2005). Assim, pode-se compreender que o narcotráfico, aliado ao contrabando e à exploração de esmeraldas consiste em outro meio potencial para o transbordamento do conflito colombiano - mesmo que não explorado extensamente no presente trabalho - devido à internacionalização de seus efeitos através dos produtos destas atividades a ganhar territórios em escala mundial. Conforme Coggiola (2004), o narcotráfico é na atualidade um dos negócios mais lucrativos do mundo, sendo a América Latina a maior produtora mundial de cocaína e a maior parte do tráfico internacional da droga detida pela Colômbia, cujos maiores cartéis são os de Mendellín e Cali. Portanto, um ponto de inflexão na questão do combate às drogas materializado pelo Plano Colômbia – a ser retomado adiante – e a lucratividade do narcotráfico seria as benesses concedidas a setores financeiros dos EUA com o tráfico de entorpecentes ademais da primeira posição no ranking mundial de consumo de cocaína pertencer ao referido país, esvaziando o conteúdo prático do plano (WINER et al., 2006). Dentre apropriações de conhecimento comum acerca do narcotráfico estão suas consequências na vida política, social e econômica no âmbito doméstico colombiano. A mais preocupante, segundo Restrepo (2005) é o financiamento de grupos paraestatais pelo narcotráfico, internacionalizando a questão e tornando a resolução do conflito interno mais complexa por ampliar o escopo da questão e seus envolvidos. Dentro deste escopo encontrase a relação Colômbia - Estados Unidos. Dada a relação entre os grupos armados ilegais e o narcotráfico como um dos mecanismos de financiamento, as relações entre Colômbia e Estados Unidos flertam com a hipótese do fim do narcotráfico determinar o fim da

86

paraestatalidade e do conflito armado. Não obstante, existe uma dualidade para ambos os atores mencionados: a luta do Estado colombiano partindo dos eixos de erradicação do narcotráfico e de seus atores envolvidos asimultaneamente ao esforço para a repatriação dos dólares do lucrativo negócio mesmo com a mudança de governos; aparentemente o narcotráfico surge como um problema potencial para os Estados Unidos, haja vista à expressividade do consumo de cocaína no referido Estado, entretanto, os vizinhos do norte encontram benesses na atividade tanto por fornecerem matérias primas para o refino da droga, quanto por encontrarem na cruzada contra a “narcoguerrilha” uma justificativa para difundir o intervencionismo para a América do Sul (RESTREPO, 2005; COGGIOLA, 2004). Neste âmbito, também foi cunhado o conceito de narcoterrorismo, definido como a expressão do terror financiada com os recursos do narcotráfico e dentro do contexto das disputas pelo controle das áreas de plantio e refino das drogas, ademais dos mercados consumidores internos (VISACRO, 2009). Logo, observa-se um racho entre pesquisadores: os que consideram estes conceitos novos como definições que delimitam o escopo de atuação para o intervencionismo estadunidense, mediante os discursos da cruzada contra as drogas e combate ao terror; e aqueles que consideram as organizações paraestatais - paramilitares e as FARC-EP - como organizações narcoterroristas63. A questão que sustenta esta classificação remonta à época da queda de preço da coca (1994) e do aumento dos cultivos em regiões afastadas do controle estatal, ou seja, os espaços vazios de controle estatal mencionados anteriormente, os quais foram preenchidos pelos grupos guerrilheiros e paramilitares com a cobrança de impostos aos cultivadores, processadores e traficantes (THOUMI, 2009). A este ponto, convém conectar as presentes considerações à problemática dos litígios territoriais, das brechas normativas e da sobreposição de territorialidades, realçadas pela segurança provida por agentes paraestatais (guerrilheiros ou paramilitares) e capilarizada para o âmbito do narcotráfico, na medida em que tais agentes lucram com os impostos em troca de prover apoio aos agentes do tráfico (THOUMI, 2009; AGNEW; OSLENDER, 2010). Desta maneira, instaura-se uma problemática endêmica, por ser associada às diversas facetas do conflito e constituindo por si mesma em uma modalidade de transbordamento do conflito colombiano, apesar de não constituir no objeto de estudo deste trabalho.

63

Um posicionamento mais claro quanto a este “impasse” estará contido nas discussões dos efeitos do transbordamento do conflito colombiano em nível internacional, a ser apresentado no capítulo 4 do presente trabalho.

87

Para o momento, independentemente deste racho conceitual, observa-se que ademais de imbuir um escopo maior ao conflito, a questão do narcotráfico trouxe consigo o temor da intervenção e a identificação do Estado colombiano como ameaça para os Estados vizinhos (BARRAGÁN, 2007), diminuindo o horizonte para o desenvolvimento de uma resolução em âmbito regional. A relação entre o narcotráfico e a violência é dada na medida em que esta atividade é pautada na ilegalidade, não angariando respaldo mais adequado do que o recurso à violência para instauração efetiva, a fim de minimizar os riscos da produção e da comercialização da droga e garantir renda às oligarquias. Garantia de domínio e renda, à revelia da institucionalização e da credibilidade da lei e da ordem, são as motivações para o emprego da violência na promoção da referida atividade (PÉCAUT, 2000). Explicitando esta questão em conjunto com o perfil do traficante na atualidade:

[...] El objetivo de integración que tienen los traficantes hoy los lleva a apoyarse em sofisticados consejeros políticos, jurídicos, comerciales y financieros y en su bajo perfil y comportamiento como hombres de negocios corrientes. Construyen vínculos con los negocios lícitos y parecen contribuir con el desarrollo político y social. La ilegalidad de su principal negocio les fuerza a mantener el uso de la violencia como una opción para proteger sus bienes y resolver sus conflictos por lo que han generado una demanda de servicios de seguridad, intimidación y retaliación suplida por las organizaciones armadas y el crimen organizado (THOUMI, 2009, p.103).

Em suma, a grande síntese e também gênese do conflito colombiano perpassa por parâmetros territoriais, sociais e históricos, donde a permanência de assimetrias e questões não resolvidas fada o Estado à extensão do conflito armado até a contemporaneidade e ao círculo vicioso da violência como componentes tradicionais. Por se tratar de uma questão recorrente, o recurso à violência pode ser observado tanto nos esforços insurgentes, quanto nos contrainsurgentes, conferindo mais máculas à sociedade colombiana. Encerrando a busca pela captação sucinta da colombianidade em meio à dramática situação de conflito, depreende-se que a imersão em complexidades, na busca de detalhes que retratem o quadro colombiano, seja a partir de ambientações conceituais, seja a partir de incursões em breves históricos de contextualização foram partes de um processo que norteou as intenções do presente trabalho até este ponto. A partir do próximo segmento, a estratégia será a de aplicar as sucintas bases metodológicas às problemáticas em desenvolvimento.

88

A ESCALADA DO CONFLITO COLOMBIANO E A ASCENSÃO DE ÁLVARO URIBE

Apresentadas as facetas do conflito colombiano, como estas moldam a alma da sociedade colombiana e como se dá a entronização da violência - elemento recorrente e passível de utilização tanto pelo lado da insurgência quanto pelo lado oposto a esta - convém tecer considerações acerca de como se deu propriamente a escalada do conflito colombiano ante a materialização de seu transbordamento. Para tanto, o presente capítulo será estruturado sob a forma de um panorama sobre fatores que sustentaram acontecimentos relativamente recentes dentro do âmbito do conflito colombiano, como a emergência de Álvaro Uribe na presidência colombiana e a escalada de beligerância nas operações de contrainsurgência, cujo estopim se materializou com a intervenção no Equador em 2008. Neste contexto, o presente capítulo se subdivide temáticamente nas principais questões que permearam os antecedentes do referido episódio, quais sejam: um comparativo entre os ambientes de negociação anteriores à gestão Uribe no concernente à questão da insurgência e das drogas; a ascensão de Uribe à presidência mediante um projeto de centralização e de uso ostensivo do militarismo; apresentação de alguns aspectos da Política de Segurança e Defesa Democrática, demonstrando as principais componentes de beligerância da referida política - traduzidas no Plano Patriota e dentro do marco jurídico na Lei de Justiça e Paz - e por fim, a intervenção do Equador como um indício pronunciado do transbordamento do conflito, coroando todos os processos interligados de fragmentações e assimetrias intrínsecas ao conflito colombiano conforme apresentado anteriormente no segmento de ambientações. Portanto, pretende-se estabelecer análises mediante uma observação panorâmica do período de 2002 a 2008 a fim de compreender como as diferentes dimensões do conflito encontraram seu ápice na crise política e diplomática de 2008.

89

Negociação, insurgência e o combate às drogas : algumas considerações sobre governos e contextos que antecederam a gestão Uribe

Conforme apresentado anteriormente, a insurgência surgiu como um mecanismo alternativo às vias institucionais em virtude do o fechamento político colombiano - mediante a preponderância das oligarquias no sistema bipartidário e o insulamento governamental – suscitando a busca pelo atendimento de demandas sociais e conferindo feição à dimensão política do conflito. Conforme Neira (2010), a insurgência é um fenômeno associado ao déficit de democracia no Estado colombiano, cujo memoriário político é pautado na repressão e em reformas políticas com expressão relativamente baixa, dadas as manchas da “guerra suja” travada contra setores sociais e políticos pertencentes à esquerda. Ainda conforme o autor, o legado colombiano a partir dos anos 90, após a promulgação da Constituição de 1991, são os reflexos das tensões sociais em torno de três eixos principais: a crescente violência proveniente da insurgência, do paramilitarismo e do narcotráfico; a imposição do neoliberalismo; e por fim a difícil construção de uma democracia mais plural e includente. Somados a estes aspectos está a crescente intervenção norte-americana, assim como o foco do presente

trabalho:

a

internacionalização

do

conflito

colombiano

mediante

seu

transbordamento (NEIRA, 2010). Foi sob este contexto, em resumo, que houve a ascensão de Álvaro Uribe Vélez ao poder. Entretanto antes de adentrar a uma discussão mais detalhada acerca das políticas desenvolvidas pelo referido dirigente, bem como seus efeitos, convém realizar um comparativo dos ambientes de negociação instaurados em governos anteriores, estabelecendo os seguintes parâmetros de observação: pontos que compreenderam mudanças e pontos remanescentes no que tange a questão do conflito armado. Trata-se de um importante movimento de recapitulação visto que os ambientes de negociação estabelecidos foram diferentes a cada alteração de governo e, ademais das trocas refletirem parcialmente os anseios de uma sociedade cansada de conviver com um duradouro conflito civil (VILLA; OSTOS, 2005), estas também foram responsáveis pelas bases de sustentação de uma “virada à direita” no governo colombiano, representada com a eleição de Uribe para presidente. Foi demonstrando anteriormente, no capítulo destinado à ambientação e ao desenvolvimento da noção de colombianidade, que o cenário colombiano consiste em um panorama de alta complexidade, elencando diversos atores, interesses e dimensões para o conflito em voga. Levando este entendimento para um espectro prático, o conflito armado que

90

toma lugar na Colômbia consiste em uma luta de caráter insurrecional levada a cabo pela guerrilha a fim de instaurar, via revolução, a ordem social e um Estado que a proteja, não se limitando exclusivamente ao âmbito das armas - dadas as táticas e estratégias econômicas, sociais, políticas e psicológicas imbuídas na causa (ARIAS O., 2008). Neste sentido, a questão transcende a dinâmica de disputa armada por poder e não corresponde à instituição de um arranjo alternativo ao Estado (RESTREPO, 1988), fugindo à lógica maniqueísta da difusão da violência e se inserindo cada vez mais na lógica da sobreposição de territorialidades e demais litígios que o Estado colombiano necessita solucionar (AGNEW, 2009; 2010), como a questão da permeabilidade fronteiriça e da erosão institucional do Estado (ROSENAU, 1999; ROSENAU; DURFEE, 2000). Portanto, a instauração da paz consiste no cerne das motivações para a solução política e para a instauração de ambientes de negociação com a insurgência. Esta não deve ser vista apenas como instrumento de erradicação de agentes violentos, representada pelo desarmamento e pela desmobilização dos entes paraestatais, mas sim como um meio de conduzir à reprodução de condições estruturais nos âmbitos político, econômico e social em detrimento da tradicional reprodução da violência (ARIAS O., 2008), interrompendo o fenômeno que Waldmann (2007) intitula de cultura de violência colombiana64. Existem níveis ou gradações para a instauração da negociação, os quais servem de parâmetros operativos em sua implementação, conforme ilustrado na tabela abaixo:

Tabela 8 - Níveis de negociação dentro do conflito armado Nível

1° - nível vertical

Atores/ questão envolvida

Relevância

Governo e grupos guerrilheiros

Analisar a forma como funciona

(caso colombiano).

a

negociação

e

seus

componentes a fim de viabilizála com eficácia. Processos paralelos aos

2° - nível horizontal

que

A necessidade da construção de

tomam lugar no interior daquele

consensos

que

legitimidade e respaldo interno

envolve

diretamente

partes negociantes.

as

e

alcance

de

para cada ator a fim de garantir solidez à negociação.

64

Termo designado pelo autor para indicar um conjunto de fatores que levam à difusão da violência no Estado colombiano, sendo os principais a falta de monopólio da coerção por parte do Estado, a dominância de eixos horizontais do conflito, a questão do narcotráfico e a estrutura de classes sociais na sociedade colombiana, refletindo as tensões e desigualdades sociais e a concentração das classes médias nos centros urbanos (WALDMANN, 2007).

91

Bases de apoio humano de cada

A necessidade de dintinguir os

uma das partes negociantes

espaços global, nacional, setorial

3° - nível subterrâneo

e regional (no âmbito dos efeitos do conflito e na extensão de suas resoluções). Potências

que

apoiam

influenciam no conflito.

ou

Demonstração do voluntarismo na resolução do conflito haja vista

ao

advento

do

multilateralismo e da polifonia como 4° - nível exterior

consequências

da

globalização, além do aumento contigencial e de participação de atores no cenário internacional, segundo as relações entre as esferas

estatocêntrica

multicêntrica

e

(ROSENAU;

DURFEE, 2000). Elaboração Nossa, 2012, com base em ARIAS O., Gerson I. Una mirada atrás: procesos de paz y dispositivos de negociación del gobierno colombiano. Bogotá, Colombia: Fundación Ideas para la Paz (FIP). Serie Working Papers FIP, 2008, n.4.

Apresentados os níveis pelos quais a solução negociada do conflito armado se desenvolve, convém explicitar como esta possui um peso histórico no Estado colombiano, seja pelo tecido de alianças e apoios angariados aos projetos político-militares, seja pela maneira como os atores envolvidos pensaram e referenciaram o conflito em torno da agenda da Paz, mediante um balanço dos processos de negociação que adquiriram diferentes feições em cada governo colombiano (GUTIÉRREZ, 1999). Intercalações entre elementos militares e voluntaristas fizeram parte de um regime de tentativas de encerramento da violência a partir dos anos 50, configurando a bipolaridade governo-guerrilhas enquanto a paz permanecia na linha do horizonte (GUTIÉRREZ, 1999). Neste sentido, a tabela a seguir tem por objetivo estabelecer um limiar comparativo entre as estratégias adotadas e os ambientes de negociação estabelecidos, com vistas a demonstrar o contexto da ascensão de Uribe além do âmbito da intervenção norte-americana.

92

Tabela 9 - Comparativo das estratégias governamentais adotadas quanto ao ambiente de negociação com a insurgência Governo Turbay

Governo Barco

Governo Samper

(1978-1982)

(1986-1990)

(1994-1998)

Estratégia básica adotada:

Estratégia básica adotada:

Estratégia básica adotada:

Normalização da situação pública, se

Retorno

moral das Forças Armadas.

centrando nas causas objetivas da

fundamental

Principais ações:

violência e menos na negociação em

erradicação objetiva da violência,

Criminalização dos protestos e dos

si.

retomando as ações de caráter

movimentos insurgentes; detenção

Principais ações:

consultivo e gerencial da Comissão

preventiva prevista na Constituição

Responsabilidade e supervisão direta

de Ação pela Paz.

de 1981; criação de uma Comissão

das Políticas de Paz centrada na

Principais ações:

ad-hoc a fim de estudar o ponto de

figura do Presidente; omissão do

Criação da Comissão facilitadora

vista dos grupos armados para

termo paz e emprego de conceitos

da Paz de Antioquia (1995) –

fornecer

parâmetros

mais amplos, como reconciliação,

primeira iniciativa formal regional,

jurídico

legal

normalização

sob a responsabilidade de Álvaro

Militarização

e

manutenção

e

reitengração destes

de

caráter

promover

a

reabilitação;

Paz e

tema

busca

pela

(1981); ensaios de entendimento

participação

diálogos

com o M-19 (1982).

aproximações

Adversidades/ consequências:

dando

Renúncia

(1982);

Guerrillera Simón Bolívar (CGSB),

Conciliação Nacional, do Fundo de

queda de legimitidade por parte do

com dirigentes das FARC-EP, M-19,

Programas Especiais para a Paz

governo e a preponderância do

ELN-UC, EPL, PRT e MAQL;

(1997), do Conselho Nacional da

elemento

militarização

Paz

Comissão

militar

sobre

elaboradas

as pela

da

Comissão

com

início

à

com

a

nas

guerrilha,

Coordinadora

o

estatuto

Vélez;

a

como

Uribe

recomendações

sociedade

e

da

negociação horizontal e aumento da

da

à

da

com

aproximação

e

o

a

ELN

e

desmobilização de paramilitares; criação

da

(1998)

Comissão

e

da

de

Assembleia

antiterrorista (1988).

Permanente da Sociedade Civil

Comissão, refletindo a beligerância

Adversidades/ consequências:

pela Paz (1998); disposição do

sobre os mecanismos de negociação.

Aumento do recurso indiscriminado

governo a celebrar acordos sobre a

à violência, traduzido no extermínio

zona de distensão, facilitando a

de integrantes da UP, massacres em

abertura a negociações.

áreas

Adversidades/consequências:

camponesas;

desconfiança

e

da

aumento

da

impunidade;

Escândalo

político

sobre

a

aumento contingencial das frentes

campanha ter sido financiada com

guerrilheiras antes do processo de

recursos do narcotráfico, reduzindo

negociação; acordo político com o

a

M-19 em 1990 (desarmamento);

superditação da política às armas,

mesas de trabalho pela Paz e

dificultando a saída do conflito

legitimidade;

o

legado

da

93

Reconciliação Nacional.

armado;

o

interesse

pela 65

manutenção da CONVIVIR

e

outras cooperativas de segurança rural,

fomentando

o

paramilitarismo e reduzindo o monopólio da coerção por parte do Estado.

Governo Betancur (1982-1986)

Governo Gaviria (1990-1994)

Governo Pastrana (1998 – 2002)

Estratégia básica adotada:

Estratégia básica adotada:

Estratégia básica adotada:

Diálogo e abertura, numa tentativa

Ligeira continuidade das estratégias

Retomada do voluntarismo político

de

de Paz do período Barco, usando

mediante aproximações com as

Comissão em críticas aos elementos

como

de

FARC-EP - as quais estavam mais

repressivos da gestão anterior.

negociação

e

distantes do diálogo – e a criação

Principais ações:

concentrando esforços no combate à

de Zonas de Distensão.

Revitalização da Comissão de Paz,

violência;

de

Principais ações:

conferindo seu caráter consultivo e

elementos

da

Relativa desmilitarização para as

de assistência às áreas de economia,

observância

internacional

às

tentativas de negociação através

política, sociedade, recuperação e

negociações;

reinserção

dos

das Zonas de distensão; criação da

desenvolvimento

desmobilizados.

Agenda Comum para a mudança

melhoramentos da justiça e da

Principais ações:

rumo a uma nova Colômbia (1999)

segurança e eficiência de ações e

Fortalecimento do controle civil

– agenda de negociações com as

gasto público; criação de um projeto

sobre órgãos públicos estratégicos

FARC-EP; avanços com o ELN de

de lei de anistia geral e do PNR

como o DAS; revisão nas penas dos

maneira

(Plano Nacional de Reabilitação),

narcotraficantes para submetê-los à

Comissão dos Notáveis (2001) para

instituindo mecanismos formais de

justiça com a promessa de não

uma reaproximação com as FARC-

negociação e mudanças nas políticas

extradição; conversações com a

EP; criação da Comissão dos

de paz; reconhecimento do caráter

CGSB;

Países

político dos grupos insurgentes,

Assessora de Reinserção; redesenho

processo de Paz entre o Governo e

estabelecendo a negociação política

político com a Constituição de 1991,

as

como critério básico na busca pela

avançando rumo a um pacto político

Espanha, França, Itália, Suécia,

paz;

social.

Suíça,

nacional e cessar fogo (ADO, EPL e

Adversidades/consequências:

Venezuela).

M-19)

Operação Colômbia (1990) como

Adversidades/consequências:

Adversidades/ consequências:

reflexo de uma “guerra integral” –

Intermitências entre os diálogos,

Aumento das proporções do conflito

ofensiva do exército ao secretariado

que se seguiam congelados com o

na região do Magdalena Medio,

das FARC-EP e a retomada das

avançar de hostilidades e ataques;

65

retomar

a

tentativa

Paz

através

de

de

um

da

regiões,

diálogo

exemplo

o

com

modelo o

M-19

incorporação humanitários

criação

da

e

Comissão

paralela;

Facilitadores

FARC-EP

criação

para

(Canadá,

México,

da

o

Cuba,

Noruega,

Consiste em um plano do governo colombiano que concatenou os Servicios de Vigilancia y Seguridad Privada (1994), o qual mais tarde veio a ser intitulado de CONVIVIR. Constituiu na legalização de serviços de segurança privada, também exercidos pelos grupos paramilitares, visto que estes foram considerados ilegais em 1989 (HUMAN RIGHTS WATCH, 1998).

94

levando

à

criação

de

na

ataque do ELN a Machuca (1998);

renúncias

reintegração das FARC em 1991;

suspensão dos diálogos (1999),

massivas da Comissão, levando à

manutenção da CGSB em uma

bons

sua

1986;

tentativa de trazer a negociação à

Sociedade Civil e retomada do

reacionarismo dada a falta de apoio

órbita do governo (1991-1992);

diálogo em 2000; fracasso nos

político e a crise de legitimidade,

acordos de Paz definitivos com o

esforços com o ELN dada a

desencadeando a tomada do Palácio

EPL, o PLT e o MAQL; outros

oposição de setores sociais e a

da Justiça (06/11/1985); arrebatada

acordos de paz com a CRS, as

expansão do paramilitarismo e da

paramilitar contra desmobilizados,

milícias de Medellín e a Frente

violência.

militantes da UP.

Francisco

comissionado especial;

desintegração

em

um

hostilidades,

traduzida

Garnica

de

ofícios

oferecidos

pela

la

Coordinadora Guerrillera.

Elaboração Nossa, 2012, com base em ARIAS O., Gerson I. Una mirada atrás: procesos de paz y dispositivos de negociación del gobierno colombiano. Bogotá, Colombia: Fundación Ideas para la Paz (FIP). Serie Working Papers FIP, 2008, n.4, e em GUTIÉRREZ, William L. Las Políticas de Paz y los Procesos de Negociación em Colombia. Breve balance y perspectivas. Toluca, México: Universidad Autónoma del Estado de México – Convergencia – Revista de Ciencias Sociales, 1999, ano 6, n. 19, pp. 245-274.

Analisando a tabela 9, algumas tendências podem ser observadas ao longo dos câmbios de governo e políticas respectivamente, quais sejam: 

Alternância entre políticas mais voltadas ao emprego da força, caracterizadas pelo combate direto à insurgência, e políticas voluntaristas, caracterizadas por críticas aos elementos repressivos, e tentativas de negociação com os grupos insurgentes, mediante com conversações e cessar fogo;



Alternância entre o reconhecimento dos grupos paralelos como pertencentes à insurgência e o discurso com o esvaziamento das prerrogativas políticas dos referidos grupos, suscitando a mobilização destes e o distanciamento das possibilidades de negociação;



Aumento da violência ante a oposição de setores sociais a determinadas políticas empregadas e aumento da atuação paramilitar;



Aproximações e distanciamentos de uma solução negociada principalmente com as FARC-EP e o ELN-UC, associadas com as alternâncias de políticas entre negociação e combate direto à insurgência.

95

As tendências previamente relacionadas moldaram de certa maneira os ambientes de negociação, fazendo com que os níveis de negociação adotados mudassem conforme a estratégia básica adotada em cada gestão. Conforme a tabela 09, pode-se verificar que elementos mais humanitários e voluntaristas encontram-se presentes nos últimos governos, enquanto elementos mais militarizantes encontram-se nos primeiros, tramitando entre os níveis de negociação dispostos na tabela 08 e envolvendo mais atores ou mesmo transformando a questão doméstica em preocupação internacional. Neste sentido, compreende-se que as alterações nos níveis de negociação também consistem em um viés para a internacionalização do conflito, ao servirem como veículo que angaria a atenção e a participação de Estados externos à questão. Portanto, o processo de paz, apesar de demandar esforços domésticos, invariavelmente, consiste em um esforço conjunto, dada a prerrogativa do 4° nível de negociação. A importância de discutir acerca dos dispositivos e níveis de negociação, ademais dos ambientes através da história dos processos de paz habita na possibilidade de reconstruir a memória institucional do Estado colombiano, demonstrando que a solução política e negociada para o conflito armado não perpassa unicamente pelo cessar fogo (ARIAS O., 2008). Outra questão apresentada pela tabela 09 seria a recorrência das oposições políticas e de setores da sociedade, engendrando manobras para a queda da popularidade desta ou daquela gestão. Este fenômeno em conjunto com os atentados e o aumento da violência reforça a prerrogativa política da atuação do paralelismo estatal, realçando as origens destes atores em detrimento dos discursos que vieram a posteriori. Considerando observações relacionadas às tabelas 08 e 09, está a questão do apoio ou não da campanha presidencial pelos cartéis de drogas, suscitando uma postura mais combativa ou não ao tráfico. Em caráter de exemplo, enquanto o governo Turbay e suas componentes mais militarizantes, provenientes da intervenção estadunidense, preocupava-se com o combate ao narcotráfico – traduzido na ratificação do tratado de extradição para os Estados Unidos em 1978 – o governo Samper foi alvo da mudança de estratégia dos cartéis, tendo o apoio destes em sua campanha e acarretando um escândalo político sucedito por uma crise de governabilidade - plataforma para que os grupos guerrilheiros e paramilitares angariassem maior poder sobre o território colombiano (THOUMI, 2009). O governo sucessor, sob a administração de Andrés Pastrana, mostrou-se ineficaz quanto à saída negociada e transformou o processo de paz com as FARC-EP em algo que meramente existia, mas não possuía funcionalidade. Também foi o iniciador de um intento de militarização e retomada do controle do território colombiano mediante a aplicação do Plano Colômbia, o qual a partir de 2001, com a designação dos grupos guerrilheiros e paramilitares de terroristas pelo governo

96

dos EUA –aliás, narcoterroristas – transformou-se mais em um mecanismo de combate à insurgência do que de combate ao narcotráfico propriamente (THOUMI, 2009). Haja vistas a estes dissensos, a violência aumentou, as falhas da solução negociada como mecanismo de contenção do conflito armado e obtenção da paz tornaram-se mais evidentes em detrimento do voluntarismo e dos esforços empreendidos para o objetivo mencionado. Entretanto, apesar deste quadro possuir um estopim durante a gestão de Pastrana, tratava-se de um retrato com construções que remontam ao período de La Violencia e que, após o período de fechamento político, foi se agravando a partir da gestão Turbay. Dando indícios de amenização da guerra sucia66 desde a administração Betancur, o paramilitarismo e suas ações pareciam ter recrudescido nestes intentos de busca pela paz, no entanto esta situação não corresponde à resultante de mais de vinte anos de esforços contra o conflito armado dado o perdurar de componentes que indiciavam que a estratégia de paz seguia travestida de guerra (OSPINA, 2007). Entretanto, outro acontecimento importante dentro do referido marco temporal concerne à instituição e intensificação do Plano Colômbia a partir do atentado de 11/09/2001 nos Estados Unidos. Com o discurso de instituição de um plano de desenvolvimento conjunto, reativação econômica e defesa dos direitos humanos para a instituição da paz, o governo Pastrana, apesar de ser mal sucedido na instauração da paz negociada e da diplomacia com a insurgência, logrou a imposição do Plano encabeçado por Washington, abrindo espaço para que a primeira categoria de transbordamento do conflito colombiano vigorasse, isto é, o transbordamento no marco interventivo (OSPINA, 2007). Os fatores que sustentam esta hipótese advêm da distribuição dos recursos econômicos - e sua aplicação - provenientes dos Estados Unidos, divididos basicamente conforme segue: 

Treinamento e equipamento das Forças Armadas a fim de apoiar a expansão da operação antidrogas na América do Sul – investimento de US$ 416,9 milhões;



Modernização dos sisntemas de comunicação e serviços de inteligência no âmbito militar – investimento de US$ 378,6 milhões;



Treinamento e equipamento da Polícia Nacional da Colômbia – investimento de US$ 115,6 milhões;

66

Remete-se à intervenção paramilitar contra a população civil, como por exemplo as ações de “limpeza social” descritas em Sanford (2003).

97



Desenvolvimento econômico e atividades que sirvam como alternativa à economia ilítica baseada no cultivo de matérias primas para o processamento de narcóticos – investimento de US$ 106 milhões;



Reforma do sistema judiciário, combate à corrupção, sequestro, lavagem de dinheiro e promoção dos direitos humanos – investimento de US$ 119 milhões;



Apoio a programas regionais e ao processo de paz – investimento de US$ 183 milhões;



Manutenção de um efetivo de 500 militares e 300 civis norte-americanos em território colombiano;



Renomeação da Escola das Américas, após o término da Guerra Fria, para Instituto do Hemisfério Ocidental para a Cooperação em Segurança, o qual fornecia treinamento e apoio ao Exército colombiano 67.

Neste âmbito existem questões estratégicas que devem ser consideradas. A primeira é que uma parcela dos investimentos foi remanejada para a compra de equipamentos bélicos, elevando a Colômbia à categoria de “principais países receptores de arma mentos pesados e semipesados, treinamento de forças de elite e de assessoria em inteligência militar por parte dos EUA”, transferindo o eixo de preocupações do Plano de um caráter de reconstrução e desenvolvimento para um caráter armamentista, beligerante (SANTOS, 2006). Logo, o combate ao narcotráfico associava-se à cruzada contra o terrorismo internacional, transformando-se em veículo de extermínio da insurgência. Ademais deste remanejamento, cuja aquisição foi feita em empresas norte-americanas, convém ressaltar o interesse em recursos minerais estratégicos, como o petróleo por exemplo. A salvaguarda de corporações norte-americanas ligadas ao petróleo, mediante a manutenção do vínculo interventivo em território vizinho de um Estado com postura de desalinhamento aos interesses dos EUA - ou seja, o Estado venezuelano - é algo incidente no âmbito das consequências do Plano Colômbia, principalmente se agregada esta condição à posição do Estado colombiano como terceiro exportador de petróleo para os EUA na América Latina (DE CASTRO, 2008; OSPINA, 2007). Além disso, o combate ao narcotráfico mediante o emprego de armas químicas a partir das fumigações dos cultivos de coca, contando com insumos da Monsanto em aviões da Dyn-Corp (SANTOS, 2006; HYLTON, 2009), ampliam a margem para constatações de que os processos para a paz mediante soluções negociadas tornavam-se 67

SANTOS, Marcelo. O Plano Colômbia e o primeiro mandato de Álvaro Uribe (2002-2006). Revista Cena Internacional, vol. 8, n. 2, 2006, 63 – 83pp.

98

incongruentes com as aplicações do Plano iniciado ao governo Pastrana, evidenciando a primazia de interesses estratégicos exteriores à revelia de considerável parcela da população colombiana, que lém de tudo, agora estava exposta às ameaças à saúde e à alimentação dado o referido procedimento (OSPINA, 2007). Tratava-se do início das políticas de “terra arrasada” na Colômbia, donde imperou a estratégia de “retirar a água dos peixes do aquário” (OSPINA, 2007; HYLTON, 2009). Agregadas estas constatações acerca da ingerência estadunidense no conflito ao previamente anunciado fracasso das negociações com as FARC-EP, à desilusão por parte de muitos colombianos e à grave crise econômica que se instaurou no Estado colombiano nos anos finais do século XX, estão dadas as condições para a “virada à direita” através da alternativa militarista apresentada pelo governo Uribe a partir de 2002 (VILLA; OSTOS, 2005; THOUMI, 2009; NEIRA, 2010).

Álvaro Uribe e o projeto de centralização: instaurando a cruzada contra o terror mediante a beligerância de Estado

Candidato dissidente do partido liberal, Álvaro Uribe Vélez se apresentou como uma alternativa militarista ante o avanço das FARC-EP durante as gestões anteriores, em uma convocatória ao povo colombiano traduzida da Política de Seguridad y Defensa Democrática (PSDD). O exercício da democracia - a despeito da nomenclatura dada ao plano político – consistiu na moeda de troca, em nome da centralização do poder pelo Estado colombiano (NEIRA, 2010). Em um contexto de urgência pela instauração da paz, a eleição de Álvaro Uribe constituiu tanto em uma demonstração clara dos resultados deficitários da política de negociação e paz de seu antecessor, quanto uma receptividade positiva às declarações de sua carta de intenções caso fosse eleito presidente: o Manifiesto Democrático -100 Puntos Álvaro Uribe Vélez68. A referida carta de intenções, bem como o primeiro discurso presidencial, exalta-se uma conclamação aos colombianos para a instauração de mudanças, com uma amenização dos “tons combativos” no que tange à violência no discurso de posse 69, em principal no excerto em que Uribe alude que o recurso à violência não pode ser prerrogativa nem para combate ao Governo, nem para sua defesa. Quanto aos referidos documentos, ao agregarem 68 69

Vide texto na íntegra no Anexo 2. Vide texto na íntegra no Anexo 3.

99

elementos de caráter nacionalista, em um chamado às classes necessitadas, com o personalismo e o considerável impacto midiático, lançam bases de comparação com o fenômeno do populismo a partir de novas vestes – resguardando as devidas proporções. Trata-se de um “populismo” orientado a solucionar os novos desafios impostos pelo contexto da globalização na contemporaneidade (HERNANDÉZ, 2007). Ainda conforme Hernandéz (2007), esta contextualização do populismo para a Colômbia, equiparando-a ao neopopulismo, está mais ligada à extensa popularidade angariada por Uribe mediante seu projeto de segurança no âmbito da PSDD e da instauração do Estado Comunitário do que de um projeto populista nos termos encontrados nos demais Estados latino-americanos. No Estado colombiano as experiências mais próximas ao populismo se centraram nas figuras de Gaitán e Alianza Nacional Popular (ANAPO), sob a liderança do general Rojas Pinilla. Apesar da referida classificação – neopopulismo – não se restringir apenas ao contexto do discurso personalista e paternalista, o argumento da promoção da cidadania com questões como segurança, paz e defesa, ademais do uso daquela como veículo contra a corrupção e a politicagem fomentaram o ambiente de novidades que permeou a gestão Uribe. A “fórmula” para esta consecução foi um discurso de integridade nacional, salpicado por elementos de encargo pessoal com a nação e beligerâncias no concernente aos problemas sociais e à luta contra o terrorismo (HERNANDÉZ, 2007; COLOMBIA, 2007). Neste sentido, observa-se, antes de uma releitura do populismo segundo peculiaridades colombianas, a tentativa de instituir um mecanismo de administrar os efeitos provenientes da globalização, tais como a fragmentação identitária e a corrosão das estruturas do estatocentrismo (CASTELLS, 1999; ROSENAU; DURFEE, 2000). Como a segurança constitui o problema mais grave enfrentado pelo Estado colombiano, o pronto enfrentamento às adversidades por meio da cidadania serviu como plataforma para que Uribe angariasse votos em sua campanha presidencial. Ademais,

[...]También influyó en ello la descomposición de los partidos y su consecuente efecto de adquirir mayor importancia en esa intención la imagen de los candidatos. Detrás de la bandera ideológica del Presidente electo de dar prioridad al principio de autoridad frente al de libertad, con fines de recuperar la seguridad, se observa un ambiguo modelo de gobierno fuerte ratificado con pretenciones como la de reformar la Constitución, con el objetivo de remover los obstáculos jurídicos que se supone impiden confrontar con éxito a la subversión (BUITRAGO, 2002, p.58)

Estabelecendo uma desoxigenação da saída negociada com as condicionantes previstas tanto no Manifiesto Democrático, quanto no discurso de posse como presidente em 2002,

100

Uribe sintetizou um firme exercício da autoridade, sem abandonar aquilo que julgou corresponder ao bem estar coletivo da sociedade – segurança – hasteando a bandeira da democracia (BUITRAGO, 2002) mediante condicionamentos a quaisquer intentos de negociação ao cessar fogo prévio por parte dos grupos armados ilegais. O resultado foi a negativa por parte dos grupos guerrilheiros e avanços com os grupos paramilitares, traduzidos em aproximações informais com estes atores do conflito (ARIAS O., 2008).

A partir da

instituição desta etapa, estava concretizada a distinção da gestão Uribe em relação às anteriores, anunciando um recrudescimento da política de segurança do Estado colombiano, centrado na figura emblemática de um presidente com suspeitas ligações com os narcotraficantes - como a sua chegada à fazenda em 1983 após o assassinato de seu pai, Uribe Sierra, em um helicóptero de Pablo Escobar, o número um do narcotráfico colombiano (HYLTON, 2009). Outras coincidências que permeiam o plano pessoal de Álvaro Uribe, ademais dos negócios ilícitos e obscuros por parte de seu falecido pai, o conectam tanto ao paramilitarismo quanto aos narcotraficantes, como por exemplo, uma propriedade sua fazer fronteira com a propriedade de Salvatore Mancuso – comandante paramilitar e uma das principais figuras das AUC – a ascensão de Moreno Villa como principal importador de permanganato de potássio do país durante a gestão de Uribe como governador de Antioquia (1995-1997) – matéria prima fundamental para o processamento da cocaína – entre outros aspectos e especulações de cunho não oficial, dado o não julgamento em Corte (HYLTON, 2009). E de determinada forma, este histórico se correlacionou com a política aplicada por Uribe enquanto presidente da Colômbia ao longo de oito anos.

101

Figura 5 - Esboço esquemático acerca das providências tomadas durante a gestão Uribe quanto ao paralelismo estatal

Declaración por la Paz De Colombia

AUC

Aproximações por Comisión Exploratória de Parte do Paz Governo

Autodefensas Campesinas Bloque Central Bolívar BCB Vencedores de Arauca Alianza del Oriente

Acuerdo Santa Fé de Ralito – 15/07/2003

Comisión Facilitadora da Paz de Antioquia

ELN

Tentativas de Aproximação por Parte do governo Casa de Paz em Mendellín Conversações em Cuba Havana (2005 -2007)

X Afastamento por parte Do governo

Tentativas concatenadas No Acordo humanitário

Alto Comisionado Como não efetivo Enquadramento Do grupo como Ameaça terrorista

Comisión de Facilitación

Ley de Justicia y Paz (2005) Elaboração Nossa, 2012. Com base em ARIAS O., Gerson I. Una mirada atrás: procesos de paz y dispositivos de negociación del gobierno colombiano. Bogotá, Colombia: Fundación Ideas para la Paz (FIP). Serie Working Papers FIP, 2008, n.4, e em HYLTON, Forrest. A Revolução Colombiana. São Paulo: Editora Unesp, 2009.

102

Observando a Figura 5, pode-se constatar que ao longo das gestões de Uribe houve avanços diferenciados nos esforços para o estabelecimento da paz previstos na PSDD, derivados também de métodos diferenciados para a obtenção do objetivo primário da política de segurança proposta pelo governo: a desmobilização dos grupos armados paralelos. Enquanto os maiores avanços foram produzidos com os grupos paramilitares, dado o cessar fogo unilateral e o início de conversações mediante comissões – tendo como resultantes os acordos de paz –, os avanços com os grupos guerrilheiros não se mostraram tão pronunciados, principalmente tratando-se das FARC-EP - cujas aproximações por parte do governo se viram inviabilizadas, tanto pela condição do cessar fogo unilateral antes dos processos de negociação quanto pelo enquadramento conferido a estes grupos, equiparando-os a organizações terroristas. Em principal, é possível enumerar duas dinâmicas que evidenciaram este “engessamento” do processo de paz com as FARC-EP, quais sejam: 

O esvaziamento do conteúdo político da organização em discursos ao equipará-la como organização terrorista, concretizado com a instituição da polêmica Ley de Justicia y Paz;



A beligerância política traduzida em principal na ofensiva contra Raúl Reyes em território equatoriano, resultando na evidenciação do transbordamento do conflito e em uma crise internacional elencando a questão.

Ambas dinâmicas geraram uma maximização das hostilidades, as quais transcenderam as fronteiras colombianas angariando projeção internacional mediante este confronto direto com as FARC-EP. Vale ressaltar que à diferença do ELN-UC - grupo guerrilheiro com o qual o governo conseguiu alguns avanços quanto à solução negociada – as FARC-EP negligenciam as expectativas em torno da sociedade civil, também promovendo uma divisão maniqueísta da Colômbia entre amigos e inimigos (HYLTON, 2009). Neste sentido, se há maniqueísmo por parte do governo na aplicação de políticas contrainsurgentes, as FARC-EP seguiram caminho análogo, inviabilizando a solução negociada dada a protagonização destes enfrentamentos diretos.

103

A Política de Seguridad y Defensa Democrática: esforços pela paz mediante a beligerância Conforme previamente mencionado, todas as estratégias com caráter beligerante na égide do Plano Colômbia adquiriram maior vigor em sua aplicação, tanto em virtude da PSDD quanto do contexto instaurado após o atentado de 11 de setembro de 2001, recrudescendo as políticas norte-americanas e sua projeção no concernente à doutrina antiterrorista e estabelecendo de forma definitiva o caráter contrainsurgente do plano (SANTOS, 2006). Concretizava-se a institucionalização da beligerância política no Estado colombiano sob a promessa de recuperação de legitimidade, legalidade e governabilidade (SANTOS, 2006), engendrando ofensivas para a alteração da dinâmica territorial fragmentária instaurada. Nas palavras do próprio presidente expressas no documento Política de Seguridad y Defensa Democrática,

[...] La Seguridad Democrática se diferencia de las concepciones de seguridad profesadas por regímenes autoritarios, partidarios de la hegemonía ideológica y la exclusión política. Este Gobierno no hace suyas concepciones de otras épocas como la "Seguridad Nacional" en América Latina, que partía de considerar a un grupo ideológico o partido político como "enemigo interno". Nosotros predicamos que todos son bienvenidos en la democracia. La oposición, los que disientan de las ideas del Gobierno o de su partido, serán protegidos con el mismo cuidado que los amigos o partidarios del Gobierno. No hay contradicción entre seguridad y democracia. Por el contrario, la seguridad garantiza el espacio de discrepancia, que es el oxígeno de toda democracia, para que disentir no signifique exponer la seguridad personal. Pero hay que trazar una línea nítida entre el derecho a disentir y la conducta criminal. Sólo cuando el Estado castiga implacablemente el crimen y combate la impunidad hay plenas garantías para ejercer la oposición y la crítica (COLOMBIA, 2003, p.5)70.

Neste contexto, convém retomar as assimetrias entre as providências tomadas por parte do governo em relação aos grupos armados - ilustradas anteriormente na figura 5 - inclusive a denominação de ameaça terrorista aos grupos guerrilheiros conforme previamente discutido. Críticas quanto ao caráter militar e policial preponderante na PSDD - postas em virtude do pouco expressivo fomento ao desenvolvimento socioeconômico do Estado - estas consistiram em uma componente frequente ao longo do primeiro mandato de Uribe, entretanto não impediram que a popularidade do mandatário se expandisse (SANTOS, 2006), a ponto de que considerações acerca de um novo tipo de populismo fossem tecidas, conforme discussão

70

Documento oficial acerca da PSDD. Disponível no sítio da Organização dos Estados Americanos (OEA) – http://www.oas.org

104

prévia. Porém, a questão remanescente a este ponto seria acerca da polêmica denominação dos grupos armados, em especial os guerrilheiros, como terroristas. Considerando as atividades insurgentes no âmbito interno como terrorismo análogo ao contexto do narcotráfico, Uribe concatenou o dilema interno de segurança ao âmbito da defesa nacional, abrindo precedentes para a crise que viria a posteriori:

[...] La necesidad de atender la seguridad interior no implica un descuido de la defensa nacional, a la que se otorgará la debida prioridad. Colombia seguirá siendo fiel a su tradición de país respetuoso del derecho internacional, pero mantendrá una capacidad disuasiva, con la proyección necesaria para asegurar el respeto a su soberania nacional e integridad territorial, dentro de una postura estratégica defensiva. Sin embargo, la naturaleza de las amenazas que aquejan a la Nación, en particular el terrorismo y el negocio de las drogas ilícitas, ha llevado a que en el caso colombiano, al igual que en el de muchos otros países que hoy enfrentan este tipo de amenazas, se desdibujen los límites entre la seguridad interior y la defensa nacional (COLOMBIA, 2003, p.20).

A presente consideração, entre tantas outras dispostas no documento referido previamente, é destacável, pois contempla questões encabeçadoras de diversas discussões na seara das consequências da política de segurança empregada com base no modelo de “cruzada ao terrorismo” de Washington, admitindo que outros países com o mesmo tipo de ameaças elevem esta categoria de litígios ao âmbito da defesa. Este movimento, em reflexo às posturas estadunidenses, constitui um dos elementos norteadores para a crise com o Equador observada em 2008, colocando em evidência novamente o denominado marco interventivo do conflito colombiano. Dentro do referido marco e também resgatando considerações tecidas quanto às diferenças entre insurgência e terrorismo, pode-se depreender que a alocação dos grupos guerrilheiros a este polo do conflito se deu eminentemente por considerações políticas e convergência com os objetivos da atual gestão, visto que segundo Leongómez (2002), um ator armado pode ser aliado hoje, inimigo amanhã à luz das conveniências e interesses políticos do Estado. Portanto, a disseminação deste discurso político ostensivamente combativo, presente na PSDD desde a carta de intenções de Uribe, possui tanto uma função clara de esvaziamento do papel do outro quanto o de eliminação de obstáculos políticos rumo a um projeto de centralização de poder - e ao objetivo pessoal de angariar prestígio político doméstico e internacional (ESTRADA, 2009; HAGE, 2008). Como componente que tangencia ao contexto de maniqueísmo – dualidade aliado/inimigo - existe a tendência à dinâmica da vingança e da retribuição, tramitando de

105

forma oculta por outras questões inerentes ao conflito e às ações contrainsurgentes do governo, expressa entrementes pela nomeação de Franciso Santos como vice-presidente:

[...] La primera versión de estas ideas la esbocé hace algunos meses, a manera de work in progress, en mi mal inglés, y todavía bajo el impacto ambivalente que me produjo la escogencia de Francisco Santos como fórmula vicepresidencial de Álvaro Uribe Vélez. Cuando leí la noticia pensé: una víctima del secuestro escoge como su compañero de aventura a otra víctima del secuestro. Da igual en este contexto que el padre del segundo hubiera sido secuestrado y asesinado por las FARC; en tanto que el primero hubiera sobrevivido a los vejámenes impuestos por Pablo Escobar. Hoy, para el común de las gentes, secuestro y FARC se han convertido en sinónimos. Era la primera vez, desde que tengo uso de razón, que el hecho de haber sido secuestrado parecía Haber sido elevado a la categoria de título de legitimidad para gobernar el país. El lema tácito de la campaña de Uribe parecía ser “la vindicta al poder. (ABAD, 2002, p.81-82)

Este fato, tal como retratado por Abad (2002), evidencia um elemento de pessoalismo à política empregada durante a gestão Uribe, elevando uma questão de segurança pública à seara de vingança pessoal e conferindo espaço para conjecturas quanto ao trato diferenciado conferido aos atores armados e à sistemática política de debelação das FARC-EP como objeto de prestígio político (HAGE, 2008). A este ponto, convém questionar até que ponto a PSDD não serviu como objeto de promoção de segurança e desenvolvimento social, haja vista ao contexto político que este instrumento, bem como a própria figura do presidente Álvaro Uribe, estiveram inseridos. Conforme Buitrago (2002), dentre as maiores dificuldades que emergem no Estado colombiano está a articulação da realidade da guerra com a busca pela paz, propiciando um equilíbrio político dificultado por nove dinâmicas contrapostas: 

A intesidade do conflito armado, rementendo à questão do recurso indiscriminado à violência - traduzido na situação ilustrada por Abad (2002), em que as FARC-EP tornaram-se sinônimo de sequestros;



O aumento do paramilitarismo apoiado por setores importantes da sociedade e pelo próprio Estado - o qual conferiu papel político ao referido grupo (HYLTON, 2009) bem como providências políticas apresentadas à figura 5;



A dispersão do narcotráfico como financiador dos grupos paralelos armados e difusor da corrupção;

106



A incapacidade da Força Pública71 em confrontar a subversão de forma eficaz observada tanto no fracasso das saídas negociadas quanto na militarização, conforme a Tabela 9;



A tendência da Força Pública ao minimizar sua responsabilidade perante o paramilitarismo por considerá-lo um aliado no combate ao terrorismo;



Ingerência estadunidense a partir da política repressiva e unilateral face ao narcotráfico, institucionalizada pelo Plano Colômbia;



A distorção da eficácia na tarefa antisubversiva da Força Pública devido ao auxílio militar estadunidense na órbita do Plano Colômbia;



O requerimento da comunidade internacional e de setores nacionais na manutenção de democracia;



A crise econômica do país, agravada pela demanda por ajustes macroeconômicos, apoio à população civil vítima da guerra e designação de maiores investimentos no setor de Força Pública.

À luz das considerações de Buitrago (2002), um segundo questionamento quanto à PSDD emerge. Até que ponto a referida política concretizou os objetivos para a qual foi designada, visto que conforme o referido autor, os princípios norteadores de uma política de segurança deveriam ser coerência interna e articulação de componentes para se propiciar uma visão universal, características carentes na PSDD de Uribe desde seu discurso até sua aplicação. É provável que as referidas carências derivem de equívocos conceituais, alguns interrelacionados no discurso oficial e entronizados por setores da sociedade colombiana, outros largamente difundidos e transformados em senso comum, do qual as análises relacionadas neste trabalho pretendem se distanciar. Conforme Leongómez (2002), o primeiro deles seria conceituar o conflito colombiano como guerra civil. Este equívoco deriva de outro, que seria presumir a total representatividade dos grupos guerrilheiros e dos paramilitares dos interesses de setores camponeses e classes médias, respectivamente, no conflito armado. Apesar do apoio angariado pelos paramilitares de uma nova elite terrateniente – gestada pela máfia da droga e das esmeraldas – a elite tradicional subsiste dificultosamente face ao embate com as guerrilhas e à tendência de outras elites políticas e econômicas à saída pela extrema direita. E quanto à guerrilha, alguns núcleos camponeses a apoiam em seus locais de

71

Por Força Pública, entenda-se Forças Armadas e/ou Segurança e Defesa.

107

influência, mas trata-se de uma representação fragmentada tanto no âmbito social quanto no âmbito territorial dada a dispersão destes grupos. Portanto, como existe uma fragmentação no âmbito da representatividade de dois dos polos em conflito, trata-se de um equívoco conceitual equiparar o conflito interno colombiano à guerra civil, a qual corresponde a um enfrentamento entre dois ou mais segmentos da população claramente identificados em razão de sua etnia, religião, região, cultura ou ideologia (LEONGÓMEZ, 2002). Conforme delineado anteriormente, o conflito colombiano é multidimensional, com bases em litígios territoriais e um histórico escopo político; logo a denominação de guerra civil ou mesmo conflito civil ao conflito interno colombiano é um despropósito. Ttrata-se de um conflito irregular, donde o que está em xeque é a legitimidade do Estado mediante o apoio da população (VISACRO, 2009), ou mesmo um conflito que em virutde de suas proporções e do acuamento da população esteja direcionado contra os civis (NEIRA, 2010), ainda mais se for levado em consideração o escândalo dos falsos positivos, o qual será tratado adiante. O segundo erro conceitual apontado por Leóngomez (2002) foi o de considerar a existência da polarização social a ponto de suscitar o fenômeno de um “Estado dentro de outro Estado”, a partir da divisão da soberania instituída devido ao paralelismo estatal. Conforme previamente discutido no concernente aos espaços vazios de função estatal, é inegável que os grupos guerrilheiros e paramilitares cumprem incumbências originalmente atribuídas ao Estado, dadas as demandas não atendidas nestas regiões. Entretanto, convém rememorar que há uma querela territorial no pano de fundo de um conflito armado em franco desenvolvimento no Estado colombiano, alterando suas dinâmicas de territorialidade. Neste sentido, retoma-se a multiplicidade dimensional do conflito que se desdobra no referido Estado, não configurando a situação de um Estado dentro de outro ou mesmo a dinâmica de nações sem Estado conforme expressa Castells (2001). Realçando novamente, o papel das FARC-EP, bem como o de outros grupos que compõem o fenômeno do paralelismo estatal, corresponde ao componente reivindicatório na forma de insurgência dado o recurso à violência, tal como expresso na tabela 07, não implicando na instituição de um arranjo alternativo ao Estado (RESTREPO, 1988). Ademais de um conflito irregular com derivações de litígios territoriais e de legitimidade, a questão do narcotráfico conforme explicitada constitui uma das feições do conflito interno colombiano, instaurando uma complexa simbiose com os atores paralelos armados e dificultando tanto os processos de instauração da paz - dada à existência desta “economia de guerra” (LEONGÓMEZ, 2002) - quanto a qualificação e as políticas de

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enfrentamento deste conflito. Por conseguinte, instaura-se uma simbiose também no âmbito conceitual: as cruzadas contra o narcotráfico e contra o terrorismo recaíram à sinonímia, enquanto houve a continuidade da estratégia de “tirar a água do aquário” com as fumigações aéreas, mesmo revelando contraproducência no sentido de custo-benefício, dados os resultados localizados e temporários (HYLTON, 2009). Diretamente relacionado à referida sinonímia, a qual se encontra associada ao multidimensionamento do conceito de segurança, subsiste um último equívoco conceitual: a mescla dos conceitos de defesa e segurança pública em prol de justificar o emprego de forças armadas em um litígio doméstico. Esta manobra esteve presente nos discursos da PSDD de Uribe conforme ressaltado anteriormente incorre em uma grave tendência observada na América Latina:

Na América Latina, na área especificamente dedicada à segurança internacional, a defesa e a paz, incorporaram-se teorias, conceitos e noções de notável infertilidade analítica, explicativa e heurística, de pobre capacidade preditiva, de inconveniente força prescritiva e inconsequente administração operacional. Poderia ser considerado apenas mais um outro caso de ingenuidade acadêmica se suas consequências práticas não fossem um perigo à autonomia intelectual e à soberania política. Notório espaço na literatura especializada ocupou o conceito errôneo de “monopolaridade”chegando-se a considerar que quem não o usasse estaria ainda preso à heterogeneidade ideológica da Guerra Fria; outro exemplo que consumiu tinta em excesso foi considerar o 11 de setembro como um divisor de águas no âmbito da segu-rança internacional; outros ainda mais prosaicos foram (e continuam sendo) as prescrições de “guerra contra as drogas” e “guerra contra o terrorismo”. Os que aqui nos preocupam especialmente são os de “agenda hemisférica de ameaças”, a muitas vezes ignorada diferença entre a natureza da “defesa” e a da “segurança”, e o perigoso deslocamento do conceito de “segurança”, extrapolando-o e “multidimensionando-o” (SAINT-PIERRE, 2011, p.408).

Logo, este equívoco aparentemente proposital expresso no conteúdo e na prática da PSDD ferem diversas searas analíticas conforme apontado por Saint-Pierre (2011), gerando desdobramentos como a confluência de problemáticas relacionadas a sintomas de uma disfunção de democracia. Conforme previamente discutido, o conflito colombiano está relacionado com a questão do déficit democrático traduzido em insurgência, portanto pode-se depreender que as confluências conceituais indevidas, utilizadas nos discursos que permearam a PSDD a fim de justificar os planos e ações de governo que a compunham, esvaziaram o conceito de segurança e serviram mais como instrumento de justificativa aos níveis de beligerância e ao continuísmo das diretrizes que regeram o Plano Colômbia e, por conseguinte, o transbordamento do conflito no marco interventivo.

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As componentes de beligerância da PSDD e o Plano Patriota: a democracia pela via armada

Ademais das providências listadas à figura 5, o governo colombiano sob a gestão Uribe tomou diversas ações no âmbito da PSDD, sendo a primeira delas em 2002, com a declaração de “estado de comoção interior” e a alegação da ameaça terrorista delegada aos grupos guerrilheiros, intensificando as ações previamente estabelecidas pelo Plano Colômbia em uma mensagem clara: não se tratava mais de uma ação militar esporádica, e sim algo de natureza permanente e sem volta, a fim de impingir derrota à guerrilha (SANTOS, 2006; OSPINA, 2007). Estava decretado o início de uma política de austeridade cujas consequências sociais foram denunciadas no âmbito dos Direitos Humanos e logo puderam ser observadas com maior projeção midiática sob a forma de escândalos. Ações com vistas a retomar a centralidade da Força Pública e a confiança do governo em sua prerogativa centralizadora foram traduzidas em aumento dos repasses do PIB para os orçamentos de segurança e defesa beirando os 4% - correspondendo a mais de 18% em gastos militares em geral conforme demonstrado previamente na tabela 5 – e um envolvimento popular ao estabelecer uma rede de informantes (para fins de delação de grupos criminosos ou insurgentes), programas de recompensas e armamento da sociedade mediante o programa Soldados Campesinos, ademais do recrudescimento das operações contrainsurgentes materializadas no âmbito do Plano Patriota (CEPIK; BORBA, 2010; SANTOS, 2006). O referido plano remetia à histórica Operação Marquetalia e à Iniciativa Andina, visto que seu objetivo consistia na alocação de um alto contingente militar (em torno de 17 mil soldados colombianos e equatorianos) visando à debelação dos grupos paralelos dos departamentos de Caquetá, Guaviare, Meta e Putumayo (OSPINA, 2007; SANTOS, 2006; DAWOOD, 2004). Tomava forma a um dos principais fatores geradores de tensão regional, abrindo alas à prerrogativa do transbordamento dentro do marco fronteiriço. Explicitando, da mesma forma que houve fuga e remobilização dos grupos insurgentes, especificamente das FARC-EP no episódio de Marquetália, e considerando a mobilidade fronteiriça e as diferenças de contingentes militares alocados nas fronteiras com os Estados vizinhos à Colômbia, aparentemente esta seria a estratégia empregada pela insurgência em virtude das baixas impingidas pela ação militar descrita. Apesar dos números expressivos resultantes da ofensiva, os quais implicaram na ativação de 6 batalhões de alta montanha, 9 brigadas móveis, 13 unidades antiterroristas urbanas denominadas AFEAUR e 29 esquadrões móveis de policiais no período de 2004 a 2006, além dos totais de “17.208 capturas, sendo 10.035 das

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FARC, 1.643 do ELN, 5.055 das AUC e 475 outros; e 6.510 baixas, sendo 4.139 das FARC, 1.123 do ELN, 1.101 das AUC e 147 outros” (COLOMBIA, 2007; SANTOS, 2006), a prerrogativa da remobilização segue inerente à estratégia das FARC-EP, dadas as mudanças bruscas no ambiente de negociação impedindo as possibilidades de um cessar fogo conveniente a seus objetivos. A partir destas considerações, o Plano Patriota constituiu em uma fase de intervenção militar e ingerência por parte dos Estados Unidos de uma maneira mais direta no âmbito do conflito interno colombiano, revelando uma espécie de hermetismo, dada a falta de controle do referido plano por parte do Congresso colombiano – o qual em tese teria a incumbência de autorizar o trâmite de tropas e assessores militares estrangeiros em território colombiano, entretanto teve seu escopo reduzido à recepção e expedição de comunicados oficiais (OSPINA, 2007). Empreendendo esta campanha militarizada com discurso libertador, Uribe negligenciou uma prerrogativa de grupos insurgentes como as FARC-EP em sua ânsia por projeção política traduzida no “libertar a Colômbia” da paraestatalidade: a retirada estratégica e a hibernação.

[...] En la actualidad, las FARC mantienen un repliegue estratégico y una ofensiva táctica, mientras han visto reducirse de manera importante su capacidad (o voluntad), de acción y no han estado en condiciones de generar un ataque contundente o de alto impacto simbólico ni a unidades de las Fuerzas Armadas ni a la población civil, a pesar de la práctica reiterada del hostigamiento, las rápidas incursiones armadas en algunas poblaciones, y de algunos incidentes terroristas como los que ocurrieron en Bogotá y la serie de atentados que sacudió a Cali durante el año pasado. Adicionalmente, su pie de fuerza se ha reducido, lo que explica el correspondiente aumento en la depredación practicada para forzar el reclutamiento especialmente de menores. En términos generales, su estado actual podría calificarse como de hibernación72. Aunque han visto seriamente erosionada su capacidad ofensiva y han sido sometidas a una constante presión por parte de la Fuerza Pública, están todavía muy lejos de ser derrotadas o de tan siquiera estar suficientemente debilitadas como para forzar su mejor disposición a la solución negociada. Más bien, hibernan, se adecúan al nuevo escenario, y mientras tanto, resuelven problemas internos relativos a su propia dinámica organizacional (la sucesión de Marulanda, la relación de fuerzas entre halcones y palomas) (TORRIJOS, 2007, p.92).

Neste sentido, Torrijos (2007) demonstra que apesar da expressividade numérica angariada pelo Plano levado a cabo por Uribe, a insurgência representada neste caso pelas FARC-EP possui a prerrogativa da remobilização inviabilizando o sucesso duradouro da política de

72

Destaque para o termo em negrito mantido conforme texto original do autor.

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derrota militar. Desconsiderar esta prerrogativa e atenuar os custos sociais do referido plano foram elementos que o conduziram a críticas e descontinuidade após a crise de 2008. Dentre as consequências, Rojas (2007) relaciona as arbitrariedades ao direito humanitário traduzidas no aumento do número de assassinatos, desaparecimentos e tortura de ativistas dos direitos humanos e o aumento do número de desalojamentos forçados internos e transfronteiriços, cujas cifras seguiram em crescimento conforme demonstrado previamente na tabela 2. Dada à magnitude do fenômeno, o qual também pode ser inserido no contexto do transbordamento do conflito, uma securitização ante a temática foi incluída na agenda dos Estados vizinhos à Colômbia, tanto devido ao temor e à desconfiança motivados pela aproximação do referido Estado com a agenda de Washington, quanto pela debilidade fronteiriça, observada nas diferenças de contingentes militares alocados para o patrulhamento destas regiões (TICKNER, 2007). Dentro deste contexto, houve um racho opinativo donde em um polo as comunidades receptoras foram mal vistas pela opinião internacional, que associava suas ações com apoio à violência e à corrupção - reflexos da visão propagada ao longo do governo Uribe - e em outro, existe uma demanda por uma solução conjunta para o conflito colombiano e suas consequências, a fim de orquestrar um equilíbrio na égide regional em vez de um isolacionismo baseado no exclusivo nortear pela doméstica dos Estados vizinhos à Colômbia. Logo, retoma-se a hipótese do anuviamento da visão geral acerca dos custos e demais questões envolvidas na prática da PSDD e seus respectivos planos (BARRAGÁN, 2007; ROJAS, 2007). Em continuidade à seara dos custos humanitários, Sanford (2003) denuncia os abusos cometidos pelos grupos paramilitares às margens do Estado – em suas áreas de influência - e com apoio da estrutura da Força Pública, passando a imagem de representantes da repressão e da violência praticadas pelo Estado mediante um fenômeno denominado pela autora como killing by proxy73. Em meio aos exemplos da aplicação deste fenômeno podem ser listados os desabrigamentos como estratégia tática do paramilitarismo - em virtude das torturas impingidas aos camponeses na busca por guerrilheiros infiltrados – e a morte de civis através da “Operación Limpieza”, mascarada em números de assassinatos políticos contabilizados tanto no âmbito das forças oficiais quanto no âmbito deste mecanismo paralelo de “justiça social” (SANFORD, 2003). A fim de ilustrar a escalada do recurso à violência traduzido em mortes, segue uma tabela ilustrativa:

73

Seria equivalente à promoção de mortes por delegação de uma autoridade, compreendida pela autora como o Estado.

112

Tabela 10 - Assassinatos políticos anuais na Colômbia e percentual de autoria Ano

Percentual de assassinatos Percentual de autoria dos políticos por ano

assassinatos

1980

100

20 – 30%: insurgência

1985

1000

(FARC-EP e ELN-UC)

1988

4200

70-80%: Força Pública 20 – 30%: insurgência

1998-99

4380

(FARC-EP e ELN-UC) 50%: Força Pública 20%: Paramilitarismo

2000

3500

20%: insurgência (FARC-EP

2001

4000

e ELN-UC) 80%: Paramilitarismo -como vertente representante da

2002

4000

Força Pública na interpretação de Sanford (2003).

Elaboração Nossa, 2012. Com base em SANFORD, Victoria. Learning to kill by Proxy: Colombian Paramilitaries and the Legacy of Central American Death Squads, Contras and Civil Patrols. San Francisco, Social Justice, 2003, vol. 30, n. 3.

Neste sentido em observância à tabela 10 e aos pontos ressaltados pela autora, podem ser depreendidas duas dinâmicas: a da associação da Força Pública, braço armado do Estado colombiano, com o paramilitarismo, e o aumento do temor da prática violenta independentemente de seus autores, aumentando o número de desabrigados nos termos previamente discutidos. Desta forma, a violência por representação desvela uma preocupante simbiose às margens do Estado colombiano:

The infrastructure of Colombian army patrols, troop maneuvers, and security bcheckpoints lends protection to the paramilitaries and allows them safe freedom of movement and action. Once revealed, this relationship between the army and the paramilitaries, which is mutually beneficial on a strategic level, makes legible a relationship of Power intended to remain illegible by proxy paramilitaries of the state operating in the anonymity of the margins of the state. Thus, what at first glance appears to be simply a privatization of state violence is revealed in practice as state violence by Proxy (SANFORD, 2004, p.263).

O anonimato das ações violentas engendradas às margens, em conjunto com a estratégia dos desabrigamentos, resulta no esmagamento dos anseios de não alinhamento aos polos

113

conflitantes empreendidos pelas Comunidades de Paz colombianas, cujos membros empreendem esforços para um resgate de sua cidadania ante as disputas territoriais veladas nesta guerra ao terror (SANFORD, 2004). Esta resistência não armada empreendida pelas Comunidades de Paz com apoio de uma pequena corte civil, a Casa de Justicia, constitui tanto um intento de trazer de volta desabrigados originários de diversos departamentos colombianos, quanto um chamariz aos olhares da comunidade internacional para a gravidade da questão colombiana, da privação do direito à cidadania e do “pertencimento” a estes colombianos que estão mais próximos do palco do conflito. Trata-se de um novo terreno de engajamento sem recurso à violência (SANFORD, 2004), transformando as relações de presença do estado às margens bem como as relações de territorialidade previamente mencionadas. Consequentemente, é possível observar um padrão de acuamento dos civis ante a violência, a qual não se restringiu ao combate à insurgência conforme apregoado nos discursos, impingindo custos humanitários e sociais não contabilizados pelas estatísticas dos informes oficiais concernentes ao Plano Patriota. Para encerramento da lista dos parâmetros humanitários extrapolados ao longo da PSDD e seus respectivos planos, a política de desconfiança do próximo, recompensas por delações e resultados – entendamse baixas no contingente da insurgência – empreendidos pela Força Pública culminou em um dos maiores escândalos humanitários ocorridos durante a gestão Uribe, isto é, a questão dos falsos positivos revelada após o episódio dos muchachos de Soacha (DE CASTRO, 2009). Explicitando a questão já suscitada em momentos anteriores do presente trabalho, o referido episódio consistiu na desaparição forçada de civis não ligados a grupos guerrilheiros, cujas mortes eram contabilizadas como baixas na “guerra contra a insurgência” empreendida pela Força Pública no âmbito da PSDD e do Plano Patriota. O estopim do referido escândalo, no âmbito midiático, se deu em outubro de 2008, a partir da busca por um morador de Soacha empreendida pela Comissão da Busca de Desaparecidos e a localização do corpo deste em uma cova rasa em proximidades da fronteira com o Estado Venezuelano, junto aos corpos de adolescentes que trajavam fardas guerrilheiras sem nunca terem pertencido a tais grupos. A aposentadoria compulsória de oficiais do exército colombiano foi decretada por Uribe e a questão da “síndrome de contagem de corpos”, em busca de demonstrar a efetividade da campanha libertadora da Colômbia, não pode permanecer restrita ao escopo das falsas denúncias opositoras ao recrudescimento da política de segurança colombiana (DE CASTRO, 2009). Entretanto,

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talvez o que mais demonstre uma conduta recorrente no âmbito do recurso à violência em detrimento do papel da Força Pública e da segurança dos civis em meio ao conflito colombiano seria que o caso dos falsos positivos não constitui um fenômeno novo:

[...] No final daquele fatídico mês de outubro de 2008, o mesmo semanário colombiano, Semana, publicou um texto de Michel Evans, membro da ONG norteamericana The National Security Archive, no qual este mostra como cabogramas confidenciais enviados à CIA pela Embaixada dos EUA na Colômbia desde 1994, tornados públicos (‘desclassificados’) mais de dez anos depois, atestam que o corpo diplomático norte-americano suspeitava da existência dessa síndrome da ‘contagem dos corpos’ no Exército colombiano, e que, além disso, reconhecia a existência de fortes indícios que apontariam para a prática da eliminação intencional de inocentes para que se aumentassem as cotas oficiais de guerrilheiros mortos. Segundo relatório da procuradoria geral da Colômbia divulgado no mês de outubro, de 2002 a 2008 foram computados pelo menos 2.000 ‘falsos positivos’, dentre eles 122 mulheres e 59 menores de idade, uma média de uma pessoa inocente morta por dia. Tratava-se, portanto, de uma conduta sistemática (DE CASTRO, 2009, p.136).

Analisando brevemente as consequências aqui relacionadas de forma conjunta, podese depreender que a política de segurança colombiana, apoiada no recurso à violência como mecanismo de recentralização do governo, incorre no equívoco de legar mais uma vez as origens do conflito interno ao esquecimento e a territorialização do conflito a um pouco recorrido pano de fundo, enquanto este seria o parâmetro para as crises desenvolvidas a posteriori. Os cenários de violência produzidos pelo conflito colombiano obedecem à presença desigual do Estado em suas regiões e fogem do escopo do maniqueísmo propagado nos discursos políticos, obedecendo a uma dinâmica cuja presença do conflito em diferentes graus reproduz processos históricos e identidades em transição em meio às mudanças de controles sobre os territórios (GONZÁLEZ, 2002). Em retomada, subsiste uma dinâmica territorial fluida, sobreposta caso a análise perpasse pelos termos de Agnew e Oslender (2010), e fragmentária, nos termos de Rosenau e Durfee (2000). Entrementes, em meio a toda fluidez dinâmica, onde está elencado um embate entre uma recuperação do pleno exercício da soberania estatal em todo o território colombiano em contraposição à atuação da paraestatalidade, Sanford (2003; 2004) chama atenção para a existência de espaços relativamente pacíficos em coexistência com os denominados “estados de guerra”74, caracterizados pelos enfrentamentos bélicos. Em um ambiente marcado pelas instabilidades provenientes do conflito armado, desdobramento da referida disputa pelo controle territorial, emerge um caráter virtual da cidadania, donde os direitos dos cidadãos tornam-se precários e em 74

URIBE (2001) apud GONZÁLEZ (2002).

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segundo plano em relação ao combate à insurgência aos olhos do governo75, conferindo a esta parcela da sociedade colombiana as seguintes opções: alinhamento à insurgência, à contrainsurgência ou um clamor pelo desarmamento, engendrado através das Comunidades de Paz. O último consiste um intento de fuga da lógica da colombianidade retratada ao início do presente trabalho, sob a tipologia do cidadão colombiano pelo princípio do “quarto excluído”; ou seja, trata-se de uma mobilização de coletividades em busca de forjar a tipologia do colombiano que goza de sua cidadania em conjunto com a paz. Encerrando esta questão de uma alternativa de esperança em meio às armas, convém ressaltar determinada negligência por parte da engenharia política que regeu a condução da PSDD e do Plano Patriota. Neste sentido, para fins demonstrativos, segue um esboço de territorialização dos grupos guerrilheiros e paramilitares, ilustrando como o conflito interno colombiano encontra-se atrelado às dimensões apresentadas em capítulo anterior.

75

Ibid.

116

Figura 6 - Territorialização da paraestatalidade 1) Zonas mais ricas e integradas ao mercado doméstico ou internacional, mas que contam com marginalidade camponesa sujeita a poderes locais, os quais por sua vez possuem relativa autonomia em relação ao governo central mediante aparatos institucionais.

As guerrilhas emergem em zonas periféricas e de colonização camponesa marginal, agremiando-se nas fronteiras internas e se expandindo para:

2) Zonas com rápida expansão econômica mas que possuem pouca presença institucional do Estado, coexistindo assimetricamente com camponeses sem acesso a estas riquezas sem o amparo da regulação estatal para a hierarquia social emergente nestas áreas. 3) Zonas camponesas de pequena e média propriedade que eram prósperas antes da decadência econômica, a qual as sujeitou a falta de coesão social e diminuição da presença institucional do Estado.

Os paramilitares emergem em zonas relativamente mais prósperas e interligadas à economia doméstica e internacional, em que existem poderes locais e regionais consolidados ou em fase de consolidação, cujas elites se sentem ameaçadas pelo avanço guerrilheiro e afastadas do aparato institucional do Estado. Se expandem para:

1) Zonas mais periféricas, angariando apoio dos poderes locais em consolidação nestas áreas, tanto pertencentes à seara política quanto à seara econômica, com limites de atuação e expansão atrelados à consolidação destes poderes regionalmente.

Guerrilhas Centros EMBATES ARMADOS Periferias Paramilitares

Elaboração Nossa, 2012. Com base em GONZÁLEZ, Fernán E.; BAHAMON, Silvia O. La presencia diferenciada del Estado: un desafío a los conceptos de gobernabilidad y gobernanza. Bogotá, Colombia: Centro de Investigación y Educación Popular (CINEP), Dossié Usos y desafíos del concepto de gobernanza en Colombia, 2006, e em GONZÁLEZ, Fernán E., . Colombia entre la guerra y la paz. Aproximación a una lectura geopolítica de la violencia colombiana. Venezuela, Universidad Central de Venezuela: Revista Venezolana de Economía y Ciencias Sociales, 2002, vol.8, n.2.

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Em observação à figura 6 e considerando a questão da presença diferenciada do Estado (GONZÁLEZ; BAHAMON, 2006) em conjunto com a dinâmica dos espaços vazios de função estatal e da sobreposição de territorialidades, é possível evidenciar a falha da PSDD e do Plano Patriota em termos de contemplar resoluções do conflito armado em suas origens, zelando pela manutenção da segurança e da democracia conforme apregoado em discursos e informes oficiais da gestão Uribe. A práxis da referida política de segurança recaiu ao mesmo nível tático empreendido ao interior do conflito colombiano, esmagando e acuando a sociedade civil involucrada pelo terror mesmo que não aliada a nenhum dos polos conflitantes:

[...] esta situación se agrava todavía más por las características del enfrentamiento armado, que no se reduce solamente al combate abierto entre las partes por el control de un territorio y el aniquilamiento del enemigo, aunque en los últimos años los combates han venido aumentando de manera significativa. En buena parte, el conflicto armado colombiano se caracteriza por ser uma “guerra por tercero interpuesto”, donde los adversarios no se enfrentan directamente entre sí sino que golpean a las bases sociales, reales o supuestas, del enemigo, para “quitarle el agua al pez”, en términos de los paramilitares. Esto significa que, en buena medida, el conflicto colombiano es una guerra contra la población civil (GONZÁLEZ, 2002, p. 40)

Logo, retomando a confluência conceitual equivocada presente da PSDD e somando-a aos seus “efeitos colaterais”, é possível depreender que o ideário democrático não converge com a garantia de acesso a armamentos por parte da população, conforme possibilitado mediante o programa Soldados Campesinos, tão pouco o empreendimento de uma aniquilação desenfreada daquele compreendido como inimigo dentro da lógica de partilha maniqueísta da sociedade colombiana, importando enviesadamente o conceito de terrorismo à revelia da proteção dos cidadãos e das contendas aos efeitos colaterais do Plano Patriota, por exemplo (OSPINA, 2007; SANTOS, 2006). Trata-se de incluir a sociedade em um projeto de nacional de reavivamento do conceito de sociedade civil - debilitado historicamente e em degradação devido ao conflito e às crises de representatividade ilustradas com o passar das gestões colombianas - de uma reeducação da inteligência humana no âmbito militar, a fim de resgatar no aparato da Força Pública o zêlo pelos direitos humanos e pela democracia,

e de

transformação da receptividade do braço armado do Estado colombiano como um mecanismo de proteção e não de trauma a seus concidadãos (BUITRAGO, 2002). Apesar dos deméritos relacionados aos efeitos colaterais do recrudescimento da política de segurança ao longo da gestão Uribe, houve um prevalecimento dos índices positivos relativos à segurança pública como resultante das aplicações da PSDD – queda na

118

taxa de homicídios de 63 para 33 (em um grupo de 100 mil habitantes); redução de 1700 sequestros cometidos em 2002 para 280 em 2006; queda do número de barreiras ilegais nas estradas devido ao policiamento extensivo, permitindo maior circulação no território colombiano; queda nos ataques guerrilheiros a povoados; aumento do crescimento da economia nacional de 3 para quase 8% ao ano (RANGEL, 2007) - aumentando a popularidade do ex-presidente sobretudo em setores médios e altos da sociedade colombiana, conduzindoos à tolerância das medidas repressivas empreendidas pelo governo sob a bandeira da segurança (SANTOS, 2006). Neste contexto, donde o emprego de estratégias de esvaziamento de caráter político de setores contrários é tolerável, instituiu-se um mecanismo de amnésia social nas palavras de Hylton (2009), transformando o que seria um dispositivo jurídico para reinserção e quitação de “dívidas de guerra” em um aparato de inserção social exclusivo aos grupos paramilitares: a Ley de Justicia y Paz.

Ley de Justicia y Paz: reflexos de uma política pautada por assimetrias de aplicação

Conforme previamente discutida, a estrutura de impunidade estabelecida à simples deposição das armas por parte dos paramilitares, entendida como sua desmobilização, transmite uma mensagem de intimidação aos entes que se encontram no entorno do conflito colombiano, acuados tanto pela tática guerrilheira de resistência ao governo central quanto pela ação paramilitar, ambas apoiadas na violência (DE CASTRO, 2009). Ademais, nos remete à forma assimétrica - previamente discutida - com a qual o governo lidou com a questão do conflito colombiano e da paraestatalidade durante a gestão Uribe, afastando-se da isonomia de tratamento aos entes armados apregoadas em discurso oficial de campanha e de posse do ex-presidente. A fim de prosseguir as discussões neste sentido, antes de adentrar a questão da aplicação da Ley de Justicia y Paz, bem como de suas implicações assimétricas relativas aos atores protagonistas do conflito colombiano, convém apresentar o dispositivo legal antecedente, que seria o texto que equivaleria à Ley de Verdad, Justicia y Reparación. Ressaltando a abertura de portas do governo colombiano à desmobilização para o término do conflito armado a partir de um cessar fogo unilateral, a ex-ministra de defesa da Colômbia, Marta Lucia Ramirez de Rincón, tenta demonstrar que foi facultada a possibilidade de reintegração dos grupos armados à sociedade, em um esforço para se alcançar a paz e a garantia dos direitos constitucionais no âmbito da segurança “seja pela via do diálogo, seja

119

pelo uso legítimo da força” (RINCÓN, 2005, p.69). A princípio, segundo a ex-ministra Rincón (2005), a Lei de Verdade, Justiça e Reparação76 - que viria a ter seu texto aprovado em 2005 sob a denominação de Lei de Justiça e Paz - consistiria em uma complementação da Lei 782 de 2002, visando à instituição de penas alternativas a crimes que não comportam anistia ou indulto. Conforme texto da referida legislação,

Se entiende por grupo armado organizado al margen de la ley, el grupo de guerrilla o de autodefensas, o una parte significativa e integral de los mismos como bloques, frentes u otras modalidades de esas mismas organizaciones, de las que trate la Ley 782 de 2002 (COLOMBIA, 2005, p.1)

Ou seja, no marco jurídico está resguardado o reconhecimento dos grupos guerrilheiros como entes passíveis de enquadramento para os “benefícios da desmobilização” em prol do estabelecimento da paz. Contudo, e a aplicação da referida lei nos marcos de possibilitar à colombianidade a prerrogativa de reescrever sua história com a aplicação da verdade e da justiça sem incorrência ao esquecimento de suas máculas e mero indulto aos responsáveis por estas? Conforme Rangel (2007), a referida lei consiste em um dos mecanismos mais avançados e rigorosos do mundo no concernente à aplicação da justiça de transição a fim de solucionar contenciosos armados. Com um parecer similar, Ramírez (2010) ressalta o caráter de novidade imbuído à lei, visto que na Colômbia os parâmetros legais anteriores, relativos às aproximações com a insurgência, remetiam a perdão e esquecimento ou indulto apenas. Não obstante, a condicionalidade do item relacionado à verdade, expresso pelo art. 7° da referida lei (COLOMBIA, 2005) abre margens para contestações de até que ponto a sociedade colombiana pode ter acesso à verdade promulgada judicialmente, lhe conferindo parâmetros oficiais para a reconstrução de sua identidade, cidadania e memória coletiva nos termos de Halbwachs (1990). Ademais, a posterior aplicação da lei de Justiça e Paz em favorecimento dos grupos paramilitares simultaneamente à propagação do discurso antiterrorista esvaziando o conteúdo político daqueles que não se submeteram aos termos da referida lei como as FARC-EP – abre espaço para questionamentos quanto à instituição de uma “blindagem jurídica” a um dos polos do conflito armado à revelia dos propósitos de paz e reparação das vítimas (HYLTON, 2009). Relativo a estas questões apresentadas, outro fenômeno discutível é o da anistia.

76

Tradução do original – Ley de Verdad, Justicia y Reparación – com base em Rincón (2005).

120

Conforme Abad (2002), dentro do âmbito do direito contemporâneo, anistia é sinônimo de impunidade e apenas pode ser justificada dentro de termos práticos; no caso colombiano, segundo o autor, a redução da guerra contra o terrorismo definindo este como uma ética norteadora absoluta sobre os meios de combate tratou-se apenas do ápice de um longo processo de esvaziamento do conceito de anistia. A razão instrumental e estratégica, inerentes ao contexto de aproximações com a insurgência durante a gestão de Uribe, não cumprem um papel substituto ante o esvaziamento motal do conceito de anistia, entretanto consistem em um fator relevante no referido contexto e no espectro da Lei de Justiça e Paz, visto que intentam imbuir à anistia a prerrogativa de oferecer, aos “inimigos” internos, motivações para terminar a guerra e desmobilizar-se rumo à paz negociada (ABAD, 2002). Em termos práticos, é possível depreender o porquê do emprego da anistia como tentativa de imbuir um término ao conflito colombiano, entretanto dentro da dinâmica apresentada, o vazio moral do referido conceito implica na desassociação da componente reparação, removendo as bases para que as máculas do conflito permaneçam no tempo passado dentro de uma reconstrução da memória coletiva colombiana. Portanto, apesar de novidade, observa-se que o conceito de anistia permanece, aparentemente, mais ligado a perdão e esquecimento ou indulto. Convém observar que desde a instauração do estado de comoção interior em 2002, foram iniciadas as detenções de defensores de direitos humanos sob alegações de envolvimento com grupos guerrilheiros – as quais foram fortemente impulsionadas pela política de recompensas - e a exposição da sociedade colombiana a maiores riscos de morte, dada a estratégia de armamento à população como tentativa de “levar o controle do Estado para áreas marginais”no âmbito do Programa Soldados Campesinos. Os despreparos militar e psicológico dos participantes do programa era evidente em relação às táticas empreendidas pelos grupos guerrilheiros em suas incursões, conduzindo-os às estatísticas de baixas no conflito armado, ademais de constituir em outra expressão do conflito colombiano como uma guerra contra os civis (OSPINA, 2007; LAIR, 2001; LEONGÓMEZ, 2002). Dados os desdobramentos destas políticas em curso concomitante com o trâmite da Lei de Justiça e Paz, como transformar a salvaguarda da sociedade e a defesa de seus direitos de maneira efetiva? Eis a questão, dados os efeitos colaterais relacionados à aplicação das políticas no âmbito da PSDD, além das denúncias de violações de direitos humanos - componentes que parecem instituir uma dinâmica paradoxal se analisados paralelalemente aos mecanismos previstos em Lei a fim de salvaguardar os direitos humanos à sociedade colombiana.

121

Conforme a ministra de relações exteriores da gestão Uribe, Carolina Barco, o foco do governo

em

âmbito

doméstico

seria

promover

a

governabilidade

democrática,

reestabelecendo o império da lei em território nacional mediante um compromisso com a sociedade colombiana no resguardo de seus direitos individuais e humanos (BARCO, 2004). Aparentemente contraditório tal apelo à luz das considerações anteriores, entretanto, tratou-se de uma mensagem enviada à comunidade internacional sob a forma de desafios no âmbito da política externa colombiana, donde:

Atualmente, o maior desafio enfrentado pela política externa colombiana consiste em transmitir de modo efetivo a mensagem de que a Colômbia está fortalecendo a democracia e a governabilidade em todo o território nacional, promovendo o desenvolvimento com eqüidade; que continua lutando contra o terrorismo e persevera no compromisso indeclinável de combater as drogas. Mas esse esforço não é suficiente, e são necessárias ações concretas, decididas e imediatas da comunidade internacional” (BARCO, 2004, 69-70).

A referida mensagem parece ter funcionado de maneira mais eficaz com os Estados Unidos do que com os demais Estados, principalmente os Estados vizinhos, que se depararam com um envolvimento maior em relação ao conflito devido à extensão de seus efeitos colaterais para a seara internacional –traduzidos a princípio nas ondas emigratórias de desabrigados, além da transformação das regiões de fronteira menos patrulhadas em rotas de fuga para os grupos guerrilheiros; estes acuados pelo Plano Patriota e com a preocupação de salvaguarda dos plantios de coca (ROJAS, 2007; DAWOOD, 2004; URIGUËN, 2008). Retornando à questão da Lei de Justiça e Paz, a posição crítica da comunidade internacional e de ONGs acerca do fomento à impunidade revelou uma interpretação dúbia acerca dos objetivos de reparação, ressaltados como questões contempladas neste esforço para assegurar a paz na Colômbia sem perdoar crimes hediondos (RINCÓN, 2005). Tanto estas divergências interpretativas acerca da “mensagem” que o Estado colombiano intenta enviar à comunidade internacional mediante suas políticas, quanto as críticas e análises realizadas com base na assimetria entre de jure e de facto relativas à aplicação da Lei de Justiça e Paz, revelam o caráter fragmentário do conflito interno colombiano, que dentro do espectro normativo ainda possui a querela das brechas normativas mencionadas anteriormente (THOUMI,2009). Entretanto, além das problematizações acerca das referidas assimetrias e dos custos humanitários marcadamente ressaltados, a questão trazida por Abad (2002) relativa à vingança e retribuição de caráter pessoal não pode ser

122

negligenciada, visto que se trata de uma força motriz para o acirramento de um conflito com polos ideológicos - e territoriais conforme figura 6 - distintos. Algo que aparentemente define um conflito de natureza tão fragmentária e complexa em meio a discursos dissonantes seria a manipulação e a distorsão da verdade mediante a presença de diversos interesses em choque. Verdade esta apresentada na Lei em seu artigo 7º como condicionalmente exequível (COLOMBIA, 2005, p.1). Verdade da qual carece a sociedade colombiana para a reconstrução de si mesma e de um sentido maior de reparação do que o oferecido pela anistia e pelos mecanismos legais presentes:

[...] En las guerras, la verdad es un arma que utilizan todos los bandos. Por ello, después de una guerra, la tarea de las comisiones de verdad es en parte distinta a la que cumplen en las dictaduras sin conflicto. Su oficio primordial es describir en blanco y negro lo que fue escrito en blanco y negro, pero además, redescubrir los grises. En la realización de esa tarea, las comisio-nes de la verdad son superiores al derecho. El derecho es una máquina de leer en blanco y negro, maravillosa para resaltar y para valorar lo que fue escrito con sangre en blanco y negro, pero relativamente incompetente para mostrar los grises. Mientras el derecho pone los casos –cognitiva y moralmente– claros de victimización en el centro y las zonas grises en la periferia del sistema, un discur-so sobre la reconciliación debe poner las zonas grises en el centro. Nuestra comisión deberá tener en cuenta las peculiaridades de ambos mundos cromáticos. Para ello deberá extenderse, por ló menos en materia de grises, hasta los comienzos del Frente Nacional. Pienso, por último, que una comisión oficial de la verdad y la reconciliación para Colombia, estará inevitablemente, y para bien, muy interferida por la comunidad internacional, pero deberá ser refrendada democráticamente. Quiera Dios que de esa manera la justicia y la reconciliación se concierten ambas para un “Nunca más”(ABAD, 2002, p.99).

A importância da verdade, do esclarecimento dos fatos e do registro devido dos acontecimentos se dá como parte da tentativa de construção da memória coletiva colombiana menos regada de impunidade e violência, mas com bases firmes em um Estado capaz de garantir que os elementos externos e complementares aos indivíduos - que lhes são peculiares para o tecer da memória individual – sejam sinônimos de direitos e cidadania (HALBWACHS, 1990). Talvez seja esta a fórmula para se garantir à sociedade colombianidades diferentes das observadas contemporaneamente. Não obstante, esta vertente de problemáticas e questionamentos - a ser levada em consideração com a aplicação da lei – fica reclusa à penumbra dos índices positivos apresentados pela PSDD como a redução no número de sequestros e as taxas de violência urbana, ademais da popularidade conquistada por Uribe ao fim de seu primeiro mandato presidencial. A própria questão das redefinições político-partidárias, esboçando a saída do tradicional bipartidarismo – com a emergência de frentes recentes como o Partido de la U,

123

Cambio Radical, Convergencia Ciudadana e Pólo Democrático Alternativo - também teve parte neste cenário de perspectivas para um novo modelo de segurança a ser levado adiante. O aumento da transferência dos impostos para o setor da segurança a partir de 2006 e a especulação de uma segunda reeleição de Uribe mediante reforma constitucional também fizeram parte desta pauta (RANGEL, 2007). Todos estes méritos, angariados na gestão Uribe no marco da PSDD e da Lei de Justiça e Paz, mascararam a crise que estava no âmbito do porvir, gestada a partir das problemáticas apontadas a este segmento do trabalho; ou seja, a crise equacionada pela intervenção do Equador em adição ao aumento de hostilidades com a Venezuela por ser interpretada como produto de negligências aos referidos efeitos colaterais das políticas empreendidas, as quais, por sua vez, não conseguiram engendrar simpatia por parte dos países vizinhos devido ao temor da ingerência estadunidense, transformando as regiões fronteiriças em focos de tensão a posteriori (BARRAGÁN, 2007; MONTENEGRO, 2007).

A intervenção no Equador como um indício pronunciado do transbordamento do conflito colombiano Pode-se dizer que o Estado equatoriano, dentre todos os Estados vizinhos da Colômbia, é o que sofre de forma mais próxima os efeitos das Políticas antinarcóticos e terrorismo engendradas na Colômbia, não apenas devido ao estopim representado pela crise de 2008, mas por litígios e questões estruturais já empreendidas de outros tempos, os quais culminaram após um recrudescimento de aplicação da PSDD de Uribe. Logo, a intervenção ocorrida em 01/03/2008 pode ser figurada como a “ponta de um iceberg”. Retomando as propostas de alinhamento aos Estados Unidos no concernente às declarações de guerra ao terror e ao narcotráfico - discutidas à luz do comunicado da Presidência ao Congresso colombiano – o Estado colombiano já deixava evidente sua carta de intenções, as quais se materializaram de maneira mais beligerante a partir da reeleição de Uribe em 2006,

com a recusa terminante de trocas de sequestrados por prisioneiros

guerrilheiros a despeito de setores da opinião pública (DE CASTRO, 2008). A persistência desta negativa por parte do governo levou as FARC-EP a recorrerem a intermediações por parte do presidente venezuelano Hugo Chávez Frias, resultando em 10/02/2008 na libertação unilateral da acessora de campanha de Ìngrid Betancur, Clara Rojas e da ex-congressista Consuelo Gonzáles, ademais da libertação posterior de outros sequestrados políticos dos períodos de 2001-2002. A resposta do governo colombiano, no entanto, se materializou em

124

um bombardeio aéreo em 01/03/2008 e no assassinato de Raúl Reyes, número 2 das FARCEP, em território equatoriano, gerando uma crise diplomática entre os dois Estados e a Venezuela, ademais de evidenciar o previamente anunciado desequilíbrio do contexto regional (DE CASTRO, 2008; LARA; AYALA, 2008). Dentro deste contexto, podem-se depreender três dinâmicas complementares em voga: o aumento das animosidades derivado do recrudescimento da política de segurança colombiana, o transbordamento do conflito nos marcos fronteiriço e interventivo e envolvimento compulsório dos Estados vizinhos no conflito em virtude das consequências da referida política e da ingerência estadunidense evidenciada pela crise com o Equador.

Tabela 11 - Compreensão geral acerca do contexto da crise de 2008 – intervenção no Equador O recrudescimento da PSDD na Colômbia

O transbordamento do conflito colombiano

Antece-

O fracasso das políticas de negociação, empreendidas

Assimetrias de natureza interna derivadas de

dentes

com os grupos insurgentes e paramilitares, motivou a

fragmentações que moldaram o conflito nas

opção pela fórmula política que conduziu Álvaro Uribe

dimensões

à presidência e à reeleição – segurança total e

normativa e política. Logo, o pano de fundo do

eliminação do terrorismo empreendido pela subversão.

transbordamento habita em principal na escassez de

geográfica/territorial,

fundiária,

providências de demandas domésticas sociais mediante o insulamento dos canais de comunicação entre governo e sociedade, aprofundando as assimetrias e abrindo espaço para a paraestatalidade e o consequente aprofundamento do conflito interno e suas complexidades. Motiva-

Apoio de setores da sociedade colombiana à revelia

- Divergência de interesses políticos disputados na

ções

dos escândalos contra os direitos humanos; aposta na

égide do bipartidarismo, suscitando o patrocínio de

segurança pública e na instauração da paz por outros

polos opostos em um conflito que recorreu às

meios não angariados pelos mecanismos de negociação

armas e apresentava ideologias divergentes em suas

empreendidos anteriormente.

conformações iniciais; - Radicalização do Plano Colômbia e a instituição do Plano Patriota como guerra ao terror sem precedentes à revelia das pertubações do equilíbrio regional.

Ações

Instituição da PSDD e desdobramentos desta mediante diversos planos, em principal o Plano Soldados Campesinos, Plano Patriota e a Lei de Justiça e Paz .

125

Efeitos

- Aumento dos riscos para os civis, despreparados para

- Compreensão da Colômbia como uma ameaça por

/conse-

um enfrentamento direto com os mecanismos violentos

parte dos Estados vizinhos, seja devido ao episódio

quências

peculiares dos atores armados envolvidos no conflito;

de 01/03/2008, seja pelo temor da ingerência

observa-

- Aumento do policiamento e a militarização fronteiriça

estadounidense em espectro análogo ao Plano

dos (as)

por parte da Colômbia, fomentando a busca dos grupos

Colômbia;

guerrilheiros por outros territórios para fins de

- Produção de um espectro divisório em caráter

ocupação ou mesmo recorrendo a rotas de fuga em

regional mediante a consideração dos grupos

território estrangeiro;

guerrilheiros como terroristas por parte do Estado

.Aumento do número de desabrigados em virtude do

colombiano e não compartilhamento desta visão

conflito;

pelos demais Estados vizinhos;

- Críticas e pressões da opinião pública nacional e internacional em virtude do escândalo dos falsos positivos, da Lei de Justiça e Paz como mecanismo de anistia à revelia de reparação e do afastamento de acordos com as FARC-EP no âmbito humanitário, culminando na intervenção do dia 01/03/2008; - Afastamento definitivo das prospecções de solução negociada com as FARC-EP. Elaboração Nossa (2012), com base em considerações e autores apresentados anteriormente no trabalho.

Apresentados alguns dos desdobramentos relativos ao transbordamento do conflito colombiano que rotundaram a questão da intervenção do Equador, convém apresentar que as assimetrias e contradições provenientes tanto do conflito colombiano quanto da política estadunidense de construção de bases militares pelo subcontinente sul americano são alguns dos fatores que potencializaram a geração da crise, em conjunto com o pano de fundo mencionado. Conforme Monteiro (2008), o Estado do Equador apresenta determinadas peculiaridades, tanto por estar mais próximo do espaço de atuação do Plano Colômbia quanto por sofrer interações de maior intensidade, engendradas em virtude de vários fatores, tais como: inclusão da porção norte do referido Estado nas dinâmicas extranacionais do conflito; problemas ambientais além-fronteira – traduzidos no embate entre os cultivos de coca e papoula e as fumigações aéreas – o grande contingente de colombianos se deslocando para o Equador devido aos desalojamentos; o tráfico de drogas e a deliquência comum. Dentro deste contexto, emerge uma disputa de interesses caracterizada por um intercâmbio de “joguetes” de ambos os lados: do lado colombiano, incursões no território do Estado do Equador empreendidas desde novembro de 2005, na região de Esmeraldas, até as posteriores incursões de 2006 – 2008 na região de Sucumbíos, enquanto do lado equatoriano, as ameaças de

126

deportação de imigrantes ilegais colombianos e o uso de refugiados como mecanismo de pressões políticas ao governo colombiano, ademais de mecanismo de atração de investimentos internacionais a fim de propiciar contendas aos efeitos do conflito – solução incipiente tanto no âmbito financeiro quanto no âmbito prático (LARA; AYALA, 2008; MONTEIRO, 2008). Depreende-se, então, que as disputas políticas já possuíam lugar no cenário do conflito, conferindo feições regionais que antecediam a referida crise de 2008, inclusive com violações à soberania do Estado do Equador de forma menos pronunciada pelos mecanismos midiáticos, responsáveis pela contemporarização da problemática em nível internacional. Outro aspecto a problematizar os antecedentes da previamente anunciada crise seria a presença de recursos naturais no departamento fronteiriço entre os Estados de Colômbia e Equador, a região de Putumayo. Alvo de colonizações a fim de exploração de recursos primários nos séculos XIX e XX, exploração de petróleo pela Texas Company em 1963 em Orito, Colômbia e 1967 em Sucumbíos, Equador, a região ganhou um ponto a mais de inflexões com a chegada dos grupos guerrilheiros a partir da década de 1970 e o incremento da cocalização, em virtude de baixos investimentos ao setor da agricultura tradicional instalada na região (URIGÜEN, 2008). Adicionalmente, a questão da percepção diferenciada de ameaças no espectro nacional norteou os embates dentro deste entorno estratégico, fomentando a conflitividade na região fronteiriça e reduzindo o escopo para a confiança e a concertação política entre Uribe e Rafael Correa, presidente do Equador:

[...] tanto las percepciones de amenaza como los intereses de seguridad provenienen de los contextos nacionales y no regionales. En este sentido, la orientación es adoptar políticas de largo plazo y así esta sensación de peligro de Ecuador, en lo que se refiere al conflicto colombiano, esta determinada por la incapacidad del gobierno colombiano para controlar su territorio y los actores que dentro de él operan. En este sentido, la zona más vulnerable para el Estado ecuatoriano se ubica en la frontera Norte, y el objetivo es solucionar en el menor tiempo posible los problemas que la aquejan como la alta cantidad de refugiados y/o desplazados, actividades ilícitas, entre otros (URIGÜEN, 2008, p.5)

À luz dos contextos apresentados, observa-se a gestação da crise com o Estado do Equador a partir de interações conflitivas por parte do Estado colombiano intermediadas por políticas de âmbito doméstico na égide estadunidense, fomentando a complexidade das relações entre os referidos Estados à fronteira Norte do Equador e evidenciando os dois marcos de transbordamento do conflito colombiano mencionados anteriormente.

127

O percurso realizado desde o fracasso dos ambientes de negociação com a insurgência e a instituição do Plano Colômbia até a desoxigenação dos referidos ambientes e o esvaziamento do papel cumprido pela insurgência como atores do conflito armado, pôde ser delineado dentro de um panorama político de tentativas de recentralização do governo e projeção de poder via força militar à revelia das questões sociais, impingindo-lhe custos humanitários, mecanismo legal deficitário e fomentando a referida crise diplomática, coroada pela última intervenção no território do Equador à “caça de terroristas” com a morte do chanceler das FARC, Raúl Reyes (DE CASTRO, 2008). Neste ínterim, as intenções registradas ao longo do presente capítulo eram as de demonstrar que a gama de acontecimentos interrelacionados, provenientes principalmente das dimensões política e territorial do conflito, possui um histórico permeado pela debilidade institucional colombiana e pelo continuísmo de litígios diversos, cujos impactos contínuos em associação com os câmbios políticos relativos ao período de 2002 a 2008 conferiram agravo do cenário de crises, descortinando a cimeira do “iceberg”. Logo, assim como o episódio da intervenção do Equador pode ser observado como o ápice de um processo gestado de divergências, as políticas empreendidas por Uribe, apesar de sua rápida projeção e de repercussões positivas e negativas difundidas à luz dos veículos midiáticos, podem ser inseridas em um processo de escalada do conflito colombiano, fadado a se desenvolver em virtude da permanência dos litígios territoriais e demandas sociais não contempladas. As políticas que serviram de sustentáculo para a eleição e reeleição de Uribe, engendradas no âmbito da PSDD – dentre os quais foram problematizados os Planos Patriota, Soldados Campesinos além do Plano Colômbia – constituíram antes em um catalisador do referido processo do que causas fundadoras, em principal porque ademais de sua constituição recente, pertencem à dimensão epidérmica do conflito, ou seja à dimensão política. Segue ilustração indicando a progressão e a interligações das dimensões do conflito colombiano neste sentido.

128

Figura 7 - Interligação das dimensões do conflito colombiano

Dimensão Geográfica Dimensão Fundiária Dimensão Normativa Dimensão Política

A partir desta concepção de multidimensionalidade, bem como da escalada deste, subentende-se que são diversos os processos inseridos no abrangente envolvimento com as questões gestadas a priori no interior do Estado colombiano. Apresentadas estas dinâmicas e compreendidas à luz do breve histórico e comparativo político estabelecido até este ponto, observa-se a transcendência e a complexificação destas dimensões imbricadas no conflito colombiano, provendo fomento a diversas considerações e reflexões em torno de causas e consequências. É justamente este movimento de transcendência que será explicitado no capítulo a seguir, sob a denominação de transbordamento do conflito.

129

BRASIL, VENEZUELA E A QUESTÃO COLOMBIANA – respostas políticas ao transbordamento do conflito e suas complexidades

Analisados os contextos que permearam a ascensão de Álvaro Uribe à presidência colombiana e as transformações de ordem política e normativa - as quais ademais de base eleitoral ao referido presidente, constituíram um mecanismo de fechamento do ambiente de negociações com a insurgência e fomento à escalada do conflito armado – pode-se considerar construído o ambiente analítico para a apreciação da questão principal do presente trabalho: o transbordamento do conflito interno colombiano sob os marcos interventivo e fronteiriço. Nesta linha de raciocínio, pretende-se apresentar neste segmento do trabalho as caracterizações do transbordamento segundo as “modalidades” mencionadas dentro do âmbito das bases metodológicas propostas ao início, concatenando análises políticas, geopolíticas e sociológicas. Logo, o presente capítulo se estrutura tematicamente em: uma breve retomada comparativa acerca do transbordamento do conflito colombiano nos marcos interventivo e fronteiriço no escopo de antecedentes, motivações e desdobramentos; o contexto da tensão regional instaurada a partir da intervenção no Equador, contando com observações e análises à luz das posturas e providências políticas adotadas pelos Estados brasileiro e venezuelano; breve análise comparativa do arranjo regional traduzido no Conselho de Segurança Sul Americano (CDS) como resposta ao litígio de segurança representado pelo conflito colombiano e seu transbordamento; e por fim, considerações finais acerca do fim da gestão Uribe, contando com uma análise em perspectiva do contexto regional gestado pelos desdobramentos do conflito colombiano à luz das ações empreendidas pelo governo Santos na atualidade. Como segmento final do presente trabalho, o objetivo é empreender um encerramento das análises propostas ao início sem a pretensão de encerrar os debates e o espaço para a produção de reflexões acerca de uma temática abrangente, complexa, multifacetada e a qual permanece em franco desenvolvimento.

130

Um delinear metodológico acerca do transbordamento do conflito colombiano: breves aproximações sobre os marcos interventivo e fronteiriço do fenômeno

Após segmentos contextualizadores apresentados nos capítulos anteriores, os quais em determinada medida retomaram a estratégia de ambientação disposta ao início do presente trabalho, convém contemplar novamente o “tripé metodológico”, proposto também ao início do trabalho, ilustrando com mais clareza aspectos concernentes ao transbordamento do conflito colombiano. Fenômeno passível de desdobramentos advindos da intervenção estadunidense e de litígios comuns que perduraram nas regiões de fronteira, derivados da ausência de políticas efetivas e concertadas para sua resolução, o transbordamento do conflito será explicitado sucintamente mediante duas tabelas: uma explicitando sucintamente os principais aspectos observados no marco interventivo e outra no fronteiriço, disponibilizando fomento para posterior análise. Tabela 12 - Principais aspectos observados como pano de fundo para o transbordamento do conflito colombiano no âmbito do marco interventivo Aspectos Políticos

Aspectos Geográficos das

Aspectos Sociológicos

Expressão da ingerência esta-

Preponderância

políticas

Criação de um ambiente de menor

dunidense sob a forma de planos,

antinarcóticos e contrainsurgentes

conhecimento acerca do outro,

iniciativas e operações que tive-

à revelia do respeito à soberania e

reduzindo as relações entre os

ram lugar a partir de justificativas

aos limitres territoriais delineados

polos

diversas, como o combate ao

pelas fronteiras;

amigo-inimigo

comunismo à década de 1960 na

Interesses por controle e projeção

sociedade);

égide do LASO, a Iniciativa Andi-

política mediante “recuperação de

Neutralização da verdade;

na como regionalização das estra-

territórios” em especial por áreas

Fragmentações no âmbito social

tégias previstas pelo Plano Colôm-

com riquezas naturais estratégicas.

identitário, evidenciando as difi-

conflitantes

à

dinâmica

(polarização

da

bia no combate a narcóticos,

culdades de se forjar uma iden-

ademais da “radicalização” das

tidade nacional e projetos que

ações previstas no referido plano e

agreguem o reconhecimento da

seus desdobramentos; Insulamento

sociedade colombiana como um

dos

todo;

canais

sociedade

de

entre

governo

forma

e

histórica,

Instituição da

violência

como

prevalecendo os inte-resses da

recurso para a concretização de

elite que ascendia ao governo -

objetivos.

consequentemente

conferindo

abertura à ingerência externa. Elaboração Nossa, 2012. Com base em considerações e autores apresentados anteriormente no trabalho.

131

Tabela 13 - Principais aspectos observados como pano de fundo para o transbordamento do conflito colombiano no âmbito do marco fronteiriço77 Aspectos Políticos

Aspectos Geográficos

Aspectos Sociológicos

compreensão

Fragmentação territorial gestada

A ocorrência (e permanência) de

conceitual dos termos de Estado,

no Estado colombiano desde seus

problemas sociais entre outros

soberania e fronteiras, conferindo

primórdios;

litígios

uma dinâmica diferenciada para os

Escassez

de

estudos

truturais

com

Alterações

na

de

Relações

Interna-

projetos

independen-

temente da existência/separação

capacidade

o

através das fronteiras, propiciando

promover

a

identificação e possibilidades de

cionais e afins;

suficiente

A preponderância de uma ide-

integração da malha territorial;

ologia política beligerante, repro-

Alterações

duzindo

a

territorialidade e suas dinâmicas

A identificação com o papel

doutrina de Washington princi-

internas, trazendo à baila litígios

político exercido pela insurgência

palmente no contexto pós 11/09,

intraterritoriais que uma vez não

ou mesmo o alinhamento devido a

desconsiderando convenções que

solucionados,

ausência

obstruam a consecução de seus

fronteiras;

ascensão social em determinadas

objetivos – traduzidas em viola-

Interesses por controle e projeção

localidades,

ções à soberania e o afastamento

política mediante “recuperação de

incorra na migração transfron-

de uma égide regional para a

territórios” em especial por áreas

teiriça;

resolução deste litígio de segu-

com riquezas naturais estratégicas.

Fragmentações no âmbito social

similitudes

com

rança.

para

infraes-

comuns

na

concepção

transcendem

alinhamento a um dos polos do de

as

conflito armado;

de

alternativas

mesmo

que

de

este

identitário, evidenciando as difi-

Insulamento

entre

culdades de se forjar uma iden-

governo e sociedade de forma

tidade nacional e projetos que

histórica, prevalecendo os interes-

agreguem o reconhecimento da

ses da elite que ascendia ao

sociedade colombiana como um

governo

todo;

-

dos

canais

consequentemente

conferindo abertura à paraestata-

Instituição da

violência

como

lidade.

recurso para a concretização de objetivos.

Elaboração Nossa, 2012. Com base em considerações e autores apresentados anteriormente no trabalho.

Mediante apresentação das duas tabelas, as quais representam basicamente quadrosresumo com considerações e constatações observadas ao longo do trabalho, é possível 77

Eventuais repetições entre as componentes retratadas às tabelas 12 e 13 foram propositais, dada a interrelação entre os marcos do transbordamento do conflito colombiano. Conforme mencionado e a ser analisado adiante, o transbordamento do conflito em sua conformação fronteiriça se tratou de uma derivação do processo de transbordamento do conflito em sua conformação interventiva.

132

observar aproximações entre os dois marcos de transbordamento no âmbito dos aspectos antecedentes, fomentadores para o desenvolvimento dos fenômenos em conformidades expressas anteriormente. Neste âmbito, outra depreensão possível seria o marco interventivo do transbordamento desencadeia em certa medida o transbordamento no marco fronteiriço, a considerar o âmbito das motivações para a transgressão da soberania por exemplo. Esta interrelação pode ser explicitada a partir da percepção de ameaças sob a visão estadunidense no contexto pós Guerra Fria, donde os potenciais riscos detectados para a região da América Latina se enquadram em duas categorias:

Fazendo uma sistematização das análises apresentadas sobre as fontes de conflito no mundo pós-guerra fria, podemos agrupar as ameaças em quatro categorias: 1. políticas de poder de potências hostis com capacidade de desencadear corridas armamentistas, disputas por recursos naturais, terrorismo, guerras; 2. instabilidade regional gerada pela desestruturação de países em razão de conflitos internos, especialmente os que têm como origem a politização de diferenças de origem étnica; 3. emigração em massa provocada por esses mesmos conflitos, pela pobreza ou por catástrofes naturais; 4. Insegurança global por desequilíbrios no mercado financeiro, degradação do meioambiente, disseminação de doenças, tráfico de drogas ou crescimento populacional descontrolado. Quando as ameaças são divididas por região, os potenciais de risco atribuídos à América Latina se situam nos itens 3 e 4. (AYERBE, 2002, p.273)

Ainda conforme Ayerbe (2002), apesar da multiplicidade de enfoques acerca da postura estadunidense no pós - Guerra Fria, ora delegando litígios às instâncias multilaterais, ora se encarregando de delinear as fronteiras do “mundo livre” punindo perturbadores da ordem, o principal desafio que desponta neste contexto seria a questão da garantia de governabilidade e ordem, enquanto no concernente à resolução dos conflitos, “o objetivo é fortalecer a capacidade de ação dos Estados, promovendo a modernização e o aparelhamento do sistema judiciário e das forças de segurança, estimulando mecanismos sub-regionais de intervenção” (AYERBE, 2002, p.279). Neste contexto, apesar da transição de ordenamento mundial, é possível compreender que existe um resgate ao pensamento norteador da segurança hemisférica em determinadas ações empreendidas pelos EUA, em principal adequando a referida percepção de ameaças ao conflito colombiano e desdobramentos. O LASO, o Plano Colômbia e demais concepções contempladas na tabela 12 refletem estas visões e percepções adaptadas à questão colombiana, ilustrando a permanência de certas dinâmicas e preocupações. Trata-se da dinâmica de considerar o futuro tal qual o passado em matéria de “estadismo” e estratégia, lançando mão de ingredientes bem sucedidos, visto que apesar das mudanças estruturais

133

compreendidas no âmbito do SI, a essência é de continuidade das políticas em âmbito internacional (GRAY, 1999; WALTZ, 1998). Para compreender esta dinâmica de transições e continuidades, convém retomar alguns conceitos em transição caros para a ilustração dos fenômenos contemplados a este segmento do trabalho, como as compreensões de Estado e soberania face ao novo arranjo do pós - Guerra Fria. Rememorando o percurso conceitual metodológico realizado ao segmento de ambientação deste trabalho, foram demonstrados reflexos de articulações conceituais entre os estudos de RI e Geopolítica dentro dos termos Estado, soberania e território, demonstrando que apesar da emergência de novos debates, paradigmas e revisões conceituais, a preocupação com segurança – e manutenção de território em última instância – segue em pauta no constructo de políticas domésticas e políticas internacionais elaboradas pelos Estados. No entanto, paralelalemente a estas preocupações, o advento da globalização e de novos paradigmas apregoam a minimalização da atuação do Estado, dado o compartilhamento desta prerrogativa com outros atores em nível doméstico e internacional, conforme versam Rosenau e Durfee (2000). Neste âmbito, convém questionar até que ponto o conceito weberiano, arrolado ao segmento de ambientação, explicita por si a dinâmica reproduzida pelo contexto do conflito e do transbordamento do conflito colombiano. Para tanto se faz necessária uma cisão entre a compreensão acerca do Estado colombiano em conformação doméstica e como participante do SI no referido contexto, e a compreensão acerca das motivações da ingerência estadunidense sobre o referido Estado. No primeiro caso, recuperando problematização anterior - em que se resgatou a conceituação de monopólio da violência por parte do Estado e ambientou-se a questão do dilema de autoridades como um desdobramento da dimensão política do conflito - convém ressaltar que o Estado possui prerrogativas peculiares que o distinguem dos demais atores do Sistema Internacional. Tais prerrogativas, levantadas por diferentes conceitos ao longo do tempo e da transição de paradigmas políticos e relativos aos estudos de RI, convergem no domínio calcado na centralidade como elemento justificador no provimento da segurança aos indivíduos e no exercício da soberania, a qual corresponde ao direito de decreto à guerra, celebração de paz, representação via corpo diplomático, personalidade jurídica, representação em instâncias internacionais através do exercício de observação, voto ou participação na elaboração de agendas (CASTRO, 2012). Ou seja, enquanto compreensão política clássica e relativa ao conceito de Estado moderno, o exercício da soberania equivale às prerrogativas descritas em conjunto com o princípio de respeito às demais jurisdições territoriais pertencentes aos demais Estados, reconstituindo o pilar da anarquia do SI e resguardando as

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interações das unidades políticas78. Aglutinando os referidos conceitos, em suma, o Estado corresponderia à “materialização organizada – fruto de um processo histórico – da vida social e das aspirações humanas com um grau elevado de institucionalismo e reconhecimento internacional” (CASTRO, 2012, p.105), compreendido em um determinado espaço físico e limitado territorialmente ao exercício da soberania dentro de suas fronteiras. É a este ponto que habita a limitação conceitual/metodológica dos estudos de RI em observação ao conflito colombiano, instituindo um ponto que demanda intersecção com os estudos de Geopolítica. Conforme os aportes de Rosenau e Durfee (2000), dentro do âmbito do pós internacionalismo, questões referentes a transições conceituais que tangenciam o Estado e a soberania a partir da globalização podem ser compreendidas a partir das relações entre as esferas estatocêntrica – concernente aos Estados – e multicêntrica – concernente aos demais atores domésticos e do SI. Neste contexto, a soberania estatal estaria em erosão em virtude das múltiplas dinâmicas em voga e da estrutura fragmentária que o Estado apresenta, suscetível a crise de autoridade em meio às complexidades do SI. Entretanto a visão do cientista político acerca da turbulência como vetor paradigmático a reger a fragmentação, porosidade fronteiriça e a emergência de diversas fontes de autoridade alterando as concepções de governabilidade doméstica e governança (ROSENAU, 1997) não explica ou problematiza com maior profundidade as consequências desta nova dinâmica de forma comparada, restringindo-se ao âmbito de apresentar as mudanças conceituais ocorridas sob um novo prisma. Em relação à concepção de Estado e soberania descrita anteriormente, talvez o mérito desta formulação teórica habite em detectar que a questão da territorialidade ainda esta na pauta de preocupações, ademais da presença de diferentes fontes de autoridade emergentes em conjunto com a pluralidade de atores (ROSENAU, 1997), não incorrendo no equívoco delimitado por Agnew e Corbridge (1995) como armadilha territorial. Rememorando as considerações de Agnew (2009) acerca do conceito de território e seu uso através de conotações políticas – seja no sentido de envolver a limitação de acessos a determinados locais e regiões, seja no sentido de dominação exercida sobre um dado espaço com determinadas espécies ou indivíduos - a territorialidade consiste no uso do território para atingir metas organizacionais, incluindo outros atores ademais do Estado e consistindo em uma das diversas formas de organizar o espaço social e politicamente. Considerar a espacialidade e a soberania restritas à conformação eminentemente territorial constituiu o 78

Ver ARON (2002). Conceito utilizado para designar atores do Sistema Internacional que possuam a prerrogativa da soberania e de aplicar políticas. Este conceito é utilizado pelo autor em vez de Estado visto que ele remete em suas análises a períodos anteriores ao Tratado de Westphalia – o qual instituiu o Estado – analisando por exemplo as pólis gregas.

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ponto de inflexão com as concepções clássicas do conceito de Estado e soberania explicitados à luz dos estudos de RI em formulações teóricas da década de 1990 e anteriores. Segundo Agnew e Corbridge (1995), há três fatores contextuais expressos nas formulações teóricas dos estudos de RI que privilegiam a concepção territorial do Estado, conectados a três pressupostos geográficos chave: 1) Os Estados se materializaram como unidades fixas ou pré-dispostas de espaço soberano, desistoricizando e descontextualizando o processo de formação do Estado e desintegração; 2) O uso de polaridades para a distinção entre âmbito doméstico/estrangeiro e nacional/internacional, obscurecendo a interação entre processos que escapam a estas dualidades, como por exemplo, a desterritorialização do capital e da produção industrial com o advento da globalização; 3) O Estado como ente territorial visto como um container da sociedade, transformando-a em um fenômeno nacional. Neste sentido, está constituída a armadilha territorial, principalmente manifestada às questões de segurança e defesa da soberania arroladas ao Estado, conforme observado principalmente nas formulações teóricas da corrente realista. A referida associação entre Estado e soberania territorial, ainda conforme os mesmos autores, traz quatro implicações principais, as quais: 1) definição de identidade política exclusivamente através de meios territoriais, fugindo do escopo contemporâneo de fragmentação e setorização de arranjos alternativos, emersos parcialmente em virtude das ameaças à segurança/estabilidade como mudanças na tecnologia militar, questões globais inseridas no contexto ecológico ou mesmo resistências a governos burocráticos repressivos. Isto pressupõe o monopólio da coerção em termos weberianos, ademais de maior regulação sobre as liberdades individuais, retomando a dialética do Estado de natureza hobbesiano em termos previamente mencionados; 2) a rígida separação entre a população pertencente a um determinado território e seus valores universais concernentes a uma determinada prática política e a população de fora, que pratica valores diferentes . Esta categoria de marginalização territorialmente localizada está progressivamente perdendo espaço na contemporaneidade a despeito da continuidade de sua representação, principalmente com a desterritorialização das comunicações e a migração de indivíduos, eliminando parcialmente estes “confinamentos” de Estados à margem do sistema; 3) a visão da soberania em termos de segurança espacial implicando em admitir o Estado em sua conformação territorial como um sujeito idealizado no escopo de processos decisórios, desconsiderando suas particularidades históricas em prol de determinar esta abstração. Isto limitou a possibilidade de enxergar os Estados como autores de contribuições únicas para o SI em matéria de comportamento e valores, favorecendo uma predisposição para as análises a partir de um prisma de relações militares ou econômicas apenas. O fenômeno inclusive

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conduziu à confusão conceitual entre Estado e nação; 4) o princípio da soberania imbuída territorialmente ao Estado nega a possibilidade de arranjos alternativos pois fixa as perspectivas e a compreensão de oportunidades futuras em relação à distinção entre história e progresso dentro de um escopo contingencial, restrito por fronteiras do Estado territorial. Neste sentido, as únicas configurações possíveis dentro do SI seriam a dos Estados como entes territoriais autônomos na estrutura anárquica ou a integração em um “Superestado global”, em termos análogos aos apregoados por Negri e Hardt em Império (2001)79, retomando a axiomática hobbesiana do Estado de natureza como fundamento para a existência do Estado (AGNEW; CORBRIDGE, 1995). Recolhendo as acepções dos autores, uma das primeiras elucidações que convém realizar seria que a soberania efetiva não é necessariamente predicada ou fixada estritamente às fronteiras territoriais dos Estados, visto que a negociação e a redefinição de poder e autoridade em maneiras abrangidas pelo complexo geográfico sugerem as mudanças nos termos deste debate (AGNEW, 2009). Esta tendência foi parcialmente detectada sem a componente territorial no âmbito da política e das RI:

[...] Yet, just as the foundations of sovereignty have been eroded by the centralizing processes of globalization, so have they been reinforced by decentralizing tendencies wherein people are shrinking "we" to like-minded others and enlarging "they" to everyone else. Subgroupism, tribalism, nationalism, ethnicity- however they are labeled, these simultaneous inclinations to resist globalization by reverting to closeat-hand ties have the consequence of further challenging those who aspire to clarifying the bases of modern-day sovereignty. In some deep and significant sense, in other words, the authority of states has also, like shopping malls, devolved toward the local community (ROSENAU, 1997, p.220).

Os referidos fenômenos de fato podem ser observados contemporaneamente, entretanto estes ocorrem dentro de uma dinâmica de alterações de territorialidade. De fato, a Guerra Fria elencando a partilha do mundo em áreas de influência do modelo estadunidense e soviético “congelou” o mapa político mundial por anos, entretanto as práticas espaciais, bem como o modo de produção do espaço utilizado mudaram drasticamente, transcendendo as representações meramente sob a conformação territorial dentro de um contexto longe de ser abrangido pela homogeneização (AGNEW; CORBRIDGE, 1995). Ademais da restrição da concepção do Estado às questões territoriais nas dinâmicas geográficas supramencionadas, certos exageros acerca da globalização, amplamento difundidos, anuviam as análises teóricas acerca de fenômenos contemporâneos envolvendo o 79

Obra que retrata a supremacia de um único poder em escala mundial se materializando na contemporaneidade a despeito das denominadas permutas globais, inerentes ao fenômeno da globalização.

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SI e seus atores. Esta seria outra motivação para a recorrência ao aporte geopolítico enquanto instrumento de análise interdisciplinar para o objeto de estudos do presente trabalho.Agnew (2009) segmentou análises acerca destas exacerbações conceituais em cinco “mitos da globalização”, os quais: 1) disseminar da ideia de que o mundo é plano, difundindo a perspectiva de que este seria uma crescente superfície indiferenciada donde o comércio e os fluxos de investimentos encontram-se desimpedidos para partir de um lugar para outro. Seria correto inferir efeitos como a redução dos custos com transportes, das barreiras tarifárias e os investimentos internacionais, entretanto o sucesso econômico passa pelo crivo do Estado, que não pode ser excluído através desta hipótese equivocada de planificação 80; 2) pensar que a globalização tal qual vivenciada é algo completamente novo - algo refutado por historiadores e geógrafos. Esta sensação é dada ao passo que os regimes totalitários presentes em período recente do século XX primam pelo Estado em todas as instâncias. Contudo, o processo de abertura e fechamento dos Estados ou unidades políticas em é dado conforme as demandas do período histórico, constituindo um ciclo 81; 3) inferir que a globalização possui raízes em uma única inspiração ideológica, ilustrada na substituição do Estado por mercados. A propagação do modo de vida estadounidense e a consolidação da vitória do capitalismo após a derrocada da ex-URSS constituíram um cenário de preponderância do neoliberalismo e consequente associação da globalização exclusivamente com a referida ideologia. Entretanto, há que se considerar a existência da variável avanço tecnológico no aumento da produção contemporâneo, alavancado pela globalização 82. Logo as raízes do fenômeno habitam o sistema bipolar e não o sistema contemporâneo, o qual acatou o neoliberalismo de bom grado; 4) a suposta divergência entre estado de bem estar social e os ditames da globalização, visto que os Estados estariam disciplinados pelos mercados globais a reduzir custos a fim de angariar investimentos e tornarem-se competitivos. Entretanto, empiricamente, as economias mais prósperas do globo são aquelas que possuem infraestrutura adequada e consolidação de investimentos para estas áreas, tornando o ponto de vista retratado em falácia 83; 5) a globalização como fenômeno inexorável, desprovendo os atores de alternativas. Este seria um caso de interpretação dúbia, visto que equipara o fenômeno da globalização ao determinante de uma era, algo que ainda está em construção84. Não existe um afastamento temporal suficiente para determinar esta questão, principalmente considerando que alternativas podem 80

AGNEW, 2009, p.13 Ibid., p. 16 82 Ibid., p.17. 83 AGNEW, 2009, p.18. 84 Ibid., p. 18-19 81

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habitar o âmbito do porvir. Em

observação

às

considerações

apresentadas,

pode-se

inferir

que

a

contemporaneidade no âmbito da globalização está marcada por uma pluralidade de atores, forças e interações, entretanto isso não significa que o Estado ou a soberania encontram-se “em xeque”, mas sim sujeitos em um ciclo que, propiciado pelo momento anterior, brinda a todos com atores, bem como o próprio SI, com mudanças de contexto e permanências estruturais. A contemporaneidade se depara em dinâmicas simultâneas e contraditórias, que não determinaram o fim da compreensão racional e instrumental do Estado como ente territorial e container da sociedade, mas vivencia a emergência de processos que não podem ser entendidos adequadamente em termos de espaços territoriais fixos no limiar das teorias de RI e economia política internacional (AGNEW, 2009; AGNEW; CORBRIDGE, 1995). Neste sentido, ressalta-se novamente a compreensão em um limiar mais abrangente e interdisciplinar conforme proposto ao início. As fragmentações e as diversas dimensões abrangidas pelo conflito colombiano transportaram diversas problemáticas e as trouxeram à baila mediante os dois marcos de transbordamento mencionados. Compreender as questões trazidas pelo aspecto geográfico no marco interventivo a partir de uma concepção clássica e territorializada de soberania seria propor uma análise incompleta, baseada unicamente no espectro de que a intervenção no Equador por si mesma constituiu no motivo das tensões diplomáticas observadas a posteriori. Ao passo que considerar unicamente as fragmentações de ordem geográfica às quais o Estado colombiano encontra-se sujeito, mediante análises da dinâmica da territorialidade ao observar o marco fronteiriço do transbordamento, também seria incorrer em exercício analítico incompleto, dadas as dinâmicas políticas e as interações entre atores pertencentes a diferentes esferas ocorrendo simultaneamente às territorializações e desterritorializações. Mas o amálgama para a compreensão dos aspectos políticos e geográficos de maneira a contemplar as relações dadas no âmbito doméstico entre governo e sociedade habita nos aspectos sociológicos, por isso a demanda por este aporte. Conforme expresso no segmento Colombianidades e no segundo capítulo, a violência se expressa de diversas maneiras no transcorrer do conflito colombiano e sua recorrência se relaciona tanto com os aspectos geográficos quanto com os aspectos políticos observados no conflito colombiano e nos dois marcos do transbordamento. A prática da violência empreendida tanto pelos grupos guerrilheiros quanto por parte do governo a partir da Força Pública, anuvia de certa maneira a compreensão do papel político cumprido pela insurgência e seu contexto na história colombiana, abrindo espaço para que o limiar entre este conceito e o de terrorismo desapareça (DELLA PORTA, 1995), tal como ocorre nos discursos políticos

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que promoveram a ascensão de Uribe ao poder executivo colombiano. Entretanto, esta dinâmica de rotulações e maniqueísmos, desenvolvida em meio ao conflito e os atores em disputa, se desenvolve em outro tipo de anuviamento: o desconhecimento do outro. A vida em sociedade pressupõe o estabelecimento de relações entre indivíduos ou grupo de indivíduos e estas não estão imunes a conflitos de interesses. Mesmo elevando estas relações ao contexto de interações entre as esferas estatocêntrica e multicêntrica apregoadas por Rosenau e Durfee (2000), materializam-se conflitos de diversos níveis no escopo da divergência de interesses, entretanto o fundamento segue perpassando pelo desconhecimento e equiparação do outro conforme conveniências. O outro está para ser descoberto, mas até onde este processo não fere os interesses?

[...] Porque el otro está por descubrir. El asunto es digno de asombro, pues el hombre nunca está solo, y no sería lo que es sin su dimensión social. Y sin embargo, así es: para el niño que acaba de nacer, su mundo es el mundo, y el crecimiento es su aprendizaje de la exterioridad y de la sociedad; se podría decir un poco a la ligera que la vida humana está encerrada entre esos dos extremos, aquel en que el yo invade al mundo, y aquel en que el mundo acaba por absorber al yo, en forma de cadáver o de cenizas. Y como el descubrimiento del otro tiene varios grados, desde el otro como objeto, confundido con el mundo que lo rodea, hasta el otro como sujeto, igual al yo, pero diferente de él, con un infinito número de matices intermedíos, bien podemos pasarnos la vida sin terminar nunca el descubrimiento del otro (suponiendo que se pueda dar). Cada uno de nosotros debe volverlo a iniciar a su vez; las experiencias anteriores no nos dispensan de ello, pero pueden enseñarnos cuáles son los efectos del desconocimiento (TODOROV, 1998, p.257)

Desconhecer o outro em seus interesses e anseios parece se aplicar à realidade do conflito colombiano - bem como ao contexto da “morte da verdade em meio a guerra” trazido por Abad (2002) - evidenciando que a polarização do conflito e a elevação deste de litígio doméstico a questão internacional através da violência reproduz uma disputa por poder emanado pela política, pela detenção da coerção e de territórios em conjunto com a estratégia de arrolar ao outro o papel de vilão. Desta forma, instaura-se também uma polarização da sociedade, a qual se vê condicionada ao alinhamento a um dos polos conflitantes ou, como mecanismo de resistência, agremiam-se em uma ação coletiva (DELLA PORTA; DIANI, 2006) através da instituição de comunidades de Paz (SANFORD, 2004), se expondo a toda sorte de consequências do conflito armado. Ademais deste relevante pano de fundo para o desenvolvimento do conflito, o histórico de emprego de violência no Estado colombiano, seja através das reprimendas a movimentos contestatórios, seja mediante atores paraestatais preenchendo áreas vazias de

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função estatal revelam o desenvolvimento de uma cultura aliciada pelos meios violentos (WALDMANN, 2007), transformando a violência em causa e consequência, meio e fim. A recepção traumática do Estado, registrada em episódios trágicos como o Bogotazo (CANO, 2002), e a questão da falta de oportunidades de ascensão social, aliada à relativa representatividade encontrada na paraestatalidade (PÉCAUT, 2000; LEONGÓMEZ, 2002) propagam esta dinâmica, apropriada pelos protagonistas do conflito de diferentes formas a fim de salvaguardar seus interesses. Neste sentido, é possível depreender que a chave para a compreensão e superação desta dinâmica social pautada na recorrência à violência tornando o conflito em incidências cíclicas seria tanto o reconhecimento do outro em suas diferenças, quanto a superação das assimetrias existentes desde as bases do conflito, a fim de instaurar um ambiente de negociações mais salutar e fazer prevalecer os interesses pela paz, acuados em meio à disputa que ainda se encontra em desdobramento. Explicitadas as questões metodológicas inerentes ao tripé analítico proposto ao início do presente trabalho, convém retornar ao paralelo existente entre os marcos interventivo e fronteiriço relativos ao transbordamento do conflito colombiano. Quanto aos aspectos políticos destacados no âmbito do marco interventivo, é possível inferir que o insulamento dos canais entre governo e sociedade, empreendido no Estado colombiano com o transcorrer de diferentes gestões, está relacionado com a emergência da violência a posteriori por transformar a recepção do Estado em uma experiência traumática para a sociedade, fazendo com que a presença do Estado recaia na sinonímia de uso ostensivo da força para fins de repressão em vez de resgatar na figura da Força Pública a tarefa da proteção à sociedade no âmbito interno e ao Estado de litígios advindos do exterior (CANO, 2002; COLOMBIA, 1991, n.p.). Esta questão, presente tanto no marco interventivo quanto no marco fronteiriço do transbordamento do conflito armado, evidencia o caráter fragmentário do Estado colombiano no âmbito geográfico, trazendo à baila a questão da falta de políticas e de centralização institucional com suficiente capacidade para “costurar” a malha territorial com projetos de infraestrutura, bem como de identidade nacional – contemplando o aspecto sociológico (HAGE, 2008; PÉCAUT, 2000) – conferindo espaço tanto para a emergência e fortalecimento da paraestatalidade através do fenômeno denominado por Rosenau e Durfee (2000) de subgrupismo, questão que altera também a compreensão de territorialidade imbuída aos conceitos clássicos de Estado e soberania para conceitos relativizados e diluídos na dinâmica da sobreposição de territorialidades (AGNEW; OSLENDER, 2010). A junção das dinâmicas supramencionadas confere espaço para a ingerência externa através de políticas cujos objetivos finais convergem no controle e na projeção de áreas

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estratégicas devido a recursos naturais, ademais da influência política na região, configurando um potencial desequilíbrio em tentativas de se instituir um balanço de poder no âmbito continental85, ao passo que se suscitam políticas beligerantes – observadas principalmente no contexto pós 11/09 e na ascensão de Uribe à presidência - à revelia de transformações estruturais que permitam a inclusão da margem da sociedade de forma efetiva, bem como a própria consolidação da paz.Instaura-se um mecanismo cíclico de geração de violência interna, altos custos sociais, desequilíbrio regional a partir de tensões e migrações forçadas e perspectivas longínquas de encerramento do conflito armado a partir da desoxigenação dos ambientes de negociação. A intervenção armada torna-se arauto e instrumento cabal para a resolução do conflito, configurando por fim as duas modalidades do transbordamento colombiano e suas interrelações. À luz destas observações, infere-se que o marco fronteiriço consiste no reflexo das questões relacionadas ao âmbito interventivo do processo de transformação da doutrina do “Destino Manifesto” 86 para uma cruzada contra o terror ou narcoterror (VISACRO, 2009) em solo sul americano, questão consentida pelo Estado colombiano sem a produção de políticas de integração geográfica e social, permitindo a permanência de questões sociais, políticas e institucionais a fomentar o conflito armado em âmbito doméstico e internacional (HAGE, 2008; URIGUËN, 2008; BARRAGÁN, 2007). Longe de esgotar reflexões acerca de um objeto tão complexo, estas breves reflexões acerca do transbordamento do conflito colombiano em suas conformações, aspectos interrelacionados e desdobramentos a diferentes períodos do histórico colombiano serviram como ponto de partida para se exercitar a compreensão das políticas empreendidas pelos Estados vizinhos ante a evidência da crise, trazida pelo episódio da intervenção do Equador e pela posterior crise diplomática deste Estado com a Colômbia. Tais questões trouxeram de certa maneira a preocupação com segurança em âmbito regional de volta ao debate, suscitando na dinâmica de mudanças e permanências. Outra forma de conceituar tais fenômenos, para emprestar a terminologia de Couto e Silva (1981), tratamos de “sístoles e

85

Questão a ser problematizada mais adiante no mesmo capítulo. Esclarecendo antecipadamente, a ingerência estadunidense na região consolida uma divergência de perspectivas, a qual institui um dos principais entraves em concertações na égide regional (entenda-se no âmbito sulamericano / latino americano). Quanto à terminologia balanço de poder, derivada de equilíbrio de poder relativo ao SI, vide Morgenthau, Hans. A Política entre as Nações, 2003. 86 Termo relativo à predestinação dos EUA a dominar o mundo através de um “altruísmo civilizatório”, fomentando a política expansionista sob diversas formas. Ver RAMOS, André L. A; MIRANDA, Augusto R. A. Religião Civil, Destino Manifesto e a Política Expansionista Estadunidense. Ameríndia, vol. 4, n.2, 2007. Disponível em: http://www.amerindia.ufc.br.

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diástoles” do SI e das políticas em seu âmbito, conforme será discutido adiante, apresentando duas respostas distintas à questão colombiana : a brasileira e a venezuelana.

143

Brasil

e

Venezuela:

duas

respostas

políticas

diferenciadas

face

ao

transbordamento do conflito colombiano

Apesar de consistir em uma questão de grandes proporções, principalmente por angariar consequências que podem incorrer na desestabilização regional, o conflito colombiano e seu transbordamento nem sempre são observados sob o prisma estratégico com a devida relevância demandada pela questão, pois os esforços críticos não raro se veem absorvidos pelas relações Colômbia-EUA ou ainda direcionados aos episódios retratados pelos veículos midiáticos. Reflexo desta consideração seria que a maior parte da literatura política versou acerca das ações e reações no âmbito da guerra, explicitando pouco as questões estratégicas imbuídas (KURTENBACH, 2004). Essencialmente, a dimensão internacional se confinou em apoiar ou negar a política apresentada pela gestão colombiana no concernente ao conflito sem preocupações ademais da análise da cooperação ColômbiaEUA. As discussões que transcenderam o dualismo Colômbia-EUA foram concentradas em torno das iniciativas de integração regional traduzidas na União das Nações Sul Americadas (UNASUL) e no Conselho de Defesa Sul Americano (CDS). No entanto será que estes arranjos estão articulados suficientemente no quesito estratégia e aplicação institucional para servir como mecanismo de resposta às ameaças de intervenção estadunidense? Eis a questão a ser problematizada a este segmento, em conjunto com comparativos entre as posturas políticas adotadas por Brasil e Venezuela em relação ao Estado colombiano, aos atores que compõem o conflito, bem como as diretrizes após a crise de 01/03/2008.

Brasil Unidos pelo extenso território amazônico, os Estados brasileiro e colombiano encontram-se interligados tanto pelas riquezas minerais, vegetais, animais e de recursos hídricos existentes a esta região quanto pelos litígios, como pelas potencialidades para o desenvolvimento do narcotráfico e a “cobiça” internacional pela região, impingindo desafios para a manutenção da soberania e transformando esta questão em uma das principais preocupações de segurança nacional por parte do Brasil – principalmente por compor a categoria de conflito geopolítico (MIRANDA, 2004; COSTA, 2007).

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Sustentando uma relação amistosa e pautada na cordialidade, os Estados colombiano e brasileiro, apesar de compartilharem territorialmente porções estratégicas, mantinham até o momento da crise com o Equador uma relação de baixa densidade, situação esta que poderia ser revertida institucionalmente, quiçá, garantindo uma maior dinâmica (MIRANDA, 2004). De fato, apesar da baixa densidade das relações entre os referidos Estados, pode-se observar no norteamento estratégico presente na posição brasileira uma tentativa de antecipação perante eventualidades ou contenciosos fronteiriços possíveis - estes devido à falta de projetos infraestruturais em comum para a área fronteiriça, integrando a sociedade que vive à margem e habita estas áreas antes que os atores paraestatais realizem este papel (ARDILA, 2003). Apesar da escassez de projetos conjuntos com o teor de integração social, a preocupação brasileira em manter uma cooperação tática a fim de evitar que litígios de segurança ultrapassassem a fronteira podia ser observada desde a década de 1980 em diante, com a criação de pelotões especiais posicionados à área intitulada “cabeça do cachorro” 87, troca de informações através do Sistema de Vigilância da Amazônia (SIVAM) e um acordo de assistência entre os dois Estados no concernente a controle do narcotráfico (CEPIK; BORBA, 2010). Entretanto, quanto à perspectiva de integração regional sob uma égide de conjunção política de espectro mais amplo, pode-se observar que há uma gama deveras persistente de questões não resolvidas que potencializam o perecer de arranjos institucionais e iniciativas deste âmbito, desvirtuando as potencialidades brasileiras em “liderar” o subcontinente rumo a uma perspectiva política sul americana ou latino americana por exemplo. Conforme Hage (2010), o advento da União das Nações Sul Americanas (UNASUL) tem por objetivo angariar respeitabilidade e força para a resolução de litígios e controvérsias existente na região, contudo sem sanar questões que obstaculizam a instituição de uma perspectiva única a ser instaurada na região, ademais de resoluções práticas, trata-se de um arranjo fadado ao perecimento. Questões como o impasse Argentina – Uruguai em torno das papeleiras, um reestabelecimento diplomático real entre Chile e Bolívia – palco de um impasse histórico – resolução para os impasses entre Colômbia e Venezuela a partir do episódio da intervenção no Equador e a viabilidade de montar e gerir o “Banco do Sul” como mecanismo de financiamento a Estados de economia mais débil não tiveram soluções contempladas até o momento, e como fator agregado a estas problemáticas, a tentativa de se instituir o Conselho 87

No município de São Gabriel da Cachoeira, AM, o 5° Pelotão Especial de Fronteira do Exército Brasileiro exerce suas funções em Maturacá. Mais informações em NASCIMENTO, Messias L.; SÁ, Alcindo J. 5º Pelotão Especial de Fronteira: territorialidades e temporalidades na “Cabeça do Cachorro – AM”. UFPE – Revista de Geografia, 2006, vol. 23, n.2. Disponível em: http://www.revista.ufpe.br/revistageografia

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de Defesa Sul Americano segue com fôlego como uma resposta ao conflito colombiano e seu transbordamento,

principalmente

na

conformação

interventiva

(HAGE,

2010).

Contextualmente, nota-se a presença de um ânimo para a criação de novas iniciativas em torno da integração à revelia do aprimoramento e melhor compreensão de aparatos já existentes - como o Mercado Comum do Sul (Mercosul) - engessando a concretização das iniciativas encabeçadas pelo Brasil no âmbito da integração, em determinada medida, devido ao gap entre práxis e voluntarismo. A outra faceta que obstaculiza a implementação, a divergência de perspectivas, será tratada mais adiante. Para o momento, o ponto mais atinente nas relações entre Colômbia e Brasil, no contexto antecedente à crise com o Equador, seria a cordialidade demarcada por uma determinada distância apesar das preocupações estratégicas brasileiras.

Venezuela

Estado originário da separação da Grã-Colômbia, conforme mencionado ao início do trabalho, a “pequena Veneza” possui relações instáveis com o Estado colombiano, as quais tomaram proporções maiores e bélicas a partir de março de 2008. Apesar das instabilidades, a vizinhança com o Estado colombiano constituiu uma questão chave para o resgate do ideário do bolivarianismo e das possibilidades de reunificação dos territórios que correspondiam à Grã-Colômbia caso isso fosse decidido por voto dos residentes, conforme art. 14 da Constituição da República Bolivariana da Venezuela (CERVO, 2001). Entrementes, em uma fronteira comum de mais de 2.200 km, compartilham-se também os litígios e desafios, “como a integração, o comércio, o desenvolvimento da zona de fronteira, a migração fronteiriça, o problema da dupla nacionalidade, a segurança, a cooperação judicial, a luta contra o tráfico transfronteiriço de ilícitos e a guerra revolucionária na Colômbia” (CERVO, 2001, p.11). Os contenciosos entre estes Estados que compartilham uma considerável extensão territorial advém desde meados do século XX, contando com a demarcação fronteiriça por acordos bilaterais em 1941 e descontentamentos pela parte venezuelana, a qual se sentia lesada, e levou alguns destes ressentimentos para a questão da demarcação de áreas marítimas – que se via pendente até 1999 88. Contudo três acordos de âmbito bilateral foram importantes para suscitar a institucionalidade entre os dois Estados – Acta de San Pedro Alejandrino (março/1990); Declaración de Ureña (março/1989) e Comunicado Conjunto Pérez-Barco

88

CERVO, 2001, passim.

146

(fevereiro/1989) - possibilitando transformações como a visão integral das relações em todas as dimensões; uma abordagem integral e de caráter integrador, angariando oportunidades para ambos Estados; institucionalização dos vínculos governamentais e a abertura da agenda, garantindo maior dinâmica e fluidez para os vínculos (CARDOZO, 2006). Neste sentido, a imigração entre os Estados ganhou fôlego, em conjunto com o comércio que favorecia o fenômeno integrador, ao adquirir espaço na pauta de ambos Estados e instigar famílias a participarem do processo dissuasório minimizando as tensões fronteiriças. Esforços baseados na negociação apontavam para que a parceria produzisse bons frutos tanto no âmbito comercial quanto no âmbito político, social, e militar, dado que “entre 1835 e 1995, foram firmados 31 acordos formais, aos quais se somaram a troca de notas e atos complementares, atingindo um total de 67. Por campo de poder, foram 7 acordos econômicos, 8 sociais, 48 políticos e 4 militares” (CERVO, 2001, p.14). Entretanto, uma retomada às divergências pôde ser observada a partir de 2000, abalando as relações bilaterais em virtude do não compartilhamento de visões acerca das guerrilhas colombianas e das políticas no âmbito do Plano Colômbia, fomentando desdobramentos problemáticos a partir do governo Uribe, bem como aumento de tensões e animosidades a partir de 2008, esfriando as relações.

Comparativos políticos

A seguir, foi disposta tabela comparativa acerca das relações e políticas adotadas pelo Brasil e pela Venezuela no concernente ao conflito, às políticas de Uribe e às novas orientações políticas após a intervenção no Equador por parte da Colômbia, a fim de demonstrar e problematizar os principais pontos das aproximações e distanciamentos dos referidos Estados em relação à Colômbia.

147

Tabela 14 - Comparativo das Relações e Políticas adotadas por Brasil e Venezuela ante o conflito colombiano e a crise de 2008 Relações com a Colômbia

Como

lida

questão

com

do

colombiano

a

conflito e

seus

Como

lida

com

as

Políticas empreendidas

Orientações

políticas

pós crise de 2008

na gestão Uribe

atores Brasil

Mais

distantes,

porém

Lida com um cauteloso

Apoio à política es-

Continuação de apro-

orientadas pela preocu-

distanciamento calcado

tabelecida por Uribe sem

ximações com a Vene-

pação

patru-

na aplicação de estra-

a

zuela (como as já em-

lhamento fronteiriço, mas

tégias para a não con-

terização

contando com esbo-ços de

cretização do transbor-

guerrilheiros como ter-

diplomacia para alívio

mudanças

da

damento do conflito para

roristas – devido à vi-são

das

gestão Lula – na qual os

as fronteiras brasileiras,

da PSDD com o auxílio

referido Estado e a Co-

esforços

pois

a

estadunidense como um

lômbia para possibili-tar

cionalização dos proje-tos

concepção de que os

mecanismo de extensão

a reaproximação emtre

de integração regio-nal na

problemas

fronteiriços

dos

Uribe

égide do Mercosul e da

derivados

do conflito

UNASUL se viam em

com

a

pela

o

partir

institu-

ainda

existe

adoção

de dos

domí-nios

e

da

preendidas), tensões

aplicando entre

e

o

Chávez;

Proposta de criação do

colombiano não envol-

mediante intervenção -

Conselho de Defesa Sul

marcha. Entretanto, preo-

vem o Estado brasileiro,

mas

Americano

cupações no concernente

não demandando por um

controle

ao conflito colombiano e

maior envolvimento – a

lhamento fronteiriço.

seus desdobramentos por

cautela se dá também

estabelecimento de rela-

um longo tempo perma-

devido à aproximação

ções apenas com gover-

neceram restritas aos estu-

ideológica dos grupos

nos eleitos, combate a

dos acadêmicos (de forma

guerrilheiros (em prin-

grupos

limitada) e instâncias go-

cipal as FARC-EP) com

decisões

vernamentais

à

partidos políticos alinha-

por consensos, culmi-

segurança e à diplomacia,

dos à esquerda, caso do

nando na participação

enquanto grande parte das

Partido dos Trabalha-

colombiana nos grupos

informações relativas ao

dores (PT), legenda sob

de

fenômeno se limitavam/

a qual o presidente Lula

mento de bons ofícios

limitam à retratação “epi-

foi eleito em 2002.

para a resolução pacífica

sódica”

pelos

midiáticos.

veículos

dos

grupos

EUA

ligadas

influência

carac-

recrudescendo e

o

o

patru-

contando

(CDS) com



aceite

colombiano mediante o

irregulares

e

estabelecidas

trabalho;

Ofereci-

do conflito; Financiamento de uma linha férrea para o transporte de carvão e fomentos a parcerias

comerciais

com o Estado colombiano,

ampliando

o

status brasileiro para o terceiro maior Estado investidor.

148

Venezuela

Relações

mais

Aproximações com os

Tentativas de media-

Tensões, militarização

mas, baseadas na inten-

grupos

ções em prol de prover

fronteiriça extensiva, e

sidade

(em

as

uma saída negociada

o congelamento de re-

praticada e dos diver-sos

FARC-EP) a fim de

para o conflito colom-

lações presidenciais a

acordos celebrados desde

gerenciar

uma

saída

biano através da apro-

partir de julho de 2009,

o

negociada

e

afastar

ximação com as FARC

dadas as animosidades

litígios

tensões nas fronteiras,

-EP desde o governo

suscitadas desde a in-

fronteiriços até ques-tões

contudo esta estratégia

Pastrana e a iniciativa

tervenção no Equador e

comerciais,

quais

gerou tensões com os

das “zonas de disten-

o

possuem dados expres-

governos colombianos,

são”; Interpretação do

oferecido pela Venezu-

sivos: a Colômbia com-

principalmente a partir

Plano Colômbia e de

ela ao referido Estado;

siste no principal destino

da gestão Uribe. Esta

politicas em sua égide -

Anúncios e compras de

de

não

posição é bem acatada

como a PSDD – como

armamentos como fu-

petrolíferas venezuelanas

pela insurgência co-

ameaças à Revolução

zis, mísseis, tanques e

desde 1999, ademais de

lombiana, enquanto há

Bolivariana,

ademais

aviões Sukhoi, abalan-

consistir

segundo

um determinado desa-

de possibilidades reais

do as relações binacio-

Estado fornecedor exter-

preço pelos paramili-

de intervenção e de

nais com a escalada de

no da Venezuela; Apro-

tares,

de

desestabilização gover-

beligerância;

ximações

distancia-

hostilidades a comuni-

namental a serem em-

Manutenção das ten-

mentos se dão na medida

dades indígenas fron-

preendidos pelo De-

sões face à incapa-

em

teiriças.

partamento

cidade da UNASUL de

da

séc.

próxi-

diplomacia

XIX

resolução

para

de

as

exportações

no

e

que a

pauta

a

de

guerrilheiros principal

causadores

Adminis-

respaldo

militar

relações com guerrilhei-

trativo de Seguridad da

contemplar

ros volta à tona, indican-

Colômbia

-

questões após o ad-

do tensões devido à com-

conforme informações

vento do CDS e à

trariedade do governo

que vieram à tona em

negativa colombiana de

venezuelano em se afas-

2006.

discutir suas relações

(DAS)

outras

tar dos grupos guerri-

com os EUA por meio

lheiros, bem como o

daquela

temor de eventuais com-

suscitando o aumento

sequências ligadas à in-

das

tervenção na égide do

animosidades por parte

Plano Colômbia.

da Venezuela - as quais

instituição,

desconfianças

e

apenas foram anuviadas com a entrada de Juan Manuel Santos à presidência colombiana. Elaboração nossa, 2013. Com base em Cardona (2011); Cervo (2001); Cepik; Borba (2010); Ramírez (2008); Ospina (2007); Barragán (2007); Montenegro (2007); Vaz (2004); Cardozo (2006); Miranda (2004).

149

Em observação à tabela apresentada, podem-se inferir duas modalidades de dualidade enfrentadas pelo Estado brasileiro e pelo Estado venezuelano no concernente às relações com Colômbia no contexto do transbordamento do conflito. No caso brasileiro, pode-se observar a preocupação com a vinda de litígios complexos para o território de sua jurisdição, tanto que foram firmados diversos acordos de cooperação na área da segurança como o Acordo de Cooperação Amazônica no âmbito da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) em 1978, a assitência recíproca relativa ao narcotráfico em 1981, a criação dos Pelotões Especiais de Fronteira à década de 1980, as operações conjuntas COBRA e COLBRA entre 2000 e 2003, a cooperação fronteiriça mediante compartilhamento de informações do SIVAM em 2001, relativo aumento da cooperação a partir de 2003 com as visitas presidenciais de ambos Estados, procedimentos de aplicação idênticos quanto à “Lei do Abate” em ambos Estados, o controle de vôos ilícitos em 2006 e, em 2009, o acordo de liberação recíproca de 45 km de espaço aéreo para viabilizar perseguições em território vizinho como resposta à crise da intervenção no Equador (CEPIK; BORBA, 2010; MONTEIRO, 2011). No entanto, esta percepção de ameaça, detectada pelo Brasil às regiões fronteiriças, não se revelou capaz de envolver o Estado brasileiro de forma mais direta no conflito colombiano, que manteve uma diplomacia distante, desvinculada da caracterização dos grupos insurgentes como terroristas (tal como solicitava à Comunidade Internacional o presidente Uribe), simultaneamente à cooperação no âmbito da segurança e do combate ao narcotráfico, dissipando em parte a desconfiança que os demais Estados vizinhos tinham acerca do Estado colombiano (CEPIK; BORBA, 2010; MONTEIRO, 2011). Em suma, o “quebra-cabeça” perpassava pelo zelo à soberania territorial do Equador, violada em março de 2008, sem um distanciamento ou congelamento das relações com a Colômbia. Entre aproximações e distanciamentos, a postura brasileira tentava evitar o envolvimento direto no conflito de origem doméstica – em principal devido à visão de que os problemas

fronteiriços

existentes

não

estavam

diretamente

ligados

ao

Brasil

(MONTENEGRO, 2007) - o transbordamento das operações contrainsurgentes e demais desdobramentos do conflito em território brasileiro, ademais da intermediação colombiana como mecanismo de projeção dos EUA no subcontinente sul americano - questão esta que já se desenvolvia na égide do LASO e da Iniciativa Andina, por exemplo (CEPIK, BORBA, 2010). Contudo - abrindo um breve parêntese - apesar de o conflito e de a internacionalização da crise não poderem ser meramente restritas a um spill over89 das ações empreendidas na 89

Termo que indica um fenômeno análogo ao transbordamento, proveniente da teoria neofuncionalista acerca dos processos de integração regional, conforme análises de Haas. Para mais informações, vide HAAS, Ernst B.

150

égide de Washington, convertendo a questão em uma ameaça a toda a região; há que se considerar as relações desenvolvidas entre Colômbia e Estados vizinhos em torno de interesses desalinhados (RAMÍREZ, 2006). Logo, a dinâmica pode ser expressa nas seguintes conformidades:

[…] A Estados Unidos le sirve para hacer avanzar su estrategia, aprovechando la confrontación colombiana, la crisis andina y la mutua recriminación entre los países contiguos. A los gobiernos colombianos les ayuda a buscar recursos externos, a reiterarles a sus vecinos que la seguridad de Colombia es su propia seguridad y a solicitarles la adopción de determinadas medidas. A las guerrillas y los paramilitares les facilita el chantaje a los países colindantes, con el fin de que no apoyen las medidas de los gobiernos colombianos, a riesgo de sufrir las represalias. A varios gobiernos de países colindantes les ayuda a ajustar sus relaciones con Estados Unidos, a avanzar en sus negociaciones con Washington y a conseguir recursos adicionales (RAMÍREZ, 2006, p.90).

Nos referidos parâmetros, não é possível definir a problemática de segurança nacional e regional com base apenas nos fenômenos do transbordamento em si, mas tomando por base uma análise dos contextos binacionais que envolvem a Colômbia e a existência ou ausência de contenciosos com cada Estado vizinho, a fim de se obter um quadro diagnóstico mais aproximado da complexa realidade contemporânea do conflito colombiano e de seus desdobramentos. No entanto, a realização de um trabalho desta complexidade não foi a proposta da presente pesquisa, que se limitou a traçar um perfil de raízes do conflito colombiano e como estas conduziram esta situação prévia em um fenômeno internacional, expandindo suas consequências para os Estados vizinhos, com especial atenção para as fronteiras brasileiras e venezuelas, estas consistindo nas mais afetadas.

Reforçando a

complexidade do referido objeto de estudo,

[...] El conflicto colombiano, por ser el conflicto interno más prolongado, más agudo y de mayor amplitud en la región, tiene efectos más graves: articula diversos procesos a partir de las dinámicas existentes en ambos lados de las zonas fronterizas, es utilizado por sectores gubernamentales vecinos en sus propias situaciones críticas y sirve de catalizador de intereses nacionales o regionales. Por lo tanto, los efectos del conflicto dependen no sólo de la capacidad los actores armados colombianos, sino también de otros factores: la estrategia estadounidense, la política y las acciones colombianas frente a la confrontación y sus consecuencias, los problemas internos de cada país, la situación de cada zona fronteriza, la actuación de los vecinos tanto frente a los efectos del conflicto como ante la problemática binacional o transnacional específica en la que se articulan sus nacionales y la percepción que de las guerrillas colombianas tengan diversos sectores suramericanos. No asumir esa compleja maraña ha generado una cadena de tensiones adicionales e innecesarias en las relaciones de vecindad y ha impedido hacerles frente común a los problemas “International Integration – The European and the Universal Process”. International Organization, 1961, vol. 15, n.3. Disponível em http://www.jstor.org/stable/2705338.

151

tanto de las zonas fronterizas como de las redes globales de delincuencia organizada; estas últimas articuladas a distintas problemáticas nacionales: crisis social, falta de empleo, corrupción, problemas de gobernabilidad, polarización política, etc (RAMÍREZ, 2006, p.92).

Encerrando o pequeno parêntese aberto, a fim de elucidar alguns pontos acerca do conflito e do transbordamento, convém retornar à problemática da intervenção estadunidense e à sensação desta ameaça interpretada pelos Estados vizinhos à Colômbia, especialmente Brasil, conforme mencionado anteriormente. Em face de dificuldades de coordenação de ações conjuntas perante a questão do conflito colombiano, interpretações diferenciadas acerca dos desdobramentos internacionais do conflito, gerando posições que primavam pelo âmbito doméstico e que de certa maneira isolavam o Estado colombiano, o papel de “zelar” pela questão recaiu aos EUA, preenchendo este “vazio” segundo seus próprios interesses e garantindo a continuidade da cruzada antiterrorista como diretriz após o episódio de 11/09/2001 (BARRAGÁN, 2007; MONTENEGRO, 2007; RAMÍREZ, 2006). O papel arrolado ao CDS vinha justamente cumprir o papel de substituir a égide estadunidense no enfrentamento deste desafio. A promoção de iniciativas de integração regional como a Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul Americana (IIIRSA)

90

, bem como a integração econômica e

política através da UNASUL não se faz uma tarefa fácil enquanto existe um conflito armado em andamento, bem como crises diplomáticas em decorrência deste. A instauração de um complexo regional de segurança nas conformidades propostas para o CDS, tão pouco. Conforme mencionado anteriormente, apesar do voluntarismo, da boa aplicação da diplomacia brasileira na intermediação das tensões geradas após a intervenção no Equador e da real necessidade de se instituir um arranjo que seja capaz de afastar a sombra da intervenção estadunidense, a questão de repetições de arranjos institucionais e de seu engessamento devido a litígios não solucionados (cf. HAGE, 2010) é algo elementar, e para augúrio da estabilização regional, acompanha as iniciativas pró-integração até o momento. Trata-se de uma constatação de alguns fatores que não sofreram alterações definitivas, como a participação parcial do Estado colombiano nas instâncias supramencionadas, ao apresentar uma perspectiva diferenciada à revelia dos anseios que norteiam a instituição de tais projetos. Um dos exemplos que ilustra esta consideração seria a oposição de Uribe ao acordo no âmbito

90

Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIIRSA) – constitui em um projeto de integração infraestrutural que conta com a participação dos doze países sul americanos (à exceção da Guiana francesa) e encontra-se em voga desde a Reunião de Presidentes da América do Sul, em agosto de 2000. Maiores informações em: http://www.iirsa.org

152

do CDS, apoiado na argumentação de que já existe a Organização dos Estados Americanos (OEA) com a mesma incumbência, ademais das divergências em torno da classificação dos grupos armados colombianos como terroristas (SAINT-PIÉRRE, 2009). Apesar de estas rusgas, o Estado brasileiro primou pelo prisma do Estaco colombiano como parceiro para o desenvolvimento de estratégias conjuntas no que concerne à segurança, reconstruindo laços de diversas searas, relações governamentais e um horizonte de prospecções de parcerias alternativas a dos EUA (RAMÍREZ, 2008). Por outro lado, enquanto entraves aos projetos de integração, aliando à questão do próprio conflito colombiano, têm-se: a retórica do giro à esquerda em prol da minimização de divergências políticas como meio de se atingir a integração sem maiores obstáculos; os discursos exacerbados com conteúdo nacionalista, freando a visão de conjunto necessária à promoção da integração e o déficit de liderança, em virtude de uma visão que prima as questões domésticas em face dos custos que exercer o papel de líder traria (MALAMUD, 2009). Seria neste último enquadramento que se encontra o Estado brasileiro em seus contenciosos institucionais, seja pelas questões não resolvidas na égide do Mercosul, seja por não assumir abertamente um papel preponderante na execução das iniciativas pró-integração. Talvez a resposta a esta questão encontre-se na organização do âmbito doméstico em primeira instância e a instituição de uma visão de conjunto, assumindo o compromisso de se arcar com os ônus e os bônus provenientes de tais iniciativas. Entretanto, o primeiro passo em questão de se detectar a importância das questões de Segurança e Defesa no âmbito regional já foi dado; o Estado brasileiro está exteriorizando suas ideias e estratégias em relação a isso, tentando trazê-las para o horizonte da prática conjunta:

Pocas veces en su historia ha manifestado Brasil sus propósitos de defensa en su política exterior con la consistencia y profundidad actua. Tanto el CSAD91 como la END92 son indicativos de un nuevo rumbo en la conducción de la política exterior brasileña: ambos impactan directamente en la percepción de los países vecinos y de la sociedad internacional. Para maximizar ese impacto y condicionar las percepciones, dichas iniciativas exigen el trabajo que solo una adecuación sintonizada de los instrumentos específicos de la política exterior podría lograr. Pero como la autonomía es un valor para las burocracias que dan cuerpo a esos instrumentos, y la END y aún más la CSAD la comprometen, es posible que, sin oponerse explícitamente, las burocracias frenen el empeño del Ejecutivo mediante prácticas dilatorias, llevando al vaciado de aquellas (SAINT-PIÉRRE, 2009, p.30).

A questão da resolução do conflito em âmbito regional depende do voluntarismo político em vencer as barreiras impostas por determinadas burocracias institucionais, impedindo que as 91 92

Consejo Suramericano de Defensa – CDS Estratégia Nacional de Defesa

153

referidas iniciativas engessem e entrem em crise como as anteriores, bem como concatenar perspectivas pró-integração, questão mais distante do horizonte ao curto-prazo dada a recente instituição da Alianza del Pacífico - bloco regional constituído por Colômbia, México, Peru e Chile, o qual ademais de refletir questões já abrangidas no âmbito da UNASUL, traz à baila a não inclusão do México no âmbito do Mercosul. Neste contexto, institui-se uma dinâmica com dois polos: a perspectiva meridional, representada pelos projetos de integração no âmbito sul americano, e a perspectiva austral, representada pela influência estadunidense pairando por intermédio do Estado colombiano em principal. Dirimir esta fratura de perspectivas é o principal obstáculo a ser superado em conjunto com o provimento de soluções conjuntas para os desdobramentos internacionais do conflito colombiano. Portanto, pode-se inferir que o principal entrave para a concretização dos projetos de integração regional mencionados perpassa pelo eixo da divergência de perspectivas em primeira instância e se traduz no perdurar do conflito armado colombiano em última instância. Convém resgatar o princípio da meridionalidade, uma das componentes geográficas de posicionamento do Brasil, sobreposta pela ocidentalidade, dada a persistente preponderância do elogio aos valores ocidentais como superiores sob uma ótica hegemônica (MARTIN, 1993). Sem maiores receios, esta linha de raciocínio é passível de ser estendida para o subcontinente sul americano, ou mesmo ao recorte latino americano, retratando a fragmentação de perspectivas ilustrada. Não se trata de uma apologia à negação dos valores ocidentais ou da perspectiva setentrional, mas em um chamariz para a tendência fragmentária que se instaura em um horizonte próximo em detrimento de projetos de desenvolvimento e inserção conjunta dos Estados latino-americanos na dinâmica internacional. Em meio a este tecido de orientações diversificadas, uma alternativa para trazer projetos de inserção internacional concatenados seria a proposta meridionalista, donde as problemáticas internacionais fora e dentro do âmbito regional seriam observadas segundo os olhares do Sul (MARTIN, 1993). Se as fronteiras físicas unem Estados irmanados tanto pelo histórico colonial quanto pela diversidade cultural e por uma gama de aspectos, convém exaltar estes aspectos destas e não transformá-las em resistentes muros (MONTENEGRO, 2007) mediante divergências ideológicas e políticas, expressas nos desdobramentos retratados. Este seria mais um aspecto, ademais do voluntarismo político, a constituir uma saída para o impasse protagonizado por Colômbia e Estados vizinhos no decorrer do conflito armado. Rumo a uma perspectiva de estabilidade de inserção internacional, se faz necessário superar problemáticas remanescentes do século anterior, e suscitar a compreensão de um dos principais contenciosos fronteiriços existentes da América do Sul, como o caso do conflito colombiano e seus

154

desdobramentos internacionais, é algo demandado em tempos cuja “alternativa à integração é o percurso do alinhamento automático de cada estado isolado a uma Grande Potência e a sua dependência política e econômica, um status político que sociedade alguma deveria almejar em qualquer tempo” (COSTA, 2009, p.28). Encerrando as considerações mais específicas relativas aos efeitos que tangenciam o Estado brasileiro, convém reforçar que apesar de não haver indícios quantitativos ou qualitativos mais relevantes acerca do transbordamento do conflito colombiano no marco fronteiriço, preocupações norteadas pelos efeitos da possibilidade do transbordamento no marco interventivo levaram o referido Estado a cooperar com o Estado colombiano no âmbito da segurança em caráter de prevenção, ora aproximando-os, ora distanciando-os em meio a uma espécie de ambivalência na política brasileira. Explicitado o contexto em que se desenvolve a dualidade brasileira, passa-se para o contexto que envolve maiores tensões a fim de expressar a dualidade venezuelana. Em conformidade com diversos indicadores do conflito colombiano e seus desdobramentos como violência, repercussões em territórios pertencentes a comunidades indígenas alocadas em regiões fronteiriças, o Estado venezuelano consiste na área mais afetada pelo transbordamento do conflito, conferindo a percepção de regionalização do enfrentamento dada à expressiva presença guerrilheira nestas fronteiras (RAMÍREZ, 2006). Logo, podem-se enumerar algumas ameaças de origem interna e externa como “conspiradoras” da Revolução Bolivariana resgatada pelo governo de Hugo Chávez: pobreza, deterioração econômica, insegurança pessoal, corrupção, debilitação da governabilidade mediante conflitos internos e externos e problemas ambientais como ameaças internas; intervenção estadunidense a partir da Colômbia, impacto do conflito colombiano – o qual trouxe questões como imigração, investidas paramilitares em áreas de comunidades indígenas entre outros - crime organizado transnacional, narcotráfico e deterioração ambiental como ameaças externas (JÁCOME, 2011). Com olhar mais aguçado para as ameaças externas após a intervenção no Equador em 2008, o Estado venezuelano inicia um reaparelhamento bélico a partir de importações provenientes da Rússia, da China e do Irã a fim de se salvaguardar das ameaças mencionadas, pois apesar da existência de um Mecanismo de Incidentes Fronteiriços e do Acordo de Cooperação Policial desde 1997, a violação da soberania do território equatoriano soou como um alerta à Venezuela (JÁCOME, 2011; CERVO, 2001; OSPINA, 2007). Neste contexto, pode-se caracterizar a dualidade venezuelana como a salvaguarda das ameaças externas - compreendidas entre uma das prioridades a partir de março de 2008 e aumentando hostilidades – e a manutenção do comércio bilateral com a Colômbia, com

155

relações imbricadas a ponto de “denominar de região metropolitana o estado de Táchira e o Departamento Norte de Santander” (CERVO, 2001, p.14). Está disposta uma querela que apenas começou a ser resolvida com a eleição de Juan Manuel Santos na presidência colombiana. Em comparação com as relações bilaterais com o governo colombiano anterior, sob a gestão Pastrana, pode-se observar um maior compromisso com os processos de paz colombianos por parte da Venezuela, quadro modificado ao longo da gestão Uribe, cujas declarações não possuíam conteúdo explícito acerca do conflito colombiano:

[...] En las suscritas con el presidente Uribe Vélez no hay mención explícita del conflicto, en una situación en la que las tensiones que este tema provoca en las relaciones bilaterales son mucho mayores que las acumuladas en las relaciones con el gobierno de Pastrana; la insistencia en mantener y fortalecer los mecanismos institucionales binacionales es la expresión formal y pública de los desacuerdos en torno al desbordamiento del conflicto interno y en relación con la estrategia que asume el gobierno venezolano ante ese desbordamiento y el creciente apoyo de EE. UU. a Colombia (CARDOZO, 2006, p.50).

Esta mudança de característica nas relações entre os Estados, acrescida pela estratégia de Chávez de aproximação com os grupos guerrilheiros – empreendendo esforços pelo acordo humanitário a fim de um maior engajamento na saída negociada do conflito colombiano – fez com que o Estado colombiano visualizasse empecilhos para a concretização da estratégia de segurança e paz com bases na PSDD e no próprio Plano Colômbia, conforme mencionado anteriormente, “esfriando” as relações bilaterais entre os Estados devido a divergências de perspectivas. Após a crise de 2008, ocasionando tensões e hostilidades traduzidas em beligerâncias93, a questão das divergências políticas se extravasou em dados relativos ao comércio a partir de 2009: [...] En 2009 comienza el declive del comercio colombo-venezolano y como consecuencia de ello se registra un nuevo cambio en la composición del mismo. Los automóviles pierden peso completamente por las restricciones impuestas en el vecino país, y como consecuencia de ello, resto (35%), carne que siguió exportándose en la primera parte del año aumenta (15%), químicos (13%), textiles (10%) y maquinaria (7%) aumentan sus participaciones. En la segunda mitad del año todas estas compras caen pero se mantienen estas participaciones porque la caída afecta a todos los grupos, con excepción de la carne, en magnitudes 93

Referente ao reaparelhamento bélico venezuelano em conjunto com declarações de hostilidades ao Estado colombiano e às consequências da PSDD. Apesar das compras de armamentos estarem previstas pelo governo e de alegações sustentarem seu uso exclusivamente para fins defensivos, o movimento constituiu em mais um mecanismo de aumento das tensões em vez de interpretado como questão desvinculada da crise diplomática de 2008. As declarações de apoio ao Equador por parte do Estado venezuelano não constituíram, tão pouco, em um elemento que trouxesse a estabilidade à região após a intervenção no Equador por parte da Colômbia (MALAMUD, 2009).

156

semejantes. A la carne si se le restringe completamente como consecuencia de la no renovación de los permisos sanitarios para importación (UMAÑA et al., 2010, p.12)

Portanto a dualidade venezuelana não se trata exatamente de pontos que se contrapõem, mas que foram afetados mediante uma crise nas relações políticas e se interrelacionaram a posteriori, acarretando desdobramentos que compreenderam também a dimensão comercial e a ligeira perda da perspectiva de projeção regional a partir de 2008 (CARDOZO, 2006). Em retomada, o desafio habita em como defender os interesses do Estado venezuelano em âmbito comercial e econômico perante uma crise político-diplomática na região, gestando desestabilizações bem como a sombra de ameaças externas conforme mencionado anteriormente. Como conciliar o “mal estar” político com a ligeira dependência comercial, dadas às expressivas importações de bens manufaturados provenientes do Estado colombiano? Convém incluir que o dito mal estar derivado de divergentes orientações políticas (governo conservador à frente colombiana e governo de esquerda, ligado ao socialismo, à frente venezuelana) já gestava potencial discórdia - tanto no episódio do golpe contra o governo Chávez e asilo político concedido a Pedro Carmona em Bogotá, após a retomada do poder venezuelano por Hugo Chávez em 2002, quanto na operação empreendida por funcionários do DAS, que envolvia o assassinato do presidente venezuelano e acarretou na detenção de cerca de 100 colombianos (CARDOZO, 2006; HYLTON, 2009). Ademais, crises envolvendo Caracas e Bogotá, relativas a sequestros políticos, impulsionaram a elevação de tensões:

El 13 de diciembre 2004, un emisario de la comisión político-diplomática de las FARC, Rodrigo Granda, fue secuestrado en una calle de Caracas. El guerrillero fue llevado clandestinamente hasta Colombia por miembros de la Guardia Nacional venezolana—posteriormente arrestados—, actuando en coordinación con los servicios de seguridad colombianos, y a cambio de una fuerte suma de dinero. En contra de todas las normas del derecho internacional, esta opberación provocó una gran crisis entre Caracas, que considera violada su soberanía, y Bogotá. El embajador de Estados Unidos en Colombia, William Wood, fue el único que brindó inmediatamente su apoyo al gobierno colombiano. Este no era el primer secuestro político que se realizaba en territorio venezolano. Dirigentes sociales y campesinos que habían pasado la frontera tratando de salvar sus vidas, fueron capturados por elementos “antichavistas” de los servicios de seguridad venezolanos e ilegalmente entregados a las autoridades colombianas (OSPINA, 2007, p.308)

Desta forma, podem ser resgatadas algumas tendências ilustradas em tabelas e considerações anteriores acerca da política de segurança empregada na Colômbia a partir do governo Uribe e a questão do transbordamento do conflito no marco interventivo: a política aparentemente

157

indiscriminada de “caça à insurgência” motivada por recompensas, reproduzindo uma dinâmica análoga à “caça às bruxas”, empreendida no contexto do macarthismo e da Guerra Fria; e um aparente resgate à concepção de domínio hemisférico no âmbito das influências, donde os atos supramencionados fariam parte de um movimento em prol de desestabilizar concertos no âmbito regional fora da órbita de Washington, obstaculizando um equilíbrio de poder conforme discussão anterior. A considerar este raciocínio, basicamente duas situações se interpuseram para que as tensões geradas entre Colômbia e Venezuela não se transformassem em um conflito armado: a diplomacia e a orquestração de um arranjo visando à integração regional, que antes de gerar este objetivo final, serviu como um mecanismo de conversações políticas – ou seja, a instauração da UNASUL em conjunto com a diplomacia brasileira (RAMÍREZ, 2008; MALAMUD, 2009) – e o peso exercido pelas relações comerciais (guardadas as devidas proporções), abrindo a possibilidade do reatamento de laços entre os Estados em 2010 com Juan Manuel Santos – o qual deu a impressão de uma espécie de remissão de atos equivocados cometidos na gestão anterior (JÁCOME, 2011). Esclarecendo que divergências e querelas presentes na América do sul devem ser resolvidas regionalmente, a diplomacia brasileira ao longo do governo Lula exerceu um papel mediador que, apesar de não solucionar a crise pela qual a integração regional perpassa em suas instâncias - por falta de uma liderança mais consistente e de institucionalidade concatenada com ações efeitvas – tratou-se de um componente auxiliar na redução das tensões entre Venezuela e Colômbia, angariando também maior aproximação com a Venezuela e dando passos rumo à transformação do isolacionismo em cooperação regional (RAMÍREZ, 2008; MALAMUD, 2009; CERVO, 2001). Quanto às relações comerciais, questão relevante para ambos Estados, estas constituíram em mais um dos fatores para o cessar do congelamento de relações empreendido desde julho de 200994, dentro de um contexto em que as divergências ideológicas e tensões fomentavam a transformação de um dilema de segurança para um dilema de defesa. Apesar de as divergências ideológicas consistirem em um mecanismo preponderante nas fricções entre Colômbia e Venezuela, e de os referidos Estados se utilizarem das instituições como OEA, UNASUL e Grupo do Rio em virtude destas divergências (SANTOS, 2011), pode-se inferir que se não houvesse as duas referidas situações, arquitetando de certa maneira um retorno à estabilidade, é provável que o cenário de tensões ganhasse mais fôlego à revelia da demanda por paz e estabilidade apregoada desde o Estado colombiano. 94

Período em que houve corte de relações diplomáticas e comerciais entre os Estados devido à denúncia colombiana de desvios de armas importadas pela Venezuela para as FARC-EP (SANTOS, 2011).

158

Entretanto, convém incluir que se para o Estado venezuelano as animosidades e intermitências nas relações com o Estado colombiano impingiram tolhimentos comerciais e tensões políticas; para o Estado colombiano entrar em conflito direto com o vizinho venezuelano não consistia em uma atitude conveniente, pois apesar do expressivo contingente e do investimento alocados à Força Pública, os custos político, comercial e social eram altos demais para serem pagos (CARDONA, 2011). Em retomada aos principais fatores que conferiram maior ou menor projeção à dinâmica do transbordamento do conflito colombiano, bem como explicitações das relações e posições adotadas, encontra-se a seguir uma tabela ilustrando brevemente fatores, contexto e efeitos do referido fenômeno para os Estados brasileiro e venezuelano.

159

Tabela 15 - Fatores que contribuíram para aumento ou diminuição dos efeitos do conflito colombiano Brasil

Venezuela

1) Caráter da zona fronteiriça:

Zona fronteiriça extensa (1645

Zona fronteiriça mais extensa

extensão, presença estatal, grau

km),

densidade

em relação aos demais Estados

de desenvolvimento institucional

populacional de ambos os lados

vizinhos (2.219 km), contando

e quadro social

devido ao relevo amazônico.

com divergências e conver-

Porém, preocupações estraté-

gências que possibilitaram tanto

gicas acerca da possibilidade de

intercâmbios

intervenções,

os

culturais e comerciais, quanto

Estados a acordos bilaterais no

passagem para o narcotráfico e

combate

e

migração ilegal, levando os

querelas fronteiriças envolvendo

Estados a criarem estruturas

atores armados. A existência de

institucionais para lidar com

diversos acordos táticos, exerci-

estas querelas e a segurança

cios militares conjuntos, bem

fronteiriça, como a Comisión

como a preocupação do Estado

Binacional

brasileiro e do estado colom-

(COMBIFRON) e a Comisión

biano acerca das questões de

Presidencial de Integración y

segurança desenvolveram uma

Asuntos Fronteirizos Colombo-

estrutura institucional consis-

Venezolanos (COPIAF). Mes-

tente no âmbito dos acordos,

mo a existência destas insti-

minimizando expressivamente o

tuições e da história marcada-

transbordamento

mente apoiada em diversos

riço/local

interfrontei-

com

ao

baixa

conduziram

narcotráfico

do

conflito

colombiano àquela região.

acordos,

populacionais,

Fronteiriza

o

quadro

social

interfronteiriço, como a incursão de paramilitares em busca de guerrilheiros em território venezuelano, acuando comunidades fronteiriças, se constituiu em um vetor para crises a posteriori. Neste sentido, a questão não perpassou exatamente pela ausência dos Estados na área de fronteira, mas por questões pautadas em divergências político-ideológicas.

160

2) Grau do conflito limítrofe;

Alto grau de confiança traduzido

O conflito e seus desdobra-

grau de confiança entre centros

em operações conjuntas entre as

mentos

políticos e forças armadas; e

forças armadas de ambos os

atenuados, adquirindo determi-

convergências/divergências entre

Estados. As diferentes orienta-

nada latência e intermitências

os governos

ções políticas não serviram de

entre as relações comerciais e

empecilho para a celebração de

diplomáticas em virtude de

acordos comerciais e aproxi-

acusações trocadas entre os

mações entre os Estados, que

presidentes - Uribe acusava a

levaram a cooperação para além

Venezuela de dar apoio às

do âmbito da segurança. Logo, o

FARC-EP através de abrigo e

conflito não atingiu a relação de

armas, ao passo que Chávez

“cordialidade” entre os Estados.

acusava a Colômbia de não ter

não

capacidade

puderam

para

gerir

ser

suas

problemáticas internas sem o auxílio estadunidense, que por sua vez utilizava o referido Estado como plataforma para intervenção. Logo, a desconfiança

e

a

iminência

das

ameaças externas se matérializarem

em

conflitos

não

suscitaram confiança o suficiente entre os Estados para propiciar manobras conjuntas e a superação das divergências políticas.

3) Funcionamento e eficácia dos

Considerando a ausência de

A incipiência no atendimento

mecanismos locais para atender

registros compreendendo crises

de

demandas binacionais/regionais

ou dilemas de defesa evidentes

nais/regionais habita na latência

elencando Brasil e Colômbia, a

das querelas envolvendo Vene-

ausência de interações mais

zuela e Colômbia, as quais

anunciadas entre os referidos

adquiriram maiores proporções

Estados em virtude da baixa

a partir das diferenças político-

densidade demográfica às fron-

ideológicas e ampliaram o es-

teiras e a existência dos meca-

copo das consequências do

nismos institucionais para a

conflito armado colombiano e

resolução de questões concer-

da contrainsurgência para li-

nentes à referida área, pode-se

mites aquém das capacidades

inferir que os mecanismos locais

institucionais, demandando por

demandas

binacio-

161

têm atendido as questões com

uma questão ausente:

a con-

eficiência.

catenação efetiva de políticas para estes tipos de demanda.

4) Repercussão atrelada ao tipo

Mediante o uso da diplomacia, o

Relativo distanciamento devido

de apoio internacional recebido

Estado

às

(resultando aproximação ou dis-

negociações em âmbito multi-

ideológicas durante a gestão

tanciamento)

lateral e angariou dentro de suas

Uribe – superadas a partir da

capacidades uma mediação para

gestão Santos na Colômbia.

a crise instaurada em 2008,

Desde antes da crise de 2008, o

permitindo com que o Estado

modo direto com o qual Chávez

colombiano não ficasse 100%

interpunha suas críticas rela-

isolado dadas as

cionadas

brasileiro

conduziu

iniciativas

referidas

divergências

ao

imperialismo

regionais em andamento. Apesar

estadunidense,

do distanciamento devido à

proposta de estabelecer apro-

compreensão geral da Colômbia

ximações internacionais com

como ameaça, iniciativas como

bases identitárias (aludindo ao

a COMBIFRON no Equador e,

projeto bolivariano) suscitou

posteriormente no Brasil (a par-

tanto

tir da gestão de Dilma Roussef)

distanciamentos

foram concretizadas, possibi-

regional, suscitando algumas

litando inferir na construção de

reticências

tendências

Estado venezuelano à revelia de

de

aproximação/

ademais

aproximações em

em

presença

da

quanto âmbito

relação

ao

reaproximação ao Estado co-

sua

regional

e

lombiano desde a gestão Lula.

potencialidades. Esta questão pôde ser ligeiramente superada dado o voluntarismo materializado

nas

iniciativas

de

integração regional - as quais contribuíram

para

maior

aproximação dos Estados e, apesar das deficiências institucionais de ordem prática, contribuíram como canal de conversação e minimização de tensões, diminuindo as potencialidades que o distanciamento entre Venezuela e Colômbia poderia adquirir. Elaboração Nossa, 2013. Com base em RAMÍREZ (2006); CERVO (2001); SANTOS (2011); CEPIK; BORBA (2010); MIRANDA (2004); MONTENEGRO (2007); JÁCOME (2010; 2011).

162

Rumo a resoluções do conflito colombiano e seus desdobramentos: considerações e algumas reflexões

Observando as questões retomadas à tabela 15 e as considerações tecidas anteriormente, pode-se inferir que a questão da divergência de perspectivas - sejam elas no âmbito político-ideológico como no caso das relações Colômbia-Venezuela, sejam no âmbito regional/internacional, como a participação limitada da Colômbia no âmbito do CDS à luz das reticências em aceitar que os demais Estados não consideram os grupos guerrilheiros como agentes terroristas – compõem um quadro complexo de relações políticas, as quais imbricam questões domésticas, regionais e impõem desafios a serem superados sob a perspectiva de inserção internacional conjunta no cenário contemporâneo (CARDOZO, 2006; SAINTPIÉRRE, 2009). O primeiro deles, no espectro institucional-regional, seria a convergência de perspectivas para a inserção conjunta do subcontinente sul americano no complexo de relações políticas representado pelo SI, resgatando as questões não resolvidas por aparatos institucionais já existentes através de revisões de condutas e coesão política em vez de repetições institucionais movidas por rusgas ou divergências dentro dos parâmetros citados (HAGE, 2010). Seria, na prática, aceitar o fenômeno da regionalização, pensar na UNASUL como um projeto político em que cabem processos econômicos e no qual se fazem necessários os processos de segurança – mediante o CDS – a fim de se concretizar o seguinte cenário: um ambiente de construção identitária, inserido no contexto geopolítico bioceânico (Pacífico e Atlântico), no qual o pensar em segurança como superação das diferenças e o promover do ideário dissuasivo suscite a preservação da integridade e das potencialidades da região abrangida pela instituição, baseando-se nos princípios da interoperacionalidade, integração, confiança, intercâmbio e transversalidade política 95. Tratam-se dos passos seguintes ao processo de “emancipação” e inserção no cenário internacional (JOERIβEN; STEINHILBER, 2008). O segundo depende da concretização de ações domésticas e está envolto por dificuldades, na medida em que se apoia em diversos atores; isto é, uma vez registrados esforços assertivos para a erradicação das bases que sustentam as várias dimensões do conflito colombiano em âmbito interno, se faz necessário reforçar estruturas para que não haja vias de

95

Com base em exposição do vice-diretor do Centro de Estudos Estratégicos em Defesa do Conselho de Defesa Sul-americano da União de Nações Sul-americanas, Pablo Celi de la Torre, em ocasião do Seminário Estratégias de Defesa Nacional, ministrado em 28/11/2012, Câmara dos Deputados, Brasília – DF.

163

escoamento do conflito, repetindo-se a situação do transbordamento no marco fronteiriço. Neste sentido, convém: a promoção de aproximações, operações táticas conjuntas relativas ao patrulhamento/ policiamento fronteiriço; políticas migratórias conjuntas a fim de ampliar o controle sobre o status de refugiado; sanar velhas inflexões, a fim de se promover a conjunção de objetivos e visões entre os Estados vizinhos; configuração de políticas de segurança e antinarcóticos de forma conjunta, fazendo prevalecer a percepção de que as consequências de um embate direto contra a paraestatalidade sem o suscitar de outras políticas trarão novamente à baila o transbordamento do conflito, em principal na região vizinha localizada a sudeste; o fortalecimento de assistência e segurança aos colombianos que a buscam em outras localidades em virtude do conflito armado; buscar alternativas conjuntas à prática das fumigações, as quais expõem populações e a biodiversidade a riscos; suscitar convivência pacífica e confiança mútua com os Estados vizinhos mediante relações interinstitucionais com múltiplos vínculos, viabilizando os canais para o exercício da diplomacia pública e as discussões acerca do conflito e de suas consequências com a participação da sociedade civil e suas organizações (MONTENEGRO, 2007; BARRAGÁN, 2007). O norteamento mediante alinhamentos a um dos polos do conflito interno se provou mais desgastante e menos efetivo – em caráter de longo prazo – no decorrer de uma verdadeira “queda de braço” entre os governos colombianos e a insurgência, desviando o foco das atenções às raízes e motivações que transformaram o conflito em uma questão de longa duração para uma disputa calcada nas dualidades certo/errado, bom/mau. Resguardadas as devidas proporções, convém encontrar uma saída na égide sul americana em vez de importar o modo estadunidense de combate ao terrorismo, afastando os Estados vizinhos por temores de intervenção e legando ao Estado colombiano uma única alternativa como parceria para a resolução da referida questão (RAMÍREZ, 2008). No concernente às operações contrainsurgentes dirigidas ao longo do governo Uribe, houve pontos negativos e positivos, os quais o levaram a pleitear por um terceiro mandato, questão objeto de atenções, pois ademais de corresponder “a um verdadeiro rompimento com mais de duzentos anos de tradição republicana daquele país, visto que desde a Constituição de 1886 não era permitido o exercício de mandatos consecutivos pelo Presidente da República” (MAZOTTI, 2011, p.60-61), tratava-se de um prolongamento do mandato presidencial demandando por uma reforma constitucional seguida de uma adequação normativa em potencial, dado o curto período disponível para alterações desta magnitude. O resultado foi que, apesar da covocatória de referendo popular, contando com a popularidade angariada pelas políticas enquanto presidente em exercício, a tentativa de Uribe em prosseguir para um

164

terceiro mandato fracassou devido à inconstitucionalidade, baseada entre outros fatores por superfinanciamento de campanha e falta de transparência nos referidos gastos (MAZOTTI, 2011). Apesar do fracasso na referida manobra, avanços e determinados retrocessos no aplicar da PSDD, com vistas a erradicar o fenômeno intitulado pelo governo colombiano e outros de terrorista, há pontos a serem considerados a fim de se instituir uma análise mais aproximada dos desafios remanescentes ao governo colombiano neste contexto. A seguir, encontra-se uma tabela emitindo balanços entre ações assertivas e não assertivas no combate à insurgência, a fim de fornecer parâmetros para o balanço das políticas empreendidas por Uribe.

Tabela 16 - Balanço de assertividade quanto às práticas contrainsurgentes Práticas não assertivas

Práticas assertivas

 Superioridade da direção militar da operação

 Enfatizar operações de inteligência, integrando

contrainsurgente, promovendo um excedente de

todos os níveis da cadeia hierarquia estabelecida

centralização

nas operações e controlando o emprego da força a

e

minimizando

os

demais

componentes da cadeia operacional;  Fomento às

políticas

fim de minimizar os efeitos colaterais ocasionados

de recompensa

e

a

em virtude de embates diretos;

priorização em capturar o inimigo vivo ou morto à

 Focar na população, interagindo com esta e visando

revelia de interações com a população e o contexto

à segurança e a concretização de sua expectativa,

em que esta se encontra inserida;

através

 Conferir prioridade das operações conduzidas no

de

manifestação

de

interesses

em

compartilhar e aprender com a cultura local;  Controlar a população, mantendo os insurgentes

escalão batalhão;  Concentrar unidades militares em grandes bases, destacando um contingente maior de recursos humanos para a proteção destas;

distantes desta;  Adotar de uma autoridade central única a partir de um líder carismático, reduzindo os canais que

 Conferir prioridade às forças especiais para incursões à revelia da designação de assessores

possibilitam

a

paraestatalidade,

ademais

da

capacidade de interagir com a mídia e as ONGs;  Conduzir operações psicológicas amplas e eficazes,

para a resolução dos contenciosos;  Adequar e fornecer treinamento do exército local

promovendo a adaptabilidade às transformações do

aos moldes do exército estadunidense, ignorando a

conflito irregular, e a persistência e capacidade de

realidade local e, no caso colombiano, a natureza

operar por períodos prolongados, lidando com

irregular do conflito;

situações adversas como frustrações e baixas sem a

 Proceder

governamentalmente

em

padrões

análogos aos dos tempos de paz;

incorrência de desgastes políticos ou colapsos morais;

 Promover aberturas fronteiriças, do espaço aéreo e

 Conceder de anistia e reabilitação para os

dos litorais, conferindo espaços vulneráveis para o

insurgentes mediante marco normativo e político,

165

fortalecimento da paraestatalidade.

mediante

a

disponibilidade

de

instrumentos

jurídicos adequados e capacidade de utilizá-los;  Apoiar militarmente as lideranças policiais e aumento e diversificação de seu contingente, a fim de realizar operações conjuntas no âmbito da Força Pública,

contar

com

a

disponibilidade

da

colaboração de agências de inteligência e forças especiais competentes e demais agências estatais;  Reorientar as forças militares convencionais para as operações contrainsurgência;  Estabelecer assesores designados a amparar as forças especiais junto às forças locais;  Negar refúgio aos insurgentes Elaboração Nossa, 2013. Com base em: VISACRO, Alessandro. Guerra Irregular – Terrorismo, guerrilha e movimentos de resistência ao longo da história. São Paulo, Contexto, 2009.

Em observação à tabela acima, depreende-se que diversas das práticas consideradas como não assertivas não constituíram as bases e o âmbito prático da PSDD, a qual buscou aniquilar a insurgência (ou terrorismo conforme considerações prévias) mediante a instauração de uma campanha típica de combate a insurreições. Seguindo esta linha de raciocínio, é compreensível o nascimento de divergências político-ideológicas como as observadas em relação ao Estado venezuelano - devido a sua aproximação com grupos tidos como terroristas (como as FARC-EP) e em virtude da concessão de refúgio/trânsito, divergindo da estratégia contrainsurgente colombiana. Conforme Barragán (2007), o uso de mecanismos midiáticos e a aproximação com ONGs e a comunidade internacional serviria como alerta para desmistificar o papel das FARC-EP. Caso esta linha de raciocínio seja seguida, considerando apenas os parâmetros de assertividade em relação ao programa político empreendido por Uribe, pode-se inferir que os pontos falhos, enquanto tentativas pouco priorizadas, foram: aproximação com a população local, condução de operações psicológicas e controle de efeitos colaterais advindos do emprego indiscriminado da força. Rememorando considerações do compromisso de campanha e do discurso presidencial – ambos anexos a este trabalho – o suscitar da democracia e do exercício da cidadania se atrelam à segurança, que consistiu no foco das gestões de Uribe. Desta forma, as expectativas em torno do sucesso da PSDD e da popularidade do ex-presidente pareciam compor um amálgama para a continuidade de uma política rumo à almejada paz e, consequentemente, à dissolução de um contencioso de

166

segurança de longa data. À luz de uma crise diplomática, da desestabilização regional e de dificuldades de natureza política internas e externas - evidenciadas em escândalos e na intervenção do Equador - pode-se inferir que o referido amálgama foi dissolvido. O combate à captura do Estado por atividades criminais, desenvolvimento de estruturas de economias ilícitas baseadas no tráfico de narcóticos e armas, ademais da corrupção de estruturas públicas e privadas pela máfia não foram ações bem sucedidas no âmbito de recuperar as estruturas institucionais de justiça e Estado, fornecendo amparo às vítimas do conflito em vez de conjurar uma projeção de poder com caráter pessoal e retributivo conforme discutido (SALAMANCA et al., 2008; LÓPEZ, 2011; ABAD, 2002). As estruturas de concentração fundiária remanescentes desde o período colonial, a falta de interligação infraestrutural no território do Estado colombiano, ademais da ausência de políticas capazes de superar questões de ordem institucional, social e normativas vigentes em virtude da sobreposição de territorialidades (AGNEW, OSLENDER, 2010) e do subgrupismo (ROSENAU; DURFEE, 2000) indicam que há diversos desafios remanescentes. A saída da “zona de conforto” estabelecida com apoio na permanência de desigualdades e exclusão de projetos que integrem parte significativa do território e da população à economia globalizada e às benesses da modernização consiste em um deles:

[…] La captura institucional pública por parte de esas estructuras híbridas de poder regional y la resistencia armada de la guerrilla hacen de muros de contención a las posibilidades de construir o democratizar el Estado colombiano en las regiones. Y sin Estado eficaz y legítimo en las regiones es imposible atender las necesidades sociales, económicas y políticas de la cuarta parte de la población colombiana que más padece los horrores del conflicto, en particular los campesinos, afros, indígenas y desplazados. De otra parte, hasta cierto punto las clases medias urbanas y las elites económicas y políticas nacionales se han adaptado a una especie de construcción sub óptima de Estado. Controlar apenas la mitad del territorio y las instituciones es suficiente para que opere la economía moderna, nacional y globalizada, que genera los indicadores de riqueza, crecimiento y desarrollo que exhibe Colombia. Al resto del territorio y a la cuarta parte de colombianos que lo habitan se les ha dejado abandonados a su suerte y sometidos a las estructuras de poder de la narcoguerrilla o el narcoparamilitarismo. Pagar impuestos y darse a la tarea requerida para construir Estado y mercado en esos territorios o para reconstruir democráticamente el Estado donde ha sido capturado por mafias, es una prioridad que todavía no se consolida en la agenda política y ciudadana colombiana. Asumir enteramente ese reto es, sin duda, nuestro principal desafío (LÓPEZ, 2011, p. 230).

Portanto, dirimir as bases que fomentam o conflito interno colombiano constitui o terceiro e um dos mais importantes desafios para a restauração da paz em âmbito doméstico e da estabilidade em âmbito regional, erradicando um dos principais pontos de inflexão – no âmbito de segurança – para a instituição da integração regional.

167

Considerando as acepções anteriores, em conjunto com as repercussões da política de Uribe e as práticas não assertivas - apresentadas à tabela 16 – observa-se que as únicas práticas ausentes da PSDD neste contexto foram abertura fronteiriça, procedimento governamental análogo a tempos de paz (longínquos caso analisada a história colombiana), a concentração de unidades em bases dificultando a proteção e, quiçá, a superioridade diretiva das operações arrolada aos militares. Todas as demais ocorrências puderam ser observadas ao longo da gestão do ex-presidente, inclusive a insuficiência da base normativa proposta como prática assertiva, gerando críticas internas, externas e máculas na população colombiana – a questão dos muchachos de Soacha, o escândalo dos falsos positivos e as interceptações ilegais empreendidas pelo DAS contra outros organismos, as chuzadas, além de operações contra a Venezuela (DE CASTRO, 2009; GUZMÁN, 2011) - com o prosseguir da violência por ambos os lados sem incorrer na propagada segurança. Estas questões, aliadas ao âmbito do transbordamento do conflito no marco interventivo, as crises a posteriori e a inconstitucionalidade para a concorrência de um terceiro mandato desmontaram as expectativas e iniciativas de uma grande parcela da população alinhada ao uribismo (PACHÓN, 2009) e suscitaram na eleição do ministro de defesa do segundo mandato do expresidente: Juan Manuel Santos. Manteria o santismo o mesmo nível de popularidade do uribismo com o diferencial de superar os desafios remanescentes no concernente ao conflito colombiano e seus desdobramentos? Esta consiste em uma questão a qual contempla tanto resoluções internas a contento quanto uma transformação do cenário contemporâneo, donde “la regionalización de la crisis colombiana es vista hoy como el epicentro de la inseguridad andina y hemisférica” (TICKNER, 2004, p.22).

Governo Santos – remissão de equívocos anteriores e novas perspectivas? “[…] Tierra, agua, naturaleza y buen gobierno – esos símbolos preciados – harán parte integral de la administración que hoy comenzamos” 96 […] El llamado que he hecho a la unidad nacional supone dejar atrás confrontaciones estériles, pendencias desprovistas de contenido, y superar los odios sin sentido entre ciudadanos de una misma Nación (…). Un acuerdo en torno a la necesidad de tener una democracia vigorosa; una econonomía estable y próspera; una patria justa en lo económico y social; una Nación segura y en Paz97.

96

COLOMBIA, 2010, n.p. Discurso de Posse do Presidente Juan Manuel Santos Calderón em 07/08/2010, em Sierra Nevada de Santa Marta. Para texto integral, vide anexo 4. 97 Op. cit.

168

“[…] El respeto, la cooperación y la diplomacia serán los ejes de nuestras relaciones internacionales. Queremos vivir en paz con todos nuestros vecinos. Los respetaremos para que nos respeten”98.

Os excertos acima, retirados do Discurso de Posse do presidente Juan Manuel Santos em 07/08/2010 (vide anexo 4), refletem algumas tendências iniciais a serem discutidas como um balanço da política de seu antecessor, “tarefas” completadas e desafios a serem superados: um tom de discurso mais ameno, concatenando questões além do âmbito da segurança, questão enfaticamente presente tanto nos discursos quanto nas políticas empregadas por Uribe; a proposta de brindar o Estado colombiano com a demandada Unidade nacional, através da reconciliação,do provimento de resoluções ao estado de carestia social, da manutenção da democracia e do provimento de segurança; e por fim, a reconciliação e reaproximação com os Estados vizinhos em uma proposta de convivência decorosa e baseada na diplomacia. Em suma, a natureza do discurso se via bastante alterada em relação ao proferido pelo ex-presidente Uribe, abrindo espaço para a emergência de novas perspectivas, em detrimento do apregoado continuísmo político, o qual parcelas da população - opostas ao uribismo - vinculavam à figura do presidente Santos em período anterior às eleições 99. Em um contexto de concorrência com outras propostas de governo, inclusive a do ex-prefeito de Bogotá, Antanas Mockus, Santos já revelava diferenças de seu antecessor por conformar uma nova coalização de governo, a Unidad Nacional, delineada por partidos uribistas – Conservador e Cambio Radical, o qual se distanciou de Uribe – e a vinculação do Partido Liberal, que depois de doze anos retorna à coalizão governista. Neste sentido, Santos angariou uma ampla margem de manobra para o início de seu governo (VELÁSQUEZ, 2011). Sob o jargão da Prosperidad Democrática e com um discurso arauto de mudanças, Santos já inicia seu governo com diversos desafios herdados da gestão anterior, como a inserção da Colômbia no contexto regional/internacional, manutenção da preocupação com segurança fora da égide militar – pauta metodológica praticamente exclusiva e característica da gestão anterior - e atenção a outras temáticas a partir de uma maior integração com a sociedade colombiana, tanto no âmbito das reformas sociais e políticas, quanto no próprio âmbito da segurança interna. Logo, a instituição da Ley de Victimas y Restitución de

98

Ibid. A questão do continuísmo político inclusive emergia como perspectiva concreta para diversos analistas, principalmente por Santos ser o Ministro da Defesa ao longo da última gestão Uribe. Algumas opiniões e críticas dentro deste espectro estão presentes no anexo 5 – excertos do periódico opinativo “Un Pasquín”. 99

169

Tierras100 - reparando e restituindo terras aos desabrigados em virtude do conflito armado - a continuidade do combate à insurgência acompanhada de uma disposição para a solução negociada sob as condições de fim do sequestro e renúncia à luta armada foram questões que participaram deste novo roteiro político no âmbito interno mesmo com a queda de repasses provenientes do Plano Colômbia e de algumas iniciativas interventivas de partidos ligados ao uribismo (RAMÍREZ, 2011). Outra iniciativa dentro do marco legislativo empreendida pelo atual presidente ao início foi a aprovação da criação dos Ministérios da Justiça, Meio ambiente e Trabalho – questões suprimidas à gestão anterior, assim como a referida lei, sob o propósito de poupar gastos – ademais da já discutida continuidade das políticas de segurança, a qual baseou em boa medida sua eleição, exportando a experiência do manejo com as referidas questões a partir de um espectro pagmático e desideologizado (VELÁSQUEZ, 2011; ARDILA, 2011). Entretanto, pode-se inferir que esta continuidade já apresentou alguns “ônus” desde seu princípio. Sob a perspectiva de uma cessão por parte da insurgência à solução negociada, Santos desautorizou iniciativas individuais, nacionais ou externas para o início de uma solução negociada com as FARC-EP, propondo que o primeiro passo seja dado por parte da insurgência, abandonando a violência armada, os sequestros e a incorporação de crianças às fileiras guerrilheiras como condições prévias. Uma semana após a posse e estas alegações em reunião com mandos da Força Pública, ocorre um atentado à Caracol Rádio e à agência de notícias EFE, resultando em perdas materiais e trinta e seis pessoas feridas. Considerando o abandono da prática de ataques urbanos sob autoria das FARC-EP, e o reatamento de laços com o Estado venezuelano, surge a possibilidade de o ataque ter sido orquestrado por setores obscuros da direita colombiana, sob a tentativa de afastar as possibilidades de negociação com a insurgência, fragmentando o governo (GUZMÁN, 2011). Apesar da falta de informações claras acerca da identificação de culpados, aparentemente esta consistiu em uma amostra de um fenômeno de polarização política que despontava no Estado colombiano: o uribismo vs. o santismo. Ao longo de 2010, em meio a possibilidades de condições para o estabelecimento de diálogo entre o Estado colombiano e a insurgência, o conflito armado prosseguia. As FARCEP não erradicavam a prática do sequestro e assassinatos a policiais, enquanto o governo prosseguia desferindo golpes duros, como o assassinato de Mono Jojoy (Jorge Briceño),

100

Lei 1448 de 10/06/2011, “Por la cual se dictan medidas de atención, asistencia y reparación integral a las víctimas del conflicto armado interno y se dictan otras disposiciones” (COLOMBIA, 2011, p.7). Documento disponível através do sítio: http://www.minjusticia.gov.co.

170

comandante militar do Bloco Oriental das FARC-EP, apontando para desafios nesta seara – dada a atividade guerrilheira nos departamentos de Nariño, Cauca, Vale do Cauca e sul de Chocó - bem como na reparação das vítimas do conflito, mediante restituição de seus bens e terras em áreas de preponderância política e econômica do paramilitarismo (GUZMÁN, 2011). Esta gama de questões tornou a questão da segurança interna em um ponto delicado, pois mesmo com a continuidade de golpes desferidos aos mandos das FARC-EP, a atuação do governo Santos foi alvo de diversas críticas empreendidas por seu antecessor, Uribe (ABERLÁEZ, GUZMÁN, 2012). Baseando-se em dados de 2008 e 2009, as críticas desferidas por Uribe e simpatizantes 101contemplam algumas quedas nos índices de capturas e baixas conferidas à insurgência, negligenciando alguns aspectos de mérito estratégico e de emprego da inteligência, os quais empreenderam algum sucesso no combate aos mandos de FARC-EP, ELN e contingentes das Bandas Criminales Narcotraficantes (Bacrim)102, questão que suscitou alguns augúrios de saída negociada – apesar da continuidade dos embates armados – e prospecções para erradicação das atividades dos referidos grupos até 2014, segundo plano de autoria do Ministério da Defesa (ABERLÁEZ; GUZMÁN, 2012; ). Estudos para um redesenho estratégico/tático foram empreendidos neste sentido:

Finalmente, en junio de 2012, el Ministerio de Defensa presentó los resultados de la nueva Estrategia de seguridad. En el reporte se explica que, a partir de 2008, las Farc adoptaron nuevas estrategias de combate entre las cuales se encuen-tran, por ejemplo, el repliegue hacia las áreas base, un retroceso hacia la guerra de guerrillas y el uso sistemático de minas anti personales. El informe intenta hacer una diferenciación entre las AUC y las Bacrim y afirma que estas últimas, más las nuevas formas de combatir del ELN y de las Farc, obligaron a Comité de revisión estratégi-ca integral (Crei) a revisar la estrategia estatal ya existente, por orden del ministro de Defensa y de los altos mandos militares. Los resultados de este rediseño fueron positivos frente a los resultados de 2011: la tasa de homicidios de civiles llegó a ser la más baja de los últimos veintisiete años y disminuyó mucho el número de víctimas de masacres, el secuestro extorsivo y la piratería terrestre. En el caso de las Farc, el porcentaje de capturas frente al año anterior aumentó 72% y los muertos en combate en 39%. En el de las Bacrim, las capturas aumen-taron 7%. Así mismo, se incrementó en 8% la cocaína incautada en comparación con 2011. Al comparar lo corrido de 2012 con lo suce-dido durante 2011, los resultados en lo que con-cierne a las Farc han sido positivos. Sin embargo, son muy inferiores frente a los de 2008 y 2009. Esto es aún más visible en el caso del ELN. En cuanto a las capturas y dadas de baja de inte-grantes de las Bacrim, 2011 y los cinco primeros meses de 2012 muestran los mejores resultados alcanzados hasta ahora por la estrategia gubernamental (ABERLÁEZ; GUZMÁN, 2012, p. 114-115).

101

Algumas das principais críticas e manifestações encontram-se disponíveis na rede social twitter e no sítio oficial do ex-presidente, cujos endereços são respectivamente: @AlvaroUribeVel e http://www.primerocolombia.com/ 102 Compreendidas como uma nova estratégia dos atores armados protagonistas do conflito para atingir seus objetivos relativos ao poder político (CADAVID, 2011b).

171

Portanto, para se efetivar um balanço das políticas empreendidas até o momento, demanda-se uma relativização, pois podem ser observados avanços e retrocessos neste processo de mudança de um ambiente mais beligerante e focado na questão militar para a manutenção de um aporte contrainsurgente diferenciado, o qual contempla outras questões na agenda, inclusive uma maior abertura para diálogo com os Estados vizinhos. Convém rememorar que existem diversas dimensões de como a violência se desenvolve na Colômbia e como esta foi apropriada como recurso pelos polos protagonistas do conflito armado, transformando-a em uma estrutura vigente ao longo da história conforme discutido ao capítulo 2. À luz da proposição do governo Santos e das diversas modalidades de violência desenvolvidas na Colômbia – cotidiana, pública e política, fomentando bases para o vigor da injustiça social como uma das máculas da colombianidade – urge a demanda por superação do conflito armado e por visão em conjunto entre as instâncias civil e militar (VELÁSQUEZ, 2003). Ademais desta questão, a busca por uma coordenação ministerial e participação da chancelaria colombiana em questões relativas à segurança também se trata de uma necessidade, evitando ao encerramento destas ao Departamento de Segurança e correspondendo, a contento, às duas dimensões conferidas à referida questão em nível internacional: enquanto em instâncias multilaterais e associações de Estados focam atenções à segurança humana e ao respeito aos Direitos Humanos, em instâncias bilaterais há a preponderância de atenções a dilemas de segurança, soberania e territorialidade (ARDILA, 2011; RAMÍREZ, 2011) – ambas as dimensões acuadas pelos desdobramentos da política de segurança anterior. Neste contexto, o olhar voltado também para o exterior pode ser considerado como mais um sinal de transição política no governo Santos. A alteração no curso diplomático conferida com o reatamento de laços com Venezuela e Equador, a reabertura de possibilidades e perspectivas para relacionamento mais próximo com o subcontinente sul americano no âmbito da UNASUL e de tratados bilaterais, a diversificação da agenda com a Europa e os EUA – a qual esteve pautada preponderantemente nos planos de combate às drogas e ao “terrorismo” – as relações com o México, Chile e Peru no âmbito da Alianza del Pacífico, o ingresso na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), ademais da ocupação de assento no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (CSONU) durante o biênio 2011-2012, indicaram tanto um giro na política exterior colombiana quanto o anseio de inserir o Estado colombiano internacionalmente através de diversas frentes, recuperando o Estado de seu relativo isolamento perante os Estados vizinhos, bem o prestígio internacional colombiano

172

legado a segundo plano por considerável período (CARDONA, 2011; RAMÍREZ, 2011).

Considerações apresentadas, infere-se que a estratégia de inserção regional e internacional consiste em uma ação alternativa para lidar com o conflito interno e seus desdobramentos sem desassociar as estruturas sociais que o originaram:

[…] Otra premisa interna de una positiva inserción regional e internacional de Colombia tiene que ver con la necesidad, en particular en las fronteras internacionales, de asumir la seguridad no solo como un problema militar sino también como el despliegue de una presencia integral del Estado através de instituciones civiles, servicios básicos, infraestructura. También se relaciona con el desarrollo de programas económicos y sociales capaces de aliviar el elevado desempleo, la pobreza y la desigualdad, que favorecen el nacimiento y la expansión de redes delictivas, algunas de cuyas actividades se condensan en las fronteras. Allí, estos grupos flexibles y cambiantes se ligan a redes transnacionales de contrabando, tráfico de drogas y armas, involucrando de paso a sectores de los países vecinos (RAMÍREZ, 2011, p. 91-92)

A opção por adotar a referida estratégia imprimiu desafios consideráveis, principalmente em virtude da proposição de contemplar parcelas da sociedade colombiana que não estavam contempladas de forma expressiva às políticas da gestão anterior salvo o âmbito da segurança pública (CEPIK; BRANCHER; GRANDA, 2012). Abaixo, segue uma tabela ilustrando os desafios a serem enfrentados ao longo da gestão Santos em seus diversos âmbitos.

Tabela 17 - Desafios e considerações à Prosperidad Democrática do governo Santos Doméstico Segurança

Social

Superar o duplo desafio em relação

Romper com as estruturas que

Fornecer

aos EUA: busca pelo reconhecimento

sustentam a desigualdade social e o

para o enfrentamento de querelas

da capacidade cada vez maior do

aumento da pobreza na Colômbia

estruturais remanescentes, as quais

Estado de fazer frente ao conflito

através do atendimento às deman-

instituem

interno

contra-

das sociais, projetos de infraestru-

arcaísmos com modernidades – a

posição à dependência dos recursos

tura, trabalho e integração; provi-

caráter de exemplos, a subsistência

estadunidenses,

colombiano

os

em

Político

políticas

a

consis-tentes

coexistência

de

quais

têm

mento de justiça e reparação às

do clientelismo, a falta de coor-

adquirido menor presença;

esta-

vítimas do conflito armado medi-

denação política interministerial, a

belecer uma política de segurança

ante

mecanismos

recuperação do Estado de Direito,

assertiva e convergente à proposta

normativos, tornando público o

zelando pelos Direitos Humanos e a

sustentáculo da eleição, sem abrir

prevalecimento da

verdade em

superação do quadro de alianças

mão de resultados efetivos, do

favor da reconstrução da memória

políticas com mafiosos e elemen-

aplicação

de

173

emprego de inteligência e tática e da

coletiva colombiana; promoção da

tos alinhados ao paramilitarismo;

atenção a outras searas que apre-

participação cidadã na política,

convivência com as críticas, à

sentam

garantindo o exercicio da demo-

relativa polarização caracterizada

cracia e da representatividade.

pelo santismo em contraponto ao

deficiências;

resultados

empreender

(numéricos)

ante

o

contexto de críticas empreendidas

uribismo, à oposição partidária

pelo antecessor, a relativa polari-

empreendida pelo Pólo Democrá-

zação

tico Alternativo (PDA)

política

e

máculas

im-

de

e aos

pingindas à sociedade colombiana e

resquícios

radicalismos

de

aos Estados vizinhos, como a questão

direita, ligados ao paramilitarismo.

dos falsos positivos e os desdobramentos internacionais do conflito armado,

traduzidos no transbor-

damento.

Internacional/Regional Desafios: Recuperação da coordenação por parte da chancelaria colombiana, inserindo-a também em temáticas de segurança internacional; fortalecimento da academia diplomática de San Carlos a fim de angariar planejamento e suporte às ações da chancelaria; Revisão do concernente à inserção internacional colombiana no âmbito das embaixadas; normalização das relações e alianças com a América Latina – em especial Equador e Venezuela, além da adequação instrumental das relações com a Ásia e o Pacífico; Superação das divergências econômicas e políticas com a Venezuela bolivariana, mediante diplomacia sóbria e efetiva primando pela cooperação. Considerações/ perspectivas: Valorização da polissemia e da polifonia, mediante convocação de foros internacionais em diferentes regiões e cidades colombianas para promoção de debates acerca da política externa, trazendo à referida órbita sociedade civil, ONGs e coletividades organizadas; a fixação de uma estratégia de inserção colombiana com a determinação de mudanças e continuidades junto aos meios de comunicação empresários, acadêmicos e etc; combinação das modalidades de diplomacia (pública e cidadã) a fim de aprimorar a imagem da Colômbia no exterior. Elaboração Nossa, 2013. Com base em: ARDILA (2011); RAMÍREZ (2011); VELÁSQUEZ (2003); CEPIK; BRANCHER; GRANDA (2012); AYALA (2012).

Os desafios e perspectivas mais próximos do limiar da concretização encontram-se no âmbito internacional, despontando para um novo contexto de inserção internacional colombiana e aproximação da égide sul americana - com algumas reservas, dada a questão da divergência de perspectivas previamente discutida. Entretanto, podem-se observar os esboços de uma abertura internacional mais distante do anteparo hemisférico do que observado em contextos políticos anteriores. Quanto aos desafios remanescentes no âmbito doméstico, observa-se o empreendimento de múltiplos esforços dentro das searas apresentadas à tabela anterior, contudo a relativa distância de resultados mais claros se dá na medida em que são

174

diversas proposições a várias áreas deficitárias simultaneamente, diluindo alguns resultados no âmbito imediato e, a partir disso, promovendo a queda de popularidade em relação à gestão anterior (ABERLÁEZ, GUZMÁN, 2012; AYALA, 2012). O prosseguir de ataques empreendidos por parte das FARC-EP, ELN e as Bacrim, e a continuidade das rotas de fuga internacionais utilizadas pela insurgência anuviam em parte os esforços angariados às demais áreas, dilatando as críticas no âmbito da política de segurança e revelando que ainda há patamares para serem alcançados: En el campo internacional, por último, la seguridad en las fronteras colombianas ha conocido altibajos. Mientras la cooperación con los países vecinos ha dado sus frutos en materia de lucha contra el narcotráfico y captura de líderes insurgentes, eventos como el de los enfrentamientos entre transportadores de Colombia y Ecuador han causado disgustos en los mandatarios, y los resultados de la cooperación en materia de seguridad fronteriza con Venezuela no son claros. De hecho, algunos reportes de prensa sugieren todavía que los grupos insurgentes siguen utilizando el territorio venezolano como safe heaven cuando son objetivo de las hostilidades de las Fuerzas Armadas colombianas. Por consiguiente, si bien el presidente Santos ha logrado un mayor nivel de diálogo y una mayor institucionalización de sus relaciones con los vecinos, y, en consecuencia, un número significativo de operaciones exitosas en la lucha anti insurgente, estos esfuerzos siguen siendo insuficientes (ABERLÁEZ, GUZMÁN, 2012, p. 130-131)

Emitir pareceres em um balanço acerca da política empregada por Santos em comparação com a de seu antecessor seria um movimento precipitado para o momento, contudo aparentemente, iniciar uma política mais ambiciosa, que tramite de um escopo para contemplar vários simultaneamente, têm sido uma árdua tarefa em desenvolvimento.

O

resgate ao tempo perdido face ao isolamento do Estado colombiano em relação aos Estados vizinhos (RAMÍREZ, 2011) em conjunto com o compromisso da remissão aos efeitos colaterais ocorridos à gestão anterior aparentemente norteiam o atual governo. Notícias acerca do fim dos falsos positivos e de políticas sociais em Soacha e demais regiões 103, o encaminhamento de suspeitos à Justiça e a reparação às vítimas fazem parte deste processo. E no âmbito de novas perspectivas de paz e segurança, o primeiro passo foi dado: preâmbulos de negociações com as FARC-EP tiveram início em Oslo, em 16/10/2012, e encontram-se em desenvolvimento até o momento em La Habana104. Trata-se de um sinal não visto há tempos para a arquitetura de uma solução negociada e de novos auspícios de paz para a sociedade colombiana. 103

Extraídas da Seção Imprensa, no sítio da Presidencia da República da Colômbia. Textos na íntegra, vide anexo 6. 104 TELESUR (31/01/2013). Maiores informações acerca de todo o processo e acompanhamento ao vivo através do sítio: http://www.telesurtv.net.. Acesso em 31/01/2013.

175

O

ALVORECER

DA

CAPITULAÇÃO

DA

VIOLÊNCIA

NA

HISTÓRIA

COLOMBIANA: considerações finais, perspectivas e desafios

O presente trabalho se ocupou de analisar as várias dimensões na quais o conflito interno colombiano se desenvolve e como a não permanecimento destas querelas, em adição com reorientações políticas entre outros aspectos, propiciaram o transbordamento deste mediante a internacionalização de uma crise político-diplomática – aparentemente sanada nos tempos atuais. Neste sentido e à luz de todas as análises empreendidas ao longo do trabalho, ressalta-se que:  A remanescência de questões de ordem institucional e infraestrutural propicia o fomento ao conflito armado, pois dificulta o encaminhamento de políticas assertivas, resultando na manutenção de fragmentações nas dimensões fundiária, geográfica, normativa e política, culminando na falha de representatividade e na transferência de lealdades (ROSENAU; DURFEE, 2000) em primeira instância, e na má condução de políticas orientadas à realidade da sobreposição de territorialidades (AGNEW; OSLENDER, 2010) e do subgrupismo (ROSENAU, DURFEE; 2000). Isto indica uma negligência aos efeitos internos presentes à ocasião e desenvolvimento da globalização, encerrando os canais de governabilidade e fomentando mobilizações e movimentos de resistência como os observados ao longo da história colombiana (CASTELLS, 1999; ROSENAU, 2000; DELLA PORTA; DIANI, 2006). O legado destas ações conduz a um resultado que se repetiu ao longo de sucessivos governos e a uma perspectiva diferenciada na inspiração da a: 1) a repressão – como a observada no episódio do Bogotazo (CANO, 2002)- reforçando o insulamento dos canais entre sociedade e governo em detrimento de estabelecer uma figura fortalecida do Estado. O reprimir descortina a disputa política e a estrutura de bandoleirismo social à revelia do atendimento às mais diversas demandas para o estabelecimento da democracia e de um Estado de Direito (VELÁSQUEZ, 2011; NEIRA, 2010); 2) a reconciliação, compreendida enquanto retorno do aparato estatal aos interesses e demandas da sociedade, concatenando as diversas vozes e anseios da sociedade em políticas públicas efetivas e perspectivas de paz ante ações de diversos governos que tornaram o horizonte pacífico longínquo. Trata-se da reunificação entre sociedade e

176

Estado, a qual estava inviabilizada enquanto a sinonímia Estado – repressão se via recorrente;  O transbordamento do conflito colombiano, nos dois marcos retratados, foi possibilitado mediante debilidades internas – de natureza política, geopolítica e sociológica - e com projeção externa – repercussões negativas à imagem do Estado colombiano como a violação aos Direitos Humanos, violações a soberania territorial de outros Estados (Venezuela e Equador em principal) e a dependência da égide de Washington na resolução de questões como o suscitar do comunismo mediante a Operação Marquetalia (JÍMENEZ, 2011) e o combate ao denominado narcoterrorismo através da Iniciativa Andina e do Plano Colômbia (HYLTON, 2009), transformando o Estado colombiano em um ator permeável às influências estadunidenses no concernente à cruzada contra o terrorismo e como potencial canal para intervenção no subcontinente sul americano (MONTENEGRO, 2007; BARRAGÁN, 2007; URIGÜEN, 2008) - alcançando o patamar de uma crise internacional em virtude da conjunção de processos em gestação desde outros períodos com a beligerância política adotada desde a gestão Uribe.

Neste sentido, é possível construir a concepção de que o conflito interno colombiano, bem como seu transbordamento, possui pano de fundo político, geográfico e sociológico. As tentativas falhas de se estabelecer um diálogo com a insurgência não indicam somente um encerramento das instâncias políticas, mas o perdurar de debilidades institucionais, preponderância da disputa política no cunho bipartidário à revelia dos interesses da sociedade enquanto Unidade (ou carência desta) e os vínculos estabelecidos entre as máfias narcotraficantes com os protagonistas do complexo conflito em voga, gestando um cenário em que a política refletia exclusivamente os interesses do polo preponderante em um dado momento, e acuava a população, legando-lhe o temor como um dos aspectos característicos da colombianidade (VELÁSQUEZ, 2011; HAGE, 2008; PÉCAUT, 2000). Perante a falta de perspectivas de ascensão ou inclusão em uma sociedade oligarquicamente direcionada conferindo a arquitetura de espaços vazios de função estatal – a opção legada a uma sociedade anônima, que teve tolhidos seus direitos ao bem estar e à manifestação em prol destes, foi o alinhamento a um dos polos do conflito (seja este guerrilheiro ou paramilitar; não raro desde a infância) ou a resistência à própria sorte nas Comunidades de Paz, sob a pena da perspectiva do desabrigamento (SANABRÍA, 2009; PÉCAUT, 1999; 2000; SANFORD, 2003; 2004; FORO JOVEN, 2005). O escândalo dos falsos positivos, mácula recente e profunda na sociedade colombiana, foi produto não apenas da má conduta militar, orientada quase que

177

exclusivamente à busca de índices em um sistema de recompensas às baixas impingidas ao lado insurgente, mas de uma estrutura de carência de oportunidades, da manutenção do estado de carestia social e reprodução do maniqueísmo político, esvaziando o papel do outro e conferindo à violência o status de resposta em última instância (ESTRADA, 2009; DE CASTRO, 2009; TODOROV, 1998; ABAD, 2002). O resultado desta estrutura reflete a permanência de fragmentações, já oriundas do aspecto geográfico, e suscitam o choque entre várias concepções de espacialidade desenvolvidas no interior do Estado colombiano, em concomitância com a questão do subgrupismo, haja vista à incapacidade estrutural do referido Estado em adaptar-se às recontextualizações demandadas pelo fenômeno da globalização e das novas dinâmicas relacionais no âmbito do SI (AGNEW; CORBRIDGE, 1995; AGNEW, 2009; ROSENAU, 1997; ROSENAU; DURFEE, 2000). Este déficit de adaptações rendeu maiores desafios ao Estado colombiano na contemporaneidade, já não bastassem aqueles intrínsecos à superação do conflito armado e do arcabouço de efeitos colaterais angariados ao longo de diversas gestões. A atual gestão enfrenta no âmbito internacional, especificamente, diversos desafios à custa do referido déficit (ARDILA, 2011). Ante estas considerações e o ampliar das proporções do conflito armado, a gestão Uribe reuniu todos os esforços em prol da melhoria dos índices de segurança pública em uma declaração de guerra à insurgência, seja como projeto de centralização política, projeção ou mesmo, conforme discutido, retribuição dado o seu desgosto pessoal com a guerrilha. Iniciou-se um período de beligerância política sem precedentes, com queda vertiginosa da taxa de sequestros, baixas à insurgência e popularidade à custa de um ambiente com pouco espaço para a verdade e novo esmagamento dos Direitos Humanos, anuviando o horizonte para a cooperação com os Estados vizinhos e ratificando as relações com os EUA sob o espectro hemisférico – remontando ao contexto internacional da Guerra Fria (HAGE, 2008; HYLTON, 2009; ABAD, 2002; AYERBE, 2002; CARDONA, 2011). É provável que o maniqueísmo político intensificado à política empreendida por Uribe - tanto em âmbito doméstico quanto em âmbito internacional – seja reflexo de uma sociedade acuada, assolada pelas manifestações de violência das mais variadas modalidades (VELÁSQUEZ, 2003) como mecanismos peremptórios. Quiçá, da mesma forma que desdobramentos em âmbito social tolheram parte expressiva da sociedade colombiana de outras alternativas que não o alinhamento a um dos polos do conflito, a questão em nível internacional foi interpretada analogamente, conferindo àquele momento, após desgastes advindos de gestões anteriores, o alinhamento e a reprodução do maniqueísmo político como

178

instrumentos disponíveis para o nascer de novas perspectivas. Quiçá! Trata-se apenas de uma analogia ante a popularidade angariada pelo ex-presidente em suas propostas de mudanças radicais para lidar com o cansaço e acuamento de toda uma sociedade acerca de um duradouro conflito armado (VILLA; OSTOS, 2005). Independentemente destas conjecturas, factualmente, a realidade que se apresenta ao Estado colombiano e seu atual governo é a de diversos desafios e muitas feridas à memória coletiva colombiana, as quais se cicatrizarão na medida em que ações visando à reparação, à verdade e à justiça forem preponderantes. Conforme discutido, aparentemente esta parece ser a diretriz do atual governo, inaugurando um capítulo novo na história colombiana no concernente à reconciliação com os Estados vizinhos, inserção internacional e com os projetos de integração social, mediante objetivos de transformar a Unidade Nacional não apenas em título de coalizão partidária, mas em uma concretização no âmbito do Estado colombiano (RAMÍREZ, 2011; COLOMBIA, 2010). Ademais de um capítulo novo, um capítulo inédito, encontra-se em desdobramento: prenúncios de negociações com as FARC-EP, questão longínqua por considerável tempo, caso consideradas as ações das gestões anteriores. Apesar de desafios remanescentes, é possível depreender que o Estado colombiano está muito próximo de novas perspectivas e talvez em futuro próximo, da capitulação da violência como marca registrada em sua história. Conforme mencionado anteriormente, tecer considerações a respeito de questões em desdobramento no atual governo consiste em um movimento precipitado e pouco cauteloso, contudo, à luz das considerações e análises construídas ao longo do presente trabalho, é possível inferir que no concernente ao âmbito interno do conflito, esforços aproximados às raízes deste estão sendo empreendidos, em uma tentativa de agregar a sociedade colombiana aos projetos de um governo de Unidade, seja como estratégia de remissão de efeitos danosos à sociedade, seja por questões de pragmatismo ou interpretação de que políticas deste âmbito são assertivas para o presente momento. As comparações com os índices observados à gestão anterior seguem em conjunto com a queda nos índices de popularidade, aumentando o peso das cobranças por resultados e as atenções às ações empreendidas. Não é possível depreender se a questão atrelada aos índices legará a Santos o mérito de uma política mais ou menos assertiva do que a de Uribe no âmbito de resposta às querelas que permeiam o Estado colombiano. O que é possível ser inferido, no entanto, é que aparentemente passos rumo à inserção do Estado em âmbito internacional/regional têm sido expressivos e estes angariaram matizes diferentes à questão do transbordamento do conflito, permitindo que novas perspectivas de resoluções façam parte de análises acerca desta temática. A não efetivação do

179

transbordamento do conflito às fronteiras brasileiras consistiu em um legado de cooperação tática e preocupações concernentes à segurança previamente desenvolvidas ao longo de gestões anteriores, entretanto dado este “redesenho” da estratégia internacional colombiana, calcada na estratégia do apaziguamento (CARREÑO, 2012), é possível conjecturar um cenário de controle dos efeitos do transbordamento para as demais fronteiras, questão efetivada principalmente na Venezuela – conforme discutido – e Equador. A utilização dos últimos territórios como safe heavens ainda é recorrente (ABERLÁEZ, GUZMÁN, 2012), mas a prospecção de uma resolução conjunta acerca da questão soa mais próxima de um limiar concreto rumo à estabilidade regional do que outrora, primando por uma fluidez maior às relações internacionais do que em um ambiente marcado pela securitização (TICKNER, 2004; ARANA, 2004). Portanto, questões que permearam a história colombiana, relativas aos âmbitos político, geopolítico e sociológico estão passíveis de um redesenho em seu percurso, quebrando quiçá o paradigma da coexistência de elementos modernos e tradicionais, característicos da colombianidade. Este já seria um mérito considerável para o momento.

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Anexo 1- LISTAGEM DE PRESIDENTES DA COLÔMBIA (1814 – 2011)*

Nomes dos Presidentes

Período de Governo

Jose Miguel Pey

1810-1811 / 1815 / 1831

Jorge Tadeo Lozano

1811

Antonio Nariño y Alvarez

1811-1812 / 1812-1813

Jose Maria Arrubla

1812

Manuel Benito de Castro

1812

Luis de Ayala Vergara

1812

Felipe de Vergara

1812

Manuel Bernardo Alvarez

1813-1814

Jose Manuel Restrepo

1814-1815

Jose Fernandez Madrid

1814-1815

Joaquin Camacho

1814-1815

Crisanto Valenzuela

1815

Antonio de Villavicencio

1815

Manuel Rodrigues Torices

1815

Custodio Garcia Rovira

1814-1815 / 1816

Camilo Tores y Tenorio

1815-1816

Fernando Serrano

1816

Liborio Mejia

1816

Gal. Simón Bolívar Palacios

1819-1830

Gal. Francisco de Paula Santander y 1819-1827 / 1832-1837 Omaña Estanislao Vergara

1821 / 1829

Gal. Domingo Caycedo Santamaría

1830 / 1831 / 1839 / 1840 / 1841-1842.

Joaquin Mariano Mosquera Gal.

Jose

Ignacio

de

1830-1831 Marquez 1830-1831 / 1837-1840 / 1840-

Barreto

1841

Gal. Rafael José Urdaneta

1830-1831

Juan García del Rio

1831

194

Gal. José Maria Obando

1831 / 1853-1854

Juan de Dios Aranzazu

1841-1842

Joaquin Jose Gori

1841

Juan de Dios Aranzazu

1841-1842

Gal. Pedro de Alcantara Heran

1841 / 1842-1845

Gal. Tomás Cipriano de Mosquera

1845-1849 / 1861 – 1864 / 1866-1867

Rufino Cuervo

1847 / 1849

Gal. Jose Hilario Lopez

1849 – 1853 / 1863

José de Obaldia

1851-1852 / 1853 / 1854-1855

José Maria Melo Ort íz

1854

Francisco Antonio Obregon

1854

Tomas de Herrera

1854

Manuel Maria Mallarino

1855-1857

Mariano Ospina Rodriguez

1857-1861

Juan Jose Neto Gil

1861

Bartolomé Calvo

1861

Ignacio Gut ierrez Vergara

1861-1862

Leonardo Canal

1862

Julio Arboleda

1862

Andres Ceron Serrano

1862

Manuel del Rio y de Narvaez

1862-1863

Froilan Lagarcha

1863

Gal. Santos Gutierrez Prieto

1863 / 1868-1870

Gal. Eustorgio Salgar

1863 / 1870 – 1872

Juan Agust in de Uricoechea

1864

Manuel Murillo Toro

1864-1866 / 1872-1874

Jose Maria Rojas Garrido

1866

Joaquin Riascos Garcia

1867

Santos Acosta

1867-1868

Salvador Camacho Roldan

1868-1869 / 1871

Sant iago Pérez de Manosalbas

1869 / 1874-1876

Gal. Julián Trujillo Lagarcha

1870 / 1878-1880

195

Aquileo Parra Gomez

1876-1878

Sergio Camargo Pinzon

1877

Rafael Núñez Moledo

1880-1882 / 1884 – 1886 / 1887 – 1888 1892 – 1894

Francisco Javier Zaldua

1863 / 1882

Clímaco Calderón

1882

José Eusebio Otálora Mart inez

1882-1884

Ezequiel Hurtado

1884

Gal. José Maria Campo Serrano

1886

Eliseo Payán

1886 – 1887

Carlos Holguín

1888 – 1892

Miguel Antonio Caro Trovar

1892 / 1894 – 1898

Manuel Antonio Sanclemente

1898-1900

José Manuel Marroquin

1900 – 1904

Gal. Rafael Reyes Prieto

1904 – 1909

Gal. Jorge Holguín Jaramillo

1909 / 1921-1922

Ramón González Valencia

1909-1910

Carlos E. Restrepo Restrepo

1910-1914

José Vicente Concha

1914-1918

Marco Fidel Suárez

1918-1921

Gal. Pedro Nel Ospina Vásquez

1922 – 1926

Miguel Abadía Méndez

1926-1930

Enrique Olaya Herrera

1930-1934

Alfonso López Pumarejo

1934-1938 / 1942-1945

Eduardo Santos

1938-1942

Darío Echandía Olaya

1944

Alberto Lleras Camargo

1945-1946 / 1958-1962

Mariano Ospina Pérez

1946-1950

Laureano Gómez Castro

1950-1951

Roberto Urdaneta Arbeláez

1951-1953

Gal. Gustavo Rojas Pinilla

1953-1957

Gal. Gabriel París Gordillo

1957-1958

Guillermo León Valencia Muñoz

1962-1966

196

Carlos Lleras Restrepo

1966-1970

Misael Eduardo Pastrana Borrero

1970-1974

Alfonso López Michelsen

1974-1978

Julio César Turbay Ayala

1978-1982

Belisario Betancur Cuartas

1982-1986

Virgilio Barco Vargas

1986-1990

César Augusto Gaviria Trujillo

1990-1994

Ernesto Samper Pizano

1994-1998

Carlos Apolinar Lemos Simonds

1996

Andrés Pastrana Arango

1998 – 2002

Álvaro Uribe Vélez

2002-2006 / 2006-2010

Juan Manuel Santos Calderón

2010 até dias atuais

*Elaboração Nossa, 2012. Baseada em dados do sítio da Presidência da República da Colômbia (http://www.presidencia.gov.co/prensa_new/historia) e de CALDERON, Camilo. “Presidentes 1810 – 1994”. Revista Credencial Historia, n. 8, agosto de 1990, Disponível em http://www.banrepcultural.org/blaavirtual/revistas/credencial.

197

Anexo 2 - OS CEM PONTOS DE URIBE – MANIFESTO DEMOCRÁTICO105 Manifiesto Democrático -100 Puntos Álvaro Uribe Vélez Contenido 1. LA COLOMBIA QUE QUIERO 2. HACIA UN ESTADO COMUNITARIO 3. REFORMA POLÍTICA Y ADMINISTRATIVA. LUCHA CONTRA POLITIQUERÍA. 4. LUCHA CONTRA LA CORRUPCIÓN. 5. SEGURIDAD DEMOCRÁTICA. 6. EN BUSCA DE LA PAZ. 7. CONFIANZA, ERRADICACIÓN DE LA MISERIA Y JUSTICIA SOCIAL. 8. LA REVOLUCION EDUCATIVA. 9. SALUD PARA LOS POBRES. 10. COOPERATIVISMO, HERRAMIENTA FUNDAMENTAL. 11. EL CAMPO Y LA SEGURIDAD ALIMENTARIA. 12. SERVICIOS PÚBLICOS. 13. VOCACIÓN EMPRESARIAL. 14. 14 .EMPLEO Y VIVIENDA. 15. TRANSPORTE E INFRAESTRUCTURA. 16. IMPUESTOS Y REFORMA PENSIONAL. 17. RELACIONES INTERNACIONALES. 18. UN GOBIERNO SERIO, EFICAZ Y HONRADO. NO MILAGROSO.

LA COLOMBIA QUE QUIERO 1. Sueño con una Colombia con predominio de una clase media democrática, tolerante, solidaria y respetuosa con el medio ambiente. 2.

Sueño con una Colombia en la que todos podamos vivir en paz, resolver nuestras

diferencias pacífica y creativamente, gozar en familia de nuestras carreteras, paisajes y ríos. Sentir con ilusión que nuestra Patria nos pertenece y que debemos cumplir seriamente nuestras obligaciones con ella. Una Colombia con autoridad legítima y cero poder para los violentos. 105

Disponível em http://www.mineducacion.gov.co/1621/articles-85269_archivo_pdf.pdf

198

3. Sueño con un País democrático en lo político y en lo económico. Con oportunidades para todos. Con un País de propietarios, con una revolución de impulso a la micro, pequeña y mediana empresa. 4.

Sueño con un Estado al servicio del pueblo y no para provecho de la corrupción y la

politiquería. Hoy el Estado es permisivo con la corrupción, gigante en politiquería y avaro con lo social.

HACIA UN ESTADO COMUNITARIO

5.

Nuestro Estado Comunitario dedicará sus recursos a erradicar la miseria, a construir

equidad social y dar seguridad. Habrá más participación ciudadana en la definición de las tareas públicas, en su ejecución y vigilancia. La participación ciudadana garantiza que los recursos lleguen a la gente y no se enreden en la politiquería. 6. El Estado burocrático y politiquero ha engañado al pueblo con un discurso social que no ha cumplido porque los recursos se han ido en clientelismo y corrupción. El modelo Neoliberal abandona lo social a la suerte del mercado, con lo cual aumentan la miseria y la injusticia social. 7.

La Presidencia será austera para dar ejemplo. Gastará menos en burocracia para invertir

más, por ejemplo, en pequeña empresa. 8. Menos Congreso, menos consulados y embajadas. Menos contralorías, menos vehículos oficiales. A cambio más educación, más salud, más empleo productivo. 9. El 7 de Agosto, a las 5 p.m., si con la ayuda de Dios y el apoyo del pueblo colombiano llego a la Presidencia de Colombia, presentaré el "Referendo contra la Corrupción y la Politiquería", que incluirá la reducción del Congreso, la eliminación de los auxilios parlamentarios y de sus privilegios en pensiones y salarios. 10. El municipio es al ciudadano lo que la familia es al ser humano. El municipio es el primer encuentro del ciudadano con el Estado. Defenderemos los municipios, pero se tendrán que ayudar con austeridad y buena administración. Municipios vecinos, que en lugar de tener cada uno su respectiva unidadde asistencia agrícola se puedan agrupar y disponer de una sola a través de un convenio con empresas solidarias de profesionales y tecnólogos. Debe haber personerías comunes para grupos de pequeños municipios o ser sustituidas por la Procuraduría Nacional. Explorar todas las posibilidades de asociación.

199

11. Los departamentos no cofinancian hoy a los municipios ni lideran sus proyectos. Alcaldes y concejales pasan viajando a las oficinas del gobierno central. Necesitamos recuperar la fortaleza del nivel intermedio de gobierno. La Constitución debe autorizar regiones autónomas que surjan de la fusión de departamentos con mecanismos que mantengan su identidad cultural. Que las regiones no sean simples entes territoriales con nuevos costos. Tres departamentos que se unan, de manera voluntaria y por iniciativa propia, podrán tener una sola gobernación, una sola asamblea. Ahorrarán, dispondrán de más recursos para lo social. La Nación debe desmontar las duplicidades y delegar más funciones y competencias en las regiones. Por ejemplo, Caminos Vecinales no debe existir en el nivel central. 12. Estudiaremos diferentes modalidades de alianzas entre departamentos, que ahorren costos para dedicar más recursos a la inversión social. Por ejemplo, que fusionen entidades operativas: departamentos vecinos podrían tener una sola Secretaría de Obras Públicas. 13. Las asambleas tienen que ser más austeras, pero no se deben suprimir salvo cuando sean sustituidas por parlamentos regionales. Se justifican por la representación de las subregiones de cada departamento y el control político. Los diputados no deben tener sueldo sino honorarios y seguridad social. 14. Una Contraloría Nacional pequeña y técnica, con auditorias externas, debe remplazar a las contralorías departamentales y municipales. El ahorro se debe destinar a educación, salud y más inversión social. 15. Integraremos una comisión que recomiende la opción departamental y regional más conveniente para profundizar la descentralización. La reforma se hará. 16. La Nación ha seguido creciendo su bur ocracia a pesar de la descentralización. Hay que desmontarla porque de lo contrario se marchita la descentralización. 17.

Necesitamos crear la cultura de buena administración de lo público. Las empresas

estatales son las empresas privadas más importantes porque pertenecen a toda la comunidad. Es un delito de lesa comunidad hacer fiesta con lo estatal. Para salvar al Seguro Social, al Sena, al Bienestar Familiar, al Sisben y la educación pública, cero politiquería. Cuando los politiqueros se sienten amenazados salen con el cuento de que las van a privatizar.

REFORMA POLÍTICA Y ADMINISTRATIVA. LUCHA CONTRA POLITIQUERÍA.

200

18. No podemos seguir con un Congreso que cuesta $600.000 millones al año cuando para vivienda social solo hay $150.000 millones. El número de congres istas debe reducirse de 266 a 150. Sin privilegios pensionales, ni salarios exorbitantes. Un congresista español devenga $7 millones, uno colombiano gana el doble. Que haya audiencias públicas para los reclamos regionales, pero no auxilios parlamentarios q ue corrompen la política. Si los eliminamos, con cada $10 millones de ahorro, podemos financiar una pequeña empresa y crear 2 puestos de trabajo. 19.

Necesitamos un Congreso Visible. Que la gente conozca por nombre propio a los

congresistas. Que sepa a qué hora entran y a qué hora salen, qué proyectos presentan, qué debates impulsan. 20. Soy partidario de una sola Cámara que integre al Congreso con la ciudadanía, titular de la democracia participativa. Que para crear una ley, entre debate y debate, haya más intervención ciudadana. Muchos de mis compañeros comparten toda la reforma, pero quieren las dos cámaras. 21. La circunscripción nacional debe reducirse a lo necesario para la representación de las minorías. Como se aplica en la actualidad, ha dejado regiones sin representación y en muchos casos la única relación entre el congresista y los electores se da cada cuatro años cuando se entrega un dinero y se recogen unos votos. 22. Buscaremos acuerdos para puntos de la reforma política relacionados con los partidos y las elecciones, con el buen cuidado de que por eliminar la dispersión no se afecten los derechos de las minorías. El pluralismo se tornó en dispersión y anarquía por los auxilios, los sueldos, el clientelismo y los privilegios pensionales. 23. Impulsaremos una carrer a administrativa especial en la Registraduría, la Procuraduría y la Fiscalía. Que predomine el concurso de méritos para ingresar, pero que el titular disponga de poder discrecional para desvincular funcionarios por razones de desempeño.

LUCHA CONTRA LA CORRUPCIÓN.

24. El padre de familia que da mal ejemplo, esparce la autoridad sobre sus hijos en un desierto estéril. Para controlar a los violentos, el Estado tiene que dar ejemplo, derrotar la politiquería y la corrupción.

201

25. De una vez tenemos que derrotar la corrupción. Inicialmente propusimos ocho medidas y ya tenemos muchas más. Eliminar el beneficio de casa por cárcel para los corruptos. Que los corruptos no puedan regresar al Estado por nombramiento, elección o contrato. Que todo contrato tenga veeduría comunitaria, como ocurrió en mi época de Director de Aerocivil durante la construcción de los aeropuertos de Barranquilla y Medellín. Audiencias públicas para la adjudicación de contratos, como hice en Antioquia con las licitaciones. Publicidad y cruce de preci os para las compras oficiales. Reforma a la licitación, para que haya subasta pública entre proponentes que cumplan con los requisitos financieros y técnicos, y publicar el prepliego antes de su aprobación definitiva. Que las regalías se contraten a través de entidades transparentes, sin ánimo de lucro. Cátedra de Transparencia en escuelas, colegios y hogares. La Carrera administrativa debe contar con concursos transparentes realizados por entidades imparciales. Eliminación de trámites innecesarios.

SEGURIDAD DEMOCRÁTICA.

26. Colombia sin guerrilla y sin paramilitares. La autoridad legítima del Estado protege a los ciudadanos y disuade a los violentos. Es la garantía de la seguridad ciudadana durante el conflicto y después de alcanzar la paz. 27. La seguridad será democrática. Para proteger a todos, al trabajador, al empresario, al campesino, al sindicalista, al periodista, al maestro, frente a cualquier agresor. 28. Enalteceré la profesión de soldado y policía. Que la comunidad los valore y respete. Que ellos se esmeren por merecer respeto y admiración. Que reciban formación técnica y su esfuerzo sea premiado con becas de estudio y altas calificaciones. Con más policías y soldados nuestra fuerza pública sufrirá menos bajas, será más respetada y el pueblo vivirá más tranquilo. 29.

Eliminaremos el servicio militar obligatorio cuando hayamos completado 100.000

soldados profesionales. Este se ha prestado para discriminar a trabajadores y campesinos y no es indicado para enfrentar curtidos grupos violentos. Habrá la alternativa de la docencia obligatoria. Todos los jóvenes recibirán entrenamiento militar como los profesionales de la reserva y serán colaboradores permanentes de la fuerza pública. Cuando digo todos es porque se acabará la discriminación. 30. El Presidente dirigirá el or den público como corresponde en una sociedad democrática

202

en la cual la fuerza pública respeta a los gobernantes de elección popular. En la Gobernación de Antioquia fui el primer policía del Departamento. En la Presidencia seré el primer soldado de la Nació n, dedicado día y noche a recuperar la tranquilidad de todos los colombianos. Al final de esa Gobernación el secuestro había descendido en 60%, las carreteras eran transitables y el homicidio había bajado 20%. Los empresários pudieron volver a trabajar en Urabá, regresó la tranquilidad para los trabajadores y cesaron las masacres. 31. Un país sin droga. Apoyar y mejorar el Plan Colombia. Que incluya interceptación aérea para que no salgan aviones con coca y regresen con armas. Pediré la extensión del Plan para evitar el terrorismo, el secuestro, las masacres, las tomas de municipios. Necesitamos nuevas formas de cooperación internacional contra la violencia: que Naciones Unidas envíe una misión humanitaria a uno de nuestros municipios en donde la ciudadanía sufre de represalias guerrilleras por la resistencia civil a nuevos intentos de toma. Que esa misión humanitaria para proteger a la comunidad tenga el apoyo de soldados colombianos avalados por Naciones Unidas para disuadir a los agresores. Este tipo de soluciones son jurídicas, pero no convencionales. Un conflicto de la magnitud del nuestro necesita de soluciones atípicas. Demandamos la cooperación internacional porque este conflicto se financia con el narcotráfico, negocio criminal internacional, y se apoya e n armas fabricadas afuera. La comunidad democrática internacional no puede ser indiferente al sufrimiento del pueblo colombiano. Proyectos de sustitución de cultivos ilícitos que sean sostenibles. Un acuerdo con 50.000 familias campesinas, cocaleras y amapoleras, para que erradiquen la droga, cuiden la recuperación del bosque y reciban una remuneración de $5 millones familia por año. 32. Oralidad en la justicia penal para agilizarla con transparencia. Acuerdos con consultorios jurídicos para descongestionar des pachos. 33.

Necesitamos un estatuto antiterrorista que facilite la detención, la captura, el

allanamiento. A diferencia de mis años de estudiante, hoy violencia política y terrorismo son idénticos. Cualquier acto de violencia por razones políticas o ideológicas es terrorismo. También es terrorismo la defensa violenta del orden estatal. 34. Agravar penas para delitos como el robo de vehículos o porte ilegal de armas. Más severidad con el menor delincuente de alta peligrosidad. 35.

Impulso al arbitramento y a la justicia de conciliación en lo civil, comercial,

administrativo y de familia, para acelerar y descongestionar.

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36. Ensayar cárceles privadas. El Estado pagará por interno. Las cárceles deben formar en principios y en un oficio técnico. Como Gobernador de Antioquia in stalé una fábrica de gaviones en la cárcel de Bellavista. Exención tributaria para los empresarios que produzcan en las cárceles. 37. Eliminar el Consejo Superior de la Judicatura. Es muy costoso: $ 60.000 millones. Com ese dinero podemos financiar 10.000 viviendas sociales por año. Que la autonomía de la justicia la administren las altas cortes con apoyo del Ministerio. 38. Todos apoyaremos a la fuerza pública, básicamente con información. Empezaremos com un millón de ciudadanos. Sin paramilitarismo. Con frentes locales de seguridad en los barrios y el comercio. Redes de vigilantes en carreteras y campos. Todos coordinados por la fuerza pública que, con esta ayuda, será más eficaz y totalmente transparente. Un millón de buenos ciudadanos, amantes de la tranquilidady promotores de la convivencia. 39. Concertar con transportadores y taxistas para vincularlos a la seguridad de calles y carreteras. Cada carretera tendrá un coronel del Ejército o de la Policía responsable de su seguridad. El lunes será el "Día de la Recompe nsa" que pagará el Gobierno a los ciudadanos que en la semana anterior hubieran ayudado a la fuerza pública a evitar un acto terrorista y capturar al responsable. A liberar un secuestrado y capturar al secuestrador. Se respetará la reserva de identidad y s e exigirá visto bueno de las autoridades competentes. 40. Enseñar negociación de conflictos. Que sirva para evitar la violencia intra familiar. Que los cónyuges aprendan a discutir entre ellos con respeto, a corregir con cariño a sus hijos para que éstos, mástarde, en la escuela y el trabajo, sepan que todo conflicto se puede negociar pacíficamente.

EN BUSCA DE LA PAZ.

41. Soy amigo del diálogo con los violentos, pero no para que crezcan sino para hacer la paz. Pediré mediación internacional para buscar el diálogo con los grupos violentos, siempre que empiece con abandono del terrorismo y cese de hostilidades. Para el desarme y la desmovilización puede haber todo el plazo que se requiera. Urgencia para el cese de hostilidades, paciencia para los acuerdos finales. Toda la generosidad en la reinserción. Garantías efectivas para el ejercicio político de quienes provengan de los grupos armados; que hagan política sin armas y sin que los asesinen. Que no se repita la experiencia de la Unión

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Patriótica donde confluyeron dos errores: primero, combinar la política con los fusiles, cuando los argumentos son las únicas armas válidas de la lucha democrática; y, segundo, la falta de mayor determinación por parte del Estado para proteger a los militantes políticos. La agenda tem ática de la democracia no se debe negociar bajo la presión de los fusiles, pero a quienes los portan se debe ofrecer condiciones para que los abandonen y hagan valer sus ideas en los escenarios de la democracia.

CONFIANZA, ERRADICACIÓN DE LA MISERIA Y JUST ICIA SOCIAL.

42.

Recuperar la confianza inversionista en Colombia con orden público, buen manejo

macroeconómico, claridad y estabilidad en las reglas de juego. Controlaremos el lavado de activos para que el dólar barato no siga arruinando nuestra producción. Con el fondo de garantías, estímulos tributarios, premios al pago puntual, créditos asociativos y préstamos a través de fundaciones. Habrá una tasa de interés más razonable. Si una exención tributaria se elimina antes de tiempo, que el Estado indemnice a lo s afectados para que haya confianza inversionista. 43. Sin corrupción ni politiquería los recursos tienen que alcanzar para erradicar la miseria y construir justicia social. 44. Apoyar a la mujer cabeza de familia pobre con carné prioritario para el Sisben, cupos escolares para sus hijos, subsidio de vivienda social, ingreso al programa de microempresas. 45. Organizar en cooperativas a 82.000 madres comunitarias para dar almuerzo y refrigerio a un millón 400 mil niños. Hoy lo reciben 900.000. Así ampliaremos la cobertura, mejoraremos la productividad de los hogares comunitarios, podremos aumentar el monto de la beca a las madres y vincularlas al subsidio familiar. Propongo siete herramientas para construir justicia social: revolución educativa, ampliación y mejoramie nto de la seguridad social, impulso a la economía solidaria, manejo social del campo, manejo social de los servicios públicos, desarrollo de la pequeña empresa para que haya nuevos actores de la economía que eviten la concentración de la riqueza, y calidad de vida urbana, porque de lo contrario, aún con estudio, los ciudadanos no tendrán motivación para vivir en nuestro medio.

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LA REVOLUCION EDUCATIVA.

46. El País necesita una Revolución Educativa que avance hacia la cobertura universal, la buena calidad y acceso democrático. Una educación crítica, científica, ética, tolerante con la diversidad y comprometida con el medio ambiente. 47.

La Revolución Educativa incluye 5 temas esenciales: Cobertura. Propongo crear

1.500.000 cupos para educación básica. Fortaleceremo s la educación pública, la comunitaria con más recursos estatales para los pobres, y sistemas atípicos como él de aprendizaje tutorial que impulsé en Antioquia. Cambiaremos el servicio militar obligatorio por el servicio docente obligatorio. Lo aplicaremos cuando tengamos 100.000 soldados profesionales. El universitario deberá ser profesor de primaria o secundaria durante un año sin reemplazar los maestros. Propongo crear 400.000 nuevos cupos universitarios en el próximo cuatrienio. Apoyo a la universidad pública sin politiquería, con fusiones como la creación de la Universidad Nacional del Caribe. Un crédito internacional para aumentar de $100.000 mil millones a $500.000 millones los préstamos anuales del Icetex. Que en la asignación cooperen las universidades y las fundaciones de microcrédito. Universidad a distancia con Internet. Calidad. Capacitación de profesores con énfasis en matemáticas, ciencias básicas, español, inglés e historia. Conectividad. Evaluación remedial y no sancionatoria profesores. Evaluación de alumnos. Homologaremos los textos escolares y diseñaremos un sistema que permita reutilizarlos a través de un mercado secundario para reducir costos. Pertinencia laboral. Vincular la universidad a la actividad productiva exigiéndole información pública y certificada sobre el éxito laboral o empresarial de sus egresados. Integraremos los correspondientes programas de pregrado a las incubadoras de empresas para estimular la creatividad empresarial de los estudiantes. Capacitación técnica. Preparemos 150.000 personas de sectores medios y populares en oficios productivos por año. Si en 10 años, 1.500.000 compatriotas aprenden un oficio productivo, habremos provocado una impresionante revolución social y de productividad. El Sena sin politiquería, eficiente, en concurrencia con ONGs y armonía con la empresa privada. Masificar el programa Jóvenes en Acción. Todos los bachilleres deberán aprender un oficio productivo. Investigación científica. Recuperación gradual del presupuesto de investigación y ciencia . Promoveremos la alianza del Estado, la comunidad académica, científica y empresarial, en acciones concretas como los centros de desarrollo tecnológico. Para financiar la Revolución Educativa comprometeremos mínimo el 50% de las regalías; utilizaremos parte de los recursos provenientes de la lucha contra la corrupción, la politiquería y el derroche en las instituciones públicas. Mejor

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utilización educativa de los excedentes cooperativos y de los recursos de las cajas de compensación. 48. Que los niños se contagien de ciencia, cultura y deporte. Cuando un niño abraza un instrumento musical, jamás empuñará un fúsil contra el prójimo. 49. Propongo un Estado que proteja la vida y dignidad de sus profesores. Que los profesores sean maestros de la comunidad. 50. La cultura y el deporte son puentes para hacer tránsito de una sociedad de masa hacia una auténtica comunidad de pueblo con lazos de solidaridad, sentido de pertenencia y responsabilidad frente a lo colectivo y público. La cultura convierte al individuo en ciudadano con responsabilidades frente al conglomerado. 51.

Seguridad social para los trabajadores de la cultura y oportunidades de

profesionalización. Un país de lectores. Hay 326 municipios sin biblioteca pública. Mantendremos la exención del libro. Apoyo a las microempresas de la cultura. El Plan Estratégico de Exportaciones debe apoyar el cine. Artesanías con valor colombiano. Impulso al cultivo de la caña flecha para sustituir droga. La cultura para construir ciudadanía, alcanzar la paz y mejorar el ingreso. Con la Cátedra Transparencia, la enseñanza de negociación pacífica de conflictos y el énfasis en capacitación de los profesores en historia, vincularemos la educación con la cultura. Gestionaremosrecursos internacionales como lo ha logrado México para su plan de bibliotecas. 52. Deporte de alto rendimiento por regiones, concluir los centros programados. Apoyo a parques y ciclo vías para deporte comunitario. Que las carreteras que se pavimenten y las nuevas tengan senderos para caminantes, bicicletas y animales de carga y silla. Seguridad social para deportistas. Dedicar publicidad oficial al deporte como ló continué en ciclismo con el equipo Orgullo Paisa.

SALUD PARA LOS POBRES.

53. Fui senador ponente de la ley que creó el SISBEN. En la Gobernación de Antioquia ingresamos 1.020.000 pobres. Lo aumentaremos, sin politiquería, para los pobres. Será vigilado por universidades. Preferirá a la madre cabeza de familia pobre, al anciano pobre y al discapacitado pobre.

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54. Para los taxistas seguridad integral, social y policiva. 55. Que el régimen subsidiado de salud lo presten entidades sin ánimo de lucro, integradas por cooperativas, empresas solidarias, cajas de compensación y hospitales. Tendrán cobertura regional, menos gastos en administración y más cobertura. 56. Garantía de tarifas equ itativas para médicos y profesionales afines. Garantía para que el usuario tenga opciones de escogencia de instituciones prestadoras de servicios y médicos. Que el crecimiento de las empresas promotoras de salud no anule a las instituciones independientes. 57. Programas de quejas y reclamos de usuarios y pacientes de salud. 58. Extensión de la Superintendencia de Salud con supervisores como los departamentos, municipios, universidades y asociaciones comunitarias. 59. Evitar la evasión en los pagos a la salud para aume ntar cobertura. Se hará con el cruce de información y el mejoramiento de la sistematización. 60. Necesitamos salvar al Seguro Social porque la opción pública es esencial en el esquema de empresas promotoras de salud. Lo destruyó la politiquería, no la Ley 100. Entre 1993 y 1998 pasó de 23.000 empleados en nómina directa y paralela a más de 43.000. Así no hay chequera que resista. Para salvarlo cuatro medidas: no entregarlo a los directorios políticos; reducir costos con la ayuda y comprensión de los trabajadores; contratos imaginativos con el sindicato, con cooperativas de trabajadores, con cajas de compensación para el mejor manejo de las clínicas; aportes de Gobierno.

COOPERATIVISMO, HERRAMIENTA FUNDAMENTAL.

61. Toda la vida he trabajado con las cooperativas. Fondo de Garantías para facilitar crédito a las cooperativas. Cooperativas educativas. Las de trabajo asociativo deben ser verdaderas empresas, con ingresos justos y seguridad social. En el sector agropecuario para el mercadeo de insumos y productos finales. De campesinos propietarios en empresas productivas y en bancos de maquinaria. Para unir pequeños y medianos exportadores. Mantener la exención tributaria con la condición de que los excedentes sean aplicados a la revolución educativa.

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EL CAMPO Y LA SEGURIDAD ALIMENTARIA.

62. Manejo social del campo. En el 2010 nuestra Patria podrá tener cerca de 50 millones de habitantes con alta dependencia del campo para su seguridad alimentaria y el empleo. Protección razonable y regulaciones sociales por oposición a las imp ortaciones desbocadas. Impulso a sistemas asociativos de producción, mercadeo, a bancos de maquinaria de campesinos y gremios, a las cadenas productivas, a la investigación. Apoyo con fianza del fondo de garantías. Subsidios para el café y el algodón. Seguro de cosecha en uno o algunos productos campesinos, en un comienzo por vía experimental. Evitar dólar barato, a lo cual debe contribuir el Banco Central y cuidar tasa de interés. Exención de arancel e IVA a importación de maquinaria durante dos años. Exención de largo plazo a la madera comercial y sus derivados para concentrar el pago del Certificado Forestal a favor exclusivo de campesinos. Exención tributaria a la producción de alimentos y medicamentos provenientes de la investigación. Para los planes de expansión de cultivos utilizar el Incentivo de Capitalización Rural de contado, o a plazos con avales a créditos de los agricultores o certificados tributarios futuros. 63. Necesitamos a los campesinos y a los empresarios. Fraternidad en la tenencia de tierras, sin feudalismo ni lucha de clases. Adelantaremos una política de tierras encaminada a mejorar las condiciones sociales y productivas de nuestros campesinos pobres. La tierra que se compre para reforma agraria deberá ser buena y productiva. El Estado la adquirirá a precios de mercado y la entregará a grupos asociativos. El Estado pagará el ciento por ciento del precio. Los beneficiarios recibirán apoyo en crédito barato, tecnología y comercialización de sus productos. En fincas ganaderas préstamo de tierra a campesinos para cultivos. 64. Respeto a la variable ambiental. Ecoturismo exento de impuestos para proteger parques. Sustituir droga por cuidado del bosque mediante subsidios. Eliminar la politiquería en las corporaciones ambientales, revisar su estructura e introducir más participación comunitaria para la ejecución de los recursos que deben privilegiar la arborización protectora, la disposición final de basuras y el saneamiento básico de aguas residuales.

SERVICIOS PÚBLICOS.

65. Manejo social de los servicios públicos. Las familias empobrecidas consumen creciente porción del ingreso en el pago de facturas de servicios públicos. Hay empresas quebradas,

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inversionistas que se quieren ir y falta mucho en cobertura y calidad. Los servicios públicos requieren capi tal público y privado, sin politiquería en las entidades estatales ni abusos en las particulares. Crearemos el programa de quejas y reclamos, sin nuevas burocracias, con participación de universidades. Mantendremos los subsidios. A fin de democratizar la propiedad propondremos mecanismos para que los usuarios sean socios; ya lanzamos una idea en Buenaventura que tendría como capital semilla los aportes de la Nación para recuperar y ampliar el sistema. No permitiremos que la tarifa de subsistencia, la que pa gan los pobres de menores consumos, se eleve por encima de la inflación. Debemos castigar el consumo suntuario, la cultura de no pago de entidades y premiar el esfuerzo de los cumplidos. Me aplicaré personalmente a la solución de EMCALI. Todos harán esfuer zos: los gobiernos nacional, departamental y municipal; el sindicato; los acreedores; los usuarios.

VOCACIÓN EMPRESARIAL.

66. Nuevos actores de la economía. Colombia es el país del continente con mayor vocación empresarial. El informal tiene tanta alma de emp resario como el dueño de la más sofisticada industria tecnológica. Contamos con una magnífica red de entidades sin ánimo de lucro para apoyar la pequeña empresa a través de capacitación y crédito, como el Banco de la Mujer, la Fundación Carvajal, Mac, Microempresas, Actuar, Fundesan, Corporación Social, Hogares Don Bosco, Santodomingo, Contactar, para mencionar unas pocas. Con el Banco Interamericano y la Corporación Empresarial del Banco Mundial buscaremos un crédito de largo plazo y baja tasa de interés que se canalizará por dicha red para dotar de recursos a los pequeños empresarios, sin que la hipoteca sea esencial, con garantías a su alcance. Los sectores populares son buenos pagadores como lo demostró la Caja Agraria, que no la quebraron los campesinos sino los ladrones de cuello blanco. La fibra creativa de nuestros pequeños empresarios necesita oportunidades y nuestra determinación es encontrarlas. De ese modo crecerán, su contribución al empleo será inmensa y se constituirán en nuevos actores económicos que frenarán la concentración de la propiedad y el ingreso. Especial atención prestaremos a la conversión de informales en empresarios con locales adecuados. Tenemos que proteger actividades económicas típicas de clase media, que son verdaderas defensas de la democracia: la tienda de barrio para que no sea desplazada por las grandes cadenas; la farmacia familiar; la estación de gasolina de propiedad de una familia. 67. Queremos que los sindicatos de trabajadores tengan la posibilidad de ser empresarios. Me he comprometido con muchos de ellos a impulsar los contratos sindicales y sus proyectos

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empresariales para hacer la transición de un sindicalismo reivindicatorio a otro de participación.

EMPLEO Y VIVIENDA.

68. Sí al empleo productivo. No al clientelismo. Un puesto clientelista anula 4 empleos productivos. Dos años sin Arancel ni IVA para la importación de maquinaria productiva. Los trabajadores menores de 25 años y los mayores de 50 no generarán cargas parafiscales pero tendrán derecho a seguridad social. Bus caremos convênios internacionales para un plan de distritos de riesgo, de pavimentos en vías secundarias. 69. Impulso a las zonas especiales de exportación. 70. Exención tributaria a la construcción de nuevos hoteles, a la remodelación de los viejos, al turismo e cológico. 71. Que los sistemas de transporte masivo, transmilenios y semejantes, tengan participación democrática de los transportadores. Los impulsaremos en Cali, Barranquilla, Bucaramanga y Cartagena. En Bogotá para extenderlo y en Medellín para complementar el Metro. 72. Construiremos 100.000 viviendas sociales por año, sin intermediarios politiqueros. Las cajas de compensación manejarán los subsidios para la población más pobre. Estas entidades deberán reducir los costos de funcionamiento, efectuar alianzas entre las pequeñas. En las grandes ciudades debe permitirse que los trabajadores escojan la caja a la cual deben afiliarse. 73. Extenderemos la exención tributaria de los préstamos de vivienda social a la vivienda de clase media para aumentar los recursos, extender los plazos y reducir la tasa de interés. Buscaremos que el costo total para la clase popular no exceda de inflación más seis puntos. Entregaremos recursos de microcrédito para vivienda a fin de evitar la acción de los agiotistas. Para impulsar la tasa de interés hacia abajo canalizaremos las participaciones de las regiones a través de los bancos comprometidos con vivienda social. 74. La calidad de vida urbana nos enseña a apreciar al vecino, a amar el parque y a tener una vida alegre. Apoyaremos los bancos de tierra y zonas de reserva para garantizar el espacio público ecológico y recreativo y evitar que la selva del cemento anule la ilusión de residir en nuestras ciudades. Impulso a lotes con servicios y muy buena calidad urbanística. 75. Estímulos tributarios para quienes aporten sus inmuebles a la renovación urbana, para

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recuperar las zonas deprimidas dotadas de servicios públicos. Que se construyan parques, senderos de bicicletas y edificios que aprovechen la altura y asequibles a sectores populares y clase media. Desmarginalización de asentamientos urbanos. Legalización administrativa de inmuebles populares que no estén sometidos areclamaciones judiciales. 76. Estímulos tributarios a la construcción de vivienda para dar en arrendamiento con opción de compra. También el estímulo tributario al crédito en materiales de construcción. 77. Parte del subsidio de vivienda se dedicará a apoyar el fondo de garantías y a dar un seguro de tasa de interés para reducirla. Permitirá más crédito a más plazo. Buscaremos que el siste ma de subsidio pueda favorecer a personas que no cumplan con los requisitos de ahorro programado.

TRANSPORTE E INFRAESTRUCTURA.

78.

Con seguridad se harán viables las concesiones para tener mejores carreteras y

ferrocarriles y recuperar la navegabilidad de losríos. 79. Un propósito: recuperar la navegabilidad del Río Magdalena. Unir este proyecto a las opciones de puerto de Barranquilla, al mejoramiento del canal de acceso y a la recuperación de los puertos del río. La unión hará la fuerza para obtener los recurso s y lograr una concesión razonable. 80. Los puertos contaminantes no pueden seguir afectando la zona turística de Santa Marta. Para embarcar el carbón utilicemos correctivos de verdad, o el Ferrocarril de la Guajira o las opciones portuarias de Barranquilla. 81. El Canal del Dique hará parte del proyecto. Una primera fase debe definir la regulación de la entrada de agua en Calamar para garantizar el flujo suficiente y evitar el exceso que afecta la bahía de Cartagena. 82. Mantenimiento y nuevos desarrollos del puerto de Buenaventura. 83. Avanzar en el proyecto de puerto en el Pacífico del Chocó, Tribugá u otro. Concluir la carretera Condoto-Nuquí, con absoluto respeto de la ecología. 84. Trabajaremos en el sueño de la conexión del río Meta con la Hidrovía Suramericana. 85. Buscaremos un convenio con los productores de cemento y asfalto, con los centros de estudio, los ingenieros y los bancos, para emprender un masivo plan de pavimentos en las vías

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del agro. Continuaremos los proyectos viales en marcha y adicionaremos otros. Avanzaremos con la concesión ya otorgada en ferrocarriles y el estudio de nuevos proyectos. 86. Buscaremos convenios semejantes con otras naciones para adelantar distritos de riego que reclaman en el Tolima, Huila, Nariño, Atlántico, Cesar, Meta, Casanare y otros departamentos. Que el Estado no los construya pero que subsidie a los campesinos y productores. El subsidio debe ser de contado o a través de compromiso de pago de créditos. 87. Colombia debe participar en el plan energético Panamá-Puebla, para la cual es necesario interconectarnos con la Nación hermana. Debemos seguir en el desarrollo de nuestros recursos energéticos. Más conexión con Venezuela y Ecuador. Más proyectos hidroeléctricos y térmicos ajustados a la ecología. Debemos acelerar el ritmo de exploración en petróleo y gas. Debemos tasar con equilibrio las regalías para que estimulen las inversiones y beneficien a las regiones. La masificación del gas natural es una necesidad social, que obliga a conciliar muy cuidadosamente los intereses de inversionistas y consumidores. Esto es más importante que polarizar el debate entre precio controlado o libre, frente a lo cual encontraremos opciones equilibradas. 88. Buenas empresas como Isagen no se deben privatizar, entre otras razones, porque al necesitarse nuevos pro yectos de generación de energía, no hay la seguridad de que el mercado los realice. Sin embargo, este tipo de empresas estatales debe proceder con toda agilidad: tener la audacia de descubrir proyectos, elaborarlos, promocionarlos y venderlos total o parcialmente en el mercado.

IMPUESTOS Y REFORMA PENSIONAL.

89. En impuestos proponemos racionalizar las tarifas, dar períodos de ajuste e introducir severas sanciones penales a los evasores. Cuando se sale del País se pagan los impuestos y aquí no. La evasión no só lo es un problema fiscal sino de capital social, de insolidaridad en el comportamiento ciudadano. La progresividad del tributo no se debe medir tanto en el origen como en el destino social. La eliminación de la corrupción y la politiquería animará el pago de los contribuyentes. También lo hará la percepción de que sus impuestos resuelven necesidades sociales. Debemos eliminar las exenciones que no tengan relación con la recuperación de la economía y el empleo, y ofrecemos algunas específicas que apoyen esos propósitos. Cuando confluyen crisis de deuda, déficit, desempleo, miseria, desconfianza

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inversionista, y el Estado tiene severas limitaciones para financiar programas y otorgar subsidios, las exenciones son una herramienta necesaria. Pondremos atención pa ra que no ahonden el hueco fiscal. Confiamos que su impacto tonificará la economía e incrementará el recaudo de impuestos. Cualquier incremento impositivo no puede afectar la capacidad adquisitiva de los pobres. 90.

La reforma pensional debe eliminar privilegios. Reducir la pensión del Presidente,

congresistas, magistrados de las altas cortes. Poner topes o gravar excedentes. En las pensiones de base respetará derechos adquiridos, expectativas próximas y procederá con responsabilidad fiscal y corazón para introducir los cambios necesarios. Normas para que la esposa y los hijos del pensionado no queden abandonados. Queremos crear condiciones para que los fondos de pensiones puedan financiar actividades productivas, con la debida seguridad de las inversiones; si invierten en el mercado hipotecario que exista una garantía adicional. 91. En el diálogo directo con mis compatriotas he adquirido compromisos serios com cada región de la Patria. Desde Bogotá hasta el más humilde poblado. Que Bogotá pueda tener más parques, m ás pequeñas empresas, más renovación urbana, recursos para su red vial, Transmilenio por la séptima y la décima, por las franjas urbanas del Ferrocarril, de integración con Soacha. Examinaremos con las autoridades de la ciudad acuerdos en materia de peajes y sobre tasa a los combustibles.

RELACIONES INTERNACIONALES.

92.

Nuestra política internacional honrará la tradición colombiana de respeto a la

autodeterminación de los pueblos. Pero en el mundo moderno esa autodeterminación sólo es aceptable a través de la democracia. Tan rechazable es el terrorismo contra estatal como el para estatal. Toda nación que nos quiera ayudar a conseguir la paz debe hacerlo por conducto del Gobierno de Colombia. Que ninguna sea protectorado de nuestros delincuentes. La Comunidad And ina no necesita salvar la apariencia sino una férrea decisión política de recuperación. En las nuevas negociaciones de comercio haremos equipo con empresarios y trabajadores. Apoyamos los procesos de integración pero con cláusulas sociales de equidad para que el mundo no se divida más entre países beneficiarios y víctimas del libre comercio. 93. La comunidad internacional sabrá de toda nuestra determinación para realizar la política de orden público y total transparencia para rescatar los derechos humanos. Ninguna presión nos hará renunciar al derecho de los colombianos de recuperar la paz y la tranquilidad.

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94. Colombia ha sido cumplida con sus obligaciones financieras e incumplida con la deuda social. Construiremos prudentemente condiciones para honrar el pago de ambas. Haremos acuerdos con los organismos multilaterales sin sacrificar lo social. Ofreceremos derrotar la corrupción, la evasión, ajustar los tributos sin afectar la capacidad adquisitiva de los pobres y ahorrar con la eliminación del Estado Politiquero . En lugar de reducir los recursos de educación y salud, disminuyamos los gastos de la Presidencia, el Congreso, cerremos las embajadas y consulados innecesarios. 95.

Colombia no puede seguir expulsando a sus ciudadanos por negarles seguridad y

oportunidades. Haremos todos los esfuerzos para que los colombianos que viven en el extranjero sientan la solidaridad de su gobierno.

UN GOBIERNO SERIO, EFICAZ Y HONRADO. NO MILAGROSO.

96. Mi espíritu antioqueño y mi vocación campesina me han alimentado un infinito amor por todas las regiones de Colombia. 97. Ofrezco un Gobierno serio, eficaz, honrado, no milagroso. Temo a la demagogia y al populismo porque la frustración de las promesas electorales afecta la credibilidad democrática. 98.

Me haré moler para cumplirle a Colombia.

En mis manos no se defraudará la

democracia. Insistiré que el País necesita líneas estratégicas de continuidad; una coalición de largo plazo que las ejecute porque un Presidente en cuatro años no resuelve la totalidad de los complejos problemas nacionales. Pero avanzaremos. Por eso propongo un Gobierno de Unidad Nacional para rescatar la civilidad. He invitado al pueblo liberal, al cual pertenezco, que defiende el libre examen, la experimentación, la crítica y la solidaridad; a los conservadores, defensores del orden, necesario para todas las libertades sociales; a los independientes, con quienes compartimos el bello sueño de derrotar la politiquería y la corrupción; a los reinsertados, las negritudes y los indígenas, con quienes he tenido magníficas experien cias de ampliación de la inversión social y de consolidación del pluralismo. 99. Construyamos una Nación con 100% de tolerancia a la diversidad, a la idea ajena, pero con cero permisividad a la violencia, la corrupción y la politiquería. Una Nación con conciencia ética para que todos nos preocupemos de no hacer daño al prójimo con nuestro

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comportamiento. 100. Aspiro a ser Presidente sin vanidad de poder. La vida sabiamente la marchita com las dificultades y atentados. Miro a mis compatriotas hoy más con ojos de padre de familia que de político. Aspiro a ser Presidente para jugarme los años que Dios me depare en la tarea de ayudar a entregar una Nación mejor a quienes vienen detrás. No quiero morir con la vergüenza de no dar hasta la última lucha para que mi generación pueda tranquilamente esperar el juicio de la historia. Nota: El programa de gobierno ha sido construido en un proceso popular participativo. Se han realizado 30 talleres democráticos, que son ejercicios de planeación estratégica con la modalidad de meta - plan, con el propósito de construir visión de País al año 2010 y evaluar las expectativas de cada región en relación con la próxima administración presidencial; más de 60 seminarios cortos con temas especializados; y, 600 conversatorios en el año 2000 y m ás de 1.000 en el año 2001. Nota 2:Conserve este manifiesto. Si ganamos la Presidencia haga que lo cumplamos. Nota 3:Las ideas de los otros candidatos que sean útiles para mi patria, las recogeré y aplicaré, si puedo ser Presidente de Colombia.

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Anexo 3 - Discurso de Posse da Presidência da República de Álvaro Uribe Vélez (07/08/2002)106

RETOMEMOS EL LAZO UNIFICADOR DE LA LEY, LA AUTORIDAD DEMOCRÁTICA, LA LIBERTAD Y LA JUSTICIA SOCIAL POSESIÓN COMO PRESIDENTE DE LA REPÚBLICA Agosto 07 de 2002 (Bogotá D.C)

"No venimos a quejarnos, llegamos a trabajar" Compatriotas: La vida de dos seres, disímiles en talante, formación y destino, alimentan el origen de la República. Uno, el voluntarioso y rebelde caraqueño, aristócrata mantuano, criado por la ternura de la negra Hipólita, luego educado por el librepensador Simón Rodríguez bajo los principios rousseaunianos de la libertad individual y la autodisciplina y quien, entrenado como cadete, vendrá muy joven a poner su brazo y su espada bajo las órdenes del pueblo insumiso de Cartagena de Indias. El otro, de Villa del Rosario de San José de Cúcuta en la Provincia de Pamplona, alumno aplicado y precoz, enviado al Colegio Seminario de San Bartolomé para ser moldeado por la rigidez de los jesuitas, formado por éstos en los arduos ejercicios de la jurisprudencia, se sumará luego, aún adolescente, al pueblo santafereño en su lucha por la independencia. Bolívar y Santander prefiguran nuestra identidad política como Nación. El primero encarna la idea de orden y autoridad. El orden como presupuesto ineludible de la libertad, la autoridad que hace posible la igualdad de oportunidades. El segundo representa el imperio de la ley que garantiza la seguridad y las libertades. El orden para la libertad mediante la autoridad democrática de la ley: ¡eh allí el binomio ético-político que sostiene la continuidad histórica de nuestra Nación y otorga sentido a nuestra institucionalidad! Bolívar entendió el orden como principio de unidad y de justicia social. Supo obtener el apoyo de los sectores populares de Venezuela, quienes, al separarse de la dominación, 106

COLOMBIA. Presidencia de la República. Posesión como Presidente de la República. Disponível em: http://www.presidencia.gov.co. Acesso em 13/12/2012.

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hicieron posible la independencia. Los indígenas del Alto Perú avizoraron en el orden Bolivariano el faro de sus reivindicaciones sociales; en la espada libertadora, que escribió la Constitución sin privilegios para Bolivia, reconocieron el símbolo de la autoridad al servicio de las garantías populares. Para reposo del Libertador recuperemos el orden, que unifique esta Nueva Granada disgregada hoy en repúblicas de facto de organizaciones violentas. Santander concibió la paz, y la concordia que es el estado del alma para que la paz sea permanente, bajo el exclusivo reinado de la ley. Prefirió la ley a la guerra cuando le solicitaban más tropas para la campaña libertadora del Sur del Continente. Honró la ley con su obediencia a la autoridad aún al costo de su degradación de comandante militar en los Llanos. Que el Hombre de las Leyes nos inspire una Nación de obediencia a las normas para cancelar la esclavitud de la violencia. Ante el juramento que acabo de prestar, que compromete mis energías y la totalidad del ciclo vital que El Creador me depare, convoco a los colombianos y colombianas a retomar el lazo unificador de la ley, la autoridad democrática, la libertad y la justicia social, extraviado en momentos desapacibles de la historia. En nuestra Nación han descendido la confianza y la solidaridad. Cada uno desconfía del vecino y en especial del Estado. Decrece la actitud solidaria y hay desproporcionado apego al interés propio e indeferencia por la suerte de la comunidad. Lo anterior, señalado como un decaimiento del capital social, no surge de la naturaleza del ser colombiano, que es cívica y humanitaria; su razón de ser la explica la violencia destructora, la politiquería y la corrupción, que concurren a la incertidumbre, la miseria y la desigualdad. La Patria confronta un cuadro serio de dificultades. En la miseria viven 9 millones de ciudadanos, el 57 por ciento se ubica en la línea de pobreza, además del 16 por ciento de desempleo hay 6.5 millones de subempleados, el déficit total supera el 3 por ciento del Producto Interno Bruto, la capacidad de pago de la deuda pública está saturada. Si tuviéramos la tasa de homicidios de Inglaterra habría 200 cada año. Uno es muy grave, 200 también, pero padecemos 34.000. Entre 3.000 y 3.600 secuestros que se denuncian, constituyen el 60 por ciento de este delito en el mundo. Cada secuestro es sufrimiento, fuga de capitales y desempleo. No venimos a quejarnos, llegamos a trabajar. En 4 años será imposible resolverlo todo, pero no ahorraremos esfuerzo. Este es mi deber frente al derecho de los jóvenes y de quienes habrán de venir. Es mi obligación de honor con el 80 por ciento de nuestros compatriotas que vive aún en el despertar de su juventud y requiere que acertemos para que brote su ilusión. Tenemos que hacerlo bien para que se restablezca la fe de un pueblo que jamás ha rendido la cabeza pero que reclama firmeza en el timonel para interrumpir el triste discurrir de la miseria y el atentado criminal. El ajuste fiscal para enderezar las finanzas públicas es ineludible pero se adelantará en procura de un mayor crecimiento de la economía y el empleo. El crecimiento es el mejor ajuste fiscal y la única fuente perdurable de ingresos del Estado. Los más pudientes, los empresarios que con tenacidad sirven bien a Colombia, llevarán sobre sus hombros nuevas

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responsabilidades tributarias. Los esfuerzos de los sectores medios y populares deben retribuirse en mayor inversión social para frenar la renovación de su prolongado purgatorio. El momento excepcionalmente delicado de la economía exige impulsar a los sectores productivos generadores de empleo. Los países desarrollados en coyunturas difíciles no discuten los estímulos, con agilidad los diseñan y ponen en marcha. La globalización como integración de la economía es irreversible, pero la dignidad de los pueblos pobres hace imperativo que sus resultados sociales sean equitativos. De lo contrario, su sostenibilidad política traería inmensos costos para la democracia y la convivencia. La economía andina requiere más voluntad y resultados. Resulta equivocado considerar que con trabas comerciales dentro de la Región, alguno de nuestros países pueda acelerar el crecimiento. Al interior de la Comunidad la mejor protección es la mayor integración. Miremos juntos a MERCOSUR, la Unión Europea, Canadá, el ALCA. Avancemos hacía la armonía en tasa de cambio competitiva, baja inflación, endeudamiento prudente y equilibrio fiscal. A partir de allí, pensemos en una moneda única, nuestra, que podamos orientar. Tengamos con nuestros vecinos fronteras abiertas y cerradas. Abiertas para el tránsito de artículos y personas de bien, cerradas para la delincuencia. Nuestros esfuerzos de autoridad velarán para que la droga y la violencia no se trasladen al territorio fronterizo. Con la ayuda del Gobierno del respectivo País hermano lo lograremos, para tranquilidad de Colombia y de todos, porque este conflicto o se para o tiene el potencial de desestabilizar la Región. Durante la transición hablé con los directivos de los bancos multilaterales para que aumenten su exposición en Colombia. Lo necesitamos y a tiempo, si lo canalizamos debidamente mantendremos el cumplimiento en nuestras obligaciones financieras y mejoraremos en la impagada deuda social. La aceptación popular a nuestro Estado dependerá en muy buena parte de los resultados sociales. En medio de la escasez crítica de recursos impulsaremos las 7 herramientas de construcción de equidad expuestas en el Manifiesto: la revolución educativa, la ampliación de la seguridad social, el impulso a la economía solidaria, el manejo social del campo, de los servicios públicos, el apoyo a la pequeña y mediana empresa para tener un País de propietarios y la calidad de vida urbana. La estabilidad económica dependerá del crecimiento y este conservará su trayectoria de largo plazo si se funda en la cohesión social. No es posible estabilidad económica sin estabilidad social. Nuestro Estado es gigante en lo burocrático, ineficaz frente a la corrupción que maltrata las costumbres políticas y peligrosamente pequeño en inversión social. El Estado tiene que ser promotor del desarrollo, garante de la equidad social y dispensador del orden público. No puede ser obstructor de la iniciativa privada, ni estar ausente frente a los reclamos sociales. Nuestro Estado Comunitario buscará que los recursos y las acciones lleguen al pueblo, con transparencia, mediante creciente participación popular en la ejecución y vigilancia de las tareas públicas. La promoción de esa participación, será el mejor instrumento para la derrota de la corrupción.

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El Estado no puede exigir austeridad a los pequeños municipios a tiempo que las altas esferas dilapidan recursos. Para dar ejemplo, las reformas deben empezar por la Presidencia de la República y el Congreso, en pensiones, salarios, eliminación de prebendas y tamaño de nóminas y de la representación. La revolución de las comunicaciones facilita un Congreso reducido en cantidad y costos, mezcla equilibrada de la representación y la participación, más integrado con la ciudadanía y más eficaz en sus tareas. La independencia frente al Ejecutivo no requiere un Parlamento de gran tamaño sino que la opinión lo observe y controle. Esta tarde quedará radicado el proyecto de ley para convocar el Referendo contra la corrupción y la politiquería. Será luz de austeridad para trasladar recursos a la revolución de las oportunidades que empieza con la educación. No podemos luchar contra el clientelismo si practicamos el clientelismo. Los gerentes y directores de las sucursales de entidades nacionales en las regiones, serán nombrados por concursos de méritos, para que el pueblo participe en un evento inaugural de la igualdad frente a la administración. Son necesarias la derrota de la politiquería y la racionalidad de los costos laborales para salvar la existencia de empresas estatales. Nuestro concepto de Seguridad Democrática demanda aplicarnos a buscar la protección eficaz de los ciudadanos con independencia de su credo político o nivel de riqueza. La Nación entera clama por reposo y seguridad. Ningún crimen puede tener directa o ladina justificación. Que ningún secuestro halle doctrina política que lo explique. Comprendo el dolor de las madres, de los huérfanos y desplazados de la Patria, en su nombre revisaré mi alma cada madrugada para que las acciones de autoridad que emprenda tengan la más pura intención y el más noble desarrollo. Apoyaré con afecto a las Fuerzas Armadas de la Nación y estimularemos que millones de ciudadanos concurran a asistirlas. Ello aumenta nuestra obligación con los derechos humanos, cuyo respeto es lo único que conduce a encontrar la seguridad y por su conducto la reconciliación. Cuando un Estado democrático es eficaz en sus garantías, así los logros sean progresivos, la violencia en su contra es terrorismo. No aceptamos la violencia para combatir el Gobierno ni para defenderlo. Ambas son terrorismo. La fuerza legítima del Estado cumple la exclusiva misión de defender a la comunidad y no puede utilizarse para acallar a los críticos. La democracia es el único camino para la emulación de las ideas. La democracia es nuestra oferta para que los fusiles sean sustituidos por la política y la Seguridad Democrática el instrumento para que se haga política sin armas y con el derecho de no ser asesinado. La defensa de los alcaldes, concejales, gobernadores y cuantos representantes del pueblo sean amenazados será salvaguardia de la democracia. No permitiremos que la centenaria lucha popular por el derecho a elegir la más próxima autoridad sea truncada por la presión de las armas. He solicitado al Secretario General de las Naciones Unidas, señor Kofi Annan, los buenos oficios de la institución para buscar el diálogo útil a partir de un alivio para la sociedad que debe ser el cese de hostilidades. En este marco exploraremos soluciones humanitarias, que liberen secuestrados, que se den a partir de acuerdos que vislumbren la paz definitiva como

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algo posible. Quienes quieran disfrutar la libertad, que permitan que el pueblo disfrute la tranquilidad. He pedido a los medios de comunicación y a la opinión comprender la prudencia que el tema demanda. El mundo debe entender que este conflicto necesita soluciones no convencionales, transparentes, imaginativas. La violencia se financia con un negocio criminal internacional: la droga; se lleva a cabo con armas fabricadas fuera de Colombia; y, democracia alguna puede permanecer indiferente a los sufrimientos de nuestro pueblo. Continuaremos con el Plan Colombia con la adición de la interdicción aérea y programas prácticos de sustitución como el pago a campesinos para erradicar cultivos ilícitos y cuidar la recuperación del bosque tropical. Mantendremos la senda recorrida con los Estados Unidos, tocaremos las puertas de Europa y Asia y afianzaremos la unidad de propósitos con los vecinos. Si no derrotamos la droga, la droga destruye nuestra libertad, nuestra ecología y anula la ilusión de vivir en paz. Queremos la paz, no el apaciguamiento que se origina en el diálogo insincero, en el acuerdo claudicante o en la tiranía oficial. El apaciguamiento no reconcilia, suspende por momentos la violencia y la reaparece con superior intensidad. Recibo la Presidencia de manos del doctor Andrés Pastrana quien concluye una tarea decorosa, alimentada por infinita buena fe y exitosa en la integración de Colombia al mundo entero, con el ATPA como promisorio logro final para las exportaciones y del empleo. Ha jurado como Vicepresidente, Francisco Santos Calderón, jalonado por el aliento patriótico de los suyos, en especial de su Padre. He prometido cumplir la Constitución y las leyes ante el Presidente del Congreso, ciudadano probo, administrador eficiente y hombre de Estado. Este juramento reviste la circunstancia especial de que en la tierra de ambos la palabra dada es escritura otorgada. Provengo de una montaña que me enseñó a quererla a ella para querer intensamente a Colombia toda. Los míos del cielo, agricultores casi todos, me emplazan como vigías de la Patria. Desde allá me acompañan mi madre con su bondad y mi padre con su energía, para cumplir este deber con afecto, con superior afecto por mis conciudadanos. La esposa y dos estudiantes integran mi dulce retaguardia. Empecemos un Gobierno honrado, eficaz, austero, no milagroso, con el trabajo como emblema. El presupuesto es escaso, muchos los problemas, pero la alegre espontaneidad de los colombianos, intacta no obstante los padecimientos, y su carácter, acerado en el yunque de las dificultades, constituyen invaluable recurso. Soy consciente del tamaño de mi responsabilidad, pero también se que no la podré llevar acertadamente sin la compañía, la crítica constructiva, el esfuerzo y el consejo de ustedes, mis compatriotas. Con tolerancia a la idea ajena y cero permisividad al crimen, girando contra el banco de la autoridad que no estará en bancarrota, mejoremos el presente y ganemos el porvenir para que prime el fraterno debate creativo. Que el amor por esta Patria sea la llama a través de la cual Nuestro Señor y la Santísima Virgen me iluminen para acertar; también para superar la humana vanidad y rectificar cuando incurra en el error.

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Aspiro, dentro de 4 años poder mirar a los ojos de ustedes, mis compatriotas. Muchas gracias.

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Anexo 4 - Discurso de Posse da Presidência da República de Juan Manuel Santos Calderón (07/08/2010)107 ¡Le llegó la hora a Colombia! Bogotá, 7 ago (SIG).- El siguiente es el discurso del presidente Juan Manuel Santos Calderón, al asumir como Jefe del Estado en ceremonia realizada en la Plaza de Bolívar de Bogotá. "¡Gracias a Dios! ¡Gracias Colombia! Nuestro país es una maravillosa combinación de culturas, de razas, de talentos, de riquezas naturales, que nos hace únicos en el planeta. Como un reconocimiento a esta diversidad cultural y étnica, esta mañana acudí, con mi familia, al gran templo ceremonial de Seiyua, en la Sierra Nevada de Santa Marta. Allí nos reunimos con líderes y representantes de los pueblos Kogi, Arhuaco, Wiwa y Kankuamo, herederos de la milenaria cultura Tayrona. Ellos nos antecedieron en la posesión de estas tierras, y aún hoy velan desde sus resguardos por el equilibrio que debe regir nuestra nación y nuestra relación con el universo. En un acto simbólico, pero con trascendental significado, los “mamas” me entregaron un bastón de mando y un collar con cuatro piedras. Una representa la tierra que debemos cuidar. Otra representa el agua que es la fuente de la vida. Otra representa la naturaleza con la que debemos estar en armonía. La cuarta representa el gobierno, que debe respetar el orden de la naturaleza y la voluntad del Creador. Tierra, agua, naturaleza y buen gobierno –esos símbolos preciados – harán parte integral de la administración que hoy comenzamos. El mensaje de nuestros “hermanos mayores”, porque lo son, de los guardianes del equilibrio universal, hoy lo transmito, emocionado, a los más de 45 millones de compatriotas que venimos de esa herencia indígena, del legado de España, del rico aporte africano, y de tantas otras vertientes que han construido lo que somos. Es el mensaje de la vida, de la armonía, y de la unidad dentro de la diversidad. Es el mensaje de la Colombia pacífica y sabia que queremos dejar a nuestros hijos. Haciendo honor a ese mensaje, hoy reitero solemnemente, en esta histórica Plaza de Bolívar, que presidiré un Gobierno que será de Unidad Nacional y que buscará la prosperidad social para todos los colombianos. Hace doscientos años, en esta misma plaza, un puñado de neogranadinos dio los primeros pasos en nuestro camino hacia la independencia. Somos la generación del Bicentenario: una generación con sentido del pasado y con vocación 107

COLOMBIA. Presidencia de la República. Discurso del Presidente Juan Manuel Santos Calderón. Disponível em: http://www.presidencia.gov.co. Acesso em 29/01/2013.

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de futuro. Al asumir el cargo de Presidente de la República de Colombia, el más alto honor pero también la mayor responsabilidad que otorga la Patria, siento que nos miran desde la historia nuestros padres Bolívar, Santander, Nariño y todos los hombres y mujeres que lucharon por darnos la Libertad. Si ellos regresaran, verían con regocijo y con asombro cuánto hemos crecido en este país; cuánto se ha multiplicado; cuánto se ha transformado. Pero también sentirían desilusión, porque doscientos años después no hemos alcanzado la justicia social ni consolidado la paz, soportes de la verdadera libertad, esa libertad por la que ellos vivieron y murieron. Si queremos lograr el pleno desarrollo económico y social, tenemos que construir unidad entre nosotros, los herederos de la gesta libertaria. En el bicentenario de nuestra Independencia es más oportuno que nunca que los colombianos nos decidamos por la unión y no por la confrontación. Un gobierno de Unidad Nacional, como el que propongo, lo que plantea no es una repartición burocrática sino una gran alianza para consolidar la Colombia que todos soñamos. El llamado que he hecho a la unidad nacional supone dejar atrás confrontaciones estériles, pendencias desprovistas de contenido, y superar los odios sin sentido entre ciudadanos de una misma Nación. Implica convocar las mejores inteligencias y las mejores voluntades para construir entre todos un mejor país. Significa alcanzar un gran acuerdo sobre lo fundamental, como decía Álvaro Gómez Hurtado, ese gran líder asesinado por las fuerzas oscuras que tanto daño le han hecho a nuestra patria y que nosotros estamos empeñados en acabar. Un acuerdo en torno a la necesidad de tener una democracia vigorosa; una economía estable y próspera; una patria justa en lo económico y lo social; una Nación segura y en paz. Lo dije el 20 de junio, y lo repito hoy ante mis compatriotas: ¡Soy y seré el Presidente de la Unidad Nacional! Pero que quede claro: no quiero un país sin partidos ni sin controversias ideológicas. Colombia necesita partidos sólidos, serios y de vocación permanente, con posiciones diferentes sobre la sociedad y sobre el Estado. En su célebre discurso en el Teatro Patria, como Presidente electo de Colombia, Alberto Lleras Camargo –quien fuera el primer Secretario General de la OEA– advirtió que “una sociedad civil sin partidos no existe, ni puede operar una democracia sin ellos”. Tampoco puede operar una democracia verdadera sin una prensa libre –con la cual he estado comprometido toda mi vida–, sin una oposición seria, o sin el equilibrio de los contrapesos del poder. ¡Esa es la democracia que defendemos! En nuestro tiempo, el concepto de la Libertad tiene su razón de ser y su plena expresión si

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está ligado a la dimensión de la justicia y a la magnitud del bienestar social. Por ello propuse a los colombianos durante mi campaña –y ellos me respondieron con una votación tan abrumadora que me enaltece y me compromete– que Colombia tenía que dar el paso hacia la Prosperidad Democrática. Llegó la hora de que los bienes naturales que nos fueron otorgados con tanta abundancia y que los colombianos hemos multiplicado con ingenio y sabiduría, no sean el privilegio de unos pocos sino que estén al alcance de muchas manos. De eso se trata en esencia la Prosperidad Democrática. De una casa digna, de un empleo estable con salario y prestaciones justas, de acceso a la educación y a la salud. De un bienestar básico, con tranquilidad económica, en cada familia colombiana. Sólo así, si ningún colombiano se levanta en la mañana con la incertidumbre de su sustento diario, sólo así será posible la existencia de una sociedad con fuerza colectiva, capaz de soñar un futuro común. Si superamos el desafío de la pobreza, el potencial intelectual y económico de Colombia despegará como una fuerza incontenible. Por ello reitero hoy, ante la estatua vigilante del Libertador, que a los pobres no los vamos a defraudar. ¡A los pobres no les fallaremos! Trabajaremos para disminuir la pobreza con la misma intensidad y con el mismo compromiso con que combatimos –y seguiremos combatiendo– el terrorismo y otros enemigos de Colombia. Hoy hablo a los más de dos millones y medio de compatriotas que están en situación de desempleo, y a sus familias. Cuando dije en mi campaña que el mío sería el gobierno del Trabajo, Trabajo y más Trabajo, ¡no eran palabras vanas! Nuestra meta es bajar el desempleo a un dígito, así como apoyar el emprendimiento para que surjan más empresas rentables, más empresas generadoras de trabajo. Con la creación del Ministerio de Trabajo y Desarrollo Laboral; con políticas de choque para la generación inmediata de trabajo; con leyes como la de Primer Empleo –una propuesta del Partido Liberal para dar incentivos a quienes contraten a los jóvenes que ingresan al mercado laboral–, y con el tren de nuestra economía avanzando a toda marcha, cumpliremos nuestra promesa. Y en esto quiero ser enfático: la prioridad, la obsesión de mi Gobierno, será la generación de prosperidad social a través de la creación de trabajo. Me comprometo con los que nada tienen y con los que se han cansado de esperar. Todos nuestros esfuerzos, todos nuestros desvelos, hasta el último minuto de cada día, irán destinados a combatir la pobreza y el desempleo, ¡que no tienen por qué ser condiciones eternas para los colombianos!

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Hablo también a los niños y jóvenes de Colombia: Nuestro empeño será proporcionarles a todos – sin excepción, y desde la primera infancia – una nutrición y una educación de calidad en todas sus etapas, que les permita crecer como seres humanos integrales. Queremos que cada estudiante tenga acceso a un computador personal y una formación bilingüe. Pondremos en práctica un amplio programa de becas-crédito para que la falta de recursos deje de ser razón para que los bachilleres no ingresen a la educación técnica o universitaria. Impulsaremos la integración y la colaboración de las universidades con las empresas para que se imparta una educación pertinente que contribuya al desarrollo y al empleo. Reformaremos el sistema general de regalías para que –entre otras cosas– el diez por ciento de ellas se destinen en todo el país a la ciencia y la tecnología. ¡Todo con el fin de que ustedes, niños y jóvenes de Colombia, sean protagonistas activos en la sociedad global del siglo XXI! A nuestros niños les debemos también la obligación de velar, con responsabilidad, por la preservación de nuestro medio ambiente y por el futuro de nuestro planeta. Somos una de las naciones con mayor diversidad biológica del mundo, y con mayor riqueza hídrica, y estamos llamados a conservarlas para bien nuestro y de la humanidad. Crearemos el Ministerio de Medio Ambiente y Desarrollo Sostenible, y la Agencia Nacional de Aguas, para garantizar una mayor protección del agua y de nuestros recursos naturales. Como dijo un sabio naturalista, “el mundo no es una herencia de nuestros padres, sino un préstamo de nuestros hijos”. Por eso trabajaremos por el medio ambiente, para pagar esa deuda impostergable a las nuevas generaciones. A las familias de Colombia; a las que lidian cada día con los problemas de salud, con los pagos de arriendos o hipotecas, con los desafíos de la vida cotidiana, quiero enviarles un mensaje de esperanza: Trabajaremos para que tengan una salud de calidad, por su derecho a una vivienda digna, para que puedan caminar por sus calles sin temer por su seguridad. El gobierno del presidente Uribe realizó un gran esfuerzo para aumentar la cobertura de salud, pero aún nos falta mucho por hacer. Adelantaremos una reforma de fondo que – partiendo de la creación del nuevo Ministerio de Salud– haga énfasis en la prevención, unifique el Plan Obligatorio de Salud para todos los regímenes, y promueva el buen gobierno en el sector. Otra prioridad de mi gobierno será hacer posible el sueño de cada colombiano de tener una vivienda digna para su familia. Nos fijamos la meta de duplicar los subsidios y de construir al menos un millón de viviendas nuevas el próximo cuatrienio; viviendas dignas que respeten la condición humana de sus habitantes.

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Desde el nuevo Ministerio de Vivienda y Desarrollo Urbano articularemos las políticas para que todos los colombianos puedan decir que salen de su trabajo – ¡porque tienen trabajo! – y que van para su casa. Y que cuando digan “su casa”, ¡es porque es propia! Vamos a meterle el hombro a nuestras ciudades, para mejorar su seguridad y su movilidad, y para cerrar las brechas sociales y de oportunidades entre sus habitantes. Pondremos en marcha una estrategia integral de seguridad ciudadana para que los centros urbanos sean espacios sociales, de convivencia, donde los niños, las mujeres, los ancianos, puedan jugar, caminar y vivir tranquilos, ¡sin temor ni zozobra! Y quiero que me escuchen en los campos –en las montañas, en las llanuras, las selvas, en las costas de nuestra tierra– los campesinos de Colombia. Vamos a defender al campesino colombiano, vamos a convertirlo en empresario, a apoyarlo con tecnología y créditos, para hacer de cada campesino un próspero Juan Valdez. Porque ese campesino es la persona capaz de alimentar a Colombia y de ayudar a sustentar a un mundo ávido de alimentos. Colombia puede ser una despensa productiva para el planeta, y trabajaremos con empeño para que así sea. También vamos a trabajar para que los campesinos sean dueños de las tierras más productivas de Colombia y para que las exploten. Los fenómenos del narcotráfico, del terrorismo, de la violencia, que ha sufrido nuestro país, hicieron que buena parte de las mejores tierras terminaran en manos de agentes de la violencia. ¡Eso lo vamos a reversar! Presentaremos al Congreso un proyecto de Ley de Tierras, y aceleraremos los mecanismos de extinción de dominio, para que las tierras que el Estado les ha incautado a los criminales, y las que les vamos a incautar, regresen a las manos campesinas, a los que de verdad las trabajan con vocación y con sudor. Con campos más seguros, promoveremos el retorno a sus parcelas –como ya se viene cumpliendo, con acompañamiento integral del Estado– de los desplazados y de las víctimas de la violencia. Ante todo, los vamos a capacitar y los vamos a apoyar para que recuperen su vida productiva, en sus tierras de origen o donde se encuentren hoy en día. Por supuesto, para lograr todos estos avances sociales, se requiere de una economía sana y próspera. La economía de nuestro país tiene que crecer cada vez más, porque las expectativas y necesidades de nuestro pueblo crecen igualmente cada día. Juntos, gobierno y sector privado, empresarios y trabajadores, vamos a impulsar las cinco locomotoras que harán despegar nuestra economía, con un destino cierto: el de la paz y la prosperidad; el de la paz y la creación de empleo. Con el campo, la infraestructura, la vivienda, la minería y la innovación pondremos en marcha

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el tren del progreso y la prosperidad, para que jalone los vagones de la industria, del comercio y los servicios, que son los mayores generadores de empleo. Para superar un rezago de décadas, seremos contundentes en la planeación y ejecución de las grandes obras de infraestructura que necesita el país, y exigiremos pulcritud y cumplimiento en su contratación y desarrollo. Manejaremos las finanzas públicas con responsabilidad fiscal y con responsabilidad monetaria, no sólo para el presente, sino pensando en las futuras generaciones. Siguiendo una adecuada regla fiscal, vamos a ahorrar los recursos de tiempos de bonanza para poder manejar con solvencia los tiempos de crisis. Y quiero que escuchen los inversionistas de nuestro país y del mundo: Aquí en Colombia siempre encontrarán confianza y tierra amiga. Soy un convencido de la necesidad de la inversión para generar desarrollo y empleo, y por eso mi administración –siguiendo los lineamientos de confianza inversionista del gobierno del presidente Uribe– será amigable hacia la inversión, con reglas claras y estables. Hablo ahora a las regiones y a las minorías de nuestro país. En nuestro gobierno avanzaremos hacia una descentralización efectiva, que respete la autonomía regional y la diversidad que enriquece nuestra Nación. Presentaremos al Congreso la reforma al régimen de regalías y crearemos, doctor (Armando) Benedetti (Presidente del Congreso) el Fondo de Compensación Regional para cerrar la brecha de desarrollo entre las regiones de la periferia y el centro del país. Un gran reto del nuevo Congreso será la aprobación, por fin, de la Ley de Ordenamiento Territorial que impulse la descentralización y desarrolle los derechos de las minorías étnicas consagradas en la Carta del 91. Las regiones que estableció la Constitución para promover el desarrollo económico y social, van a ser una realidad. En medio de la voluntad y el tesón de más de 45 millones de buenos colombianos, subsiste, sin embargo, una ínfima minoría que persiste en el terrorismo y el narcotráfico, en obstruir nuestro camino hacia la prosperidad. A todas las organizaciones legales las defenderemos y a las ilegales las seguiremos combatiendo sin tregua ni cuartel. No descansaremos hasta que impere plenamente el Estado de derecho en todos y cada uno de los corregimientos de nuestra patria. Con la consolidación de la seguridad democrática hemos avanzado en esta dirección como nunca antes, pero falta camino por recorrer. Llegar a este final seguirá siendo prioridad, y desde ya le pido a la nueva cúpula de nuestras Fuerzas Armadas que continúe dando resultados y produciendo avances contundentes. Al mismo tiempo quiero reiterar lo que he dicho en el pasado: La puerta del diálogo no está cerrada con llave. Yo aspiro, durante mi gobierno, a sembrar las bases de una verdadera reconciliación entre los

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colombianos. De un desarme real de los espíritus, construido sobre cimientos perdurables que no alimenten falsas esperanzas, que no permitan más engaños y que no conduzcan a nuevas frustraciones en un país que, desde lo más profundo de su alma ensangrentada, lo que más desea es la paz. Tenemos que asimilar la lección del pasado y aprender de los errores cometidos en esta brega por superar una confrontación que hace demasiado tiempo nos desgarra. Es cierto que quienes no aprenden de la historia están condenados a repetirla. Pero el pueblo colombiano ha asimilado muy a fondo la suya. Y por eso expresa, todos los días y en todas las formas, su rechazo a quienes persisten en una violencia insensata y fratricida. A los grupos armados ilegales que invocan razones políticas y hoy hablan otra vez de diálogo y negociación, les digo que mi gobierno estará abierto a cualquier conversación que busque la erradicación de la violencia, y la construcción de una sociedad más próspera, equitativa y justa. Eso sí –insisto– sobre premisas inalterables: la renuncia a las armas, al secuestro, al narcotráfico, a la extorsión, a la intimidación. No es la exigencia caprichosa de un gobernante de turno. ¡Es el clamor de una Nación! Pero mientras no liberen a los secuestrados, mientras sigan cometiendo actos terroristas, mientras no devuelvan a los niños reclutados a la fuerza, mientras sigan minando y contaminando los campos colombianos, seguiremos enfrentando a todos los violentos, sin excepción, con todo lo que esté a nuestro alcance. ¡Y ustedes, los que me escuchan, saben que somos eficaces! Lo he dicho, y lo repito: Es posible tener una Colombia en paz, una Colombia sin guerrilla, ¡y lo vamos a demostrar! Por la razón o por la fuerza. Sea el momento –en esta plaza que vio nacer nuestra libertad– para hacer un homenaje, el más justo de todos, a nuestras Fuerzas Armadas. Mi saludo de gratitud a nuestros soldados, infantes de marina y policías que ahora mismo, hoy ¡ahora mismo!, arriesgan sus vidas por proteger las de todos los colombianos, así quienes me antecedieron y sucedieron en el Ministerio de Defensa. ¡Gloria y honor a las Fuerzas Armadas de Colombia! Como su comandante supremo, trabajaré con las Fuerzas Armadas, y por las Fuerzas Armadas, para acabar de consolidar la seguridad y la tranquilidad en todo el territorio nacional. Quiero rendir también un tributo especial, un homenaje desde el fondo de mi corazón, a un hombre que brillará en la historia como aquel que devolvió a los colombianos la esperanza en el mañana y la posibilidad de recorrer sin miedo nuestro hermoso país: el presidente Álvaro

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Uribe Vélez. Las próximas generaciones de colombianos mirarán hacia atrás y descubrirán, con admiración, que fue el liderazgo del presidente Uribe, un colombiano genial e irrepetible, el que sentó las bases del país próspero y en paz que vivirán. Recordarán también que a su lado, como soporte de su afecto y de su hogar, estuvo una mujer excepcional, ejemplo de lucidez, de sencillez y calidad humana, que trabajó con dedicación y discreción por las causas más justas: doña Lina Moreno de Uribe. ¡Gracias, gracias, mil veces gracias, presidente Uribe, a usted y su familia, por dejarnos un país donde es posible hablar de progreso, de prosperidad, donde es posible hablar de futuro y es posible hablar de paz! Hoy recibo ese legado con humildad y respeto, y proclamo que lucharé por consolidar y acrecentar su inmensa obra de gobierno. No retrocederemos ni un paso en el sendero recorrido y, tal como lo prometí en mi campaña, avanzaremos desde la seguridad democrática hacia la Prosperidad Democrática. Porque si este país, en estos dos siglos, ha alcanzado tantos logros de desarrollo en medio del asedio de los violentos, ¡ya verá el mundo de lo que somos capaces los colombianos cuando consolidemos la paz! Como en todas las naciones y sociedades, existe en Colombia otro sector tan ambicioso como despiadado que asecha y ataca desde las sombras. Se trata del flagelo de la corrupción. Por eso, así como a los jefes terroristas los convertimos en objetivos de alto valor para localizarlos y neutralizarlos, vamos a perseguir y combatir a los corruptos que se roban los recursos de los colombianos. Combatiremos con igual decisión la corrupción oficial o la privada, y la relación de vasos comunicantes entre ambas. Para ser más eficaces en este esfuerzo, presentaremos al Congreso un estatuto integral de lucha contra la corrupción, que consolide, coordine y fortalezca la acción preventiva y punitiva del Estado contra los corruptos. También nos proponemos adherir a la Convención Anti-Soborno de la Organización para la Cooperación y el Desarrollo Económico –una asociación de países comprometidos con la responsabilidad económica y las buenas prácticas, a la que aspiramos ingresar– como un paso trascendental en nuestro compromiso contra la corrupción. Y que quede muy claro: Si alguien en su interior abriga la oscura intención de lucrarse con los bienes públicos, le advierto desde ahora que no trate de hacer parte del gobierno que hoy comienza. He dicho que aplicaré en mi administración los postulados del buen gobierno, y así lo haré. Los principios de eficiencia, eficacia, de transparencia, de rendición de cuentas van a presidir las actuaciones del Gobierno Nacional. ¡Vamos a gobernar en una urna de cristal! Ser servidor público será sinónimo de compromiso con el bien general, una tarea que

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convoque a los mejores ciudadanos, y a los más éticos, a trabajar por su país. Habrá pudor en el manejo de lo público, porque esa es una condición esencial del buen gobierno. Como demócrata integral, creo y defenderé siempre la independencia de la Justicia en Colombia, condición esencial de la separación de poderes, que es el alma de la democracia moderna. Por eso hoy reitero mi invitación a las Altas Cortes para que trabajemos en completa armonía, buscando una justicia pronta y eficaz para todos los colombianos, y combatiendo la impunidad, que es uno de los grandes desafíos de nuestro tiempo. El próximo lunes me reuniré con los magistrados para cimentar esta relación armónica, fundamental para el buen desarrollo del Estado. Restableceremos el Ministerio de Justicia como un Ministerio de Justicia y de los Derechos que articule una política de Estado para fortalecer la justicia y proteger los derechos fundamentales. Será un ministerio que no sólo tendrá interlocución con el Poder Judicial sino que liderará la estrategia jurídica del Estado, preservará la coherencia legislativa y velará por la formación de los abogados. Un ministerio, más que respetuoso, garante de la independencia judicial. Concertaremos con las Cortes, y luego impulsaremos en el Congreso, una reforma a la Justicia que afirme la fe de los colombianos en su sistema judicial, que nos brinde seguridad jurídica, y que complemente el acento que puso la Carta del 91 en la justicia y los derechos. Como lo ha dicho quien fuera mi profesor en dos oportunidades, el premio nobel Amartya Sen, una reforma moderna de justicia implica enfrentar desde la política la injusticia diaria de la vida real. Colombia está llamada a jugar un papel muy relevante en los nuevos espacios globales, y aspiramos asumir –después de 40 años de estar a la defensiva– el liderazgo que nos corresponde en los escenarios internacionales. Hay que saberse globalizar y no sólo dejarse globalizar. Para ello pondremos en marcha una política exterior moderna que mire hacia el futuro, con contingentes de diplomáticos que multipliquen la presencia de Colombia en los organismos multilaterales y profundicen las relaciones bilaterales. El respeto, la cooperación y la diplomacia serán los ejes de nuestras relaciones internacionales. Queremos vivir en paz con todos nuestros vecinos. Los respetaremos para que nos respeten. Entendemos que sobre las diferencias ideológicas se impone el destino compartido de hermanos de historia y de sangre; que nos unen propósitos comunes para trabajar por nuestra gente y por nuestra región. Y no debería ser necesario decirlo, pero a veces hay que subrayar lo sobreentendido:

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Así como no reconozco enemigos en la política nacional, tampoco lo hago en ningún gobierno extranjero. La palabra guerra no está en mi diccionario cuando pienso en las relaciones de Colombia con sus vecinos o con cualquier nación del planeta. Quien diga que quiere la guerra se ve que no ha tenido nunca la responsabilidad de enviar soldados a una guerra de verdad. Yo he tenido esa responsabilidad; yo he enviado a nuestros soldados, infantes de marina y policías a combatir el terrorismo; yo he consolado a sus viudas y a sus huérfanos, y sé lo doloroso que es esto. Por eso quiero ser muy claro en este punto tan delicado. Porque, antes que soldado, he sido diplomático. Me enorgullece haber sido el arquitecto, en la década de los noventa, como Ministro de Comercio Exterior, de la integración con Venezuela, con Ecuador y con muchos otros países del mundo; una integración que generó cientos de miles de empleos que trajeron prosperidad y bienestar a nuestros pueblos Uno de mis propósitos fundamentales como Presidente será reconstruir las relaciones con Venezuela y Ecuador, restablecer la confianza, y privilegiar la diplomacia y la prudencia. Les agradezco a tantas personas de buenísima voluntad que se han ofrecido a mediar en la situación con Venezuela, pero debo decir honestamente que, dadas las circunstancias y mi forma de ser, prefiero el diálogo franco y directo. Y ojalá sea lo más pronto posible. Eso sí: un diálogo dentro de un marco de respeto mutuo, de cooperación recíproca, de firmeza contra la criminalidad, y de comunicación sincera y abierta. Las buenas relaciones nos benefician a todos, porque cuando los gobiernos disputan son los pueblos los que sufren. Cada país de nuestra región tiene grandes fortalezas, pero si trabajamos juntos ¡podemos ser una gran potencia! Por eso creemos firmemente en la unidad y la confraternidad latinoamericana, que son el legado de nuestros Libertadores y el imperativo de nuestros tiempos. Bien lo ha dicho el gran escritor mexicano, y mi buen amigo, Carlos Fuentes: “Los Estados democráticos en América Latina están desafiados a hacer algo que hasta ahora sólo se esperaba de las revoluciones: alcanzar el desarrollo económico junto con la democracia y la justicia social”. Esta unidad latinoamericana también debe expresarse en solidaridad. La semana pasada, al concluir una gira por doce países de Europa y América, tuve la oportunidad de visitar Haití, y de reunirme con muchos haitianos y con el propio presidente Préval. Debo decir, con el corazón adolorido, que la angustiosa realidad que constaté supera la imaginación.

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Latinoamérica y el mundo tenemos que hacer mucho más. La gran ayuda anunciada no ha llegado o, por lo menos, no se ve. No podemos, apreciados colegas, ¡no podemos avanzar tranquilos hacia el futuro dejando atrás la inmensa tragedia del pueblo haitiano! En este día central de nuestra democracia, quiero hacer, ante el país y el mundo, una expresa declaración de principios. El respeto a la vida es un mandato sagrado. El respeto a la libertad e integridad de las personas es una obligación ineludible de todo Estado que se llame democrático. La defensa de los derechos humanos, ¡óigase bien!, será un compromiso firme e indeclinable de mi gobierno, y así lo reitero hoy ante mis conciudadanos, ante los honorables miembros del Congreso y ante la comunidad internacional. No lo hacemos por presiones o imposiciones externas. No, lo hacemos porque nos nace de la más profunda convicción democrática, ética y humana. Colombianos: Los invito a que compartamos la construcción de un nuevo amanecer. En este nuevo amanecer tenemos la oportunidad histórica para transformar a Colombia y asumir un positivo protagonismo en el escenario internacional. En este nuevo amanecer vamos a desarrollar las potencialidades de nuestra gente, de nuestra tierra, de nuestras regiones, para conquistar las oportunidades globales de los próximos 50 años. En este nuevo amanecer lograremos que Colombia, en menos de una década, sea reconocida internacionalmente por su altísima calidad de capital humano, por su equidad social, una capacidad económica, empresarial y tecnológica de talla mundial. En este nuevo amanecer empresarios, científicos, estudiantes, artistas, deportistas y ciudadanos del común se convertirán en símbolos de superación, excelencia, profesionalismo e innovación. En este nuevo amanecer nuestro país se destacará en los temas más importantes para la humanidad, como son el uso sostenible de la biodiversidad, las energías limpias, la seguridad alimentaria, el desarrollo tecnológico y las mismas industrias creativas. No será fácil, y seamos conscientes, no será fácil, pero podemos lograrlo si trabajamos juntos, alcanzando consensos nacionales y empujando todos en una misma dirección, la dirección de la paz y la prosperidad. Es hora de exigirnos más como sociedad, de exigirnos más como país. Tenemos que ir mucho más lejos de lo que hemos llegado; tenemos que pensar en grande; tener metas audaces, con visión, con ambición. Desde el Gobierno nacional, con el vicepresidente Angelino Garzón –un formidable líder social y defensor de los derechos humanos–; y con un equipo de lujo, capacitado y dispuesto a servirle al país con probidad y profesionalismo, vamos a poner todo de nuestra parte para que

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ese nuevo amanecer sea una realidad. Ahora que estamos listos para dar el gran salto a la prosperidad democrática, el nuevo Congreso de la República tiene una responsabilidad histórica con Colombia, y estoy seguro de que no será inferior a las expectativas. A las fuerzas que han manifestado su adhesión a nuestro gobierno de Unidad Nacional les pido un trabajo serio y consistente. A quienes quieran asumir la oposición les comunico mi absoluto respeto y todas las garantías, porque su control político y su veeduría son necesarios para el fortalecimiento de nuestra democracia. Como representantes de los intereses supremos de nuestra nación tenemos que dar ejemplo de trabajo y honradez, ¡un ejemplo de buen gobierno! La clase política es vista con desconfianza por buena parte de las sociedades de Colombia y del mundo. Está en nuestras manos demostrar que la realidad es diferente. Les pido a Dios Todopoderoso, al pueblo colombiano, a la comunidad internacional, que me acompañen y me ayuden para sacar adelante la gran misión y responsabilidad que asumo en este año del bicentenario de nuestra Independencia. Quiero agradecer desde ahora, en este día inolvidable de nuestras vidas, a mi esposa María Clemencia y a mis hijos Martín, María Antonia y Esteban, porque sé que serán mi fuerza y mi refugio en los días difíciles de gobierno, y sé que entenderán y acompañarán mis desvelos, y el tiempo que destinaremos al servicio de la patria. El 7 de agosto de 1938 el presidente Eduardo Santos terminó su discurso de posesión con la siguiente declaración: “Cualquier sacrificio que me espera en la vía que hoy empiezo a recorrer, lo recibiré con alegría, si puedo en cambio llevar a los hogares colombianos un poco más de bienestar, un poco más de justicia y el don divino de la paz”. Setenta y dos años después, firmo con gusto, con entusiasmo este destino para mí y para mi patria. Porque pasan los años, pasan los presidentes; tan grande como efímero es el poder, pero Colombia siempre prevalecerá. Quiero contribuir con trabajo, con amor, con respeto, con pulcritud, con humildad y compasión, para que esta Colombia grande, alegre y valiente pueda llegar a ser algún día una nación que, además de justa, además de próspera, sea completamente feliz. Muchos países en la historia han superado duras etapas de violencia, de subdesarrollo, de conflicto, y hoy son ejemplo de progreso y justicia social. Colombianos: ¡ahora es nuestro turno! Ahora nos toca a nosotros. El mañana está llamando a la puerta, y entre todos vamos a abrirla para recorrer la senda de la prosperidad.

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Porque llegó la hora de la verdad. Llegó la hora de asumir nuestro destino. Llegó la hora de enterrar los odios. Llegó la hora de sembrar concordia. Llegó la hora de edificar –unidos, como debe ser – un país que nos llene de orgullo, un país digno para nuestros hijos. Compatriotas: ¡Le llegó la hora a Colombia!

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Anexo 5 - Conteúdo selecionado do períodico opinativo "Un Pasquín", acerca das eleições de 2010108

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O referido periódico tem por objetivo incluir pesquisas e opiniões acerca de acontecimentos contemporâneos na Colômbia sem o vínculo partidário ou político-ideológico segundo seus idealizadores. Foram incluídos excertos do periódico para fins de contextualização das críticas acerca do período eleitoral de 2010, antecedente à presidência de Juan Manuel Santos. O presente material encontra-se completo através do sítio http://www.unpasquin.com/PDF-Version/Un-Pasquin-Ed52.pdf. Para maiores informações acerca do periódico, vide sítio http://www.unpasquin.com

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Anexo 6 Notícias da Agência de Imprensa do Governo colombiano109

Sistema Informativo del Gobierno SIG

En Colombia podemos decir que hoy no hay ni una sola acusación de falsos positivos: Presidente Santos • Así lo indicó el Mandatario al intervenir en la Conferencia Nacional de Derechos Humanos, realizada este jueves en Bogotá. • Manifestó que él es el primer interesado en que no haya impunidad. Bogotá, 13 dic (SIG). El Presidente Juan Manuel Santos afirmó que el episodio de los 'falsos positivos' fue una vergüenza para el país, pero subrayó que por fortuna hoy no se presenta ni una sola acusación de este tipo en Colombia. Así lo manifestó el Mandatario al intervenir en la Conferencia Nacional de Derechos Humanos, que se realizó este jueves en las instalaciones de Corferias en Bogotá. "Por fortuna, hoy, 2012, podemos decir: no hay una sola acusación de falsos positivos en este año, ni una sola", sostuvo. El Jefe de Estado indicó que él es el primer interesado en que no haya impunidad y en que este triste episodio pase a la historia. "Que estemos buscando que no haya ninguna impunidad, tengan la absoluta seguridad de que eso será así. Soy el primer interesado en que no haya impunidad, porque ese tipo de crímenes no se pueden perdonar", dijo. "En ese sentido, tengan la seguridad de que nosotros vamos a estar vigilantes, porque queremos que este tristísimo episodio (de los falsos positivos ) realmente pase a la historia", concluyó el Presidente Santos.

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Ambas as notícias estão disponíveis no sítio: http://www.presidencia.gov.co. Acesso em 31/01/2013.

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SISTEMA INFORMATIVO DEL GOBIERNO SIG

Así se reconstruye el país en vivienda, agua y ambiente Bogotá, 24 jun (SIG). Convenios por 216 mil millones de pesos firmados con alcaldes y gobernadores de las zonas más afectadas por el Fenómeno de la Niña, asignación de cinco mil subsidios y millonarios recursos para agua, saneamiento y ambiente, son parte del balance que el Ministerio de Ambiente, Vivienda y Desarrollo Territorial entregó sobre su trabajo ante la emergencia. La Ministra del ramo, Beatriz Uribe Botero, destacó que para hacer frente a los retos que planteó el Fenómeno de la Niña en materia de vivienda, el Ministerio expidió los Decretos–Ley 4821 y 4832 de 2010, por medio de los cuales se agilizan los procesos para generar vivienda con destino a los damnificados y a quienes viven en zona de alto riesgo no mitigable. Según la Dirección de Gestión del Riesgo, a mayo de 2011 se habían registrado 483.896 viviendas afectadas en el país, de las cuales 13.289 se encuentran destruidas y 470.607averiadas. Convenios La Ministra indicó que se han suscrito siete convenios por valor de 216 mil millones de pesos con alcaldes y gobernadores de zonas muy afectadas por el Fenómeno de la Niña, que beneficiarán 17.612 familias, a través de proyectos de vivienda. En los próximos días se firmarán otros convenios con alcaldías y gobernaciones, por valor de 317 mil millones de pesos, para atender cerca de 20 mil afectados más por el invierno. También se han realizado jornadas de capacitación con alcaldes y gobernadores, principales socios en esta reconstrucción, en los departamentos de Santander, Norte de Santander, Caldas, Quindío, Risaralda, Tolima, Huila, Cundinamarca, Bolívar, Magdalena y Atlántico. Hasta el momento, el Ministerio ha asignado cerca de 5 mil subsidios familiares de vivienda por valor de 43 mil millones de pesos, para atender familias damnificadas de Cartagena, Manizales, Valledupar, El Bagre, Candelaria, Sabanagrande y Páez, entre otros. El Ministerio ha recibido cerca de 50 proyectos, que representan aproximadamente 35 mil soluciones de vivienda para atender especialmente población damnificada por invierno, reubicados por zonas de alto riesgo no mitigable y población desplazada. Gramalote Por otro lado, Uribe Botero informó que se gestionaron recursos por 2.000 millones de pesos ante Colombia Humanitaria, para adelantar la fase de planeación en el proceso de refundación del municipio de Gramalote. Agua y saneamiento

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En materia de agua y saneamiento básico, se han asignado 93.766 millones de pesos de recursos de los Planes Departamentales de Agua, para atención de emergencias. A través del Fondo Nacional de Calamidades, se asignaron 212.000 millones de pesos para rehabilitación de sistemas de agua potable y saneamiento básico afectados por el invierno en 16 departamentos. De este total, 94.519 millones de pesos están en ejecución con proyectos en Manizales, Soacha y Mosquera. De este mismo Fondo se han aprobado recursos para el sector de ambiente por 331.189 millones de pesos, para la financiación de 83 proyectos enfocados a control y manejo de movimientos en masa, control de inundaciones y reparación y reforzamiento de estructuras, entre otros.

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