O UTILITARISMO PROCESSUAL, A BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL E A TEORIA DO MAIS DESESTÍMULO NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

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O UTILITARISMO PROCESSUAL, A BANALIZAÇÃO DO DANO MORAL E A TEORIA DO MAIS DESESTÍMULO NO ÂMBITO DOS JUIZADOS ESPECIAIS.
Anderson Ernesto Caroli
PALAVRAS CHAVE: Direito processual civil, Direito do consumidor, Juizados Especiais, Dano moral, Teoria do mais desestímulo.
OBJETIVO: O presente trabalho tem o objetivo de investigar e fazer algumas ponderações sobre as principais causas da morosidade e banalização do dano moral no âmbito dos juizados especiais cíveis, assim como listar alguns avanços e possíveis soluções para os problemas encontrados.
INTRODUÇÃO
Infelizmente o serviço público brasileiro apresenta um déficit muito grande, e nem o poder judiciário escapa desse problema. Os motivos, são diversos, podemos citar: infra-estrutura precária, falta de funcionários, judicialização demasiada de algumas matérias, legislações ultrapassadas, crescente número de processos em detrimento do número de juízes, entre outras, que acabam por tornar a prestação jurisdicional ainda mais morosa.
Fato é que a morosidade e a ineficácia das decisões judiciais acabam por promover a impunidade, a injustiça, a inadimplência, a descrença no judiciário e o retardamento do desenvolvimento nacional, e por isso veremos alguns fatores que tem prejudicado a boa prestação jurisdicional nos juizados especiais cíveis de forma geral.
Fatores que contribuem diretamente para a morosidade e ineficácia dos juizados especiais cíveis

Ampliação do acesso a justiça as grandes massas
O Acesso a Justiça é uma garantia constitucional, mas desde longa data tem se mostrado uma das grandes deficiências do poder judiciário no Brasil e no mundo, e procurando ampliar o acesso a justiça na década de 80 foi criado o micro sistema dos juizados especiais de pequenas causas que na década de 90 foi transformado nos juizados especiais cíveis e criminais após estudo minucioso realizado pelos professores Cappelleti e Garth.
Dentre as características principais dos Juizados especiais estão a celeridade, informalidade, dispensa de pagamento das custas processuais na primeira instância e a dispensa da assistência de advogado, o que ampliou sensivelmente o acesso a justiça as classes mais desfavorecidas, e por conseqüência aumentou a "clientela do poder judiciário" e os processos submetidos a tutela jurisdicional.
Relação de consumo e seu alcance
A relação de consumo permeia a vida de todo indivíduo, pois na verdade todos n s já nascemos consumidores, e com o advento da internet, da globalização, de novos produtos e serviços, do aumento do poder econômico da população e de super técnicas publicitárias, o consumo tem se multiplicado em progressão geométrica.
Quando as leis 8.078/90(CDC) e 9.099/95 (Juizados Especiais Cíveis e Criminais) foram sancionadas não se tinha idéia do que estaria por vir com o advento da internet e da telefonia móvel, pois apesar de essas tecnologia já existirem foram popularizadas apenas nos anos seguintes, causando assim uma revolução nas relações de consumo.
Com aumento desenfreado do consumo, aumentaram também os problemas, e como prova disso uma pesquisa realizada em 2013 pela FGV constatou que os processos que versam sobre relação de consumo correspondiam a 44% dos em tramitação no poder judiciário nacional, ou seja, quase a metade dos processos submetidos a tutela jurisdicional, e a maioria deles distribuídos no âmbito dos juizados especiais cíveis, sendo este também um dos grandes motivos da avalanche de processos submetidos ao micro sistema em questão.
O fenômeno da Judicialização e Ineficácia de medidas administrativas de proteção ao consumidor
Vemos atualmente um grande descontentamento da população com os poderes executivos e legislativos, por diversos fatores sejam eles sociais, políticos ou casos recorrentes de corrupção pelos membros desses poderes, e apesar do judiciário não estar livre de todas essas mazelas, grande maioria da população ainda deposita em suas mãos a solução de seus litígios.
Grande tem sidos os esforços para a mudança da cultura da judicialização exacerbada que temos atualmente, visto que o próprio sistema dos Juizados Especiais estimula a conciliação entre as partes e nesse mesmo sentido o a lei 13.105/15 (Novo CPC), também procura estimula a autocomposição entre os litigantes.
Outro grande problema é a ineficácia dos atos extrajudiciais praticados pelos órgãos administrativos de proteção e defesa do consumidor como PROCON e as agências reguladoras, e por isso o consumidor se vê abandonado tendo como única alternativa se socorrer junto ao poder judiciário.
Demandismo
Geralmente quase todos os remédios possuem efeitos colaterais indesejados, e não foi diferente com a lei 9.099/95, uma vez que diante das inovações trazidas, alguns viram uma oportunidade de tirar algum proveito indevido demandando por qualquer motivo, uma vez que não tinham nada a perder, pois estão dispensados de contratar advogados e consequentemente de arcar com seus honorários além de não precisar recolher custas processuais, fazendo do processo uma verdadeira "loteria do dano moral", inchando os juizados especiais de demandas sem qualquer fundamento e fadadas ao insucesso.
Sucateamento do poder judiciário
É de notório saber que atravessamos uma profunda crise econômica e cada vez mais fica evidente a escassez dos recursos e o alto endividamento do poder público, mas a falta de investimento e déficit de pessoal no poder judiciário já é coisa antiga.
A quantidade de processos submetidos ao poder judiciário se multiplicou avassaladoramente, porém tal crescimento não foi acompanhado pela realização de concursos públicos para o provimento de cargos de Juízes e serventuários da justiça, causando assim uma sobrecarga dos servidores, tornando humanamente impossível dar conta de tão crescente demanda, ainda mais com infra-estrutura tão precária.
Utilitarismo processual exercido pela empresas
Não são raras as situações de insatisfação dos consumidores com seus respectivos fornecedores de produtos e serviços, porém raramente o consumidor é atendido de maneira satisfatória pelos chamados serviços de atendimento ao consumidor (SAC) das próprias empresas, sem alternativa o consumidor vê no judiciário, mais precisamente nos Juizados Especiais, sua única saída, e dessa forma é como se indevidamente as empresas transformassem o poder judiciário em seu departamento de atendimento ao consumidor e balcão de acordos, o que se mostra um verdadeiro abuso.
Em alguns casos é mais barato pagar a respectiva indenização aos poucos consumidores que procuram o judiciário do que investir efetivamente em uma prestação de serviço exemplar para todos os consumidores.
Tal prática se coaduna a idéia utilitarista pregada por Jeremy Bentham e John Stuart Mill, porém aplicada ao campo processual, onde é pregada a teoria da máxima felicidade e utilidade para a maioria das pessoas, mesmo que seja em detrimento da minoria, fato que tem como exemplo clássico o caso do carro FORD PINTO na década de 70 nos Estados Unidos da América.
Banalização do dano moral e não aplicação da teoria do mais desestímulo
O dano moral sem sombra de dúvida é uma das grandes conquistas trazidas pela nova ordem constitucional de 1988, pois até então não havia base legal para sua aplicação, mesmo já existindo vasto conteúdo doutrinário e jurisprudencial em sua defesa no direito brasileiro.
No entanto até pouco tempo o conceito de dano moral ainda não estava bem esclarecido, o que levava muitas pessoas a pleiteá-lo sem realmente entender o que o significava, e outros por outro lado, como já dito anteriormente, com o intuito de obter alguma vantagem começaram a abusar de seu direito de ação na chamada "loteria do dano moral", o por isso os julgadores de maneira cada vez mais recorrente tem diminuído o valor das indenizações com o intuito de evitar o enriquecimento ilícito dos litigantes oportunistas e desestimulá-los de forma geral.
A banalização do dano moral tem acontecido pelos dois lados, ou seja, tanto pelas partes como pelos magistrados, pelas partes quando acionam o poder judiciário por qualquer ato que contrarie a sua vontade buscando no processo judicial mera guarida para seus caprichos em sua aventuras jurídicas, o que não pode ser tolerado pelo judiciário, e por parte dos magistrados quando perdem a sensibilidade de que por trás de cada processo existem pessoas, indivíduos estes que geralmente estão tendo seus direitos violados e merecem uma prestação jurisdicional eficaz, não apenas capazes de extinguir o processo, mas sim de solucionar o fato gerador do litígio.
Infelizmente quando são condenadas as empresas recebem condenações irrisórias, o que de forma indireta acaba por estimulá-las a continuarem perpetrando suas arbitrariedades mediante a sensação de impunidade. O bolso tem sido o "órgão" mais sensível da sociedade materialista em que vivemos, e até que os fornecedores e fabricantes de produtos e serviços sintam nele as punições pelos seus atos desleais para com o consumidor e sociedade em geral, continuaram buscando a maximização de seus lucros em detrimento dos direitos do consumidor.
Um dos argumentos contrários a teoria do mais desestímulo (Punitive Demage) no Brasil, seria o enriquecimento ilícito da outra parte, o que seria facilmente resolvido se parte da condenação fosse revertida para órgão e fundações de proteção e defesa do consumidor e uma parte razoável a individuo que foi lesado.
FATORES QUE TÊM CONTRIBUIDO PARA A CELERIDADE E EFICÁCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

Inovações trazidas pela lei 13.105/15 que instituiu o novo Código de Processo Civil
Na verdade o novo CPC foi mais influenciado do que influenciou a lei nº 9.099/95, e pouca mudanças foram realmente significativas, mas para não passar em branco vamos citar as principais mudanças.
Interrupção dos prazos na interposição de embargos de declaração
A mudança traz poucas vantagens práticas, mas evita equívoco quando os prazos processuais, vista que com tal mudança as interposições de embargos de declaração interrompem os prazos em todos os procedimentos e não mais os suspendem como acontecia nos âmbito dos juizados.
Incidente de desconsideração da personalidade jurídica
Esta alteração com toda certeza chegou em boa hora e tem efeitos mais práticos, visto que contribuirá sensivelmente para efetivação da fase executiva aumentando as chances do credor receber os valores que faz jus.
O processo eletrônico
Ainda que não seja uma realidade em todo Brasil, onde está operante, o processo eletrônico de longe foi a melhor coisa que aconteceu para os Juizados Especiais desde sua instituição, visto que tal inovação reduziu grandemente o tempo de tramitação dos processos, e atos que demoravam meses para ser praticados como uma simples juntada de petição agora é automática sendo feita pelo próprio sistema, possibilitando que os serventuários concentrem seus esforços na prática dos atos realmente importantes e consequentemente dando mais celeridade ao procedimento.
Dentre as vantagens podemos destacar: Acesso remoto aos processos por qualquer das partes a qualquer hora do dia, evitando que esses advogados sejam atendidos no balcão para uma simples vista ou carga dos autos; o processo eletrônico extinguirá no futuro a função do PROGER e Distribuidor, pois as petições e os processos serão juntadas e distribuídos de forma eletrônica, podendo se remanejados para outras áreas os servidores que desempenham atualmente essas funções; evitará a procura por processos e que os mesmos sejam perdidos pelo cartório ou por advogados; mandado de pagamento eletrônico enviado diretamente ao banco, entre diversas outras vantagens que tem agilizado a tão árdua tarefa dos operadores do direito e contribuído efetivo do desejo das partes.
Conclusão
Vimos que muitos são os fatores que tem prejudicado o bom andamento processual e a tutela jurisdicional em sede dos juizados especiais, no entanto tivemos a oportunidade de perceber também que os principais avanços não vieram de reformas na lei processual, mas sim na administração dos processos, ficando clara que o principal problema dos juizados é a forma que são conduzidos e administrados, e não da lei em si, pois a lei sem o homem é apenas letras no papel sem qualquer valor prático.
Bibliografia
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. Vol. 1. 18ª ed. Salvador: JusPodivm, 2016.
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SANDEL, Michael. O que o dinheiro não compra, 6ª ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2014.
JORGE, Flávio Cheim. A nova reforma processual. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil, vol. 2 - Manual do Processo de Conhecimento. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.






Aluno do 8º período do Curso de Direito e da Pós-graduação em Direito Civil e Processual Civil da UNESA. email: [email protected] - Link Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2593263471618405

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