O tratamento das questões repetitivas no projeto do novo CPC

August 8, 2017 | Autor: Oberdã Stivanin | Categoria: Novo Código De Processo Civil Brasileiro
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COMPLEXO DE ENSINO SUPERIOR DE SANTA CATARINA – CESUSC FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS DE FLORIANÓPOLIS – FCSF CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

OBERDÃ LAERTH ALMI STIVANIN

O TRATAMENTO DAS QUESTÕES REPETITIVAS NO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

FLORIANÓPOLIS MAIO 2012

Oberdã Laerth Almi Stivanin

O tratamento das questões repetitivas no Projeto do Novo Código de Processo Civil

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Faculdade de Ciências Sociais de Florianópolis como requisito à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Msc. Marcus Vinícius Motter Borges

Florianópolis Maio 2012

Oberdã Laerth Almi Stivanin O tratamento das questões repetitivas no Projeto do Novo Código de Processo Civil

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Faculdade de Ciências Sociais de Florianópolis como requisito à obtenção do título de Bacharel em Direito, aprovado com conceito [ ].

Florianópolis (SC),

de junho de 2012.

____________________________________ Prof. Msc. Marcus Vinícius Motter Borges Professor Orientador

____________________________________ [ ] Membro da Banca Examinadora

____________________________________ [ ] Membro da Banca Examinadora

Dedico este trabalho à minha família, em especial aos meus pais, pelo incentivo e apoio a mim concedido para que eu pudesse concluir mais esta etapa da minha vida.

AGRADECIMENTOS

Agradeço

aos meus

pais

pelo

amor,

carinho,

apoio,

amizade,

compreensão e dedicação que tiveram em todos os momentos de minha vida, pois sempre acreditaram em mim, os quais devo tudo o que sou. À minha namorada, Eliza Santos, por todo apoio, companheirismo e incentivo incondicionais, estando sempre presente nos momentos em que mais precisei, compartilhando de sua alegria e entusiasmo. Aos colegas e amigos de faculdade, pelos bons momentos vividos e pelo aprendizado que obtive, em especial, aos amigos Vinícius Roque Rollo da Silva, Nicholas Soares Ribeiro, Pedro Brügman, Paolla Andrade Fernandes, Alice Assing, Ana Maria Quevedo e Jeanine Joaquim Barcelos, agradeço principalmente pelas lições que levarei para toda a minha vida. Aos Amigos, em especial: ao André Bittencourt Palma Ribeiro, grande amigo que carrego sempre no coração e que tenho gratidão eterna por todos os momentos vividos; Aos amigos e companheiros de moradia Juliano Dal Pupo, Marcos Roberto Signori e Mara Cristina Schneider, que além de grandes companheiros, foram professores de muitos ensinamentos; Agradeço por fim, ao Gustavo Regis Avila, amigo de muitas histórias que ficarão para sempre na memória e que tenho muito apreço. Aos colegas de estágio pelos quais passei durante a graduação, pelo apoio de dedicação que tiveram, em especial à Vera Lúcia Lorenzett Rech, pessoa maravilhosa que me inseriu no direito como acadêmico e como profissional, merecendo todo meu carinho e homenagem por todo seu esforço. Ao Professor e orientador Marcus Vinícius Motter Borges pelo apoio e por acreditar neste projeto, mesmo sabendo das dificuldades da quase inexistência de referências bibliográficas. À todos os demais amigos e familiares não mencionados diretamente, mas que, de igual modo, contribuíram para a concretização dessa monografia.

"Que os vossos esforços desafiem as impossibilidades, lembrai-vos de que as grandes coisas do homem foram conquistadas do que parecia impossível." (Charlie Chaplin)

RESUMO

O presente trabalho inicia com uma abordagem sobre a jurisdição, sob a ótica das demandas repetitivas, apontando como o acesso à justiça intensificou a incidência das ações repetitivas e a problemática enfrentada pelo judiciário frete a tal incentivo. Neste sentido, faz-se uma análise das técnicas destinadas ao tratamento das ações repetitivas previstas, elencando como o atual ordenamento processual civil aborda as questões repetitivas, elencando institutos como, o julgamento sumário das ações repetitivas, os recursos especial e extraordinário repetitivos, a súmula impeditiva de recurso, o julgamento monocrático do relator e a sumula vinculante. Além dos referidos institutos, foi realizado um breve estudo sobre o tratamento da repetitividade no ordenamento jurídico estrangeiro. Em seguida, verifica-se o procedimento das demandas repetitivas no Novo CPC que será futuramente aprovado, e ao final, faz-se uma análise sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas, visando demonstrar como o futuro ordenamento processual irá colaborar com a celeridade processual e desobstrução das pautas de julgamento.

Palavras chave: Jurisdição. Repetitividade. Massificação. Princípio da duração razoável do processo. Celeridade. Morosidade.

LISTA DE ABREVIATURAS

Art. – Artigo CPC – Código de Processo Civil CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil RISTF – Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal STJ – Superior Tribunal de Justiça STF – Supremo Tribunal Federal

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 10 2 AS QUESTÕES REPETITIVAS ........................................................................... 12 2.1 Breves considerações sobre o exercício da jurisdição ............................... 12 2.1.1 A doutrina de Chiovenda ................................................................................ 13 2.1.2 A doutrina de Carnelutti .................................................................................. 14 2.1.3 A visão na doutrina brasileira ......................................................................... 16 2.2 Os problemas decorrentes do exercício da jurisdição massificada ........... 18 2.3 O “problema” do incentivo do acesso à justiça e o congestionamento do judiciário ........................................................................................................... 21 2.4 O impacto no princípio da duração razoável do processo .......................... 24 2.5 As técnicas processuais clássicas frente a questões repetitivas .............. 27 3

O

TRATAMENTO

DAS

QUESTÕES

REPETITIVAS

NO

ATUAL

ORDENAMENTO PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO ......................................... 31 3.1 O tratamento direto das questões repetitivas ............................................... 31 3.1.1 O julgamento sumário das ações repetitivas .................................................. 32 3.1.2 O recurso especial e extraordinário repetitivo ................................................ 36 3.2 O tratamento indireto das questões repetitivas ........................................... 40 3.2.1 A súmula impeditiva de recurso ...................................................................... 40 3.2.2 O julgamento monocrático pelo relator ........................................................... 42 3.2.3 A súmula vinculante........................................................................................ 43 3.3 O tratamento das ações repetitivas no ordenamento jurídico estrangeiro ............................................................................................................. 46 4 O TRATAMENTO DAS DEMANDAS REPETITIVAS NO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ................................................................. 50 4.1 O Novo CPC e os institutos já existentes...................................................... 50 4.1.1 O julgamento sumário de ações repetitivas e o Projeto.................................. 51 4.1.2 O recurso especial e extraordinário repetitivos do Novo CPC ........................ 53 4.1.3 A súmula impeditiva de recursos e o Novo CPC ............................................ 57 4.1.4 O julgamento monocrático do relator e suas manutenções ............................ 58 4.1.5 A súmula vinculante no Novo CPC ................................................................. 59

4.2 O incidente de resolução das demandas repetitivas ................................... 61 4.2.1 O incidente, a efetividade e a segurança jurídica ........................................... 61 4.2.2 Procedimento do incidente de resolução de demandas repetitivas ................ 62 4.2.3 A importância do incidente de resolução das demandas repetitivas .............. 68 5 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 70 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 72

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1 INTRODUÇÃO

Ante ao cenário das ultimas reformas processuais civis e da nova realidade social que trouxe ao Poder Judiciário os litígios em massa, ou seja, ações que abordam exatamente a mesma questão de direito, o legislador sentiu a necessidade de atualizar a ordem processual civil, a fim de enfrentar a grande demandas de ações repetitivas que aportam todos os dias o Judiciário e que causa seu congestionamento pelo excesso de trabalho. Neste contexto, foi criado por uma comissão de juristas nomeada pelo Senado Federal um anteprojeto do que será o Novo Código de Processo Civil, o qual atualmente tramita na Câmara dos Deputados sob a roupagem de Projeto de Lei n. 8.046/2010, com a finalidade de, através do tratamento diferenciado das demandas repetitivas, desobstruir a pauta de julgamento desde o primeiro grau até os Tribunais superiores. Desta forma, o presente trabalho versará sobre as questões repetitivas sob os mais diversos pontos de vista, seja como ação repetitiva ou recurso repetitivo. Primeiramente será feita uma abordagem sobre a repetitividade e o incentivo ao acesso a justiça, demonstrando a presença de repetitividade dos direitos antes mesmo de aportar ao Poder judiciário, elencando suas causas e consequências na sociedade, para depois visualizar o comportamento destas questões sob a ótica judicial. Nesse sentido, foi analisado o tratamento das questões repetitivas no atual CPC e no futuro Código de Processo Civil, demonstrando que os institutos destinados às questões repetitivas podem contribuir para a celeridade processual e descongestionamento do Judiciário. No que se refere à metodologia, usar-se-á o método de abordagem dedutivo, já que o ponto de partida é uma ampla abordagem acerca das questões repetitivas, para ao final restringir ao tratamento judicial dado à estas questões, passando pela previsão no atual CPC até chegar ao PL n. 8.046/2101, com o objetivo de verificar se institutos criados para julgamento das demandas repetitivas conferem maior celeridade no julgamento destas questões ou se não possibilitam maior velocidade na tramitação das causas.

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Quanto aos métodos de procedimento usados, será o monográfico, por se tratar do procedimento adequado para elaboração de trabalho de conclusão de curso, já que versará sobre tema específico a ser desenvolvido individualmente pelo autor; e o jurídico, por ser um tema atinente à dogmática processual. A técnica de pesquisa que se adotará será a teórica, em razão da utilização das fontes primárias de pesquisa, dentre elas, a legislação, e fontes secundárias, como livros, artigos e revistas. Em linhas gerais, o primeiro capítulo abordará a visão doutrinária acerca da jurisdição, adentrando-se na problemática da jurisdição massificada. Demonstrar-se-á a o surgimento das questões de massa no judiciário, ocorridas através do incentivo ao acesso a justiça, analisando quais os impactos deste tipo de demanda, bem como, ao final, fazer uma breve incursão sobre os mecanismos utilizados para tratamento das questões repetitivas. No segundo capítulo, serão abordados os procedimentos contemplados no atual ordenamento jurídico vigente visando conceder um julgamento diferenciado às questões repetitivas. Para tanto forma estudados institutos como julgamento sumário das ações repetitivas, os recursos especial e extraordinário repetitivos, a súmula impeditiva de recurso, o julgamento monocrático do relator e a súmula vinculante. Além disso, verificar-se-á o tratamento judicial da litigiosidade em massa no ordenamento jurídico estrangeiro. Por fim, no terceiro capítulo será apresentado um estudo comparado entre os institutos elencados no segundo capítulo deste trabalho e a sua previsão no Novo Código de Processo Civil, bem como trabalhar o incidente de resolução de demandas repetitivas, a fim de que possa ser constatada a existência de alterações e inovações legislativas no futuro CPC que contribuam para rápido julgamento das demandas repetitivas e com isso possibilitar a desobstrução do Poder Judiciário.

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2 AS QUESTÕES REPETITIVAS

Neste primeiro capítulo discorrer-se-á brevemente sobre a jurisdição elencando os conceitos definidos pelos autores clássicos até abordar o entendimento perante a doutrina nacional. Em seguida, será feita uma breve apresentação da problemática enfrentada pelo Poder Judiciário relativo às demandas repetitivas e o incentivo ao acesso à justiça dentro deste contexto, bem como as consequências da questão na formulação de tratamentos alternativos destinados à massificação de ações que possuem uma estrutura interna muito semelhante, quase idênticas.

2.1 Breves considerações sobre o exercício da jurisdição

É notável nas relações humanas encontrar disputas de interesses, nesse caminho, a vida em sociedade confirmou ser impossível a existência pacífica sem a presença do direito. Por essa razão, verificou-se a necessidade da presença do estado-juiz para intervir impondo limites na forma de resolução dos litígios. Neste rumo, o Estado surge como o detentor do poder de aplicar o direito através da jurisdição. No entanto, a forma concebida hodiernamente de controle estatal das demandas de interesses, necessitou de um grande percurso a ser trilhado até atingir o feitio estabelecido (CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, 2007, p. 25-30). A princípio, o Estado não detinha poder suficiente para aplicar o Direito, apenas se destinava a instituí-lo, sendo designado aos sujeitos a função de defesa de suas pretensões através do modo a que tinham alcance. Nesta época imperava a “justiça privada ou a justiça pelas próprias mãos” (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 35). Após este período, com o fortalecimento estatal e a incapacidade da justiça privada em ofertar uma resposta adequada às situações de conflito, o Estado moderno assume o monopólio não só da definição do direito como de sua aplicação, o desempenho desta atividade foi denominado de jurisdição (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 35-36).

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Nesta senda, ao Estado moderno, influenciado pelos ideais de Montesquieu de separação de poderes, foi confiada a obrigação de gerir a jurisdição para que esta atue de forma adequada e livre quando provocada pelo titular do direito lesado, aplicando a lei de acordo com sua conveniência. Conforme observado, é necessário que o sujeito detentor do direito material lesado atue para que a engrenagem da jurisdição entre em movimento. Dito isso, Silva e Gomes (2006, p. 62-63) afirmam que: A jurisdição, diz-se, é uma função inerte que só se põe em movimento quando ativada por aquele que invoca a proteção jurisdicional do Estado. E o meio através do qual se desencadeia a atividade jurisdicional denominase ação. De modo que, para conceituar a ação e delimitar-lhe as fronteiras, é imperioso que se defina, antes, o que se entende por jurisdição.

Neste toar, a solução dos conflitos interpessoais “é exercida pelo juiz, devidamente investido no poder do Estado, e por meio do processo. Em outras palavras, o processo é o instrumento pelo qual o Estado exerce a jurisdição” (MARINONI e ARENHART 2010, p. 53). Não são poucas as teorias que se debruçam na tentativa de explicar e definir o que seria a jurisdição e sua a função como atividade estatal. Por essa razão, ante a existência de divergências nos conceitos elencados por diversos autores, mister se faz necessário, abordar através de uma breve exposição as principais doutrinas sobre o assunto a fim de delimitar melhor o tema.

2.1.1 A doutrina de Chiovenda

Tratando-se de Estado dito moderno, impossível não mencionar o renomado doutrinador italiano que considerava a atividade jurisdicional “como função essencial própria a administração da Justiça; é exclusivamente seu o poder de atuar a vontade da lei no caso concreto, poder que se diz ‘jurisdição’; e que provê com a instituição de órgãos próprios” (CHIOVENDA, 2000, p. 58). Temos, portando, que cabe apenas ao juiz, representante do estado, o ato de aplicar e afirmar a vontade da lei, considerando como aquilo realmente pertinente o que a lei determina. Nesse liame, Chiovenda (2000, p. 8) define a jurisdição como a [...] função do Estado que tem por escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade

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de particulares ou de outros órgãos públicos, já no afirmar a existência da vontade da lei, já no torná-la, praticamente, efetiva.

Nesta concepção, resta evidente o fato da existência de uma distinção bem delimitada quanto a soberania estatal no que se refere ao direito. De acordo com o doutrinador italiano existe primeiramente a função de produzir o direito, ou seja, a de legislar; e em segundo lugar a função de aplicá-lo, exercida pelo juiz. “O ato de aplicação do direito objetivo, contudo, faz-se de dois modos diferentes. Para o administrador, a lei é o limite, enquanto para o juiz a lei é seu fim.” (SILVA e GOMES, 2006, p. 63-64) Extrai-se da doutrina chiovendiana que o verdadeiro poder residia na lei, a função da jurisdição neste caso destinava-se em aplicar o comando legal oriundo do poder legislativo. Não havia a possibilidade de criar uma norma para o caso concreto de forma individual como afirmam outros doutrinadores, assim, o juiz ficava cativo às normas de cunho geral exercendo a simples tarefa de aplicá-la. Entretanto, esta concepção se mostra ultrapassada, pois baseada “no modelo institucional do Estado de direito de matriz liberal, revelando, de tal modo, uma continuidade ideológica em relação ao pensamento dos juristas do século XIX” (MARINONI, 2008, p. 36). Destaca-se de oportuno, muito embora haja críticas quanto ao posicionamento da doutrina de Chiovenda, não se pode esquecer que o desenvolvimento de suas teses tiveram influências nas “idéias jurídico-filosóficas predominantes no século XIX”, diferenciando a função de criar as leis da função de aplicá-las. É preciso ressaltar, que o direito contemporâneo aborda o tema de forma diversa, aduzindo que no momento em que se aplica a lei estaria também sendo criado o direito, ou seja, a norma genérica e abstrata é moldada pelo julgador a fim de que possa aplicá-la ao caso concreto (SILVA e GOMES, 2006, p. 65).

2.1.2 A doutrina de Carnelutti

Para melhor compreensão da noção de jurisdição e de sua atuação como atividade estatal desempenhada pela figura do juiz, é imperioso ressaltar as teses do renomado processualista italiano Francesco Carnelutti. Ao defender o seu posicionamento referente à jurisdição, afirma haver uma visível diferença entre a

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função jurisdicional e a função processual, afirmando que, por exemplo, no processo de execução não existiria atividade jurisdicional, assim não seria qualquer processo que envolveria o exercício da jurisdição. Neste tocante, manifesta-se: Não me preocupa que no transcurso da história e inclusive na lei atual a palavra ‘jurisdição’ se utilize fora dos limites de seu significado natural, para indicar qualquer função processual. Tal uso se deve à preponderância que teve o processo jurisdicional na lenta elaboração do pensamento acerca dos fenômenos processuais. O processo executivo e, em geral, os outros tipos de processo permaneceram até ontem mesmo na sombra, e desse modo a noção de jurisdição absorveu integralmente a noção de processo. (CARNELUTTI, 2000, p. 222)

Deste norte, para o doutrinador a jurisdição pressupõe a existência do conflito de interesses, com a discussão de uma pretensão resistida para que ao final o julgador realize a cognição declarando o direito a ser aplicado ao caso concreto. “Há a necessidade, para haver processo jurisdicional, da prévia existência de uma pretensão, conceito este que, na doutrina de Carnelutti, é entendido como a exigência de subordinação de um interesse alheio ao interesse próprio de quem pretende”. (SILVA e GOMES, 2006, p. 67) Atribuída à jurisdição a função de resolver os litígios da sociedade através da “justa composição da lide”, cabe esclarecer que a lei concebida de forma isolada não é capaz de compor a lide, sendo necessário que o juiz realize a sua interpretação de modo a fazer da norma abstrata uma norma concreta, ou seja, a decisão do magistrado faria uma espécie de lei particular entre as partes partes. Destaca-se que a atividade jurisdicional descrita diverge da definida por Chiovenda quando se trata da aplicação do texto legal pelo julgador, nesse diapasão, descreve Marinoni (2008, p. 38): Para Carnelutti, a sentença cria uma regra ou uma norma individual, particular para o caso concreto, que passa a integrar o ordenamento jurídico, enquanto, na teoria de Chiovenda, a sentença é externa (está fora) ao ordenamento jurídico, tendo a função de simplesmente declarar a lei, e não de completar o ordenamento jurídico.

Observa-se, portanto, que neste caso o juiz faz uso de uma lei de cunho genérico realizando a sua adequação ao caso levado em juízo. O exercício deste mecanismo de adaptação do texto legal ao mundo dos fatos é ressaltado especialmente por Kelsen (2006, p. 4) 1. Apesar da ampla liberdade concedida aos

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“norma funciona como esquema de interpretação. Por outras palavras: o juízo em que se enuncia que um ato de conduta humana constitui um ato jurídico (ou antijurídico) é o resultado de uma interpretação especifica, a saber, de uma interpretação normativa.”

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juízes no momento de resolver as questões controvertidas, a necessidade de estar subordinado à vontade do legislador ainda persiste, pois o respeito à legislação se faz presente no ato de declarar o direito.

2.1.3 A visão da jurisdição na doutrina brasileira

Após a breve exposição acerca do conceito de jurisdição, com especial contribuição das principais doutrinas acerca assunto, resta necessário tecer alguns comentários para abordar a jurisdição perante a doutrina nacional. Ante o mencionado, vislumbra-se que a atividade jurisdicional é de monopólio estatal sendo exercida/representada pela figura do juiz, o qual tem por dever aplicar a lei ao caso concreto nas lides com o objetivo de atingir a pacificação social. Em face disto, o julgador há de executar as suas atividades jurisdicionais de maneira imparcial em relação às partes que compõe a demanda, devendo sempre permanecer equidistante para que possa assegurar a aplicação do direito subjetivo (SILVA e GOMES, 2006, p. 74-75). Já fora mencionado que a jurisdição é uma função e monopólio do Estado, resta, no entanto, “dizer que a jurisdição é, ao mesmo tempo, poder, função e atividade” (CINTRA, GRINOVER E DINAMARCO, 2007, p. 145): Como poder, é a manifestação do poder estatal, conceituado como capacidade de decidir imperativamente e impor decisões. Como função, expressa o encargo que tem os órgãos estatais de promover a pacificação de conflitos interindividuais, mediante a realização do direito justo e através do processo. E como atividade ela é o complexo de atos do juiz do processo, exercendo o poder e cumprindo a função que a lei lhe comete. O poder, a função e a atividade somente transparecem legitimamente através do processo devidamente estruturado (devido processo legal)

Ainda no tocante, torna-se evidente que no Estado de Direito não há espaço para que os interessados decidam suas desavenças pelas próprias mãos, sendo obrigatória a submissão da controvérsia ao juiz para que componha os propósitos em disputa, determinando qual o melhor interesse a prevalecer com base no ordenamento jurídico estabelecido. Deste modo, ao retirar do particular a possibilidade de resolver seus direitos no âmbito privado, o Estado abraça a função jurisdicional, como bem define Theodoro Júnior (2009, p. 37), “a função do Estado

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de declarar e realizar, de forma prática, a vontade da lei diante de uma situação jurídica controvertida”. No entanto, com a evolução das concepções de jurisdição, afirmar que o juiz detém a função de dizer o direito pura e simplesmente ou de criar lei entre as partes,

como

mencionado

nas

doutrinas

anteriormente

destacadas,

está

ultrapassada. Nesse sentido, a aplicação do direito ao caso concreto deve se pautar primeiramente pela Constituição, “deixando claro que a legislação deve ser compreendida a partir dos princípios constitucionais de justiça e dos direitos fundamentais

(MARINONI,

2008,

p.

136).”

Nesse

liame,

o

magistrado,

primeiramente, deve buscar a melhor solução ao direito material, mas sempre tendo como parâmetro a lei mais adequada partindo inicialmente da Constituição. Desta forma, é de grande importância salientar, que apesar da preocupação com a aplicação dos princípios constitucionais nos casos levados ao Poder Judiciário, deve-se conceder relevância a real tutela do direito material, haja vista que a finalidade do processo é tutelar o bem jurídico em disputa. Por esta razão, os meios executivos estão presentes no procedimento processual, servindo de elemento necessário para alcançar o bem da vida e atendendo a necessidade que o direito material necessita, como bem aborda Luiz Guilherme Marinoni (2008, p. 136): O direito fundamental à tutela jurisdicional, além de ter como corolário o direito ao meio executivo adequado, exige que os procedimentos e a técnica processual sejam estruturados pelo legislador segundo as necessidades do direito material e compreendidos pelo juiz de acordo com o modo como essas necessidades se revelam no caso concreto.

Do aludido pode-se afirmar que se há direito material a ser protegido é dele que deriva o direito à tutela. Neste rumo, a jurisdição serve como caminho para viabilizar o exercício ao direito de se buscar proteção ao direito pretendido, pois a tutela do direito material somente poderá ser exercida por via judicial e não particularmente. É deste raciocínio que se pode afirmar que o Estado deve prestar a tutela necessária ao jurisdicionado. “Ou melhor: a jurisdição tem o dever de prestar ao cidadão a tutela que decorre da sua posição jurídica. Essa tutela jurisdicional tem de ser necessariamente adequada, pois toda posição jurídica deve ser devidamente protegida” (MARINONI, 2008, p. 139). Conclui-se, portanto, que a jurisdição objetiva relacionar o direito material ao direito processual, partindo da Constituição utilizando as “tutelas dos direitos”

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(MARINONI, 2008, p. 142) para entregar ao jurisdicionado a tutela da pretensão resistida, tendo como representante do Poder judiciário o juiz, imparcial, que aplicará a norma mais benéfica ao caso concreto, através da decisão jurisdicional. Assim, o Estado exerce o monopólio de sua função, evitando que os cidadãos utilizem da própria força para buscar seus direitos, visando a pacificação social.

2.2 Os problemas decorrentes do exercício da jurisdição massificada

A existência de uma vida em sociedade exige que os participantes do grupo desenvolvam um convívio visando à manutenção dos laços que unem esta agregação, para tanto a necessidade de padrões de conduta se faz indispensável. Na medida em que o grupo aumenta, a padronização do comportamento cresce, tomando corpo e se prolongando pelo tempo, adquirindo o status de cultura. Assim, as atitudes tomadas pelos membros passam a ser realizadas de forma natural e inconsciente, tornando a convivência suportável através da reprodução de um padrão social. Um exemplo clássico da tendência de uniformização das condutas foi a Revolução Industrial, que propiciou um aumento gigantesco no desenvolvimento de tecnologias destinadas a produção repetitiva de bens. O favorecimento do momento histórico possibilitou que a expansão das indústrias culminasse no crescimento da urbanização e do capitalismo. A característica deste período pode ser classificada pela expressão “massificação”, atribuição que pode ser destinada à todas as sociedades contemporâneas que apresentam proporções de produção em larga escala (CAPPELLETI, 1993, p. 57). Em virtude da ocorrência concomitante de fenômenos como a industrialização, urbanização, produção em série, entre outros, pode-se constatar dois aspectos da massificação referentes ao presente trabalho, segundo Ruy Zoch Rodrigues (2010, 30-31): [...] a emergência de direitos sem titulação específica em indivíduos identificados, pertencentes a grupos ou mesmo à população humana em seu todo (ou seja, direitos pertencentes a massa de pessoas), e a emergência de direitos individuais vinculados às relações jurídicas que se formam na cadeia da produção e consumo em massa de bens e serviços. Percebe-se, desde já, que em linhas gerais os primeiros correspondem aos

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chamados direitos coletivos e difusos, e os demais aos direitos individuais homogêneos [...]

No caso em debate parece ser mais interessante a análise da segunda categoria, haja vista ser nesta a existência de maior número de ações repetitivas no âmbito do judiciário. Para melhor compreensão do fenômeno da massificação é necessária a verificação de outro aspecto, qual seja, a economia de escala 2. Neste tipo de economia o lucro é obtido através da reunião de operações econômicas, desta forma, uma única operação não gera o retorno do investimento para a produção do bem ou implementação do serviço. O exemplo mais próximo de economia de escala é o serviço de telefonia, evidentemente que apenas um indivíduo utilizando os serviços de uma empresa não é capaz de gerar ganhos, apenas o conjunto de vários usuários terá o condão de ensejar uma margem de lucratividade. Frisa-se que a economia de escala é essencial para a nossa sociedade, pois é através dela que determinados tipos de bens são viáveis de serem produzidos, como o serviço de telefonia mencionado. Com a expansão da urbanização e da produção de bens de forma massificada, bem como pela privatização de serviços antes pertencentes ao Estado, houve uma elevação na oferta de bens, vez que anteriormente determinados setores não estavam sendo explorados de maneira eficaz pelo Estado. Tal avanço não demorou para refletir no Poder judiciário, criando verdadeiros segmentos dentro do direito, como as demandas relativas à discussão dos limites dos juros em operações financeiras (RODRIGUES, 2010, p. 32-34). Com o intuito de entender melhor este fenômeno que aportou ao Judiciário, foi realizado um estudo pelo jurista Boaventura de Souza Santos 3 sobre os Tribunais portugueses. Em que pese a pesquisa abranger apenas um cenário restrito de jurisdição, nada impede sua utilização para compreensão da temática das ações repetitivas, pois o desencadeamento destas ações seguem rumos similares que viabilizam sua aplicação neste trabalho.

2

"Diz-se que há economias de escala quando o aumento do volume da produção de um bem por período reduz os seus custos. Esta redução pode se dar pela possibilidade de utilização de métodos produtivos mais automatizados ou mais avançados, mas também pode estar relacionada a ganhos em propaganda, marketing, P&D, financiamento, enfim qualquer etapa da produção e comercialização. Até recentemente a ocorrência de economias de escala de grande porte era em geral associada à produção, por meio de processos contínuos, de insumos de uso generalizado, para os quais não cabe diferenciação de produto" (POSSAS,1993, p. 70-71). 3

SANTOS, Boaventura de Souza et al, Os tribunais nas sociedades contemporâneas: o caso português. Porto: Afrontamento, 1996.

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O presente estudo pautou-se pela análise econômica do direito revelando aspectos importantes para a lógica capitalista massificada e sua ligação com a justiça. Uma vez que o agente econômico entra na demanda, a sua manutenção depende do custo benefício desta ação, um dos exemplos seriam as ações de repetição de indébito. Estas ações são contestadas até o último grau de jurisdição, pois desta forma são mais rentáveis economicamente, haja vista que “mesmo convencido o banco de que perderá a ação, porque o dinheiro devido, aplicado em suas operações financeiras, rende mais que o custo de mora praticado em juízo.” (RODRIGUES, 2010, p. 35) Somada esta lógica à morosidade habitual dos processos, o Judiciário é forçado a tomar uma decisão única para estes casos a fim de dar conta da quantidade de ações. Neste toar, no mesmo ritmo em que são proferidas decisões neste

caso,

mais

crédito

é

concedido

e

mais

inadimplência

ocorre,

consequentemente todo este ciclo acaba passando pelos escritórios de advocacia revertendo em posterior congestionamento do judiciário. Ademais, a grande questão envolvida neste caso, não reside apenas no atravancamento do judiciário, mas no processamento destas ações, como aborda Ruy Zoch Rodrigues (2010, p. 35): O problema é que a massa de demandas deste tipo, que se explica em uma política geral de enfrentamento de litígios e não necessariamente no direito, e que, nessa linha, possui uma anatomia interna muito semelhante (senão idêntica) em todas as unidades do conjunto, é absorvida pelo Judiciário por um procedimento que é o mesmo aplicado para a cobrança de uma dívida entre dois particulares, por exemplo, salvo aqueles créditos que são veiculados em juizados especiais. E é nessa medida que se pode produzir aquele extremo destacado no início deste estudo: sabe-se, desde a autuação, o destino final da demanda.

A enxurrada de ações repetitivas advindas do exemplo anteriormente destacado ou que abordem a mesma questão de direito envolvida, obriga o Poder judiciário, na tentativa de contornar a problemática da imensa quantidade processos, a proferir a mesma decisão, tanto para processos ditos como idênticos como para os processos semelhantes que apresentam uma leve distinção quanto à matéria fática envolvida. Isto se deve ao fato de que o procedimento utilizado para ambos os casos ser o mesmo, como bem mencionado acima. Nas demandas de massas encontram-se uma grande quantidade de homogeneidade nas causas postas em juízo, principalmente tratando-se dos repeat

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players4 (ou litigantes frequentes) como Bancos, empresas de telefonia e tabaco, mas apesar desta padronização ainda existe uma certa sensibilidade entre os casos que em razão da situação fática diferem um dos outros. São nestes processos que o Judiciário se desdobra para resolver todas as variáveis sem prejudicar a cognição, contudo nem sempre satisfatórias. Neste aspecto, encontra-se no Judiciário dois tipos de demandas, as repetitivas e as convencionais, em um dos extremos temos as causas idênticas, no outro as marcadas pela incerteza, respectivamente. A problemática está na separação destas ações para o posterior julgamento adequado, desta forma, identificado o tipo de demanda, passasse para a apreciação na forma que cada processo necessita. Ausente o filtro que reconhece qual o procedimento será utilizado, caminha-se em direção ao equívoco quanto ao tratamento a ser dado ao caso, “na medida em que práticas de generalização possam ser aplicadas em processos da ‘jurisdição convencional’.” (RODRIGUES, 2010, p. 47) Portanto, para que possa ser dada a tutela jurisdicional adequada, é fundamental que primeiramente haja uma separação dos litígios de massa para tratá-los em conjunto, como no caso das Leis 11.418, de 19/12/2006, e 11.672, de 08/05/2008, evitando que demandas convencionais, com diferenças nas questões fáticas, possam ser julgadas nos moldes das ações de massa.

2.3 O “problema” do incentivo do acesso à justiça e o congestionamento do judiciário

O exercício da função jurisdicional é imposto ao Estado que exerce tal atividade através da jurisdição, dentro deste contexto cabe a este a obrigação de decidir todos os conflitos que lhe sejam levados, garantindo, por meio do devido processo legal, uma decisão imparcial para o litígio. No entanto este exercício nem sempre foi, ou é, executado da maneira esperada, gerando frustrações dos seus “clientes”. A controvérsia do acesso à justiça surgiu com maior intensidade após a segunda guerra mundial, ou seja, desde meados do século passado. O acesso à 4

SANTOS, Boaventura de Souza et al, Os tribunais nas sociedades contemporâneas: o caso português. Porto: Afrontamento, 1996, p. 71-72.

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justiça está extremamente ligado à noção de “justiça social”, inclusive, pode-se afirmar que é o que interliga o Processo Civil com a justiça social (MARINONI, 2000, p. 25). No Estado Liberal, a tutela jurisdicional era vista de forma individualista, em que o mero direito formal de propor uma ação já era considerado suficiente perante o entendimento de proteção jurisdicional. As dificuldades de se obter o acesso ao judiciário eram principalmente marcadas pela pobreza da população impedindo os que não possuíam condições de arcar com os custos do processo e a propositura do mesmo. Cappelletti e Garth (2002, p. 09) advertiram sobre a dificuldade da operacionalização do direito na época: Afastar a “pobreza no sentindo legal” – a incapacidade que muitas pessoas têm de utilizar plenamente a justiça e suas instituições – não era preocupação do Estado. A justiça, como outros bens, no sistema do laissezfaire, só podia ser obtida por aqueles que pudessem enfrentar seus custos; aqueles que não pudessem fazê-lo eram considerados os únicos responsáveis por sua sorte. O acesso formal, mas não efetivo à justiça, correspondia à igualdade, apenas formal, mas não efetiva.

De outra banda, as Constituições do Século XX primaram pela participação do cidadão na sociedade, inclusive, mediante o direito de ação, desde então, começou a ser focalizado como direito de acesso à justiça e, assim, ampliou as estruturas de efetivo acesso ao Poder Judiciário (MARINONI, 2008, p. 184-186). Na Constituição Federal de 1988, o princípio do acesso à justiça, também conhecido como princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, encontra-se com revisão no art. 5º XXXV, da CRFB/885. O dispositivo legal pode ser considerado como um dos pilares do Estado de Direito, sendo que nenhuma Lei poderá dispor excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer pretensão fundada em direito, o que conduz, ao menos, teoricamente, a independência harmônica das funções do poder (GERAIGE NETO, 2003, p. 34). Impende mencionar que a Emenda Constitucional 45/2004, promulgada no dia 31 de dezembro de 2004, apresentou como um dos objetivos principais uma prestação jurisdicional em tempo razoável, por meio de um processo sem dilações indevidas, efetivando os princípios constitucionais do acesso à justiça, da legalidade, da eficiência e do devido processo legal. Destaca-se que na busca pela proteção do judiciário, se torna indispensável que todos tenham direito à adequada tutela jurisdicional, ampliando o acesso à justiça e conduzindo a pacificação social. 5

XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

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Muito embora a busca pelo acesso à justiça tenha trazido enormes avanços aos que procuram o poder judiciário, trouxe consequências na mesma proporção em que concedeu direitos. Com a cultura de massa e a expansão do mercado de consumo, marcado pelo fortalecimento do capitalismo, pela urbanização e principalmente pela privatização de serviços antes encontrados na mão do Estado, “se reproduziu, no Brasil, o boom de litígios verificado nos Estados Unidos na década de 70” (AMARAL, 2011, p. 247). Nesse sentido, surgiu a figura das ações repetitivas que causam o congestionamento do Judiciário, como já bem mencionado no tópico anterior. Ademais, verificou-se através de uma pesquisa elaborada pelo STF que são estas ações as principais causadoras da morosidade, como descreve Ruy Zoch Rodrigues (2010, p. 38): O Supremo Tribunal Federal orientou pesquisa para mapear zonas de estrangulamento, detectando que as origens mais importantes do excesso de volume de demandas são ações do Executivo em nível tributário e ações oriundas de atividades econômicas produzidas em regime de intensa massificação, como a telefonia celular, cartões de crédito, financiamentos bancários, planos de saúde e etc. Assim, pode se dizer, com margem de segurança estatística, que o grande fator de congestionamento do poder judiciário são ações repetitivas.

Em que pese a existência de outros fatores contribuintes para o retardamento do julgamento dos processos, como o desaparelhamento do Judiciário, por exemplo, a demora ocasionada pelo excesso de ações repetitivas é o ponto de maior contribuição neste aspecto, carecendo de maior dedicação na resolução desta problemática. A consequência mais drástica desta questão reside na lacuna de um tratamento adequado das questões repetitivas, que pode ser observado com maior propriedade nas sentenças. Isto ocorre, porque as primeiras decisões dos processos que versam sobre idêntica questão, transformam-se em paradigmas e passam a ser aplicados aos demais casos. De fato analisar de forma criteriosa cada ação repetitiva parece ilógico e desnecessário (RODRIGUES, 2010, p. 40). Ante o exposto, a alternativa encontrada para reduzir o impacto da ações repetitivas vai ao encontro da conclusão delineada no tópico anterior, é necessário dar um tratamento diferenciado as questões repetitivas em relação aos casos comuns, objetivando a redução no tempo de tramitação de todas as questões levadas à juízo.

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2.4 O impacto no princípio da duração razoável do processo

Dentre os princípios processuais constitucionais um dos mais importantes quando o assunto é demandas repetitivas e, consequentemente, celeridade é o da razoável duração do processo. Inserido pela Emenda Constitucional nº 45 de 2004, incide diretamente sobre a morosidade, clamando por uma justiça mais rápida frente às

protelações

desnecessárias.

No

entanto,

sua

aplicação

necessita

do

acompanhamento de uma justiça com qualidade na prestação jurisdicional (SANTOS, 2008, p. 44), só desta forma a Constituição será observada. É evidente que o Judiciário brasileiro recebe críticas quanto a letargia no processamento das ações (REBÊLO, 2003), ainda que os jurisdicionados mereçam uma solução judicial em um prazo considerável, não se pode esquecer, que muito mais fundamental que a presteza é a cognição. A questão aqui centrada reside no “problema dos mais delicados e que deve merecer a mais profunda meditação por parte dos processualistas, pois nem sempre a melhor justiça corresponde à rapidez nos julgamentos.” (ARAÚJO apud PORTANOVA, 2008, p.174) Nesta senda, o que almeja o inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal quando faz referência à razoável duração do processo é uma economia da atividade jurisdicional, concentrando a maior parte dos atos e buscando solucionar os conflitos de interesses de forma conjunta (BUENO, 2010, p. 177). Racionalizar e otimizar a atividade jurisdicional é conduzir o processo de forma inteligente, mas sem esquecer de examinar as especificidades de cada caso para que a prestação jurisdicional ocorra de forma justa. Neste tocante, Ruy Zoch Rodrigues (2010, p. 35), defende: O objetivo da jurisdição é resolver o conflito com justiça, proporcionando o quanto possível a certeza jurídica, por intermédio da coisa julgada, e a realização prática do direito reconhecido em favor de seu titular. O vocábulo ‘justiça’ pressupõe contraditório, ampla defesa e qualidade de jurisdição, valores que, somados à coisa julgada, constituem a ampla acepção da segurança jurídica.

Nesta campanha de apresentar uma jurisdição com qualidade e célere, compete ao processo de conhecimento a tarefa mais árdua, é nesta etapa que se encontra a discussão da maioria dos direitos envolvidos na lide (ROCHA, 2007, p. 81). Portanto, reside neste aspecto o dever de verificar a existência de protelações

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necessárias e de desnecessárias, sendo afastadas do processamento aquelas que não se apresentam como indispensáveis para findar a controvérsia da questão (RODRIGUES, 2010, p. 104-105). Deste modo, torna-se inseparável da razoável duração do processo que este seja efetivo. Quando a parte em juízo obtém decisões realizadas em prazos razoáveis, ou seja, com inocorrência de dilações impertinentes e que o tempo de processamento é próprio para a complexidade do caso, está presente a efetividade no julgamento da demanda. Verifica-se, destarte, que o principal inimigo do processo é o tempo (TUCCI, 1997, p. 66/119), assim todas as questões levantadas quanto a existência de morosidade ou de efetividade do processo estão ligadas ao fator tempo. Cabe agora identificar quais questões que levam a não observância do princípio da razoável duração do processo. Para Carlos Mário da Silva Velloso (apud ROCHA, 2007, p. 96-98) a grande causa da morosidade encontra-se no desaparelhamento do judiciário, como por exemplo, a ausência de magistrado em relação ao crescimento populacional, o excesso de formalismo, o aumento no número de processos, entre outros. Dentre os aspectos levantados cabe, ainda, separar os fatores exógenos e os endógenos como causadores de lentidão no processamento (RODRIGUES, 2010, p. 107). Quanto aos fatores externos (exógenos), sinala-se que o elemento contribuinte o presente aspecto é o excesso de demandas que ocasionam o chamado “congestionamento do Judiciário”. Tanto o juiz, quanto seu corpo de assessores, possuem um período limitado para a dedicação ao julgamento das ações, ao passo que as demandas continuam crescendo o tempo à disposição permanece o mesmo, ocasionando uma lentidão no julgamento. Teoricamente, neste caso, o rito processual possui uma influência reduzida na tentativa de minorar esta mazela, mesmo o mais efetivo dos procedimentos encontra dificuldade no enfrentamento do excesso de processos. Em que pese a pouca influência do rito, Ruy Zoch Rodrigues (2010, p. 107) destaca um dos escopos do Projeto de Lei do Senado nº 166, de 2010: Dentre os objetivos centrais do anteprojeto do Novo CPC, figura a tentativa de separação das demandas massificadas do conjunto litigioso que marcha no interior do Judiciário, para serem julgadas como conjunto, minimizando esse fator exógeno de congestionamento.

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O Projeto de Lei em comento almeja reduzir o impacto das consequências causadas pelas demandas em massa no princípio da razoável duração do processo, principalmente quanto a efetividade e segurança jurídica que o acompanham. O volume absurdo de processos que aportaram o judiciário enseja um tratamento diferenciado como o mencionado acima, nesse sentido, de acordo com Guilherme Rizzo Amaral (2011, p. 249-252) utilizando este procedimento estariam asseguradas efetividade e a segurança jurídica. O que se extrai dos aspectos mencionados é que massificação dos litígios (fator exógeno) influencia diretamente na tramitação dos processos, sejam eles repetitivos ou comuns. Prova disso é a tentativa buscada pelo legislador aos instituir mecanismos no Projeto do Novo CPC, como o incidente de demandas repetitivas6, com a finalidade de reduzir as pilhas de processos que aguardam julgamento. Neste caso se está diante da influência dos fatores endógenos, relativos aos aspectos internos do processo, como o modo de tramitação. As questões endógenas como causa de morosidade processual, estão diretamente ligadas ao procedimento e a questões políticas, como nos casos em que o processo aguarda julgamento “na gaveta” e a decisão não é prolatada por influência de conflito de interesses (SANTOS, 2008, p. 43). Ademais, o tempo em que o processo permanece parado entre um ato processual e outro, bem como as dilações indevidas, marcam a característica dos fatores internos. Sobretudo porque decorrem da atividade dos juízes e/ou do Judiciário livre dos agentes externos como a excesso de litigiosidade (RODRIGUES, 2010, p. 111). Neste ínterim, diante do congestionamento do Judiciário, a questão que se apresenta gira entorno da capacidade de o princípio da razoável duração do processo ser eficiente ao ponto de influenciar a desobstrução da atividade jurisdicional causadas principalmente pelas ações de massa. Como mencionado anteriormente, é notório que as demandas repetitivas são as maiores freqüentadoras do Judiciário, se comparadas aos dissídios convencionais. Diante disso, pode-se afirmar, com certa convicção, que aquelas são as maiores responsáveis pela morosidade hodiernamente encontrada (OTHARAN, 2011, p. 12). Nesta esteira, denota-se que o acúmulo das causas idênticas irradia conseqüências na esfera de julgamento de qualquer espécie de litígio, afetando de 6

Art. 930. É admissível o incidente de demandas repetitivas sempre que identificada controvérsia com potencial de gerar relevante multiplicação de processos fundados em idêntica questão de direito e de causar grave insegurança jurídica, decorrente do risco de coexistência de decisões conflitantes.

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modo direto, através da lentidão do Judiciário, e de modo indireto, com a criação de mecanismos para contornar o problema apresentado. Cada vez mais está se buscando adequar as questões repetitivas com o intuito de libertar os julgadores do excesso de trabalhos. Assim afirma Ruy Zoch Rodrigues (2010, p. 148): Mas a pressão da repetitividade se intensificou sempre mais, empurrando o sistema para o desenvolvimento de novas alternativas, a ponto de ser possível afirmar, hoje, uma autêntica tendência do processo civil brasileiro no sentido de que a jurisdição da litigiosidade repetitiva seja adaptada aos contornos de seu objeto, tanto aproveitando oportunidades que os conjuntos oferecem, como ajustando o ponto de equilíbrio da relação ente a independência do juiz e o dever de consideração que deve ter pelas posições consolidadas dos tribunais [...]

Ante o exposto, em síntese, pode-se concluir que o princípio da razoável duração

do

processo

está

intimamente

ligado

a

cultura

de

massa,

e,

consequentemente a litigiosidade desenfreada na forma de ações idênticas que abarrotam o Judiciário. Por essa razão, é que técnicas processuais são criadas pelo legislador mirando alternativas no procedimento para estas causas, abrindo uma brecha na pauta de julgamento de questões que demandem mais debate.

2.5 As técnicas processuais clássicas frente a questões repetitivas

Como abordado anteriormente, as ações repetitivas tornaram-se um dos grandes problemas enfrentados pelo Poder Judiciário quando tratamos de morosidade processual e congestionamento nos julgamentos. Em face da necessidade de se buscar maior celeridade no julgamento tanto das questões repetitivas e das não repetitivas, o legislador inseriu no CPC procedimentos que propiciassem um tratamento diferenciado para as questões repetitivas, assim desafogando essas demandas e, consequentemente, liberando os juízes para enfrentar com mais propriedade processos mais complexos. Ao longo das mudanças ocorridas no seio da sociedade as relações humanas foram sofrendo transformações assim como os litígios levados em juízo, principalmente nas questões individuais e coletivas (LACERDA apud RODRIGUES, 2010, p. 50-51). Sabe-se que o processo ordinário foi fundado para abranger uma universalidade de demandas, adaptando a cada caso às suas exigências, no

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entanto, a sua perspectiva individualista é insuficiente para abranger a todos os tipos de questões complexas relativas à evolução do direito. Ainda com relação as precariedades do processo frente as necessidades hodiernas, descreve RODRIGUES (2010, p. 52-53): A maior visibilidade dessa crise do processo se deu na demora da prestação jurisdicional. Há outros aspectos, tanto ou mais relevantes, como, por exemplo, a incompatibilidade de sua estrutura para dinamizar as ações coletivas. Mas isso só muito recentemente tomou espaço no debate, ainda imerso na grande questão da demora considerada em si mesma. Por aí o debate polarizou-se entre a segurança jurídica, a exigir tempo de pesquisa, diálogo e meditação – e, consequentemente, a impor demora -, e a efetividade de direitos, a exigir tempestividade na prestação jurisdicional.

Neste rumo, impulsionado pela carência de efetividade e de segurança jurídica, o processo clássico foi sofrendo alterações no seu procedimento, implementado técnicas de aceleração, mas sem mexer na sua estrutura básica, apenas afastando “formulas supérfluas” (OLIVEIRA, 2003, p. 43-44). Diante do cenário da massificação abordado alhures, criou-se um cenário propício para a elaboração de modificações no processo, buscando, sempre, romper com o ônus do tempo, o que será abordado a seguir. Inspirados pelo desejo de que o tutelado jurisdicional encontre no processo a proteção que necessita para alcançar a mais lídima justiça no curso da sua pretensão, é que os processualistas buscam alcançar o chamado “processo de resultados” (THEODORO JÚNIOR, 2009, p. 15). Por essa razão, o legislador brasileiro buscou através de alterações legislativas abrandar esta questão criando novas técnicas processuais para o tratamento das questões repetitivas. Nesta senda, foi inserido no CPC pela Lei 11.672, de maio de 2008 o art. 543-C7, prevendo que os recursos especiais fundamentados em “idêntica questão de direito” terão um julgamento diferenciado dos recursos especiais não inseridos nesta exceção. Desta forma, os recursos especiais destacados pelo referido artigo ficariam sobrestados, sendo isolados apenas alguns recursos para serem julgados, do julgamento destes recursos se formará uma única decisão que será aplicada para todos os demais.

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Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.

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Na mesma linha, a Lei 11.418, de dezembro de 2006, trouxe o art. 543-B8 para o CPC, determinando que os recursos extraordinários que versem sobre “idêntica controvérsia” terão a análise da repercussão geral analisada em conjunto. Assim, antes de serem admitidos os recursos ficaram sobrestados enquanto será julgado pelo STF apenas algumas unidades do conjunto selecionadas pelo Tribunal de origem, com isso a decisão é reproduzida para os demais, gerando um julgamento mais célere. Partindo do apresentado, pode-se afirmar que a massa de recursos repetitivos acima destacados são rapidamente julgados, pois não há a necessidade de serem analisados individualmente. O que importa nestes casos, são as transformações no processamento oriundas da tentativa de encontrar um caminho diverso para o enfrentamento de um conjunto de litígios também carregados de certa peculiaridade. Outro ponto a se abordado frente à repetitividade é o súmula vinculante prevista no art. 103-A9 da Constituição Federal e regulamentada pela Lei 11.417, de dezembro de 2006, visando uniformizar a compreensão do direito, tanto no âmbito do Judiciário quanto na Administração. Apesar de não haver uma ligação com a repetitividade como nos casos anteriores, a súmula vinculante possui um entendimento em comum com aqueles, qual seja, a “ideia de que as decisões dos tribunais superiores prevalecem sobre as decisões de juizados de menor hierarquia” (RODRIGUES, 2010, p. 151). Imperioso destacar, que não importa qual a decisão dos juízes de primeiro grau ou até dos tribunais, se a compreensão do direito dada pelos tribunais superiores for diversa, esta sempre prevalecerá, pois poderá ser alcançada pela interposição de recursos aos tribunais ad quem. Neste passo foi a inspiração da “súmula impeditiva de recursos” encontrada no §1º10 do art. 518 do CPC, em caso

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Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo. 9

Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.

§1o O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. 10

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da sentença estar de acordo com súmula do STF e STJ o juiz não receberá a apelação interposta, obedecendo, assim, o entendimento dos tribunais superiores. Além desta prerrogativa concedida ao juiz de primeiro grau, há outro instituto enquadrado no mesmo gênero da súmula vinculante e da jurisprudência majoritária dos tribunais, a sentença de improcedência prima facie baseada em decisões anteriores adotadas pelo mesmo juízo em “casos idênticos”. O art. 285-A11 do CPC prevê que quando as matérias controvertidas invocadas na petição inicial forem apenas de direito e no juízo existe sentença de total improcedência em casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e ser prolatada a mesma decisão para o caso repetido. Não cabe neste tópico abordar de forma profunda as questões levantadas, mas apenas realizar um apanhado geral sobre a forma com que o processo civil foi acrescentando institutos diferenciados para o tratamento das questões repetitivas, sejam elas no âmbito de primeiro grau ou em sede de recurso. Desde o início do estudo foi destacado a existência de demandas convencionais e as massificadas, abordando o seu impacto na sociedade de no interior do Judiciário. Este último caso mereceu especial atenção por se apresentar como o ponto de estrangulamento de todas as demandas repetitivas, não importa onde ela nasça, mas sempre encontrará como destinatário final o Judiciário. Por essa razão, é possível afirmar que o processo civil contemporâneo apresenta uma “tendência” a realizar adaptações com relação ao fenômeno das repetições (RODRIGUES, 2010, p. 154). No capítulo seguinte, será abordada a temática referente à técnicas de julgamento de questões repetitivas adotadas pelo atual código, sendo realizada uma abordagem mais pormenorizada e contundente. Foram selecionados alguns dos casos mencionados anteriormente como o julgamento dos recursos especiais e extraordinários repetitivos e o julgamento prima facie pelo juiz de primeiro grau, para verificar se tais institutos realmente tiveram impacto na redução da morosidade processual dentro do Poder Judiciário.

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Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.

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3 O TRATAMENTO DAS QUESTÕES REPETITIVAS NO ATUAL ORDENAMENTO PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRO

Neste capítulo será apresentado o tratamento das demandas repetitivas no Código de Processo Civil brasileiro, elencando quais mecanismos de julgamento são utilizados frente a estes casos, a fim de enfrentar a problemática da grande quantidade de demandas que aportam o judiciário sob a mesma controvérsia, acarretando no congestionamento e sobrecarga de trabalho. Nesta linha de pensamento, serão abordados o julgamento sumário das questões repetitivas, o recurso especial e extraordinário repetitivo, súmula vinculante, súmula impeditiva de recurso, julgamento monocrático do relator, desta forma se discorrerá os procedimentos destas questões. Ao final, será realizado um enfoque sobre o tratamento judicial das questões repetitivas no ordenamento jurídico estrangeiro. Antes de adentrar-se no mérito do capítulo, foi realizada uma divisão nos tópicos da pesquisa a fim de estabelecer um marco separatório entre assuntos que serão abordados a seguir, dividindo entre as formas diretas e indiretas de tratamento das ações repetitivas. Por fim, cumpre esclarecer que as questões abordadas visam dar tratamento adequado às ações repetitivas, o que será verificado ao final de cada assunto.

3.1 O tratamento direto das questões repetitivas

Neste ponto serão tratadas as formas diretas de controle das demandas repetitivas, ou seja, como o Código de Processo Civil atua diretamente no julgamento de tais ações, a fim de que haja uma rápida solução para todas a ações que versem sobre a mesma questão de direito. Para o debate aqui lançado foram eleitas duas questões principais que serão objeto de estudo a seguir, quais sejam, o julgamento sumário das ações com base no art. 285-A do CPC e o julgamento dos recursos especial e extraordinários repetitivos, previstos, respectivamente, nos arts. 543-B e 543-C.

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3.1.1 O julgamento sumário de ações repetitivas

As demandas repetitivas encontraram na Lei n. 11.277/2006 que inseriu no CPC o Art. 285-A tratamento diferenciado frente à fenômeno da grande quantidade de processos que versam sobre questão jurídica semelhante. O presente dispositivo trouxe o julgamento prima facie das ações repetitivas, visando abreviar a tramitação daquelas que apresentam como mérito questões preponderantemente de direito. “Assim, a reforma introduzida pelo novel art. 285-A do CPC é uma alternativa à problemática decorrente do advento dessas ações repetitivas em nosso ordenamento jurídico, o que contribui ao afogamento do Judiciário e à morosidade dos julgamentos” (PINTO, 2007, p. 124). O teor do referido dispositivo é o seguinte: Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada. § 1o Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação. § 2o Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso.

Primeiramente, antes de adentrar-se ao cerne do dispositivo, deve ser levantado o sentido da expressão casos idênticos, pois é necessário definir que tipos de demandas poderão ser encaixadas no caput do artigo e assim serem passíveis de julgamento sumário. No caso em tela, as ações abrangidas pelo dispositivo legal e comento não são as idênticas ou com a mesma causa de pedir, mas sim são demandas que possuem similaridade, ou seja, trazem causas de pedir similares, este é o limite que pode se chegar quanto à definição de casos idênticos descrita no dispositivo (RODRIGUES, 2010, p. 157). Desta forma, não podem ser classificados como casos idênticos aqueles que utilizam uma mesma tese jurídica, passível de aplicação para diversos outros casos. Como por exemplo, a rejeição de ação de indenização por danos morais em face de protesto indevido de uma duplicata, em que o autor possuía títulos protestados anteriormente, não pode ser utilizada para rejeitar ação de indenização por danos morais em razão de apresentação de cheque pós-datado antes da data

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acordada, se o outro já tinha cheques devolvidos por não ter fundos (WAMBIER; WAMBIER; MEDINA, 2006, p. 68). Neste toar, pode-se afirmar que uma ação para retomada do fornecimento de energia elétrica de determinado consumidor que não pagou três faturas no ano de 2006 e por esta razão teve o serviço interrompido, e outra em que o consumidor não pagou quatro faturas em 2007, tendo como tese o direito à continuidade desse serviço essencial, podem ser classificadas como casos idênticos, permitindo que outras ações como estas possam ser inseridas na condição de similaridade (RODRIGUES, 2010, p. 156/157). Definido o que se entende por casos idênticos, cabe agora levantar outra importante questão, o requisito de que a controvérsia seja apenas de direito. Para explicar quais casos seriam enquadrados como apenas de direito, Antonio Carlos Marcato (2008, p. 925) afirma: O primeiro requisito que o art. 285-A reclama para sua incidência é que a questão jurídica, a tese jurídica, predomine sobre eventuais questões de fato. É isto que deve ser entendido como “matéria controvertida unicamente de direito”. São aqueles casos que, sem qualquer hesitação, podem ser identificados pela matéria nele versada: complemento de aposentadoria; inconstitucionalidade de tributo; abusividade de uma determinada cláusula de contrato de adesão; índices de correção monetária e assim por diante. Aqueles casos em que a prática do foro levará, sempre e qualquer caso, ao “julgamento antecipado da lide” (art. 330,I), justamente porque a questão a ser resolvida é “unicamente” (leia-se: predominantemente) de direito, porque fatos sempre há mas os fatos, em si mesmos considerados, nada têm de peculiar ou característica.

Como bem se observa do acima mencionado, não há como haver uma demanda que verse somente sobre direito, os fatos são inerentes à ação, sendo que estes necessitam de prova anterior para haver o julgamento liminar do pedido (PINTO, 2007, p. 136). Nesta senda, através de uma interpretação mirando a finalidade do dispositivo em debate, não há impedimento à aplicação do mesmo quando houver casos onde estão presentes fato e direito no mérito, desde que tenha prova pré-constituída nos autos. Assim, quando houver predominância do direito sobre o fato, a ponto de possibilitar o julgamento antecipado por haver provas que permitem a decisão sem a necessidade de resposta do réu, estar-se-á diante de uma demanda com matéria controvertida apenas de direito. Permitindo, desta forma, o julgamento célere da ação, ao invés de seguir o procedimento padrão.

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O julgamento sumário incorporado ao ordenamento jurídico processual pela Lei n. 11.277/2006 poderia ser considerado inconstitucional por ferir princípios como contraditório, igualdade, segurança, acesso à justiça e devido processo legal. Razão pela qual, o Conselho Nacional da OAB ingressou com a ADIn n. 3.695, que aguarda julgamento, sustentando a inconstitucionalidade do dispositivo. Todavia, o entendimento da doutrina segue rumo diferente, afirmando que a lei atacada é constitucional ao passo que busca a celeridade, objetivando garantir uma tutela jurisdicional rápida e eficiente, o que compatibiliza com os preceitos constitucionais do processo civil atual (PINTO, 2007, p. 136) No entanto, a aplicação do art. 285-A deve ser pautada pela cautela, utilizando o dispositivo apenas em casos em que se mostra vantajosa a sua aplicação, não só para os juízes e os tribunais, mas principalmente para os jurisdicionados. Do contrário, o efeito ocasionado pela aplicação errônea do instituto pode acarretar em desperdício de tempo, ou seja, a consequência vai de encontro à razoável duração do processo e da celeridade, pois a interposição de recurso é praticamente certa (WAMBIER; WAMBIER; MEDINA, 2006, p. 71). Um dos requisitos para aplicação do dispositivo é que no juízo haja julgamentos anteriores no mesmo sentido, formando assim, um cenário de precedentes internos que possibilitem a prolação da sentença de improcedência. Deste norte, Rodrigues (2010,160-161) afirma havendo mais de uma decisão no mesmo sentido no juízo e que não contrarie entendimento dominante na jurisprudência dos tribunais, estaria autorizada a aplicação do instituto. Do contrário, não seria salutar o julgamento sumário quando houver divergência com relação à jurisprudência dominante dos Tribunais ou com entendimento sumulado, pois ensejaria, inevitavelmente, a interposição de apelação. “A coincidência entre a orientação adotada pelo juízo de primeiro grau e o entendimento manifestado por tribunal que lhe seja hierarquicamente superior é, assim, pressuposto fundamental para a incidência do art. 285-A” (WAMBIER; WAMBIER; MEDINA, 2006, p. 67). Assim é o entendimento do STJ: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMPROCEDÊNCIA PRIMA FACIE. ART. 285-A DO CPC. ENTENDIMENTO DO JUÍZO SENTENCIANTE. DISSIDÊNCIA RELATIVA ÀS INSTÂNCIAS SUPERIORES. APLICAÇÃO DA NOVA TÉCNICA. DESCABIMENTO. EXEGESE TELEOLÓGICA. 1. A aplicação do art. 285-A do CPC, mecanismo de celeridade e economia processual, supõe alinhamento entre o juízo sentenciante, quanto à matéria

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repetitiva, e o entendimento cristalizado nas instâncias superiores, sobretudo junto ao Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal. 2. Recurso especial não provido. (BRASIL, STJ, 2011)

Demonstrada a necessidade de consonância da sentença com o entendimento dos tribunais, cabe agora tratar brevemente sobre o procedimento do art. 285-A. Ocorrendo as condições para aplicação do julgamento sumário, é autorizada a reprodução de sentença de total improcedência em casos idênticos, sem citação do réu, sendo facultado ao autor apelar. Apelando o autor, o juiz, poderá exercer o juízo de retratação no prazo de cinco dias, caso não mantenha a sentença e, por consequência, seja dado prosseguimento à ação, deve ser determinada a citação do réu. Nesse sentido, é faculdade do juiz voltar atrás em seu juízo de valor. No entanto, ao não exercer a retratação, mantendo a sentença, ordenará a citação do réu para responder ao recurso, apresentando contrarrazões à apelação. Assim aborda Ataíde Junior (2006, p. 118) no seu resumo do procedimento do artigo 285- A: [...] o autor distribui a petição inicial; ela é autuada e os autos seguem conclusos para o juiz; se não houver razão para o indeferimento da inicial (ou mesmo para emenda), o juiz, presentes os pressupostos do art. 285-A do CPC, de imediato profere sentença, julgando improcedente o pedido. O réu não é citado, a menos que haja apelação do autor e a sentença seja mantida pelo juiz de primeiro grau (art. 285-A, §2º, do CPC). Como o juiz rejeita liminarmente o pedido do autor, seu ato implica na situação prevista no art. 269,I, CPC (com a redação dada pela Lei 11.232/2005), com força para produzir coisa julgada material.

Deste modo, é assegurado ao réu a possibilidade de defesa e a consequente manutenção da sentença, sendo o vocábulo citação o mais adequado, pois é a primeira vez que o demandado obtém conhecimento da ação (PINTO, 2007, 147). Conclui-se, portanto, que o art. 285-A está de acordo com o processo civil contemporâneo, sendo constitucional, não violado o contraditório e a ampla defesa, pois garante ao réu a possibilidade de apresentar defesa. Deve-se destacar que a norma em questão carrega consigo a segurança jurídica, em razão da igualdade de julgamento das ações repetitivas, evitando que ocorra divergência no julgamento sobre o mesmo caso (PINTO, 2007, 155).

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3.1.2 O recurso especial e o recurso extraordinário repetitivo

Como já mencionado no capítulo anterior a sociedade atual está fortemente marcada pela repetitividade e pela massificação das relações socioeconômicas, refletindo este comportamento no judiciário. A grande quantidade de processos fundados em idêntica controvérsia sob o contexto da repetição atingem os já congestionados tribunais nacionais sob, tais processos podem ser chamados de macrolides (BENETI, 2009, p. 10-11). Diante da necessidade de dar uma resposta rápida a este percalço a Lei n. 11.418 e a Lei n. 11.672 introduziram, respectivamente, os arts. 543-B12 e 543-C13 no CPC. Tais artigos inseriram uma nova técnica de julgamento dos recursos extraordinários e especiais, permitindo que estes recursos quando apresentarem “idêntica controvérsia” ou “com fundamento em idêntica questão de direito” sejam julgados através da seleção de um ou mais recursos representativos da divergência (BONDIOLI, 2010, p. 28). De modo geral, este mecanismo permite realizar uma seleção dos recursos representativos para um julgamento distinto. Até que ocorra o julgamento, os demais recursos permanecem sobrestados, sendo que após a decisão estes terão seu destino decidido com base no julgamento dos recursos selecionados, é o que Barbosa Moreira (2009, p. 619) chama de julgamento por amostragem. As providências para realizar o julgamento por amostragem podem ser tomadas pelo tribunal de origem ou pelo Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, pelo contato inicial ocorrer nos tribunais locais, estes tem grande chance de diagnosticar antecipadamente a existência de recursos repetitivos. Deste modo, não há obstáculo para os tribunais locais instaurarem o julgamento por amostragem, visto que o julgamento só ocorrerá se o STF e o STJ “entenderem presentes os requisitos para tanto, ou seja, eles controlam a posteriori a atividade do tribunal em matéria de recursos repetitivos e dão a última palavra no assunto” (BONDIOLI, 2010, p. 29).

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Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo.[...] 13

Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.[...]

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Pode-se dizer, pelo exposto, que a instauração do julgamento por amostragem pode ser realizado independentemente da parte envolvida no litígio solicitar ao interpor o recurso. Tal constatação ocorre em face do comprometimento dos tribunais superiores em garantir um processo célere, de baixo custo e efetivo. Quanto à multiplicidade de recursos, os art. 543-B e 543-C trazem em seu texto critérios muito próximos quando se referem à repetitividade, usando termos como “idêntica controvérsia” e “idêntica questão de direito”. Na realidade se referem à mesma coisa, haja vista a proibição de reexame de provas pelo recurso extraordinário, ex vi da Súmula n. 279 do STF14, o que conduz ao entendimento de que sempre que houver identidade de questão de direito os recursos especiais e extraordinários repetitivos poderão ser julgados por amostragem (ASSIS, 2008, p. 753 e 815). Uma questão relevante quando à amostragem levada aos tribunais superiores é que os processos escolhidos devem conter elementos que possibilitem o julgamento de todos os elementos envolvidos no debate (BONDIOLI, 2010, p. 33): Por isso, é preciso fazer chegar aos tribunais de superposição processos com todos os elementos fáticos e jurídicos necessários à ampla e precisa compreensão da questão de direito em debate e do litígio ao qual ela está atrelada. Assim, deve-se levar em conta não só a petição do recurso extraordinário ou especial, mas também outras peças relevantes do processo, como o acórdão recorrido e as contrarrazões ofertadas ao recurso extraordinário ou especial. Daí poder ser um recurso selecionado ‘por ter a peça recursal mais clara e precisa, outro pela qualidade das contrarrazões, um terceiro por conter acórdão mais bem fundamentado, etc.’

Tomado o devido cuidado com os processos selecionados para o julgamento, aqueles não indicados ficam sobrestados até o pronunciamento definitivo da Corte. Assim, o parágrafo único do art. 32815 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal prevê que a Presidência do Tribunal ou o Relator vão selecionar um ou mais recursos para julgamento e remeter os demais para o tribunal

14 Súmula n. 297 do STF - Simples Reexame de Prova - Cabimento - Recurso Extraordinário Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário. 15

Parágrafo único. Quando se verificar subida ou distribuição de múltiplos recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a Presidência do Tribunal ou o(a) Relator(a) selecionará um ou mais representativos da questão e determinará a devolução dos demais aos tribunais ou turmas de juizado especial de origem, para aplicação dos parágrafos do art. 543-B do Código de Processo Civil.

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de origem, igual tratamento é dado pelo caput do art. 1º da Resolução n. 8 do Superior Tribunal de Justiça16. No que tange aos recursos não representativos da questão, um detalhe merece especial atenção, caso um recurso especial ou extraordinário estiver fundado não apenas numa idêntica questão de direito repetida nos outros recursos, mas também e outras matérias autônomas e diversas, este deve seguir o julgamento normal, não podendo permanecer sobrestado, a fim de garantir a razoável duração do processo (BONDIOLI, 2010, p. 37-38). Ultrapassadas tais etapas e deflagrado o julgamento por amostragem, o primeiro passo é analisar a admissibilidade dos recursos. Caso os recursos não sejam admitidos o relator deve julgar monocraticamente (art. 557, caput do CPC) e encerrar o procedimento, comunicando os tribunais de origem para revogar o sobrestamento dos recursos represados. Admitidos os recursos, o relator do caso deve verificar os requisitos para o julgamento por amostragem, inexistindo a repetitividade na questão de direito, o procedimento deve ser abortado. Deste modo, os recursos especiais e extraordinários não serão mais julgados pelos arts. 543-B e 543-C, mas sim pelo procedimento ordinário de julgamento, não olvidando a comunicação para o tribunal de origem. Outro procedimento que merece ser adotado é a abertura de espaço para manifestação de pessoas que não figuram como parte nos recursos selecionados. A providência deve ser adotada, ao passo que o julgamento por amostragem dos recursos em questão influencia em uma série de processos, envolvendo diversas questões relevantes. A colaboração de terceiros vem disciplinada no §6º do art. 543A do CPC e no §2º do art. 323 do Regimento Interno do STF, bem como no §4º do art. 543-C do CPC e pelo inciso I art. 3º da Resolução n. 8 do STJ. Encerradas as providências preparatórias, os recursos repetitivos são incluídos na pauta de julgamento. No que concerne ao julgamento há dois pontos relevantes que são aplicados no STJ que deveriam ser incorporados ao julgamento pelo STF, quais sejam: a preferência no julgamento das demandas repetitivas (art.

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Art. 1º Havendo multiplicidade de recursos especiais com fundamento em idêntica questão de direito, caberá ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido (CPC, art. 541) admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando os demais suspensos até o pronunciamento definitivo do Tribunal.

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543-C, §6º do CPC) e o julgamento destas causas pelo órgão máximo julgador do tribunal superior (art. 2º da Resolução n. 8 do TJ)(BONDIOLI, 2010, p. 42-43). Como dito alhures, o relator do caso realiza o juízo de admissibilidade dos recursos especial e extraordinários representativos da controvérsia para posterior início do julgamento. No entanto, após a remessa para o órgão colegiado, os recursos passam por uma nova verificação sobre a admissibilidade, realizada pelos ministros

encarregados

pelo

julgamento.

Configurada

a

existência

da

inadmissibilidade dos recursos, os tribunais de origem são comunicados e os recursos sobrestados passam a ser julgados normalmente (CAVALCANTE, 2008, p. 185-186). Caso a inadmissibilidade afetar apenas parte dos recursos, sem prejudicar a questão da repetitividade, o julgamento prossegue normalmente. Se a inadmissibilidade de alguns recursos prejudicar a análise da controvérsia, o órgão julgador pode solicitar diligência, a fim de selecionar novos recursos para julgamento (BONDIOLI, 2010, p. 45). Ocorrido o julgamento dos recursos pelo tribunal superior, passa-se a análise dos recursos e agravos de instrumento represados nos tribunais locais. Apesar da decisão ser emanada dos tribunais mais representativos do país, esta não tem caráter vinculante, apesar disso, é salutar que os tribunais locais sigam o entendimento do STF ou STJ, pois estariam agindo pelo bem do funcionamento do sistema, dando celeridade na tramitação dos recursos, escopo do julgamento por amostragem (WAMBIER e VASCONCELOS, 2008, p. 34). Duas situações devem ser observadas a partir da observância do julgamento dos casos repetitivos, a primeira diz respeito à desconformidade entre a tese jurídica do recurso sobrestado e decisão dos tribunais superiores. Neste toar, os recursos sobrestados serão declarados “prejudicados” ou “terão seguimento denegado” (Art. 543-B, §3º do CPC; art. 328-A, §1º do RISTF; e art. 543-C, §7º, I, do CPC; arts. 5º, III, 7º da Res. N. 8 do STJ), ou seja, não haverá julgamento de mérito, mas apenas o trancamento dos recursos. A segunda situação versa sobre a desconformidade entre o acórdão recorrido e a orientação firmada pelo tribunal superior. Aqui há a possibilidade de retratação do tribunal de origem (art. 543-B, §3º do CPC e art. 543-C, 7º, II, do CPC), para alterar seu entendimento e proferir novo acórdão já condizente com o entendimento do julgado realizado por amostragem, cabendo, ainda, recurso

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especial ou extraordinário da decisão de retratação do tribunal (art. 105, III, e 102, III, da CRFB/88). Por derradeiro, caso o tribunal de origem mantenha seu acórdão e divirja do entendimento dos tribunais de superposição, deve aquele, dar seguimento normal aos recursos sobrestados, fazendo o juízo de admissibilidade dos recursos especial e extraordinário, encaminhado os recursos admitidos para o STJ e STF (art. 543-B, §4º do CPC e art. 543-C, 8º do CPC). Os agravos de instrumento interpostos contra a decisão que denegou seguimento aos sobrestados devem ser liberados par que estes subam naturalmente à instância superior (BONDIOLI, 2010, p. 51). Ao chegar ao tribunal de superposição, os recursos sobrestados podem ser julgados monocraticamente (Art. 543-B, §4º e art. 557, §1º-A do CPC; art. 21, §1º do RISTF; e art. 5º, I da Res. N. 8 do STJ), ou serem encaminhados para novo julgamento colegiado, a fim de mudar o entendimento anterior.

3.2 O tratamento indireto das questões repetitivas

Nesta etapa serão abordas as questões relativas ao enfrentamento das ações repetitivas de forma indireta, ou seja, as ações repetitivas já receberam um tratamento anterior e por esta razão são processadas de forma diversa. Assim, já há um debate anterior das questões levadas pelas ações de massa, de modo que seu julgamento é determinado de acordo com o que foi anteriormente decidido.

3.2.1 A súmula impeditiva

Em face da necessidade da rápida tramitação dos processos na tentativa de desafogar o Judiciário, a Lei 11.276/2006 trouxe a baila o §1º, do art. 518 do Código de Processo Civil. Dentre as alterações havidas, acrescentou o parágrafo 1º ao artigo 518, transformando o antigo parágrafo único em parágrafo segundo. O

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parágrafo primeiro aderido ao artigo 518 ficou conhecido como a “súmula impeditiva de recursos”17. Segundo Daidone (2006, p. 83-84), a súmula impeditiva de recurso foi instituída com o desiderato de propiciar maior celeridade na tramitação dos processos, não ficando impedida a possibilidade de o juiz apreciar o caso de acordo com suas convicções, com embasamento nas leis e nos autos. Assim, estará garantida a autonomia frente ao processo, tendo autonomia para decidir de acordo com as súmulas dos Tribunais Superiores. Deste norte, se houver apelação em desacordo com súmula dos tribunais superiores, o juiz não poderá admiti-la. O que autorizaria dizer que o que a nova legislação fez foi ampliar, dilatar, expandir, o poder do magistrado nesta etapa do processo. Assim, ao indeferir o recurso o juiz não estaria analisando requisitos de admissibilidade, mas sim de mérito é o que defende Wambier; Wambier e Medina(2006, p. 226). Ademais, ao indeferir o recurso quando a sentença estiver em consonância com a súmula do STJ ou STF nada mais estaria fazendo o juiz que evitando etapas de julgamento de um recurso que ao alcançar os tribunais superiores encontraria o mesmo tratamento que recebeu pelo referido instituto. Isto porque é função dos tribunais superiores dar a interpretação final das normas jurídicas (WAMBIER; WAMBIER; MEDINA, 2006, p. 226). Caso o recorrente entenda que não assiste razão à decisão que julga seu recurso com base no §1º do art. 518 do CPC, poderá agravar a decisão, é o que destaca Cei ( 2009, p. 204): A decisão de não recebimento de apelação motivada no art. 518, §1º, do CPC, será recorrível por agravo de instrumento. Justifica-se por se tratar de decisão interlocutória, em vista do conceito dado pelo art. 162 do CPC, porque decide questão incidente. Por outro lado, não é ato que implique uma das situações dos arts. 267 e 269 do CPC, ou seja, não é sentença, tampouco é despacho por ter cunho decisório.

O instituto da súmula impeditiva de recursos tem por objetivo frear a interposição demasiada dos recursos, o que por óbvio, faria com que o trâmite processual fosse mais demorado. Nesse sentido, o instituto destacado, teria eficácia nos casos repetitivos, pois, presume-se que casos em massa já tenham um tratamento respaldado por súmulas dos tribunais superiores. § 1o O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. 17

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No entanto, não há segurança quanto ao afirmado, posto que não há como garantir que o STJ e o STF tenham entendimento sedimentado sobre todas as questões que aportam o judiciário. De outro norte, como há a possibilidade da decisão ser agravada, inexiste garantias de que a parte descontente maneje vários agravos de instrumento até ver sua tese jurídica analisada, o que retira do instituto ora debatido sua credibilidade.

3.2.2. O julgamento monocrático do relator

Como dito, há formas de controle indireto das demandas repetitivas, foi neste contexto que a Lei n. 9.756 de 1998 acrescentou ao Código de Processo Civil o art. 557 e seus parágrafos18. O que se extraí do caput referido artigo é a possibilidade do relator decidir, singularmente, quando verificar que o recurso não obterá sucesso nas instâncias superiores, seja em juízo negativo de admissibilidade, seja pelo próprio mérito recursal, prevendo, inclusive, que a decisão de mérito não encontre guarida no entendimento do próprio tribunal, do qual ele, relator, faz parte, ou na jurisprudência do STF ou STJ. Observando a reforma do art. 557 do CPC, Athos Gusmão Carneiro (2003, p. 256), com propriedade, expõe que o juízo monocrático é aquele que liberta os órgãos colegiados do dever de julgar, de maneira que: Como consta de arestos do STJ, que este 'novo' artigo 557 tem como escopo desobstruir as pautas dos tribunais, a fim de que as ações e os recursos que realmente precisam ser julgados por um órgão colegiado possam ser apreciados o quanto antes possível. Por essa razão, os recursos intempestivos, incabíveis, desertos e contrários à jurisprudência consolidada no tribunal de segundo grau ou nos Tribunais superiores deverão ser julgados imediatamente pelo próprio relator, através de decisão singular, acarretando o tão desejado esvaziando das pautas. Prestigiou-se, portanto, o princípio da economia processual e o princípio da celeridade processual, que norteiam o direito processual moderno. 18

Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. § 1o-A Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso. (Incluído pela Lei nº 9.756, de 17.12.1998) § 1o Da decisão caberá agravo, no prazo de cinco dias, ao órgão competente para o julgamento do recurso, e, se não houver retratação, o relator apresentará o processo em mesa, proferindo voto; provido o agravo, o recurso terá seguimento. § 2o Quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor.

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Foi pensando no rápido julgamento que o referido instituto foi criado, visando, como dito acima, que os recursos, não só aquele tem seguimento negado, mas também aqueles que serão julgados possam ser apreciados o mais rapidamente possível. Contudo, nestes casos surge um obstáculo, quanto mais rapidez no julgamento menor a cognição desempenhada no caso. Baseado nisso, Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2010, p. 594) lecionam: Indubitavelmente, o sistema recursal atual padece de mal grave e de difícil solução. A busca de decisões mais perfeitas bate-se contra a necessidade de respostas rápidas do processo. Se o primeiro objetivo exige tempo, o segundo escopo impõe a restrição desse elemento. A compatibilização destas duas metas não é fácil, mas o sistema processual, por vários meios, tenta acomodar tais interesses conflitantes.

Deste modo, os poderes do relator devem ser usados apenas nos casos em que constatada de forma evidente a possibilidade do julgamento monocrático, nos termos do caput do art. 557 do CPC. No tocante, o referido artigo dispõe de quatro classes de fundamentos para o relator negar seguimento ao recurso, são elas: inadmissibilidade, improcedência, desaparecimento superveniente e contrariedade à súmula ou à jurisprudência dominante do tribunal competente para o julgamento do recurso, do STF ou de tribunal superior. De outra banda, pode o relator prover o recurso se a decisão atacada estiver contrastando com súmula ou jurisprudência dominante do STF ou de Tribunal Superior. Assim, as súmulas nestes dispositivos têm caráter impeditivo no prosseguimento do recurso. (ASSIS, 2008, p. 278)

3.2.3 A Súmula Vinculante

Foi com o escopo de pacificar o entendimento judicial, que as súmulas jurisprudenciais foram instituídas, visando, principalmente, definir o posicionamento dos tribunais quanto às teses jurídicas que aportam estes órgãos com maior frequência. As súmulas vinculantes foram incorporadas ao ordenamento jurídico brasileiro, mais precisamente à Constituição da República Federativa do BrasilCRFB/88, pela Emenda Constitucional nº 45 no ano de 2004, sendo regulamentadas

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pela Lei 11.417, em 19 de dezembro de 2006, tendo como dispositivo legal o art. 103-A. O referido artigo trouxe a possibilidade de aprovar súmula com efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e da administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, tendo como editor o Supremo Tribunal Federal, vejamos o texto literal para melhor análise: Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. § 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.

Conforme traz o texto legal, a finalidade da norma em comento é pacificar divergências existentes em determinadas normas, quando a controvérsia ocorrer entre os órgãos dos poder judiciário, ou entre estes e a administração pública, quando o assunto a ser sumulado for objeto de processo em grande número. Nesse contexto, Mancuso (1999, p. 282) preceitua: [...] a súmula vinculante vem conceituada por um critério finalístico, a saber, em contemplação dos valores a serem preservados e dos males a serem coartados a partir da uniformização jurisprudencial, propiciada pela técnica do parâmetro judicial obrigatório: “A Súmula Vinculante terá por objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública, que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.”

Destaca-se, por interpretação do art. 103-A da CRFB/88, que o entendimento trazido pela súmula vinculante produzirá efeito vinculante ao Poder Judiciário e ao Poder executivo, bem como terá eficácia erga omnes, pois aplicável a todos os casos que aportem o judiciário. Uma importante questão a ser levantada é que a súmula vinculante serve como mecanismo indireto de tratamento às

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demandas repetitivas, pois prevê entendimento a ser seguido antes mesmo do ingresso de ações de massa, Velloso (2004, p. 26) confirma o abordado ao dizer que a súmula vinculante é “o mecanismo que acabaria com a massa inútil de processos repetidos.” Assim também entendem Cambi e Brito (2009, p. 146): Não se pode negar, todavia, que a súmula vinculante, embora não seja lei, tenha força de lei, na medida em que se reveste de suas características essenciais, quais sejam, é geral, abstrata, impessoal e obrigatória. Ao não se emoldurar em determinado caso concreto, mas ser aplicável a todos aqueles que se enquadrem em seu enunciado, bem como por dever ser respeitada por todos os órgãos do Poder Judiciário e da administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal (art. 103A, caput, CF, e art. 2º da Lei 11.417/2006), é inegável que a súmula vinculante não seja catalogada como “mera” jurisprudência, com força apenas persuasiva, e, embora não seja lei, tem força de lei, sendo que sua violação enseja, inclusive, o cabimento de ação rescisória (art. 485, V, CPC).

Em que pese à possibilidade de tratamento indireto das questões repetitivas, a súmula vinculante não seria “mera” jurisprudência, como dito acima, tendo poderes conferidos somente às leis, o que gera crítica por parte da doutrina. Deste modo, Silva (1998, p. 51) adverte: “Atribuir-se à súmula o efeito vinculante amplo e inocular-lhe a força cogente que só provém da lei é invadir a competência do poder legislativo. O juiz, qualquer juiz, não tem e não pode assumir prerrogativa que é privativa do legislador.” Apesar da existência de crítica por parte da doutrina, no sentido de que a súmula vinculante afrontaria a separação dos poderes, contendo força de lei, e que limitaria a liberdade dos juízes em julgar as causas que aportam à sua jurisdição, é inegável que a súmula vinculante traz benefícios que superam estas questões, ao passo que resolve a problemática do engessamento do Judiciário com causas repetitivas, dando tratamento a estas questões, diminuindo carga laborativa. Deste norte, não é crível a tese de que a edição de súmulas vinculantes estaria rompendo com a separação dos poderes, vez que o juiz teria sua decisão vinculada ao efeito da súmula, estando atrelado ao entendimento desta, tendo seu poder de decisão reduzido e não ampliado. Assim o juiz que não seguir o entendimento sumulado estaria ferindo os princípios da isonomia, da segurança jurídica e do acesso à justiça (CAMBI; BRITO, 2009, p. 145). Ademais, Cambi e Brito (2009, p. 147) acrescentam: [...] o argumento de que a súmula vinculante esbarraria no princípio da separação de poderes foi superado pela existência de vários projetos ou

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propostas de emenda à Constituição, os quais redundaram no art. 103-A, inserido pela EC 45/2004.

Salienta-se, de oportuno, que os mesmos que podem propor ação direta de inconstitucionalidade poderão requerer a revisão ou cancelamento da súmula vinculante (artigo 103-A, §2º da CRFB/88), cabendo a decisão a 2/3 (dois terços) dos membros do STF19. Outrossim, a Lei n. 11.417/2006 aumentou o rol dos que podem intentar a edição, a revisão ou o cancelamento do enunciado da súmula vinculante, adicionando mais legitimados para tanto. Nesta senda, as sumulas vinculantes possuem um grande papel no tratamento das ações de massa submetidas à apreciação do Poder Judiciário, pois concede à uma mesma questão tratamento isonômico, desiderato da segurança jurídica. Neste mesmo rumo, Cunha (1999, p. 124) traz: As súmulas são enunciados que, sintetizando as decisões assentadas pelo respectivo tribunal em relação a determinados temas específicos de sua jurisprudência, servem de orientação a toda comunidade jurídica.

Pelo exposto, pode-se concluir que a finalidade da súmula vinculante é pacificar divergências no entorno de questões de interpretação constitucional, que possuem grande relevância social e que aportam o judiciário em grande quantidade, como nos casos das ações repetitivas, concedendo tratamento isonômico à ações e livrando o Judiciário de uma sobrecarga de trabalho.

3.3 O tratamento das ações repetitivas no ordenamento jurídico estrangeiro

Não é apenas no Brasil que as ações de massa têm tratamento diferenciado do restante das demandas. Existem técnicas para julgamento destas questões no ordenamento jurídico estrangeiro que se aproximam às destacadas anteriormente, pois possuem uma finalidade semelhante, qual seja, a redução do tempo despendido para julgamento, desobstruindo não só as ações repetitivas, mas também aquelas não repetitivas. A seguir serão expostos alguns casos do Direito

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Art. 103 - Podem propor a ação de inconstitucionalidade:I - o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa da Assembléia Legislativa; V - o Governador do Estado; VI - o Procurador Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

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inglês, alemão e espanhol, para melhor observar o tratamento do caso a nível internacional. No sistema processual civil inglês há a figura dos litígios com “múltiplas partes”, casos e que uma demanda apresenta diversos autores ou réus, podendo haver vários componentes nos dois lados simultaneamente. Nestes casos, o ordenamento jurídico inglês busca solução para acomodar tantos litigantes ao mesmo tempo, prevendo, assim, três formas de procedimento para as ações de massa: processos por representação; ações de massa sob ordem de litígio em grupo (GLO – Group Litigation Order); ou ainda litígio “consolidado” (ANDREWS, 2010, p. 337). Os casos julgados através da ordem de litígio em grupo (GLO – Group Litigation Order) possuem estreita relação com o procedimento dos recursos especiais repetitivos. Sendo que para a sua instauração, é indispensável o preenchimento de seis pré-requisitos: é necessária um detalhamento sobre a quantidade de ações, a especificação das questões de fato ou de direito inerente a todos, existência de objetivo preponderante, restar demonstrada a inaplicabilidade dos processos de representação e de consolidação no tocante, e por último, a descrição do número de partes relacionadas (BORGES, 2010, p. 167-168). Com o objetivo de acelerar o julgamento de um grande número de ações repetitivas, foi criada na Alemanha a lei referente ao Musterverfahren (Gesetz zur Einführung

von

Kapítalanleger-Musterverfahren

-

KapMuG),

conhecido

como

“procedimento-modelo” , destinado para os processos judiciais postulados pelos investidores no mercado de capitais, definidos pela referida lei (RIBEIRO, 2010, p. 624). A necessidade de criação do instituto ocorreu em razão da divulgação de uma notícia falsa acerca dos valores dos ativos imobiliários pela empresa Deutsche Telekon, em 1999 e 2000, gerando o ingresso de cerca de duas mil e quinhentas ações envolvendo aproximadamente dezessete mil poupadores e setecentos advogados, tendo como mesma questão de direito os danos causados pela notícia (RIBEIRO, 2010, p. 624). Quanto ao processamento supramencionado, Marcus Vinícius Motter Borges (2010, p. 166) destacou questões relevantes para o caso, vejamos: (a) além da determinação específica de qual situação repetitiva será enfrentada, a lei isola de maneira detalhada a questão jurídica, porquanto se refere somente a casos de “reparação de danos causados a investidores

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devido à informação falsa (...) por empresa de capital aberto, ou em que houvesse reivindicação acerca de satisfação de contratos baseados em ofertas de aquisição de valores imobiliários”; (b) existe uma espécie de bancos de dados on-line, no qual o incidente que foi instaurado por uma das partes fica disponível a todos podendo, assim, mensurar, precisamente, quantos litígios existem; (c) há um critério objetivo para se identificar a multiplicidade: no mínimo de 10 (dez) requerimentos (ações) num lapso de temporal de 4 (quatro) meses; (d) serão eleitos litigantes modelo representado, respectivamente, autores e réus no julgamento da causa; (e) todos os demais processos ficarão sobrestados; (f) os demais litigantes poderão participar do julgamento auxiliando alguma das partes e se manifestando por escrito; e (g) a decisão proferida no incidente vinculará todos os demais processos.

O que se extrai do caso é que o procedimento foi criado para que as ações repetitivas pudessem obter a mesma decisão, com a finalidade evitar divergências quanto ao caso e garantindo a segurança jurídica para as questões judiciais. Ademais, não obstante a homogeneidade objetivada pelo procedimento buscou-se uma solução célere, ocasionando uma redução no trabalho que seria despendido para julgamento e também das custas, pois estas são divididas entre as partes do litígio. Outrossim, conclui-se que o legislador brasileiro inspirou-se no procedimento alemão ao elaborar a Lei 11.672/08, quando visou a redução do número de processos semelhantes a serem julgados (RIBEIRO, 2010, p. 626). O procedimento alemão não influenciou apenas o direito brasileiro, trouxe inovações legislativas também na Espanha. Desta forma, o direito espanhol criou o instituto chamado pleito testigo, que tende a agilizar a tramitação de determinada causa em face da extensão dos efeitos da decisão nela proferida, vez que os efeitos da sentença são aplicados nos demais recursos semelhantes quando houver demandas em massa e o mesmo pedido. Neste rumo, o tribunal poderá escolher um, ou alguns recursos que abarcam o tema em comum para que seja julgado. Após ser proferida a sentença, as partes serão notificadas da decisão, podendo optar em extendê-la para seu processo, pela desistência da ação, ou pela continuidade de sua demanda, ficando desvinculada do julgamento proferido pelo tribunal (RIBEIRO, 2010, p. 629). Portanto, observa-se que o problema da litigiosidade em massa é uma questão que não fica restrita ao cenário brasileiro, mas sim mundial, sendo imperiosa a existência de procedimentos diferenciados, tendo como base a Constituição de cada país, para tratar do assunto. Assim, não pode ser permitido que a necessidade de julgamento rápido de casos repetitivos ocorra em

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desobediência aos direitos fundamentais do cidadão (THEODORO JÚNIOR; NUNES, 2009, p. 19). No capítulo seguinte, será abordada a temática referente ao tratamento dado pelo Projeto do Novo Código de Processo Civil quanto às ações repetitivas. De modo a elencar quais as inovações trazidas pelo novo ordenamento e se estas serão capazes de ofertar um tratamento adequado aos processos de massa, bem como analisar o incidente de resolução de demandas repetitivas e suas possíveis consequências na atual situação processual.

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4 O TRATAMENTO DAS DEMANDAS REPETITIVAS NO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O presente capítulo tem por objetivo apresentar algumas inovações quanto ao tratamento das ações repetitivas no Projeto do Novo Código de Processo Civil, visando demonstrar a existência de mecanismos capazes de garantir maior celeridade na tramitação destes casos, desafogando o Poder Judiciário e garantindo a razoável duração do processo. Para tanto, será realizado um estudo comparativo entre os institutos trabalhados no segundo capítulo e seu tratamento no Projeto, bem como será tratado o mecanismo de julgamento chamado “incidente de resolução de demandas repetitivas”. Impende salientar que o Projeto de Lei em análise foi instituído pelos atos da Presidência do Senado Federal ns. 379 e 411, tendo como Presidente da Comissão responsável pela elaboração do Projeto o Ministro do STJ Luiz Fux. O Projeto tramitou no Senado como Projeto de Lei n. 166/201020 (MARINONI, MITIDIERO, 2010, p. 63). Após os debates no Senado, foi aprovado por este uma proposta modificada do Projeto de Lei original, criando-se um modelo substitutivo que foi encaminhado para a Câmara dos Deputados. Hoje tramita na Câmara o Projeto de Lei n. 8.046/201021 que discute o Novo CPC, nomenclatura que será utilizada apenas para melhor visualização do tema, sendo objeto deste estudo apenas o texto modificado até março de 2012, para melhor delimitação do tema. Assim, ao final será verificada a existência de inovações quanto ao procedimento de julgamento das questões repetitivas capazes de ensejar uma melhora no processamento destas ações, objetivando o descongestionando do Judiciário.

4.1 O Novo CPC e os institutos já existentes

20 21

http://www.senado.gov.br/senado/novocpc/pdf/Anteprojeto.pdf. http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=490267

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Aqui serão abordados os institutos que foram objeto de estudo do segundo capítulo deste trabalho, realizando um estudo comparado com o Novo CPC, a fim de apontar a ocorrência de alterações no texto legal, bem como se houveram modificações relevantes. Deste modo, depois de realizado o ato comparativo, será verificado se as modificações encontradas se mostram capazes de promover maior celeridade aos processos repetitivos, sem que isso afete o devido processo legal e a segurança jurídica, de modo que as alterações se apresentem salutares para o fim que almejam. Assim, caberá demonstrar quais institutos permaneceram no novo ordenamento, as suas alterações e existência de novos institutos que possibilitem o rápido julgamento das questões repetitivas a fim de desafogar o Poder judiciário.

4.1.1 O julgamento sumário de ações repetitivas e o Projeto

Neste tópico serão traçadas semelhanças e diferenças do julgamento previsto no art. 285-A do atual CPC e o respectivo dispositivo trazido pelo Projeto de Lei n. 8.046/2010. Deste modo, sempre que há troca de um diploma legal, é interessante verificar a existência de um correspondente normativo no novo código em comparação com o antigo, a fim de apontar modificações e obsevar a existência de inovações pertinentes a finalidade do instituto a ser analisado. Como abordado no capítulo 2 deste trabalho o art. 285-A do CPC22 prevê o julgamento prima facie das ações que versem unicamente sobre questão de direito nos casos em que o juízo já proferiu decisão de total improcedência nos mesmos termos. Nesta senda, caso o magistrado verificar que a ação está em desacordo com a jurisprudência do juízo este poderá julgar liminarmente a ação, sendo reproduzida a sentença anteriormente prolatada.

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Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada. § 1o Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação. § 2o Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso.

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No Projeto de Lei n. 8046/2010 o correspondente legal do instituto do art. 285-A ao atual CPC é o art. 307, que ganha destaque no novo ordenamento jurídico, pois está previsto no capítulo III do livro II, dentro dos procedimentos comuns, sob o título “Da improcedência liminar do pedido”, diferentemente do código atual que não prevê a separação do instituto dos outros dispositivos legais. Nesse sentido, cita-se o dispositivo legal para melhor análise: Art. 307. O juiz julgará liminarmente improcedente o pedido que se fundamente em matéria exclusivamente de direito, independentemente da citação do réu, se este: I - contrariar súmula do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; II - contrariar acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; III - contrariar entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência. § 1º O juiz também poderá julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde logo, a ocorrência a decadência ou a prescrição. § 2º Não interposta a apelação, o réu será intimado do trânsito em julgado da sentença. § 3º Aplica-se a este artigo, no que couber, o disposto no art. 306.

Por uma breve leitura do dispositivo do atual CPC e do Projeto é possível visualizar que não há mais a possibilidade do juiz utilizar uma decisão de total improcedência já utilizada no mesmo juízo para indeferir a demanda com idêntica questão de direito, sumariamente. Isto se deve ao fato de que a utilização de uma decisão do próprio juízo para indeferir uma ação seria incoerente caso não seja observado o entendimento dos Tribunais, especialmente os Superiores, pois esta observância seria pressuposto de aplicação do art. 285-A do CPC de acordo com WAMBIER; WAMBIER; e MEDINA (2006, p. 67). Deste modo, mostra-se mais coerente a supressão de tal possibilidade no texto do Novo CPC a fim de evitar que o juiz sentencie de modo diverso do entendimento dos Tribunais, o que acarretaria na interposição de mais recursos (SANTOS, 2010, p. 58). Por esta razão o Art. 307 do PL n. 8.046/2010 traz em seus incisos que a rejeição liminar da demanda só poderá ser realizada quando o pedido for contrário ao entendimento do Tribunal a quo nos casos de julgamento através de incidente de resolução de demandas repetitivas e ao entendimento do STJ e STF, sumulado ou não. O que pode ser constado quanto às diferenças acima, é que o Novo CPC buscou aumentar a gama de possibilidades em que o juiz pode julgar improcedente o pedido de forma liminar. Entretanto, ao expandir a quantidade de casos em que

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poderá utilizar o instituto, o Projeto restringiu a atuação do magistrado quanto a sua atuação no campo de decidir, haja vista que na redação do atual código a improcedência é com base numa decisão do próprio juízo e no Projeto é utilizado o entendimento dos Tribunais. Não há dúvida que o Novo CPC privilegia o entendimento do STF e do STJ, principalmente quanto às questões repetitivas, como se observa pelos incisos I e II do art. 307 do PL n. 8.046/2010. Neste tocante, imprimiu força singular ao entendimento destes Tribunais superiores com o intuito de conferir maior previsibilidade da aplicação do Direito Federal e Constitucional, bem como a materialização da igualdade, celeridade e estabilidade do sistema processual (LOBO; MORAES, 2011, p. 127-129). Outro ponto que merece destaque em face da inovação quanto à presença do instituto no art. 307, é o indeferimento liminar quando constatada a prescrição e decadência, prevista no §1º do artigo em comento. Neste passo, versando o pedido sobre questão apenas de direito e estando decaído ou prescrito o juiz poderá julgar de ofício pela improcedência, sem que ocorra a citação do réu, o que se mostra mais célere. Pelo exposto, pode-se dizer que o Novo CPC foi instituído para desafogar o Poder Judiciário, através da valorização das súmulas e jurisprudências. No tocante ao art. 307 do Novo código, fica evidente que a sua principal atuação será combater as chamadas demandas repetitivas. Ao primeiro olhar, o dispositivo supramencionado ameaça engessar as decisões, evitando a inovação jurídica e o livre exercício do debate, pois uma vez proferida decisão sobre o incidente de demandas repetitivas, ou sumulado entendimento pelos Tribunais superiores, tais matérias terão dificuldade de serem revistas, impossibilitando a apreciação de novos argumentos, o que poderá dificultar novos debates e teses jurídicas.

4.1.2 O recurso especial e extraordinário repetitivos do Novo CPC

O julgamento dos recursos Especial e Extraordinário já foi abordado no capítulo anterior, sedo elencado questões relativas ao seu procedimento e

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consequências da utilização deste instrumento para julgamento das questões repetitivas. Agora o enfoque será a previsão de julgamento dos recursos especial e extraordinário repetitivos no futuro Novo CPC, elencando as principais alterações que aportam no Projeto, visualizando quais as contribuições e melhorias que o novo ordenamento jurídico traz. No atual Código de Processo Civil o julgamento dos recursos extraordinário e especial vem disciplinado nos arts. 543-B e 543-C do CPC23, assim os recursos mencionados quando versarem sobre “idêntica controvérsia” e “idêntica questão de direito” e houver “multiplicidade” ou “multiplicabilidade” destes recursos, poderá ser instaurado o procedimento de julgamento por amostragem, sendo a decisão oriunda deste julgamento aplicável aos processos sobrestados, conforme já estudado no capítulo anterior. No Projeto de Lei n. 8.046/2010 o julgamento dos Recursos especial e extraordinário vem disciplinado de forma unificada, diferente do atual CPC onde há a divisão dos institutos, sendo a forma concebida pelo Novo CPC a mais salutar (ALVIN, 2011, p. 317). Nesta senda, os recursos em questão encontram-se disciplinados nos arts. 990 ao 995 do Novo CPC, sob a denominação de ”Do julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos”. Vejamos o artigo que insere o julgamento por amostragem dos recursos especial e extraordinário repetitivo no Novo CPC: Art. 990. Sempre que houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso extraordinário ou o recurso especial será processado nos termos deste artigo, observado o disposto no regimento interno do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.

Quanto ao caput do referido artigo não se vislumbra nenhuma inovação legislativa, permanecendo praticamente idêntico ao texto trazido pelos artigos do atual CPC. Observa-se, ainda, que a controvérsia dos recursos repetitivos deve versar apenas sobre direito como no caso hoje é realizado, assim autorizando o julgamento nos termos do instituto.

23

Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo. Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.

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A primeira alteração significativa prevista pelo PL n. 8046/2010 está no 24

art. 991 , quanto ao juízo de admissibilidade. No referido artigo o Presidente do Tribunal realizará a seleção do(s) recurso(s) representativo(s) da controvérsia e encaminhará para os Tribunais superiores sem realiza qualquer juízo de admissibilidade, o que não estava previsto nos §§1º dos arts. 543-B e 543-C25. Assim, como no atual ordenamento processual civil (art. 543-C, §2º, do CPC), caso o Presidente do Tribunal de origem não realize a seleção dos recursos representativos da controvérsia e remeta para julgamento pelos Tribunais superiores o Relator deverá, ao identificar a questão que enseja o julgamento por amostragem, determinar a suspensão dos recursos que apresentem a controvérsia identificada (§1º, do art. 991 do PL n. 8046/201026). Pode-se dizer que a principal novidade quanto ao caso está prevista no §3º do art. 991 do Novo CPC: § 3º Os processos em que se discute idêntica controvérsia de direito e que estiverem em primeiro grau de jurisdição ficam suspensos por período não superior a doze meses, salvo decisão fundamentada do relator.

O dispositivo legal em análise apresenta uma grande inovação que não está prevista no atual CPC, qual seja, a suspensão dos processos de primeiro grau pelo período de doze meses que apresentam discussão sobre idêntica controvérsia de direito que os recursos especial e extraordinário repetitivos. O mesmo ocorre para os recursos que tramitam em segundo grau e nos Tribunais superiores (Art. 991, 4º do PL n. 8046/201027), exceto que neste caso a suspensão ocorre por prazo indeterminado. Quanto aos prazos requisição de informações pelo Relator do caso e possibilidade de manifestação do Ministério Público e interessados não houve 24

Art. 991. Caberá ao presidente do tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça independentemente de juízo de admissibilidade, ficando suspensos os demais recursos até o pronunciamento definitivo do tribunal superior. § 1o Caberá ao Tribunal de origem selecionar um ou mais recursos representativos da controvérsia e encaminhá-los ao Supremo Tribunal Federal, sobrestando os demais até o pronunciamento definitivo da Corte. § 1o Caberá ao presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão 25

encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo do Superior Tribunal de Justiça.

26 § 1º Não adotada a providência descrita no caput, o relator, no tribunal superior, ao identificar que sobre a questão de direito já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida. 27

4º Ficam também suspensos, no tribunal superior e nos de segundo grau de jurisdição, os recursos que versem sobre idêntica controvérsia, até a decisão do recurso representativo da controvérsia.

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alterações significativas no Novo CPC, ficando a cargo do art. 992 e parágrafos regular a questão. O único ponto relevante foi o incentivo ao uso de meio eletrônico conforme dispões o §1º do artigo acima mencionado. Ocorrido o julgamento do recurso representativo da controvérsia os órgãos fracionários deverão obrigatoriamente declarar prejudicado os recursos que versam sobre idêntica controvérsia ou deverão decidir aplicando a tese julgada (art. 993 do PL n. 8.046/201028), de modo que a decisão seja de seguimento praticamente obrigatório. Caso os recursos que estiverem sobrestados na origem terão seguimento denegado caso o acórdão recorrido seja mantido pela orientação da instância superior (inciso I, do art. 994 do PL n. 8046/2010), assim como é previsto pelo atual procedimento. O mesmo ocorre nos casos em que o acórdão recorrido divergir da orientação do Tribunal superiro (inciso II, do art. 994, da PL n. 8046/2010). Por fim, a última alteração pertinente no Novo CPC consta no art. 995 e seu parágrafo único29, nesta hipótese o processo que tramita em primeiro grau e que foi afetado pela suspensão, deverá ser sentenciado pelo magistrado caso durante o lapso temporal aludido seja proferida decisão a respeito da controvérsia. Sendo possível a desistência de ação em curso caso a controvérsia seja a mesma discutida pelo recurso representativo. Diante o exposto, a nova sistemática adotada, trará o efeito vinculante, por completo, aos recursos especiais e extraordinários repetitivos. Como bem leciona Marinoni e Mitidiero (2010, p.189: “merece aplausos a vinculação proposta pelo Projeto. Essa encampa nosso posicionamento a respeito

da técnica de

julgamento repetitivo de recursos extraordinários e de recursos especiais.” Nesta senda, observa-se que as mudanças apresentadas pelo Novo CPC, firmam-se no prestígio do princípio da segurança jurídica que acarretará na uniformidade jurisprudencial. Outrossim, mostram-se bem sucedidas tais inovações, por contribuir com a isonomia das decisões proferidas por diversos tribunais acerca

28 Art. 993. Decidido o recurso representativo da controvérsia, os órgãos fracionários declararão prejudicados os demais recursos versando sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese. 29

Art. 995. Sobrevindo, durante a suspensão dos processos, decisão da instância superior a respeito do mérito da controvérsia, o juiz proferirá sentença e aplicará a tese firmada. Parágrafo único. A parte poderá desistir da ação em curso no primeiro grau de jurisdição, se a questão nela discutida for idêntica à resolvida pelo recurso representativo da controvérsia. Se a desistência ocorrer antes de oferecida a contestação, a parte ficará isenta do pagamento de custas e de honorários de sucumbência.

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de uma mesma questão de direito pleiteada, trazendo, ainda, na celeridade do Poder Judiciário.

4.1.3 A súmula impeditiva de recursos e o Novo CPC

O presente instituto já foi objeto de debate do segundo capítulo agora será objeto de estudo, entretanto, o aporte será direcionado ao Novo CPC. No atual ordenamento processual brasileiro a figura processual da súmula impeditiva de recursos esta prevista no §1º do art. 518 do CPC30, aduzindo que se a sentença estiver em conformidade com súmula do STF e STJ o juiz poderia não receber o recurso. Como dito alhures o objetivo do instituto é frear a interposição demasiada de recursos repetitivos que são contrários ao entendimento firmado pelos Tribunais superiores. Deste modo, a afirmação de que tal previsão legal possa ser aplicada aos casos repetitivos, se deve ao fato de que casos em massa já tenham um tratamento respaldado por súmulas dos tribunais superiores. O maior problema ao ter escolhido o referido instituto para realizar uma comparação com o Novo CPC, buscando averiguar quais as inovações e possibilidades de melhora na tramitação dos processos, é que não há um correspondente legal específico destinado a tratar do assunto, como ocorre no atual CPC. Nesse sentido, a doutrina já escassa quanto ao assunto não aborda a questão, muito menos indica possível dispositivo compatível com a súmula impeditiva de recursos. Todavia, o instituto que mais se aproxima da questão seria o incidente de resolução de demandas repetitivas, pois trata de julgamento de ações repetitivas que versam sobre a mesma questão de direito, sendo que a decisão oriunda deste incidente é aplicada aos processos de 1º grau de jurisdição, assim como ocorre quanto à súmula impeditiva de recurso, posto que o processo ainda encontra-se em

§ 1o O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. 30

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primeiro grau de jurisdição e tem seu rumo decidido com base no entendimento de um Tribunal hierarquicamente superior. Entretanto o incidente de resolução de demandas repetitivas será objeto de estudo a seguir, o qual irá se debruçar acerca do instituto de maneira pormenorizada, Portanto será destinado ao tópico que trata sobre o incidente de demandas repetitivas abordar o assunto de forma analógica.

4.1.4 O julgamento monocrático do relator e suas manutenções

O julgamento monocrático do relator já previsto no atual código no art. 557 do CPC31 tem aplicação estrita para determinados casos, quais sejam: quando for verificado que o recurso não obterá sucesso nas instâncias superiores, seja em juízo negativo de admissibilidade, seja pelo próprio mérito recursal, prevendo-se, que a decisão de mérito não encontre respaldo no entendimento do próprio tribunal, do qual ele, relator, faz parte, ou na jurisprudência do STF ou STJ. O que pode ser facilmente observado no PL n. 8.046/2010 é que os poderes do relator aumentaram e vieram disciplinados em instituto próprio, vejamos: Art. 888. Incumbe ao relator: I - dirigir e ordenar o processo no tribunal; II - apreciar o pedido de tutela de urgência ou da evidência nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal; III - negar seguimento a recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão ou sentença recorrida; IV – negar provimento a recurso que contrariar: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de casos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência. V - dar provimento ao recurso se a decisão recorrida contrariar:

31

Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. § 1o-A Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso. (Incluído pela Lei nº 9.756, de 17.12.1998) § 1o Da decisão caberá agravo, no prazo de cinco dias, ao órgão competente para o julgamento do recurso, e, se não houver retratação, o relator apresentará o processo em mesa, proferindo voto; provido o agravo, o recurso terá seguimento. § 2o Quando manifestamente inadmissível ou infundado o agravo, o tribunal condenará o agravante a pagar ao agravado multa entre um e dez por cento do valor corrigido da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito do respectivo valor.

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a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal, ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de casos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência;

Pelo que se visualiza o relator mantém os mesmos poderes que de decisão do atual CPC, no entanto adquire mais possibilidades de julgar a demanda de modo monocrático. Destaca-se como inovação legislativa a possibilidade do relator em negar provimento ao recurso que contraria entendimento oriundo de julgamento de recursos especial e extraordinário repetitivos e firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas. Outra questão que chama atenção no dispositivo do Novo CPC é a possibilidade de dar provimento ao recurso quando a decisão recorrida for contrária também ao acórdão proferido em julgamento de recurso especial e extraordinário repetitivo, bem como quando a decisão recorrida for contrária ao entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas. Pelo exposto verifica-se que a intenção do novo ordenamento processual é evitar que as decisões monocráticas do relator seja objeto de novo recurso, com isso foram aumentados os poderes do relator, priorizando sempre o prevalecimento das decisões dos tribunais superiores e do incidente de resolução de demandas repetitivas (MARINONI; MITIDIERO, 2010, p. 2010). Assim, o referido instituto apresenta-se mais abrangente quanto ao tratamento dado às ações repetitivas, o que possibilita um julgamento mais célere para uma gama maior de casos.

4.1.5 A súmula vinculante no Novo CPC

Como já estudado anteriormente não há previsão no Código de Processo Civil sobre a súmula vinculante, haja vista que sua previsão está na Constituição da República no art. 103-A32. O escopo da norma é pacificar controvérsias existentes 32

Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.

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em determinados regramentos quanto ao entendimento constitucional, quando a controvérsia ocorrer entre os órgãos dos poder judiciário, ou entre estes e a administração pública, bem como quando o assunto a ser sumulado for objeto um grande número de processos. As súmulas vinculantes se preocupam a adequada delimitação de um enunciado jurídico externo a decisão judicial, sendo uma construção das teses jurídicas passadas (MARINONI; MITIDIERO, 2010, p. 167). Neste norte, ao ser um entendimento formado com base em decisões anteriores, tais decisões reiteradas certamente englobam questões repetitivas já levadas à juízo. Nesse sentido, o PL n. 8.046/2010 deu grande ênfase às súmulas e à vinculação das decisões dos Tribunais, superiores ou não, de modo que as decisões oriundas dos entendimentos julgados e que tenham entendimento sedimentado através de jurisprudência ou de julgamento de demandas repetitivas tenham maior força de aplicação, é o seu se observa do art. 882 do Novo CPC33. Deste modo, em que pese a previsão da súmula vinculante ser apenas constitucional o Novo CPC vai de encontro com a finalidade do referido instituto, pois prioriza a utilização de entendimentos sedimentados dos Tribunais, especialmente do STF, é que se observa no inciso IV, do art. 882 do PL n. 8046/2010. Assim, de forma indireta o Novo CPC prioriza a aplicação dos entendimentos pacificados pelos Tribunais superiores o que vai ao encontro com a finalidade da súmula vinculante, ou seja pacificar os entendimentos sobre questões de direito.

§ 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade. § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. 33

Art. 882. Os tribunais, em princípio, velarão pela uniformização e pela estabilidade da jurisprudência, observando-se o seguinte: I - sempre que possível, na forma e segundo as condições fixadas no regimento interno, deverão editar enunciados correspondentes à súmula da jurisprudência dominante; II - os órgãos fracionários seguirão a orientação do plenário, do órgão especial ou dos órgãos fracionários superiores aos quais estiverem vinculados, nesta ordem; III - a jurisprudência pacificada de qualquer tribunal deve orientar as decisões de todos os órgãos a ele vinculados; IV - a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores deve nortear as decisões de todos os tribunais e juízos singulares do país, de modo a concretizar plenamente os princípios da legalidade e da isonomia; V - na hipótese de alteração da jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. § 1º A mudança de entendimento sedimentado observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando o imperativo de estabilidade das relações jurídicas. § 2º Os regimentos internos preverão formas de revisão da jurisprudência em procedimento autônomo, franqueando-se inclusive a realização de audiências públicas e a participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a elucidação da matéria.

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4.2 O incidente de resolução das demandas repetitivas

A necessidade de um rápido julgamento das ações de massa foi se intensificando na medida em que aportam no Judiciário milhares de processos todos os dias e entre eles os repetitivos. Diante deste fato, foi pensado um novo código de processo civil, mais especificamente um instituto que atendesse esta demanda sob a ótica de “atenuar o assoberbamento de trabalho no Poder Judiciário” como bem menciona a Exposição de Motivos do PL n. 166/2010. Deste modo, a Comissão de Juristas que elaborou o Projeto criou o instituto visando julgar demandas as demandas repetitivas, denominado de “incidente de resolução de demandas repetitivas”, previsto nos arts. 930 a 941 do Substitutivo ao Projeto de Lei n. 166/2010, o que será objeto de estudo a seguir. Nesse sentido o Novo CPC pretende desafogar o Judiciário em primeiro grau de jurisdição através do referido incidente, pois o instituto em destaque apresenta-se promissor na tentativa de reduzir a sobrecarga de trabalho quanto às ações repetitivas nos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais (ALVIN, 2011, p. 310).

4.2.1 O incidente, a efetividade e a segurança jurídica

O instituto de julgamento para as questões repetitivas mencionado é apenas mais um dentre os mecanismos utilizados para imprimir marcha acelerada aos processos mirando a razoável duração do processo, princípio levado a nível Constitucional. Sendo as ações repetitivas as representantes da maioria dos processos presentes no Judiciário, nada mais correto que a previsão de um julgamento diferenciado com o intuito de priorizar seu tramite de modo mais eficaz (OTHARAN, 2011, p. 12-13). O incidente tem cabimento nos caso em que for identificada uma controvérsia sobre a mesma questão de direito, que possa ensejar o ingresso de várias ações sobre a mesma questão, o que geraria a possibilidade de existir

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decisões controvertidas sobre o mesmo caso. Deste modo, o incidente seria remetido para o Tribunal que o julgaria, aplicando a decisão para todos os processos que versarem sobre a mesma controvérsia (OTHARAN, 2011, p. 18). Nessa linha, é possível conceituar o incidente como: [...] providência facultativa que pode ser adotada por iniciativa do juiz ou do relator da causa, em ofício dirigido ao Presidente do Tribunal a que se estiver vinculado ou, ainda, por iniciativa, através de petição, das partes, do Ministério Público ou da Defensoria Pública, também ao Presidente do Tribunal a que a demanda encontre-se subordinada, cujo o propósito é dar eficácia ultrapartes à decisão, tornando vinculativa à tese jurídica adotada. (PORTO, 2011, p. 59)

Neste rumo, um dos benefícios de se instituir um único julgamento que seja estendido para todos os demais processos, está na sua efetividade e segurança jurídica. Para DINAMARCO (2002, p. 330) quando a norma cumpre a sua função sociopolítico-jurídica, atingindo a finalidade para qual foi instituída, estamos diante da efetividade processual. Já a segurança jurídica se apresenta como a garantia do cidadão obter uma resposta previsível quando o Estado atua (AMARAL, 2011, p. 242). Nesta senda, é fundamental que o jurisdicionado quando busca a tutela do Estado tenha um mínimo de previsibilidade do resultado de sua demanda aliado ao cumprimento das leis. No entanto quando estamos diante do cenário da massificação das demandas estes institutos ficam fragilizados, posto que a grande quantidade de ações no Judiciário enfraquece seu poder de atuação sobre cada uma delas (AMARAL, 2011, p. 251). Neste passo, um único julgamento com abrangência sobre todos os outros, ensejaria na discussão de apenas um “caso”, possibilitando maior debate, aliado ao fato de que o julgamento ao ser realizado por Tribunal, como no caso do incidente de resolução de demandas repetitivas, possibilita que o entendimento seja aplicado a todos os outros casos que tramitam no juízo de origem. Assim, efetividade e segurança jurídica estariam mais próximas do referido mecanismo de julgamento (OTHARAN, 2011, p. 20).

4.2.2 Procedimento do incidente de resolução de demandas repetitivas

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Destaca-se que o incidente de resolução das demandas repetitivas tem inspiração na figura Musterverfahren (YOSHIKAWA, 2012, p. 249), mecanismo de julgamento com previsão legal no ordenamento jurídico alemão, como já abordado no capítulo anterior. No Projeto de Lei 8.046/2010 o instituto está presente no Capítulo VII, destinado a instituir e regulamentar o procedimento do instituto. O dispositivo que insere o incidente de resolução de demandas repetitivas no referido ordenamento é o art. 930, vejamos: Art. 930. É admissível o incidente de demandas repetitivas sempre que identificada controvérsia com potencial de gerar relevante multiplicação de processos fundados em idêntica questão de direito e de causar grave insegurança jurídica, decorrente do risco de coexistência de decisões conflitantes. § 1º O pedido de instauração do incidente será dirigido ao Presidente do Tribunal: I - pelo juiz ou relator, por ofício; II - pelas partes, pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição. § 2º O ofício ou a petição a que se refere o § 1º será instruído com os documentos necessários à demonstração da necessidade de instauração do incidente. § 3º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e poderá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono.

Como visto no caput do artigo acima, o incidente é limitado a determinados casos específicos, ou seja, somente será aplicado o instituto quando preenchidos os requisitos para tanto. O primeiro requisito seria a existência de demandas repetitivas (COSTA, 2011, p. 46), ou seja, que haja uma quantidade significativa de processos que versem sobre a mesma controvérsia. Diga-se controvérsia, mas que seja somente sobre questão de direito, não podendo envolver fatos. Este requisito é um desafio do juízo, que ao analisar os casos deve afastar as questões parecidas das idênticas, de modo que analise apenas a tese jurídica vertida na demanda, deixando o suporte fático em segundo plano. Essa necessidade exige do julgador um grande esforço para que possa diferencias as ações e possibilitar o preenchimento do requesito a fim de instaurar o procedimento com segurança (PORTO, 2011, p. 60). Outro requesito presente no caput do art. 930 do Projeto de Lei n. 8.046/2010 é a potencialidade de multiplicação de processos, no caso, a multiplicação está ligada à controvérsia idêntica. Não há ainda entendimento quanto ao número necessário de ações quando se fala em multiplicação, por certo tal

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entendimento será firmado posteriormente pela jurisprudência e doutrina, não cabendo aqui afirmar a questão quantitativa. Por fim, o último ponto a estar presente para a instauração do incidente é a grave insegurança jurídica causada pela existência de decisões conflitantes sobre a mesma questão. Assim, como dito alhures, a possibilidade de conferir um único julgamento que produza efeito ultrapartes, atingindo todas as demandas repetitivas, impede que ocorra julgamentos divergentes sobre a mesma questão, indo de encontro à premissa do instituto (MARINONI, MITIDIERO, 2010, p. 178). Após serem abordadas as questões pertinentes aos requisitos cabe versar sobre os procedimentos do instituto. Inicialmente é encaminhado um ofício ou petição ao Presidente do Tribunal, instruído com os documentos necessários para demonstrar a necessidade do incidente, conforme §§ 1º e 2º do art. 930 do PL n. 8.046/2010. Os legitimados para tanto são as partes, o Ministério Público e a Defensoria Pública, bem como de ofício pelo juiz ou relator, como determina os incisos I e II do §1º do art. 930 do Projeto. Quanto ao §3º do art. 930, é possível afirmar que o incidente não é passível de pedido de desistência, qualquer que seja o autor, visto que o Ministério Público assumirá a questão caso ocorra a desistência ou o abandono do incidente, como bem ressalta Eduardo Henrique de Oliveira Yoshikawa (2012, p. 255). O art. 931 e seu parágrafo único do Projeto34 abordam questões pertinentes à publicidade do incidente, nesse sentido, o caput do artigo afirma ser necessária a ampla divulgação e publicidade do instituto deflagrado, tal publicidade não diz respeito apenas à questão liga a existência ou não de segredo de justiça, mas sim que o incidente seja de conhecimento de todos, ampliando a participação dos interessados e com isso engrandecendo o debate entorno da questão (YOSHIKAWA, 2012, p. 249). De acordo com Projeto de Lei em debate a divulgação do incidente se dá mediante registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça, que deverá, além informar existência do incidente, indicar o resultado de seu julgamento, abarcando os incidentes de todos os Estados da Federação (CUNHA, 2011, p. 267)

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Art. 931. A instauração e o julgamento do incidente serão sucedidos da mais ampla e específica divulgação e publicidade, por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça. Parágrafo único. Os tribunais promoverão a formação e atualização de banco eletrônico de dados específicos sobre questões de direito submetidas ao incidente, comunicando, imediatamente, ao Conselho Nacional de Justiça, para inclusão no cadastro.

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Distribuído o incidente, o relator do caso poderá requisitar informações ao juízo originário da controvérsia, o qual terá prazo de quinze dias, para maior elucidação das questões pertinentes ao tema, é o que descreve o Projeto de Lei 8.046/2010: Art. 932. Após a distribuição, o relator poderá requisitar informações ao órgão em cujo juízo tem curso o processo originário, que as prestará em quinze dias; findo esse prazo improrrogável, será solicitada data para admissão do incidente, intimando-se o Ministério Público.

Em face do fato de que o julgamento do incidente afeta uma universidade de partes, transcendendo aquelas envolvidas no processo levado a julgamento ao Tribunal, nada mais pertinente do que o caso seja julgado com o maior número de informações possíveis, bem como que haja a intimação do Ministério Público. Por esta razão a necessidade de o relator requisitar subsídios para elucidação da questão controvertida. Impende mencionar, que o fato do incidente ser dotado de ampla publicidade, deveria ser uma faculdade dos juízes, em que os processos serão suspensos, apresentarem manifestação quanto ao incidente, sugerindo as mais diversas questões que entendem necessárias para melhor deslinde do caso, tudo isto independente de provocação por parte o relator, o que engrandeceria ainda mais o debate, é o que entende Eduardo Henrique de Oliveira Yoshikawa (2012, p. 256). Quanto ao juízo de admissibilidade do incidente, este está previsto no art. 933 e parágrafos do Projeto35. A admissibilidade e o julgamento do incidente serão realizados pelo Plenário do Tribunal ou pelo órgão especial, nos locais onde houver. Por se tratar de procedimento especial, o juízo de admissibilidade deve verificar a presença de todos os requisitos previstos no caput do art. 930 do Projeto de Lei n. 8.046/2010 (§1º do art. 933 do PL n. 8.046/2010), sob pena de ser abortado o incidente. Ausente os requisitos de admissibilidade, o incidente é rejeitado e os processos envolvidos retomam seu curso natural, caso admitido, o Tribunal irá julgar e proferirá acórdão que será observado pelos juízes que estiverem no âmbito de sua 35

Art. 933. O juízo de admissibilidade e o julgamento do incidente competirão ao plenário do tribunal ou, onde houver, ao órgão especial. § 1º Na admissibilidade, o tribunal considerará a presença dos requisitos do art. 930 e a conveniência de se adotar decisão paradigmática. § 2º Rejeitado o incidente, o curso dos processos será retomado; admitido, o tribunal julgará a questão de direito, lavrando-se o acórdão, cujo teor será observado pelos demais juízes e órgãos fracionários situados no âmbito de sua competência, na forma deste Capítulo.

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competência, aplicando-se aos processos suspensos em face da instauração do incidente (art. 933, §2º do PL n. 8.046/2010). Como dito acima, os processos pendentes de julgamento ficarão suspensos no 1º e 2º graus a partir da admissão do incidente até seu julgamento, é o que se extrai do caput do art. 934 do Projeto de Lei em análise: “Admitido o incidente, o presidente do tribunal determinará, na própria sessão, a suspensão dos processos pendentes, em primeiro e segundo graus de jurisdição”. Caso um dos processos suspensos necessite de alguma medida urgente, poderá ser realizada tal medida a fim de evitar o perecimento do direito. A previsão da possibilidade de concessão de medidas de urgência está prevista no parágrafo único do artigo acima transcrito36. Quanto ao julgamento, o art. 935 do PL n. 8.046/201037, prevê que as partes e demais interessados terão prazo comum para juntada de documentos e para solicitar diligências que entenderem necessárias para o caso, em seguida o mesmo prazo será ofertado ao Ministério Público. Assim, encerradas as diligências, o relator do caso designará um dia para o julgamento do incidente (art. 936, caput do PL n. 8.046/2010). No dia do julgamento o relator fará a exposição do incidente, após a exposição, o Presidente do Tribunal passará a palavra às partes do processo originário e ao MP, no prazo de 30 minutos para cada uma das partes (§1º, do art. 936 do PL n. 8.046/2010). Em seguida os demais interessados também terão 30 minutos para apresentar suas razões, entretanto este tempo será dividido entre todos os interessados que o requererem até 48 horas antes do julgamento (§2º, do art. 936 do PL n. 8.046/2010). Traz o art. 937 do Projeto, uma grande questão, a possibilidade de suspender todos os processos no território nacional que versem sobre o mesmo objeto do incidente: Art. 937. As partes, os interessados, o Ministério Público e a Defensoria Pública, visando à garantia da segurança jurídica, poderão requerer ao tribunal competente para conhecer de eventual recurso extraordinário ou especial a suspensão de todos os processos em curso no território nacional que versem sobre a questão objeto do incidente. Parágrafo único. Aquele que for parte em processo em curso no qual se discuta a mesma questão jurídica que deu causa ao incidente é legitimado, 36

Parágrafo único. Durante a suspensão poderão ser concedidas medidas de urgência no juízo de origem. Art. 935. O Relator ouvirá as partes e os demais interessados, inclusive pessoas, órgãos e entidades com interesse na controvérsia, que, no prazo comum de quinze dias, poderão requerer a juntada de documentos, bem como as diligências necessárias para a elucidação da questão de direito controvertida; em seguida, no mesmo prazo, manifestar-se-á o Ministério Público. 37

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independentemente dos limites da competência territorial, para requerer a providência prevista no caput.

Deste modo os legitimados pelo artigo acima, tem a possibilidade de requerer a suspensão dos processos a nível nacional, tal requerimento é realizado perante o STJ e STF, já que são estes os Tribunais que julgam os recursos especial e extraordinário como bem menciona o caput. Apesar da almejada ampliação da segurança jurídica, este procedimento se mostra inconveniente ao passo que impede a instauração do procedimento por outros Tribunais, o que poderia contribuir para o aumento da qualidade da discussão (YOSHIKAWA, 2012, p. 262). Julgado o incidente, a decisão “será aplicada a todos os processos que versem idêntica questão de direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal” (art. 938, caput, do PL n. 8.046/2010).

Caso haja recurso

interposto contra a referida decisão e este recurso seja o especial ou o extraordinário, a decisão do recurso de competência do STJ e STF será aplicada a todos os casos que versem sobre a mesma questão de direito em âmbito nacional (parágrafo único do art. 938 do PL n. 8.046/201038). O que se extrai do caput do referido artigo, é que a decisão do Tribunal tem efeito vinculante sobre todos os processos suspensos na área de jurisdição do daquele órgão julgador, posto que é imperativa a aplicação da decisum. O que faltou constar no dispositivo foi a vinculação da decisão para os casos futuros, o que diminuiria uma interpretação em sentido contrária a esta tese (YOSHIKAWA, 2012, p. 262). Por se tratar de instituto que visa à celeridade no julgamento, nada mais correto que instituir prazo para seu cumprimento a fim de que o incidente não fique sendo julgado ad aeternum. É o que prevê o art. 939 do PL n. 8.046/2010: Art. 939. O incidente será julgado no prazo de seis meses e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus. § 1º Superado o prazo previsto no caput, cessa a eficácia suspensiva do incidente, salvo decisão fundamentada do relator em sentido contrário. § 2º O disposto no § 1º aplica-se, no que couber, à hipótese do art. 937.

Assim, foi determinado o prazo de seis meses para julgamento do incidente, com exceção dos casos que envolvam réu preso e habeas corpus. Caso seja ultrapassado o período em tela, a suspensão dos processos mencionados no 38

Parágrafo único. Se houver recurso e a matéria for apreciada, em seu mérito, pelo plenário do Supremo Tribunal Federal ou pela corte especial do Superior Tribunal de Justiça, que, respectivamente, terão competência para decidir recurso extraordinário ou especial originário do incidente, a tese jurídica firmada será aplicada a todos os processos que versem idêntica questão de direito e que tramitem em todo o território nacional.

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art. 934 cessará, entretanto o texto legal possibilita ao relator a faculdade de prorrogar tal prazo, caso entenda pertinente. Impende agora salientar que a decisão oriunda do incidente é passível de ser guerreada através de recurso especial e extraordinário, a novidade aqui, é o efeito suspensivo concedido aos recursos, bem como a presunção de existência de repercussão geral de questão constitucional eventualmente discutida (art. 940, caput do PL n. 8.046/201039). Outra novidade é que o juízo de admissibilidade dos recursos em comento será realizado pelo Tribunal competente para julgamento dos recursos (parágrafo único do art. 940 do PL n. 8.046/201040). Não sendo adotada a tese da decisão proferida em sede de incidente caberá reclamação para o Tribunal, ex vi do art. 941 do Projeto de Lei n. 8.046/2010: Art. 941. Não observada a tese adotada pela decisão proferida no incidente, caberá reclamação para o tribunal competente. Parágrafo único. O processamento e julgamento da reclamação observará o Capítulo VIII, deste Livro.

O que o referido artigo busca é que a decisão proferia através da instauração do incidente seja aplicada ao caso, a fim de que o precedente tenha força de aplicação. Este controle colabora para o alcance da finalidade do instituto, qual seja, que as decisões oriundas do instituto realmente tenham efeito vinculante e que ocorra a padronização da decisão para todos os casos que versem sobre idêntica controvérsia quanto ao direito. De modo que a segurança jurídica e a efetividade do instituto, como mencionado alhures, estejam presentes.

4.2.3 A importância do incidente de resolução das demandas repetitivas

Da análise da proposta de um incidente capaz de julgar demandas repetitivas, observa-se que é salutar a sua previsão, na medida em que objetiva um julgamento célere, promovendo, ao mesmo tempo, a segurança jurídica, a igualdade e coerência de um julgamento em bloco, com a fixação de uma tese a ser aplicada 39

Art. 940. O recurso especial ou extraordinário interposto por qualquer das partes, pelo Ministério Público ou por terceiro interessado será dotado de efeito suspensivo, presumindo-se a repercussão geral de questão constitucional eventualmente discutida. 40 Parágrafo único. Na hipótese prevista no caput, interpostos os recursos, os autos serão remetidos ao tribunal competente, independentemente da realização de juízo de admissibilidade na origem.

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pelos órgãos do Poder judiciário no âmbito de sua aplicação (MARINONI, MITIDIERO, 2010, p. 178). Destaca-se que o atual Código de Processo Civil passou por diversas reformas nos últimos tempos, visando a melhor prestação jurisdicional e trazer efetividade às demandas que tramitam no Poder Judiciário. Agora, o Projeto do Novo Código de Processo Civil caminha no mesmo sentido, em uma evidente tentativa de buscar celeridade das demandas que aportam sua seara (OTHARAN, 2011, p. 18). O que o referido instituto não busca evitar o ajuizamento das ações repetitivas para obtenção da tutela jurisdicional, mas sim o aperfeiçoamento no modo de julgar, a fim de adequar a necessidade de rápido julgamento destas ações que o judiciário necessita. Pois a vertente enxurrada de demandas sobre a mesma questão de direito apresenta-se como um obstáculo ao julgamento de ações que necessitam de um olhar mais minicioso e por consequência um tempo despendido maior. É notável a e ênfase conferida à jurisprudência dos Tribunais, principalmente pelo fato de possibilitar a realização da isonomia e segurança jurídica nos julgamentos. Concretizando princípios como a legalidade e isonomia, ao passo que a aplicação da lei será igual para todos (ALVIM, 2011, p. 317), o que por consequência afasta a ocorrência de interpretações diversas sobre o mesmo texto legal ou sobre a mesma questão discutida. Por fim, o incidente de demandas repetitivas parece que vem contribuir para o descongestionamento do judiciário, caso aprovado. Vislumbrando uma prestação jurisdicional mais efetiva, servindo como uma alternativa às ações coletivas (OTHARAN, 2011, p. 18). Assim, o instituto mostra-se capaz de acelerar o julgamento das demandas repetitivas, diminuindo o tempo de tramitação e desobstruindo as pautas dos juízes de primeiro grau, os quais recebem maior carga de trabalho.

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5 CONCLUSÃO

A facilitação do ingresso ao judiciário acabou ocasionando no congestionamento dos Tribunais e das Cortes Superiores. Se antigamente se reclamava do impedimento para operacionalizar o direito, em razão de seu acesso ser restrito somente àqueles que pudessem enfrentar altos custos, atualmente, reivindica-se por uma justiça mais célere e eficaz. Denota-se que dentre as reformas legislativas processuais ocorridas nas duas últimas décadas, com certeza a Emenda Constitucional 45/2004 merece maior guarida, visto que, por meio de sua promulgação, que ocorrera a introdução do inciso LXXXVIII, do art. 5º à Constituição Federativa, ao leque de direitos fundamentais, a fim de atingir a celeridade da tramitação no âmbito judicial. Ao bojo de sua regulamentação, também sobrevieram novos institutos, objetivando alcançar a celeuma do direito fundamental à celeridade processual. Salienta-se, dessa maneira, a previsão da súmula vinculante. Nessa senda, a sistemática processual civil também apresentou novos institutos como o julgamento sumário, os recursos especial e extraordinário repetitivos e a súmula impeditiva de recurso. No primeiro capítulo deste estudo, tratou-se de uma rápida recapitulação sobre os conceitos sobre jurisdição e sobre a jurisdição massificada, elencando quais os problemas enfrentados pelo Judiciário em face do incentivo do acesso à justiça e o consequente congestionamento das demandas no referido órgão, bem como foi trabalhado a razoável duração do processo e algumas técnicas de julgamento das ações repetitivas No segundo capítulo, foram analisados os institutos utilizados para tratamento das questões repetitivas, averiguando questões procedimentais e observando a sua eficácia quanto ao julgamento célere das demandas de massa. Nesse sentido, possível constatar que as alternativas de tratamento para as questões repetitivas contribuem de certa forma para acelerar o julgamento dos processos para as quais elas se destinam. Destarte, por meio de um breve comentário sobre o julgamento em massa no ordenamento estrangeiro, percebeu-se a semelhança dos institutos brasileiro, alemão e inglês, porquanto todos objetivarem o alcance da celeridade jurisdicional.

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Quanto ao terceiro capítulo, foram estudados os mesmos institutos abordados no segunda capítulo, desta vez sob a óptica do Novo Código de Processo Civil que tramita na Câmara dos Deputados Deste norte, foi possível verificar que, na maioria dos institutos estudados o Novo CPC possui inovações positivas quanto à formulação de decisões que possam ser aplicados aos processos repetitivos, de modo que estes seriam julgados em bloco através do julgamento por amostragem, tal qual ocorre com o julgamento dos recursos especial e extraordinário repetitivo, o que diminuiria o tempo de tramitação, pois estaria sendo julgado apenas um caso enquanto no julgamento individual seriam vários os processos submetidos a julgamento. Nesse sentido, a jurisprudência e súmula dos Tribunais ganha mais força ao ser incentivada as decisões com base nestes precedentes, a fim deque sejam utilizados como decisão a ser aplicada ao caso, o que evita a prolação de nova decisão, reduzindo o tempo de tramitação e aumentando de forma exponencial a homogeneidade das decisões. Porém, muito embora, as inovações trazidas no novo código de processo civil sejam salutares em termos temporais, verifica-se uma certa tendência ao engessamento das decisões o que dificultaria a mudança de entendimento quanto à determinado assunto. Por fim, conclui-se que, os institutos de julgamento por amostragem mostram-se grandes uniformizadores da jurisprudência pátria, permitindo um procedimento célere e assegurando às partes um julgamento igualitário ao direito pleiteado.

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